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Ultimate Temptation
Sara Craven
Destino: TOSCANA
Atrações: a torre de Pisa, museus, artes góticas, paisagens deslumbrantes e...
um homem procurando uma mulher!
Giulio Falcone é a fantasia de todas as mulheres: alto, moreno e fatalmente
sensual. Foi ele quem socorreu Lucy num momento de perigo. Era natural que o
conde italiano desejasse algo em troca.
Ele precisava de uma mulher para ser a babá de seus sobrinhos. Este não seria
problema, se Giulio não houvesse declarado que se sentia atraído por ela. Na
casa de Giulio Lucy descobriu-se no lugar errado, na hora errada, com a última
e definitiva
Disponibilização: Priscila
Digitalização: Ana Cris
Revisão: Crysty
Sara Craven – A Última Tentação
(Julia Cartão Postal 51)
Querida leitora,
Este mês embarcaremos em uma via deliciosa: Toscana, uma região da Itália que tem o
maior acervo cultural do mundo, e onde você vai viver intensas emoções a bordo da
magnífica história A Ultima Tentação. Tenho certeza de que você vai adorar!
Arrivederci
Esta edição é publicada através de contrato com a Mills & Boon Ltd.
Esta edição é publicada por acordo com a Mills & Boon Ltd.
Todos os personagens desta obra são fictícios.
Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas
terá sido mera coincidência.
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Sara Craven – A Última Tentação
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PRÓLOGO
BEM-VINDA À TOSCANA
Você está convidada para conhecer essa romântica região italiana de tantos
mitos e lendas.
PASSADO ROMÂNTICO
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Sara Craven – A Última Tentação
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PRESENTE ROMÂNTICO
A mais antiga das pontes sobre o rio Arno foi erguida em 1345 e abrigava um
mercado de carne. Hoje abriga dezenas de sofisticadas joalherias.
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Sara Craven – A Última Tentação
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duas fantásticas pinturas religiosas de Leonardo da Vinci, Anunciação e Adoração
dos Magos.
Majestosa e bastante cultural, Florença tem também um clima festivo'. Por seus
arredores circula sempre uma animada multidão composta de pintores,
desenhistas, vendedores de reproduções de quadros e outras lembranças. E, é
claro, de turistas que superlotam suas ruas, restaurantes e museus, prin-
cipalmente a Piazza delia Signoria, o centro cívico e histórico da cidade.
Vale a pena provar a preciosa comida toscana, beber vinho regional, o chiantti, e
ir às compras. As principais grifes estão ali estabelecidas, transformando
Florença num pólo da moda italiana.
No sudoeste da Toscana, Pisa atrai quase tantos turistas quanto Florença, mas
por razões bem diferentes. Esta cidade cresceu e acabou por rivalizar-se com o
poderio de Gênova e Veneza, graças à expansão comercial do séc. 12. E daquela
época guarda um marco arquitetônico inconfundível e o símbolo da Itália: a
torre inclinada de Pisa, que desafia a ciência e os séculos sobrevivendo a cada
ano às previsões pessimistas quanto à sua firmeza.
A construção da Torre de Pisa — que nada mais é que a torre dos sinos — foi
iniciada em 1173 e concluída duzentos anos depois. Sua altura atinge 56 metros.
Suas paredes têm mais de três metros de espessura na base, e cerca de 1,5 metro
nos oito andares que se seguem.
Embora pequena e com apenas pouco mais de cem habitantes, Pisa reúne
muitas atrações em pouco espaço. Os quatro edifícios históricos da cidade
apresentam umas das maiores densidades mundiais de arte, história e ciência.
Além da torre pendente, estão o Duomo, o Batistério e o Campo-santo, um
cemitério retangular com galerias góticas, em área igual à do Maracanã. Neste
pequeno quadrilátero estão representadas a criatividade dos antigos pisanos,
por muitos anos rivais de Florença na arte.
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Sara Craven – A Última Tentação
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Siena parou no tempo. E é justamente aí que reside seu fascínio atual. A parte
antiga da cidade, com suas ruas estreitas que seguem em arcos dando
continuidade à Piazza del Campo, desaparecem nas colinas que dominam as
planícies ao redor.
Pouco mudou em Siena desde a época medieval. Todas as suas praças, palácios,
mansões dos antigos comerciantes, igrejas e a catedral datam do séc. 11 ao 15.
Da renascença propriamente dita, Siena herdou pouco.
De região montanhosa, Siena parece ter uma aldeia medieval no topo de cada
colina, construída em forma de fortaleza.
- a língua italiana surgiu em Florença nos escritos de Dante Alighieri, por isso
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Sara Craven – A Última Tentação
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ela é conhecida como a Mãe do idioma italiano?
- Florença e Siena são cidades rivais desde a Idade Média e que as duas foram
responsáveis pelo mais extraordinário florescimento de arte visto no mundo?
- uma das mais famosas experiências de Galileu — a que provou que matérias
de diferente peso caem na mesma velocidade — foi feita do alto da Torre de
Pisa?
CAPÍTULO I
— Lucy... olhe aquele sujeito na mesa da ponta. Já viu alguém tão lindo?
Viu um perfil que poderia ter sido esculpido em bronze por Michelangelo,
marcado por linhas que sugeriam desdém. Um nariz empinado e aristocrático
realçava a boca firme, apertada em sinal de desgosto e o queixo arrogante. O
desconhecido chamou o garçom para pedir a conta. Depois virou-se para
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apanhar uma pasta de couro na cadeira ao lado e, por um momento, os olhos
frios como o âmbar encontraram os de Lucy.
Dizem que o gelo pode queimar. Nesse momento Lucy teve a impressão de
estar sendo marcada por um ferro em brasa.
Sim, tratava-se de uma beleza clássica, apesar dos cabelos espessos, negros e
ondulados serem longos demais para o seu gosto. A graça com que
movimentava-se era mais instintiva que estudada. E ele não gostara de ser
objeto do interesse descarado de Nina, e não fez nenhuma questão de esconder
a contrariedade. E quem poderia culpá-lo?
— Aposto que viu mais que a beleza física daquele italiano. — Lucy comentou
com tom seco. — Ele estava usando um terno de corte perfeito. Um Armani,
certamente.
Nina riu.
— Fiquei mais interessada no que havia em baixo do terno. Sabe de unia coisa?
Estou começando a gostar da Itália.
Ela chamou o garçom para pedir mais dois capuccinos, e Lucy voltou ao guia de
turismo.
Pela centésima vez desde sua chegada, quarenta e oito horas atrás, imaginou se
havia tomado a decisão acertada. Concordar em dividir uma vila na Toscana
com três mulheres praticamente desconhecidas fora um tiro no escuro, mas
sentira-se desesperada para sair, distrair-se.
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Sara Craven – A Última Tentação
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Três semanas ao sol italiano seriam impossíveis se ainda estivesse com Philip.
Ele apreciava férias mais movimentadas, coisas como esquiar num mar bravio,
fazer um safári na África ou escalar as montanhas de Wales, e Lucy escondera a
própria apreensão para acompanhá-lo. Velejar na região das ilhas gregas havia
sido o máximo que ele aceitara em matéria de descanso, mas Lucy acabara se
mostrando uma péssima marinheira.
Atônita, vira ele fazer as malas e sair do apartamento que haviam dividido.
Apartamento dela, mas aceitara a decisão por conveniência, e por isso não
podia acusá-lo de nada. Agora tinha de fazer uma nova escolha, decidir se
queria viver com as lembranças ou encontrar outro lugar para recomeçar.
— Pode ficar conosco por algum tempo. — Sua irmã Jan havia oferecido, o rosto
delicado contorcido numa máscara de preocupação. — Até pôr os pés no chão
novamente.
— Essa é uma das razões pelas quais decidi tirar férias. Para pensar e
reorganizar minha vida. — Tentara sorrir. — Vou precisar de algum tempo para
me ajustar.
— Mas acha que essa é a melhor maneira para ajustar-se? — Jan espalhara
açúcar sobre a massa e as frutas que acabara de despejar numa assadeira. —
Dividir uma casa com uma mulher que mal conhece e duas amigas dela? Para
mim, esse tipo de situação sempre acaba em desastre.
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humorado à voz. — Vi algumas fotos da Villa Dante e o lugar é fantástico, além
de muito barato. A casa pertence ao amigo do gerente de um restaurante
italiano onde Sandie e Fee costumam jantar depois das aulas.
— Quer dizer que nem se deu ao trabalho de procurar uma agência de viagens?
— Pare de preocupar-se. Jan. Vai ser maravilhoso. Talvez consiga até pintar um
pouco.
— Eu não escolheria uma palavra tão amena. Mas esqueça-o e aproveite suas
férias.
Lucy, que abrira mão da bebida para dirigir o carro alugado que estaria
esperando por elas no aeroporto, notara os olhares críticos lançados pelos
outros passageiros. Também havia percebido que alguns rapazes do grupo
estavam acompanhados por mulheres, e que elas nem tentavam ocultar a
hostilidade.
— Que garota! — Ouvira Sandie resmungar para Fee. — Agora entendo porque
o namorado a abandonou.
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Sara Craven – A Última Tentação
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— Não há um inventário que precisamos examinar? — Perguntara precavida.
Naquele dia maravilhoso, o sol brilhava forte num céu muito azul e sem
nuvens. A brisa morna e suave trazia o perfume das rosas e dos pinheiros, e
intermináveis canteiros de girassóis precederam a entrada do grupo na região
dos vinhedos. Pequenos vilarejos de casas brancas e persianas fechadas
entrecortavam a paisagem de parreiras e flores, e as montanhas eram como uma
moldura natural para o quadro de rara beleza. Como as outras três haviam
dormido, Lucy pudera desfrutar do panorama em completa tranqüilidade.
De repente, depois de uma curva mais acentuada, a Villa Dante surgira diante
de seus olhos em todo seu esplendor, o nome da propriedade entalhado nos
pilares de pedra que sustentavam o portão de ferro.
Uma entrada imponente para um local de veraneio, Lucy pensara ao dirigir por
entre os enormes ciprestes que pareciam montar guarda desde o portal.
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Sara Craven – A Última Tentação
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Fora amor à primeira vista.
A vila ocupava três lados de um grande quadrilátero e era cercada por uma
varanda ampla e fresca de onde se podia ver todo o terreno. No centro do
quadrilátero havia uma grande fonte de água fresca, e alguns metros à frente
ficava a piscina. Adiante via-se o jardim repleto de flores exuberantes e cortado
por trilhas feitas com pedras.
A sala de jantar encheu os olhos de Lucy com sua beleza. As paredes exibiam
lindos afrescos e uma imponente mesa de carvalho dominava o espaço.
Cadeiras do mesmo material e meia dúzia de candelabros de prata
completavam o conjunto de rara elegância. De lá passaram ao salotto, cujo teto
exibia um desenho colorido feito sobre gesso. A lareira em pedra maciça era
grande o bastante para assar um boi, e os sofás de couro tinham uma aparência
muito convidativa.
Todo esse esplendor pelo preço que estavam pagando? Lucy questionara a
situação em silêncio, mas as outras não se mostraram intrigadas.
Mas Lucy não queria aventuras. Esse tipo de encontro nunca fora seu estilo, e
sentia-se vulnerável e frágil demais para contemplar um relacionamento,
mesmo que superficial e passageiro.
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Sara Craven – A Última Tentação
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Sandie e Fee passavam muito tempo ao telefone, falando em voz baixa e rindo
como adolescentes.
Decidira deixar para preocupar-se com a conta no momento oportuno. Até lá,
aproveitaria o ambiente de tranqüilidade e o luxo de contar com uma
empregada para servi-la.
— Talvez seja seu dia de folga — Nina arriscara irritada enquanto lutava com a
cafeteira elétrica. — Ela disse alguma coisa, Lucy?
— Não. Ela mal falou comigo. Na verdade, acho que tem medo de nós. Por que
não vai ver se ela está no chalé, Sandie?
— O que não significa que aprendemos alguma coisa — Fee sorrira. — Mas vou
tentar falar com Maddalena e descobrir o que aconteceu. — E saíra como quem
fazia uma grande concessão.
— Não há ninguém no chalé. Olhei pela janela e constatei que o lugar está
vazio. Ela levou tudo.
— Talvez ela tenha se cansado de tanto trabalho. — Fee havia sugerido. — Mas
o pagamento inclui o serviço de uma criada, e Tommaso terá de substituí-la
imediatamente. Iremos procurá-lo assim que comermos alguma coisa num
restaurante da cidade.
E fora assim que Lucy havia ido ao café na principal esquina de Montiverno,
onde bebia capuccino com Nina enquanto as outras compravam provisões no
mercado local, uma oferta que a surpreendera.
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uma casa de veraneio a alguns quilômetros de Lussione. Não é uma
coincidência espantosa?
Era evidente que haviam mantido contato desde o início. Por isso passavam
tanto tempo ao telefone. E as compras no mercado haviam sido apenas um
pretexto para encontrarem os rapazes.
— Decidimos organizar uma pequena festa esta noite, uma espécie de boas-
vindas à Toscana para todos nós. Eles adoraram a idéia. — Fee ajeitou os óculos
escuros com ar despreocupado.
Lucy encarou-a.
De repente todas olhavam para ela como se esperassem mais uma atitude
antipática da eterna desmancha-prazeres. Lucy sentia-se na obrigação de vetar
tal festa.
— A vila não é o local mais adequado para esse tipo de reunião. — Falava como
uma avó preocupada, mas não podia mudar a própria natureza. — A mobília é
composta por peças antigas e valiosas, e Tommaso pode não gostar de saber
que recebemos estranhos em sua propriedade.
— Se está tão interessada na aprovação de Tommaso, por que não vai falar com
ele? — Nina sugeriu. — Aproveite para dizer que Maddalena desapareceu.
Convide-o para participar da festa, se quiser. Bem, vou ver aquela butique no
final da rua. — Ela decidiu, consultando o relógio de pulso. — Voltarei a
encontrá-las aqui dentro de uma hora.
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deslocadas ou quebradas sugeriam problemas na próxima chuva mais forte.
A campainha não funcionava, e por isso Lucy bateu na porta. Uma vez, duas,
três... Ninguém respondeu.
Erguendo-se na ponta dos pés, espiou por uma janela e viu um aposento vazio,
sem uma única peça de mobília ou qualquer sinal de vida.
Mas devia ter errado o caminho, porque descobriu-se numa praça diferente
daquela onde estivera com as companheiras. Em lugar dos bares e do
movimento, havia apenas uma igreja gótica e muitos pombos.
Gritando, tentou pular para trás no momento em que a mão agarrou a alça de
sua bolsa, segurando-a com força e recusando-se a soltá-la. Ouviu a voz rouca
que a ameaçava, notou que o piloto acelerava e foi puxada para a frente, caindo
de bruços sobre as pedras do calçamento. Seria arrastada pela motocicleta se
não soltasse a bolsa.
Viu uma figura correndo em sua direção, sentiu uma força contrária àquela
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exercida pela mão do assaltante, e de repente a alça da bolsa se rompeu. Lucy
ficou caída no chão, assustada, ferida, mas livre, a bolsa presa entre os braços
enquanto os ladrões fugiam levando apenas uma alça sem valor.
Parecia mais seguro ficar onde estava. O coração batia depressa, o corpo todo
tremia e sentia-se enjoada. Sabia que o homem que a salvara estava inclinado
sobre ela, a voz profunda falando num italiano urgente enquanto ele tocava seu
ombro.
De perto ele era ainda mais devastador. Belo como um príncipe da Renascença
e tão distante como um representante da antiga realeza.
