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Como a elasticidade afeta o mercado de café

Luiz Moricochi

Em reuniões técnicas ouve-se com certa freqüência a expressão “o café é bebida de


demanda inelástica”. Como essa característica do café afeta seu mercado?
Não vamos teorizar sobre esse assunto, pois foge ao escopo deste artigo. Apenas
gostaria de dizer que em economia quando se fala em elasticidade preço de demanda está
se referindo à divisão de duas variações percentuais: variação percentual de quantidade
compradas de um produto, pela variação correspondente nos preços. Conforme o número
obtido nessa divisão – que recebe o nome de coeficiente de elasticidade preço de
demanda - se diz que um produto é de demanda elástica ou inelástica. Para o café o
coeficiente encontrado pela FGV em recente estudo foi de 0,67.
Mas do ponto de vista prático (é o que nos interessa), quando se tem uma cesta de
produtos e os mesmo são submetidos á mesma variação de preços (10%, por exemplo),
podemos dizer: aqueles produtos que responderem com uma menor variação no consumo
são de demanda inelástica (ou menos elástica); aqueles que, nas mesmas condições
apresentarem maior variação no consumo são de demanda elástica.
O preço que o consumidor está disposto a pagar por um bem ou produto depende
de uma série de fatores, entre as quais:
a) quantidade de dinheiro disponível;
b) sua importância para atendimento de necessidades;
c) existência ou não de produtos substitutos;
c) sua representatividade no orçamento familiar em termos de gastos e
d) quantidade disponível do produto no mercado.
Pode-se deduzir pois que a importância que os produtos têm para o consumidor é
relativa, ou seja, varia de pessoa para pessoa. O cigarro, por exemplo, é “importante”para
algumas pessoas, apesar de extremamente prejudicial à saúde.
O café se enquadra também no grupo de produtos de demanda inelástica. O
coeficiente de 0,67 encontrado, significa que quando ha aumento de 1% no seu preço
a quantidade consumida cai em proporção menor (a esse aumento), ou seja, apenas 0,67
%. Isto acontece, porque o consumidor faz de tudo para continuar satisfazendo seu habito
de tomar café. Também o cigarro é produto típico de demanda inelástica; é sabendo
disso que o governo taxa o produto o quanto pode, com a certeza de não quebrar a
indústria.
No caso do café, esse “vício” ( no bom sentido), tem também seu lado negativo,
ou seja, mesmo sendo habituado a bebida, o consumidor não vai beber mais , (diferente
da carne bovina, cujo consumo aumenta com a queda de preço) só porque o preço caiu
muito, como resultado de um eventual excesso de produção . Esse atributo tem muito a
ver com a estabilidade de renda do produtor, podendo-se se afirmar que quando há
excesso de café, o preço cai mais do que deveria cair e quando há escassez o preço sobe
mais do que deveria subir. O produtor devia gravar isso em sua mente como se fosse uma
lei da cafeicultura, para não cair em armadilhas de preços. Isso pode acontecer também
com outros produtos, mas, é mais problemático quando se trata de produto de demanda
inelástica como o café. Muitos ainda se lembram do que aconteceu no início de 1986:
devido a uma grande seca ocorrida no final do ano de 85, os preços atingiram US$
400/saca, causando grande euforia na época (com apenas uma saca de café comprava-se
um hectare de terra em algumas regiões cafeeiras). Esse alto preço, por outro lado,
provocou excesso de produção, derrubando os preços para US$ 40 em 1992. Foi uma
quebradeira geral resultando em mais um milhão de hectares erradicados. Esse preços
exagerados (dois extremos) ocorreram por culpa principalmente da demanda inelástica (
também houve especulação)
Para terminar, qual a implicação desse atributo neste contexto de crise mundial?
Com o desemprego e queda geral de renda, tudo se passa como se ocorresse na prática
um aumento de preços de café. Entretanto como o consumo pesa pouco no orçamento
familiar, dificilmente o consumidor vai abrir mão de seu habito de tomar café. Essa é
a principal razão pela qual alguns analistas (entre os quais nos incluímos) já acreditavam
que o efeito da crise seria menor quando comparado com o impacto sobre o mercado
de outras commodities É claro que há segmentos afetados, como o de cafés especiais -
em que se paga mais de R$12,00/ tacinha, em redes famosas de varejo no país – mas esse
segmento não representa nem 10% do consumo mundial de 130 milhões de sacas anuais.
Poderá também ocorrer menor consumo de café solúvel na Rússia, Alemanha, USA e
outros países mais atingidos pela crise. Mas o consumo global deverá seguir com
tendência crescente, embora à taxas inferiores a que vinha se observando antes crise.
Luiz Moricochi, eng. agr. pós graduado em economia (USP) e associado da Cocapec.

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