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DE SAÚDE
POLÍTICAS PÚBLICAS
DE SAÚDE
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REVISÃO DIAGRAMAÇÃO
Janaina Vieira UVA
Lydianna Lima
SUMÁRIO
Apresentação 6
Autor 7
UNIDADE 1
UNIDADE 2
A era Vargas 28
• Período militar
UNIDADE 3
UNIDADE 4
• Reforma Sanitária
• SUS
APRESENTAÇÃO
6
AUTOR
7
UNIDADE 1
As políticas de saúde
na República Velha
INTRODUÇÃO
Em outubro de 2020 encontrei em minha rede social uma postagem muito interessan-
te sobre o início do processo civilizatório. De modo geral, os marcos civilizatórios es-
tão relacionados à transição do homem primitivo de um modelo caçador/coletor para
um modelo agrário, quando a fixação no campo é um de seus maiores avanços. Daí
o início da ação política a partir do estabelecimento de regras de convívio, demarca-
ção de fronteiras, conceito de propriedade privada, divisão da população em estratos
sociais, taxações e impostos, e, finalmente, o desenvolvimento das ciências e da escrita
— não exatamente nesta ordem e muito menos de forma linear. Normalmente, os avan-
ços sociais ocorrem simultaneamente e, usualmente, estão relacionados a processos
associativos interdependentes.
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Esta disciplina percorre os principais fatos históricos que levaram aos avanços da saúde
no Brasil e chama a atenção para os riscos de retrocesso, principalmente nos direitos de
todo cidadão a uma vida saudável com saúde, emprego, segurança e lazer. Enfim, tudo
aquilo que é determinante para uma vida com saúde.
OBJETIVO
10
Breve perfil da saúde no Brasil até o
descobrimento
Sabe-se que durante quase toda a evolução humana nossos ancestrais atribuíram gran-
de importância a traumatismos cranianos por seu caráter dramático e letalidade. As evi-
dências estão em achados fósseis de crânios com lesões severas derivadas de confron-
tos interpessoais. Entretanto, os primeiros registros de comportamentos terapêuticos
voltados para esse tipo de lesão datam do Neolítico, há aproximadamente 10.000 anos,
quando crânios submetidos a trepanação foram encontrados em culturas pré-históricas.
Tal prática prevaleceu até meados do século IX d.C., evidenciando sua importância, prin-
cipalmente no tratamento de enxaquecas e epilepsias (CASTRO; FERNANDES, 2010).
11
Ampliando o foco
Trepanação
Orifício cirúrgico realizado intencionalmente para determinado fim.
Considere um país tomado por uma cultura invasora, europeia, com o objetivo único
de conquistar e explorar as riquezas locais. Foi nessa condição caótica de guerras que
a saúde se desenvolveu no Brasil, onde todos os tipos de patologias infecciosas espa-
lhavam-se sem nenhum controle. Com a chegada dos europeus, também vieram pató-
genos capazes de provocar infecções de fácil transmissão. As primeiras vítimas foram
os indígenas, pois eles eram desprovidos de imunidade suficientemente eficiente para
combater novos e não usuais agentes infecciosos.
Exemplo
O sarampo, a gripe, a varíola e a febre amarela são apenas alguns exemplos en-
tre os de maior incidência, sendo os mais importantes na vitimação de milhares
de nativos, colonos, e posteriormente africanos, durante os quadros epidêmicos
que se sucederam ao longo de toda a história de ocupação pelos portugueses.
12
Ampliando o foco
A varíola foi utilizada como arma biológica contra os índios goitacá, que habi-
tavam a região de Campos (RJ), como forma de consolidação do domínio por-
tuguês na região. A estratégia consistia basicamente em presentear os índios
com roupas de soldados mortos pela doença. Cabe ressaltar que essa medida
foi tomada a partir do esgotamento de todas as vias bélicas convencionais em-
pregadas na luta contra os ferozes guerreiros. Um exemplo de sua ferocidade
está no rito de passagem para a fase adulta. Quando o menino completava
18 anos tinha que se lançar nas águas turvas do rio Paraíba do Sul, na foz,
e trazer um tubarão morto para a terra. Além disso, eram hábeis corredores
e exímios caçadores, o que motivou os portugueses a utilizar estratégias de
guerra biológica.
Até a chegada da família real em 22 de janeiro de1808, a medicina por aqui restringia-se a
práticas conhecidas como artes de curar — um compêndio de saberes e procedimentos
derivados das culturas indígenas, africanas e de famílias portuguesas empobrecidas que
aqui moravam. Os doentes que necessitavam de cuidados procuravam a ajuda de pajés,
curandeiros e boticários. A despeito da eficiência de tais práticas, pode-se dizer que, do
ponto de vista da administração portuguesa até a metade do século XVIII, a saúde não
fez parte do projeto colonial e por isso, para os padrões europeus, o que se observava era
o predomínio de espaços sociais desorganizados. Quando muito, havia uma preocupa-
ção explícita com a doença, como no caso da hanseníase (lepra) e da peste, motivando
algum controle sanitário sobre portos, ruas, casas e praias (NUNES, 2000).
A partir do século XIX, novas demandas alteraram o quadro político da saúde no Brasil.
A principal delas refletia o entendimento de que a manutenção do aumento da produção
industrial estava atrelada à saúde do trabalhador.
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A lógica era irrefutável e estimulou intervenções mais efetivas voltadas para a saúde pú-
blica. Entre elas destacou-se a implementação de escolas estatais de medicina:
• A primeira foi a Escola de Cirurgia da Bahia, em 1808.
• Posteriormente, em 1809, foram fundadas a Cátedra de Anatomia do Hospital
Militar e a Escola de Medicina no Rio de Janeiro.
• Em 1829 foi criada a Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, que se
constituiu na força motriz da medicina social brasileira.
Ampliando o foco
A teoria dos miasmas foi cunhada por Hipócrates há 2.500 anos. Hipócrates
era um médico grego que acreditava na sazonalidade das doenças, uma vez
que era possível observar-se a influência das estações na saúde das pessoas.
De forma complementar, ele acreditava que o modo de vida das populações
era determinante para o processo saúde/doença, e que as doenças poderiam
ser adquiridas pelos ares fétidos ou miasmas emitidos pelos pântanos, lençóis
freáticos, poças contaminadas, matéria orgânica em decomposição ou qual-
quer tipo de ambiente insalubre, incluindo as florestas. O pensamento de Hipó-
crates foi tão importante que persistiu até o século XVII por tratar-se de uma
explicação racional, ainda que equivocada, sem vinculação sobrenatural.
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As causas naturais estavam relacionadas à presença de mangues, baixadas alagadiças,
relevos acidentados e todos os tipos de acidente geográficos presentes no perímetro
metropolitano. As causas sociais dividiam-se em dois níveis analíticos: os macrossociais
e os microssociais. Os níveis macrossociais ajustavam-se ao funcionamento geral das
cidades; os níveis microssociais estavam associados ao funcionamento das instituições
(OLIVEIRA, 1983).
Nesse período, as políticas públicas em saúde foram construídas com base nessa teo-
ria. Portanto, as ações partiam de um exame detalhado dos espaços urbanos que apre-
sentassem riscos de transmissão de doenças. Posteriormente, eram tomadas medidas
voltadas para a medicalização de instituições como escolas, quartéis, hospitais, cemité-
rios, fábricas e prostíbulos, entre outros (NUNES, 2000).
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Teoria dos miasmas x Teoria do germe
da doença
Aos poucos, a medicina social aumentou sua importância institucional a partir da chan-
cela das faculdades de Medicina, tornando-se progressivamente uma espécie de guardiã
da saúde pública, responsável pela reorganização e higienização dos espaços públicos.
As ações de controle e regulamentação do comércio e serviços estavam cada vez mais
centralizadas no Estado e a teoria dos miasmas era a doutrina ideológica que permeava
todas as políticas de saúde.
Não por acaso, em meados do século XVII estava ocorrendo uma revolução científica
na Europa, que progressivamente tomava corpo a partir dos avanços tecnológicos que
tornavam os microscópios cada vez mais potentes. O debate transcorria em torno da
presença ou não de micróbios específicos presentes no ar, capazes de causar altera-
ções na saúde dos animais e no estado dos alimentos. A comprovação da presença
de tais micróbios e sua ação seria suficiente para derrubar a teoria dos miasmas e da
geração espontânea.
Ampliando o foco
A geração espontânea era uma teoria que preconizava que a vida surgia espon-
taneamente da matéria morta ou do alimento apodrecido. Contra ela havia mui-
tos opositores, como o cientista alemão Rudolf Virchow e o químico francês
Louis Pasteur. Para contrapor a geração espontânea, Virchow cunhou o termo
“biogênese”, significando que a vida só poderia existir a partir de outra vida. Em
1857, o francês Louis Pasteur demonstrou que microrganismos presentes no
ar eram responsáveis pela fermentação, que convertia o suco de uva em vinho.
Estava comprovado que o ar continha uma variedade de micróbios capazes
de decompor a matéria orgânica em subprodutos distintos, encerrando assim
tal discussão.
16
A partir daí, os avanços científicos foram muitos.
• Em 1876, Robert Koch descobriu que uma bactéria em forma de bastão (Bacillus
anthracis) era a causadora do antraz, ou carbúnculo.
• Em 1882, Koch também descobriu que o Mycobacterium tuberculosis era a
bactéria causadora da tuberculose.
