Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
29872017 3357
Artigo article
em situação de rua: uma revisão integrativa
Abstract The homeless population has physical Resumo A população em situação de rua apre-
and mental health issues and is exposed to con- senta agravos à saúde física e mental e está expos-
ditions that lead to vulnerabilities, premature ta a condições que implicam em vulnerabilidades,
mortality, difficulty of access to basic services, mortalidade prematura, dificuldade de acesso a
all of which demands intersectoral actions. Out- serviços e que requerem ações intersetoriais. Os
reach homeless clinics are components of Primary Consultórios na Rua, componentes da Atenção
Health Care of the psychosocial health services Básica em Saúde da Rede de Atenção Psicossocial,
network and play an important role in healthcare desempenham importante papel no cuidado a esse
for this group. The goals of this integrative review grupo. Com o objetivo de conhecer as ações de saú-
are to assess health actions directed to this pop- de dirigidas a essa população; identificar se elas
ulation, identify if actions result from dialogue são construídas a partir do diálogo entre serviços
between health service providers and the popula- e pessoas atendidas; e se respondem às suas neces-
tion attended and if such actions are sufficient to sidades; foi desenvolvida esta revisão integrativa.
cater to their needs. Initially, 264 related papers Foram encontrados inicialmente 264 estudos:
were located, 27 of which were pre-selected and a 27 foram pré-selecionados e 11 selecionados. Os
further 11 were selected using pre-defined crite- achados foram sistematizados em três categorias:
ria. The findings were divided into 3 categories: 1) 1) Características das ações de saúde que buscam
Characteristics of health actions seeking to cater responder às necessidades da população em situ-
to the needs of the homeless population; 2) Factors ação de rua; 2) Fatores que limitam as ações de
limiting health actions that restrict the care to the saúde e restringem a resposta às necessidades dessa
needs of this population; 3) Participation of the população e 3) Participação das pessoas em situ-
homeless population in the planning and execu- ação de rua no planejamento e na execução das
tion of actions provided by the health services. The ações oferecidas pelos serviços de saúde. Os estu-
studies show advances in access to basic rights and dos apontam avanços no acesso a direitos básicos
provide input that support initiatives to enhance e trazem contribuições que apoiam iniciativas de
and strengthen the provision of intersectoral care ampliação e fortalecimento da oferta de atenção
to this population. intersetorial a essa população.
1
Faculdade de Medicina,
Universidade de São Paulo. Key words Homeless population, Health, Mental Palavras-chave População em situação de rua,
Rua Cipotânea 51, Butantã. health, Intersectoriality Saúde, Saúde mental, Intersetorialidade
05360-160 São Paulo SP
Brasil. livia_bustamante@
yahoo.com.br
3358
van Wijk LB, Mângia EF
Tabela 1. Distribuição da seleção de publicações A leitura criteriosa dos estudos permitiu a sis-
de bases de dados de acordo com os critérios tematização dos achados em três categorias cor-
estabelecidos para a inclusão de estudos – São Paulo, relacionadas aos objetivos da revisão: 1) Caracte-
SP, Brasil, 2017. rísticas das ações de saúde que buscam responder
Base de Pré- às necessidades da população em situação de rua;
Encontrados Selecionados
dados selecionados 2) Fatores que limitam as ações de saúde e res-
Lilacs 180 27 14 tringem a resposta às necessidades da população
SciELO 23 4 4 em situação de rua e 3) Participação das pessoas
(já inclusos) (já inclusos) em situação de rua no planejamento e na execu-
Portal 64 3 0 ção das ações oferecidas pelos serviços de saúde.
CAPES Cada uma delas será apresentada a seguir.
Total 267 30 14
Quadro 1. Informações gerais dos estudos selecionados: título; autores; local, periódico e ano de publicação; tipo
de estudo – São Paulo, SP, Brasil, 2017.
