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Ana Pereira

Portugês 12º ano


Ano letivo 2022/2023
“Nuno Álvares Pereira”

Índice

Introdução 2
Nun'Álvares Pereira 4
Análise ideológica do poema 5
Análise estilística do poema 6
Análise formal do poema 7
Intertextualidade com “Os Lusíadas” 9
Conclusão 11
Bibliografia/ webgrafia 12

1
2
Introdução

Neste trabalho vai ser analisado o poema “Nuno Álvares Pereira” que pertence à
obra “Mensagem” da autoria de Fernando Pessoa.
Fernando Pessoa foi um dos mais célebres poetas portugueses, e uma figura
central do Modernismo português.
De tudo o que escreveu durante a sua vida, as obras mais conhecidas do mesmo
fazem parte da poesia do ortónimo, dos seus heterónimos ou da obra “Mensagem”.
A poesia do ortónimo é constituída por um grupo de poemas altamente marcados
pelo conflito constante entre o pensar e o sentir, que em boa parte revela a
dificuldade em conciliar o que idealiza com o que consegue realizar, e com a
consequente frustração que a consciência de tudo isto implica.
Na poesia heteronímica, Pessoa apresenta-nos cerca de setenta heterónimos.
Poetas com personalidades próprias que escreveram a sua poesia e, com eles
procurou detectar, sob vários ângulos, os dramas do homem do seu tempo. Os seus
heterónimos mais conhecidos são Álvaro de Campos, um engenheiro naval com
marcas futuristas, Alberto Caeiro, um pastor que nega o uso da razão, e Ricardo
Reis, um médico que defende uma filosofia de vida baseada no epicurismo e
estoicismo.
Porém, para além da poesia do ortónimo e dos seus heterónimos, Fernando Pessoa
também escreveu um livro que viria a marcar a literatura portuguesa, “Mensagem”.
Esta foi a única obra completa publicada pelo poeta ainda em vida. Contém 44
poemas, escritos entre 21 de julho de 1913 e 16 de março de 1934, tendo sido
publicada a 1 de dezembro de 1934, dia das comemorações da Restauração da
República. Foi escrita para concorrer ao “Prémio Antero Quental”, onde acabou por
ser premiada com um prémio de segunda categoria de Propaganda Nacional, por
ter o número de páginas abaixo do limite imposto pelo concurso.
A “Mensagem” é mítica e simbólica. Os 44 poemas encontram-se divididos em três
partes, algo que é simbólico e que tem como base o facto de as profecias se
realizarem três vezes, ainda que de modo diferente e tempos diferentes,
correspondendo à evolução do Império Português que, tal como o ciclo da vida,
passa pelo nascimento, realização e morte. Todavia, esta morte não poderá ser
entendida como um fim definitivo, visto que a morte pressupõe uma ressurreição.

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Esta ressurreição culmina com o aparecimento de um novo império, desta vez não
terreno, mas sim espiritual e cultural, a fim de atingir a paz universal.
A primeira parte tem o nome de “Brasão” e corresponde ao nascimento, com
referência aos mitos e figuras históricas, identificadas nos elementos dos brasões.
Dá-nos conta do Portugal erguido pelo esforço dos heróis e destinado a grandes
feitos. Encontra-se subdividida em cinco partes, Os Campos; Os Castelos; As
Quinas; A Coroa e o Timbre.
Na segunda parte, “Mar Português”, surge a realização e a vida. O poeta alude à
realização da Pátria, ao auge dos descobrimentos, e os poemas retratam o anelo
pelo desconhecido e o heroísmo no confronto com o mar e a sua domação
Para terminar a composição literária, na terceira e última parte denominada o
“Encoberto”, aparece a desintegração do império, havendo, por isso um presente de
sofrimento e mágoa. Porém, o poeta mostra esperança na ressurreição da nação,
ansiando que esta esteja preparada, para quando a hora chegar, ser a cabeça do
Quinto Império, um império não material, mas sim moral e civilizacional.

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Nun'Álvares Pereira

Que auréola1 te cerca?


É a espada que, volteando.
Faz que o ar alto perca
Seu azul negro e brando.

Mas que espada é que, erguida,


Faz esse halo no céu?
É Excalibur,2 a ungida3,
Que o Rei Artur te deu.

'Sperança consumada,
S. Portugal em ser,
Ergue a luz da tua espada
Para a estrada se ver!

1 Brilho divino, prestígio


2 Espada do Rei Artur
3 Abençoada, sagrada

5
Análise estilística do poema

Número de estrofes
3 quadras

Número de versos
12

Métrica
7 sílabas métricas

Esquema rimático
Rima cruzada (abab/cdcd/efef).
O segundo e quarto verso da segunda e da terceira estrofe são versos agudos. Os
outros versos são graves.
As rimas são consonantes, e são ricas as rimas do segundo e quarto versos da
primeira e da segunda estrofe.

