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COMO O BARRO NAS MÃOS DO OLEIRO

Bourdieu e a Sociologia

Resumo Abstract

O artigo discute, esquematicamente, The article discusses, the new


como a nova sociologia vem sociology comes trying to
procurando compreender a origem understand the social origin and of
social e do sistema escolar, para the school system, to discuss the
discutir as condições das práticas conditions of the cultural practice;
culturais; mais especificamente more specifically as the actors
como os atores vêm produzindo e come producing and being
sendo produzidos como atores produced as social actors. The
sociais. Os conceitos operatórios operative concepts of this
deste esquema explicativo partem explanatory outline leave of the
da teoria da prática em Bourdieu theory of the practice in Bourdieu
para as sua noções de habitus e for its habitus notions and field.
campo.
Palavras-chave: cultura escolar,
habitus, campo ,capitais, praxiologia.

Introdução

A sociologia e a cultura da escola são aqui apresentadas na visão de


Bourdieu sob um novo prisma. Pontuam este texto passos da trajetória teórica
perseguida por este sociólogo, enquanto reelabora a sociologia clássica que
dele recebe uma representação pluralista: novos caracteres da ‘massa’
sociológica são por Bourdieu, então, evidenciados.

Uma sociologia da escola e do aluno


Enquanto para Durkheim o essencial na escola era os objetivos e os ideais
do sistema educacional, os valores e sua transmissão, a moral e a pedagogia.
Interessava-se muito pela instituição, um pouco pelos professores, quase nada
pelos estudantes, a não ser como uma pedra bruta que necessitava ser
lapidada. Numa concepção contrária a de Durkheim o também educador e
sociólogo francês Bourdieu, acredita que são os estudantes que ocupam o
centro da nova Sociologia da Educação, sendo ele contrario à pouca
importância dada aos estudantes: tal como são, e não como deveriam ser. Os
estudantes, na diversidade de suas origens de classe, na heterogeneidade de
seus resultados escolares, nas divergências de seus destinos sociais e em
suas próprias expectativas.
A Escola está repleta de diferenças de capitais incorporados, nas origens
dos alunos, nos novos valores passados a estes em relação ao capital cultural,
cuja origem encontra-se no exterior da escola, na família e na sociedade
estratificada em frações de classes, grupos e camadas sociais distintas. A
transmissão do capital cultural passou a ser a chave para a explicação das
chances, nos estudos e analises de Bourdieu, que indicaram que pessoas
provindas de meios sociais diferentes ocuparão postos diferentes na divisão
social do trabalho, os diferentes grupos de estudantes não manterão as
mesmas relações com a instituição escolar, em função, ainda, dos variados
estilos de vida, ou seja, do uso de bens de consumo.
Assim, o público escolar estará sempre dividido por estar subordinado a
situações que extrapolam limites da escola.
Bourdieu com sua contribuição fundamental na nova Sociologia da
Educação, demonstrou em seus estudos juntamente com Passerom que, longe
de constituir um meio homogêneo, os estudantes mantêm com a cultura e o
mundo escolar relações diferentes e que o princípio destas diferenças deve ser
buscado na diversidade das origens de classe. Compreender e explicar o que
ocorre na escola, desde a escola maternal até a universidade, a partir do que
ocorre fora dela na divisão da sociedade em classes e nos antagonismos que
resultam disso, tal é, afinal de contas, o espírito comum da imensa maioria dos
trabalhos recentes de Sociologia da Educação.
Bourdieu e suas raízes

A constituição do projeto de conhecimento em Bourdieu guarda de modo


geral, uma determinada continuidade em relação a alguns traços constitutivos
do desenvolvimento do pensamento francês.
O projeto de conhecimento sociológico elaborado pelos durkeimianos
ilustra de maneira exemplar os esforços de legitimação científica e a habilidade
por parte de seus integrantes em ocupar espaços que se abririam nas
instituições universitárias em busca da difusão de concepções científicas, a fim
de orientar a condução da vida social (a inspiração dos dirigentes da Terceira
República). Através disso, passavam a usufruir o respaldo institucional que o
campo do poder político procurava oferecer ao desenvolvimento das ciências
sociais.
No século XX a organização das atividades de ensino e pesquisa,
subvencionadas pelo aparelho estatal, passou por certas descontinuidades, em
se tratando de financiamento, mas, não se pode deixar de levar em conta que o
essencial da pesquisa sociológica, na sociedade francesa, ocorreu no interior
do campo universitário e de organismos mantidos por fundos públicos. Nesse
sentido a produção sociológica de Bourdieu desenvolveu-se no interior do
campo acadêmico e da proteção institucional oferecida a esse espaço social.