Título do estudo Autores Local Revista / Ano Tipo
1 Práticas de cuidado e população em situação Silva CC et al. RJ Saúde Debate / Qualitativo
de rua: o caso do Consultório na Rua23 2015
2 Consultório na Rua: atenção a pessoas em Lima HS, Seidl GO Psicologia em Qualitativo
uso de substâncias psicoativas24 EMF estudo / 2015
3 Consultório na Rua: visibilidades, Hallais JAS, Barros SP Cad Saúde Qualitativo
invisibilidades e hipervisibilidade25 NF Pública / 2015
4 A experiência no serviço de Consultório Souza VCA et al. PE Cad Ter Ocup Qualitativo
de Rua na perspectiva dos profissionais: UFSCar / 2014
Contribuições para a atenção ao usuário de
álcool e outras drogas26
5 Acesso, equidade e coesão social: avaliação Borysow IC, SP Rev Esc Enferm Qualitativo
de estratégias intersetoriais para a população Furtado JP USP / 2014
em situação de rua27
6 Práticas de saúde das equipes dos Silva FP et al. PE Cad Saúde Qualitativo
Consultórios de Rua28 Pública / 2014
7 Consultório de/na rua: desafio para um Londero MFP et al. RS Interface / 2014 Qualitativo
cuidado em verso na saúde29
8 Acesso e intersetorialidade: o Borysow IC, SP Physis / 2013 Revisão
acompanhamento de pessoas em situação de Furtado JP narrativa
rua com transtorno mental grave30
9 Experiência POP RUA: Implementação do Macerata IM RJ Rev Polis e Relato de
“Saúde em Movimento nas Ruas” do Rio de Psique / 2013 experiência
Janeiro, um Dispositivo Clínico/Político na
Rede de Saúde do Rio de Janeiro31
10 A estratégia saúde da família para a Carneiro Junior N SP Saúde Soc / Relato de
equidade de acesso dirigida à população et al. 2010 experiência
em situação de rua em grandes centros
urbanos32
11 Atendimento à população de rua em um Canônico RP et al. SP Rev Esc Enferm Relato de
centro de saúde escola na cidade de São USP / 2007 Experiência
Paulo33
12 Rede social e promoção da saúde dos Souza ES et al. SP Rev Esc Enferm Quanti-
“descartáveis urbanos” 34 USP / 2007 qualitativo
13 O cuidado em situação de rua: revendo o Rosa AS et al. SP Rev Bras Qualitativo
significado do processo saúde-doença35 Enferm / 2006
14 Os loucos de rua e as redes de saúde mental: Lisboa MS SP TESE – PUC / Qualitativo
os desafios de cuidado no território e a 2013
armadilha da institucionalização36
3361
Quadro 2. Matriz de síntese das características dos estudos incluídos na revisão, de acordo com objetivos,
metodologia e principais resultados - São Paulo, SP, Brasil, 2017.
Objetivo Metodologia Principais resultados
8 Compreender o acesso Revisão narrativa de Serviços de saúde mental enfrentam
e a acessibilidade de literatura. Levantamento dificuldades em atender na rua. O modo
moradores de rua aos bibliográfico na base de dados como o serviço responde às peculiaridades
serviços de saúde mental Scielo e no banco de teses da da população facilita ou dificulta acesso e
a partir da intermediação CAPES. cuidado. Usuários chegam ao serviço por
feita pelo setor de intermédio da assistência social.
assistência social30.
9 Expressar, apresentar Descrição do processo de Agente comunitário de saúde como
e discorrer acerca da montagem do serviço e peça chave do cuidado: vínculo e
experiência do projeto caracterização de suas ações e longitudinalidade. Serviços com
“Saúde em Movimento nas de seu modo funcionamento. funcionamento diferente do tempo da
Ruas”, a partir da ótica do população: CR como ponte, sensibilizador
gerente técnico da equipe31. e formador. Ações consideram demandas
singulares para redução de danos: promoção
de saúde como forma de produzir cidadania.
10 Relatar a experiência da Descrição do processo de Equipes objetivam acompanhar pessoas
implantação da Estratégia implantação das equipes de em seu local de moradia, vinculando-as à
Saúde da Família (ESF) ESF para a população em UBS, e desenvolver ações básicas de saúde
para a atenção à saúde da situação de rua na cidade de por meio da assistência in loco e integração
população em situação de São Paulo: projeto “A gente com serviços e recursos locais. Iniciativa
rua32. na rua”. favoreceu o acesso.
11 Relatar a experiência do Descrição do funcionamento Equipe realiza acolhimento e abordagem
programa “A gente na rua” de um Centro de Saúde Escola das pessoas em situação de rua, na unidade
em um Centro de Saúde e da Equipe “A gente na rua”, ou no território com foco em ações clínicas.