— Agora sei. Estava procurando alguém, e pensei que coisas como essa só
aconteciam nas grandes cidades.
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Em vez disso, conteve-se e disse:
— Acabei de passar por uma das piores experiências de minha vida, e tudo que
sabe fazer é criticar!
— Não. Há algo que posso fazer para ajudá-la. Meu carro está estacionado perto
daqui. Vou levá-la a uma clínica para um exame completo.
O tom cortante da voz a atingiu como uma chicotada. Não havia razão para
sentir-se mortificada, disse a si mesma furiosa. O sujeito era um completo
desconhecido, e nunca mais o veria novamente. Que importância tinha se a
comparava com Nina?
— Pense o que quiser, signore. Agradeço por ter me ajudado, mas não estou
interessada em sua opinião a meu respeito.
— Então aceite meu auxílio. Não posso ir embora e deixá-la aqui sozinha nesse
estado. Mas não tenho o dia todo para cuidar de seus interesses, signorina.
Sendo assim, decida-se de uma vez por todas.
— É claro. Sem dúvida ainda têm muito a discutir sobre o talento dos homens
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daqui. Tome cuidado, signorina. Não está na Inglaterra. Provocar um toscano é
brincar com fogo.
— Por favor, não se preocupe comigo, signore. Sou à prova de fogo — mentiu.
Ao ver que Lucy tentava manejar a maçaneta, ele inclinou-se e abriu a porta.
Mais uma vez ela foi atingida pela fragrância de almíscar e pelo calor
inquietante do corpo próximo ao dela. Muito quente. Muito próximo.
Ao encará-lo, viu uma chama intensa iluminando os olhos cor de âmbar e ouviu
o som da própria garganta engolindo em seco.
Silencioso como uma pantera, o carro afastou-se deslizando pela rua estreita, e
Lucy ficou onde estava, a mão sobre os lábios trêmulos.
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CAPÍTULO II
Lucy censurou-se mentalmente pela centésima vez. Não era mais nenhuma
criança. Havia estado apaixonada por um homem. Vivera com ele. Portanto, um
único beijo, mesmo que fosse de um completo estranho, não devia ser tratado
como algo tão importante. Precisava compor-se.
Estava deitava na cama do quarto que ocupava na vila, olhando para o teto e
tentando compreender o que havia acontecido.
Nina dirigira o Fiat de volta à vila com cuidado exagerado, enquanto Sandie e
Fee cobriam Lucy de ofertas de todos os tipos, desde frutas e sucos até uma
xícara de chá caseiro.
— Por que um homem tão rico estaria acampado no meio de um cortiço sujo e
feio? — Nina perguntara, obrigando-a a admitir que a possibilidade era
improvável.
Como Maddalena havia sumido sem deixar pistas, Nina e as outras tiveram de
organizar a festa sozinhas.
O quarto que havia escolhido não era o maior, mas oferecia a melhor vista do
vale, e gostava das linhas sóbrias e discretas dos móveis e das cortinas cor de
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creme. Era um ambiente quase masculino. Talvez pertencesse a Tommaso,
pensou, experimentado um arrepio de contrariedade.
Eram todas mais jovens que ela, mesmo que só por alguns meses, solteiras e
livres. Que mal havia em procurarem um pouco de diversão?
Devia deixar de ser tão crítica e interessar-se mais pelas coisas boas da vida.
Envolver-se mais com as pessoas. A festa dessa noite seria uma ótima
oportunidade para demonstrar boa vontade. Afinal, agora também era uma
mulher sozinha, e não a metade de um casal.
A maior parte das roupas que trouxera era casual, mas no último instante
decidira pôr na mala um vestido próprio para uso noturno.
Mas era o único traje de festa que possuía, e por isso vestiu-o sem hesitar.
Talvez fosse bom usá-lo.
Desde o rompimento com Philip, havia passado dias e noites torturando-se com
autocríticas, perguntando-se como pudera ser tão cega, ou como não havia
suspeitado a tempo de tentar salvar o amor que os unira e reconquistá-lo.
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Agora, enquanto escovava os cabelos lisos de comprimento médio, sabia que
não havia nada que pudesse ter feito. E, pela primeira vez, concluiu que havia
sido melhor nem ter tentado.
Mas por que de repente passava a ver tudo isso com tanta clareza?
Porque, naquele dia, um homem a beijara, alguém que nunca mais encontraria,
e conseguira sacudi-la com a intensidade de um terremoto, provocando uma
excitação imediata como jamais sentira antes.
Não havia sido Philip quem a encantara no sonho, mas aquele outro homem.
Chegara a sentir o hálito quente no rosto, inalara o perfume delicado e sensual
de sua colônia e fora envolvida pelo calor dos braços fortes. E havia desejado
muito mais que um simples beijo.
De frente para o espelho, levou a mão aos lábios mais ume vez e assustou-se.
Apesar das boas intenções, Lucy não conseguia entrar n< espírito da festa.
— Lucy tem um grande interesse por prédios antigos. — Fee explicou aos
outros. — Ela sempre nota todos os detalhes.
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Sara Craven – A Última Tentação
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Hal inclinou-se sobre a mesa. Era alto, louro e mais velho que os outros.
— Que tal concentrar-se no presente e notar coisas mais concretas? Como eu,
por exemplo.
Todos riram, mas Lucy viu que os olhos do rapaz mergulhavam em seu decote
e sentiu-se desconfortável. Ben pegou uma das garrafas sobre a mesa.
Nina escolheu Greg, com quem havia flertado no avião e que parecia estar
desacompanhado, o que não sugeria problemas. Mas a namorada de Ben, Sue,
não escondia o aborrecimento causado pela aproximação de Fee, com quem o
rapaz dançava alegremente. E Sandie mostrava-se disposta a arrancar Dave dos
braços de Clare.
Notando que Hal vinha em sua direção, Lucy decidiu ir tirar os pratos sujos da
mesa. A sala de jantar era como uma área atingida por um bombardeio. Havia
comida no chão, sobre o tapete, e uma poça de vinho formara-se bem no centro
da mesa por conta de uma taça virada, escorrendo al£ uma das cadeiras e
respingando no piso. Um abajur sobre uma das mesas laterais fora derrubado e
quebrado, e uma das lindas taças de cristal havia sido estilhaçada.
E o estado da cozinha era ainda pior. Fee parecia ter usado todas as panelas e
tigelas para preparar o macarrão. Suspirando, Lucy amarrou um pano em torno
da cintura e começou a trabalhar.
O barulho da festa foi se tornando mais baixo, e pouco depois ela ouviu o som
de gargalhadas vindo de fora. Quando foi investigar, descobriu que todos
estavam na piscina.
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A noite era quente, e estrelas luminosas pontilhavam o céu sem nuvens. As
luzes haviam sido acesas e alguém trocara o rock por uma melodia mais
romântica e lenta.
Fee e Sandie estavam na água com Ben e Dave, obviamente nus, pois as roupas
jaziam esquecidas no piso de cerâmica. Sue os observava com expressão
carrancuda, e Clare mordia o lábio como se lutasse contra as lágrimas.
— Fugindo de nós?
— Mas não estrague esse lindo vestido — Greg gargalhou, o braço em torno da
cintura de Nina.
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— Não! — Furiosa, disparou um violento chute para trás e conseguiu cravar o
salto da sandália na canela do rapaz, que praguejou e soltou-a.
Hal devia ter encontrado um atalho. Na melhor das hipóteses, seria despida e
jogada na piscina, e a idéia a revoltava.
— Sta zitto. — A voz era profunda e familiar. — Cale a boca, sua tola, e fique
quieta.
Todas as cabeças viraram-se em sua direção como que comandadas por fio
invisíveis. As risadas e os gritos silenciaram de súbito, sucedidas por um
silêncio intenso no qual sua voz, quieta e fria, caiu como uma pedra.
— Sou Giulio Falcone, e esta é minha casa. Posso saber o que fazem aqui?
— Sua casa? — Nina foi a primeira a vencer o espanto causado pela aparição
súbita do italiano. Ela o encarava ruborizada, perturbada e agressiva. — De que
está falando?
— Não quero saber quem ele é. — Nina devolveu impaciente. — Este lugar
pertence a Tommaso Moressi, e nós o alugamos.
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— Foi exatamente o que fizemos — Lucy revelou em voz baixa, as mãos
trêmulas ajeitando o vestido. — Três semanas de aluguel, mais o uso do
automóvel e o serviço da criada, que desapareceu como o signore Moressi.
— Eu já esperava por isso. A notícia sobre meu retorno inesperado deve ter
chegado aos ouvidos dele, que tratou de escapar. Pobre Maddalena. Ela sempre
mimou o imprestável.
— Então sugiro que volte para lá. E leve seus amigos com você.
Quando passou pela porta do salotto, Lucy ouviu uma discussão furiosa entre
Ben e os outros. Hal afastou-se do grupo e caminhou até a porta.
— Esqueça!
Lucy virou-se e subiu a escada aos saltos. Quando chegou ao quarto, seu
coração batia descompassado, e ela começou a esvaziar gavetas e armários, sem
nem sequer prestar atenção ao que fazia enquanto tentava pensar. Tinha de
cortar ligações com o grupo, decidiu, jogando as roupas na mala. Precisava
chegar em Pisa e embarcar no primeiro vôo de volta a Inglaterra. Qualquer
outra possibilidade era impensável.
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ao quarto, encontrou Giulio Falcone parado à porta, observando-a.
— São apenas pessoas que conhecemos no avião. Nina e as outras queriam dar
uma festa e os convidaram.
— Não tive tempo para pôr tudo em ordem — Lucy admitiu constrangida. —
Mas limpei a cozinha. E esteja certo de que o recompensaremos pelo prejuízo.
— Não seja ingênua, signorina. O abajur e a taça eram peças antigas de grande
valor. A substituição será impossível, e mesmo que existissem objetos similares,
o custo seria inestimável.
— Podemos nos unir para pagar. Tenho certeza de que a polícia encontrará
Tommaso Moressi e recuperará nosso dinheiro. Suponho que tenha alguma
influência sobre as autoridades locais, signore.
— Tommaso já deve estar muito longe daqui. Como sempre, fugiu sem deixar
pistas enquanto a pobre tia ficava para reparar seus erros.
— Agora entendo porque ela não nos queria aqui. Maddalena parecia muito
assustada.
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sorte, signorina. Poderia ter aproveitado suas férias sem nem sequer ter
consciência de que a ocupação da vila era ilegal.
A última palavra pairou entre eles por alguns instantes, trazendo à tona todo o
tipo de implicações.
— A solução pode ser mais difícil do que imagina, signorina. Estamos em plena
temporada de férias, e todos os vôos estão lotados.
— Nesse caso, foi sorte ter conseguido ler sua mente com tanta precisão.
Giulio Falcone sorriu. Havia algo de pagão na curva dos lábios, ela pensou,
uma espécie de excitação que crescia na mesma velocidade em que aumentava a
apreensão em seu peito.
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CAPÍTULO III
Lucy encarou-o. Sabia que estava tremendo e tinha a sensação de que todo o
calor esvaíra-se de seu corpo, deixando-a gelada.
— É simples. Vai ficar aqui, signorina, para reparar o insulto praticado contra
minha casa e minha família por seus... conhecidos.
— Você mesma admitiu que não pode reparar o prejuízo causado. No entanto,
existem outros métodos de reembolso. Creio que poderemos chegar a um
acordo satisfatório para nós dois.
— Então está enganado! — Lucy reagiu, furiosa. — Como se atreve a sugerir tal
coisa? Quem pensa que é? Ou melhor, quem pensa que sou?
— Ah, sim. Mas por que provocar um homem usando um vestido como aquele,
e depois privá-lo do prazer? Suas companheiras não demonstravam a mesma
resistência.
— Não sou responsável pela conduta de ninguém. Respondo apenas por meu
comportamento, e afirmo que não faço esse tipo de jogo.
Ele riu.
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— Não sabia que havia trazido seu carro.
Quieta, esperou que o choque inicial fosse superado e tentou raciocinar. A idéia
de que o sujeito pudesse ser casado nunca havia passado por sua cabeça. Não
que fizesse alguma diferença, mas...
— Não perca seu tempo tentando encontrar respostas. — Lucy apanhou a mala.
— Poderia me emprestar seu... o carro da condessa para a viagem até Pisa, por
favor?
— Não pode me culpar por tudo que aconteceu. Havia mais gente aqui quando
chegou.
— Acha que sou como elas... como Nina e as outras. Pois posso garantir que
está enganado.
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Sara Craven – A Última Tentação
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— Eu sei que não é como elas. Se não acreditasse nisso, não a teria escolhido.
Os olhos cor de âmbar, atentos e profundos, passearam por seu corpo detendo-
se na curva dos seios, na linha delgada da cintura e nas coxas reveladas pelo
vestido curto.
— Não pode me manter aqui contra minha vontade — ela disse, movida pelo
desespero.
— Nas atuais circunstâncias, tenho todos os direitos que quiser, Lúcia mia.
— Só por que corri ao seu encontro em busca de ajuda? Teria me atirado nos
braços do próprio Frankenstein para escapar daquele sujeito asqueroso!
— Você é nojento! Quer saber de uma coisa? Chame a polícia. Até a cadeia será
melhor do que sua companhia. Também terei uma boa história para contar aos
oficiais.
— Sua esposa pode ter uma opinião diferente a respeito do assunto. Ou ela não
se importa com seu comportamento desleal e impróprio?
— Seria ótimo mantê-la aqui, nem que fosse só para ensiná-la a falar com um
mínimo de civilidade. — Giulio Falcone irritou-se. — Mas, antes disso, quero
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que saiba que cometeu mais um engano. Não sou casado. E também está
enganada quanto aos motivos que me levam a retê-la aqui. <
— Será que pode ser mais claro? — Ela suspirou, cansada de defender-se de
acusações injustas e investidas confusas.
— Não, mas está aqui, e já admitiu que não pode pagar o que me deve. De
minha parte, tenho consciência de que arruinei suas férias. Seja franca, Lúcia.
Quer realmente deixar a Toscana tão cedo, quando pode ficar aqui e ainda
receber por isso?
— Por quê? Minha irmã e as crianças estarão aqui para protegê-la contra
minhas investidas, se é isso que a preocupa.
— Não sou adequada ao emprego que oferece — disse. — Além do mais, não
sabe nada a meu respeito.
— Seis e quatro anos. — Lucy não pôde conter o sorriso terno que bailou em
sua boca provocado pela lembrança doce dos sobrinhos. Notando que ele
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preparava-se para usar aquele sentimento, tratou de reagir depressa. — Mesmo
assim, não posso aceitar.
— Não sei por quê. Marco e Emília são um pouco mais velhos, é verdade, mas
passaram por uma experiência traumática e precisam de alguém capaz de tratá-
los com carinho e atenção.
— Fiammetta raramente tem idéias próprias. Além do mais, essa é uma situação
de emergência. Eles sairão da clínica amanhã cedo e virão diretamente para cá.
Não posso permitir que encontrem um cenário de devastação.
— Porque você estava pronta a acreditar que eu era uma espécie de Casanova
moderno. A tentação de confirmar seus temores foi irresistível. — Giulio
Falcone sorriu. — Mas enquanto for minha empregada e viver sob meu teto,
estará segura. A menos, é claro, que insista...
— Não conte com isso. — Ela reagiu apressada, sentindo o rosto queimar.
— Mais que isso. Garanto que não sofrerá nenhum prejuízo financeiro em
conseqüência da desonestidade de Moressi, e ainda levará com você lembranças
inesquecíveis da Toscana, sem falar na eterna gratidão dos Falcone.
