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Sociologia 1°Ano

Cultura brasileira: da diversidade à


desigualdade
Apesar de ser um país com uma vasta constituição cultural, o Brasil
apresenta elementos que atestam a desigualdade social entre as
diversas culturas que o constituem.

A pobreza e a desigualdade social são evidentes nas periferias brasileiras.


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A cultura brasileira é diversificada, o que não exclui a


evidente desigualdade social, que é uma característica marcante de
nosso país e é atestada pela evidente hegemonia de uma classe social
nos processos de divisão social do trabalho e de divisão da renda, além
de fatores como o acesso à saúde, educação, saneamento e segurança.
Apesar de vasta e ampla, a cultura brasileira torna-se símbolo de
status para as elites, que selecionam arbitrariamente aquilo que deve
ou não ser consumido, relegando o que não foi selecionado para o
limbo da produção cultural. Ademais, a nossa rica cultura popular faz
contraste ao nosso povo, desprovido, muitas vezes, de insumos básicos
para a sobrevivência.

É comum escutarmos que o Brasil é um país miscigenado, de cultura


vasta e crenças religiosas sincréticas. De fato, a formação étnica do
povo brasileiro ocorreu, primeiramente, com a miscigenação entre
povos africanos, portugueses (que já tinham em sua linhagem traços
de miscigenação entre povos diversos do continente europeu) e
indígenas.

Ao longo do tempo decorrido, desde o início da república, o Brasil


recebeu imigrantes italianos, japoneses, alemães e de outros países
sul-americanos. Isso somente atesta que, tomando o significado de
cultura por uma concepção geral que envolve os hábitos, costumes, a
culinária, as crenças e o modo de vida geral de um povo, o Brasil é
realmente vasto.

Porém, essa concepção diversa da cultura brasileira pode resultar


em um olhar equivocado quanto à não existência de mazelas sociais,
como a desigualdade social, o elitismo cultural e o racismo.

Gilberto Freyre, em Casa-Grande e Senzala, aponta sua análise sobre a


sociedade colonial brasileira para um rumo, no mínimo, estranho: ele
fala de uma relação harmônica entre negros e brancos no Brasil
Colonial, o que parece ser um eufemismo que relativiza o que
realmente aconteceu – a dominação pura e simples de brancos contra
negros.

A miscigenação que Freyre utiliza como dado para atestar a sua teoria


nada mais foi que fruto de abusos sexuais e estupros de homens
brancos contra as suas escravas e contra as mulheres indígenas.
Quando se relativiza a dominação branca durante o período colonial,
tende-se a apoiar um racismo estrutural que perdura até hoje.

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O elitismo cultural (que, apesar de toda a vastidão cultural brasileira,
existe por aqui) também é fator estruturante para a manutenção das
desigualdades sociais que privilegiam etnias, classes sociais e regiões.

Durante muito tempo, a Antropologia formulou teorias que tentaram


justificar a existência de culturas superiores e inferiores, de acordo com
o desenvolvimento fenotípico dos povos que criaram essas culturas.
Uma dessas teorias é o darwinismo social, que passou a ser
questionado por Franz Boas, no fim do século XIX, e somente caiu de
vez a partir do estruturalismo de Claude Lévi-Strauss.

Veja também: Cultura material e cultura imaterial

Tópicos deste artigo


 1 - Formação e diversidade cultural da população brasileira

 2 - Preconceito cultural no Brasil

 3 - Diferença entre diversidade cultural e desigualdade social

Formação e diversidade cultural da população


brasileira
O território brasileiro era habitado, até 1500, pelos povos nativos,
chamados pelos europeus de índios. Porém, não havia apenas uma
tribo ou uma vertente cultural indígena nas terras que os povos Tupi
chamavam de Pindorama: eram quatro agrupamentos linguísticos
diferentes (Tupi-Guarani, Jê, Caribe e Aruaque). Esses grupos étnicos
eram divididos em milhares de tribos, essas divididas em aldeias. Cada
tribo possuía seus costumes.

Com a captura e escravização dos povos africanos, pudemos observar


uma vastidão cultural semelhante à dos povos indígenas, pois não
havia uma só tribo de onde os portugueses capturavam os africanos
ou uma só cultura africana. Os povos africanos eram vastos, divididos
em várias tribos e de várias origens étnicas diferentes, o que conferiu à
formação cultural afro-brasileira uma vastidão e amplitude tão diversa
quanto à indígena.

