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Uma História Social da Mídia: de

Gutenberg à Internet

Asa Briggs & Peter Burke. Rio de


Janeiro: Jorge Zahar Ed. 2004.
Período Moderno: de 1450 1789
• P. 28- Desde a ‘revolução da prensa gráfica’
até as revoluções Francesa e Industrial.
Em 1500 já havia mais de 250 oficinas de
impressão na Europa que produziram 27 mil
edições até o ano de 1500. Estimando em 500
cópias por edição cerca de 13 milhões de livros
estavam circulando em uma Europa com 100
milhões de habitantes.
Mas não se pode esquecer a tradição oral.
Período Moderno: de 1450 1789
• Na Rússia o czar Pedro fundou uma gráfica
apenas em 1711. No mundo muçulmano o sultão
Selim I fez um decreto punindo com a morte a
prática de impressão. No fim do século 16 o
sultão Murad III permitiu a venda de livros
impressos não religiosos. No império otomano
havia obstáculos à impressão gráfica e às
representações visuais e a primeira prensa foi
instalada no século 18, 200 anos depois da
hebraica e 150 depois da norte-americana.
No início da Idade Média o problema
havia sido a falta de livros
• No século 16 foi o oposto, os volumes eram uma
floresta em que os leitores podiam se perder.
Havia mais livros do que era possível ler durante
uma vida e foram organizadas bibliografias
selecionadas. A
invenção da impressão gráfica mudou a estrutura
ocupacional das cidades européias. Impressores
eram um novo tipo de artesãos necessariamente
letrados. A
correção das provas tipográficas era uma ocupação
recente surgida com a nova técnica, assim como
cresceu a quantidade de vendedores de livros e
bibliotecários.
Na França do século 19 e 20
• Graças ao trabalho de mascates, as brochuras
eram amplamente distribuídas tanto no interior
como nas cidades. Os assuntos mais comuns
eram a vida de santos e romances de cavalaria.
Os livros não eram comprados apenas por
pessoas comuns, nobres também os liam,
mas provavelmente a cultura oral era
mais importante. O que importa é que o material
impresso tornou-se parte importante da cultura
popular do século 17, se não antes.
McLuhan sublinhou a mudança do
foco Auditivo para o Visual
• Chegou a dizer que “os impressos abriram uma
fenda entre a cabeça e o coração”. Ong, parceiro
de McLuhan, acreditava nas consequências
psicológicas a longo prazo das publicações:
“Enquanto a invenção da prensa tipográfica tem
sido discutida convencionalmente em termos de
seu valor para veicular ideias, sua contribuição
maior foi levar mais longe a mudança a longo
prazo da relação entre espaço e discurso”
e enfatizou que os índices dos livros “tudo
significavam para os olhos e nada para os
ouvidos”, porque é impossível lê-los em voz alta.
Critica o conceito de ‘revolução da cultura
impressa’ no livro de Elizabeth Eisenstein
• Porque as alterações ocorreram num período de três
séculos, da Bíblia de Gutemberg à Enciclopédia
Francesa, portanto uma ‘longa revolução’.
• Salientar a impressão como agente de mudança é dar
muita ênfase ao meio de comunicação em detrimento
de escritores, impressores e leitores que usaram a
nova tecnologia, cada qual segundo seus próprios
interesses e objetivos.
• É mais realista ver a nova técnica como um catalisador,
mais ajudando as mudanças sociais do que as
originando. (como a televisão e a internet).
Como estimar as consequências
culturais e sociais da nova técnica?
• É necessário avaliar a mídia como um sistema
interdependente, enfatizar a divisão do trabalho em certo
lugar e determinado tempo, sem esquecer que a velha e a
nova mídia podem e realmente coexistem e se
complementam.
• As mudanças no sistema de mídia precisam ser
relacionadas a alterações no sistema de transporte,
ao movimento de mercadorias e pessoas, seja por terra ou
água.
• A comunicação de mensagens é parte de um sistema de
comunicação física. (como o sistema postal com cavalos ...
as estradas; as ondas do rádio; os provedores de internet)
39- Comunicação Oral na Idade Média
• O altar, mais do que o púlpito, ocupava o centro das igrejas cristãs.