Estrutura do poema: O poeta desenvolve o tema segundo o esquema de pergunta-


resposta, nas duas primeiras quadras, e termina com uma frase imperativa, na
terceira. É um discurso em forma de colóquio, com o uso da segunda pessoa, com
apóstrofes e preces quase em ladainha. Usa a metonímia, invocando São Portugal
em vez de Nun’Álvares, a adjetivação expressiva (negro e brando), para salientar o
poder da espada-luz no azul celeste para nos iluminar o caminho, e o gerúndio
“volteando”, para imprimir um dinamismo ao movimento singular da espada-luz a
dar-lhe a eficácia da espada-bênção ou da bênção-espada.

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Análise ideológica do poema

Este poema surge na primeira parte da obra, “Brasão”, onde os poemas são
dedicados aos heróis fundadores da nacionalidade, aqueles que realizaram atos
gloriosos e deram origem à formação do reino de Portugal, sendo-lhe dedicado o
quarto capítulo desta primeira parte, apelidado “A Coroa”.
A coroa é um símbolo de poder e autoridade dos governantes, desde os tempos
pré-históricos. Mas a coroa também era dada ou posta a indivíduos que não eram
monarcas, em cujo caso a coroa era símbolo de grandes feitos heróicos ou
conquistas de coragem.
Não resulta, por isso, indiferente que a figura histórica escolhida para integrar o IV
capítulo de “Brasão”, tenha sido justamente Nuno Álvares Pereira.
D. Nuno Álvares Pereira, foi chefe militar e frade.
Companheiro e amigo de D. João I, teve uma intervenção decisiva na resolução da
crise de 1383-1385, conquistando a sua primeira vitória no conflito em Abril de 1384,
culminando na sua nomeação a Condestável de Portugal e Conde de Ourém pelo
Mestre de Avis.
Pouco tempo depois de D. João ser reconhecido pelas cortes de Coimbra como Rei
de Portugal, D. Nuno mostra o seu génio militar ao engendrar a batalha de
Aljubarrota, que acabaria por resultar na vitória dos lusitanos. Esta batalha viria a
ser decisiva no fim da instabilidade política e na consolidação da independência
portuguesa.
Após a morte do rei D. João I, Nuno Álvares Pereira continuou a travar grandes
batalhas defendendo a independência do país. Tais feitos, renderam-lhe uma fama
lendária, como guerreiro e como um homem devoto a Deus.
Por todas as suas façanhas no campo militar e religioso, é beatificado em 1918 pela
Igreja, e por isso mesmo, é compreensível a inclusão do mesmo na quinta parte,“A
Coroa”, porque este representa a espiritualidade pura, a essência do sagrado,
colocando-se acima da medida humana comum, a sua figura torna-se o exemplo
inteiro do ideal de ser português, deixando ver através do seu gesto significativo a
existência sagrada de Portugal e o sentido de missão que o define, sendo-nos
apresentado como um modelo a seguir.

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Análise formal do poema

Análise da primeira estrofe

Que auréola te cerca? A santidade que cercava Nuno Álvares Pereira


É a espada que, volteando Nasce da sua espada, dançando no ar
Faz que o ar alto perca A espada que perfura o céu em tal altura
Seu azul negro e brando4 Que o negro da altitude perde cor para o azul

O poeta inicia a primeira estrofe com uma pergunta retórica acerca da “auréola” que
cerca Nuno Álvares Pereira. Auréola é um símbolo de santidade e divindade, que
tradicionalmente “cerca” os santos e os iluminados.
A auréola que cerca Nuno Álvares Pereira é, ao mesmo tempo, uma auréola de
santidade (do guerreiro tornado monge) e uma auréola de combate (“é a espada (...)
volteando”). Quer dizer que a santidade que ele alcançou, foi a custo também dos
seus actos de guerreiro, pois é a sua espada que desenha o círculo diáfano por
cima da sua cabeça, destacando-o do comum dos homens, igualando-o a um santo.
A imagem poética é muito bem conseguida, dado que Pessoa nos faz imaginar o
raio da espada que, levantada em círculo tão alto, rompe o negro do céu em altitude
(“o ar alto”), deixando este de ser tão “negro e brando”, ou seja, D. Nuno surge
como símbolo de esperança e mudança.

Análise da segunda estrofe

Mas que espada é que, erguida, Qual é a espada levantada


Faz esse halo no céu? Que faz o desenho do halo (da auréola) no céu
É Excalibur, a ungida, É a espada Excalibur
Que o Rei Artur te deu. A espada do Rei Artur

Conhecendo a origem da auréola que cerca Nuno Álvares Pereira (a espada), na


segunda estrofe, Pessoa fala-nos dessa mesma espada. Diz-nos que esta “que,
erguida / Faz esse halo no céu” não é uma espada qualquer, não é a espada de um
comum cavaleiro, mas “é Excalibur, a ungida”, a espada do “Rei Artur”.

