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História da Leitura

*Felipe de Queiroz Nopes

Em seu livro Uma história da leitura, Alberto Manguel afirma que a leitura
começa com os olhos, visto que as letras são aprendidas pela visão. Segundo
ele, “lemos para compreender, ou para começar a compreender. Ler, quase
como respirar, é nossa função essencial”. Desde o passado, a prática da leitura
era vista como fortalecimento da memória e ampliação e transmissão do
conhecimento adquirido pelos leitores, que se deixavam envolver pelas
histórias e se apropriavam das reflexões dos autores.

O livro era – e continua sendo – uma espécie de companhia para aqueles


que se sentiam sós. Ler, muitas vezes, tornava-se um refúgio, pois permitia
que os leitores usassem a imaginação e viajassem nas histórias contadas
pelos autores. As leituras costumavam ser solitárias e feitas em voz alta. Liam-
se diversos livros de romance, ensaios, poemas, textos da Bíblia e de filósofos.

Os estudiosos medievais confiavam na memória que tinham dos livros


lidos, por meio de técnicas de memorização que aprendiam dede criança. Na
sociedade cristã da baixa Idade Média e começo da Renascença, aprender a
ler e a escrever fora da igreja era um privilégio exclusivo da aristocracia e,
depois do século XIII, da alta burguesia. A ama da criança, caso soubesse ler,
iniciava o ensino, soletrando as letras em voz alta. Em outros casos, essa
tarefa era realizada pela mãe da criança.

Até a invenção da imprensa, a alfabetização era rara e os livros eram


propriedade dos ricos. A simples posse de livros implica uma posição social e
certa riqueza intelectual. Pessoas afortunadas contratavam alguém para ler
livros para elas ou para seus filhos em suas casas, geralmente à noite ou então
pela manhã, quando a escola permitia.

Mais recentemente, muitos leitores começaram a fazer anotações nos


livros sobre informações que não querem esquecer, ou seja, que vão auxiliar a
sua memória sempre que necessário. Também tornou-se possível recorrer à
busca de dados nos inúmeros sites disponíveis na internet ou no acervo das
bibliotecas físicas.

Atualmente, homens e mulheres têm a mesma liberdade para escrever


livros sobre os mais variados temas, sem distinção e sem limites entre os
escritores de ambos os sexos, o que não acontecia antigamente. Hoje, a leitura
é livre para quem desejar desfrutá-la, sem barreiras quanto à idade, ao sexo, à
raça, à religião ou ao grau de instrução dos leitores.

Principais acontecimentos na linha do tempo da leitura:

- Duas pequenas placas de argila de formato retangular encontradas em 1984


em Tel Brak, na Síria, datando do quarto milênio antes de Cristo, com “um
pequeno entalhe em cima e uma espécie de animal puxado por uma vara no
centro”, revelaram os sinais mais antigos da escrita que a humanidade já
conheceu.

- Na Idade Média, tornou-se popular na Europa o livro de orações pessoais ou


livro de horas, visto que boa parte da vida dos europeus se passava em ofícios
religiosos.

- Até parte da Idade Média, tendo em vista que poucas pessoas sabiam ler, as
leituras públicas eram comuns e os textos medievais exigiam que os ouvintes
"prestassem ouvidos" à história.

- Denominado de códice o feixe de páginas encadernadas, as Epístolas de


Paulo eram um códice de papiro encadernado e manuscrito em escrita
contínua, na nova letra uncial ou semiuncial que apareceu nos documentos
romanos nos últimos anos do século III. Algum tempo depois, o códice passou
a ser feito de pergaminho e se tornou a forma comum dos livros para
autoridades e padres, viajantes e estudantes, substituindo os rolos de papiro
nos quais os textos eram escritos.

- No século IV, até o aparecimento do papel na Itália, oito séculos depois, o


pergaminho foi o material preferido em toda a Europa para fazer livros.

- Durante o século IX, os escribas começaram a separar uma palavra da outra,


a fim de simplificar a leitura de um texto.

- A leitura silenciosa se tornou usual no Ocidente, no século X (exemplos


anteriores são muito mais incertos), permitindo a comunicação sem
testemunhas entre o livro e o leitor. Até então, a leitura era feita em voz alta
(norma desde os primórdios da palavra escrita).

- Ainda no século X, as escolas foram estabelecidas em torno da figura de um


professor, o qual realizava as práticas de leitura e de escrita com os
estudantes.

- Nos séculos XII e XIII, os filósofos desenvolveram o método escolástico, que


consistia em treinar o estudante a considerar um texto de acordo com certos
critérios preestabelecidos e aprovados, incutidos neles por meio de muito
trabalho e sofrimento. Também neste período, os livros eram lidos em voz alta
para familiares e amigos nas cortes e, às vezes, em casas mais humildes, com
o objetivo de instruí-los e entretê-los.

- Durante o século XIV, ler livros deixa de ser uma prática exclusiva da nobreza
e do clero e passa a ser exercida também pela burguesia.

- Entre 1450 e 1455, Johann Gutenberg produziu uma Bíblia com 42 linhas por
página – o primeiro livro impresso com tipos – e levou as páginas impressas
para a Feira Comercial de Frankfurt, na Alemanha. Pela primeira vez, por meio
de máquinas impressoras, era possível produzir material de leitura rapidamente
e em grandes quantidades.
- Na metade do século XV, a leitura estava se tornando responsabilidade de
cada leitor individual, que devia ler por si mesmo.

- No século XVI, o método escolástico dominava nas universidades e em


escolas de paróquias, mosteiros e catedrais de toda a Europa.

- Leituras públicas informais em reuniões não programadas eram bastante


comuns no século XVII.

- Entre 1865 e 1870, ocorreram leituras públicas entre os trabalhadores de


fábricas e oficinas de Cuba, pois a maioria da população ainda era analfabeta.
Os textos lidos envolviam política, ciência, literatura, poemas e contos. Em
1869, a prática dessas leituras surgiu nos Estados Unidos e eram realizadas
pelos próprios operários, que costumavam ler também romances e coleções de
poesia clássica e moderna.

- Ainda no século XIX, diversos livros costumavam ser lidos pelos burgueses
durante as longas viagens de trem. Em toda a Europa, o século XIX foi a “idade
de ouro” da leitura em público feita pelos próprios autores, tanto em residências
quanto em salas de assembleia, livrarias, escritórios, salões, entre outros
ambientes.

- Já no final do século XX, mais precisamente nos anos 90, com a


comercialização em massa dos computadores lançados anos antes e a sua
aquisição por uma grande quantidade de pessoas no mundo todo, juntamente
com a disseminação da internet, muitos livros começaram a ser digitalizados ou
lançados em formato digital (e-books). Em consequência disso, a leitura
também passou a ser feita de forma online. Além disso, a internet possibilitou
aos usuários o acesso a inúmeros sites com conteúdo informativo em nível
mundial, permitindo, desde então, que a leitura seja praticada onde e quando o
leitor desejar, podendo ler vários materiais ao mesmo tempo. No entanto, essa
nova forma de leitura não substituiu a tradicional, com o livro impresso em
mãos, praticada até os dias atuais e de forma linear, ou seja, do início para o
fim, página após página, de cima para baixo e da esquerda para a direita.

*Mestrando do Programa de Pós-graduação em Letras


da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc).

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