Escola33. na cidade de São Paulo. Atribui à resistência dos usuários a sua não
adesão à unidade.
12 Realizar o diagnóstico e Pesquisa-ação com aplicação Instituições costumam impor valores;
identificar os princípios de questionário semi- oferecem ações assistenciais, paliativas e
norteadores das estruturado em 19 serviços cronificantes. Prevalecem saberes técnicos,
instituições públicas, do centro da cidade de São indicando pouca articulação com a
privadas e entidades sociais Paulo. Realizada oficina população. Incoerência entre prática e
que têm como público- participativa com 5 serviços, norteadores apontados (emancipação,
alvo pessoas adultas em que discutiu o conhecimento direitos, geração de renda, cidadania e rede
situação de rua34. acerca das instituições e o social). Setor saúde favorece articulação.
relacionamento entre elas.
13 Conhecer o significado Pesquisa qualitativa, Para os entrevistados, o processo saúde-
do processo saúde- exploratória. Entrevista semi- doença depende do indivíduo e o cuidado
doença-cuidado para estruturada realizada com 4 é responsabilidade dos serviços de saúde.
pessoas em situação de adultos em situação de rua e Trabalhadores acreditam que o serviço é
rua e trabalhadores de um 4 agentes comunitários que de má qualidade devido ao despreparo dos
centro comunitário de trabalham em um centro profissionais para lidar com essa população.
atendimento à população comunitário.na cidade de São
de rua35. Paulo.
14 Investigar como se Estudo etnográfico: Uma Equipe atua em consonância com o projeto
configura a rede de atenção equipe do Programa de Saúde terapêutico singular e efetiva ações em
e cuidado destinada às da Família Sem Domicílio uma rede enfraquecida e com serviços
pessoas em situação de de uma UBS do centro da excludentes. A equipe consegue dar suporte
rua em sofrimento mental cidade de São Paulo foi ao sofrimento e às necessidades em saúde
e como se articulam as acompanhada durante um e se responsabiliza pelo cuidado integral
intervenções em Saúde. ano. As observações foram das pessoas. Ações focadas na autonomia,
Acompanhar como são registradas em diário de vínculo e acolhimento. Aponta o risco
acionadas redes de cuidado campo e a análise foi feita por das ações serem atravessadas por práticas
e sobrevivência frente às meio das narrativas coletadas. de poder e dominação e resultarem em
necessidades de saúde. institucionalização: risco de pessoas em
Compreender a potência situação de rua com transtorno mental
das relações de cuidado36. serem internadas em hospitais psiquiátricos.
3363
Londero et al.29 descrevem que a interação da representam uma forma de exclusão, que buro-
equipe de Consultório de/na Rua com essa po- cratiza a prática e reforça o preconceito ao qual
pulação, em seus diversos contextos, permite a essa população se encontra exposta28,36.
apreensão de necessidades ampliadas de cuidado Lisboa36 descreve que a rede de serviços es-
e a expressão dessas necessidades para a rede de tudada se apresenta fracamente estabelecida e
serviços. Outros estudos23,31 também reconhecem não se responsabiliza pelo cuidado a esse grupo.
o potencial sensibilizador do trabalho das equi- Borysow e Furtado27 também destacam que a ar-
pes. Um deles23 destaca a importância dos pro- ticulação entre os serviços da rede é difícil e que
fissionais mapearem e tecerem relações com os muitas vezes os fluxos não são instituídos e se
serviços da rede, de modo a assegurar o cuidado efetivam apenas por meio de contatos pessoais.
integral às pessoas em situação de rua; e o ou- Souza et al.26 identificam que a ausência de
tro31 identifica que o compartilhamento de ações uma rede consolidada de atendimento noturno
com outros serviços, bem como o matriciamen- também é um fator prejudicial à estruturação do
to, promovem a atenção integrada, contribuem cuidado e desenvolvimento de ações, bem como
para a formação das equipes e consequentemente o número insuficiente de recursos físicos e mate-
aprimoram o cuidado. riais; profissionais; equipes e serviços23.