4 Adjetivação

8
Esta espada usada pelo Rei Artur é o símbolo da vontade humana, da força, do
empenho humano para se chegar ao divino. Existia uma lenda que dizia que a
Espada Excalibur estava cravada numa pedra de onde ninguém a conseguia retirar,
e que quando houvesse alguém que a conseguisse retirar da pedra esse seria o Rei
de Camelot, foi assim que Artur se tornou Rei. Aqui temos um grande simbolismo,
pois a pedra representa a dureza do coração, e Excalibur que é a vontade humana
cravada na pedra, simboliza a espiritualidade cravada na matéria, e só um coração
puro pode retirá-la e tomar posse dos poderes divinos.
Note-se que Pessoa dá a coroa ao Condestável, e depois dá-lhe a Excalibur –
como dizendo que ele era cavaleiro por dedicação mas rei por direito. Para a
Mensagem também é importante que a espada tenha sido usada pelo cavaleiro cuja
irmandade – os cavaleiros da Távola Redonda 5 – protegia o Santo Graal6, um
objecto desde sempre ligado aos Templários e que simboliza o derradeiro
conhecimento e união com Deus.
Em suma, a espada do Condestável não é apenas uma arma, é o símbolo do
guerreiro Cristão, que foi abençoado por Deus.

Análise da terceira estrofe

Esperança consumada, Exemplo real de coragem


S. Portugal em ser, Santo feito de carne 7
Ergue a luz da tua espada Dá-nos o teu exemplo
Para a estrada se ver! Para sabermos onde ir no futuro

O poema dedicado ao Condestável termina com uma invocação da sua memória.


Fernando Pessoa resume novamente as qualidades mais relevantes do seu mito –
ser “Esperança consumada” e “S.Portugal em ser” para depois lhe pedir que erga “a
luz” da sua “espada” para “a estrada se ver”. “Esperança consumada” porque o
Condestável foi um homem de feitos corajosos, ou seja, consumou, concretizou a

5 Segundo a lenda, foram os homens premiados com a mais alta ordem da Cavalaria, na corte do
Rei Artur
6 Santo Graal é uma expressão medieval que designa normalmente o cálice supostamente usado
por Jesus Cristo na Última Ceia
7 Que incorpora tudo o que de bom há em Portugal

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sua coragem em actos. “S. Portugal em ser”, porque aliou, na sua pessoa, a
coragem e a santidade.
Pede-lhe Pessoa que erga a luz da sua espada “para a estrada se ver”, ou seja,
pede a Nuno Álvares Pereira que devolva ao país o brilho de outrora, revelando-lhe
o caminho a seguir.
É claro que este pedido vem na mesma linha de outros, parecendo que Pessoa
reúne um exército imaterial, para servir de inspiração a uma revolta futura. Mas
como é um exército imaterial, de memórias, mitos, a revolta terá de ser de
consciências, mentalidades humanas.

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Intertextualidade com “Os Lusíadas”

Depois de feita uma análise estilística e formal do poema “Nuno Álvares Pereira”,
vamos agora analisar as semelhanças e as diferenças da presença desta figura
histórica na obra "Mensagem", e na epopeia de Luís de Camões, “Os Lusíadas”.
Tal como “Mensagem”, também “Os Lusíadas”, é uma obra intensamente pautada
pelo nacionalismo, onde o poeta conta a história do povo português exaltando a sua
grandeza e heroísmo. Ambas têm uma finalidade em comum, que é consciencializar
as mentes para a necessidade de valorização dos heróis, por duas razões, primeiro,
pois serve como prêmio pelos feitos por eles obtidos, e segundo, porque serve de
exemplo e inspiração para as gerações futuras.
Porém, também existem algumas discrepâncias entre as duas obras. Por um lado,
Fernando Pessoa possuía a perspetiva subsequente ao desmoronamento da alma
nacional e propõe justamente a substância do nosso passado e o mito sebástico
como forma de promover a regeneração de Portugal e de reconquistar uma
identidade perdida, não através da construção de um império material, situado num
espaço geográfico delimitado por fronteiras, mas profetizando a construção de um
império espiritual.
Enquanto Camões canta o império real, o expansionismo material para oriente, a
cruzada religiosa contra os infiéis, a ultrapassagem dos obstáculos físicos que se
erguiam aos portugueses por terra e por mar.
Ambos os poetas fazem referência a Nuno Álvares Pereira nas suas obras, seja
esta feita direta ou indiretamente.
Tal como vimos na análise do poema dedicado a D.Nuno na “Mensagem”, Pessoa
apresenta-nos este herói como o exemplo ideal do que é ser verdadeiramente
português, como alguém que lutou pelo país tanto a nível militar, como a nível
religioso, e por isso, aparece como um modelo a seguir para as conquistas do
futuro.
Ora em “Os Lusíadas”, Camões, em termos exactos ou simbólicos, de um modo
explícito ou implícito, faz referência ao Condestável nada menos que 14 vezes,
recebendo este uma consideração dada aos grandes heróis da pátria, e aparece
como alguém robusto, leal, destemido e de grande valor, sendo exaltadas as suas
habilidades físicas, morais e éticas.