• Em 1910, Carlos Chagas realizou uma descoberta fascinante, que mudou a ciên-
cia no Brasil. Sozinho, ele descobriu como a doença de Chagas era transmitida, qual
era o vetor, sua ecologia e regiões endêmicas.
Um dos mais iminentes estagiários de Carlos Chagas foi Cecílio Romanha (1901 – 1997),
epidemiologista argentino que contribuiu com muitos trabalhos para o entendimento da
doença de Chagas, sua distribuição no continente e seu diagnóstico (DIAS, 1997). O feito
de Carlos Chagas igualou-se ao de Robert Koch com seus estudos sobre tuberculose.
Koch recebeu o Prêmio Nobel de Medicina em 1905. Já Carlos Chagas, tal qual Oswaldo
Cruz, foi odiado pela classe médica brasileira da época. Veja a seguir a cronologia das
principais descobertas no campo da microbiologia.
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1879 Neisser – Neisseria gonorrhoeae
18
1898 Shiga – Shigella dysenteriae
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A saúde na Primeira República: Oswaldo Cruz
As preocupações com a saúde nesse período não estavam relacionadas com a digni-
dade humana ou mesmo com os direitos de acesso aos bens de consumo da classe
trabalhadora, mas com os interesses econômicos das oligarquias em manter os traba-
lhadores em condições “adequadas” de saúde, visando a estabilidade da produção agrá-
ria (NUNES, 2000). Ou seja, o velho conceito da racionalização extrema da produção
de trabalho, advindo dos métodos de Frederick Taylor (1856–1915), reinava enquanto
fundamento pseudocientífico para justificar a produção em cadeia na indústria do café.
Por isso, a epidemia de febre amarela, que havia começado em 1950 no Rio de Janei-
ro, atingiu grande parte da zona cafeicultora de Campinas e Sorocaba (SP) em 1889,
gerando prejuízos incalculáveis para a economia do país. Os mais vulneráveis eram os
trabalhadores do campo, principalmente imigrantes contratados para substituir a mão de
obra escrava, que havia sido liberta em 13 de maio de1888, ano anterior à Proclamação
da República.
Em termos gerais, no início do século XX o quadro epidêmico do Rio de Janeiro retratava
uma cidade insalubre e assolada por uma série de doenças, que variavam entre varíola,
peste bubônica e febre amarela. Em 1902, o recém-eleito presidente do Brasil Rodri-
gues Alves (1848–1919), inspirado no modelo francês de medicina urbana, liderou um
movimento de saneamento que permitiu abrir grandes avenidas no centro do Rio e ex-
pulsar para as favelas periféricas as populações empobrecidas que habitavam cortiços
e quartos de aluguel.
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Um pouco antes, em 1899, um jovem médico e cientista chamado Oswaldo Cruz retor-
nara de um dos maiores centros de pesquisa em microbiologia do mundo, o Instituto
Pasteur, onde havia estagiado com o biólogo russo Ilya Mechnikov, ganhador do Prêmio
Nobel de Fisiologia (1908) por seus trabalhos em imunologia, e Émile Roux, médico des-
cobridor do soro antidiftérico e diretor do mesmo instituto.
Após uma rápida passagem por Santos (SP), onde ajudou a debelar a peste bubônica,
Oswaldo Cruz foi convidado pelo Barão de Pedro Afonso, por indicação de Émile Roux,
para dirigir o recém-fundado Instituto Soroterápico Nacional, na fazenda de Manguinhos,
transformando-o em um importante centro de pesquisa básica e de produção de vacina.
Posteriormente, após a posse de Rodrigues Alves, Oswaldo Cruz foi nomeado Diretor Ge-
ral da Saúde Pública (DGSP), algo como um Ministro da Saúde de hoje, a fim de erradicar
as epidemias da cidade.
Os feitos notáveis de Oswaldo Cruz lhe renderam inúmeros prêmios, mas também algu-
mas crises institucionais como a Revolta da Vacina, em 1904. Nesta época houve dis-
sonância entre a população e a forma autoritária como Oswaldo Cruz comandou a cam-
panha de vacinação contra a varíola. O modelo propiciou abusos por parte de agentes
higienistas, que invadiram casas, assediaram mulheres e crianças vacinando-as à força,
gerando grande revolta popular, que foi debelada com violência pelo governo. Curiosa-
mente, em 1908, a população foi surpreendida por uma nova epidemia de varíola e, ao
contrário do que se esperava, os cidadãos demonstraram clareza quanto à necessidade
de imunização prévia e compareceram espontaneamente aos postos de vacinação. Em
1909 o Instituto Soroterápico Nacional passou a se chamar Instituto Oswaldo Cruz e em
1917, aos 44 anos, Oswaldo Cruz faleceu de insuficiência renal em Petrópolis (RJ) após
ter abandonado o Instituto por motivos de saúde.
O Brasil da década de 1920 era uma jovem república abalada em sua principal indústria, a
cafeeira, por conta das incertezas econômicas geradas por um mundo economicamente
arruinado por guerras. O velho continente ainda tentava recuperar-se dos imensos prejuí-
zos acumulados pela I Guerra Mundial (1914 – 1918), diminuindo o consumo de produ-
tos importados e aumentando a produção interna. Essas medidas afetaram em cheio o
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Brasil e os Estados Unidos. A falta de escoamento da superprodução norte-americana
levou ao aumento do desemprego e à hiperdesvalorização da bolsa de Nova York em
1929, culminando com uma grande recessão no mundo capitalista, da qual o Brasil não
passou ileso.
Nesse período, o Brasil iniciava sua revolução industrial tardia e vivia suas próprias con-
tradições. Por um lado, tratava-se de um país atrasado, predominantemente rural, de
tradição escravagista e patriarcal. Por outro, os grandes centros urbanos como Rio de
Janeiro e São Paulo respiravam certa modernidade e urbanizavam-se rapidamente, acen-
tuando os contrastes sociais.
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nagem estereótipo do brasileiro caipira, chamado de Jeca Tatu, de Monteiro Lobato.
Ou seja, o homem do campo, eternamente doente, necessitado, sofrendo de preguiça
crônica e fome.
Esta condição espelhava a outra extremidade da realidade das políticas públicas em saú-
de, que se limitavam aos centros urbanos de maior importância e mantinham o campo
em total abandono. Para as elites, a salvação do Brasil passava pelo “branqueamento”
da raça. Era necessário trazer sangue “bom” dos imigrantes do norte. O branqueamento
melhoraria a resistência às doenças, aumentando a produtividade, diziam eles! Com este
pensamento, os afrodescendentes recém-libertos foram abandonados pelas oligarquias
e todo o esforço voltou-se para o projeto eugênico, racista, não inclusivo, para trazer imi-
grantes — principalmente italianos — para o campo. Assim, o Brasil acumulava mais uma
dívida com aqueles que, de fato e contra a própria vontade, haviam construído a nação
até aquele período: nós, o povo brasileiro!
Neste momento já se podia dizer que havia no Brasil um Movimento Sanitário, que se
dividia entre ideias contraditórias quanto aos seus objetivos e crenças. Entretanto, uma
linha de pensamento começava a sobressair:
O atraso brasileiro não é uma questão de raça, mas uma questão de doença.
O pensamento sanitário no Brasil fez com que, naquele momento histórico entre 1923 e
1927, o sanitarismo se convertesse no projeto médico-social brasileiro. O projeto basea-
va-se no que se denominou de campanhismo.
Ampliando o foco
Campanhismo
Modelo vinculado à indústria agroexportadora, que requeria trabalhadores sau-
dáveis e produtivos, além de portos e cidades saneadas para estimulação de
comércio e imigração.
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Portanto, entre as principais ações empregadas como medidas higienistas no início do
século XX pode-se distinguir:
• Campanhas sanitárias de combate a grandes epidemias como febre amarela,
peste bubônica e varíola.
• Implementação de programas de vacinação obrigatórios.
• Desinfecção de espaços públicos e domiciliares.
• Medicalização do espaço urbano.
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MIDIATECA
NA PRÁTICA
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Resumo da Unidade 1
Nesta unidade vimos que as condições de saúde no Brasil sempre estiveram alinhadas
com o pensamento dominante de sua época. As medidas higienistas no Brasil Colônia
seguiram os conceitos da teoria dos miasmas, pois não havia fundamentos científicos
mais confiáveis naquele momento. Contudo, a ciência não é estática e movimenta-se a
partir dos avanços da sociedade. Na República Velha, as políticas de saúde adequaram-
-se à vanguarda do pensamento europeu, passando a perceber a doença como resultado
de interação com microrganismos, de acordo com a teoria unicausal ou teoria do ger-
me da doença. Seu maior representante foi o sanitarista Oswaldo Cruz, que iniciou uma
campanha de saneamento e de vacinação visando erradicar as grandes epidemias. Cabe
destacar que as políticas econômicas nem sempre estiveram alinhadas com os avanços
científicos — principalmente quando se tratava de produtividade. Assim, muitas vezes os
trabalhadores eram tratados como componentes de uma engrenagem que não podia
parar. O lado humano era esquecido.
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Referências
MADIGAN, M. T.; MARTINKO, J. M & Parker, J. Microbiologia de Brock. 10. ed. São Paulo:
Pearson, 2004.
NUNES, E. D. Sobre a história da saúde pública: ideias e autores. Ciência e Saúde Coletiva.
5(2): 251-264, 2000. Disponível em: histŠria (scielo.br). Acesso em: 30 nov. 2020.