O projeto sociológico de Bourdieu

O projeto sociológico desenvolvido por Bourdieu representa uma


dimensão de reatualização numa disposição para produzir determinadas
técnicas de ruptura contra o saber imediato. Na obra, A Profissão do Sociólogo
(Lê metier du sociologue), assinala que

A familiaridade com o universo social constitui para o sociólogo o


obstáculo epistemológico por excelência, uma vez que produz
continuamente concepções provenientes da imaginação. O sociólogo
jamais cessa de se opor à sociologia espontânea. Ele deve impor-se
uma polêmica incessante contra as evidências enganadoras
provenientes do saber imediato. Ele encontra mais dificuldades para
estabelecer a diferença entre a percepção e a ciência, separação esta
que para o físico se exprime na oposição marcada entre o laboratório e
a vida cotidiana, enquanto o sociólogo não pode encontrar em sua
tradição teórica os instrumentos que lhe permitiriam recusar
radicalmente a linguagem e as noções do senso-comum. (1968: 8-9).

Além da busca pela legitimidade científica, o trabalho de Bourdieu


apresenta uma outra continuidade com a forma pela qual se desenvolveu o
pensamento sociológico francês. Apesar de procurar manter diferenças em
relação a uma crítica dirigida a um certo atomismo individualista e subjetivismo
exacerbado na teoria fenomenológica, ele, ao longo dos seus trabalhos,
reafirma o postulado metodológico recorrente na sociologia francesa, que ao
valorizar o coletivo, estabelece preceitos morais que submetem os indivíduos à
sociedade, sendo os valores desta superiores, ou seja, concebe-se o primado
da sociedade sobre o indivíduo e da escola como formadora deste indivíduo
para integrá-lo ela. Como se sabe, uma das características fundamentais do
pensamento do séc. XIX constituiu-se numa rebelião intelectual contra o
individualismo desenvolvido pelos filósofos do século precedente. Em oposição
às formulações iluministas que ressaltavam o poder da razão individual,
alicerçada em formas científicas de conhecimento, como instrumento para
remodelar os sistemas sociais, os pensadores do séc. XIX argumentaram que
o homem não adquire o conhecimento mediante a razão individual, mas sim
como ser social, devido ao fato de viver em contextos sociais.
Pautado no poder conferido à razão individual, o otimismo do séc. XVII foi
veementemente combatido pelos iluministas, que procuravam substituir o
indivíduo auto-suficiente e racional por um indivíduo que, em larga escala, seria
o produto de relações sociais e de instituições sociais. Este estilo de
pensamento social se oporia a um realismo social, assumindo a postura
metodológica do princípio de que a sociedade não apenas precede o indivíduo
como também é eticamente superior a ele. Em termos genealógicos, esta
concepção de análise da sociedade remonta ao pensamento conservador que
se formou na primeira metade do séc. XIX. Tal estilo de pensamento exerceria
uma grande influência sobre os fundadores da sociologia francesa.
Bourdieu elabora uma sociologia que pressupõe ser a sociedade, e
somente ela que elabora, de diferentes formas, justificativas e razões para os
indivíduos existirem. Em sua visão, a sociedade produz as posições que
achamos importantes e também agentes sociais que julgam importante a
conquista destas mesmas posições.

A teoria do conhecimento do mundo social: O conhecimento praxiológico

A mediação entre o agente social e a sociedade é a problemática


alavancada por Bourdieu e tornou-se o ponto modal da sua sociologia. Para
ele, o mundo social pode ser objeto de três modos de conhecimento teórico: o
fenomenológico, o objetivista e o praxiológico. Quanto aos dois primeiros ele
tece uma crítica que lhe permite configurar o terceiro modo de conhecimento
do mundo social, o praxiológico, em que encontramos a sua própria teoria da
prática.
Para Bourdieu o modo de conhecimento fenomenológico não consegue ir
além de uma simples descrição do que caracteriza a experiência vivida do
mundo social; a apreensão do mundo social naturalizado é evidente. A
coincidência entre as estruturas objetivas e as estruturas incorporadas nos
agentes contribui para criar a ilusão da compreensão imediata, assim excluindo
toda interrogação sobre as condições desta percepção natural do mundo social
(1980b). Nesta forma de abordagem do mundo social, Bourdieu incorpora
várias tradições da análise sociológica. Na sociologia clássica tal abordagem é
identificada por ele, através do pensamento weberiano que toma, como ponto
de partida, os conteúdos significativos das relações sociais sendo o sujeito seu
substrato, para a elaboração da sociologia da compreensão. Como orientação
metodológica, ele aproxima desta abordagem o existencialismo sartreano, os
interacionistas simbólicos, e a etnometodologia, ou seja, os procedimentos que
os indivíduos utilizam para levar a termo as diferentes operações que realizam
em sua vida cotidiana.
Em 1980, em seu trabalho sobre o senso prático, Bourdieu passa a
caracterizar o conhecimento fenomenológico como subjetivista, principalmente
nas críticas proferidas ao existencialismo sartreano que ele denomina
“antropologia imaginária do subjetivismo”. Bourdieu observa que o
“voluntarismo ativista” da fenomenologia existencialista leva a representar cada
ação do indivíduo como uma espécie de confrontação, sem antecedente, do
sujeito e do mundo. A visão sartreana conduz à concepção da ação como um
“universo imaginário de possíveis” dependente inteiramente de uma resolução
ditada pela consciência dos sujeitos.
O conhecimento denominado objetivismo por Bourdieu, ao contrário do
subjetivismo, formula, enquanto projeto, o estabelecimento de regularidades
que se expressam em termos de “estruturas”, “leis”, “sistemas de relações”,
etc. Para ele, uma das questões básicas que o objetivismo introduz na
explicação sociológica é a das condições particulares, que tornam possível o
mundo social, aspecto este relegado o segundo plano pelo subjetivismo. O
objetivismo tem sua expressão teórica na sociologia clássica, pela figura de
Durkheim, na medida em que ele postula, enquanto princípio metodológico, a
sociedade como uma entidade exterior e transcendente aos indivíduos,
enquadrando-os coercitivamente através dos costumes ou das normas sociais.

