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ESCOLA SECUNDÁRIA/3 SANTA MARIA DO OLIVAL– TOMAR

PORTUGUÊS – 9º ano – Ficha Informativa – “Auto da Barca do Inferno” de Gil Vicente

Gil Vicente é considerado um poeta-dramaturgo. Dramaturgo por ser criador de teatro; e poeta porque toda a sua obra é
escrita em verso. Nas suas obras critica a sociedade do seu tempo, pondo a descoberto muitos dos vícios e hábitos das
várias classes sociais. Por isso se considera a sua obra como um espelho, porque reflete fielmente a sociedade do
século XVI.

Personagens-tipo ⇒ Uma das características das obras de Gil Vicente é o recurso a


personagens-tipo. As suas personagens representam sempre um grupo, uma classe social, uma profissão. Desta forma,
são uma síntese dos defeitos e virtudes desses grupos. Assim, Gil Vicente satirizava a sociedade, sem atacar
diretamente alguma pessoa em particular.

Objetos ⇒ Uma outra forma de que Gil Vicente se serviu para melhor caracterizar as personagens foi apresentá-las com
objetos próprios das suas classes ou profissões. Esses objetos, como o manto e a cadeira do Fidalgo, a bolsa do
Onzeneiro ou o bode do Judeu, ajudam o público a identificar o tipo social em destaque. Repara que o Fidalgo até traz
um pajem, o Frade uma moça e a Alcoviteira um grupo de raparigas, pois estas pessoas faziam parte da sua vida e
permitiam, por outro lado, evidenciar os seus defeitos.

Linguagem ⇒ Outro processo que permite identificar as personagens é o tipo de linguagem que utilizam. Quando as
personagens dialogam com o Anjo ou com o Diabo, utilizam um registo de língua próprio da classe social em que se
inserem ou do grupo que representam. Eis alguns exemplos:

• a linguagem que o Parvo utiliza é descuidada e grosseira, tendo em alguns momentos um tom
insultuoso para com as outras personagens. Repara que o Parvo não traz consigo elementos ou símbolos que o
caracterizem, e, por isso, a sua linguagem é fundamental para se perceber de que tipo de personagem se trata.

• a linguagem que o Corregedor e o Procurador utilizam está relacionada com as suas profissões: homens ligados à
Justiça. Assim, muitas palavras surgem no diálogo destas personagens em latim, mas trata-se de um latim já muito
deturpado.

Repara na linguagem que o Diabo utiliza ao longo da peça. Ele vai adequando a sua linguagem conforme o tipo de
interlocutor.
O Auto da Barca do Inferno, tal como toda a obra vicentina, tem um grande valor documental, pois não só é espelho da capacidade do autor,
como também da sociedade em que este se insere. Através da peça, é possível traçar um quadro fiel das classes sociais apresentadas, dos seus
hábitos, defeitos e virtudes.

Gil Vicente compôs o Auto da Barca do Inferno em 1517, sendo este auto considerado uma moralidade. As moralidades eram representações
cujas personagens simbólicas encarnavam vícios ou virtudes com o objetivo de moralizar a sociedade.

► Resumo

1.ª cena

Faz-se a apresentação da barca do Inferno. O Diabo dialoga com o seu companheiro, revelando uma grande euforia e pressa de que tudo esteja
preparado para o embarque das almas e para a partida rumo ao Inferno. Após esta breve apresentação, inicia -se o desfile das várias personagens-
tipo.

2.ª cena

A primeira personagem a entrar em cena é um Fidalgo, que traz consigo um pajem, um criado, que lhe segura a cauda do manto e uma cadeira. O
Fidalgo pertence à nobreza e, por isso, acha que não vai para o Inferno, mas o Anjo não o deixa entrar na barca da Glória pelos seus pecados. O
Fidalgo acaba por embarcar na barca do Inferno, enquanto o moço sai de cena.
3.ª cena

A segunda personagem é um Onzeneiro, que viveu a amealhar dinheiro à custa dos outros. Por isso entra com uma bolsa tão grand e que quase
não cabe na barca. O Diabo quer que ele entre desde logo na sua barca, mas o Onzeneiro dirige-se primeiro à barca da Glória, sendo também
repelido pelo Anjo. No entretanto, pede ao Diabo que o deixe voltar à terra para ir buscar um dinheiro que deixou escondido, mas o Diabo
obriga-o a embarcar.

4.ª cena

A terceira personagem a entrar é o Parvo, chamado Joane, que conversa com o Diabo, insultando-se um ao outro. Por ser uma personagem que
não se pode responsabilizar pelos seus atos, o Anjo promete levá-lo para o Paraíso; entretanto fica na praia onde assiste e comenta o desfile das
outras personagens.

5.ª cena

A quarta personagem é um Sapateiro, João Antão, que vem carregado de formas. Como passou a vida a roubar o povo é condenado à barca do
Inferno, mas primeiro ainda tenta a sorte junto do Anjo. De nada lhe adianta e entra na barca do Inferno.

6.ª cena

Entra a quinta personagem, um Frade, a cantar, que traz pela mão uma moça, Florença, e ainda um traje de esgrimista por baixo do hábito. Como
viveu uma vida de pecado, o Diabo também o convida a entrar na barca, mas ele e Florença dirigem-se ao Anjo, que os rejeita. Entram os dois na
barca do Inferno.
7.ª cena

Brízida Vaz é a sexta personagem a entrar em cena. Traz consigo um grupo de moças que entregou à prostituição. No entanto, e porque também
é alcoviteira, ainda se acha digna de entrar no Céu. Como tal não é possível, entra na barca do Inferno, e as suas moças abandonam a cena.

8.ª cena

A sétima personagem a desfilar é um Judeu que traz um bode às costas. Nem sequer dialoga com o Anjo, pois não acredita na religião cristã.
Também não entra na barca do Inferno, pois o Diabo decide que ele e o bode irão a reboque, já que era hábito os judeus estarem separados das
restantes pessoas.

9.ª cena

Entra um Corregedor, que vem carregado de processos. O Diabo acusa-o de se ter deixado subornar várias vezes. Entretanto, entra em cena um
Procurador carregado de livros e que também se dirige ao Diabo. Ambos, Corregedor e Procurador, procuram um lugar na barca da Glória, mas
acabam por entrar na do Inferno. O Corregedor discute com Brízida Vaz, pois tinha-a condenado.

Nota: Embora se verifique a entrada de duas personagens, é habitual considerar-se a cena do Corregedor e do Procurador como uma só, visto que
ambas as personagens pertencem ao mesmo grupo socioprofissional e percorrem o espaço cénico simultaneamente.
10.ª cena

Surge um Enforcado, que ainda traz a corda ao pescoço, convencido que poderia entrar na barca da Glória. Acaba por entrar também na barca do
Inferno.

11.ª cena

Finalmente, surgem Quatro Cavaleiros, que morreram a lutar pela Fé - razão bastante para ingressarem na barca da Glória.

As personagens representam uma classe social, com os seus vícios e virtudes. Para serem facilmente reconhecidas, as
personagens transportam também objetos que permitem inseri-las no seu meio social ou profissão. Gil Vicente recorre a
vários tipos de cómico para fazer a crítica dessas classes ou profissões.

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