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UNIDADE 2
A era Vargas
INTRODUÇÃO
Nesta unidade você vai consolidar seus conhecimentos sobre a evolução das políticas
públicas de saúde sob os pontos de vista histórico e conceitual. Os tópicos abordados
mostram de forma abrangente a diferença entre as linhas de pensamento que influen-
ciaram a construção do movimento sanitarista e as causas de seu fracasso. Por outro
lado, você também verá o crescimento da medicina assistencialista na era Vargas e a
origem da burocracia que favoreceu o desvio de finalidade dos institutos de assistência
e previdência.
OBJETIVO
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Período militar
Sabe-se que “saúde” é poder, seja no contexto privado em que o médico exerce domí-
nio sobre o paciente ou no âmbito público, quando o direcionamento das abordagens
em saúde alcança milhões de pessoas a um custo vultoso. O ordenamento público e
a organização social passam obrigatoriamente pela saúde, tal como ocorreu durante a
República Velha.
Portanto, desde o período imperial até hoje, o Brasil foi marcado por tentativas de se criar
uma identidade nacional a partir de um comércio forte e de uma igreja centralizadora,
porém capilarizada. Qualquer movimento separatista era reprimido violentamente. A for-
mação de uma identidade nacional consolidaria um modo de ser, uma forma de pensar
e um comportamento padrão de fácil controle social. Esses foram os principais motivos
que mantiveram o Estado brasileiro íntegro e coeso, evitando seu esfacelamento em pe-
quenas repúblicas como ocorreu na América Espanhola.
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O movimento sanitarista brasileiro entendeu muito cedo que a saúde não podia ficar de
fora dessa construção e, aos poucos, percebeu que a identidade nacional deveria passar
por uma política de Estado intervencionista, que englobasse de forma coletiva os con-
tingentes de brasileiros totalmente esquecidos pelo poder público nos mais profundos
rincões do território nacional.
Ampliando o foco
Enquanto isso, nas cidades, os trabalhadores das empresas e indústrias estavam alheios
aos debates e pensamentos nacionalistas do movimento sanitário. A realidade que se im-
punha à classe média trabalhadora era a ausência de direitos trabalhistas, o que ameaça-
va uma velhice tranquila, remunerada e com saúde. Repare que a Revolta da Vacina em
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1904 foi apenas mais um episódio em que a população se indignou com o autoritarismo
das decisões que lhe foi imposta, sem que houvesse comunicação adequada e respeito
às liberdades individuais, por melhores que fossem as intenções.
Em 1920 (que dirá antes disso) não havia plano de previdência ou qualquer outro direito
trabalhista com os quais estamos acostumados atualmente. Cabe lembrar que o Brasil
estava em um período de rápida industrialização e acelerada urbanização. Portanto, os
trabalhadores organizaram-se em função dessas reivindicações resultando em inúme-
ras paralisações e greves, principalmente no setor ferroviário, que politizou as lutas de
classe. De um lado, estavam os oligarcas donos dos meios de produção, europeizados
e brancos, cada vez mais ávidos por lucros e herdeiros seculares de terras, fábricas e
prédios. De outro, estavam os trabalhadores miscigenados, pobres e historicamente es-
quecidos pelo sistema, que ainda respiravam ares escravistas.
A forte agitação popular por direitos trabalhistas — tais como reajuste salarial periódico,
adicional noturno, assistência médica, férias e aposentadoria — obrigou os políticos a
se manifestarem. Em 1923, o presidente Arthur Bernardes (1922–1926) assinou a lei
proposta enviada pelo deputado federal Eloy Chaves, que obrigava cada companhia fer-
roviária do país a criar Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAPs) a partir de contribui-
ções feitas por funcionários e patrões, e pagar o benefício a aposentados e pensionistas
(AGÊNCIA SENADO, 2019). Estava criada a primeira estrutura previdenciária do Brasil,
que se alastrou pelas demais categorias trabalhistas.
Enquanto nas cidades havia forte tensão entre trabalhadores e proprietários de indús-
trias e empresas privadas, na saúde pública o movimento sanitarista procurava utilizar
a máquina estatal para ampliar medidas higienistas e avançar para o interior do Brasil
como uma forma de integração nacional e de construção de uma identidade. Entretanto,
o estabelecimento de uma associação entre saúde pública e o capitalismo crescente da
jovem república brasileira só seria possível se houvesse convergência entre os interesses
das oligarquias com os ideais nacionalistas dos sanitaristas.
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As condições sanitárias nas grandes capitais antes de 1904 não eram atrativas para a
vinda dos estrangeiros devido aos riscos que representavam para a saúde. Quando se
iniciaram as campanhas de saneamento por Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro, e em São
Paulo por Emílio Ribas e Adolfo Lutz (estes um pouco antes, em 1903), os índices de
imigração sofreram alta considerável, convergindo com os interesses das elites oligárqui-
cas, que também ocupavam os principais cargos políticos no Brasil.
Para refletir
Neste ponto da história cabe fazer a seguinte pregunta: por que a administração
brasileira no período posterior à Lei Áurea optou por substituir a mão de obra
escrava por imigrantes europeus, em vez de aproveitar os próprios brasileiros
recém-libertos ou os sertanejos esquecidos no agreste e sertões nordestinos?
Durante a República Velha havia, no Brasil, duas correntes principais de pensamento na-
cionalista, cuja questão sanitária estava no centro dessas duas ideologias. Tais visões
ganharam forte impulso após o término da I Guerra Mundial (1914 -1918).
A primeira visão era eugênica e creditava à miscigenação todos os males que tornava
o brasileiro cronicamente doente. A solução estava na europeização do Brasil e conse-
quente branqueamento da população, “melhorando” o sangue e tornando-o mais resis-
tente às doenças tropicais. Tal ideologia era inspirada no fascismo italiano de Mussolini
(1922), que havia influenciado o nazismo alemão a partir de 1933 com a chegada de
Hitler ao poder. No Brasil, encontrou forte apoio no partido de direita ultraconservador
de Plínio Salgado, chamado de integralista (Ação Integralista Brasileira – AIB). O então
33
chamado racismo científico contagiou um grupo enorme de profissionais da saúde pú-
blica, que culpava a herança africana de forma contundente pela “baixa” resistência dos
brasileiros a doenças.
Ampliando o foco
É nesse momento que o escritor Monteiro Lobato, criador, entre outros, do per-
sonagem Jeca Tatu e da obra O Sítio do Pica-pau Amarelo, abdica de suas
concepções racistas e abraça o sanitarismo como a principal questão nacional.
34
O avanço das políticas públicas
Aos poucos o sanitarismo rural converteu-se na nova bandeira da saúde pública do Brasil,
até se transformar em aspiração nacional. Ou seja, o movimento sanitarista superou a
fase urbana e se converteu ao “saneamento dos sertões”. Um dos principais motivos des-
sa guinada foi a publicação, em 1916, do Relatório Neiva-Pena como resultado da primei-
ra expedição científica organizada pelo Instituto Oswaldo Cruz em 1912. Nela, os médicos
sanitaristas Belisário Pena e Artur Neiva percorreram durante vários meses o norte e o
nordeste da Bahia, o sudeste de Pernambuco, o sul do Piauí e o norte e sul de Goiás.
Belisário Pena e seus colegas criaram a Liga Pró-Saneamento do Brasil para pressionar
o governo a implementar o programa. Como resultado, o presidente Venceslau Brás
(1914 – 1918), em seu último ano do governo criou o Serviço de Profilaxia Rural, que
centralizava as ações de saúde pública que seriam aplicadas no interior. As ações visa-
vam intervenções no Nordeste por meio do combate à malária, amarelão e doença de
Chagas (NUNES, 2000).
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Entretanto, avanços mais consistentes vieram mesmo no governo de Epitácio Pessoa
(1919 – 1922) com a ampliação dos projetos de intervenção estatal a partir das seguin-
tes mudanças:
Essas mudanças permitiram que o conjunto de medidas propostas por Belisário Pena
se tornassem viáveis.
Importante
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são e Aposentadoria, cujo financiamento era bipartite (empregados e empregadores), ou
seja, sua origem era contributiva (COHN, 2006).
Nas zonas rurais do interior do Brasil o modelo de gestão de saúde era o sanitarismo
campanhismo, surgido no início do século XX e que se ocupava de ações higienistas
voltadas para a erradicação das grandes endemias nacionais. Esse modelo também era
denominado biomédico devido ao seu caráter investigativo e científico e estava subordi-
nado ao Departamento Nacional de Saúde Pública (JÚNIOR; ALVES, 2007).
Do ponto de vista das caixas de pensão (assistência médica), o modelo era completa-
mente excludente pois contemplava apenas aqueles que estavam vinculados a alguma
empresa que estivesse obrigada, por lei, a garantir os direitos recém-conquistados pelos
trabalhadores. As pessoas sem vínculo empregatício teriam de pagar do próprio bolso — o
que seria inviável caso não pertencessem às classes privilegiadas — ou deveriam procurar
hospitais filantrópicos. Cabe ressaltar que durante três séculos de colonização existiam
apenas 10 Santas Casas de Misericórdia no Brasil. Ou seja, apesar da Lei Eloy Chaves de
1923, a situação era de total catástrofe assistencial durante toda a década de 1920.
Para refletir
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Apesar da crescente falta de recursos devido à crise, o novo código sanitário de 1920 in-
tensificou o nível de intervenção federal no interior de Brasil a partir da criação de postos
de profilaxia em 11 estados da região Nordeste. Em 1922 esse número chegou a perto de
100. Durante a presidência de Artur Bernardes (1922 – 1926) o nível de intervenção go-
vernamental aumentou com as campanhas de higiene infantil e antituberculose na Bahia.