Quando desempenho meus deveres de irmão, de esposo ou de


cidadão, quando me desincumbo de encargos que contraí, pratico
deveres que estão definidos fora de mim e de meus atos, no direito e
nos costumes. Mesmo estando de acordo com sentimentos que não
me são próprios, sentindo-lhes interiormente a realidade, esta não
deixa de ser objetiva, pois não fui eu quem os criou, mas recebi-os
através da educação (...). Esses tipos de conduta não são apenas
exteriores ao indivíduo, são também dotados de um poder coercitivo
em virtude do qual se lhe impõem quer queira ou não. DURKHEIM
(1983: 3-4).

Bourdieu identifica, na orientação que reduz o indivíduo a um epifenômeno


das manifestações da vida coletiva, a postura estruturalista da ciência social
contemporânea. Na concepção de Bourdieu, o objetivismo, ao privilegiar a
lógica da estrutura, apreendida de maneira sincrônica, sobre a história
individual ou coletiva, condena-se apenas a registrar a produção de
regularidades da vida social ou a reificar abstrações, que consistem em tratar
os objetos construídos pela ciência como realidades autônomas, com eficácia
social e capazes de agir por si próprias, substituindo os agentes sociais. Ao
deixar de levar em consideração a relação entre o sentido que o sujeito atribui
à sua ação e o sentido objetivo construído pela postura positivista, o modo de
conhecimento objetivista, ao omitir essa relação, deixa de enfocar as condições
da produção e do funcionamento do sentido da vida social que consiste em ver
como “natural” o caráter objetivado das instituições.
Conforme Bourdieu, é necessário superar a oposição criada em torno da
polêmica do objetivismo e do subjetivismo. Com o propósito de garantir a
superação, ele procurou formular e desenvolver um outro modo de
conhecimento que é por ele denominado de praxiológico, cujo objetivo é o de
articular dialeticamente estrutura social e ator social.

Bourdieu; erudito militante

Bourdieu, como ferrenho defensor da leitura dos clássicos, foi um crítico


severo da busca da originalidade a todo custo e da fidelidade a determinado
autor ou postura religiosa. Ele buscou estabelecer um diálogo mais amplo com
a sociologia clássica, de forma que permitisse ao mesmo tempo um processo
de continuidade e ruptura, na conservação e superação, sem a preocupação
em ser acusado de seguidismo ou ecletismo.
A esta postura segura e constante, permito-me a analogia com a ação do
oleiro que, ao perceber uma inadequação no objeto, logo toma a atitude de
refazê-lo, sem descartar a sua substância, mesmo que seja necessário torná-lo
barro novamente, amassá-lo e fazer de novo.
A relação que Bourdieu estabeleceu com a teoria clássica obedeceu esta
lógica. Foi neste movimento que elaborou o já mencionado conhecimento
praxiológico, como uma das maiores contribuições ao estudo da sociedade e
da cultura, como uma saída para os dilemas da sociologia clássica da oposição
entre: objetivismo/subjetivismo, representações coletivas/individuais,
coletivismo teórico-metodológico/individualismo teórico-metodológico,
micro/macro, etc.
O conhecimento praxiológico não anula as aquisições do conhecimento
objetivista, mas as conserva e ultrapassa, procurando, ainda, segundo ele,
integrar o que a postura objetivista precisou excluir para produzir suas
formulações teóricas, não se restringindo às relações objetivas, mas também
as relações dialéticas entre estas estruturas e as disposições duráveis dos
agentes nas quais elas se atualizam. Para isso, Bourdieu procurou destacar
enquanto foco de suas preocupações, o duplo processo de “interiorização da
exterioridade” e da “exteriorização da interioridade” (Bordieu, 1972).
Bourdieu reintroduz a problemática sartreana da mediação entre sujeito e
objeto, num momento que ao produzir Sartre procurou, através de um
marxismo existencialista criticar uma concepção ortodoxa do materialismo
histórico. Sartre assinalava que a conduta humana se determina com relação
aos fatores reais e presentes que condicionam e ao mesmo tempo em função
de um certo objeto futuro que o sujeito tende a conceber, que não é outra coisa
senão “projeto”.