O instinto ordenava que fugisse para bem longe da Villa Dante e do conde
Falcone. De seu sorriso. Do charme que parecia tocá-la como uma mão atrevida.
— Está bem, eu fico. Mas só até encontrar outra pessoa. — Ela decidiu, sem
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saber o que a levava a optar pelo caminho mais difícil e perigoso.
— Bastardo!
Sua primeira atitude foi procurar outro quarto. O escolhido foi o último
aposento do corredor, o mais afastado da suíte de Giulio Falcone, e também o
menor de todos.
Bem adequado para uma criada, ela pensou, jogando a mala sobre a cama.
Ainda não sabia por que decidira ficar, exceto por não ter outra alternativa. Ele
era um homem rico e poderoso, que também podia ser cruel, sem dúvida.
Mas seria por pouco tempo, consolou-se. Logo a irmã do conde encontraria
uma substituta para a babá e todo o incidente seria apenas uma lembrança da
qual riria no futuro.
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— Se está satisfeita... — O conde encolheu os ombros. — Ainda não está pronta?
Quero mostrar onde ficam os lençóis e as toalhas limpas.
— Nada que eu não possa resolver. — Ela ergueu o corpo, a tesoura de unhas
na mão.
— Não seja ridículo! O zíper do vestido emperrou, e por isso preciso da tesoura.
— Fique quieta.
A respiração dele era quente em sua pele, e sabia que estava inclinado para
examinar o material defeituoso.
— Apenas uma linha presa entre os dentes de metal — Giulio concluiu. — Acho
que posso soltá-la sem estragar seu vestido.
— Não fique nervosa. — Ele riu. — Isso é menos perigoso do que atacar-me
com a tesoura de unhas.
Giulio Falcone estava muito próximo, criando justamente o tipo de situação que
desejava evitar. Através do espelho da parede, podia ver o rosto moreno e
compenetrado, os lábios cheios e sensuais que quase tocavam sua pele. De
repente a mente foi invadida pela lembrança do sabor daquela boca, e todo seu
corpo foi inundado por uma onda de desejo que ela não podia controlar ou
ignorar. O movimento das mãos movendo o zíper para baixo só aumentavam o
tormento silencioso.
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— Não tem importância. Não pretendo usar esse vestido novamente. Nunca
mais.
Por um segundo ela ficou imóvel. Depois, com um grito de horror e vergonha,
agarrou o pano rasgado e puxou-o sobre os seios.
Giulio Falcone deu dois passos para trás, observando seu desconforto com
olhos que sugeriam humor, satisfação e algo mais intenso e perigoso.
Assim que ele saiu, Lucy sentou-se na cama estreita e ficou olhando para a
porta fechada. De uma coisa tinha certeza. Não podia correr o risco de
permanecer na Villa Dante. Tinha de fugir o mais depressa possível.
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arrepio.
CAPÍTULO IV
Não que Giulio Falcone pudesse ser descrito como um inocente engano,
decidiu, terminando de vestir a calça de lycra verde e a camiseta grande e
confortável. Falcone era a personificação do perigo, e expor-se seria loucura.
O quarto que havia ocupado foi deixado por último. Parada na porta, relutou
em entrar, mas censurou-se pela insegurança e, respirando fundo, passou pela
soleira.
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mais limpo que os outros, o que provocou uma nova onda de alívio.
A janela estava aberta para a noite quente, e uma brisa suave empurrava as
cortinas para dentro do quarto.
A lua parecia estar próxima o bastante para ser tocada, espalhando sua luz
prateada como um manto de cetim sobre as montanhas distantes.
— Subi a escada como sempre faço. Não tenho culpa se estava distraída.
— Digamos que tenho muito em que pensar. E muito o que fazer, também. —
Determinada, aproximou-se da cama e começou a retirar os lençóis.
— Então deixe-a como está. — O sorriso que dançava em seus lábios tornou-se
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mais amplo quando ela ergueu o corpo e encarou-o com ar surpreso. — Ou
acha, bella mia, que não gostaria de dormir com o cheiro de sua pele no meu
travesseiro?
Furiosa, Lucy percebeu que havia ruborizado novamente. Mesmo assim, fingiu
uma calma que estava longe de sentir.
— Fui contratada para fazer um trabalho, signore. Arrumar as camas faz parte
dele.
— Mas não precisa concluí-lo agora. Preparei café e alguma comida para nós.
— Não sou o aristocrata afetado que imagina. Ao longo dos anos aprendi a ser
auto-suficiente. Sou capaz até de arrumar minha própria cama. Portanto, deixe
o quarto como está e venha comer.
— Mas... não podemos nos sentar à mesa para uma refeição no meio da noite.
—Por que não? Sempre que um apetite existe, devemos saciá-lo. Não concorda?
Lucy mordeu o lábio. Sabia que a pergunta tinha pouco a ver com comida, e
que ele não media esforços para provocá-la, mas desafiá-lo seria mergulhar em
águas ainda mais profundas, e só a faria parecer ridícula.
Por isso seguiu-o relutante até a cozinha. Quando passaram pela porta da sala
de jantar, Lucy notou que o antigo resplendor havia sido restaurado.
— Então pode alterar seus planos. De qualquer maneira, espero que não se
incomode se comermos na cozinha.
A resposta gelada provocou uma expressão carrancuda que ela registrou com
satisfação.
Mas a alegria por tê-lo surpreendido foi superada pela perplexidade quando
viu o omelete perfeito que o conde preparara, uma mistura dourada completa
com ervas frescas, presunto, queijo e tomate. Era evidente que usara tudo que
havia no refrigerador. Também aquecera um pedaço de pão e abrira uma
garrafa de vinho.
— Não posso comer tudo isso — ela protestou ao ser servida. — Passaria o resto
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da noite acordada.
— Para lidar com Marco e Emília, é claro. Por que mais, colombina!
— Não. A condessa vive em Roma durante quase todo o tempo, e passa o verão
entre Zurique e o sul da França. Ela fica tão entediada aqui que suas visitas são
sempre breves, embora eu faça questão de sua presença nas celebrações da
colheita. Os trabalhadores da propriedade dão muita importância a esse tipo de
formalidade.
— Como alguém pode ficar aborrecido num lugar tão lindo? A vila é um
pedaço do paraíso!
— Aí estão as duas faces da Villa Dante. Para você, o paraíso. Para Cláudia, o
purgatório.
— E o Fiat pertence a ela. Se vem aqui tão raramente, por que a contessa mantém
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um carro na propriedade?
— Para poder escapar quando é obrigada a vir. Com o automóvel, ela foge do
tédio dos vinhedos e da vida do campo para ir ao encontro dos amigos em
Siena e Florença. Fazer compras, falar sobre a vida alheia e jogar cartas são seus
passatempos favoritos.
— Não. — Lucy respirou fundo, tentando conter-se. — Nós... não chegamos tão
longe, felizmente.
— Não com todas as palavras. Não posso acusá-lo de crueldade. Mas tirei
minhas próprias conclusões.
— Non importa. Algumas semanas de sol italiano, bella mia, e a marca deixará de
existir.
A menos que tomasse muito cuidado, deixaria a Toscana marcada por cicatrizes
mais profundas que a faixa clara no dedo. A dor causada por Philip não
passaria de um simples incômodo comparada ao sofrimento a que se expunha.
Algumas semanas seriam demais para sua segurança. Tinha de partir o mais
depressa possível.
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— E pode melhorar. Devia ser melhor, já que a 'maioria das transações
comerciais do nosso banco é realizada em seu país. Passei vários períodos de
minha vida na Inglaterra, mas não recentemente. Caso contrário, poderíamos
ter nos conhecido antes.
Lucy falou um pouco sobre a carreira, e ele ergueu uma sobrancelha numa
expressão que mesclava espanto e respeito.
Quando acordou, a luz do sol penetrava por uma fresta da cortina e espalhava-
se pelo chão do quarto como uma piscina dourada. Por um momento sentiu-se
desorientada, mas em seguida a memória retornou, e ela sentou-se de um salto.
Dormira demais.
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sarcástico ou uma censura direta, mas, para sua surpresa, Falcone não estava
em parte alguma. O lugar parecia deserto, mas a cafeteira havia sido usada.
Liberdade. A palavra cruzou sua mente e foi instalar-se num recanto escondido
da consciência.
Olhando para o Fiat, respirou fundo. Por que não? O carcereiro havia
desaparecido e deixara a porta da cela aberta. Por que ficar, se podia partir? Por
que pagar pelos erros cometidos por outros, se podia simplesmente fugir? Já
havia preparado os quartos para os visitantes da vila. O que mais Giulio
Falcone podia esperar?
Na noite anterior fora quase convencida a aceitar seus termos, mas agora o sol
brilhava no céu, e estava acordada e pronta para lutar. E escapar, Porque tinha
de haver um lugar para onde pudesse fugir.
— Vou para casa agora, enquanto ainda posso! — exclamou em voz alta.
Deixou o copo de suco sobre a pia e subiu. No quarto, jogou todas as roupas e
objetos pessoais dentro da mala e fechou-a.
Para sua surpresa, o veículo estava trancado. Não lembrava-se de tê-lo fechado
com a chave, já que o isolamento da vila não exigia esse tipo de precaução, mas
Nina havia sido a última a dirigir o automóvel na tarde anterior, quando
retornaram de Montiverno.
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Talvez ainda estivessem lá. Se Giulio Falcone não houvesse notado a presença
das chaves... Ele estivera cansado na noite anterior, e nessa manhã devia ter
saído apressado, preocupado com outros assuntos.
Lucy deixou a mala escondida atrás de uma grande pedra que marcava o início
dos canteiros de flores e correu de volta a casa, subindo a escada aos saltos.
Um olhar para a cômoda revelou que seu otimismo havia sido em vão.
Respirando fundo, refletiu sobre a situação. Era possível que as chaves, jogadas
sobre a cômoda sem nenhum cuidado, houvessem deslizado pela superfície
encerada e caído entre a parede e o móvel.
Tentou arrastar a pesada peça de mobília para examinar o vão atrás dela, mas
foi impossível movê-la. Ofegante, ajoelhou-se e encostou o rosto no chão para
tentar enxergar alguma coisa de baixo para cima.
Por que não ouvira os passos dele? Felizmente não havia sido surpreendida
vasculhando suas coisas.
— Lamento, mas não. Acho que estava usando seu relógio ontem à noite.
— Machucou-se?
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outros lugares.
Tinha de passar por ele para chegar à porta, mas não esperava que o conde a
segurasse pelo braço e a fizesse parar.
— Desculpe se a assustei. Não era essa minha intenção. Fui ao vinhedo para
pedir a ajuda de Teresa, esposa de Franco. Ela virá cozinhar para nós
temporariamente. Esperava estar de volta antes que acordasse, mas...
— Lamento ter criado tantos problemas, signore. Garanto que não acontecerá
novamente. Se quiser especificar um horário para que eu comece minhas
atividades diárias, prometo estar acordada e disponível no futuro.
— Por que o ultraje? — Ele sorriu. — Não sou o primeiro homem a vê-la na
cama, afinal.
— Se é tudo que posso obter no momento... E agora, será que pode me soltar?
— Por outro lado — ele prosseguiu como se não a escutasse —, tem autorização
para entrar no meu quarto sempre que desejar, e ficar por quanto tempo quiser.
Espero que encontre seu relógio. — Soltou-a, aproximando-se da cômoda. — É
irritante procurar alguma coisa inutilmente.
A gargalhada de Giulio Falcone a seguiu através da porta, que ela bateu com
violência, e pelo longo corredor até a frágil segurança de seu quarto.
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CAPÍTULO V
O quarto parecia um forno, e o único lugar para sentar era a cama, o que não
contribuía muito para melhorar o humor de Lucy.
O ódio era uma atitude mais segura que a anterior reação ingênua à atração que
experimentava por ele. O trabalho não havia sido suficiente para defendê-la
contra o sorriso que transformava o rosto duro, ou contra o fogo que iluminava
os extraordinários olhos cor de âmbar. Descobrira aquela verdade na noite
anterior.
Precisava do ódio como uma ferramenta extra de defesa, até que um dia, de
alguma maneira, fosse capaz de ensinar ao sujeito uma lição que ele jamais
esqueceria.
— Sim?
— Minha irmã chegou, Lúcia. Pode descer para conhecê-la? Sei que está
zangada comigo, mas as crianças estão muito assustadas e precisam de você.
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Furiosa, Lucy foi até a porta e abriu-a com um movimento brusco.
— Reconheço que não é uma atitude digna de orgulho, mas já fui acusado de
coisas piores. E agora, pare de desperdiçar sua energia com tolices e venha
comigo, por favor.
Giulio virou-se, e Lucy deu um passo à frente, parando ao sentir que a canela ia
de encontro a um objeto duro e doloroso. Sua mala. Alguém a retirara do
esconderijo perto da garagem e a trouxera até o corredor.
Alguém?
— Meu querido Giulio. É claro que vim para ajudar minha filha.
Embora falasse em italiano, Lucy entendia com clareza. A contessa tinha uma
voz curiosa, rouca, mas com uma nota metálica que destoava do sorriso amplo.
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— Quem é a moça? Giulio respondeu em inglês:
— Esta é Lucy Winters, minha querida Cláudia. Ela aceitou ocupar o cargo de
Alison e nos ajudar até tomarmos outras providências.
— Teresa virá cozinhar para nós, mas ela tem uma família de quem precisa
cuidar. Por isso não pode assumir todas as responsabilidades.
— Mamma, é claro que preferimos uma inglesa. Assim as lições das crianças não
serão interrompidas. Devíamos demonstrar alguma gratidão por Giulio ter se
dado ao trabalho de substituir a pobre Alison. — Ela ofereceu um sorriso
radiante para Lucy. — Como vai, signorina? Sou Fiammetta Rinaldi. E um
prazer conhecê-la.
— Mas... quem é essa jovem? De onde ela veio? — Cláudia insistiu, impaciente.
— Quais são suas credenciais? Tem alguma experiência com crianças?
— Mamma, não crie problemas. É claro que Giulio não contrataria alguém sem
referências adequadas. — E, virando-se para a inglesa. — Não é uma boa
maneira de nos conhecermos, signorina, mas as últimas quarenta e oito horas
foram muito difíceis para nós.
Era muito bonita, Lucy decidiu, notando os grandes olhos castanhos e a boca
perfeita. Nem mesmo o curativo em sua, testa podia diminuir a beleza dos
traços delicados.
— O acidente podia ter sido uma tragédia. A vida de meu único neto foi posta
em risco.
Lucy viu a menina encolher-se, o rosto marcado pelas lágrimas exibindo uma
hostilidade assustadora e, naquele momento, soube que jamais gostaria de
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Cláudia Falcone.
— Sua neta não estava no carro na ocasião do acidente, condessa Falcone? Que
sorte!
— Emilia estava no carro — ele anunciou. — Mas ela chorou. Não foi corajosa
como eu. E hoje ela ficou enjoada e passou mal.
Mordendo a língua para não dizer o que pensava, Lucy decidiu que era hora de
intervir e assumir seu papel. Descendo os degraus até onde estava o conde,
tocou seu braço e disse:
— Não! Quero Alison! — E correu para trás da avó como se quisesse esconder o
rosto em seu vestido.
Giulio entrou em cena e decidiu o impasse com doçura, sem deixar de ser firme.
— Acha que não? — Ele pegou a criança e abraçou-a, fingindo que ia jogá-la
sobre um ombro. Em nenhum momento deu a impressão de importar-se com o
estado das roupas, do rosto e dos cabelos da sobrinha, e pouco depois subiu a
escada levando-a no colo.