No período de Washington Luís (1927 – 1930) o modelo campanhista ainda sustentava
algum fôlego com as campanhas de Educação em Saúde de Belisário Pena pelos esta-
dos de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e vários do nordeste voltadas para o despertar
da consciência sanitária do povo (expressão da época). Apesar disso, alguns postos de
profilaxia rural foram fechados por falta de recursos e, progressivamente, o movimento
sanitário esvaziou-se (SANTOS, 1985).
A crise se agravou com a quebra da Bolsa de Nova York, gerando uma forte recessão no
mundo ocidental. O desemprego, a inflação, as greves por melhores condições de saúde
e trabalho, entre outros aspectos políticos, levaram a um golpe de Estado que depôs o
presidente Washington Luís em 24 de outubro de 1929 e impediu a posse do presidente
eleito, Júlio Prestes. Estava terminada a República Velha e iniciava-se o período militar.
Com as mudanças, vieram novas perspectivas na saúde e nas relações entre trabalhado-
res e patrões, tanto para o bem quanto para o mal.
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A saúde na era Vargas – Democracia
Finalmente chegamos aos anos 1930, o início do assim chamado Governo Provisório
por ter sido derivado de um golpe de Estado liderado por Getúlio Vargas. Vargas foi can-
didato nas eleições de 1930, mas sabia que não tinha condições de romper com as for-
ças que se revezavam no poder havia praticamente 40 anos, principalmente após o as-
sassinato do seu vice, João Pessoa. Portanto, organizou um golpe de Estado com apoio
dos industriais urbanos, da classe média operária, bem como das elites intelectuais e
artísticas da época (1930 - 1934), instaurando um governo provisório por quatro anos.
Uma de suas primeiras medidas foi o fechamento do Congresso, seguido da destituição
dos governadores. No lugar deles foram nomeados interventores. Tal medida desmontou
o poder das oligarquias mineira e paulista, que se revezavam no governo central por meio
de fraudes eleitorais a partir do que se denominou política do café com leite.
Vamos lembrar que as políticas públicas de saúde eram viabilizadas sempre que os in-
teresses das oligarquias convergiam com os interesses dos sanitaristas. Os sanitaristas
tinham uma ideologia consistente, que pregava o combate às doenças a partir de uma
abordagem profilática ou preventiva. Era necessário que o sanitarismo se tornasse parte
da consciência nacional e, portanto, de sua própria identidade. A convergência com os
interesses oligárquicos era ampla pois, segundo a lógica dos ruralistas, um ambiente sa-
neado era igual a trabalhadores saudáveis, o que significava força de trabalho e aumento
de exportação. Porém, não ia muito além disso. Afinal, sabemos que saúde gera força de
trabalho e educação gera mobilização e luta de classes por direitos. A convergência era
limitada a interesses comuns, mas estes nem sempre convergiam.
O governo Vargas adotou uma política de saúde urbana com base em critérios econômicos
harmonizados com as forças que o impulsionaram rumo ao governo central. Não se com-
batia mais a doença e sim os surtos epidêmicos, de acordo com a conveniência do capital.
39
Exemplo
Cabe considerar que, desde a sua origem, o movimento sanitarista esteve atrelado ao
Estado e teve como fundamento a centralização de suas ações, que se caracterizavam
por posturas tipicamente autoritárias a partir de uma orientação vertical. Era de se espe-
rar que uma conjuntura militarista, nacionalista e autoritária representasse um ambiente
propício para o seu desenvolvimento. Entretanto, o que se viu foi seu esfacelamento.
Uma possível aproximação que ilumine essa aparente contradição talvez esteja na cria-
ção do Ministério da Educação e Saúde, em 1930. Esta, uma antiga reivindicação da
classe higienista em substituição ao DGSP (Diretoria-Geral da Saúde Pública), acabou se
mostrando o seu maior obstáculo.
Ampliando o foco
40
A criação do Ministério da Educação e Saúde converteu-se em uma gestão altamente
burocratizada, com força suficiente para gerar paralisação no processo político do mo-
vimento sanitarista. Vale lembrar que o início do movimento foi acompanhado por uma
mobilização política que o empurrou rumo ao interior do país como uma condição para
a elaboração de uma identidade nacional. A despolitização do movimento, força motriz
do sonho idealizado por Belisário Pena e Carlos Chagas, acabou com seu potencial de
transformação no campo.
Obviamente que não temos como proposta a demonização de Getúlio Vargas pelo fim do
movimento sanitarista, até porque, como todo político, Vargas era movido por aspirações
populares. A despolitização do movimento sanitarista impediu que ele enfrentasse o po-
der das oligarquias rurais em direção a uma ação de Educação em Saúde nas fazendas.
A verdade é que, por motivos óbvios, não interessava aos latifundiários tamanho grau
de organização popular no interior de suas fronteiras. Assim, as políticas públicas foram
deslocadas para os grandes centros urbanos em resposta às pressões sindicais.
O governo provisório terminou em 1934 e Vargas foi eleito democraticamente para mais
quatro anos de governo. Inicia-se o período democrático da era Vargas.
41
MIDIATECA
NA PRÁTICA
42
Resumo da Unidade 2
A década de 1920 foi marcada por fortes mudanças na política de saúde, impulsionada
tanto pela agitação popular que lutava por melhores condições de trabalho nas cidades,
quanto pela idealização dos sanitaristas por um Brasil saneado no interior e nos grandes
centros urbanos. Para os sanitaristas, a construção de uma identidade nacional pas-
sava pela incorporação de uma consciência higienista como um valor em si. Em 1923
a pressão popular foi responsável pela criação da Lei Eloy Chaves, instituindo os CAPs
e melhorando as condições gerais de algumas classes de trabalhadores. A estrutura
organizacional da saúde no Brasil era dual: nos grandes centros urbanos o modelo era
assistencial, do tipo curativo/privatista. Nas zonas rurais o modelo de gestão de saú-
de era o sanitarismo campanhismo, voltado para a erradicação das grandes endemias
nacionais. A despolitização progressiva do movimento sanitarista após a Revolução de
1930, com a ascensão de Getúlio Vargas ao poder, esvaziou o movimento, levando-o ao
fracasso. Em 1933 o CAPs foi convertido em IAP.
43
Referências
BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Decre-
to nº 4.682, de 24 de janeiro de 1923. Crea, em cada uma das emprezas de estradas
de ferro existentes no paiz, uma caixa de aposentadoria e pensões para os respectivos
empregados. Rio de Janeiro, RJ: Presidência da República, 24 jan. 1923. Disponível em:
DPL4682-1923 (planalto.gov.br).Acesso em: 15 dez. 2020.
COHN, A. O estudo das políticas de saúde: implicações e fatos. In: Campos, W. G. S.; et.
al. Tratado de saúde coletiva. São Paulo: Hucitec, 2006.
NUNES, E. D. Sobre a história da saúde pública: ideias e autores. Ciência e Saúde Coletiva.
5(2): 251-264, 2000. Disponível em: histŠria (scielo.br). Acesso em: 30 nov. 2020.
PAIM, J.; TRAVASSOS, C.; ALMEIDA, C.; BAHIA, L.; MACINKO, J. O Sistema de Saúde Bra-
sileiro: história, avanços e desafios. The Lancet. 6735(11): 60054-8, 2011.
44
UNIDADE 3
A criação do Ministério da
Educação, Saúde Pública e a
reforma administrativa de Vargas
INTRODUÇÃO
A saúde no Brasil evoluiu a partir de duas vias. Uma estava relacionada a um ideário
sanitarista de saúde pública gratuita e acessível para toda a população, cuja representa-
ção era o Ministério da Educação e Saúde Pública – MESP, criado em 1930. A outra se
desenvolveu no contexto da medicina assistencial previdenciária, atrelada às políticas
partidárias do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio – MTIC.
A Era Vargas foi marcada por indefinição quanto ao tipo de política de saúde a seguir. Se
por um lado as reformas administrativas ocorridas no sistema previdenciário favorece-
ram mais as empresas privadas do que os trabalhadores, por outro os segurados do sis-
tema sofreram com atendimentos desumanizados e assistência médica precarizada. A
unificação das Caixas de Aposentadoria e Pensão – CAPs em Institutos de Aposentado-
ria e Pensão – IAPs apenas agravou o problema e agregou outros novos. A centralização
dos recursos nas mãos do governo fez com que a saúde pública ficasse subfinanciada
devido ao desvio de finalidade das verbas públicas. Neste contexto, ocorreu a reforma do
Mesp como resposta a estas distorções.
OBJETIVO
46
A burocracia crescente da era Vargas
Nas unidades anteriores ficou claro que o desenvolvimento das políticas públicas de saú-
de e suas bifurcações baseadas em demandas específicas e subjetivas não morreram
completamente. O aparente fracasso do movimento sanitarista atribuído à máquina bu-
rocrática do Ministério da Educação e Saúde Pública – Mesp, criado em 1930, foram
responsáveis pela desmobilização política do movimento e, consequentemente, de seu
esvaziamento. Entretanto, é possível verificar vários indícios de que a semente do sani-
tarismo outrora plantada germinou e, mesmo desidratada, os remanescentes de suas
raízes favoreceram seu ressurgimento.
Se por um lado conseguimos inserir no imaginário público um mundo cuja vacinação faz
parte da realidade, por outro ainda não conseguimos a plenitude de alguns aspectos que
também eram parte da ideologia sanitarista, como o saneamento completo das cidades
e do interior do país. Vários indicadores de saúde mostram o atraso do Brasil em compa-
ração a países desenvolvidos e à maioria dos países emergentes.
