Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
JUDICIÁRIA DE ANÁPOLIS-GO.
Em face de CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, pelos motivos de fato e razõ es de direito que
passa a expor.
Sucintamente, a parte autora busca o provimento jurisdicional para ver corrigida uma
grave injustiça que vem sendo imposta a todos os trabalhadores brasileiros que possuem
Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.
O FGTS, fruto originariamente da lei nº 5107/66 e atualmente regulamentado pela lei
8036/90, serve de modo primordial como uma “segurança” ao trabalhador demitido sem
justa causa; de modo secundá rio, pode complementar sua renda para aquisiçã o de seleta
lista de bens e serviços, como faz exemplo o financiamento para compra da casa pró pria.
A Caixa Econô mica Federal, por sua vez, ingressa na demanda em virtude de ser definido
por lei1 como “agente operador” do Fundo, sendo a responsá vel direta para responder
tanto ativa quanto passivamente em litígios que versem sobre FGTS, conforme já pacificado
entendimento jurisprudencial.
Estabelecido o apertado acervo de dados que compõ e o pano de fundo desta demanda,
passamos à aná lise do efetivo ponto controvertido. O requerimento por provimento
jurisdicional manejado nos presentes autos encontra sua razã o de ser basilar em virtude de
uma contradiçã o fá tica ocorrida supervenientemente à prolaçã o da Lei do FGTS, em 1990.
Isto porque, conforme pode-se vislumbrar através de rá pida leitura dos artigos 2º e 13 da
referida legislaçã o, ficou definido naquela época que os valores depositados na conta
vinculada dos trabalhadores seriam atualizados monetariamente pelos mesmos índices
aplicados à caderneta de poupança e angariariam adicionalmente juros de 0,25% ao mês:
Art. 2º O FGTS é constituído pelos saldos das contas vinculadas a que se refere esta lei e
outros recursos a ele incorporados, devendo ser aplicados com atualizaçã o monetá ria e
juros, de modo a assegurar a cobertura de suas obrigaçõ es.
Art. 13. Os depó sitos efetuados nas contas vinculadas serã o corrigidos monetariamente
com base nos parâ metros fixados para atualizaçã o dos saldos dos depó sitos de poupança e
capitalizaçã o juros de (três) por cento ao ano.
Como bem se sabe, a poupança era – e é – atualizada monetariamente pela Taxa Referencial
(TR), conforme menciona a Lei nº 8177/91:
Art. 12. Em cada período de rendimento, os depósitos de poupança serão remunerados:
I - como remuneração básica, por taxa correspondente à acumulação das TRD, no período
transcorrido entre o dia do último crédito de rendimento, inclusive, e o dia do crédito de
rendimento, exclusive;
(...)
A simbiose entre a atualizaçã o da poupança e dos saldos de FGTS é confirmada pelo artigo
17 da mesma lei nº 8.177/91, in verbis:
1 Artigo 4º da Lei nº 8036/90
Art. 17. A partir de fevereiro de 1991, os saldos das contas do Fundo de Garantia por Tempo
de Serviço (FGTS) passam a ser remunerados pela taxa aplicável à remuneração básica dos
depósitos de poupança com data de aniversário no dia 1º, observada a periodicidade mensal
para remuneração.
Parágrafo único. As taxas de juros previstas na legislação em vigor do FGTS são mantidas e
consideradas como adicionais à remuneração prevista neste artigo.
Inobstante, referido indexador é calculado pelo Banco Central do Brasil (e, diretamente,
pelo Conselho Monetá rio Nacional) a partir de requisitos e especificaçõ es constantes do
artigo 1º da mesma norma, como se vê a seguir:
Art. 1º O Banco Central do Brasil divulgará Taxa Referencial (TR), calculada a partir da
remuneração mensal média líquida de impostos, dos depósitos a prazo fixo captados nos
bancos comerciais, bancos de investimentos, bancos múltiplos com carteira comercial ou de
investimentos, caixas econômicas, ou dos títulos públicos federais, estaduais e municipais, de
acordo com metodologia a ser aprovada pelo Conselho Monetário Nacional, no prazo de
sessenta dias, e enviada ao conhecimento do Senado Federal.
(...)
§ 2º As instituições que venham a ser utilizadas como bancos de referência, dentre elas,
necessariamente, as dez maiores do País, classificadas pelo volume de depósitos a prazo fixo,
estão obrigadas a fornecer as informações de que trata este artigo, segundo normas
estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional, sujeitando-se a instituição e seus
administradores, no caso de infração às referidas normas, às penas estabelecidas no art. 44
da Lei nº 4.595, de 31 de dezembro de 1964.