Lisboa36 e Macerata31 destacam que as equipes Outros dois aspectos apresentados como obs-
estudadas se mantêm atentas às situações de vul- táculos à realização de boas práticas são a discre-
nerabilidade; atuam em consonância com as ne- pância de atuação e a desarticulação entre diferen-
cessidades de saúde observadas e conseguem dar tes serviços e/ou setores. Enquanto alguns serviços
suporte ao sofrimento dos usuários, mesclando baseiam suas ações no respeito à população e na
saberes da Atenção Básica e da Saúde Mental nas promoção de sua autonomia, outros atuam de for-
ações ofertadas. Porém Lisboa36 ressalta que é ma autoritária, impositiva e higienista23-25,27,36. Por
preciso abrir caminhos para que seja possível efe- serem vítimas de repreensões, encaminhamentos
tivar ações complexas. Silva et al.23 compreendem indiscriminados e/ou ações de recolhimentos por
que o trabalho do Consultório na Rua permitiu parte de serviços de outras Secretarias de Estado,
muitos avanços; porém a ampliação do acesso muitas vezes essa população se apresenta insegura
ainda não se encontra plenamente garantida. em buscar os serviços de saúde23.
Londero et al.29, bem como Lima e Seidl24,
Fatores que limitam as ações e restringem a avaliam que o trabalho junto a essa população
resposta às necessidades da população provoca angústia e sofrimento nos profissionais
em situação de rua pelo contato com situações de desamparo e de
invalidação dos direitos dos usuários, além de
De um modo geral, os estudos avaliam que as demandar intenso investimento afetivo. Tais con-
equipes voltadas ao cuidado à população em si- dições são difíceis de serem manejadas e podem
tuação de rua muitas vezes encontram limitações produzir ações desarticuladas dos sujeitos, pres-
para executar ações devido a dificuldades dos de- critivas, resolutivas e impositivas29.
mais serviços de saúde em oferecer atendimento Lisboa36, apesar de reconhecer a consonância
a essa população e compartilhar o cuidado. do trabalho realizado com as proposições da Po-
A situação desse grupo, que em sua maioria lítica Pública e com o cuidado integral, reconhece
encontra dificuldades em manter o autocuidado que há o risco das ações serem atravessadas por
e em decorrência se apresenta com falta de hi- práticas de poder e dominação que podem se des-
giene, associada aos efeitos do uso de álcool e/ dobrar em intervenções de controle e regulação e
ou drogas, provocam o afastamento dos profis- culminar na institucionalização dos usuários.
sionais, produzem restrições nos acolhimentos Alguns estudos27,34 descrevem dissonâncias
e por vezes impedem atendimentos23,25,26,27,30. entre o que os serviços se propõem a fazer e o
Requisições burocráticas, como a exigência de que de fato realizam. Souza et al.34 identificam
documentos e comprovante de residência, além que instituições dirigidas a essa população apre-
de limitações no agendamento de consultas e in- sentam em seus objetivos termos como “eman-
flexibilidade de horários, reforçam o processo de cipação, direitos, geração de renda, cidadania e
exclusão vivenciado25,26. rede social”, porém desenvolvem práticas assis-
A exigência da presença de familiares e/ou de tencialistas e costumam impor seus próprios va-
pessoas responsáveis, feita por hospitais ou pron- lores em resposta à visão de que as pessoas em
to socorros, muitas vezes impede que as pessoas situação de rua são desprovidas “de tudo, inclu-
em situação de rua sejam atendidas ou interna- sive de história, vontades, valores e costumes”. Os
das25,30. Tais obstáculos colocados pelos serviços autores ainda observam que o saber técnico e a
3365
usuário e do que ele identifica como prioridade. O modo de funcionamento de alguns servi-
Observa-se o comprometimento com as necessi- ços, ao limitar o acesso de usuários devido a pre-
dades identificadas e o enfoque na construção do conceitos, burocratizações e não flexibilizações
vínculo e no incentivo à autonomia. No estudo de práticas diante de necessidades apresentadas
de Lima e Seidl24, usuários avaliam que as ações pelas pessoas em situação de rua23,25,26,28,30,34,36,
oferecidas pela equipe melhoram sua condição de pode se apresentar como uma barreira à efetiva-
saúde, reduzem riscos e são fontes de carinho e ção do trabalho em rede, juntamente com a au-
cuidado. A preocupação e a dedicação da equipe sência de fluxos entre os serviços27 e de linhas de
são reconhecidas pelos usuários, que valorizam a cuidado para essa população36.