Para refletir
47
que disseminou a doença chamada Covid-19. As medidas sanitárias tomadas
para conter a pandemia estão de acordo com aquelas definidas na I Conferên-
cia Sanitária Internacional, em que o isolamento e a quarentena aparecem na
linha de frente para contenção primária da incidência viral. A contenção surge
como estratégia mitigatória enquanto são testadas as eficácias de algumas va-
cinas experimentais. Entretanto, do ponto de vista humanista ainda temos mui-
to a caminhar, pois a lógica eugênica que regeu parte dos avanços científicos
do passado ainda perdura no presente. Os objetivos relacionados ao financia-
mento de vacinas ainda estão atrelados principalmente ao ganho financeiro e à
manutenção da força de trabalho. Se a saúde tiver que se curvar à especulação
financeira em nome de um ideal maior, que tenha ao menos como resultado
uma população saudável até que a humanidade dê mais um salto civilizatório
em direção ao futuro.
Ampliando o foco
Cabe salientar que foi apenas a partir de 1930, durante o governo provisório de Vargas
(1930 – 1934), que uma política nacional de saúde pública tomou forma com a instala-
ção dos aparelhos necessários para sua efetivação. Entre eles destacam-se a criação do
MESP (1930) e dos institutos de aposentadoria e pensões IAPs (1933).
48
Importante
O termo “burguês” aqui não tem um sentido filosófico, mas é uma alusão ao
poder aquisitivo de uma sociedade emergente formada por uma minoria de
novos-ricos que, por vício ou distração, passou a agir como as oligarquias do
passado, ainda que no domínio de seus micropoderes.
Em 1968 o grande educador e filósofo Paulo Freire, Patrono da Educação no Brasil, es-
creveu: “Seria uma atitude ingênua esperar que as classes dominantes desenvolvessem
uma forma de educação que proporcionasse às classes dominadas perceberem as in-
justiças sociais de maneira crítica.”
Sua fala reflete em cheio a realidade do que foi a acomodação política ajustada entre Ge-
túlio Vargas e o coronelismo frente às aspirações sanitaristas. A convergência das verda-
deiras oligarquias ia apenas até os pontos em que as ações de higienização contribuíam
para o aumento da força de trabalho. Fora isso, a política dos coronéis não tinha interes-
se em uma educação emancipadora, uma vez que igualdade de direitos e equidade não
representavam projetos compatíveis com o lucro fácil advindo da exploração da mão de
obra humana. Hoje, esses trabalhadores estão representados também por bancários,
advogados, engenheiros e muitos outros que atuam no ramo liberal ou não.
A saúde no Brasil evoluiu junto com um liberalismo distorcido, em que as minorias deten-
toras do poder resistiram e resistem até hoje a “dividir o bolo”, mesmo à custa de tensão
social permanente.
O financiamento dos IAPs era tripartite, pois tratava-se de um filão muito grande para
ser administrado apenas por empregados e empregadores como no tempo do CAPs.
Portanto, o Estado se juntou a eles assumindo o controle e centralizando recursos finan-
ceiros e ações. Uma das formas de controle dos IAPs se deu a partir da nomeação de
seu presidente pelo presidente da República Getúlio Vargas, e a nomeação dos represen-
tantes dos trabalhadores e patrões pelos sindicados atrelados ao poder executivo.
Essa prática ocorria por meio de eleição direta. Como foi dito, o interesse do Estado não
era exatamente em saúde, mas nos recursos em si que, aos poucos, foram sendo utiliza-
dos em outras áreas até que tais práticas se normalizassem e se constituíssem em um
problema que perdurou até os dias atuais com a falta crônica de recursos para financiar
aposentados e pensionistas devido ao desvio de verbas.
49
Portanto, a série histórica das políticas de saúde até aqui mostra que houve um reforço
na dualidade entre as ações públicas na área de saúde, em que:
• As ações de caráter coletivo e campanhistas ficaram a cargo do Mesp.
• As ações individuais e curativas permaneceram vinculadas aos IAPs.
Para as pessoas que possuíam recursos, a medicina liberal era a alternativa mais viável,
enquanto para a maioria da população sem vínculo previdenciário restavam apenas as
práticas populares semelhantes àquelas praticadas no Brasil colônia ou, quando muito,
em hospitais de caridade.
50
A reforma do Ministério da Educação e
Saúde Pública
É importante que tenhamos em mente, de forma bem assertiva, este aspecto estrutural
das políticas de saúde, pois, apesar das aparências, não era aleatório. Havia uma estra-
tégia na consolidação dessa dualidade para que se concretizassem as aspirações getu-
listas de se construir um Estado forte e centralizado. O sucesso de tais objetivos depen-
dia da construção de um aparato governamental que conjugasse a ação governamental
nas esferas federal, estadual e municipal. Portanto, a criação do Mesp era a resposta a
estas aspirações.
Foi assim que o governo Vargas se estruturou como um Estado nacional, centralizador
e intervencionista, capaz de responder com políticas sociais aos conflitos urbanos por
meio do MTIC e do Mesp. Nestes contextos, eram definidas ações prioritárias de com-
bate a doenças em diferentes regiões, requerendo a formação de profissionais especia-
lizados que garantissem a penetração do poder estatal por meio de novas campanhas
sanitárias. O viés centralizador do Estado visava ao aprofundamento dos processos de
expansão dos aparelhos estatais para que assumissem cada vez mais o controle das
políticas públicas em todo o território nacional de forma unificada.
51
O governo provisório chegou ao fim com a promulgação da Constituição de 1934,
que instituiu:
• O voto feminino.
• O voto secreto de parlamentares.
• As leis trabalhistas.
A política de saúde do Ministério Capanema foi um dos pilares que levou os ideais sanita-
ristas em direção ao pensamento coletivo de uma saúde como direito universal. Durante
todo o período varguista, os sanitaristas lutaram por um serviço de saúde que fosse
abrangente e destinado a toda a população. Em termos práticos, no entanto, este objetivo
jamais foi alcançado, a não ser com a criação do SUS muitas décadas depois. O ideário
de uma saúde popular foi levado à frente pelas novas gerações e as conferências Na-
cionais de Saúde e de Educação se constituíram em fóruns onde tais debates foram se
52
aprimorando. A primeira conferência Nacional de Saúde ocorreu no Rio de Janeiro, em
1941 (CASTRO; FARIA, 1999).
Ampliando o foco
53
Segundo Capanema, as CNS eram: “[...] conferências de administradores que terão apenas
o objetivo de estudar e assentar providências de ordem administrativa. Por meio delas, po-
derá ainda a União coordenar a execução dos planos nacionais que forem estabelecidos.”
Em 1941, em plena II Guerra Mundial, o Brasil sofreu intensa pressão dos Estados Uni-
dos para sair da neutralidade e apoiar os países aliados contra a Alemanha nazista e os
demais países do eixo (Itália e Japão). Isso incluía ameaça de invasão territorial caso o
Brasil não concordasse. Por mais estranho que fosse, havia uma real possibilidade de o
54
Brasil romper a sua neutralidade e apoiar os nazistas, visto que a ditadura de Vargas e
seu governo tinham um caráter fascista. Tanto que o general Góis Monteiro, que sempre
esteve no governo Vargas, era a favor de declarar guerra aos ingleses.
55
Criação do Instituto Nacional de Previdência
Social – INPS
Apesar do avanço das políticas públicas de saúde representadas pelos MES e MTIC, o
perfil epidemiológico do Brasil na década de 1950 ainda era caracterizado pelo predomí-
nio de doenças típicas da pobreza ou Doença Infecciosas da Pobreza (DIP), tais como
malária, cólera, sarampo, difteria, entre outras, causadas por fome, desnutrição infantil,
água poluída, redes de saneamento praticamente inexistentes. Além disso, todo tipo de
iniquidade era produzida por um Estado injusto e preocupado quase que unicamente
com o desvio de verbas e ganhos de capitais para uma oligarquia centenária e de menta-
lidade escravista que se perpetuava no poder.
Por outro lado, apesar da extrema miséria e da lentidão quase inerte do governo em apre-
sentar soluções definitivas para esse quadro desolador, o Brasil começava a sofrer com
o aparecimento progressivo de doenças relacionadas à modernidade. A industrialização
tardia, porém vigorosa, impulsionada pela CSN após a guerra, trouxe consigo um conjun-
to de patologias até então pouco percebidas tais como enxaqueca, transtornos cardía-
cos, obesidade, insônia, dores articulares, distúrbios endócrinos e outras mais. Eram as
doenças da modernidade.
56
Ampliando o foco
Um dos grandes vilões desse quadro, que atropelou os sonhos e ideais sanita-
ristas, foi a assimetria com que se deram as relações econômicas entre os paí-
ses centrais e os periféricos. O Brasil vinha acumulando uma grande dívida com
a Inglaterra desde o período colonial. Posteriormente, após a II Guerra Mundial,
essa relação de endividamento alterou-se a partir do financiamento da CSN
pelos Estados Unidos por 20 milhões de dólares. Tais países lucravam com
os juros abusivos cobrados do Brasil e da América Latina como um todo, e os
governos — submissos — aceitavam sem questionar. O alto endividamento, o
subfinanciamento da saúde e o descaso das oligarquias foram fatores determi-
nantes para o quadro pavoroso da saúde pública no Brasil neste período.