O sermão do padre já era obrigação aceita, e o estilo de pregação
era conscientemente adaptado às platéias.
As possibilidades do meio oral eram exploradas pelos
mestres com a “retórica eclesiástica”.
• Após a Reforma Protestante o sermão de domingo se tornou parte
cada vez mais importante da instrução religiosa, tanto para
protestantes como para católicos.
• Lutero saudava a nova técnica de impressão, mas ainda
considerava a igreja “uma casa de boca, e não da pena”.
• Os governos tinham consciência do valor do púlpito para difundir
informação, especialmente nas áreas rurais, e estimular
obediência: “em tempos de paz as pessoas são mais governadas
pelo púlpito que pela espada”, concordavam a rainha Elizabeth I e
Carlos I.
O ensino nas universidades
• Era baseado em palestras, debates formais ou
disputas (testando a habilidade lógica dos
estudantes) e discursos formais ou declarações
(testando seus poderes de retórica).
• A arte da fala e do gesto era considerada pelos
retóricos tão importante quanto a da escrita.
O ensaio escrito era desconhecido.
• Nas escolas de gramática dava-se grande ênfase
à habilidade de falar latim, e os professores
compunham diálogos e peças para que os
estudantes praticassem a fala.
O ensino nas universidades
• O canto, especialmente a balada, canção que
contava uma história, era outro importante
domínio da comunicação oral.
• As fórmulas e temas recorrentes nessas baladas
eram: enviar uma carta, sentar em um pavilhão,
galopar a cavalo, crescerem plantas nos túmulos
dos amantes trágicos para, por fim, reuni-los.
• Os menestréis desenvolveram seus próprios
estilos de recitar, que provavelmente eram semi-
improvisados.
Os boatos funcionavam com
velocidade admirável
• E as mensagens transmitidas nem sempre eram
espontâneas, mas por motivos políticos e, em
tempos de conflito, um lado acusava o outro de
espalhar boatos.
• Três famosos exemplos de boatos no início da era
moderna: o movimento iconoclasta de 1566,
no norte da França e nos Países Baixos;
• a “conspiração papal” inglesa na década de 1680
• e o chamado ‘grande medo’ no interior da
França, em 1789 (o massacre de trabalhadores
rurais por ordem dos ingleses ou da aristocracia).
A comunicação oral
e a arte da conversa
• 40- A comunicação oral desenvolveu-se em novas
instituições, como academias, sociedades científicas,
salões, clubes e cafés, assim como nas livrarias, onde a
arte da conversa foi cultivada com intensidade.
• O desenvolvimento do comércio trouxe notáveis
consequências para a comunicação oral, sobretudo o
aumento da troca de valores e mercadorias.
• E também o hábito de lançar boatos, de modo a forçar
os preços para cima e para baixo, fenômeno
observado atualmente nas bolsas de valores.
Os centros de comunicação oral incluíam tabernas,
clubes, banhos públicos e cafés,
uma inovação no período
• Istambul era famosa no século XVI pelos seus 600 cafés.
Neles, contadores de histórias faziam suas performances.
Em várias cidades, as autoridades preocupadas com a
possibilidade dos cafés estimularem comentários
subversivos sobre o governo, mantinham-nos sob
vigilância.
• Clubes e cafés inspiraram a criação de comunidades
originais de comunicação, como o criativo Spectator Club,
base do jornal The Spectator e publicado em 1711-12.
Alguns jornais do século XVIII ajudaram a criar
comunidades locais e da mesma forma que o jornal do
século XIX contribuíram para a formação de uma
consciência nacional, por tratar seus leitores na condição
de comunidade, de um público nacional.
Comunicação Escrita
• 41- No início da Europa moderna ensinavam-se a
leitura e a escrita separadamente.
• Escolas especializadas ensinavam escrita e
aritmética com base em exemplos comerciais,
para meninos que iam se tornar comerciantes ou
contadores.
• Documentos escritos tinham a função de
registrar transferências de propriedades por
ocasião de matrimônio ou mortes.
• Autobiografias focalizavam mais as famílias ou a
cidade, e menos os indivíduos.
O contexto religioso do letramento
• É visível principalmente na Europa protestante, nos séculos XVII e XVIII.
Na Suécia luterana a igreja fazia exames anuais em toda casa para avaliar
a leitura de cada membro da família, seu conhecimento do catecismo etc.
• A Europa era uma sociedade pouco letrada, em que somente uma minoria
da população (homens, moradores urbanos e protestantes) sabia ler e
menos ainda escrever.
• Daí a importância do ‘letramento mediado’: uma ocupação comum no
período era a de escritor público, com um ‘escritório’ na rua, compondo
ou escrevendo cartas para gente que não sabia escrever.
• O letramento penetrou na vida diária e fez crescer o número de pessoas
em ocupações ligadas à escrita: empregados de escritório, contadores,
escrivãos, notários, escritores públicos e carteiros.
As consequências políticas do
letramento: administração burocrática
• Compreendiam a disseminação dos registros escritos e,
com eles, a grande dependência do processamento da
informação, que desembocou no modelo de administração
escritural ou burocrática (Max Weber), o uso da escrita
para formular e registrar decisões e um tipo de
administração mais impessoal.
• 43. A intensificação do uso da escrita no processo de
administração era condição necessária para o controle à
distância, para o crescimento de um estado centralizado.
As rebeliões eram acompanhadas por queixas escritas,
ou a assinatura de petições pelas pessoas comuns.
Meio de comunicação escrito não é sinônimo de
manuscrito e incluía inscrições pintadas e cinzeladas,
epitáfios nos túmulos e monumentos nas igrejas.
Linguagens de Comunicação:
a Escrita e a Visual
• 44- O crescimento de uma sociedade com tecnologia
de impressão está associada ao desenvolvimento das
línguas vernáculas na Europa, em contraste com o
período medieval pré-impressão, na qual a
comunicação escrita era predominantemente em
latim, e a oral fazia-se no dialeto local.
• 45- Comunicação Visual. A linguagem do gesto era
ensinada nas escolas como parte da disciplina de
retórica, uma ‘retórica manual’, “da linguagem natural
das mãos”. As obras de arte da Renascença deviam ser
vistas como imagens ou ‘eventos comunicativos’.
A punição de Cora, de Boticceli, na
Capela Sistina,
• Afirma categoricamente que o novo Papa é Moisés e
que a rebelião não vale a pena.
• A maior parte das imagens seculares do Renascimento
era comprada por indivíduos, que os punham em suas
casas.
• As obras literárias também eram frequentemente
criadas para clientes específicos e a eles dedicadas.
• Foi somente no início do período moderno (no século
XVI nos Países Baixos e no XVIII na França e Inglaterra)
que os artistas e escritores começaram a trabalhar para
o mercado, produzindo primeiro e vendendo depois,
e assim se profissionalizou o ofício de escritor.
“Estampa”= Imagens Impressas
• 46- O meio utilizado era um bloco de madeira ou uma placa
de cobre com a imagem cinzelada na placa (gravada).
• A primeira xilogravura conhecida data do final do século
XIV e foi provavelmente inspirada pela estamparia de
tecidos.
• A água-forte se desenvolveu nos séculos XVI e XVII;
• Era feita por corrosão com ácido de uma placa de metal,
coberta com cera, sobre a qual são desenhadas linhas que
ficarão salientes. (Rembrandt - Holanda)
• No século XVIII a invenção da meia-tinta tornou possível
fazer reproduções realísticas em preto e branco de pinturas
a óleo.
Litografia: desenho de lápis de cera
sobre uma pedra
• Em 1796 a litografia foi inventada e permitiu, pela primeira
vez, produzir imagens coloridas a baixo custo, o que tornou
possível sua difusão e criou uma série de ilustrações em
xilogravuras para a Divina Comédia de Dante.
• As pinturas de Leonardo da Vinci, Rafael e Michelângelo
foram reproduzidas sob a forma de gravuras e xilogravuras
e apresentadas para um público bem maior.
• A consciência política popular foi estimulada pela difusão
de impressos satíricos, nos séculos XVII e XVIII, na
Inglaterra e na França revolucionária.
• Algumas dessas imagens vendiam bastante bem.
Walter Benjamin e a ‘perda da aura’
do objeto artístico
• 48- Walter Benjamin (1892-1940) defende que o trabalho
artístico mudou de caráter após a Revolução Industrial.
• “O que decai na idade da produção mecânica é a aura da
obra de arte”.
• A máquina “substitui por uma pluralidade de cópias o que
era uma existência única” e, fazendo isso provoca um
deslocamento do “valor de culto” da imagem em direção
ao seu “valor de exibição”.
• Se a aura da imagem se perde ou não, esta é uma hipótese
difícil de testar; sempre é possível argumentar que a
familiaridade com a reprodução aguça, em vez de saciar, o
desejo de ver o original.
Pinturas reproduzidas são as
ferramentas modernas mais

poderosas
Benjamim estava pensando na mídia do século XIX,
como a litografia e a fotografia, mas Willian Ivins,
curador no Moma de NY, salientou a importância das
gravuras do século XVI como
• “relatos pictóricos reproduzíveis de maneira exata”
e que estavam “entre as ferramentas mais importantes
e poderosas da vida e do pensamento modernos”.

• Os mapas começaram a ser impressos em 1472 e


ofereciam aos leitores “o mundo no papel”
o que tornava mais fácil conhecer partes da Terra,
independente de seu controle ser militar, político,
econômico ou ideológico.
Comunicação Multimídia: apelo aos
olhos e ouvidos simultaneamente
• 49- Parece que as formas de comunicação mais efetivas
daquele período eram as que apelavam simultaneamente
para os olhos e os ouvidos, combinando mensagens verbais
com não-verbais, musicais e visuais, desde tambores e
trombetas de paradas militares até os violinos que
acompanhavam performances de salão.
• Os rituais eram mensagens, mas também um meio mais ou
menos eficaz de comunicar informação, pois criavam
solidariedade e acreditava-se que eram meios de promover
mudanças no mundo: a consagração da hóstia a
transformava no corpo e sangue de Cristo, enquanto a
cerimônia de coroação tornava a pessoa um rei.
Espetáculos públicos: da execução de
condenados ao ‘teatro da vida diária’
• 50- No século XVII havia espetáculos públicos, como a
execução de condenados, realizadas para impressionar os
espectadores, e comunicavam a mensagem de que não
adiantava resistir às autoridades, e que os malfeitores
teriam um final funesto.
• Outro espetáculo era o “teatro” da vida diária do
governante, suas refeições, seus atos de se levantar pela
manhã e ir dormir à noite.
• A televisão pode ser responsável pelo reflorescimento do
teatro político (A sociedade do espetáculo) e certamente
lhe deu novas formas, mas a dramatização pública e a
personalização da política – como o monólogo oficial de
auto-elogio – tem um passado muito mais antigo.
Rituais como Identidade Coletiva
• São João Batista foi o principal patrono e protetor
de Florença, e sua festa, em 24 de junho, era uma
ocasião particularmente esplêndida:
• Incluía uma exibição de produções de luxo
fornecidos pelos artesãos da cidade, em tecidos e
jóias, e também uma corrida com cavalos e
cavaleiros.
• Os rituais podem ser descritos como uma
expressão da identidade coletiva dos florentinos.
“O mundo todo é um palco”
• 51- O estilo do ritual europeu mudou nos séculos
XVI e XVII, com o reaparecimento do teatro,
no processo de reviver a Antiguidade clássica
no Renascimento.
• Frequentemente os espetáculos eram descritos em
livros impressos e ilustrados, disponíveis no
próprio dia ou nos dias seguintes, para permitir aos
espectadores saber o que esperar e compreender
o que estavam vendo, ou
descobrir o significado do que acabara de ver.
Quem estava dizendo O Que
e Para Quem nesses rituais?
• 52- A visita do príncipe aos centros urbanos demonstrava sua boa
vontade aos súditos, enquanto a cidade mostrava sua lealdade ao
príncipe.
• A época dos festivais era a melhor para os espetáculos teatrais:
as peças religiosas para a festa de Corpus Christi,
ou peças profanas para o carnaval.
• Uma importante evolução, a partir do fim do século XVI,
foi o surgimento do teatro público em Londres (Globe, de
propriedade de Shakespeare): eram abertos a todos, mediante o
pagamento de um ingresso bastante barato.
• O aparecimento ao mesmo tempo do teatro comercial em diversos
países sugere que o fator crucial de seu desenvolvimento foi o
crescimento da população das cidades (com + de 100 mil
habitantes); os atores se fixavam nelas em vez de vagar pelo país a
procura de novos espectadores.
Interação entre meios de comunicação
• 53- Na história cultural é recorrente que quando
aparece um novo gênero ou meio de comunicação, o
velho e o novo coexistem e competem entre si até que
se estabeleça alguma divisão de trabalho ou função.
• Os manuscritos continuaram como importante canal
para a circulação pública de mensagens.
• Poetas de círculo social íntimo preferiam fazer seus
trabalhos circular entre amigos e conhecidos em
cópias manuscritas, para não se identificar aos
comerciantes de livros.
• A caligrafia dos manuscritos transformava-os em obras
de arte.
Organizar para Escapar da Censura
• Mais importante razão era escapar da censura
religiosa, moral e política.
• No começo do século XVII, em Paris, o comércio de
cópias manuscritas de livros não-ortodoxos era
extremamente organizado, como os noticiosos, e
cartas enviadas em múltiplas cópias para um número
de assinantes limitado.
• Isso permitia variações nas notícias enviadas a cada
assinante, duas gerações antes do surgimento dos
jornais. (ocorrida entre 1550 e 1640).
• Nestes, algumas cartas dos leitores eram impressas.
A interação entre a imagem,
o texto e a fala
• 55- O entendimento das gravuras de Willian
Hogarth depende do material textual preso nos
lados das imagens.
• Os textos impressos reproduziam construções
gramaticais mais apropriadas à fala do que à
escrita, à audição do que à visão, o que Ong
chamou de “resíduo oral”.
• A utilização de livros impressos revela a interação
entre a fala e o texto impresso, como Exercícios
Espirituais escrito por Inácio de Loyola.
Canções impressas apóiam
performances orais e a padronização
• 56- Na Inglaterra do século XVII canções populares
impressas eram usadas como apoio à performances
orais, equivalentes ao karaokê.
• A arte da conversação foi transformada pela difusão
do assunto em livros impressos, que ofereciam
conselhos de quando falar ou ficar me silêncio, para
quem falar, sobre o quê e em que estilo.
• A linguagem é um dos domínios que melhor ilustra a
afirmação de Einsestein sobre as conexões entre o
material impresso e a padronização.
• Os livros mais populares eram os romances de
cavalaria.
As mídias oral e impressa coexistiam e
interagiam nos séculos XV e XVI
• 57- ... na Itália , assim como nas fronteiras anglo-escocesas
no século XVIII
• A performance dos contadores de histórias era uma
espécie de marketing: juntava uma audiência de leitores
potenciais e dava a oportunidade de testar a qualidade do
produto ao repetir a performance para a família.
• A fórmula do fechamento. As aberturas ou os finais
lembram os trechos normalmente em versos do começo e
fim das peças teatrais, em que o autor se dirige
diretamente à platéia.
• Graças a esse tipo de coexistência sobreviveram as baladas
tradicionais da Escócia, Inglaterra e Escandinávia, que
foram transcritas e impressas a partir do século XVI.
Censura católica:
os livros proibidos de ler
• 58- O sistema de censura mais famoso e difundido no
período foi o da Igreja Católica, com seu “Index de Livros
Proibidos” de ler: os heréticos, os imorais e os mágicos.
• Foi uma invenção que funcionou como um antídoto ao
protestantismo - a maioria dos livros listados dedicavam-se
à teologia protestante em latim - e à impressão gráfica,
uma tentativa de lutar contra as publicações usando
publicações.
• Obras literárias como Gargantua e Pantagruel, de Rabelais
(não pela obscenidade mas pelas críticas à igreja), O
Príncipe, de Maquiavel, Decameron, de Boccacio, sátiras de
Erasmo, Dante, Petrarca, os Ensaios, de Montaigne.
Censura católica e a protestante:
os livros proibidos de ler
• Atacava os romances de cavalaria como “estratagemas de
Satã”, por darem ênfase ao amor e à magia.