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Por outras palavras, D.Nuno surge nesta epopeia como uma das figuras centrais e
mais importantes na história do nosso país, mais concretamente na vitória da
Batalha de Aljubarrota, e na a ajuda que prestou ao reino na luta pela
independência, que resultou no início de uma das mais prósperas dinastias, a
dinastia de Avis.
Ora, tanto Pessoa na “Mensagem”, como Camões em “Os Lusíadas” cantam
Portugal e em particular Nun'Álvares, mas de um modo bastante diferente. Camões
canta o início do império real, através da narração e da descrição, valorizando o
passado e o nacionalismo, e por esse motivo, D.Nuno aparece como uma das
figuras essenciais na história nacional, espelhando o ideal de lealdade, coragem e
perseverança, desempenhando um papel de extrema relevância na conservação
das fronteiras nacionais, e amaprando D.João I no início de uma nova dinastia, que
mais tarde conduziria o país a grandes feitos como os Descobrimentos.
Por sua vez, Pessoa canta o fim do império português, de uma forma abstracta e
interpretativa, exaltando o futuro ao cantar um Portugal que há-de voltar a ser
glorioso (o do Quinto Império), bem como o nacionalismo universalista. Logo, nesta
obra o Condestável8 aparece-nos como alguém que devemos tomar como exemplo
para um futuro próximo, pois se quisermos ser vitoriosos no futuro, e atingir o tal
Império espiritual para o qual Portugal está supostamente destinado, devemos
assumir a mesma postura de luta, valentia e bravura para assim podermos triunfar.
Em suma, ambos poetas, cada um na sua respectiva obra, cantam os feitos
gloriosos desta personagem histórica, descrevendo-o como alguém de grande valor
para a cronologia da nação. Sendo, no caso dos "Lusíadas", homenageado e
louvado pelos seus feitos ao serviço da pátria, e por isso, é-lhe concedida uma
estima e apreço dada apenas aos grandes heróis do país. E no caso de Fernando
Pessoa na obra "Mensagem", D.Nuno é nos apresentado como o modelo que os
portugueses devem seguir no futuro para poderem atingir o tão sonhado e destinado
império moral, o quinto Império, que será encabeçado pela nação lusitana.

8 Nuno Álvares Pereira

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Conclusão
Para terminar, Nuno Álvares Pereira foi uma pessoa de extrema importância para a
história do nosso país, pois foi ele que engendrou o esquema que possibilitou a
importante vitória na batalha de Aljubarrota, considerada um dos momentos altos e
importantes na luta contra Castela, e porque foi o mesmo que sempre apoiou o
Mestre de Avis no seu caminho para o trono.
Por isto, e por todas as outras façanhas que fez em vida, o seu nome ficaria para
sempre marcado na história nacional como alguém que lutou lealmente e
destemidamente pelo nosso país conjugando os três valores, moral, ético e
religioso, em si mesmo. Posto isto, faz todo sentido ter sido incluído na obra de
Fernando Pessoa, e ser-nos apresentado como um modelo a seguir, pois este
simboliza o ideal de perfeição, consagrado pelo mito na memória coletiva.

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Bibliografia/ webgrafia
Carlos Alberto; Hélder; Paulo; Romeu e Rui Mendes
http://ohomemsonha.blogspot.com/2008/03/nunlvares-pereira.html

Pedro Moreira; Março 2017


https://prezi.com/s7zgf5lfjlwm/nunalvares-pereira-de-fernando-pessoa/?
frame=cc2ea5fefd0d4341129827eef28964065c500539

Abílio carvalho
http://ideiaspoligraficas.blogspot.com/2014/06/a-portugal-em-desprezo-de-
valores.html

Luiz H.T.Chaves
https://www.templariosinternacional.com.br/l/o-simbolismo-por-tras-do-mito-do-rei-
arthur/

Porto Editora – D. Nuno Álvares Pereira na Infopédia


https://www.infopedia.pt/apoio/artigos/$d.-nuno-alvares-pereira

Artur Veríssimo, Dicionário da Mensagem: Figuras históricas, Mitos, Símbolos,


Conceitos.
https://fkxexplica.wordpress.com/2013/01/15/os-simbolos-na-mensagem/

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