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Tratamento antiviral usando a adenosina análoga de nucleosídeo GS-441524

em gatos com diagnóstico clínico de peritonite infecciosa felina neurológica

RESUMO
Peritonite infecciosa felina (PIF) é causada por uma mutação do coronavírus
entérico felino. O vírus de PIF resultante comumente causa patologias oculares e no
sistema nervoso central nos casos da manifestação não efusiva da doença. Mais de
95% dos gatos com PIF vão sucumbir à doença em dias ou meses após o diagnóstico
apesar de toda a variedade de tratamentos já usados antes. Drogas antivirais
recentemente desenvolvidas têm se mostrado promissoras no tratamento da PIF não
neurológica, mas os dados sobre casos de PIF neurológica são limitados. Quatro
casos de ocorrência natural da PIF com acometimento do sistema nervoso central
foram tratados com o análogo de nucleosídeo antiviral GS-441524 (5-10 mg/kg) por
pelo menos 12 semanas. Os gatos foram monitorados continuamente com exames
físicos, neurológicos e oftálmicos. Um gato passou por seguidos exames de imagem
(ressonância magnética), análises de fluido cérebro-espinhal (incluindo testes de
concentração de coronavírus felino e de transcriptase reversa de coronavírus felino),
seguidos exames de imagem oculares usando tomografia de coerência óptica de
Fourier-domain,e microscopia confocal in vivo. Três gatos estão vivos já sem
tratamento (528, 516 e 354 dias após o início do tratamento) com exames físicos e
neurológicos normais. Um gato foi eutanasiado 216 dias depois o início do tratamento
depois de seguidas recaídas pós tratamento primário e secundário. No caso 1, a
reversão da doença foi definida baseada na normalização dos achados da
ressonância magnética e dos fluidos cérebro-espinhais, além da resolução dos
segmentos cranial e caudal da imagem ocular. O tratamento com GS-441524 mostrou
eficácia clínica e pode resultar em esclarecimento e resolução a longo prazo da FIP
neurológica. As dosagens requeridas pela doença no sistema nervoso central podem
ser maiores que aquelas usadas para a FIP não neurológica.

1| INTRODUÇÃO
Os tratamentos experimentais foram aprovados pelo Comitê Institucional de
Cuidados e Uso Animal e pelo Conselho de Revisão de Experimentos do Hospital
Escola de Medicina Veterinária de UC Davis. A GS-441524 foi fornecida pela
Corporação de Ciências Gilead. O diagnóstico clínico da PIF foi baseado em uma
combinação de sinais característicos, histórico, sinais patológicos, resultados de
testes laboratoriais incluindo hiperglobulinemia, queda de albumina: proporções de
globulina e anticorpos de coronavírus felino e resposta a tratamento viral específico.
Foram realizados testes ELISA de FIV e FeLV. Os repetidos testes avançados como
RM, análise de SNC, proporções de FCoV RT-PCR e sorologia, microscopia confocal
in vivo e tomografia de coerência óptica foram realizados em 1 caso.

2| CASO 1
Um gato doméstico de oito meses macho castrado semelhante a siamês com
as extremidades cinzas, adotado de um grupo de resgate quando filhote foi
apresentado com um histórico de meses de letargia e diminuição de apetite, um mês
de ataxia progressiva nos membros pélvicos que também foi notada no exame
neurológico. O gato pesou 3kg, no caso 1 kg a menos que uma irmã fêmea dele.
Anormalidades nos exames de bioquímica sérica incluíam um aumento da
concentração de proteína total (8.9 g/dL; o intervalo referencial é de 6.3 a 8,8 g/dL),
com uma proporção de AG de 0.53 (albumina 3.1 g/dL intervalo referencial: 2.6 a 3.9
g/dL; globulina 5.8 g/dL intervalo referencial: 3.0 a 5.9 g/dL). Testes de FIV, FeLV,
proporções de anticorpos IgM e IgG de Toxoplasma gondii deram negativos e a
concentração de anticorpos para coronavírus felino deu positiva em 1:12 800. Exame
oftalmológico identificou cicatrizes coriorretinianas no fundi tapetal de ambos os olhos.
A ultrassom abdominal mostrou linhas de circunferência hiper ecoica nas junções
corticomedulares renais, linhas hiper ecoicas lineares paralelas à superfície luminal
do jejujo e íleo e colo e linfonodos mesentéricos aumentados. O gato foi tratado com
5mg/Kg de GS-441524 subcutânea uma vez por dia por 14 semanas. O apetite e a
atividade aumentaram dentro de 4 dias, ele voltou inclusive a pular em superfícies
altas. A concentração sérica de proteína total ao fim do tratamento era de 7.8 g/dL
com a proporção de AG de 0.77. O exame neurológico estava normal e o peso
corporal foi para 5.1kg. O gato permaneceu normal durante o tempo de montagem do
trabalho, 528 dias depois do início do tratamento.

3| CASO 2
Um gato doméstico de um ano, macho castrado, da raça Pelo Curto nascido
numa casa de resgate foi apresentado com um histórico de 3 meses de uveíte, uma
semana de letargia, alterações comportamentais, contraindo o rabo, com convulsões
generalizadas, apetite reduzido e disfagia, e ataxia dos membros pélvicos. O gato
pesava 3,7Kg. No exame neurológico, o gato estava obnubilado (estado de
consciência em que não se reage a determinados estímulos), com ataxia
generalizada, diminuição de reações posturais nos membros torácicos esquerdos e
pélvicos direitos, com nistagmos fisiológicos em ambos os olhos e diminuição da
sensibilidade nasal no lado direito. A resposta à ameaça estava diminuída nos dois
olhos e havia midríase no olho esquerdo, além de diminuição do reflexo pupilar à luz
direta e consensual, com iluminação no olho esquerdo ele estava presente. O exame
oftalmológico mostrou vulveíte anterior nos dois olhos, com destaque retinal no olho
esquerdo e vasculite retinal em ambos os olhos. O gato pesou 3,7Kg e as
anormalidades na bioquímica sérica incluíam aumento da concentração de proteínas
totais (8.8 g/dL intervalo referencial: 6.6 a 8.4 g/dL) com a proporção AG de 0.48
(albumina 2.8g/dL intervalo referencial: 2.2 a 4.6g/dL; globulina 5.8g/dL intervalo
referencial: 2.8 a 5.4g/dL), concentração de bilirrubinas totais aumentada (1.8mg/dL
intervalo referencial 0.0 a 0.2mg/dL) e AST aumentado (128IU/L intervalo referencial:
17 a 58IU/L). Os testes de FIV, FeLV e dirofilariose foram negativos. Com base na
palpação abdominal, os linfonodos mesentéricos estavam aumentados. O gato foi
tratado com 5mg/Kg de GS-441524 subcutânea, uma vez por dia por 14 semanas. O
peso corporal ao final do tratamento era de 5,9 Kg. O nível mental e atividade
melhoraram significativamente 48 horas após o início do tratamento. Depois de três
semanas de tratamento, os exames neurológico e oftálmico mostraram normalidade
a não ser por leve anisocoria intermitente e cicatrizes corioretinianas nos dois olhos.
As alterções antes notadas na bioquímica sérica foram resolvidas terminando em
concentração sérica de proteínas totais de 8.1g/dL, e proporção AG de 0.77. Três
semanas depois do fim do tratamento, o gato pesou 6.4Kg, exames físicos e
neurológicos estavam normai e a concentração sérica de proteínas totais foi pra
7.0mg/dL com proporção AG de 0.84. O gato continuou clinicamente normal durante
a montagem do trabalho, 516 dias depois do início do tratamento.

4| CASO 3
Uma gata doméstica de 18 meses, fêmea castrada, da raca Pelo Curto, obtida de um
abrigo de animais, foi apresentada com um histótico de três meses de doença ocular,
três semanas de letargia progressiva e inapetência, além de um histórico de vários
dias de paresia progressiva dos membros pélvicos. A gata foi tratada com colírio de
acetato de predinisolona 1% nos dois olhos a cada 6 horas por 5 dias. No exame
neurológico,a gata apresentou comportamento inapropriado e hipersensibilidade à
palpação cranial. A gata se mostrou paraparesica não ambulatorial (fraqueza extrema
nos membros mas com algum movimento, no entanto sem conseguir andar) com
diminuição dos reflexos dos membros pélvicos. A resposta à ameaça foi ausente em
ambos os olhos com anisocoria (pupila do olho direito estava média e havia midríade
no olho esquerdo). O reflexo pupilar à luz estava ausente no olho direito devido a uma
sinéquia posterior (aderência da íris ao cristalino) e ausente no olho esquerdo tanto
com iluminação direta quanto indireta. Havia reflexo de visão nos dois olhos e a gata
parecia ter visão em condições fotópicas. O exame oftálmico mostrou uveíte e
síndrome de hiperviscosidade em ambos os olhos. A gata pesou 2.6Kg. As
anormalidades na bioquímica sérica incluíam aumento da concentraçãode proteína
total (11.7g/dL; intercvalo referencial 6.3 a 8.8g/dL) com proporção AG de 0.2
(albumina 2.0g/dL intervalo referencial 2.6 a 3.9g/dL e globulina 9.7g/dL intervalo
referencial 3.0 a 5.9g/dL). Os testes de FIV e FeLV estavam negativos e a
concentração de anticorpos para coronavírus felino foi positiva com 1:6400. A
ultrassom abdominal mostrou hepatoesplenomegalia, rins pequenis com junções
corticomedulares indistintas e linfonodos mesentéricos aumentados. A gata foi tratada
com 5mg/Kg de GS-441524 subcutânea, uma vez por dia por 15 semanas. Depois de
um mês de tratamento, a uveíte melhorou mas continuou presente e a gata estava
paraparesica ambulatorial com reflexos segmentares normais. A gata pesou 3,3Kg e
a proporção AG 0.55. Depois de dois meses de tratamento, sinais súbitos de vulveíte
anterior ativa estavam presentem no olho direito, mas também havia apenas melhora
moderada na parapesia ambulatorial. O peso corporal subiu para 3.7Kg e a proporção
AG era 0.67. Depois de 15 semanas de tratamento haviam mínimas evidências de
vulveíte no olho direiro e melhora na parapesia ambulatorial que se estabilizou pelas
próximas 4 semasnas. A gata pesou 4.0Kg e a proporção AG era 0.76. Depois de
terminar o tratamento, letargia, inapetencia e anisoscoria voltaram dentro de 36 horas.
O tratamento foi reinstituído com 5mg/Kg de GS-441524 subcutânea, uma vez por dia
e os sinais cessaram dentro de 24 horas. Os sinais permaneceram estáticos durante
as doze semanas do segundo round de tratamento, mas a diminuição da atividade
retornou novamente após o encerramento do tratamento. A gata foi eutanasiada em
partes por causa do aumento da resistência à administração da droga. A avaliação
histopatológica depois da necrópsia mostrou meningite crônica não supurativa
multifocal, encefalomielite e ventriculite, uveóte linfocítica e histiocítica e coroidite nos
dois olhos e nefrite intersticial. Imunorreatividade imunohistoquímica positiva para
coronavírus foi identificada em histiócitos associados a lesões no cérebro, rim e olho.

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