• A condenação de Decameron , de Bocage, foi assunto do
Concílio de Trento, em meados do século XVI, para discutir
a reforma da igreja.
• Houve interferência diplomática e a condenação do livro foi
transformada em expurgo (= livrar do que é nocivo ou
imoral; limpar, purificar, corrigir).
• 60- A censura protestante era menos eficaz que a católica,
porque eram mais divididos. As gráficas recebiam
inspeções regulares e os livros proibidos eram confiscados
e podiam ser queimados pelo executor.
• O sistema terminou em 1695, na Inglaterra.
Comunicação Clandestina e
contrabando de livros
• A censura sem querer despertou interesse por obras
proibidas e reorganizou a comunicação clandestina:
de segredos do governo a segredos comerciais ou
técnicos, de ideias religiosas não ortodoxas à
pornografia.
• O contrabando de livros tornou-se uma atividade
importante: no início da década de 1550 havia rotas
clandestinas regulares da Suíça para Veneza,
por onde viajavam livros heréticos.
• 61-62 O segredo de um grupo muitas vezes era
guardado com a ajuda de uma linguagem própria,
como no jargão de pedintes e ladrões.
• Em terceiro lugar haviam as publicações clandestinas,
instaladas em residências e que mudavam de endereço
para evitar apreensões.
• Algumas obras pornográficas francesas do fim do
século XVIII sustentavam ser publicadas na “prensa das
odaliscas”, em Istambul ou no próprio Vaticano.
• No início do período moderno publicava-se em outros
países. O método alegórico, como o ‘método Esopo’,
o antigo escritor grego de fábulas sobre animais que
podiam ser facilmente aplicadas ao gênero humano.
O crescimento do mercado:
publicidade e notícia
• 63-69- A impressão gráfica pode ser perigosa, mas
também é lucrativa.
• Envolveu os negociantes no processo de difundir
conhecimento e está nos primórdios da ‘lista dos mais
vendidos’.
• Para vender mais livros os editores publicavam
catálogos e se envolviam com outras formas de
publicidade, como as Feira de Livros e os próprios
livros.
• A publicidade impressa em jornais em Londres, em
1650, tinha em média seis anúncios; cem anos depois,
50. As notícias eram vistas como mercadoria.
O “nascimento da sociedade de
consumo”.
• As novelas do século XVIII permitiam aos leitores o
desfrute vicário de caras mercadorias de consumo e
estimulava-os a comprá-las.
• O surgimento da ideia de propriedade intelectual
ocorreu porque os humanistas se acusavam uns aos
outros de plágio ou roubo.
• As forças do mercado estimulavam a ideia de autoria
individual e publicavam o retrato do autor, numa
época em que escrever era cada vez mais um passo
rumo à fama individual.
• Em 1709 na Inglaterra foi adotada a Lei de Direitos
Autorais.
Os principais centros de comércio de
livros: Veneza, Amsterdã e Londres
• Os três principais centros de comércio de livros no
início da Europa moderna eram Veneza no séc. XVI,
Amsterdã no XVII e Londres no XVIII.
• Os impressores se debatiam em uma concorrência
ferrenha e publicavam os mesmos livros de seus rivais.
• O grande número de impressores e editores era uma
das atrações das cidades para os homens de letras,
uma vez que lhes possibilitava o sustento
independentemente dos patrocinadores.
• “Escritores de aluguel” podiam ser alugados para
escrever prosa ou verso, originais ou traduções,
adaptações ou plágios de outros escritores.
“Pirataria”: ladrões da propriedade
literária de seus rivais
• Como havia excesso de pastores para as necessidades das
igrejas protestantes exiladas na Holanda, alguns desses
homens bem educados tornaram-se escritores para
sobreviver.
• No início do sec. XVII Amsterdã era o maior centro europeu
de produção de livros e iniciou a impressão de Jornais, um
novo gênero literário que ilustra a comercialização da
informação. Livros impressos em Amsterdã apareciam em
diversas línguas.
• Mapas e relatos de viagem a lugares exóticos formavam
parte fundamental de seu repertório. Em Londres os
vendedores de livros eram conhecidos como ladrões da
propriedade literária de seus rivais, conhecida como
‘falsificação’ ou ‘pirataria’.