perseverança e o envolvimento dos profissionais Aspectos como o risco de imposição de sabe-
com o trabalho. res técnicos em detrimento à escuta qualificada
Nas experiências de trabalho citadas23-26,28,29,31,36 dos usuários e de execução de ações resolutivas
a construção do vínculo é descrita como essencial e assistenciais, advindos dos sentimentos de de-
para o desenvolvimento das ações. A participa- samparo e angústia provocados pelo contato com
ção do usuário nesse processo também é com- a vulnerabilidade à qual a população de rua se
preendida como importante por contribuir com encontra submetida29,36, compõem uma possível
práticas pautadas na ética, que levam em conta o fonte de sobrecarga aos profissionais e assinalam
desejo do sujeito, suas necessidades e prioridades. a necessidade de educação permanente14,15 iden-
tificada em alguns estudos26,28,29,34,36.
Os estudos evidenciam importantes contri-
Discussão buições das equipes de saúde aos cuidados da po-
pulação em situação de rua. A presença cotidiana
Por meio desta revisão integrativa, na qual 13 ar- de profissionais junto a essas pessoas favorece o
tigos e uma tese de doutorado foram analisados, reconhecimento de suas necessidades e a cons-
buscou-se identificar se as ações de saúde descri- trução de relações de confiança.
tas na literatura respondem às necessidades das A vinculação ao usuário, sua escuta e o seu
pessoas em situação de rua e se levam em conta as envolvimento no cuidado são fatores que contri-
prioridades e opiniões apontadas por elas. buem para a realização do trabalho. Observam-se
As equipes de Consultório na Rua e os CAPS esforços em responder às necessidades identifica-
são componentes da RAPS e os estudos mostram das e alinhar as ações às normativas que regem os
que esses serviços realizam parcialmente o que é serviços públicos de saúde, porém são muitos os
preconizado pelas diretrizes. Apesar dos obstácu- desafios encontrados nesse processo.
los descritos, investem na garantia de acesso e na Há a necessidade de se refletir sobre os impac-
construção de vínculo; inclusão social; humani- tos produzidos por este trabalho no cotidiano dos
zação; redução de danos e construção de PTS em profissionais e sobre maneiras de ampliar o acesso
rede14,15. e expandir ações de cuidado, de modo a implicar
Nove estudos descrevem a experiência de serviços, gestores e Políticas nesse processo.
equipes23-26,28,29,31,36 ou apresentam propostas de Um aspecto que chama a atenção nessa revisão
atuação de equipes32 que se mostram compro- é o reduzido número de estudos encontrados. Em
metidas com o trabalho desenvolvido e que pa- sua maioria, são estudos pequenos, que descrevem
recem ancorar as ações em conceitos como vín- experiências relevantes junto à população em situ-
culo, escuta, responsabilização, clínica ampliada, ação de rua. Os dados levantados confirmam que
cuidado integral, intersetorialidade, respeito aos as equipes de Consultório na Rua, componentes
direitos humanos e garantia de autonomia e li- da Atenção Básica da RAPS, ofertam ações pauta-
berdade15. A atenção básica se apresenta como das no acolhimento, escuta qualificada e atenção
articuladora da rede, conforme preconizado, e há às vulnerabilidades e necessidades da população
indícios de reflexões, trocas e cruzamento de sa- em situação de rua. Porém, é possível perceber
beres entre as profissões nos locais de trabalho14. que, até o momento, são poucas as publicações
Apesar dos investimentos positivos e articu- que estudam especificamente o cuidado a esse
lações com as diretrizes das RAPS, são encon- grupo oferecido pelos serviços de saúde mental
trados obstáculos nesse processo. Algumas equi- especializados, como os Centros de Atenção Psi-
pes23-26,27,28,30,34,36 relatam dificuldades em articular cossocial (CAPS), e pelos serviços de urgência e
o trabalho em rede de modo a responder a ur- emergência, também componentes da RAPS.
gências e realizar ações complexas, o que sugere Pelo fato deste estudo buscar conhecer ca-
insuficiência na integração dos pontos da rede de racterísticas das ações dirigidas à população em
cuidado e ausência de corresponsabilização14. situação de rua, de modo a identificar se elas são
3367
Colaboradores Referências
LB van Wijk realizou a revisão e redigiu o artigo. 1. Brasil. Governo Federal. Política Nacional para Inclu-
EF Mângia colaborou na concepção, redação e são Social da População em Situação de Rua. Brasília:
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à
revisão do artigo. Fome (MDS); 2008.