A vinda de povos brancos, de origem europeia, para o Brasil, tanto


portugueses (que por si só já tinham uma origem poliétnica) como a
vinda de italianos e alemães, contribuiu para a miscigenação de nosso
povo. No Brasil, surgiu uma cultura ímpar, fruto da forte
miscigenação, que resultou em produtos culturais populares sem igual
no mundo.

Há também em nossa terra e na formação de nosso povo


o sincretismo religioso devido à mistura de crenças, o que resultou,
por exemplo, no surgimento de uma religião genuinamente brasileira:
a umbanda, que mistura elementos do candomblé e do kardecismo.

Preconceito cultural no Brasil


Desde o início da colonização, um elitismo cultural reina no Brasil,
pois os portugueses viam a si mesmos como superiores e os povos
nativos como inferiores. O trecho transcrito a seguir atesta essa visão
etnocêntrica:

“A língua deste gentio toda pela costa é uma, carece de três letras, não se acha nela f, nem l, nem r, coisa
digna de espanto, porque assim não têm fé, nem lei, nem rei, e desta maneira vivem sem justiça e
desordenadamente”i.

Mais tarde, quando os africanos começaram a ser escravizados por


povos europeus, a escravidão assentava-se, igualmente, em
um etnocentrismo racista e em um elitismo cultural: os europeus,
brancos, julgavam-se superiores aos africanos por seus fenótipos e por
suas características culturais que, no julgamento dos próprios
europeus, eram superiores.

Os europeus tinham um sistema político governamental e com


formação estatal, dominavam a pólvora e a escrita, além de terem
moeda e iniciarem o capitalismo mercantilista. Os povos do sul
desenvolveram-se de maneira diferente. Com exceção de alguns povos
mesoamericanos, nativos da África e da América viviam em contato
com a natureza e não estabeleciam relações comerciais nem
centralização de poder.

O modo de vida dos nativos africanos e americanos era


autossuficiente, e a sua cultura tinha ganhado contornos diferentes da
cultura europeia. A justificação do domínio pela cultura é um forte
elemento do preconceito cultural no Brasil.

Hoje, podemos falar da existência de um elitismo que culmina na


discriminação daquelas pessoas marginalizadas (que estão à margem
da sociedade, devido à exclusão social) e em um racismo estrutural. O
racismo estrutural, muito forte no Brasil, é um tipo de racismo
velado e indireto. Ele pode ser manifestado por meio de dados
socioeconômicos, como os que apontam que os negros ganham, em
média, 1,2 mil reais a menos que os brancos, segundo levantamento
do IBGEii.

Esse tipo de racismo arrasta-se sorrateiramente desde a abolição da


escravidão, que deu a liberdade por direito aos negros escravizados,
mas não deu suporte educacional, econômico e de assistência básica
para que aquela população pudesse organizar a sua vida. Teorias que
apontam para uma democracia racial, como a de Gilberto Freyre,
somente reforçaram a ideia de que estava tudo bem, quando não
estava.

Por não possuir um regime de apartheid, como houve nos Estados


Unidos, o brasileiro médio (em especial a população branca) cresceu
acreditando que havia oportunidades iguais para negros, brancos e
indígenas, quando, na verdade, nunca houve, e quem sofre com isso
diariamente são os negros de classe baixa. Esses aspectos atestam que
existe uma direta relação entre desigualdade social e diversidade
cultural.

Leia também: Apropriação cultural — entenda o que significa e suas


consequências

Diferença entre diversidade cultural e


desigualdade social
Em termos de estrita interpretação, diversidade cultural e desigualdade
social são completamente diferentes. Desigualdade social faz
referência à diferença entre as classes sociais e aos rendimentos de
cada classe. Diversidade cultural faz referência
à vasta quantidade de culturas diferentes existentes em um nosso
território.

No Brasil, a associação entre os termos “desigualdade social” e


“diversidade cultural” é possível, pois apesar de nossa diversa formação
cultural, a exclusão social apresenta-se como um fator de exclusão que
se manifesta, majoritariamente, por meio da diferença entre as diversas
culturas que formam a população brasileira.
Notas

i GÂNDAVO, Pero de Magalhães. Tratado da Província do Brasil. Rio de Janeiro: INL/MEC,


1965, p. 182.

ii VELASCO, Clara. Negros ganham R$ 1,2 mil a menos que brancos em média no


Brasil;  trabalhadores relatam dificuldades e “racismo velado”. In: G1 Economia. Disponível
em: https://g1.globo.com/economia/noticia/negros-ganham-r-12-mil-a-menos-que-
brancos-em-media-no-brasil-trabalhadores-relatam-dificuldades-e-racismo-velado.ghtml.
Acesso em 25/04/2019.

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