Para surpresa de Lucy, Giulio levou Emília para o quarto dele. Ao colocá-la no
chão no banheiro da suíte, sorriu para a menina e afagou seus cabelos com
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carinho.
— Aqui estamos, cara. Logo tudo estará bem melhor. — E virou-se para Lucy.
— Sente-se capaz de assumir o comando de agora em diante?
Lucy abriu a torneira para encher a banheira com água morna e, sem encará-lo,
opinou:
A menina reclamou que a água estava muito quente, depois muito fria, e que o
xampu ardia nos olhos. Ao empurrar o chuveiro manual que Lucy utilizava
para terminar de lavar seus cabelos, vingou-se dando um banho na babá
substituta.
Essa era uma bela introdução às suas novas obrigações, Lucy decidiu irritada,
lutando para tirar a menina da banheira, apesar dos protestos veementes.
Depois de enxugá-la, enrolou-a na toalha de banho e deixou-a sentada sobre a
cama enquanto ia buscar o próprio secador de cabelos no quarto modesto que
passara a ocupar.
— Desculpe, mas deve estar havendo algum engano. Este quarto é meu.
— Non capisco.
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— Não acredito no que estou vendo!
— Algum problema?
— Parece que perdi meu quarto — disse, sem tentar esconder o aborrecimento.
— Seu quarto? Esse aposento sempre foi ocupado por minha criada quando
estou na vila. Preciso tê-la perto de mim. Tenho certeza de que compreende.
— É claro. Irei me instalar num dos outros quartos — Lucy decidiu resignada,
odiando a arrogância da nobre italiana.
— Estou aqui para cuidar das crianças. Imagino que a signora Rinaldi prefira
que eu fique perto delas.
— Sem dúvida. Por isso as crianças ficarão na casetta com você. É a solução
ideal. Minha filha precisa de alguns dias de repouso para recuperar-se do
choque do acidente. Embora seja uma excelente mãe, crianças nessa idade
costumam ser cansativas. Concorda comigo?
— Sugiro que discuta o assunto com seu enteado, contessa. Afinal, qualquer
coisa que eu diga será apenas fofoca de empregada.
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cabelos, cuidou da menina com delicadeza e foi recompensada por uma
resignação silenciosa.
— É sua?
— Sim, mas nunca a usei, e por isso não será contaminada. Servirá como
camisola — decidiu, abandonando a tentativa de humor. — Não pode dormir
embrulhada numa toalha úmida.
— Estávamos indo para a praia quando o carro nos atingiu. Gosto mais de lá.
Aqui é aborrecido — suspirou. — Mas minha mãe fará o que nonna disser. E o
que sempre acontece quando meu pai não está por perto. Espero que ele volte
logo.
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Emília encarou-a, certamente ponderando a ignomínia de ter sido relegada aos
aposentos de uma empregada contra a grande vantagem de poder ficar longe
da avó.
— Porque chegarão alguns convidados. Uma de suas primas, pelo que entendi.
— Por quê? — ela perguntou, percebendo que segurava o fecho da mala com
força desnecessária antes de finalmente fechá-la.
— Não, mas ouvi mamma falando com papá sobre o assunto, e ela dizia que zio
Giulio só está esperando que Angela cresça.
— Bem, já é hora de irmos descansar. Fique aqui, enquanto vou preparar nossa
nova casa.
Só esperava que Giulio Falcone não soubesse como havia ido longe na estrada
sem volta rumo a um sofrimento que ela mesma fabricara.
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Sem dúvida a considerava presa fácil, especialmente por ter sido rejeitada por
outro homem recentemente. Mas se pensava que estava à disposição para ser
usada e humilhada mais uma vez, se a julgava uma aventureira, então provaria
que estava cometendo um engano.
Giulio podia perceber as respostas físicas que provocava com sua presença, mas
não o deixaria descobrir a profundidade de sua rendição mental e emocional.
Agora o destino estava em suas mãos. Falcone não podia saber que tinha o
poder de feri-la, caso contrário a Villa Dante seria uma filial do inferno para ela.
Quarenta e oito horas atrás, nem sabia sobre a existência de Giulio Falcone.
Agora estava emaranhada numa teia de ciúme, medo e paixão.
Mas, por maior que fosse a distância entre eles, sempre o levaria na mente e no
coração, ao lado de uma urgência intensa que jamais poderia ser saciada.
Tinha de ficar. Tinha de vê-lo todos os dias ao lado de Angela, a mulher com
quem o conde pretendia se casar. Precisava encarar a realidade e matar de uma
vez por todas o desejo que sentia por ele, antes que o sentimento a destruísse.
Quando voltou ao quarto, viu que Emília dormia profundamente e sentiu uma
onda de simpatia pela menina que, encolhida, exibia as marcas das lágrimas no
rosto triste.
Não era a única criatura infeliz na Villa Dante, pensou furiosa. Malditos Falcone
com sua beleza e crueldade!
Mas não os deixaria vencer essa batalha. Ficaria e lutaria, mesmo que a
verdadeira briga fosse contra ela mesma.
CAPÍTULO VI
Para alívio de Lucy, nenhum membro da família estava por perto quando ela
desceu, embora pudesse ouvir vozes além da porta do salotto, inclusive os gritos
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agudos de Marco.
A casetta não era espaçosa. Com dois quartos e um pequeno banheiro separados
da sala e da cozinha por um lance de escada, serviria apenas como refúgio para
os momentos de repouso.
Respirando fundo, desceu a escada para ir encontrá-lo na sala, onde ele olhava
em volta com ar crítico.
— Não é necessário.
— Está enganada, signorina. Pedi para ficar aqui e ajudar Fiammetta com as
crianças, mas não imaginava que Cláudia também viria, nem que imporia a
presença de convidados sem me consultar. Também não esperava que fosse
forçada a acomodar-se aqui. — E abriu os braços. — Mas a chegada de minha
madrasta muda tudo. Nas atuais circunstâncias, sinto-me forçado a libertá-la do
nosso acordo. Pode partir quando quiser, e sugiro que vá o mais depressa
possível.
Silêncio.
Era quase engraçado. Até pouco antes sentira-se angustiada sem saber se devia
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ficar ou partir e, de repente, Giulio a expulsava sem a menor hesitação. Pena
não sentir vontade de rir.
— Francamente, signore! Sabe muito bem que nenhuma delas está disposta a
assumir a responsabilidade. Sente-se disposto a cuidar de seus sobrinhos?
— Eu?
— Era o que eu imaginava. Nesse caso, prefiro ficar e zelar belo bem-estar dos
meninos até encontrar outra pessoa para o trabalho.
— Isso é impossível.
— Por quê?
— Não importa. Afirmo que a chegada dos convidados não faz a menor
diferença para mim — mentiu.
— Não foi essa a impressão que tive. Desculpe-me, mas pensei que fosse mais
que um interlúdio.
— Bravas palavras. Mas o que vai sentir quando deparar-se com a realidade?
Não quero vê-la sofrer, Lúcia.
Então não via que estava ferida de morte? Ela ergueu os ombros.
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— Por favor, não se incomode mais. Está levando muito a sério algo que é...
trivial. Lamento ter dado uma falsa impressão sobre meus sentimentos e... meu
envolvimento. Não foi intencional.
— Entendo. É evidente que minha opinião original a seu respeito era correta, —
Giulio esperou que ela digerisse o comentário para prosseguir. — Encontrei as
roupas das crianças. — E apontou as malas deixadas perto da porta.
— Grazie.
— Prego. Desejo boa sorte em seu novo papel, cara. Espero que ele não exija
demais de você.
— Não se preocupe. Saberei ocupar meu lugar. Falcone estava partindo, mas
encarou-a mais uma vez.
— Seu lugar? — repetiu, a voz traindo o aborrecimento que até então tentara
esconder. — Vou mostrar qual é o seu lugar, mia cara.
E então acabou.
— Agora vai ter algo para lembrar — disse. — Mais um item em sua coleção de
trivialidades.
Mas jamais revelaria o que sentia pelo conde. Desse momento em diante, Giulio
Falcone seria território proibido e tomaria providências para que os mundos
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que habitavam jamais colidissem novamente.
Para Lucy, o almoço foi uma ocasião tensa. Emília, limpa e bem-arrumada nas
próprias roupas, mostrava-se mal-humorada, e Marco, que passara toda a
manhã merecendo a atenção completa da avó, parecia disposto a demonstrar
como podia ser insuportável, se quisesse.
— Não estou com sono. Marco pode ir dormir, se quiser. Eu vou nadar.
— Não grite, por favor. — E, virando-se para Lucy. — Pode fazer alguma
coisa...?
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Sara Craven – A Última Tentação
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— Vai sair? — Havia um certo tom de censura na voz da confessa. — Angela
chegará a qualquer momento.
— Nesse caso, espero que a receba bem e a instale com todo o conforto. Afinal,
Angela e o amigo são seus convidados, Cláudia.
— Mamma, ainda não aprendeu que Giulio não pode ser comandado? Ele se
casará com Angela quando decidir, e não antes. Até lá, os dois podem divertir-
se como quiserem.
— Lúcia, quero que saiba que sou muito grata por estar aqui. Também quero
pedir para não dar importância ao comportamento de minha mãe. A verdade é
que ela não tem muita simpatia pelos ingleses. Sua irmã mais nova, Bianca, a
quem ela amava muito, casou-se com um inglês e morreu em seu país depois de
dar à luz Angela.
— Mamma é uma pessoa obstinada. Quando ela se casou com o conde Falcone,
Giulio e eu éramos apenas crianças. Ela esperava ter outro filho, um menino,
mas não conseguiu engravidar, e então decidiu que Giulio e eu deveríamos nos
casar. É claro que a idéia era ridícula. Não nos amávamos como homem e
mulher, e sim como irmãos, apesar de ele sempre ter sido muito atraente. Além
do mais, eu nunca conseguia saber em que ele estava pensando, e isso me
enlouquecia. Com Sérgio sou canaz de prever cada pensamento ou ação, e por
isso nosso casamento é perfeito.
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Sara Craven – A Última Tentação
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— Oh, por favor! Detesto toda essa formalidade. Alison é como um membro da
família, e espero que você também se aproxime mais de nós. Pode me chamar
de Fiammetta. Está imaginando por que disse coisas tão pessoais, não é? — Ela
a conduziu para dentro do quarto e fechou a porta. — Não se trata de simples
fofoca. Está cuidando de meus filhos, e por isso há algo que precisa saber. Algo
sobre Emília e o grande problema que enfrentamos.
Fiammetta prosseguiu.
— Quando ela nasceu, mamma ficou muito feliz, naturalmente. Afinal, era sua
primeira neta. Mas quando Marco veio ao mundo, tudo foi diferente. Ali estava
o menino com que ela tanto sonhara. Mamãe ficou muito feliz, quase como se o
bebê fosse dela. Sérgio e eu pensamos que a onda de euforia acabaria passando,
mas estávamos enganados. Emília percebe a diferença que a avó faz entre os
dois, e sente ciúme.
— É compreensível.
— Uma certa rivalidade entre irmãos faz parte da infância. Meus sobrinhos
também brigam muito e...
— Mas ele não escorregou. E tudo isso deve ter acontecido há muito tempo.
— E o que Sérgio diz, mas não consigo esquecer a cena. Recentemente Emília
tem roubado. Nada de muito valor, felizmente. Apenas algumas mil liras da
minha bolsa, ou da carteira de minha mãe. Mas isso me deixa muito ansiosa.
Mamma acredita que devemos mandá-la para um colégio interno especializado
em crianças problemáticas.
Projeto Revisoras 59
Sara Craven – A Última Tentação
(Julia Cartão Postal 51)
— Já discutiu esse assunto com Giulio... quero dizer, com o conde Falcone?
— Não. Giulio era apenas um garoto de quatorze anos quando o pai dele casou-
se pela segunda vez. É claro que ele amava a mãe, e não conseguiu aceitar a
presença de outra mulher no lugar que havia sido dela. E mamma... bem, ela
também cometeu alguns enganos. Duvido que sinta-se capaz de dividir
problemas tão sérios com o enteado. Revelar que a neta pode ter algum tipo de
doença... Se Giulio fosse casado, se tivesse filhos, o relacionamento familiar
certamente seria mais próximo. Ele entenderia melhor...
— Bem, talvez as coisas mudem quando ele se casar com Angela. — A voz de
Lucy soava particularmente indiferente.
— Pode ser. Angela é muito bonita, e Giulio... bem, você já deve ter notado. Ele
é um homem que qualquer mulher gostaria de ter, mesmo sem o dinheiro e o
poder que o acompanham. Pensei que se casariam há três anos, quando ele
esteve em Londres e passou a encontrá-la com freqüência, mas Giulio recusou-
se a assumir qualquer tipo de compromisso, dizendo que Angela era muito
jovem. Desde então os dois têm visto outras pessoas, mas no final acabarão se
unindo. E ela certamente será uma boa esposa, porque pode partilhar do
mundo de Giulio e participar de seus negócios como eu jamais poderia. Sérgio
nunca me aborreceu com essas exigências.
Lucy não estava surpresa. Fiammetta tinha beleza e charme, mas não havia sido
brindada com uma inteligência notável ou uma grande profundidade de
caráter.
— Sim, você pode estar certa. — Fiammetta bateu palmas. — Brava. Lúcia. É
uma mulher muito inteligente. Como acha que ele vai reagir? Aposto que os
próximos dias serão muito interessantes.
Quando voltou à casetta levando os livros e brinquedos, Lucy decidiu que tanta
Projeto Revisoras 60
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(Julia Cartão Postal 51)
diversão seria mais do que podia suportar.
Depois de trocar o conjunto de saia e blusa por um biquíni preto e uma camisa
de seda da mesma cor, colocou os óculos escuros e o protetor solar numa bolsa.
A vila parecia dormir sob o sol escaldante quando ela atravessou o jardim. Nem
as abelhas voavam sobre os canteiros que separavam a casa principal da área da
piscina, e até as cigarras mantinham-se silenciosas. As folhas das árvores não se
moviam, sinal de que não havia nem mesmo uma brisa leve, e podia ouvir a
própria respiração na tarde quieta e parada.
Por um momento ficou no alto da escada, olhando para a água azul e cristalina
da piscina, lembrando os eventos da noite anterior. A música, as risadas, o
pânico que experimentara... Com um arrepio de repulsa, deixou-se envolver
pela paz que agora dominava o local.
Além das cadeiras e dos guarda-sóis, havia também uma pilha de colchões
próprios para o banho de sol. Lucy colocou um deles à sombra de uma árvore
frondosa perto da piscina, despiu a camisa e mergulhou. A água era como uma
carícia na pele quente e suada, e ela nadou até sentir-se fresca e relaxada.
A verdade era que estava muito envolvida com tudo que acontecia à sua volta,
e tivera consciência desse envolvimento desde o primeiro e infeliz encontro com
Giulio Falcone em Montiverno.
Pensar nele era o suficiente para provocar arrepios que percorriam seu corpo
como dedos gelados.
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Sara Craven – A Última Tentação
(Julia Cartão Postal 51)
Estava enxugando-se com a toalha que levara quando os sentidos entraram em
alerta.
De algum lugar, além dos canteiros floridos, viera um ruído abafado, como a
brisa soprando por entre as folhas. Mas o ar estava parado.
Devia ter imaginado o som que a inquietara, decidiu, estendendo a toalha sobre
o colchão e deitando-se de bruço. Apoiando a cabeça nos braços, fechou os
olhos e deixou a quietude envolvê-la aos poucos.