2. Aguiar MM, Iriart JAB. Significados e práticas de
saúde e doença entre a população em situação de rua
em Salvador, Bahia, Brasil. Cad Saude Publica 2012;
28(1):115-124.
3. Valencia E, Saez H, Kool J, Santos JFC, Cavalcanti MT,
Lovisi GM. Homelessness and mental health in New
York City: an overview 1994-2006. Cad Saúde Coletiva
2011; 19(1):20-26.
4. Barata RB, Carneiro Junior N, Ribeiro MCSA, Silveira
C. Desigualdade social em saúde na população em si-
tuação de rua na cidade de São Paulo. Saúde Soc 2015;
24(1):219-232.
5. Botti NCL, Castro CG, Silva AK, Silva MF, Oliveira LC,
Castro ACHOA, Fonseca LLK. Avaliação da ocorrência
de transtornos mentais comuns entre a população de
rua de Belo Horizonte. Barbarói 2010; (33):178-193.
6. Sarradon-Eck A, Farnarier C, Hymans TD. Caring on
the margins of the healthcare system. Anthropology &
Medicine 2014; 21(2):251-263.
3368
van Wijk LB, Mângia EF
7. Skosireva A, O’Campo P, Zerger S, Chambers C, Ga- 20. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Manual sobre o cui-
pka S, Stergiopoulos V. Different faces of discrimi- dado à saúde junto à população em situação de rua.
nation: perceived discrimination among homeless Brasília: MS; 2012.
adults with mental illness in healthcare settings. BMC 21. Soares CB, Hoga LAK, Peduzzi M, Sangaleti C, Yo-
Health Care Research 2014; 14:376. nekura T, Silva DRAD. Revisão integrativa: conceitos
8. Chrystal J, Glover D, Young AS, Whelan F, Austin EL, e métodos utilizados na enfermagem. Rev Esc Enferm
Johnson NK, Pollio DE, Holt CL, Stringfellow E, Gor- USP 2014; 48(2):335-345.
don AJ, Kim TA, Daigle SG, Stewart JL, Kertesz SG. 22. Botelho LLR, Cunha CCA, Macedo M. O método da
Experience of primary care among homeless indivi- revisão integrativa nos estudos organizacionais. Gest
duals with mental health conditions. PLOS ONE 2015; Soc 2011; 5(11):121-136.
10(2):e0117395. 23. Silva CC, Cruz MM, Vargas EP. Práticas de cuidado e
9. World Health Organization (WHO). Regional Office população em situação de rua: o caso do Consultório
for Europe’s Health Evidence Network (HEN). How na Rua. Saúde Debate 2015; 39(Esp.):245-256.
can health care systems effectively deal with the major 24. Lima HS, Seidl EMF. Consultório na Rua: atenção a
health care needs of homeless people? Geneva: WHO; pessoas em uso de substâncias psicoativas. Psicologia
2005. em estudo 2015; 20(1):57-69.
10. Meta Instituto de Pesquisa e Opinião, Secretaria de 25. Hallais JS, Barros NF. Consultório na Rua: visibili-
Avaliação e Gestão de Informação, Ministério do dades, invisibilidades e hipervisibilidade. Cad Saude
Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS). Publica 2015; 31(7):1497-1504.
Sumário executivo. Pesquisa nacional sobre a população 26. Souza VCA, Pereira AR, Gontijo DT. A experiência no
em situação de rua. Brasília: MDS; 2008. serviço de Consultório de Rua na perspectiva dos pro-
11. Natalino MAC. Estimativa da população em situação fissionais: contribuiçãoes para a atenção ao usuário de
de rua no Brasil. Brasília: Instituto de Pesquisa Econô- álcool e outras drogas. Cad Ter Ocup UFSCar 2014;
mica e Aplicada; 2016. 22(Especial):37-47.
