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Banco de proteína: Guandu


Alternativa para pecuária de corte

Antonio João Lourenço – ajlourenco@iz.sp.gov.br


Pesquisador científico – Instituto de Zootecnia

Introdução
As leguminosas forrageiras têm importante função no aumento de produção e
produtividade das pastagens, e conseqüentemente na obtenção de mais carne e leite por unidade
de área com menor custo.
Destacam-se três principais funções das leguminosas no sistema de produção das
pastagens:
1 – Fixação simbiótica do nitrogênio atmosférico, através das bactérias (rhizobium), que
estão localizadas nos nódulos de suas raízes. Esse mecanismo biológico de retorno de nitrogênio
atmosférico para o complexo solo-planta é de grande importância para os sistemas de produção
com pastagens.
2 – Deposição de folhas na superfície do solo, aumentando a matéria orgânica, um
componente importante da fertilidade, que exerce múltiplos efeitos sobre as propriedades física,
química e biológica do solo.
3 – A presença da leguminosa em proporções adequadas em uma pastagem consorciada
(gramínea + leguminosa) ou em plantio de culturas puras (banco de proteína) contribui para uma
dieta de melhor qualidade, principalmente durante o período da “seca”.
Uma das maiores dificuldades para produção de carne a pasto nas condições tropicais e
subtropicais é a ocorrência da estacionalidade da produção da matéria seca das plantas
forrageiras, e como alternativa para amenizar o período crítico é sugerida a utilização de
leguminosas para pastejo.
Diversas leguminosas vêm sendo estudadas para avaliar o potencial forrageiro, e ser
empregada na alimentação de bovinos em pastejo ou mesmo como fonte de nitrogênio. Entre
essas leguminosas forrageiras tropicais destaca-se o guandu.
Define-se como banco de proteína uma área adjacente com planta forrageira de qualidade
superior, sob condições de manejo especifico com objetivo de produzir suplemento alimentar à
bovinos em pastejo.

GUANDU
O guandu é uma leguminosa arbustiva, semi-perene, apresentando caule lenhoso e raiz
principal pivotante profunda.. As raízes secundárias são mais finas, apresentando nódulos que
contém bactérias do gênero Rhizobium, que fixam simbioticamente o nitrogênio atmosférico.
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As folhas são trifoliadas e a emissão da inflorescência é sensível ao efeito do fotoperíodo


nas condições tropicais.
O guandu é planta que produz grande quantidade de sementes, e os testes de germinação
mostram que 80 a 90% geminam com até quatro anos de armazenagem em condições adequadas.
A época de plantio é um fator importante que pode interferir na proporção de folha/caule no
guandu. O plantio realizado em dezembro tem favorecido uma melhor proporção de folhas,
principalmente no primeiro ano da cultura, disponibilizando forragem de melhor qualidade para
utilização no período critico do ano, como banco de proteína.
Segundo SEIFFERT (1988), os teores de proteína bruta do guandu variam entre as
variedades, entre os corte e épocas do ano, de um mínimo de 13% a um máximo de 20,2%.
LOURENÇO et al. (1994) encontrou teores entre 18,0 a 25,5% de proteína bruta nas folhas do
guandu disponível como banco de proteína, o que evidência a alta qualidade da forragem. Os
valores de proteína bruta, determinados nos caules do guandu disponível, foram inferiores aos das
folhas.
Segundo LOURENÇO et al. (1983), o uso de banco de proteína com o guandu para
pastejo durante a época crítica do ano, mostrou-se viável para melhorar o ganho de peso de
animais, principalmente nos meses de junho-julho. Bovinos mantidos em pasto de capim-colonião
exclusivo sem acesso ao banco de proteína mantiveram o mesmo peso, enquanto que os animais
com acesso ao guandu apresentaram ganhos de peso vivo de 242 gramas/animal/dia no período
das “secas”.
O guandu como banco de proteína contribui positivamente no ganho de peso vivo animal
diário durante o período de utilização nas “secas”, aumentando a produtividade.
Em Campo Grande (MS) no Centro Nacional de Pesquisa de Gado de Corte, um sistema
de pasto, usando 1/3 da área em banco de proteína de guandu dentro de pastagem de Brachiaria
decumbens para recria de bezerros desmamados (150 – 180 kg de peso vivo) com lotação de 3
cabeças por hectare, e com acesso livre de julho a outubro, proporcionou ganho de 18 kg de peso
vivo a mais por animal, quando comparado com área idêntica de Brachiaria decumbens, sem a
inclusão do banco de proteína.

Pasto Peso inicial Peso final Ganho animal Ganho hectare


(kg) (kg) (kg) (kg)
Brachiaria
(5ha) 180 210 30 90
Brach+guandu
(3,5 ha) + (1,5 ha) 173 221 48 144
Obs.: Período de suplementação de 114 dias na estação seca . Média de 15 bezerros por
tratamentos.
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SCHAFFHAUSEN (1966) conduziu um trabalho no Estado de São Paulo, no qual o guandu


foi plantado nas curvas de nível em pastagens de capim-pangola, verificando que novilhos zebu
ganharam em média 35 kg/animal em 93 dias durante severo período de “seca”, enquanto que
animais mantidos somente em pastagens de pangola perderam peso.
Em estudo do potencial forrageiro do guandu como banco de proteína, empregando
diferentes percentuais (0: 18: 33 e 51%) em áreas associado ao capim-jaraguá, LOURENÇO et al.
(1984) observaram ganhos de peso de novilhos Nelore.