Uma sucessão de imagens ocupava sua mente. O rosto triste de Emília, os olhos
ansiosos de Fiammetta, a expressão de desprezo da contessa. E, acima de todas
elas, os olhos cor de âmbar de Giulio Falcone cintilando como fogo, a boca
apertada numa linha furiosa ou distendida num sorriso encantador. A graça
inerente e instintiva do corpo musculoso. A força evidente das mãos
determinadas e bem cuidadas.
CAPÍTULO VII
Mas sabia que aquela liberdade era uma breve ilusão. Acima dela pairava a
sombra do falcão, o predador de quem jamais poderia escapar.
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Sara Craven – A Última Tentação
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Então ouviu seu nome e sentiu a mão que acariciava seu corpo emplumado,
subjugando-a sem esforço. Era o toque de um mestre.
— Aposto que também esteve aqui antes, observando-me. Como dono da casa,
devia ter um pouco mais de respeito pela privacidade dos hóspedes e
empregados.
— Tenha cuidado, Lúcia. Existem limites, até mesmo para você. Cheguei há
alguns momentos com a intenção de nadar. Se não a houvesse encontrado
exposta ao sol, certamente teria respeitado sua privacidade.
— À essa hora do dia, normalmente tenho a piscina só para mim, e por isso
posso esquecer certas trivialidades. Quer uma demonstração? — Ele sorriu,
levando a mão ao cinto.
Imaginando o corpo poderoso e forte totalmente nu, Lucy sentiu a boca seca.
— Não precisa fugir, colombina. Continue aproveitando o sol, agora que está
protegida contra ele. E desfrute de sua liberdade enquanto pode.
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Sara Craven – A Última Tentação
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— Oh, céus! As crianças! — Assustou-se, olhando em volta com expressão
assustada. — Onde elas estão?
Lucy permaneceu onde estava, indecisa, sabendo que Giulio notava a pele
dourada exposta pelo biquíni sumário. Até pouco antes estivera tocando suas
costas.
— Lúcia, pare de agarrar essa camisa como se fosse um escudo. Não precisa
defender-se.
— Pelo contrário. Se quer que eu peça desculpas por minha conduta na casetta,
então me desculpo. Reconheço que não tinha o direito de beijá-la. Mas me
recuso a pedir perdão pelo protetor solar. Foi necessário, e só quis ajudá-la.
— Não tinha o direito de decidir por mim e me tocar, quaisquer que fossem as
circunstâncias.
— Mas foi o que insinuou. Deixou claro que não mereço sua confiança, que não
sou capaz de ficar sozinho com você sem tomar pela força algo que não está
disposta a oferecer.
Pois está enganada, mia cara. Nunca precisei forçar uma mulher a nada, e você
não será exceção a essa regra.
Ele despiu a camisa e a calça, revelando um calção preto próprio para a natação.
O traje de banho não a ajudava em nada, e Lucy teve de respirar fundo várias
vezes para controlar as batidas rápidas do coração.
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— Sim, mas não me tenta a ficar. — Fingindo uma indiferença que estava longe
de sentir, vestiu a camisa sobre o biquíni e começou a abotoá-la com dedos
trêmulos.
Notando a maneira como os olhos vagavam por seu corpo, ela pendurou a
bolsa sobre o ombro indicando que pretendia partir.
Ao passar por ele, sentiu os dedos em torno de seu braço e foi obrigada a parar.
— O que pode ser justo numa situação como a nossa? Olhe para mim, Lúcia.
O sangue corria devagar pelas veias de Lucy, espalhando um calor que aos
poucos ia tomando conta de todo o corpo. Só precisava virar-se para ele.
Apenas um movimento...
Não precisava tentar adivinhar quem era a jovem. Só podia ser Angela, a futura
esposa de Giulio.
E ele também estava ali, parado na escada, o rosto congelado numa máscara de
incredulidade que beirava o horror.
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Não podia estar acontecendo!
Mas onde ficava Philip nessa história? Estaria divertindo-se, também, ou levava
o romance a sério?
E o que Ângela sentia? Comparado a Giulio, Philip tinha pouco a oferecer. Uma
aptidão para esportes radicais e dedicação ao trabalho não significavam muito
contrapostos à fortuna e ao nome que vinham desde a época do Renascimento.
Teria acertado ao dizer que Ângela só usava o namorado para despertar o
ciúme do futuro marido e forçá-lo a tomar uma decisão?
Lucy suspirou. Pelo rumo que os fatos pareciam tomar, logo seria duas vezes
perdedora.
Mas Giulio nunca fora seu, e por isso não podia perdê-lo. E tinha de lembrar-se
disso a todo custo, se quisesse preservar a sanidade.
Foi um alívio quando Teresa trouxe as crianças, e ela ocupou-se com a tarefa de
banhá-los e vesti-los para o jantar.
— Nesse caso, é melhor procurar uma cara nova. — Marco deu uma gargalhada
forçada seguida por um grito de dor. — Ela me beliscou! — E mostrou o braço
rechonchudo onde marcas vermelhas confirmavam a acusação.
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— Se não fosse tão rude com sua irmã, nada disso teria acontecido.
— Devia estar do meu lado, não do dela. — O rosto infantil era uma máscara de
ultraje.
— Então contarei a mamma sobre o que ela fez, e Emília estará encrencada.
— Ninguém gosta de pessoas que falam demais — disse, torcendo o nariz para
o garoto.
— Mas nonna diz que Emília tem de ser punida quando é má para mim.
— Tenho uma idéia. Por que vocês dois não tentam ser amigos só por um dia?
— Por quê? O que temos a ganhar com isso? — Marco perguntou sem
entusiasmo.
— Vou esperar até ter certeza de que são capazes de um mínimo de gentileza, e
depois decidirei. Agora, desçam e fiquem quietos enquanto mudo de roupa.
— Não joguei. — Emília estava vermelha de raiva. — Ele estava brincando com
o vaso. Disse a ele que devia parar e Marco o jogou no chão.
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— Lúcia prometeu que nos recompensaria se fossemos amigos por um dia
inteiro — Março contou ao tio.
— Suborno, colombina?
— Tenho de começar por algum lugar. — Vermelha, segurou a toalha com mais
força.
— Sim, obrigada.
— Prego. — Assim que os dois pequenos saíram para a tarde ensolarada, Giulio
virou-se da porta e sorriu. — Se eu for bonzinho por um dia inteiro, também vai
me recompensar?
— Acho que posso assumir esse compromisso sem correr riscos, signore. Vinte e
quatro horas representam muito tempo.
E, com toda a dignidade que podia manter numa toalha de banho, virou-se e
subiu a escada consciente de estar sendo observada.
Através da janela do quarto, viu quando ele cruzou o pátio e teve de respirar
fundo para recuperar a calma.
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se ao ouvir seus passos e encarou-a.
— Quer que eu acredite nessa tolice? Veio até aqui com o único propósito de
embaraçar-me. Estou desapontado, Lucy. Pensei que tivesse mais dignidade.
Mais... orgulho.
— Não seja ridículo. Não sabia que sua namorada tinha alguma ligação com os
donos desta casa. Na verdade, nem conhecia essas pessoas até ontem.
— Suponho que não. Por outro lado, seria apenas o desfecho perfeito para essa
horrível viagem. Planejamos uma espécie de lua-de-mel, férias românticas para
um casal de namorados, mas assim que chegamos a Florença, Angela
transformou-se num monstro devorador de cultura. Fui obrigado a visitar
dezenas de museus, e tenho a impressão de que nunca mais vou esquecer a
estátua de Davi. Em todo lugar que olhava havia uma delas.
— Ah, sim! É claro que você sabe! — E virou-se como se só então a visse
realmente. — Não me lembro de tê-la visto usando essa roupa.
A saia ampla em tons de azul combinava com a blusa branca de decote redondo
e, apesar de simples, o traje tinha uma certa elegância.
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Campari. — Para ser bem honesto, não esperava hospedar-me com os parentes
de Angela. Ela nunca os mencionou quando estávamos em Londres. Mas querer
me apresentar à família deve ser um bom sinal. — E baixou a voz. — A tia, a tal
confessa, é um verdadeiro teste de paciência!
— Não há como discutir preferências pessoais. Tenho de admitir que está muito
bonita, Lucy.
— Obrigada.
— Você sabe que sim. — Ele abandonou o copo sobre uma mesa de canto e
levantou-se.
— Ora, ora! De repente tornou-se altiva e distante. Espera que o grande Giulio
Falcone se interesse por você? Vi como estavam próximos na piscina hoje à
tarde, quando chegamos. De acordo com Angela, ele é famoso por seus
romances passageiros, mas normalmente exige padrões mais elevados.
Um som na porta chamou sua atenção, e ela virou-se. Giulio estava parado na
soleira, acompanhando a cena com expressão neutra.
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— Quanta virtude!
— Acho que vou ver por que Angela está demorando tanto.
— O eterno problema sobre o que vestir, sem dúvida — Giulio comentou com
tom divertido, servindo-se de um uísque enquanto Philip dirigia-se à porta.
Lucy obrigou-se a beber alguns goles do suco, preparando-se para o que estava
por vir.
— Fique longe dele, Lúcia. Esse homem não é para você. Adoraria dizer que
sabia disso, mas preferiu cooperar com o jogo de aparências.
— Isso é um aviso?
— Talvez. Pelo menos até ela se cansar. — Giulio riu. — Angela foi
amaldiçoada com um baixíssimo nível de tolerância.
— Lamento, mas está atrasado, signore. Já me arrependi mil vezes. Sendo assim,
creio não ter mais nada a perder.
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Lucy aproximou-se da janela e fingiu um enorme interesse pelas sombras que
começavam a invadir o jardim.
CAPÍTULO VIII
Se Lucy não estivesse tão tensa, o jantar teria sido quase divertido.
Usando um vestido de seda que devia ter custado o equivalente a três meses do
salário de Lucy, Angela mantinha toda a atenção voltada para Giulio. A voz
baixa, a linguagem corporal que excluía todos os presentes com um simples
movimento de ombros, a mão brincando com a abotoadura de ouro do conde, o
riso suave e sedutor... tudo proclamava uma intimidade sólida e antiga.
Marco cutucou-a.
— Minha querida Cláudia, vejo que está usando o anel Falcone. Isso significa
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que decidiu devolvê-lo, afinal?
— Tentei discutir a questão em particular, mas não obtive sucesso. Como seus
advogados disseram várias vezes, o anel é uma herança, não uma jóia qualquer,
e devia ter sido devolvido à família depois da morte de meu pai.
— A fim de que o novo conde Falcone possa dá-lo à sua esposa? Mas você não
tem uma esposa, mio caro. Na verdade, está se tornando famoso por conta dessa
insistência em permanecer solteiro. Sendo assim, a questão está em suas mãos.
Tudo que precisa fazer é satisfazer meu desejo anunciando o noivado, e garanto
que terá o anel para presentear a jovem felizarda. — Ela sorriu para Angela e
estendeu a mão, estudando a jóia que brilhava à luz do candelabro de prata.
— Estou farto dessa discussão — Giulio Falcone anunciou com frieza. — Meu
casamento não tem nenhuma, relação com o assunto. O anel pertence ao legado
da família, mesmo que eu permaneça solteiro até o fim de meus dias.
— Não. Pretendo me casar antes do final do ano. Mas isso, perdoe-me, querida
Cláudia, não lhe diz respeito. E presentear minha fidanzata com a jóia também é
uma decisão pessoal, não um ritual orquestrado por você.
— Sim, sobre muitas coisas, mas não sobre o anel. Mamma jamais me ouviria.
Ela provoca Giulio constantemente, como fez esta noite, exibindo a jóia em
ocasiões sem importância. Sei que ele não devia ter dito o que disse, mas não
posso censurá-lo.
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casamento.
— Então ela não conhece o próprio enteado. Por outro lado, o casamento não
deve demorar. Notou como eles conversaram durante o jantar?
— Sim. — Lucy respondeu com tom seco. — Crianças, mais devagar — disse,
apressando o passo para alcançá-las. — Está escuro, e vão acabar caindo e se
machucando.
As crianças foram para a cama sem criar problemas, apesar de Emília mostrar-
se disposta a manter a mãe a seu lado. E quem poderia censurá-la por isso?
Quando Fiammetta saiu e a casetta foi invadida pelo silêncio, Lucy sentou-se no
banco do lado de fora, perto da porta. Depois da quietude do dia, a noite era
cheia de sons e movimentos. Grilos, sapos e aves noturnas entoavam uma
canção de amor à natureza que embalava seus devaneios.
O som de passos invadiu sua reflexão, e ela ergueu os ombros, o corpo todo em
estado de alerta esperando ver a figura alta e imponente que pouco depois
surgiu sob a luz da lua.
— Não. Encerrei o período de batalhas, pelo menos por hoje. Vim ver se as
crianças estão bem e se você tem tudo que considera necessário. Posso sentar-
me?
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pequenos já foram dormir, sinto-me livre para decidir como ocupar meu tempo.
— Não está nervosa aqui fora, longe da casa e das outras pessoas?
— Não. Graças a Deus, não temos esse tipo de problema por aqui. Foi você
quem sentiu-se observada na piscina.
— Eu disse que não havia ficado escondido para observá-la, mas isso não exclui
outras pessoas.
— Não exagere. É evidente que não perdeu o equilíbrio. Mas também é óbvio
que está infeliz, e isso me incomoda, porque sei que sou o culpado. Não queria
vê-la sofrendo dessa maneira, Lúcia.
— Por favor. Prefiro não discutir esse assunto — ela pediu, sentindo que
poderia trair-se a qualquer momento.
— Mas não podemos fingir que a situação não existe — o conde argumentou.
— Lúcia. — Ele estendeu a mão e parou ao vê-la encolher-se. — Será que não
entende? Discutir o assunto só tornará tudo muito pior. Não pode demonstrar
um mínimo de compaixão, pelo menos?
— Não sabia que a ferida era tão profunda. Não há nada que eu possa fazer?
— Esta manhã, disse que tudo seria melhor se eu partisse. Eu... sou forçada a
reconhecer que estava certo. Irei embora assim que encontrar outra pessoa para
cuidar das crianças.
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Giulio ficou em silêncio por alguns instantes, os olhos fixos no chão.
— Como quiser. Teresa tem uma prima que é professora e está procurando um
emprego temporário para ocupar-se durante as férias. Verei o que posso
arranjar. O que pretende fazer?
— O que devia ter feito desde o início. Voltarei para a Inglaterra no primeiro
vôo disponível. Retomarei minha vida de onde a deixei.
— Fala como se tudo fosse muito simples. Como se a questão fosse racional. E
no entanto, nós dois sabemos que não é assim.
Antes que pudesse imaginar as intenções do conde, Lucy foi aprisionada pelos
braços fortes e descobriu-se sobre os joelhos dele, imobilizada.
Por um segundo viu o rosto moreno iluminado pelo luar, o brilho nos olhos e as
linhas que marcavam a área em torno da boca provocante. O falcão com sua
presa. Logo ele a devoraria, e então estaria eternamente perdida na escuridão.
Depois foi a vez dos lábios seguirem o caminho traçado pelas mãos, excitando-a
como jamais imaginara ser possível.
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O desejo de tocá-lo era mais forte que tudo e, tímida, ela levou os dedos
trêmulos à gola da camisa, abrindo-a devagar para experimentar a textura da
pele bronzeada e firme. Quando finalmente espalmou a mão sobre o peito
musculoso e sentiu as batidas aceleradas daquele coração, teve a impressão de
estar entrando no paraíso.
Sabia o que aconteceria em breve. Sentiu quando ele abriu sua saia e
experimentou uma onda de calor tão forte, que temeu derreter nos braços do
conde.
A boca apoderou-se novamente da dela, dessa vez com delicadeza. O beijo era
como uma súplica silenciosa, um pedido que ela estava disposta a atender sem
hesitar.
O encanto se quebrou.
Mas, qualquer que fosse o problema, Marco não podia ser acusado de nada. Um
olhar para a cama vizinha foi suficiente para certificar-se de que ele dormia
profundamente.
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— Mas isso não aconteceu, Emília. — Lucy afagou os cabelos da menina com
delicadeza. — Está aqui, na vila de seu tio, e perfeitamente segura.
— Lúcia está certa, cara. — O conde abraçou-a e secou seu rosto com o lenço
que retirou do bolso. — Foi só um sonho ruim.
— Quero um copo de leite. E quero que fique aqui comigo, zio Giulio.
Quando voltou ao quarto levando o leite morno, Emília estava bem mais calma
e até sorria enquanto Giulio murmurava uma história em seu ouvido. Ela bebeu
todo o leite sem protestar e, em seguida, deitou-se segurando a mão do tio.
Mas havia uma certa medida de paz em contar a velha história de amor, perdas
e redescobertas. Lucy mantinha a voz baixa e estável, e muito antes de
Cinderela fugir deixando para trás o sapatinho de cristal, Emília já dormia
profundamente.
— Ela está mais tranqüila, mas dormirei com a porta aberta, caso tenha de
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voltar a confortá-la.
Giulio levantou-se.
— Sabe de uma coisa, bella mia? Está desperdiçando seu talento no ramo da
publicidade. Devia dedicar-se às crianças.
— Não sei de onde tirou essa idéia. — Lúcia saiu do quarto e desceu a escada
de cabeça erguida, consciente da presença dele às suas costas. — Uma história e
um copo de leite não me transformam em Mary Poppins.
— Entendo. Acha que tentarei fazer amor com você novamente, se ficar. Está
enganada. Meu comportamento esta noite foi um erro. Não tenho o direito de
tocá-la.
— Não tentarei justificar minha atitude. Digo apenas que é difícil resistir aos
seus encantos.
E à sua disponibilidade. Giulio não disse as palavras em voz alta, mas nem era
necessário.
— Então a terá. E espero, pelo seu próprio bem, caríssima, que não tenha de
pagar muito caro por ela.
Devia estar feliz, mas a única coisa que sentia era um imenso vazio.
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Um soluço conseguiu vencer a barreira que formara-se em sua garganta e
explodiu no alívio das lágrimas.
CAPITULO IX
Foi uma noite interminável para Lucy. A idéia de partir e nunca mais ver Giulio
era insuportável, mas também não ousava ficar, porque sabia que, nesse caso,
seria destruída.
— Pare com isso, por favor. Vá se vestir, e prometo que irei encontrá-lo num
minuto.
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por pão, geléia de cereja e uma pêra.
— Minha tia prefere tomar o café no quarto. Pode preparar uma bandeja?
Por um momento, Lucy olhou para a jovem vestida com short e camiseta branca
e imaginou como ela ficaria depois de ser atingida por um torpedo de geléia de
cereja.
Lucy, que estava prestes a censurar o menino pela mesma razão, encolheu os
ombros. -
— Gosto de ver uma criança com apetite. — E levantou-se para sair da sala.
Teresa providenciou uma bandeja coberta com uma imaculada toalha branca,
porcelana chinesa decorada com padrões florais e um cintilante serviço de café
em prata, tudo acompanhado por sorrisos de simpatia e compaixão.
Quando estava carregando a bandeja na direção da escada, Lucy foi detida pela
voz de Giulio.
Com o coração aos saltos, virou-se e o viu parado na porta, uma silhueta escura
contra o sol matinal.
— Quem pediu?
Pela primeira vez desde que o conhecera, ele não exibia a habitual aparência
impecável. Precisava barbear-se, e as roupas que usava eram as mesmas da
noite anterior.
— A srta. Winters também não gosta de ser tratada como uma criada —, Giulio
afirmou com tom gelado. — Sua tia já tem uma empregada para servi-la. Onde
está ela?
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— Provavelmente passando as roupas que tia Cláudia pretende usar. Qual é o
problema caro! É só uma bandeja de café.
— Oh, acho que isso já ficou bem claro, pelo menos para mim, meu bem. —
Angela ria. — Mas quem sou eu para criticar suas pequenas escapadas?
Também não sou imune a certas tentações.
Seria um dia muito quente. Lucy passou a primeira parte da manhã tentando
convencer as crianças a escreverem um cartão para Alison, mas elas recusavam-
se a fazer um desenho ou assinar os nomes, e por isso desistiu e os levou à
piscina para um mergulho.
Emilia tinha um certo temor de água, mas procurava não demonstrá-lo. Como
Marco insistia em debruçar-se sobre a irmã e enervá-la, Lucy foi buscar uma
bola no quarto de despejo onde ficavam os guarda-sóis e colchões, e assim os
dois começaram um divertido jogo na parte mais rasa da piscina. A brincadeira
durou cerca de meia hora, até Angela entrar em cena.
— Que barulho! — Ela estava parada perto da borda, acompanhada por Philip
que, sério, parecia pouco a vontade. — Vim aqui para relaxar — a jovem
continuou. — Não pode levar os meninos para brincarem em outro lugar?
— E daí? Estou dizendo que deve levá-los para outro lugar. Gostaria de um
pouco de paz e privacidade. — Angela olhou para Philip com um sorriso
bastante significativo, e em seguida examinou o biquíni de Lucy com ar de
desprezo. — Além do mais, tenho certeza de que zia Cláudia não permite que
os criados usem a piscina quando há algum convidado.
Controlando a fúria que a invadia, Lucy retirou as crianças da água com esforço
e enrolou-as em. toalhas.
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— Espero que sim. Todos os meus amigos na Inglaterra têm babás, e você é
simplesmente a pior que já vi. E não se iluda com as atenções de Giulio, meu
bem, porque para ele, esse tipo de atitude é instintiva. Como um reflexo
fisiológico, se é que me entende.
— Sinto muito — Lucy respondeu irritada. — Não sabia que queria me ver.
Lucy suspirou.
— É bom saber disso. Vou almoçar com alguns amigos em Siena, e quero levar
Marco comigo. Por favor, vista-o adequadamente.
— Somente Marco?
— Você é insolente.
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espere por mim no quarto.
— Quero ficar aqui. — Excitado, ele olhou por cima do ombro da babá e bateu
palmas. — Zio Giulio, venha ver Lucy e nonna brigando.
— Dorotea, a prima de Teresa. Isto é, espero que ela aceite o convite assim que
for encontrada. — E virou-se para a sobrinha. — O que aconteceu, meu bem?
— Disse apenas que não a levarei para almoçar na casa dos Masserinis porque
ela não é confiável.
— Você vai almoçar comigo, cara. — Giulio decidiu, afagando o rosto molhado
da menina. — Vá mudar de roupa.
O sorriso de Emília foi como o sol surgindo por trás das nuvens, mas o olhar
que ela lançou na direção da avó antes de entrar na casetta sugeria rancor e
ressentimento. Marco seguiu a irmã.
— Meu querido Giulio, não pode abandonar seus convidados. Angela ficará
ofendida. — E virou-se para Lucy. — Ainda aqui, signorina? Devia estar
ajudando meu neto a vestir-se.
Projeto Revisoras 84
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Lucy afirmou com a cabeça e desapareceu além da porta da casetta. Lá dentro,
enquanto supervisionava as crianças, pôde ouvir a furiosa explosão da
condessa e as respostas geladas de Giulio às colocações em italiano.
— Estão brigando por causa daquele anel vermelho que nonna usa de vez em
quando. — Marco contou enquanto tomava uma ducha.
— O anel não é dela. Ela não devia usá-lo. — Emília opinou com paixão
enquanto lavava os cabelos. — Ouvi papa dizendo a mamma que a jóia devia ser
devolvida.
— Trata-se de uma discussão entre dois adultos, e vocês não devem interferir —
Lucy orientou com firmeza. — Muito bem, o que vão vestir?
Pela primeira vez Emília não criou problemas, aceitando de imediato a sugestão
oferecida pela babá temporária.
— Você já tem mais do que precisa — Lucy comentou com tom severo
enquanto penteava os cabelos do garoto.
Sabia que estava brincando com fogo, mas, mesmo assim, vestiu um conjunto
amarelo e afastou os cabelos do rosto prendendo-os com um lenço da mesma
cor.
— Sim, e Emília estará lá para ter certeza disso. — Fiammetta riu, estendendo a
mão para Giulio. — Tome cuidado, mio caro. Às vezes acho que vai depressa
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demais.
Depois que Cláudia e Marco partiram, Giulio parou o carro diante da casa.
— Acho que vai ter de esperar alguns anos. Mas um dia ele virá, tenho certeza.
— E acomodou-se atrás do volante. — Muito bem, o dia é todo seu. Para onde
vamos, principessa!
— Ah, sim! Mas receio ter esquecido o caminho. Vai ter de me ajudar, ou
corremos o risco de almoçar em Roma. E vai ter de falar alto, porque estou
ficando velho e surdo.
Em alguns momentos, ela ficou em dúvida sobre para que lado ficavam a
direita e a esquerda, e a aproximação de um precipício a deixou visivelmente
assustada, mas a alegria de Giulio e as intervenções doces e firmes de Lucy a
ajudaram a superar os temores. O jogo estendeu-se até Florença.
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no meio de uma grande praça repleta de cópias em bronze das mais famosas
esculturas de Michelangelo, incluindo o conhecido Davi. — Foi muita bondade
sua.
— Ora, não!
A partir daquele ponto elevado puderam ver Florença cortada pelo rio Arno,
suas torres e praças iluminadas pelo sol como numa gloriosa pintura medieval.
E além dela, à distância, erguiam-se as montanhas toscanas em tons de verde,
azul e púrpura.
Virando-se, viu que ele a observava com atenção. Um rubor instintivo tingiu
seu rosto e, perturbada, ela voltou a apreciar a paisagem.
— Sempre que me afasto daqui, este é o primeiro lugar que visito na volta. —
Giulio contou.
— Sim, a única ponte sobre o Arno que resistiu intacta à guerra. Meu pai
sempre dizia que ninguém jamais saberia porque os alemães a pouparam. A
ponte permanece no mesmo lugar, altiva e sólida, desde o tempo de Cosimo de
Mediei.
— Seu ancestral.
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— Um deles, talvez. Quer comprar alguma coisa na Ponte Vecchio? Uma
lembrança de sua visita a Florença?
— Acho que terei de me contentar com souvenirs baratos. Pensando bem, não
preciso deles. Jamais esquecerei essa vista enquanto viver. Obrigada por ter me
trazido até aqui.
— Tirei o dia para praticar boas ações. Sei que nem sempre fui muito generoso
com você, Lúcia, e sei também que, no final, terei de ser cruel... para ser bom.
A mão pousou sobre seu ombro e, de repente, ela sentiu-se puxada contra o
corpo musculoso. Os lábios roçaram o dela num beijo suave e rápido.
E então, com a mesma rapidez, antes que alguém pudesse notar o que
acontecia, Lucy estava livre novamente, tocando a boca com dedos trêmulos e
vendo o conde afastar-se. Um dia, num futuro muito próximo, teria de vê-lo
afastar-se para sempre.
CAPÍTULO X
Sem esperar para ouvir a opinião da babá temporária, ele entrou no automóvel
e dirigiu até uma rua lateral perto da Piazza delia Signoria, onde estacionou.
— É claro. Esse lugar foi cenário de um filme famoso. Uma Janela para o Amor.
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Não imagina como senti saudade daqui.
— Imagino. Foi assistindo a esse filme que decidi conhecer a Itália a qualquer
preço.
— A qualquer preço? Tem certeza de que já não pagou caro demais por essa
viagem?
Podia apostar que essa era a ambição da maioria dos turistas que passava por
ali, mas, para ela, retornar a Itália representava apenas um risco que não
pretendia correr. Mesmo assim, incentivada por Emília, levantou a mão e
deslizou-a pelo metal frio, notando que a menina pedia algumas moedas ao tio
para jogá-las na boca do animal.
— Mais uma parte da lenda local — ele explicou. — Dizem que dá sorte...
— Para quem?
Foram levados à melhor mesa, onde um garçom logo serviu vinho, água
mineral e pães quentes.
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Sara Craven – A Última Tentação
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Esquecendo que prometera a si mesma ser fria e distante, Lucy retribuiu o
sorriso com que Giulio a brindara.
— Deve vir aqui com freqüência para receber tratamento tão especial.
— Moro e trabalho aqui, só isso. E então, está satisfeita com a visita a Florença?
— Sim, muito. Pretendia mesmo conhecer essa região. Mas fui... surpreendida
pelos eventos.
— Eu também. Mas uma visita não é o bastante. Deve conhecer melhor minha
cidade antes de partir.
— Sim, como Beatrice, a jovem que o poeta amou durante toda a vida. Mas
Dante não se contentou com a poesia. Envolveu-se na política e foi expulso da
cidade para Ravenna. Há uma história em nossa família sobre ele ter sido
recebido em nossa casa a caminho do exílio, motivo pelo qual a propriedade
leva seu nome. Gosto de acreditar nisso.
— Não. Tinha inimigos demais para isso. Mas agora, todos os anos no
aniversário de sua morte, a cidade envia combustível para acender as luzes em
seu túmulo e assim fazer as pazes com ele.
— É uma bela história. Pena ele nunca mais ter reencontrado sua querida
Beatrice.
— Diz a lenda que ele só a viu uma única vez, quando ainda era uma menina a
caminho da escola. Mas aquela criança tornou-se seu ideal, embora os dois
tenham se casado com outras pessoas.
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— Sim, mas nem sempre isso é possível, cara. Além do mais, sabemos que
Dante amou Beatrice, mas comenta-se que ela nunca retribuiu seu amor.
— Sim, querida. Irei encontrá-la assim que terminar de tomar o café. — E sorriu
para Lucy, que parecia prestes a protestar. — Relaxe, colombina. Ela estará
segura no pátio. Aproveite a paz enquanto pode. Afinal, todos nós merecemos
uma trégua. E enquanto descansamos, Ângela pode desfrutar de alguma
privacidade com o amante.
Por que não pedia Angela em casamento e a* fazia encerrar de vez o romance
com Philip? Angela era uma mulher vulgar, leviana e gananciosa, mas se era
esse seu ideal romântico, ninguém tinha o direito de criticá-lo.
— Talvez não possamos controlar nossas emoções com a facilidade que sugere.
O verdadeiro amor, o sentimento forte, profundo e eterno de que falam os
poetas, não nos dá escolha.
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— Quem?
— Suponho que seja uma prática habitual... num lugar tão quente... — Ela
gaguejou, sentindo a boca seca.
As palavras provocavam uma reação tão poderosa que Lucy teve medo de
perder o contato com a realidade. O desejo incendiava seu corpo, e naquele
momento soube que aceitaria estar em qualquer lugar, desde que fosse com ele.
Ela sorriu e agradeceu, não sem antes elogiar a excelente comida e o ambiente
fresco e agradável.
— Posso sentar-me?
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— Entendo. Prefere os italianos, não? — Ele riu, sentando-se com uma
casualidade irritante. — Nina ficou enciumada por não ter sido escolhida pelo
conde, mas expliquei a ela que você possui um ar misterioso capaz de
enlouquecer os homens. Quando ele apareceu em Lussione, ela chegou a
esperar que Falcone houvesse mudado de idéia, mas o sujeito só queria fazer
perguntas sobre seu passado. Ela ficou furiosa por isso!