12. Organização Mundial de Saúde (OMS). Relatório so- 27. Borysow IC, Furtado JP. Acesso, equidade e coesão
bre a Saúde no Mundo. Saúde Mental: Nova Concepção, social: avaliação de estratégias intersetoriais para a
Nova Esperança. Geneva: OMS; 2001. população em situação de rua. Rev Esc Enferm USP
13. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Conselho Nacio- 2014; 48(6):1069-1076.
nal de Saúde (CNS). Comissão Organizadora da IV 28. Silva FP, Frazão IS, Linhares FMP. Práticas de saúde
Conferência Nacional de Saúde Mental – Intersetorial. das equipes dos Consultórios de Rua. Cad Saude Pu-
Relatório final da IV Conferência Nacional de Saúde blica 2014; 30(4):805-814.
Mental Intersetorial. Brasília: CNS; 2011. 29. Londero MFP, Ceccim RB, Bilibio LFS. Consultório
14. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Portaria Nº 4.279, de/na rua: desafio para um cuidado em verso na saú-
de 30 de dezembro de 2010. Estabelece diretrizes para de. Interface (Botucatu) 2014; 18(49):251-260.
a organização da Rede de Atenção à Saúde no âmbito 30. Borysow IC, Furtado JP. Acesso e intersetorialidade: o
do Sistema Único de Saúde. Diário Oficial da União acompanhamento de pessoas em situação de rua com
2010; 31 dez. transtorno mental grave. Physis 2013; 23(1):33-50.
15. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Portaria Nº 3.088, 31. Macerata IM. Experiência POP RUA: implementação
de 23 de dezembro de 2011. Institui a Rede de Atenção do “Saúde em Movimento nas Ruas” do Rio de Janeiro,
Psicossocial para pessoas com sofrimento ou trans- um dispositivo clínico/político na Rede de Saúde do
torno mental e com necessidades decorrentes do uso Rio de Janeiro. Rev Polis e Psique 2013; 3(2):207-219.
de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema 32. Carneiro Júnior N, Jesus CH, Crevelim MA. A estraté-
Único de Saúde. Diário Oficial da União 2011; 26 dez. gia Saúde da Família para a equidade de acesso dirigi-
16. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Portaria n° 122, de da à população em situação de rua em grandes centros
25 de janeiro de 2012. Define as diretrizes e funcio- urbanos. Saúde Soc 2010; 19(3):709-716.
namento das equipes de consultório na rua. Brasília. 33. Canônico RP, Tanaka ACD, Mazza MMPR, Souza MF,
Diário Oficial da União 2012; 26 jan. Bernat MC, Junqueira LX. Atendimento à população
17. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Aten- de rua em um Centro de Saúde Escola na cidade de
ção à saúde. Departamento de Atenção Básica. De- São Paulo. Rev Esc Enferm USP 2007; 41(Esp):799-803.
partamento de Ações Programáticas Estratégicas. 34. Souza ES, Silva SRV, Caricari AM. Rede social e pro-
Coordenação de Área Técnica de Saúde Mental. Nota moção da saúde dos “descartáveis urbanos”. Rev Esc
Técnica Conjunta/2012. Brasília; 2012. Enferm USP 2007; 41(Esp):810-814.
18. Trino AT, Machado MPM, Rodrigues RB. Conceitos 35. Rosa AS, Secco MG, Brêtas ACP. O cuidado em situa-
norteadores do cuidado junto à população em situa- ção de rua: revendo o significado do processo saúde-
ção de rua. In: Teixeira M, Fonseca Z, organizadores. doença. Rev Bras Enferm 2006; 59(3):331-336.
Saberes e práticas na Atenção Primária à Saúde – cui- 36. Lisboa MS. Os loucos de rua e as redes de saúde mental:
dado à população em situação de rua e a usuários de ál- os desafios do cuidado no território e a armadilha da
cool, crack e outras drogas. São Paulo: Editora Hucitec; institucionalização [tese]. São Paulo: Pontifícia Uni-
2015, pg 27-44. versidade Católica de São Paulo; 2013.
19. Brasil. Portal da Saúde. Estratégias e Ações de Saúde vol-
tadas para População em Situação de Rua. [acessado 2016
Jun 14]. Disponível em: http://portalsaude.saude.gov.
br/index.php?option=com_content&view=article&i-
d=18974&Itemid=1005#estrategias/ Artigo apresentado em 08/02/2017
Aprovado em 13/02/2018
Versão final apresentada em 15/02/2018
CC BY Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons