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Todas essas fases de entendimento sobre saúde têm no indivíduo o centro de seu
interesse. Nessa lógica, a saúde é algo que tem relação com o bom funcionamento
do corpo, naquilo o que, pela observação deveria ser o correto funcionamento dos
órgãos e sua influência para todo o organismo. Mesmo que, segundo concepções
totalmente díspares, considerando a concepção mágico-religiosa da antiguidade, a
condição de saúde está ligada à ausência de doença, aos atos do indivíduo e ao bom
funcionamento do corpo (FARINATTI; FERREIRA, 2006).
É nesse contexto que Louis Pasteur (1822 – 1895) entra em cena – seus
trabalhos forneceram novos modelos e aspirações à ciência médica,
consolidando o mais importante paradigma das ciências da saúde. Pasteur
foi o grande promotor da teoria do germe e da legitimação da era
bacteriológica. As importantes descobertas no domínio das doenças
infecciosas revolucionaram as teorias que explicavam as causa das
enfermidades e da boa saúde, eclipsando o papel do comportamento
individual e das condições de vida, ao mesmo tempo em que realçavam a
gênese das doenças em si. No momento em que o trabalho dos
epidemiologistas atingia o seu apogeu em termos de aceitação e
reconhecimento, um novo paradigma, muito mais restritivo, mas igualmente
muito mais produtivo fazia sua aparição. A partir da afirmação da teoria do
germe e da doutrina da etiologia específica, a maneira pela qual se
concebiam as origens, a prevenção e o tratamento das doenças se
modificaria profundamente. A procura de microrganismos específicos
praticamente monopolizaria os recursos materiais e intelectuais que regiam a
educação, a intervenção e a investigação médica (FARINATTI; FERREIRA,
2006, p. 33).
A influência do paradigma biomédico, fez enfraquecer a forma de formas mais plurais
de compreender a saúde e isso influenciou/influencia a forma como a temática da
saúde é tratada como conteúdo didático nos currículos escolares. Estudos como os
de Mendes Silva (2019) e Rudek e Hermel (2021), que pesquisaram as concepções
de saúde em livros didáticos nas séries da educação básica, corroboram essa
influência do paradigma biomédico, com os resquícios de uma abordagem focada no
indivíduo.
Hooks (2013) concorda que o discurso científico nas sociedades ocidentais aborda o
ser humano segundo uma concepção dualista na qual corpo e mente são
considerados de forma dicotômica e hierarquizada. Nesse aspecto, na escola, o corpo
é sempre o que precisa ser calado (ou domesticado) para que seja possível a atenção
e o processo educativo ocorra. Há sempre o incômodo do corpo com seus desejos,
odores, movimento, inquietação, entre outros elementos que carecem da educação
escolar disciplinar. Nessa perspectiva, ou o corpo surge como um incômodo ou
“dissecado” em suas partes, para o estudo disciplinar do funcionamento de suas
partes. Aqui, o corpo não é tematizado como conteúdo de ensino, formando uma
unidade no ser, canal de percepção e leitura de mundo e relacionamento com os
demais sujeitos, dificultando, assim, o tratamento do tema saúde para além do
paradigma hegemônico.
Sendo assim, por mais que tenhamos avanços e abordagens na área de produção de
conhecimento em saúde, ao reconhecer as discussões nas áreas de psicologia,
sociologia, antropologia, etc., uma abordagem que seja significativa na educação e
ensino da saúde, que traga essas discussões, não figura como tarefa simples.
Para além das áreas médicas e biológicas (microbiologia, anatomia, etc.), a área da
psicologia, antropologia, sociologia, as áreas interdisciplinares como saúde coletiva,
responsável por integração da educação em saúde no âmbito formal, não formal e
informal, considerando os saberes populares e as esferas de atendimento e às redes
de atenção à saúde, tem dado importantes contribuições para o estabelecimento de
formação e atenção à população, inclusive em formação e educação e saúde
(CECCIM; FERLA, 2020).
Entende-se como importantes um ensino que se propõe tratar saúde, que considera
o ensino de ciências, precisará abordar, seguindo a tradição do paradigma biomédico,
as questões focadas no indivíduo, no funcionamento global do corpo (fisiologia) e no
entendimento das partes (anatomia). Considerando a atualidade pandêmica que
vivemos, os elementos de microbiologia, biotecnologia, para tratar de vacina,
contaminação, as técnicas de proteção para os diferentes tipos de contaminação, etc.,
são conhecimentos dos quais não se pode ignorar.
REFERÊNCIAS
CECCIM, Ricardo Burg; FERLA, Alcindo Antônio. Editorial: Educação e ensino da saúde:
ensino formal, não formal e informal. In: Saúde em redes. 2020; 6(1): pp. 5-9.
FARINATTI, Paulo de Tarso Veras; FERREIRA, Marcos Santos. Saúde, promoção da
saúde e educação física: conceitos, princípios e aplicações. Rio de Janeiro: EDUERJ,
2006.
HOOKS, Bell. Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade. São Paulo:
Editora WMF Martins Fontes, 2013.
KUHN, Thomas Samuel. A estrutura das revoluções científicas. 12 ed. São Paulo:
Perspectiva, 2013.
LOPES, Alice Ribeiro Casimiro. Conhecimento escolar: ciência e cotidiano. Rio de Janeiro:
EdUERJ, 1999.
MENDES SILVA, Premma Hary. As abordagens da educação em saúde em livros
didáticos de biologia. 2019. 99 f. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências e
Matemática) – Universidade Federal do Maranhão, São Luís, 2019.
MOREIRA, Marco Antonio. Teorias de aprendizagem. 3ª ed. ampl. Rio de Janeiro: LTC,
2022.
RUDEK, Karine; HERMEL, Erica do Espirito Santo. Educação em saúde nos livros
didáticos de ciências e biologia brasileiros: um panorama das teses e dissertações
(1994 – 2018). Sustinere, 2021, Rio de Janeiro, v. 9, suplemento 1, p. 3-20, mar.