— Sim, ele apareceu ontem de manhã, logo depois do café. Os pais de Ben
ficaram muito impressionados. Espero que ele tenha ficado satisfeito com as
referências, que Nina forneceu a seu respeito. Francamente, eu não teria ficado.
— É claro. — Hal comentou com ironia. — Bem, sei quando não sou bem-vindo.
Se as coisas não derem certo com o conde, meu bem, se for abandonada, como
ele fez com todas as outras, não hesite em me procurar.
Ele inclinou-se e, pressentindo sua intenção, Lucy virou a cabeça, de forma que
o beijo insolente atingiu-a no rosto.
— Então sua memória é bastante fraca, bella mia. — Giulio jogou o pacote que
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carregava sobre a mesa e, impaciente, fez um gesto para pedir a conta a
Giovanni.
— Sua memória também não é nenhum prodígio, conde Falcone. Não pode
imaginar que eu tenha desejado... aquilo!
Por um momento, ela o encarou atônita e ultrajada. Como ousava lançar uma
acusação tão injusta, quando ele mesmo havia tentado seduzi-la? Quando a
mulher com quem pretendia casar-se conduzia um romance sob seu próprio
teto? Não só era totalmente amoral, como um especialista em estabelecer e
seguir duplos padrões de conduta. E como pudera esquecer tudo isso, mesmo
que só por um momento?
— E decidiu que tenho fibra moral suficiente para cuidar das crianças? Se é que
pode julgar esse tipo de característica...
— Sou o chefe da minha família, Lúcia, e farei sempre o que for necessário para
proteger o bem-estar e a reputação dos Falcone.
Lucy levantou-se.
— Quer me convencer de que essas pessoas não estão habituadas com esse tipo
de cena, signore? Notei que os habitantes de sua cidade costumam conduzir
conversas comuns em voz alta.
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Sara Craven – A Última Tentação
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— Não eu. E agora, é melhor irmos embora, antes que Giovanni sofra um
ataque cardíaco. Presumo que tenha visto o bastante de Florença por um dia.
— São todas tão lindas! — a menina exclamou ao vê-la. — Acha que mamma vai
gostar de flores amarelas? Ou as rosas são mais bonitas?
— Que tal um ramalhete misto? — Lucy perguntou, furiosa por notar que
Giovanni ria de algo que Giulio acabara de dizer. Um comentário engraçado à
sua custa, sem dúvida.
Quando chegaram à vila, Emília quis correr ao encontro da mãe para entregar o
presente, mas Giulio agiu com firmeza.
— Sua mãe está descansando, e você deve fazer o mesmo, querida. Acompanhe
Lúcia, e Teresa porá as flores na água até mais tarde.
Emília fez uma careta contrariada, mas obedeceu sem protestar. Quando Giulio
subia a escada para a porta principal, ela se abriu, e Angela apareceu, sorrindo e
estendendo as mãos na direção dele.
— Querido! — A voz melosa sugeria reprovação. — Por que não me disse que
ia a Florença? Teria ido com você. Preciso fazer algumas compras na Ferragamo
e na Pucci.
— Quem sabe da próxima vez? — Giulio tomou as mãos dela e levou-as aos
lábios, dizendo mais alguma coisa que Lucy não pôde ouvir.
— Cinderela.
— Outra vez?
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— Sim, porque Cinderela tornou-se uma principessa, como zio Giulio diz que eu
serei um dia. Espera encontrar um príncipe e casar-se com ele, Lúcia?
— Zio Giulio é um bom homem. E hoje eu o vi beijá-la. Vai se casar com ele?
— As pessoas trocam beijos por vários motivos, Emília — Lucy respondeu com
tom neutro, apesar da reação intensa provocada pelo comentário inocente. —
Nem sempre um beijo significa que um homem e uma mulher estejam
apaixonados, ou que pretendem viver juntos para sempre. Na maioria das
vezes, eles acabam se casando com outros indivíduos. — A imagem de Ângela,
sorridente é triunfante, invadiu sua mente. — Vamos à história. Era uma vez...
Emília adormeceu muito antes de a história terminar. Lucy desceu a escada sem
fazer barulho, disposta a ir sentar-se no jardim e desenhar. Recusava-se a
pensar.
Viu o pacote que Giulio lhe entregara em Florença, e que ela havia deixado
sobre a mesa da sala. Havia uma nota sob o laço de fita que o envolvia.
Impelida pela curiosidade, e algo mais difícil de definir, ela rasgou o papel e
abriu a caixa. Com mãos trêmulas, removeu o papel de seda que envolvia uma
linda bolsa de couro com fecho dourado. Depois abriu a bolsa.
Dentro dela encontrou um cartão branco onde estava escrito apenas o nome
dele. Giulio. Nada mais.
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CAPÍTULO XI
Foi uma tarde longa. Apesar da determinação de Lucy, a atividade tão adorada
de desenhar e pintar não proporcionou o efeito anestésico que esperava.
Qualquer que fosse ele. Havia lido o bilhete dezenas de vezes, mas ainda não
conseguira chegar a uma conclusão.
Foi quase um alívio quando Marco retornou, e Lucy sugeriu que o brinquedo
fosse guardado, e os dois passassem o tempo pintando.
— Acho que, se ama Angela de verdade, deve ficar e lutar por ela, mesmo que
isso o faça sofrer. Não acredito em desistir.
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Por um instante, examinou-o como se quisesse devorá-lo com os olhos,
absorvendo a elegância do terno de tecido leve que realçava os ombros largos e
as pernas longas e bem torneadas.
Vestido para matar! E devia estar feliz por não ser a vítima. Devia... mas não
estava.
— Com licença, conde Falcone. Preciso ir cuidar das crianças. Havia acabado de
alcançar a porta do salotto quando ouviu
Ao abrir a porta, Lucy viu a menina atirar-se sobre a confessa com os punhos
cerrados. Deu um passo à frente, mas Giulio chegou ao local da cena antes dela,
contendo a criança com mãos firmes.
— Minhas flores! — Emília soluçou. — As flores que trouxe para minha mãe.
Ela as jogou no lixo! Odeio você! Odeio essa mulher!
— Encontrei aquele horrível buquê num vaso sobre a mesa. Notei que estavam
murchando, e por isso as joguei fora.
— Já chega! — Giulio interferiu com voz firme. — Fez realmente o que Emília
está dizendo, Cláudia? Por quê?
— Não suporto flores murchas. Mas, como acabou de ver, Giulio, Emília é
incapaz de controlar-se. Talvez tenha algum tipo de desequilíbrio emocional.
Agora Fiammetta vai acreditar no que digo sobre a necessidade de submeter
essa criança a uma supervisão rígida e severa.
Ela deu um passo à frente, e Lucy sentiu que Emília encolhia-se em seus braços.
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— Não acredito no que estou ouvindo! — Lucy explodiu, abraçando a criança
com mais força, como se quisesse protegê-la. — Admito que o comportamento
de Emília foi reprovável, mas ela estava ferida, magoada. E foi provocada.
Tratar as flores que ela escolheu para a mãe como lixo, foi crueldade.
— Leve as crianças de volta à casetta, Lúcia. Pedirei a Teresa que sirva a refeição
de vocês lá. — Giulio decidiu.
— Fiammetta está com uma terrível dor de cabeça. Ela jantará no quarto e não
deseja ser perturbada. Faça o que estou pedindo, Lúcia, per favore.
— Agora zio Giulio não vai nos levar ao piquenique. E eu fui bom. A culpa é de
Emília.
— Está sendo cruel e injusto. O que faria se sua avó jogasse fora um presente
que você comprou?
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serem levados de volta à vila, Lucy tentou jogar paciência, mas descobriu-se
sem chances depois de alguns poucos movimentos em cada partida.
Como último recurso, foi para a cama e ficou virando-se de um lado para o
outro, incapaz de dormir, a mente alerta e a imaginação criando cenas
envolvendo Giulio e Angela jantando num terraço iluminado pelo luar,
conversando em voz baixa e trocando carícias furtivas.
De repente uma espécie de instinto avisou-a de que não estava sozinha, e ela
parou, tensa. A sombra que surgiu entre os arbustos do jardim logo
materializou-se na figura de um homem que caminhava em sua direção.
— Lúcia.
— Giulio! Oh, meu Deus! — Aliviada, deixou-se cair no banco e levou o punho
cerrado à boca. — E você...
— Peço desculpas por tê-la assustado — ele disse, sentando-se ao lado dela e
tomando o cuidado de manter uma distância segura.
E por ter me surpreendido. E enchido meu coração com uma alegria tão imensa
e estúpida, que não sei se devo rir ou chorar.
— Não tive a intenção de incomodá-la. Não pensei que ainda estaria acordada à
— Também esperava o mesmo. Mas não vim aqui para discutir minha vida
social.
— Se espera que eu peça desculpas à contessa, lamento, mas não posso. Acho
que a maneira como ela trata a neta é absolutamente inadequada, e não
pretendo dizer o contrário.
— Tem razão. Mas não pode acreditar que Emília sairá mais feliz ou ajustada de
um colégio interno.
— Qualquer que seja minha opinião, a decisão final deve ser de Fiammetta e
Sérgio.
— Não como Cláudia exerce sobre Fiammetta. Se quer mesmo ajudar, minha
sobrinha, mantenha-a longe de Cláudia. Certifique-se de que não haja mais
nenhum confronto entre vocês. Minha madrasta é uma inimiga vingativa.
— Já havia notado. Suponho que partir em defesa de Emília foi a pior coisa que
eu poderia ter feito.
— Sem dúvida. Quando sugeri que ficasse para cuidar das crianças, não
imaginava que enfrentaríamos todos esses problemas.
— Sim. Mas naquele momento, Lúcia, não tive outra opção. Como poderia
— Por favor, não se culpe. Afinal, as coisas não têm sido tão terríveis assim, e
no final tudo acabará bem.
— Sim. — Giulio concordou. — Tarde demais para nós dois. Lucy deu um
passo para trás, e ele a seguiu, como sabia desde o início que aconteceria.
— Quero vê-la, Lúcia. Só uma vez. Vai mostrar-se para mim? Preciso ter algo
para lembrar quando for embora.
Tremia por dentro, mas as mãos permaneciam firmes quando começou a abrir
os doze minúsculos botões que fechavam a camisola. Quando o último botão foi
aberto, ela afastou o tecido dos ombros e deixou-o cair a seus pés. Nua sob a luz
tênue da lâmpada, era como uma oferenda de rosa e pérolas, aturdida pelo fogo
que brilhava nos olhos cor de âmbar.
— Não posso, mia cara. Não me atrevo a beijá-la, a tocá-la, porque, se o fizer,
não serei capaz de parar, e nós dois sabemos que um encontro entre nós é
impossível. Tudo que posso dizer é que jamais esquecerei esse momento, e serei
eternamente grato por ter me dado a oportunidade de guardar tão doce e
encantadora lembrança.
Por algum tempo Lucy permaneceu onde estava. Depois, sacudida por um leve
tremor, voltou à realidade. Devagar, abaixou-se, recolheu a camisola e colocou-
a sobre o corpo.
CAPÍTULO XII
O tempo havia mudado, como Lucy previra ao ver a lua encoberta, e uma
chuva persistente caía sobre a vila. A idéia de rever Giulio depois da
humilhação da noite anterior era perturbadora, mas não teve muito tempo para
pensar nisso. Assim que pôs os pés na vila e levou as crianças à sala de jantar
para a refeição matinal, ouviu a voz abafada de Fiammetta chamando-a da
porta do salotto.
Lucy entrou e fechou a porta para evitar que as crianças ouvissem a conversa.
— É verdade. O presente que ela trouxe de Florença para você foi destruído, e a
pobrezinha ficou muito aborrecida.
— Minha mãe está furiosa. Ela afirma que Emília perdeu o controle, e que está a
caminho da delinqüência.
— Que exagero!
— Então, por que não adia a decisão até poder conversar com ele? Tenho
certeza de que a contessa compreenderá seu desejo. Enquanto isso, manterei
Emília bem longe da avó. Ela e Marco gostam muito de brincar com os filhos de
Teresa no vinhedo, e posso passar mais tempo por lá com as crianças.
— Oh, Lúcia! O que seria de mim sem você? Especialmente agora, que Giulio
voltou a Florença...
— Ele saiu esta manhã, bem cedo. Giulio representa tão grande conforto para
mim, que chego a me esquecer de que ele tem um trabalho e uma vida própria.
— Ele não virá. Na verdade, Giulio nunca fica na vila nesta época do ano. Ele só
veio para me ajudar num momento de crise, mas agora só voltará em setembro,
para a colheita.
— Por quê? Você é jovem, bonita. E ele também é um rapaz muito atraente.
— Dorotea está de férias, viajando, e não há como entrar em contato com ela. É
constrangedor, Lúcia, especialmente porque, sabemos, você também precisa
retomar sua vida. Não pode ter sido babá antes de vir para cá.
— Bem, terei de ser paciente por mais algum tempo. E agora, é melhor ir ver as
crianças.
— Hoje terão a casa toda só para vocês. Vou fazer alguns exames médicos, e
mamãe me acompanhará. É uma pena que o tempo tenha mudado. O que vai
fazer?
— Ainda não sei, mas tenho certeza de que poderei divertir as crianças. — Lucy
afirmou com falso entusiasmo antes de sair.
— Bem-vinda a mais um dia no paraíso — disse. Tomada por uma súbita onda
de compaixão, Lucy silenciou os irmãos e serviu-se de presunto e queijo. Se ele
realmente gostasse de Angela, devia estar se sentindo o último dos homens.
— Veja, Lúcia! nonna deixou o lindo anel de zio Giulio sobre a cômoda. Um
ladrão poderia tê-lo roubado. Vou entregá-lo ao meu tio assim que ele chegar,
porque assim a jóia estará em segurança.
— Apenas olhando.
Por que não havia declarado o quarto da condessa território proibido? Agora,
sem querer, Emília acabara de fornecer mais munição para os cruéis ataques de
Cláudia.
— Então cuidarei da jóia até ele voltar. Meu tio não quer que nonna fique com o
anel.
— isso é problema deles. E seu tio não voltará... pelo menos no futuro próximo.
— O que é isso?
— É muito tempo. Não discuta comigo, Emília. Vou devolver esse anel ao local
de onde o tirou. Sua avó ficaria furiosa se soubesse que esteve mexendo nas
coisas dela, ou que entrou em seu quarto.
— E deve me odiar, também. Porque é evidente que sua avó ficaria zangada
comigo por tê-la deixado entrar no quarto, e me mandaria embora
imediatamente. É isso que deseja?
— Oh, não!
Emília obedeceu, e Lucy foi ao quarto da contessa para depositar a preciosa jóia
sobre a cômoda, entre a confusão de frascos de perfume e objetos de uso
pessoal. A bagunça que reinava no ambiente sugeria que, além de carrancuda, a
criada de Cláudia também era preguiçosa e negligente. Felizmente não tinha de
responder pela organização das roupas e sapatos da condessa, ou passaria
Mais um segredo que teria de carregar para o resto da vida, como todos os
outros que colecionara durante sua breve estada na Villa Dante.
O dia era quente. No alto de uma colina, Lucy pintava o cenário de telhados
vermelhos que via alguns metros abaixo, além do vinhedo.