Em 1953, desde uma antiga reivindicação dos sanitaristas que remonta à Primeira Confe-
rência Nacional de Saúde, foi criado o Ministério da Saúde (Lei nº 1.920/1953) a partir do
desmembramento do então Ministério da Educação e Saúde em dois ministérios: Saúde
e Educação e Cultura.
Ampliando o foco
57
e integração nacional, acentuou as desigualdades sociais e favoreceu a forma-
ção de novos latifúndios. Além disso, o financiamento para a construção tornou
ainda mais grave a dívida externa brasileira.
Com a instauração do regime militar em 1964 por meio de um golpe de Estado que
depôs o presidente eleito João Goulart, ocorreram novas mudanças na saúde com fa-
vorecimento claro da medicina liberal privada. Em 1966, os IAPs foram unificados no
Instituto Nacional de Previdência Social – INPS. Entretanto, o INPS manteve o foco na
assistência à saúde individual, expandindo o modelo biomédico de atendimento a partir
do financiamento direto e de compras de serviços para os hospitais privados. Com esses
incentivos, o setor privado de clínicas, hospitais, equipamentos e medicamentos, experi-
mentou um grande crescimento, sem que para isso houvesse melhoria significativa na
assistência à saúde (JUNIOR; ALVES, 2007).
Neste período, o Brasil experimentou uma política claramente privatista dos serviços de
saúde. O caráter promíscuo da parceria público-privada evidenciou sua iniquidade dian-
te da impossibilidade de gerir os processos obscuros que se davam por trás de tantos
incentivos. Cada paciente era um “cheque em branco”, uma vez que a previdência era
obrigada a pagar as faturas que chegavam oriundas dos “tratamentos” realizados. Afinal,
quem discutiria se o paciente precisava ou não de raio-X, de cirurgia, de três ou 10 consul-
tas etc.? Sem falar que os custos do sistema aumentavam progressivamente e a forma
de compra dos serviços, chamadas de Unidades de Serviço – US, que em geral valoriza-
va os procedimentos mais especializados e sofisticados, era suscetível a fraudes. Assim,
a capacidade gestora do sistema foi erodida por dentro, reforçando sua irracionalidade.
58
o Ministério da Previdência e Assistência Social – MPAS, desmembrado do Ministério
do Trabalho e Previdência Social. Logo de início ficou clara a preponderância do novo mi-
nistério sobre o Ministério da Saúde. O MPAS era o segundo maior orçamento da União,
apenas superado pelo da própria União. O movimento sanitário acolhido no Ministério da
Saúde era contra-hegemônico e aspirava à transformação do sistema vigente que, como
sabemos, era caracterizado pela dicotomia das ações de saúde pelas estatais. Dentre
suas principais distorções, destacava-se a corrupção normatizada pela forma de paga-
mento conhecida como Unidade de Serviço – US (ESCOREL, 1999).
Esse quadro manteve-se parcialmente inalterado até 1975 quando, objetivando discipli-
nar a oferta de serviços de saúde, foi instituído o Sistema Nacional de Saúde – SNS por
meio da Lei nº 6.229, de julho de 1975, visando superar a descoordenação imperante no
campo das ações de saúde. Infelizmente, o SNS não foi capaz de fazer frente aos proble-
mas apontados devido à sua restrição burocrática desprovida de real poder disciplinar.
Finalmente, em 1977 foi criado o Sistema Nacional de Assistência e Previdência Social
– SINPAS, e, dentro dele, o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência
Social – Inamps. A criação do Inamps surgiu em função das dificuldades de reduzir os
custos da atenção médica, em face do modelo privatista e curativo vigente.
Ou seja, esperava-se que o Inamps, sendo uma autarquia vinculada aos dois sistemas,
atuasse como braço assistencial do SNS e como braço da saúde do sistema de proteção
social. A mesma lei que instituiu o SNS também atribuiu ao Ministério da Saúde a res-
ponsabilidade de formulação de políticas em saúde e execução das ações de interesse
coletivo, e ao MPAS, por meio do Inamps, as ações médico-assistenciais individualiza-
das. Ou seja, do ponto de vista estrutural não haviam ocorrido grandes mudanças. Em
termos práticos, o Inamps passou a ser o órgão prestador de assistência médica à custa
de compra de serviços médico-hospitalares e especializados do setor privado.
Como resultado de toda essa panaceia, os subsídios diretos dados a empresas privadas
para a oferta de assistência médica a seus empregados, segundo Paim (2010), foram
substituídos por descontos no imposto de renda, levando à expansão da oferta de servi-
ços médicos e ao crescimento de planos de saúde privados. Como era de se esperar, os
resultados da política de saúde do Inamps, associada à recessão econômica da década
de 1980, geraram uma crise de financiamento na previdência, que alimentou os anseios
por uma reforma sanitária.
59
MIDIATECA
NA PRÁTICA
Imagine se você fosse convidado para trabalhar com saúde coletiva e tivesse
que capacitar agentes de saúde sobre o SUS? Como você se sairia? O Brasil ca-
rece de gestores públicos qualificados para lidar com epidemias e pandemias.
Portanto, conhecer profundamente o SUS é o caminho para o sucesso. Esteja
preparado quando a oportunidade aparecer.
60
Resumo da Unidade 3
Com a instauração do regime militar em 1964 os IAPs foram unificados no Instituto Na-
cional de Previdência Social – INPS, que passou a subsidiar com financiamentos diretos
os hospitais privados levando à expansão do setor privado de clínicas, hospitais, equipa-
mentos e medicamentos, sem que houvesse uma melhoria significativa na assistência à
saúde. A política do INPS não foi capaz de conter os gastos crescentes da previdência e
nem as fraudes cometidas pelas parcerias público-privadas.
61
Referências
BUSATO, I. M. S.; GARCIA, L. F.; GARCIA, I. C. SUS: estrutura organizacional, controle, ava-
liação e regulação. Curitiba: Intersaberes, 2019. Biblioteca Pearson.
CASTRO SANTOS, L. A.; FARIA, L. Os primeiros centros de saúde nos Estados Unidos e
no Brasil: um estudo comparativo. Teoria e Pesquisa. Rio de Janeiro: v. 40, n. 41, p. 137-
181, 2002. Disponível em: Saúde e história segundo Luiz Antonio de Castro Santos e Lina
Faria (scielo.br). Acesso em: 20 de fev. 2021.
CORDOBA, E. SUS e ESF: Sistema Único de Saúde e Estratégia Saúde da Família. São
Paulo: Rideel, 2013. Biblioteca Virtual.
FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz & Terra, 1968. Disponível em:
Pedagogia do Oprimido (cpers.com.br). Acesso em: 20 de fev. 2021.
PAIM, J.; TRAVASSOS, C.; ALMEIDA, C..; BAHIA, L.; MACINKO, J. O Sistema de Saúde Bra-
sileiro: história, avanços e desafios. Salvador: The Lancet. v. 6735, n. 11, p. 60054-60058,
2011. Disponível em: 925_brazil1.pdf (actbr.org.br). Acesso em: 20 de fev. 2021.
62
UNIDADE 4
A criação do SUS — aspiração antiga por um sistema de saúde mais justo para todos
os brasileiros desde as décadas de 1940 e 1950 — foi um salto de civilidade para o Bra-
sil. Até chegarmos a uma política pública em que as prerrogativas principais fossem a
universalização da saúde (o fim da velha dicotomia entre saúde pública e assistência
médica), equidade (aquilo que é mais do que igualdade, é justiça) e integralidade (o ser
humano visto como alguém que sente, sofre e chora, e que também pode ser feliz), foram
décadas de sonhos e pesadelos. Porém, chegamos lá e agora temos que avançar. Não
podemos permitir que um BEM tão imenso seja precarizado! É disso que se trata esta
última unidade. Vamos em frente consolidar o nosso saber?
OBJETIVO
64
“O Massacre de Manguinhos” – A saúde no
contexto da ditadura militar
É importante frisar que aqueles que não possuíam carteira assinada, também conhe-
cidos como desempregados, não tinham direito à saúde — a não ser em hospitais de
caridade. Estes correspondiam à maior parte da população.
No Brasil, quem não tinha emprego formal ficava ao “deus-dará”. Outro problema im-
portante era que a saúde pública não estava integrada à assistência médica. A velha
dualidade ainda perdurava e correspondia a um entrave para a efetivação de uma política
de saúde justa, universal e integrada com outros setores. Entretanto, o sentimento de re-
forma crescia no seio da sociedade como um processo expansivo de antigas aspirações
do movimento sanitário, ou de grande parte dos sanitaristas.
A década de 1970 foi um período particularmente difícil. O Brasil experimentava uma das
fases mais duras do regime militar, quando vigorava o Ato Institucional no 5 (AI-5). Como
sabemos, o regime começou a vigorar em 1964 com um golpe de Estado, apoiado por
uma elite que detinha o poder econômico e por uma classe média conservadora, sobre o
então presidente eleito João Goulart, consolidando o sistema político brasileiro como um
processo raramente democrático. A saúde refletia a instabilidade política e jurídica desse
sistema disruptivo. As intermináveis reformas sempre ocorriam no cerne de interesses
65
populistas para legitimação de governos autoritários que ora tentavam satisfazer as jus-
tas demandas do movimento sanitário, ora as demandas dos trabalhadores, mas sem
perder o mercado de vista, seu principal interesse e maior aliado.