Área Período da “seca”


De Jun/Ago Set./Dez. Jun./Dez.
guandu (56 dias) (140 dias) (196 dias)

% Ganho de P.V. (kg/dia)


0 0,196 0,314 0,280
18 0,411 0,307 0,342
33 0,750 0,300 0,428
51 0,607 0,314 0,398

Em outro trabalho, LOURENÇO & DELISTANOV (1993) avaliaram por dois anos o
desempenho de bovinos em pastagens de capim-colonião com livre acesso ao banco de proteína
de guandu. Os dados mostram que os ganhos médios anuais e diários de peso vivo dos bovinos
com acesso ao banco de proteína foram melhores do que os mantidos em pasto exclusivo de
capim-colonião.
10. Ano 20. Ano
Pasto Kg animal /dia
Colonião exclusivo 0,455 0,335
Colonião + guandu 0,482 0,381

FAVORETTO et al. (1989) estudaram o desempenho de novilhos com peso vivo inicial de
200 kg, pastejando colonião com acesso ao guandu durante a estação seca, colonião adubado
com 100 kg N/ha e colonião consorciado com soja perene empregando o sistema put-and-take
com o ajuste da carga animal em função da disponibilidade de forragem. Os ganhos de peso vivo
na estação seca foram 356 g/animal/dia e 104 kg/ha para o pasto de colonião com acesso ao
guandu, 262 g/animal/dia e 55 kg/ah para o pasto de colonião adubado com nitrogênio e 199
g/animal/dia e 41 kg/ha para o pasto de colonião consorciado com soja perene. Os autores do
trabalho afirmam que os ganhos de peso vivo diário dos animais no capim-colonião, foi mais
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elevado devido o livre acesso ao guandu, enquanto que os ganhos registrados no pasto
consorciado foi menor em razão da baixa percentagem de soja perene no pasto.
Uma das formas de utilização do guandu na alimentação animal, é o seu fornecimento no
cocho como volumoso, que também contribui com uma fração na suplementação protéica.
MANZANO, et al. (1988) conduziram um trabalho com objetivo de estudar a viabilidade da
utilização do guandu na engorda de novilhos da raça canchim em confinamento. Entre os
tratamentos estudados o guandu participou com 55 e 65% da matéria seca das rações. Os
autores concluíram que o guandu picado fornecido no cocho proporcionou custos de produção
mais baixo por quilo de ganho de peso vivo com animais mantidos em confinamento.

DIETA SELECIONADA
É muito comum entre os pecuaristas ou mesmo técnicos de zootecnia questionar a
respeito da aceitabilidade da leguminosa quanto a participação na dieta do total da matéria seca
disponível no pasto.
Aplicando-se a teoria do fracionamento isotópico com a variação natural do carbono
determinado nas fezes dos bovinos presentes em pasto de gramínea (grupo fotossintético C-4) e
leguminosas (grupo fotossintético C-3) é possível obter o percentual de uma das espécies que
participam da dieta ingerida.
Vários trabalhos de pesquisa têm demonstrado que a leguminosa participa da dieta em
proporções variadas durante o ano quando disponível no pasto.
Os resultados demonstram que o guandu participa da dieta dos bovinos em proporções
elevadas no inicio do livre acesso ao banco de proteína no período da seca, e decrescendo depois,
a medida que o tempo decorre. Nesse período (seca), o valor nutritivo das gramíneas decresce
acentuadamente, e a presença da leguminosa na dieta dos bovinos em pastejo contribui para uma
melhor qualidade da forragem consumida.
Trabalhos de pesquisa com bovinos em pastejo confirmam a expressiva participação do
guandu na dieta durante o período das “secas” (LOURENÇO, et al., 1984, FAVORETTO, et al.,
1988 e LOURENÇO et al., 1992)
A participação do guandu na dieta selecionada pelos bovinos com livre acesso ao banco
de proteína, onde a leguminosa foi estabelecida em plantio direto, foi de 58% do total da matéria
seca ingerida, demonstrando sua aceitabilidade no período das “secas”.

PLANTIO DIRETO
A formação do banco de proteína com guandu através do plantio direto com aplicação de
herbicida glyphosate (roundup - 1,0 litro/0,6 há) sobre pastagem degradada é uma pratica viável, e
que proporciona redução de custos na recuperação do pasto como ficou demonstrado para
implantação de projeto de pesquisa para avaliação de desempenho animal a pasto. As ilustrações
mostram a seqüência da formação do banco de proteína com o guandu em plantio direto em pasto
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estabelecido de capim-aruana (Panicum maximum), na fase de implantação de projeto de pesquisa


para avaliação de desempenho animal.

10 dias após plantio 50 dias após plantio

Banco de
proteína
Guandu

Após
pastejo

Os resultados de pesquisa têm mostrado através de décadas com diferentes sistemas de


avaliações, que o guandu é planta forrageira viável para utilização como banco de proteína,
principalmente quando formado em área degradada de pastagem de gramínea. Portanto, é uma
alternativa recomendável pela convergência de interesses econômicos, sociais e ambientais em
sistema de exploração agropecuária. É importante ressaltar que após dois anos da implantação do
guandu, o capim recuperou o seu vigor vegetativo com o decréscimo da presença da leguminosa
na área de plantio direto.
O guandu não é uma leguminosa milagrosa, mas os resultados dos trabalhos de pesquisas
mostram o seu potencial para com aumento do ganho de peso vivo de bovinos a pasto,
principalmente durante o período crítico e no seu primeiro ano de estabelecimento.

BIBLIOGRAFIA
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