E, para piorar a situação, Philip havia eleito Lucy como alvo de suas atenções,
sentando-se ao lado dela à mesa do jantar, inventando desculpas para ir à
casetta e aparecendo na piscina quando ela acompanhava as crianças. Lucy o
rejeitava sem disfarces ou rodeios, mas era inútil. Como Philip ainda não
descobrira o caminho para o vinhedo, ela passava a maior parte do tempo lá,
fugindo de todos os incômodos que a vila abrigava entre suas paredes,
Caminhar pelo vinhedo era outra atividade que a encantava. Sentir o solo sob
os pés e o sol nas costas era uma forma e sentir-se mais perto de Giulio, de
sonhar que um dia poderia unir-se nessa, terra abençoada onde ele nascera
e/crescera. Mas agora ele estava longe, em Florença, conduzindo reuniões
formais e administrando negócios sobre os quais nada sabia. E sempre seria
uma figura distante. Era tolice sonhar, porque os sonhos traziam a esperança, e
esperar em vão só podia acarretar sofrimento.
— Lúcia.
— Sozinha?
— Obrigada. Não sabia... quero dizer, ninguém disse que voltaria hoje.
— Ninguém sabia. Foi um impulso. Decidi aproveitar o tempo livre para levar
as crianças ao piquenique prometido.
— Pretendo voltar a Florença antes disso. Por que não acompanhou Fiammetta
na visita à clínica?
Sabia que devia resistir, mas não tinha forças para conter a onda de alegria e
esperança que inundava seu coração. Sorrindo como se vivesse um sonho,
encarou-o e disse:
— Está bem.
CAPÍTULO XIII
O local escolhido por Giulio era encantador, e ficava bem afastado da vila.
Apesar da preocupação por não ter deixado um bilhete para Fiammetta, caso
ela voltasse cedo com as crianças, Lucy não pôde esconder o espanto causado
pela paisagem. Estavam às margens de um rio sinuoso que, cheio de rochas e
pequenas cascatas, despencava quase verticalmente numa piscina natural.
— E é.
Não queria discutir a extensão da riqueza cios Falcone, e por isso estendeu a
toalha no chão e começou a esvaziar a cesta, onde encontrou uma imensa
variedade de salgados e doces, além de uma garrafa de vinho branco que ele
resfriou no rio.
— Acho que não entendeu, Lúcia. Está livre para partir. Pode voltar para casa e
retomar sua vida. Não está satisfeita?
— Creio que sim. Quando não está envolvida com os problemas criados por
Tommaso, ela é bastante competente. Além do mais, não será por muito tempo.
Lucy queria gritar e chorar. Mas, pior ainda, queria tocar a mão dele e sentir o
calor de sua pele, encontrar a força do corpo que tanto desejava.
Livre para partir, pensou com ironia. Que liberdade poderia ter, depois de
conhecê-lo e amá-lo?
— É claro — ele concordou. — Como disse desde o início, faço questão de pagar
todas as suas despesas de viagem. Mas... está tão ansiosa assim para partir? Não
gostaria de aproveitar o que resta das férias e conhecer melhor minha Toscana?
Viu tão pouco...
— Reconheço que nem sempre foi fácil — ela comentou em voz baixa.
— Sinto muito.
— Por que pede desculpas, quando sou o único culpado? A situação foi criada
por minha total falta de bom senso.
— Não... completamente.
— Não. Tem razão. O desejo foi recíproco, e por isso somos ambos culpados.
— Não devemos falar sobre culpa. Não num dia como o de hoje, quando tudo é
tão lindo.
Giulio abriu os braços e, sem pensar nas conseqüências, Lucy mergulhou neles.
Foi um beijo delicado, cheio de ternura e paixão. Aos poucos as carícias foram
se intensificando, tornando-se mais íntimas e atrevidas, e os dois deitaram-se
sobre a relva macia ao lado da toalha. As roupas iam sendo despidas f sem
pressa, como se quisessem saborear cada instante do encontro, prolongando-o
ao máximo.
— Ah, bella mia... — Giulio sussurrou entre um beijo e outro. — Não houve um
dia em que não tenha pensado em você assim, em meus braços... Mas isso é
loucura. — Decretou, como se subitamente houvesse recuperado o bom senso.
A menos que se amasse alguém como ela o amava, além do orgulho, da honra e
da razão. A menos que se estivesse preparado para sacrificar tudo pelo ser
amado, como teria feito por ele.
Qualquer coisa, pensou, sentindo a dor rasgá-la ao meio. Teria feito qualquer
coisa...
— Pode me levar de volta à vila, por favor? — pediu, erguendo o queixo para
encará-lo. — Eu... quero fazer minhas malas.
Lucy abriu a porta e desceu do carro apressada, ansiosa pelo alívio das lágrimas
que deixaria rolar assim que estivesse sozinha. Mas Giulio a seguiu e a fez parar
antes da porta, obrigando-a a encará-lo, as mãos como garras de ferro sobre
seus ombros.
— Não me odeie, mia cara, ou não suportarei o castigo. É melhor assim. Temos
de acreditar nisso.
— Al diavoio! — ele explodiu. — Para o diabo com tudo isso. Não posso me
separar de você sem ao menos beijá-la. — E tomou-a nos braços para um beijo
apaixonado que falava de aflição e desespero. — Addio. — Ele parou e traçou o
sinal da cruz em sua testa. — Lembre-se sempre... como eu lembrarei.
Depois virou-se e partiu. Lucy ficou onde estava, vendo-o afastar-se, ouvindo-o
CAPITULO XIV
Lucy estava fazendo as malas quando a criada Ida condessa foi procurá-la para
avisar que a signora Rinaldi havia voltado com as crianças e solicitava sua
presença na vila.
— Maddalena? Oh, sim, ela vai voltar a trabalhar para nossa família, mas não é
a isso que me refiro. Sérgio chegará amanhã. Giulio estava aqui quando
chegamos e nos informou sobre o retorno de meu marido. Oh, mal posso
esperar para vê-lo! Amanhã irei ao salão de beleza em Florença e comprarei um
lindo vestido novo.
— Também gosto de você — Marco anunciou. — Vou pedir ao papa para levá-la
conosco para a praia.
Lucy escolheu um vestido preto que ainda não havia sido posto na mala e
preparou-se para a última refeição na Villa Dante. Só mais um jantar, disse a si
mesma, tentando aliviar a dor que invadia sua alma.
Assim que chegou à vila, compreendeu que algo estava acontecendo. Teresa os
esperava na porta da cozinha, o rosto preocupado e atento às vozes que vinham
do salotto. A condessa falava muito alto, traindo uma fúria devastadora,
enquanto Fiammetta tentava interceder com seu tom mais doce e submisso.
— Tenho todos os direitos. Não sabemos nada sobre essa mulher. Ela não tem
referências, nem foi recomendada por pessoas conhecidas.
— Giulio a contratou.
— Mas nunca explicou como a conheceu. Quem sabe o que podem ter
representado um para o outro, o que essa... essa vadia pode ter tramado?
— Não banque a inocente! Acha que somos cegos? Acredita que não notamos
como olha para o meu enteado?
— Não. É você quem está louca. Louca de raiva, porque meu enteado logo se
casará e não quer mais saber de você.
— Lúcia, espero que não se oponha, mas teremos de procurar a jóia na casetta —
Fiammetta avisou.
— Posso fazer uma pergunta? — Lucy interferiu. — Como soube que o conde
Falcone conversou comigo a respeito de minha partida?
— Agnese, minha criada, os viu juntos na casetta. Desde que chegamos, ela tem
se mantido muito atenta aos seus passos, seguindo minhas ordens, é claro.
Agnese esperava para acompanhá-la de volta à casetta. Uma vez lá, a criada da
condessa começou a examinar suas roupas com cuidado. Depois de alguns
instantes ela levantou seu vestido de seda amarela e um pequeno pacote caiu no
chão. Triunfante, a condessa recolheu o objeto envolto em papel de seda. O anel
Falcone brilhava como sangue em sua mão.
— Não — Fiammetta anunciou da porta, mais firme que nunca. — Não vou
permitir que envolva a polícia nisso. Lúcia irá embora amanhã, você recuperou
a jóia, e Giulio não aprovaria um escândalo. E quanto a você, Lúcia... Tem
alguma explicação a oferecer?
— Sim, mas preferia mantê-la em segredo. — Emília era só uma criança, e ainda
não compreendia que seus atos podiam ter conseqüências. Delatá-la não seria
uma lição proveitosa, mas um castigo desastroso que só criaria traumas e
ressentimentos ainda mais profundos.
— Não sei como o anel foi parar em minha mala, signora, mas garanto que não o
coloquei lá.
— Então o assunto está encerrado. Seu jantar será servido aqui mesmo, e
amanhã Franco a levará a Montiverno, de onde poderá pegar um ônibus para
Pisa. Prefiro que não tenha mais nenhum contato com meus filhos. Esta noite
eles dormirão na vila.
Depois dos choques e insultos da última meia hora, esse era o golpe que mais
doía.
— Não devia ter me mandado esse bilhete. Eles podem pensar que estamos
juntos nisso.
— Que tal pagar adiantado? Agora, por exemplo. Podemos lembrar os velhos
tempos...
— Gomo quiser. Não é uma mulher de muita sorte, Lucy. Teve dois homens em
sua vida, e perdeu os dois para a mesma mulher. Não imagina como ela está
rindo à sua custa.
A garrafa de vinho trazida para o jantar ainda estava sobre a mesa, e ela a
agarrou determinada.
— Nesse caso, vamos dar a ela mais um motivo para divertir-se. — E despejou
o líquido dourado na cabeça de Philip.
Em Montiverno, Lucy decidiu que devia contar toda a verdade a Giulio. Não só
para impedir que ele guardasse dela uma péssima impressão, mas para explicar
a atitude de Emília e evitar que a menina fosse trancafiada num colégio interno.
A viagem de ônibus até Florença foi rápida e, lá, ela guardou as malas num
armário da rodoviária e pediu informações sobre o endereço do banco Falcone.
Depois de explicar ao corpo de segurança que precisava falar pessoalmente com
Giulio Falcone, foi levada à recepção onde a secretária informou que ele estava
ausente.
De volta à rodoviária, descobriu que o ônibus para Pisa partiria dentro de uma
hora. Para passar o tempo, decidiu caminhar um pouco pela cidade. A cidade
de Giulio. Era sua última chance de conhecê-la um pouco melhor.
Lucy havia voltado, mas não como desejava. E nunca mais voltaria. Erguendo a
mão, tocou a cabeça da estátua numa despedida triste.
Altivo, com as mãos na cintura e um brilho intenso nos olhos cor de âmbar, era
como a realização de um sonho.
Lucy não sabia como reagir. O coração batia tão depressa, que temia ser ouvida
por todas as pessoas que andavam de um lado para o outro no saguão.
— Veio para me entregar à polícia? Ou só para ter certeza de que estou mesmo
deixando o país?
— Por favor, não seja muito duro com ela. Trata-se de uma criatura infeliz e
confusa, e tenho certeza de que ela fez tudo isso por você.
— Como pode ser tão generosa. Por ela, você estaria atrás das grades!
— Não se pode responsabilizá-la por seu raciocínio confuso. Aposto que ela não
teve a intenção...
— Está enganada, Lúcia. Ela queria destruí-la. Sérgio e eu ouvimos tudo. Todos
os pensamentos venenosos e distorcidos que ela abrigava naquela cabeça
— A contessa deu o anel à criada para que ele fosse escondido entre suas coisas.
Não percebeu?
— Ela ouviu a discussão entre você e sua madrasta e decidiu ajudá-lo. Chegou a
pegar a jóia no quarto da condessa, dizendo que ia entregá-lo a você. Sabia o
que Cláudia faria, se tomasse conhecimento do fato, e por isso fui devolvê-lo.
Infelizmente, Agnese me viu no quarto.
— Então foi isso. Ela a espionava desde o primeiro dia, e ontem testemunhou o
beijo que trocamos. Quando relatou os fatos a Cláudia, elas arquitetaram esse
plano diabólico para obrigá-la a partir, certas de que já estaria na Inglaterra
antes que eu tomasse conhecimento de tudo.
— E incrível!
— Não para quem conhece a condessa. Venha comigo, Lúcia. Vamos levar sua
bagagem para o meu carro, e depois encontraremos um lugar tranqüilo para
conversarmos.
— Tenho de trocar minha passagem e... Giulio, preciso ir embora. Só queria que
soubesse que não sou uma ladra.
— Não pode me impedir. Não tem nem mesmo o direito de tentar. Afinal, vai
se casar com Angela e...
— Vamos esclarecer uma coisa. Não vou me casar com Ângela, nem agora, nem
no futuro. Não amo aquela mulher, e já deixei minha posição bem clara tanto
para ela, quanto para a condessa.
— Amo você, Lúcia. Por isso quero um pouco de privacidade. Para pedi-la em
casamento. Não posso discutir um assunto tão importante em um aeroporto
Ela obedeceu e, espantada, viu o anel de rubi ser colocado em seu dedo.
— Mas... você me mandou embora! Disse que não tinha o direito de me tocar,
porque já havia assumido outras obrigações...
— Mas como... Não pode ter tirado todas essas conclusões só porque...
— Deixe-me explicar melhor. Angela será uma mulher muito rica, e é evidente
que o pai dela costuma tomar todas as precauções possíveis com relação a todos
os homens com quem ela se envolve. Ele investiga o passado de cada um deles,
e fui informado sobre a história de vida de Philip antes de ele chegar à minha
casa. Mais uma medida de prevenção.
— Entendo.
— Mas, se não tem nenhum interesse em Angela, por que saiu com ela?
— Queria apenas sua felicidade. Sabia que, se a tirasse de perto de Philip, ele
voltaria a cercá-la de atenções, e talvez reatassem o romance.
— Como pode pensar que ainda queria aquele homem? Não viu como reagia à
sua presença? Não sentiu como tremi em seus braços?
— Ah, sim! — Ele riu. — Fiammetta me contou alguma coisa sobre um certo
banho de vinho ontem à noite. Juntei a isso o fato de ele tê-la deixado partir
sozinha, com certeza ansioso para distanciar-se da suposta ladra do anel
Falcone, e concluí que havia cometido um grande engano.
— Sérgio foi o grande responsável pela façanha. Ele chegou à vila esta manhã,
bem cedo, e encontrou o local mergulhado no caos. Como pai atento que é, logo
percebeu que Emília estava perturbada. Ela ouvira parte da conversa entre
Agnese e Cláudia e, embora não conseguisse compreendê-la, contou ao pai
fragmentos que o deixaram desconfiado. Ele me chamou com urgência à vila e,
juntos, arrancamos uma confissão de Agnese e posteriormente de Cláudia. E
claro que a expulsei de minha casa imediatamente. Sérgio ficou tentando pôr
um pouco de ordem na confusão criada por toda essa história enquanto eu
vinha procurá-la. Estou aqui desde cedo, esperando por você.
— Quando voltarmos à vila, todos já terão partido. Sérgio vai levar a família
para a praia, e assim teremos algum tempo só para nós, para planejarmos nosso
casamento. Isto é, se decidir aceitar meu pedido, é claro.
— Então ainda não sabe? Oh, Giulio, eu o amo! Não sou capaz de viver sem
você!
SARA CRAVEN nasceu em South Devon e cresceu cercada por livros numa casa
junto ao mar. Depois de deixar a escola de gramática, ela trabalhou como
jornalista local e noticiou de tudo um pouco, desde exposições de flores a
assassinatos. Sara começou a escrever para a Mills & Boon em 1975. Além da
literatura, suas paixões incluem filmes, música, culinária e comer em bons
restaurantes. Atualmente ela vive em Somerset.