Alianças entre impressores para
publicar Atlas e Enciclopédias
• Contra estas práticas impressores formaram alianças para dividir
despesas e lucros em trabalhos grandes e caros, como atlas e
enciclopédias. Alguns autores começaram a receber pagamentos
substanciais de seus impressores e passaram a viver somente da
escrita no séc. XVIII.
• Mesmo para os mais bem sucedidos, a nova liberdade tinha seu
preço: compilar um dicionário ao invés de escrever um livro
(Johnson), escrever poemas e traduzir Homero (Pope),
escrever sobre história porque vendia mais que filosofia (Hume).
• É o “nascimento da sociedade de consumo”.
• A comercialização do lazer incluía corridas de cavalo, óperas,
mostras de pinturas, palestras sobre ciência nos cafés, festas e
bailes de máscaras em espaços públicos recém inaugurados.
História da Leitura: os estilos de leitura
se alteraram entre 1500 e 1800
• 69-74 –A comercialização do lazer incluía a leitura e
propiciou o surgimento de cinco tipos de leitura: crítica,
perigosa, criativa, extensiva e privada.
• 1. Leitura Crítica possibilitou comparar opiniões diversas
em livros diferentes sobre o mesmo assunto. Os que faziam
sátira debochavam daqueles que acreditavam em tudo o
que viam impresso, pelo respeito e reverência que os
leitores nutriam pelos livros.
• 2. Privada: discutia-se os perigos da leitura privada, quando
praticada por grupos subordinados, como a ‘gente comum’,
que sentia-se encorajada para criticar o governo ao ler os
jornais. Os perigos da leitura de livros de ficção para as
mulheres, assim como peças teatrais, eram temidos por
seu poder de despertar emoções perigosas, como o amor.
Leitura Criativa: leitor intenso
ruminando sobre poucos livros
• Na França de Luís XIV os romancistas mais importantes
eram mulheres, que escreviam principalmente para outras
mulheres (Lafayette 1634-93). As oportunidades para o
público feminino cresceram no séc. XVIII, quando os
romances e alguns textos históricos visavam
deliberadamente esse mercado.
• 3. Criativa: o significado dos textos foi o principal tópico
nos estudos literários na década de 1990, lidos de modo
oposto à intenção do autor. Menocchio, em O queijo e os
vermes, de Carlo Guinsburg, interpretava no sec. XVI os
textos à sua maneira e oferece um bom exemplo de leitor
Intenso, relendo uns poucos textos e ruminando sobre eles,
estilo de leitura aparentemente típico na época.
“Revolução na Leitura”: no formato e
no modo privado de ler
• 4. No fim do sec. XVIII teria havido uma ‘revolução na leitura’, uma
mudança no formato dos livros e nas práticas de folhear, dar uma
olhada e ver os capítulos durante a consulta para procurar
informações específicas.
• 5. De leitura tratada como sagrada, após 1750 veio um período de
leitura Extensiva, marcado pela proliferação e dessacralização do
livro e uma tendência à privacidade da leitura. A leitura privada é
vista como parte do crescimento do individualismo e também da
empatia.Os quartos passaram a ser lugares privados. A classe
média tendia a ler em privacidade, enquanto os trabalhadores em
público, em voz alta.
• A prática medieval de ler alto durante as refeições, nos monastérios
ou nas cortes reais persistiu nos séculos XVI e XVII. O surgimento
dos jornais estimulou a leitura em voz alta no café da manhã ou no
trabalho e ajudou a criar uma comunidade de leitores.
Instrução e Divertimento.
• 74-75. Os principais usos da leitura eram para
informação (enciclopédias) e instrução moral
(tratado sobre virtudes), e mais tardiamente,
orientado para a diversão, no sec. XVIII,
quando dispensou seu lado moral para se
tornar parte da comercialização do lazer,
junto com concertos, corrida de cavalos e
circos.
A Revolução da Prensa Gráfica
revisitada:
• 75-81. A impressão gráfica seria apenas um agente, mais
uma tecnologia empregada por indivíduos ou grupos para
diferentes propósitos em locais diversos? Innis estabelece
um viés para cada meio de comunicação.