Importante
O AI-5 foi um decreto emitido pelo general Costa e Silva em 1968, que instaurou
o período mais sombrio do regime militar. Muitos historiadores e jornalistas
consideram que foi a consolidação da ditadura no Brasil. Com ele, o governo
adquiriu poderes quase que absolutos sobre a República. O Congresso foi fe-
chado, os direitos políticos e garantias constitucionais dos cidadãos foram su-
primidos, políticos foram cassados, exilados e assassinados (GASPARI, 2002).
Ampliando o foco
A ditadura militar de 1964 durou 21 anos e nos custou muito caro. Os jovens
eram permanentemente reprimidos e jamais puderam, por exemplo, ver um
show dos Beatles em solo brasileiro. Os militares, com sua pauta conserva-
dora, tinham como lema conceitos muito particulares sobre família, religião e
tradição. Por isso, consideravam inadequados todos os movimentos artísticos
de contestação. Assim, a juventude brasileira não pôde acompanhar os movi-
mentos de blues e jazz que se ressignificavam pelo mundo; os movimentos pop
que, quando raro, apareciam nas telenovelas constantemente censuradas ou
os grandes ícones do rock ‘n’ roll das décadas de 1970 e 1980 até 1985.
66
Foi o que aconteceu no Instituto Oswaldo Cruz (IOC). Após o AI-5, 10 dos principais
cientistas do IOC tiveram seus direitos políticos suspensos por perseguição pessoal e
foram impedidos de trabalhar. A punição estendeu-se à proibição de trabalhar em qual-
quer outro órgão federal. Acusados de conspiração, os cientistas foram interrogados e
indagados se eram comunistas ou se participavam de alguma atividade política. Entre as
acusações constava que eles eram a favor de ampliar as atividades do IOC para pesquisa
científica, além da produção apenas de soro e vacina.
Em 1979 subiu ao poder o último presidente da ditadura, o general João Batista de Oli-
veira Figueiredo (1979-1985). Militar pertencente à linha dura do regime, Figueiredo foi
eleito indiretamente por meio de um Colégio Eleitoral concorrendo pela Aliança Renova-
dora Nacional (ARENA/atual DEM), partido que congregava os parlamentares apoiado-
res da ditadura. O outro partido permitido pelos militares foi o Movimento Democrático
Brasileiro (MDB/atualmente também usa a sigla MDB), que, apesar de ter sido um partido
“figurativo” naquele contexto, representava uma porta de entrada para um modelo soft de
oposição. Nessa época, o regime militar já estava enfraquecido e carecia de legitimidade.
Foi quando o general Figueiredo pronunciou a sua célebre frase: “Hei de fazer do Brasil
uma democracia.” E, de fato, ele contribuiu para isso. O país, sob sua gestão, deu conti-
nuidade a uma abertura comercial lenta e gradual iniciada no governo anterior.
67
Ampliando o foco
Sob pressão intensa, o governo concedeu anistia ampla, geral e irrestrita aos
exilados, permitindo a volta de estudantes, professores, políticos, artistas, in-
telectuais e cientistas perseguidos pela ditadura durante a vigência do AI-5, in-
cluindo Herbert José de Souza (1935-1997), o Betinho, sociólogo brasileiro e
ativista dos direitos humanos no Brasil e que ficou eternizado em O bêbado e o
equilibrista, a espetacular letra de Aldir Blanc (1946-2020) para a música genial
de João Bosco na interpretação potente de Elis Regina (1945-1982).
Ampliando o foco
Com o fim da ditadura, os cientistas cassados foram reintegrados aos seus cargos e
eu — o autor que vos escreve —, em 1987, tive a oportunidade de estudar na graduação
com dois deles: o professor Hugo de Souza Lopes (1909-1991), um dos maiores entomo-
logistas do mundo, e o professor Herman Lent (1911-2004), helmintologista renomado
mundialmente. Fica aqui a minha homenagem à memória destes dois grandes mestres
da ciência brasileira.
68
Reforma Sanitária
A Reforma Sanitária representou um corte nas políticas reformistas dos governos auto-
ritários e populistas das décadas anteriores. Cabe lembrar que a burocracia crescente e
o alinhamento com iniciativas privatistas presentes na previdência social sempre foram
representações das forças que dominavam as políticas públicas de saúde, a despeito
dos ideais mais humanistas do movimento sanitário que, entrincheirado no Ministério da
Saúde e nos governos estaduais, ainda carregavam um ranço autoritário, verticalizado e
centralizador. O diferencial da Reforma Sanitária, que nasceu das aspirações reformistas
do movimento sanitário decadente da década de 1950, foi sua permeabilização no seio
da sociedade civil que acabou sendo seu fio condutor.
Já não era mais uma iniciativa governamental, partidária ou internacional, mas da socie-
dade como um todo.
Talvez por isso a reforma tenha nascido no contexto da luta pela redemocratização,
quando havia alinhamento de muitos setores da sociedade que já não suportavam mais
a ditadura como sistema de governo. Não por acaso, a liderança do movimento foi com-
partilhada entre profissionais da saúde e personalidades ligadas a movimentos sociais,
incluindo professores, intelectuais, sindicalistas, pesquisadores, entre outros.
69
Ampliando o foco
A Reforma Sanitária pretendia haver saúde para todos, de modo que as políticas de saú-
de fossem essencialmente integradas, não dicotomizadas, em um sistema universal que
permitisse acesso democrático para cada usuário para atender às demandas coletivas
e individuais a partir de um processo de racionalização dos procedimentos. O movimen-
to pretendia constituir-se um quadro contra-hegemônico, crítico do modelo dominante,
para produzir reformas nas políticas de saúde vigentes. Tratava-se de um novo resgate
dos sertões, a retomada de uma ideologia proto-humanista de reconstrução de uma
identidade nacional inacabada. Ou o devir de uma consciência sanitária capaz de costu-
rar um vínculo robusto entre sociedade e saúde.
Importante
70
eficiente da assistência médica no contexto de atenção primária. A proposta implicava
acesso de toda a população aos avanços tecnológicos de saúde. Os grupos contrários
à ditadura militar utilizaram essa proposta como estratégia no combate ao regime auto-
ritário e a favor da redemocratização a partir de uma Reforma Sanitária democrática e
inclusiva. Entretanto, o real motivo da reforma e principal elemento motivador, dentro de
uma conjuntura que lhe era favorável, foi o esgotamento do modelo hospitalocêntrico e
a falência da medicina assistencial que, em seu auge, acumulava perda progressiva de
qualidade (JUNIOR; ALVES, 2007).
A pressão exercida pelo movimento de Reforma Sanitária levou o poder público a respon-
der com a criação do Prevsaúde em 1979 — iniciativa dos Ministérios da Saúde – MS e
da Previdência e Assistência Social – MPAS, que pretendiam reunir e gerir os recursos
do Inamps. Além disso, tinha por finalidade regionalizar a assistência, hierarquizar os ser-
viços e os profissionais, padronizar os procedimentos, integrar as instituições, definir a
atuação do setor privado, simplificar o cuidado médico e viabilizar a participação comuni-
tária. O plano foi amplamente festejado pelos setores progressistas do MS e MPAS, mas
rejeitado pelos representantes do setor privado que controlavam politicamente o Inamps
e viam no Prevsaúde riscos à crescente privatização da “saúde previdenciária”. Foi, então,
o fim do Prevsaúde (DIMENSTEIN, 1998).
Em plena onda reformista, o fracasso da Prevsaúde, que para alguns não passava de uma
farsa da ditadura militar (NARVAI, 2013), deixou claro que o país precisava caminhar para
um sistema unificado, que viria somente com a Constituição Federal de 1988. Assim, em
1981, com a continuidade do crescimento da dívida previdenciária, foram intensificados
os esforços de racionalização da oferta de serviços, acentuando a tendência anterior de
integração da rede pública de atenção à saúde. Neste contexto, setores progressistas do
Inamps e do Ministério da Saúde criaram o Conselho Consultivo da Administração de
Saúde Previdenciária – Conasp, que propunha normas mais adequadas para a prestação
de serviços de saúde à população, bem como mecanismos de gestão financeira mais
confiáveis que exercessem controle mais calibrado sobre todas as etapas de assistência
médica. Assim, foram priorizadas as ações básicas de saúde com ênfase na assistência
primária e atendimento ambulatorial humanizado (JUNIOR; ALVES, 2007).
Em 1983, como parte das estratégias do Conasp, surgiram dois grandes programas:
71
O primeiro consistia em um projeto de racionalização das contas hospitalares e o segun-
do passou a ser o eixo de organização para uma atenção integral à saúde, que incluía
uma rede de serviços integrados e regionalizados (DIMENSTEIN, 1998).
As AISs eram postos de saúde pequenos criados a partir de convênios das prefeituras
com a Previdência Social, considerados berços da atenção básica, futura porta de entra-
da do SUS. Portanto, com as AISs, foi possível racionalizar e revitalizar a oferta do setor
público a partir de mecanismos de regionalização e hierarquização da rede pública das
três esferas governamentais, que sempre foram desarticuladas. Progressivamente ocor-
reu a universalização de clientelas em um contexto de descentralização dos serviços e
ações em direção aos municípios.