§ 3º Enquanto não aprovada a metodologia de cálculo de que trata este artigo, o Banco
Central do Brasil fixará a TR.
Como mencionado alhures, o CMN, por ter o poder de fixar unilateralmente e a seu bel-
prazer os detalhes acerca da metodologia de cá lculo aludida no caput do dispositivo acima
transcrito, é o responsá vel direto por escolher o percentual real da TR. Hodiernamente em
vigência temos a Resoluçã o nº 3354/06.
Com tudo isso em mente, chegamos, finalmente, ao cerne da questã o: a Lei do FGTS,
quando previu a utilizaçã o da TR como indexador para a atualizaçã o monetá ria, encontrava
no cená rio nacional um índice que rivalizava com os demais, estando sempre pró ximo, em
percentuais, dos demais índices utilizados para correçã o de valores. No entanto, conforme
provas em anexo (notadamente o parecer do Departamento Intersindical de Estatística e
Estudos Socioeconô micos - DIEESE), torna- se visível que, a partir do ano de 1999, referido
índice nã o mais se prestava à finalidade que dele se esperava e, ao invés de corrigir
monetariamente os depó sitos, acabou causando a perda parcial dos mesmos perante a
inflaçã o acumulada em cada período.
Desta maneira, há uma contradiçã o fá tica merecedora de atençã o – e intervençã o – por
parte deste eminente juízo: a lei que incluiu a TR como índice de correçã o do FGTS assim o
fez em um período onde a Taxa Referencial claramente cumpria seu papel – e assim o fez
até 1998, atualizando os saldos de FGTS em patamar superior à inflaçã o, assim como todos
os outros índices semelhantes. Destarte, ao deixar de atualizar os depó sitos do FGTS de
maneira satisfató ria a partir de 1999, referido índice nã o mais cumpria a finalidade para a
qual a lei nº 8036/90 o escolheu.
É possível finalizar o resumo dos fatos deixando consignada apenas uma indagaçã o ao
Poder Judiciá rio: qual é o comando mais importante da Lei nº 8036/90, a necessidade de
corrigir monetariamente os saldos de FGTS ou a necessidade de utilizaçã o da TR?
Conforme restará demonstrado a seguir, o entendimento segundo o qual a previsã o de
atualizaçã o monetá ria é suficiente para permitir a substituiçã o do índice que, manipulado
artificialmente segundo interesses do BACEN / CMN, nã o representa sequer a garantia de
reposiçã o da inflaçã o, é o mais acertado.
Por essa razã o, vem à presença de Vossa Excelência requerer a substituiçã o da TR por
outro índice, idô neo, na correçã o do FGTS desde 1999.
Antes de adentrarmos as questõ es de mérito da demanda, imperioso se faz destacar, por
extremamente oportuno, que a presente açã o versa sobre a declaraçã o de um direito a ser
reconhecido ao postulante – qual seja, a de que os valores depositados em seu Fundo de
Garantia sejam revisados, recalculados conforme índices que mantenham o poder de
compra dos valores recolhidos no decorrer dos anos.
Conforme já destacado, a açã o se justifica, em apertada síntese, na medida em que o FGTS
dos trabalhadores brasileiros vem sendo atualizado pelo índice “TR”, o qual nã o reflete
minimamente a realidade financeira nacional e culmina, sem dú vidas, na defasagem dos
recolhimentos em comparaçã o a qualquer outro índice (como, por exemplo, o INPC).
O que está em jogo, Excelência, é o reconhecimento ou nã o do direito que a parte autora
sustenta possuir, no sentido de lhe ser deferido ou indeferido o pleito pela substituiçã o da
TR por outro índice que, desde 1999, reflita equitativamente as variaçõ es (a maior) da
moeda nacional no decorrer de todo esse período. Conforme restará demonstrado a seguir,
as diferenças de um montante remunerado pela TR e de outro (de igual valor) remunerado
pelo INPC poderá superar os 80% nos ú ltimos 14/15 anos.
E, por ó bvio, a discussã o acerca do direito independe da juntada dos extratos para
apuraçã o do valor a ser corrigido em caso de provimento da açã o: sendo o quantum
apurado em R$ 100,00 ou R$ 20.000,00, o direito pleiteado é o mesmo em qualquer caso.
Por este motivo, nã o se faz necessá rio perder tempo, neste momento processual, com a
discussã o e impugnaçã o de cá lculos realizados unilateralmente pelo autor: até mesmo por
celeridade processual, é imperativo a concentraçã o dos atos judiciais no sentido de
declarar a possibilidade ou impossibilidade do direito pleiteado, de maneira que, apenas
posteriormente – já em sede de liquidaçã o de sentença – poderíamos analisar o valor
efetivo da condenaçã o.
Sobre a possibilidade de restringir a discussã o à questã o de direito com a posterior juntada
de extratos em sede de cumprimento do julgado, tem decidido pacificamente toda a
jurisprudência pá tria, in verbis:
APELAÇÃO CÍVEL - EXPURGOS DA INFLAÇÃO - PRELIMINARES E PREJUDICIAL DE MÉRITO
ARGUIDAS EM CONTRARRAZÕES AFASTADAS - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA
TITULARIDADE DA CONTA-POUPANÇA À ÉPOCA DA IMPLANTAÇÃO DOS PLANOS
ECONÔMICOS DE GOVERNO - POSSIBILIDADE DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA -
EXISTÊNCIA DA POUPANÇA COMPROVADA - JUNTADA DE EXTRATOS EM LIQUIDAÇÃO -
RECURSO PROVIDO. (TJ-MS - AC: 403 MS 2010.000403-0, Relator: Des. Júlio Roberto Siqueira
Cardoso, Data de Julgamento: 29/04/2010, 5ª Turma Cível, Data de Publicação: 07/05/2010)
Por tais razõ es e em tendo transcorrido apenas 14 anos desde o período inicialmente
requerido (1999), requer seja afastado qualquer argumento de prescriçã o do direito de
açã o.
Por meio da Lei nº 4.380, de 21 de agosto de 1964, foi instituída a correçã o monetá ria para
os depó sitos de Poupança – os quais já eram remunerados a 6% ao ano por juros (por força
do Decreto Imperial nº 2.723, de 12 de janeiro de 1861). Sendo assim, evidente resta que se
tratam de dois institutos completamente diferentes, de modo que um investimento
remunerado a juros nã o está , necessariamente, sendo atualizado monetariamente: este
ú ltimo depende de um índice pró prio.
Nesse diapasã o, enquanto os juros sã o conceituados como a remuneraçã o do capital
(dinheiro) emprestado durante um determinado período, a correçã o monetá ria se presta à
recuperaçã o do poder de compra do valor emprestado, podendo ser conceituada como um
ajuste período de valores tendo por base o valor da inflaçã o de um período, objetivando
compensar a perda de valor da moeda no mercado.
Como é cediço, durante a histó ria recente e também na atualidade, muitos sã o os índices
que se propõ e a efetuar a correçã o monetá ria de valores, cada qual com sua pró pria
sistemá tica. No entanto, a Taxa Referencial, por ser diretamente fixada pelo Conselho
Monetá rio Nacional, parece ser o ú nico indexador que, desde 1999, sequer cobre as perdas
com a inflaçã o. Por esta razã o, o STF, no julgamento da ADI nº 493-0/DF, definiu que a TR
nã o pode ser considerada um índice de correçã o monetá ria:
A Taxa Referencial (TR) nã o é índice de correçã o monetá ria, pois, refletindo as variaçõ es do
custo primá rio da captaçã o dos depó sitos a prazo fixo, nã o constitui índice que reflita a
variaçã o do poder aquisitivo da moeda.
Nesta Açã o Declarató ria de Inconstitucionalidade, restou definido que a Taxa Referencial
possui características predominantes de taxa de juros e nã o de indexador de correçã o
monetá ria. Por isso, foi efetivamente declarado inconstitucional o artigo 18 da Lei nº
8.177/91, cujo texto original estabelecia que os saldos devedores e as prestaçõ es dos
contratos integrantes do Sistema Financeiro Habitacional passariam a ser corrigidos pela
TR. Veja-se:
Ação direta de inconstitucionalidade.- (...) A taxa referencial (TR) não é índice de correção
monetária, pois, refletindo as variações do custo primário da captação dos depósitos a prazo
fixo, não constitui índice que reflita a variação do poder aquisitivo da moeda. Por isso, não há
necessidade de se examinar a questão de saber se as normas que alteram índice de correção
monetária se aplicam imediatamente, alcançando, pois, as prestações futuras de contratos
celebrados no passado, sem violarem o disposto no artigo 5, XXXVI, da Carta Magna.-
Também ofendem o ato jurídico perfeito os dispositivos impugnados que alteram o critério de
reajuste das prestações nos contratos já celebrados pelo sistema do Plano de Equivalência
Salarial por Categoria Profissional (PES /CP). Ação direta de inconstitucionalidade julgada
procedente, para declarar a inconstitucionalidade dos artigos 18, "caput" e parágrafos 1 e 4;
20; 21 e parágrafo único; 23 e parágrafos; e 24 e parágrafos, todos da Lei n. 8.177, de 1 de
maio de 1991. (ADI 493, Relator (a): Min. Moreira Alves, Tribunal Pleno, julgado em
25/06/1992, DJ 04-09- 1992 PP-14089 EMENT VOL-01674-02 PP-00260 RTJ VOL-00143- 03
PP-00724)
Além do ó rgã o má ximo, também o pró prio Superior Tribunal de Justiça já exteriorizou em
reiteradas oportunidades entendimento segundo o qual a utilizaçã o da Taxa Referencial
deveria ser rechaçada, servindo como exemplo o seguinte julgado:
SFH. PLANO DE EQUIVALÊNCIA SALARIAL. REAJUSTE DAS PRESTAÇÕES. ILEGITIMIDADE
PASSIVA DA UNIÃO. NULIDADE DO ACÓRDÃO. INOCORRÊNCIA. VANTAGENS PESSOAIS.
INCLUSÃO. CORREÇÃO PELA TR. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
(...)
4. Inaplicável a TR como fator de correção monetária Entendimento consagrado nesta Corte
na esteira de orientação traçada pelo STF.
5. Recurso especial conhecido e parcialmente provido.
(REsp 209.466/BA, Rel. Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado
em 07/08/2001, DJ 17/06/2002, p. 231)
Muito embora estes julgamentos já nã o mais reflitam a posiçã o majoritá ria dos tribunais
superiores, é preciso deixar claro que o Direito, no seu viés extremamente dinâ mico,
sempre carece de reaná lises quanto à s premissas já fixadas – refletindo a presente lide um
apelo nesse sentido. A razã o pela qual movemos a açã o pode ser visualizada rapidamente
no quadro comparativo abaixo, donde constam os índices de correçã o adotados
anualmente por diferentes indexadores:
ANO
TR
INPC
IPCA
1991
335,51%
475,11%
472,69%
1992
1.156,22%
1.149,05%
1.119,09%
1993
2.474,73%
2.489,11%
2,477,15%
1994
951,19%
929,32%
916,43%
1995
31,6207%
21,98%
22,41%
1996
9,5551%
9,125%
9,56%
1997
9,7849%
4,34%
5,22%
1998
7,7938%
2,49%
1,65%
1999
5,7295%
8,43%
8,94%
2000
2,0962%
5,27%
5,97%
2001
2,2852%
9,44%
7,67%
2002
2,8023%
14,74%
12,53%
2003
4,6485%
10,38%
9,30%
2004
1,8184%
6,13%
7,60%
2005
2,8335%
5,05%
5,69%
2006
2,0377%
2,81%
3,14%
2007
1,4452%
5,15%
4,46%
2008
1,6348%
6,48%
5,90%
2009
0,7090%
4,11%
4,31%
2010
0,6887%
6,46%
5,91%
2011
1,2079%
6,07%
6,50%
2012
0,2897%
6,17%
5,84%
2013 (até setembro)
0,12%
3,61%
3,79%
Até 1998, na prá tica, a Taxa Referencial mostrava resultados semelhantes aos dos outros
indexadores (pouco menos em alguns anos, compensando em outros com índices
superiores), nã o acarretando prejuízo aos trabalhadores com contas de FGTS. No entanto,
desde 1999, o que se vê é que o comando de garantir a correçã o monetá ria nã o é observado
pelo Banco Central, que manipula a TR de modo a deixá -la propositalmente abaixo da
inflaçã o – já que, deste modo, ocorre captaçã o de dinheiro “mais barato”, à custa do
trabalhador.
Veja-se, conforme tabela abaixo, que a TR nã o alcança a inflaçã o desde 1999, restando
evidente que referida taxa, de fato, nã o mais funciona como indexador de qualquer
atualizaçã o monetá ria idô nea:
ANO INFLAÇÃ O TR
1999 8,94 5,7295%
2000 5,97 2,0962%
2001 7,67 2,2852%
2002 12,53 2,8023%
2003 9,30 4,6485%
2004 7,60 1,8184%
2005 5,69 2,8335%
2006 3,14 2,0377%
2007 4,46 1,4452%
2008 5,90 1,6348%
2009 4,31 0,7090%
2010 5,91 0,6887%
2011 6,50 1,2079%
2012 5,84 0,2897%
Apesar de nã o termos as mediçõ es oficiais finais de 2013, sabemos que a Taxa Referencial
alcançará , historicamente, a maior distâ ncia (discrepâ ncia) em relaçã o à inflaçã o do
período.
Sendo assim, se mostra supervenientemente inconstitucional o artigo que determina a
utilizaçã o da TR como fator de correçã o monetá ria, já que confere à Taxa Referencial um
dever para o qual a mesma nã o se presta desde 1999, sendo mais importante a previsã o de
correçã o do que a previsã o de utilizaçã o da TR– decorrendo daí a necessidade do Poder
Judiciá rio determinar sua modificaçã o no caso em concreto.
Como se nã o bastasse o requerimento ser manejado com base em evidente prova
documental apta a respaldar o pedido por um viés eminentemente positivista, pugnamos,
igualmente, por questã o de justiça com a classe trabalhadora do país: como é cediço, nã o é
dado ao empregado o poder de gerir, investir ou dispor de seu Fundo de Garantia, de modo
que o dinheiro depositado na conta vinculada obrigatoriamente ficará preso mesmo que
existam investimentos muito melhores a serem realizados. Até mesmo a transferência do
dinheiro da conta do FGTS para uma conta poupança (investimento mais seguro e menos
rentá vel do mercado financeiro) traria enormes vantagens ao trabalhador.
Porém, o que ocorre é que o governo capta os recursos do FGTS sem correçã o monetá ria
(ou com uma correçã o “ridícula” pela TR) e os empresta – muitas vezes aos pró prios
trabalhadores – a juros elevados. Trata-se claramente de hipó tese de locupletamento ilícito
institucionalizado.
E é exatamente para corrigir essa injustiça que, se valendo principalmente dos comandos
legais principioló gicos, deverá este eminente juízo determinar que a correçã o monetá ria
assegurada ao trabalhador com conta vinculada de FGTS, junto à requerida, merece
observâ ncia sobre a previsã o de utilizaçã o da extremamente defasada Taxa Referencial, o
que acarretará na sua modificaçã o pelo INPC4, IPCA5 ou outro índice que, na visã o do
Judiciá rio, reflita idoneamente a atualizaçã o do poder econô mico dos depó sitos realizados
desde 1999.
A Taxa Referencial, enquanto índice de correçã o monetá ria assim considerada pela atual
jurisprudência pá tria, nã o pode ser reduzida a zero, como tem sido nos ú ltimos meses, pois
afronta flagrantemente o artigo 2º da Lei nº 8.036/90, que garante atualizaçã o monetá ria
aos depó sitos feitos no FGTS.
Como índice de correçã o monetá ria, a TR deveria garantir o poder aquisitivo dos depó sitos
do FGTS, que se perfaz levando em conta os índices de inflaçã o. Desde janeiro de 1999, a TR
se distanciou sensivelmente dos índices oficiais de inflaçã o, impingindo profundas perdas
aos depó sitos do FGTS, tornando-se inidô nea para garantir a reposiçã o de perdas
monetá rias.
A inidoneidade da TR como índice de correçã o monetá ria decorre de mudanças
introduzidas na sua metodologia de cá lculo pelo Banco Central do Brasil/CMN que, através
do mecanismo econô mico de um redutor, vem nitidamente manipulando o índice para que
ele se desprenda da inflaçã o até anulá -la completamente, a despeito de um quadro de
inflaçã o persistente no País.
A Caixa Econô mica Federal está se prestando ao papel de espoliador do FGTS, na medida
em que dispõ e do patrimô nio do trabalhador sem a devida contraprestaçã o. A correçã o
monetá ria aplicada ao FGTS tem sido há muito tempo menor que a inflaçã o registrada, de
forma que descumpre nã o só o artigo 2º da lei nº 3 LICC, artigo 5º:
Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem
comum. O qual se indica por já ser o índice responsável pela atualização do salário mínimo,
com arrimo na Lei nº 12.382/2011, em seu artigo 2º, § 1º. O qual se indica por ser o indexador
utilizado nas medições de metas inflacionárias pelo governo. 8.036/90, artigo 233 do Código
Civil, mas também toda a lógica e princípios do mercado econômico.
Quem empresta tem direito a ser remunerado com juros e a totalidade da correçã o
monetá ria. O trabalhador nã o pode ser obrigado a subsidiar ainda mais os projetos do
Governo Federal. O “ainda mais” decorre do fato de os juros de 3% do FGTS serem os
menores do mercado, o quê, por si só , demonstra que ele já está fazendo sua parte sob a
perspectiva social.
Negar o direito de correçã o monetá ria aos depó sitos do FGTS, Fundo do qual o trabalhador
nã o pode simplesmente sacar seu dinheiro para aplicar em outro fundo mais rentá vel,
configura ato de tirania, incompatível com um Estado Democrá tico de Direito e deve ser de
pronto rechaçado.
Se o Governo Brasileiro remunerasse os investidores internacionais com TR mais 3% a.a,
como faz com os trabalhadores, haveria uma fuga em massa dos investimentos no País.
Nem mesmo os investidores nacionais manteriam seu capital no país.
Sendo a TR índice inidô neo para restabelecer o poder aquisitivo dos depó sitos do FGTS, sua
substituiçã o por outro índice que melhor recomponha as perdas monetá rias se torna
imperioso, a fim de fazer prevalecer o artigo 2º da lei nº 8.036/90 e artigo 233 do Có digo
Civil.
Posto que desde janeiro de 1999 o redutor criado artificialmente pelo Banco Central/CMN
promoveu o completo distanciamento da TR dos índices oficiais de inflaçã o, temos que
desde entã o ela perdeu sua condiçã o de repor as perdas inflacioná rias dos depó sitos do
FGTS, devendo desde esta data ser substituída pelo INPC, alternativamente, pelo IPCA.
Como já exposto anteriormente, a Taxa Referencial nã o constitui – pelo menos a partir de
1999 – índice apto a corrigir monetariamente qualquer montante. Nesse sentido, manter a
aplicaçã o da TR é o mesmo que julgar que o demandante nã o possui direito à correçã o
monetá ria.
Comunga deste entendimento o Supremo Tribunal Federal que, em recente julgado, dispô s
o seguinte:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. ÍNDICE OFICIAL DE REMUNERAÇÃO
BÁSICA DA CADERNETA DE POUPANÇA”: INCONSTITUCIONALIDADE DA EXPRESSÃO.
ACÓRDÃO RECORRIDO DISSONANTE DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL. ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA: OFENSA CONSTITUCIONAL
INDIRETA.RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Relatório. Recurso extraordinário interposto
com base na alínea a do inc. III do art. 102 da Constituição da Republica contra julgado do
Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que decidiu:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. EXECUÇÃO. PRECATÓRIO/RPV COMPLR. EC
N. 62/2009. ART. 100, § 12, DA CF. CONSTITUCIONALIDADE. INCIDÊNCIA IMEDIATA.O § 12
do artigo 100 da Constituição Federal, introduzido pela EC n. 62, de 09/11/2009 (publicada
em 10/12/2009), tem aplicação imediata aos feitos de natureza previdenciária, sendo
constitucional. 2. Entendimento firmado no sentido de que a TR mostra-se válida como índice
de correção monetária. 3. Nada impede o legislador constitucional ou infraconstitucional de
dispor sobre correção monetária e taxa de juros e, em se tratando de relação de direito
público, não há óbice a incidência imediata da lei, desde que respeitado período anterior à
vigência da nova norma (vedação à retroatividade), pois não existe direito adquirido a
regime jurídico” (fl. 68). 2. O Agravante alega que o Tribunal a quo teria contrariado os arts.
1º, inc. III, 5º, caput e incs. XXII, XXXVI, e 37, caput, da Constituição da Republica. Argumenta
que: “A EC n. 62/2009, em seu art. 1º, § 12, instituiu que ‘”A partir da promulgação desta
Emenda Constitucional, a atualização de valores de requisitórios, após sua expedição, até o
efetivo pagamento, independentemente de sua natureza, será feita pelo índice oficial de
remuneração básica da caderneta de poupança, e, para fins de compensação da mora,
incidirão juros simples no mesmo percentual de juros indecentes sobre a caderneta de
poupança, ficando excluída a incidência de juros compensatórios”. Como se sabe, o índice de
remuneração básico da poupança é a Taxa Referencial (TR), índice controlado pelo Estado, e
utilizado como instrumento de controle da economia, vide os sucessivos índices mensais
zerados, a fim de controle de aporte de capital nas poupanças. Tanto a TR não se presta como
índice de correção monetária, que o STF já decidiu nesse sentido: A taxa referencial (TR) não
é índice de correção monetária (...) não constitui índice que reflita a variação do poder
aquisitivo da moeda’ (ADI 493-0/DF, Relator Min. Moreira Alves, Plenário, DJ 4.9.1992). (...)
Assim sendo, texto tão danoso ao cidadão não poderá ser tolerado pelo Judiciário, merecendo
a declaração de inconstitucionalidade do § 12 do artigo 100 da Constituição Federal,
adicionado pela EC n. 62/2009. (...) Assim, declarada a inconstitucionalidade do índice
aplicado ao precatório pago nos autos, deve ser tomado como vigente e aplicado ao caso
concreto o índice IPCA-E” (fls. 72-73).
(...)
5. Pelo exposto, dou parcial provimento a este recurso extraordinário (art. 557, § 1º-A, do
Código de Processo Civil e art. 21, § 2º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal)
para reafirmar a inconstitucionalidade da expressão “índice oficial de remuneração básica da
caderneta de poupança”, constante do § 12 do art. 100 da Constituição da Republica e
determinar que o Tribunal de origem julgue como de direito quanto à aplicação de outro
índice que não a taxa referencial (TR). Publique-se. Brasília, 13 de junho de 2013.Ministra
CÁRMEN LÚCIA Relatora (STF - RE: 747706 SC, Relator: Min. CÁRMEN LÚCIA, Data de
Julgamento: 13/06/2013, Data de Publicação: DJe-124 DIVULG 27/06/2013 PUBLIC
28/06/2013)
Nesse ponto, o STF apenas reconhece aquilo que é ó bvio a qualquer indivíduo de boa-fé: os
trabalhadores sã o lesados mensalmente através da aplicaçã o de um índice que, ao
contrá rio do momento de sua fixaçã o (1991), nã o mais representa qualquer sombra de
correçã o monetá ria idô nea. Impossível presumir, portanto, que era do espírito da lei que os
trabalhadores obtivessem atualizaçã o irrisó ria de seus depó sitos de FGTS, motivo pelo
qual, mais uma vez, reiteramos os pleitos iniciais.
Finalmente, insta ressaltarmos, apesar de se tratar de informaçã o vastamente difundida e
que provavelmente já adentra na seara de “fato notó rio” ou de “conhecimento geral”, que
estamos diante de um “boom” de açõ es idênticas à presente Brasil afora. Por isso mesmo, é
importante que o Poder Judiciá rio, visando sempre garantir a segurança jurídica, faça o
possível para tutelar os direitos dos demandantes de maneira semelhante, evitando a
inserçã o de um cará ter de “sorte” ou “azar” no deferimento ou indeferimento dos pedidos
formulados pelo litigante.
Por isso, e visando até mesmo auxiliar no convencimento pessoal do eminente julgador,
imperioso se torna trazer ao vosso conhecimento o entendimento já exteriorizado por
magistrados que prolataram sentença de procedência dos pedidos de revisã o do FGTS
através da modificaçã o do índice de correçã o monetá ria – como é o caso do pedido
manejado na presente lide.
Para tanto, citamos a sentença dos autos eletrô nicos nº 5009533- 35.2013.404.7002/PR, a
qual trazemos na íntegra em anexo. Nela, o Juiz Federal Diego Viegas Véras, de Foz do
Iguaçú , decide pela procedência dos pedidos com base nos seguintes fundamentos,
sintetizados e destacados neste momento para facilitar e agilizar o entendimento:
(...) A Lei, portanto, dispõe que o fundo deverá ser corrigido monetariamente e a correção
monetária não representa qualquer acréscimo, mas simples recomposição do valor da moeda
corroído pelo processo inflacionário (STJ, REsp nº 1.191.868, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana
Calmon, j. 15/06/2010 e p. 22/06/2010). A Taxa Referencial (TR) como bem trazido pela
parte autora, foi índice capaz de refletir a inflação ocorrida na economia brasileira por
significativo período de tempo, durante o qual não havia quaisquer razões para se opor a sua
aplicação. Não é, contudo, a realidade desde janeiro de 1999, a partir de quando o índice
deixou de espelhar a desvalorização da moeda.
(...)
...foi com o julgamento das ADI 4425 e 4357, onde o Supremo Tribunal Federal analisou a
inconstitucionalidade da Emenda Constitucional nº 62/2009, que ficou inconteste o
entendimento daquela Corte no sentido de que a TR não pode ser utilizada como índice de
atualização monetária, eis que não é capaz de espelhar o processo inflacionário brasileiro.
(...)
Veja-se: com a TR ostentando seus índices praticamente zerados desde o ano de 2009, os
saldos das contas do FGTS acabaram sendo remunerados tão somente pelos juros anuais de
3% previstos na Lei 8.036/90. Ou seja, os juros que deveriam, supostamente, remunerar o
capital, não são sequer suficientes para repor o poder de compra perdido pela inflação
acumulada.
(...)
Tem-se, em resumo, que a Lei nº 8.036/90, lei específica do FGTS, determina que ao saldo de
suas contas deve ser obrigatoriamente aplicado índice de correção monetária. Não sendo a
Taxa Referencial (TR), índice disposto pela Lei 8.177/91, hábil a atualizar monetariamente
tais saldos, e estando tal índice em lei não específica do FGTS, entende-se que como
inconstitucional a utilização da TR para tal fim, subsistindo a necessidade de aplicar-se índice
de correção monetária que reflita a inflação do período, tal como prevê a Lei nº 8.036/90.
(...)
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos, condenando a CEF a pagar à parte autora
os valores correspondentes à diferença de FGTS em razão da aplicação da correção
monetária pelo IPCA-E desde janeiro de 1999 em diante até seu efetivo saque, cujo valor
deverá ser apurado em sede de cumprimento de sentença. Caso não tenha havido saque, tal
diferença deverá ser depositada diretamente na conta vinculada do autor.
Diante do exposto, tendo em vista o que já decidido pelo E. STF no caso da lei 11.960/09 e o
fato de o FGTS ser um pecú lio constitucional obrigató rio, nã o portá vel e de longo prazo,
cuja garantia de recomposiçã o das perdas inflacioná rias está implícita na disposiçã o do art.
7º, III, da CR/88, que assegura esse direito trabalhista fundamental a todos os
trabalhadores, é de se declarar inconstitucional, pelo menos desde a superveniência dos
efeitos da Resoluçã o CMN 2.604, de 23/04/1999, a vinculaçã o da correçã o monetá ria do
FGTS à TR, conforme art. 13 da lei 8.036/90 c/c arts. 1º e 17 da lei 8.177/91.
Diante do acima exposto, pugnamos que também este respeitoso juízo dê provimento aos
pleitos formulados pela parte autora, na forma seguinte.
PEDIDOS
Antes o exposto, a parte autora pleiteia a Vossa Excelência que, cumulativamente:
1) Em aná lise de mérito, determine à Caixa Econô mica Federal que:
1.1) Venha a pagar à parte autora o montante correspondente ao valor corrigido pelo
índice de correçã o monetá ria deferido (INPC/IPCA/outro definido pelo Douto Juízo) nos
meses em que a TR foi zero, nas parcelas vencidas e vincendas;
1.2) Pagar à parte autora o montante correspondente ao valor corrigido pelo índice de
correçã o monetá ria deferido (INPC/IPCA/outro definido pelo Douto Juízo), desde Janeiro
de 1999, nos meses em que a TR nã o foi zero, mas foi menor que a inflaçã o do período ou,
alternativamente, pagar a favor da parte autora o montante correspondente à s diferenças
de FGTS em razã o da aplicaçã o do índice de correçã o definido, correspondentes à s perdas
inflacioná rias do trabalhador nas contas do FGTS, no entender deste Juízo, desde Janeiro de
1999, inclusive nos meses em que a TR foi zero.
2) A declaraçã o de inconstitucionalidade da parte do artigo 13 da Lei nº 8036/90, a qual
determina a utilizaçã o da Taxa Referencial como indexador de correçã o monetá ria para os
depó sitos realizados na conta vinculada ao FGTS.
3) Que se ordene a citaçã o da requerida, para querendo contestar a presente açã o, sob pena
de revelia e efeitos da confissã o;
4) A concessã o de correçã o monetá ria e juros legais sobre os valores devidos pela
condenaçã o de que tratam os itens acima;
5) A condenaçã o da Ré ao pagamento das custas e honorá rios advocatícios na ordem de
20% sobre o valor da condenaçã o;
6) A concessã o dos benefícios da justiça gratuita à parte autora, uma vez que pobre no
sentido jurídico do termo, conforme declaraçã o de hipossuficiência anexa.
Protesta provar o alegado por todos os meios de prova admitidos em direito,
principalmente prova documental – pugnando desde já pela juntada dos extratos do Fundo
de Garantia apenas em sede de liquidaçã o de sentença, conforme exposto preliminarmente.
Adicionalmente, pede a declaraçã o expressa de prequestionamento de todos os
dispositivos direta e indiretamente mencionados nesta exordial, de maneira a possibilitar o
protocolo de posteriores recursos.
Atribui-se à causa o valor de R$ 10.000.00 (dez mil reais).
Á guas Lindas de Goiá s-GO,