• Do ponto de vista geográfico, ocorreram efeitos similares
em lugares diferentes; do ponto de vista cronológico, é útil
distinguir entre consequências imediatas e as de longo
prazo.
• Muitas vezes a mudança cultural foi mais aditiva que
substitutiva, a velha mídia de comunicação oral e por
manuscritos coexistiram e interagiram com a nova mídia
impressa.
A escrita, a impressão gráfica e as
interpretações conflitantes
• A cultura oral é fluida e a criação oral um empreendimento
coletivo.
• A escrita estimulou a fixação de textos muito antes que fosse
conhecida a técnica de impressão.
• Com a impressão, poetas oficiais louvavam os feitos dos
monarcas e historiadores oficiais publicavam relatos de suas
maravilhosas realizações para os contemporâneos e a
posteridade.
• A impressão gráfica facilitou a acumulação de conhecimento,
por difundir as descobertas mais amplamente e tornar mais
difícil perder a informação.
• Por outro lado, desestabilizou o que era conhecido como
conhecimento, ao tornar os leitores conscientes da existência
de histórias e interpretações conflitantes.
A criação de “Pseudo Eventos”
• Os principais festivais da corte, caros e efêmeros, eram
fixados na memória em descrições impressas e ilustradas,
em gravuras ou xilogravuras. Confiáveis ou não, materiais
impressos se tornaram muito importantes na vida diária.
Dentre esses eventos , alguns nunca aconteceram.
• Deve-se agradecer ao jornal diário do século XVIII uma
amostra do efêmero que se tornaria extremamente valioso
para os historiadores sociais: o fato de os impressos se
tornarem parte da vida cotidiana, ao menos em algumas
regiões da Europa.
• A criação de “pseudo eventos” foi o resultado da
“Revolução Gráfica” dos séculos XIX e XX, a era da
fotografia e da televisão.
Como a imprensa molda atitudes
• Dois exemplos concretos de como a imprensa ajuda a amoldar
atitudes de seus leitores referem-se ao suicídio e ao ceticismo.
• “O estilo e o tom das histórias dos jornais sobre o suicídio
promoveram uma atitude secular crescente e simpática sobre esse
ato”, no século XVIII na Inglaterra.
• Os relatos mostravam o suicídio como coisa comum, as cartas dos
que se matavam eram publicadas nos jornais, permitindo aos
leitores ver o evento do ponto de vista dos atores. Essas cartas, por
sua vez, influenciavam o estilo de outras deixadas por suicidas
posteriores.
• Genericamente, os jornais contribuíram para o aparecimento da
opinião pública, termo que tem seu primeiro registro em francês
por volta de 1750; em inglês em 1781; em alemão, em 1793.
Habermas e a
“esfera pública” x opinião pública
• no sentido de “tornar público”: uma arena na qual
aconteceram os debates e se oferece um argumento sobre
um argumento.
• Habermas afirma que o século XVIII foi um período crucial
para o aparecimento da argumentação racional e crítica,
presente dentro de uma “esfera pública” burguesa liberal,
a qual, a princípio, estava aberta para a participação de
todos.
• Vê a mídia como um sistema no qual os elementos
distintivos trabalham em conjunto e enfatiza a
transformação estrutural dessa esfera no final do século
XVIII, sua “não instrumentalidade” ou a liberalidade quanto
à manipulação, e sua contribuição para o surgimento de
atitudes racionais e críticas.
Crítica a Habermas e ao conceito de
“esfera pública”
• Habermas foi criticado por oferecer um relatório “utópico”
daquele século, ao não perceber a manipulação do público
pela mídia, ter dado pouca atenção aos grupos que
estavam excluídos dos debates e ter salientado demais o
que chama de “caso modelo” da Grã-Bretanha, em
detrimento de outros lugares e períodos.
• A contra-argumentação é que há mais de uma esfera
pública no início da moderna Europa, como a das cortes
reais, nas quais a informação política estava disponível em
abundância e era avidamente discutida.
• As novas técnicas do século XX, começando como rádio, a
televisão e o crescimento da propaganda, mudaram
totalmente o contexto da tese de Habermas, como ele
próprio reconheceu.

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