Em 1985, com o fim da ditadura militar, um fato importante e definitivo ocorreu: o médico
Hésio de Albuquerque Cordeiro (1942-2020) assumiu a presidência do Inamps com a
promessa de acabar com a entidade e colocar em seu lugar um sistema público univer-
sal de saúde. Assim, o Inamps passou aos poucos de um modelo voltado à prestação
de serviços médico-hospitalares para um sistema de acesso universal aos serviços de
saúde, com base no princípio da Seguridade Social. Na presidência do Inamps, Cordeiro
levou o órgão a defender as bandeiras da Reforma Sanitária, contribuindo para fundar as
bases do futuro SUS. A prioridade de sua gestão foi a universalização do acesso aos ser-
viços de saúde a fim de reduzir as desigualdades entre populações urbanas e rurais. Em
sua gestão, as AISs foram expandidas para cerca de 2.500 municípios, área geográfica
onde viviam aproximadamente 90% da população do país (D’ÁVILA, 2020).
No rastro das inovações das políticas públicas de saúde foram organizadas por vários
municípios as Redes de Unidades de Saúde para atenção primária, com a participação
de universidades como as de Niterói, Londrina, Campinas e outras. Tanto os debates sobre
os melhores modelos de assistência primária no contexto da assistência médica, quanto
as experiências intermunicipais de unidades de saúde fomentaram a Reforma Sanitária
que culminou na VIII Conferência Nacional de Saúde em 1986 (JUNIOR; ALVES, 2011).
72
A VIII Conferência Nacional de Saúde foi um marco na história do SUS.
O evento foi realizado na cidade de Brasília sob a presidência de Antônio Sérgio da Silva
Arouca (Sérgio Arouca), ex-presidente da Fiocruz, após conferências preparatórias por
todo o Brasil. O evento contou com a participação de aproximadamente 5.000 pessoas
representantes dos diversos movimentos sociais, além de médicos, enfermeiros, psicó-
logos, parlamentares, sindicatos, estudantes, intelectuais, cientistas, entre muitos outros.
No evento debateu-se a criação do SUS através da unificação do Inamps e do Ministério
da Saúde. Entre os inúmeros conferencistas, um dos mais concorridos foi o próprio Sér-
gio Arouca, sanitarista consagrado. Na ocasião, Arouca discorreu sobre o conceito am-
pliado de saúde formulado no próprio evento. O conceito definiu a saúde como o comple-
to bem-estar físico, mental e social e não a simples ausência de doença (AROUCA, 1986).
Ampliando o foco
No ano de 1987, ainda na gestão de Hésio Cordeiro frente ao Inamps, teve início a im-
plantação do Sistema Único Descentralizado de Saúde – SUDS por meio de convênios
com secretarias estaduais e municipais de Saúde. O SUDS era uma espécie de aper-
feiçoamento das AISs e uma antessala do SUS, e tinha como objetivo universalizar a
73
assistência e reafirmar a política de descentralização dos serviços de saúde a partir da
estadualização e municipalização (DIMENSTEIN, 1998).
74
SUS
No Brasil as coisas não são tão simples: lei tem que pegar! Se ela não
pega, você não é pego por ela.
... estamos lendo o Artigo 196 da Constituição Federal do Brasil de 1988 — uma lei com-
patível com as aspirações de um país que deseja justiça e amparo aos seus cidadãos.
O referido artigo retrata quem somos e também quem desejamos ser, porque ainda não
fizemos valer a lei em sua totalidade, mas queremos que ela se cumpra. É este um dos
aspectos da identidade sanitária pela qual tanto se lutou. A lei diz que é preciso ações
de promoção de saúde como forma de política social para que ocorra redução e riscos
de doenças e agravos.
Se lermos o artigo 197, veremos que cabe ao poder público regulamentar, fiscalizar e
controlar o sistema de saúde, devendo sua execução ser feita diretamente ou por meio
de terceiros. Observe o contexto: “por meio de terceiros” — trata-se da velha medicina
liberal que conseguiu se inserir no texto para garantir seu filão.
Basta ver o Artigo 199: A assistência à saúde é livre à iniciativa privada, que poderá com-
plementar o SUS. No texto, fica claro que a ideia de “complementar o SUS” significa utili-
zar dinheiro público para fins lucrativos, exatamente como no passado, quando a saúde
75
privada e a medicina liberal vendiam serviços e equipamentos para o antigo Inamps sem
que para isso a assistência fosse de qualidade, humanizada ou integralizada.
Para refletir
Por outro lado, o que está escrito no Artigo 198 representa um salto extraordinário e uma
conquista dos reformistas (BRASIL, 1988).
Importante
No Artigo 198 está muito claro de onde vem o recurso para o SUS. Entre ou-
tros, o SUS será financiado com recursos da Seguridade Social (SS). A Reforma
Sanitária representou um período de transição entre a Previdência Social e a
Seguridade Social. Portanto, é importante compreender que são coisas com-
pletamente diferentes.
76
Neste contexto, a Seguridade Social é formada por três serviços principais que corres-
pondem a um tripé constituído por:
Seguridade Social
SS
Assistência Previdência
Social Social
SUAS
Ampliando o foco
77
Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio – PNAD, divulgada pelo IBGE
em dezembro de 2019, o Brasil bateu novo recorde de trabalhadores informais: um total
de 24,4 milhões de trabalhadores sem carteira assinada que, somados aos 12,4 milhões
de desempregados, segundo a mesma pesquisa, formavam uma multidão de 36,8 mi-
lhões de brasileiros que não contribuíam para a Seguridade Social e, portanto, que não
possuíam direito previdenciário.
Logo, a Seguridade Social passou a possuir uma lacuna, impedindo uma grande quanti-
dade de trabalhadores informais e a totalidade de desempregados de terem acesso inte-
gral aos benefícios. Nesse caso, o conceito de Universalidade não se verifica. Por outro
lado, a Saúde sob o comando do SUS, e a Assistência Social sob o comando do SUAS
(Sistema Único de Assistência Social), dois dos três eixos do tripé da Seguridade Social,
são acessíveis à totalidade dos brasileiros, independentemente de contribuição.
78
Para refletir
A Atenção Primária à Saúde – APS é o modelo que predomina nesse tipo de política e
corresponde ao primeiro nível ou o momento em que se inicia o processo de atenção em
um sistema de saúde. No SUS, a APS surge como uma estratégia fundamental, tornan-
do-se o principal e o primeiro ponto de contato entre as pessoas e os serviços. É cha-
mado de porta de entrada do SUS. Esse nível de atenção fornece uma atenção integral e
aborda a maioria das demandas em saúde da população de forma longitudinal (ao longo
do curso de vida). A APS está voltada para responder de forma regionalizada, contínua e
sistematizada à maior parte das necessidades de saúde de uma população, integrando
ações dos tipos:
1. Preventivas.
79
2. Curativas.
3. Coletivas (atenção a indivíduos e comunidades).
O SUS brasileiro adotou o modelo inglês de Atenção Primária à Saúde, com base no
Relatório Dawnson (1920), sendo uma forma de organização criada em contraponto ao
modelo norte-americano de cunho curativo, fundado no reducionismo biológico e na
atenção individual. A proposta principal do modelo inglês é a de hierarquização de níveis
de atenção à saúde com a seguinte organização:
Com base nesse modelo, o SUS se organizou de acordo com os seguintes modos hie-
rárquicos:
1. Baixa complexidade.
2. Média complexidade.
3. Alta complexidade.
80
Sendo o nível 1 a porta de entrada do sistema, o paciente é conduzido aos demais
níveis de acordo com a complexidade do seu caso.
Agora, cabe a você, agente do seu próprio saber, utilizar as ferramentas aqui disponibi-
lizadas para aprofundamento acerca de Políticas Públicas de Saúde e reformulação de
novos saberes. Lembre-se de que não podemos perder de vista a importância do salto
civilizatório que foi a criação do SUS em um país tão carente de cuidado e amparo.
Todos nós, profissionais de saúde e futuros profissionais, temos o dever de conhecer a
nossa principal política de saúde: o Sistema Único de Saúde – SUS.
81
MIDIATECA
NA PRÁTICA
82
Resumo da Unidade 4
Na década de 1970 o Brasil vivia uma ditadura militar cruel e sanguinária por conta de
sua fase mais dura relacionada ao Ato Institucional nº 5 (AI-5), decretado pelo regime
em 1968. A saúde refletia a instabilidade política e jurídica de um sistema disruptivo,
caracterizado por reformas que sempre ocorriam no âmago de interesses populistas de
legitimação de governos autoritários intermináveis. Neste período ocorreu o “Massacre
de Manguinhos”, quando 10 dos nossos melhores cientistas foram cassados por perse-
guição política, gerando enormes prejuízos para a ciência brasileira. Em 1986 ocorreu a
VIII Conferência Nacional de Saúde, expressão máxima da Reforma Sanitária e marco
na história do SUS e na luta contra o autoritarismo pela democracia. Em 1988 o SUS foi
aprovado na nova Constituição Federal, consolidando um modelo de prestação de servi-
ço baseado em descentralização e no conceito de rede hierarquizada e regionalizada. O
sistema viabilizou o acesso gratuito e igualitário aos serviços para promoção, proteção,
recuperação e reabilitação dos indivíduos.
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Referências
D’AVILA, C. O homem que lançou as bases do Sistema Único de Saúde (SUS). Café
História. Publicado em: 07/12/2020. Disponível em: O homem que lançou as bases do
Sistema Único de Saúde (SUS) (cafehistoria.com.br). Acesso em: 20 de fev. 2021.
LENT, H. O massacre de Manguinhos. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2019. Disponível em: Mas-
sacre_Manguinhos_2019_vers_web.pdf (fiocruz.br). Acesso em: 20 de fev. 2021.
NARVAI, P. C. Prevsaúde: tragédia e farsa. CEBES. 2013. Disponível em: Prevsaude: tragé-
dia e farsa | Cebes. Acesso em: 20 de fev. 2021.
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