O conceito de habitus

Na concepção de Bourdieu a mediação entre sujeito e objeto e as relações


objetivas de mundo social se afasta da sartreana, na medida que quando
Bourdieu introduz um conceito estratégico em seu esquema explicativo para
articular a mediação entre estrutura e ator social, o que é a noção de habitus.
Este conceito é uma apropriação, ele foi formulado em sua origem pela filosofia
escolástica, significando qualidade estável e difícil de ser removida, tendo
caracterizado por sua finalidade de facilitar as ações dos indivíduos. Para os
escolásticos o habitus é adquirido através de repetição de atos, o que
pressupõe a existência de um aprendizado passado. Bourdieu retém esta idéia
e ressalta que sua existência resulta de um longo processo de aprendizado,
produto de um contato dos agentes sociais com diversas modalidades de
estruturas sociais. Para ele, as condições materiais características de uma
determinada classe social e a incidência destas condições de existência no
contexto familiar constituem uma mediação fundamental na produção do
habitus. O ambiente familiar, como experiência primeira de vivência dos atores
sociais, e o habitus nele adquirido estão para Buordieu no princípio da
recepção e da apreciação de toda experiência ulterior dos atores sociais, ao
mesmo tempo que o habitus adquirido no sistema escolar constitui um vetor na
assimilação das mensagens produzidas pela indústria da cultura. O conceito de
habitus elaborado por Bourdieu é o seguinte:

São sistemas de disposições duráveis e transferíveis, estruturas


predispostas a funcionar como estruturas estruturantes, isto é, como
princípios geradores e organizadores de práticas e de representações
que podem ser objetivamente adaptados a seu fim sem supor a
intenção consciente dos fins e o domínio expresso das operações
necessárias para atingí-los, objetivamente “reguladas” e “regulares”,
sem ser o produto da obediência a regras, sendo coletivamente
orquestradas, sem ser o produto da ação organizadora de um regente.
(1980b: 88-89).

Bourdieu procura abordar a prática como algo distinto da obediência a


normas sociais, tal como ela aparece em Durkheim, ou como a realização
plena de um modelo construído e/ou de estruturas que prescindem dos
agentes sociais, como é entendida pela hermenêutica estruturalista, ou ainda,
como uma utilização racional de meios para obter determinados fins, tal como
surge numa das modalidades possíveis de ação social em Weber.
Nas palavras de Bourdieu,

...é através do habitus que a instituição encontra a sua plena


realização. A sua incorporação permite ao indivíduo levar a sério a
magia da vida social, o que faz com que o rei, o banqueiro, o padre
sejam respectivamente a monarquia hereditária, o capitalismo
financeiro ou a Igreja feitos homem. (1980b: 96).

Enquanto produto de um trabalho de inculcação, constituído no curso de


uma história particular de um indivíduo que se reporta a uma história particular
de seu grupo e/ou classe social, o habitus contribui para que os agentes
participem das realidades objetivas das instituições, permitindo mantê-las em
atividade, mas também impondo a essas instituições revisões e
transformações, ou seja, sua reativação. No confronto com situações
conjunturais nos diversos espaços sociais, é o habitus que torna possível a
criação de novas modalidades de condutas dos atores sociais, possibilitando-
os de certa forma a produzir determinadas “improvisações regradas”. Se o ator
social desfruta, no confronto com estas situações conjunturais, de um certo
grau de liberdade para ajustar suas práticas às contingências surgidas, esta
não se confunde com uma “criação imprevisível de uma novidade”, uma vez
que a prática social possui sempre como limite condições históricas
especificas.

O conceito de campo e as formas dominantes de capital

A prática é entendida por Bourdieu como produto da relação dialética entre


uma situação e um habitus; o conceito de situação é o mesmo que ele passou
a denominar de campo, ou seja, é um espaço social que possui uma estrutura
própria, relativamente autônoma com relação a outros espaços sociais, ou
mesmo a outros campos sociais. Cada campo possui objetivo específico, uma
lógica própria de funcionamento e estrutura, em cujo interior da relação dos
atores é caracterizada por hierarquias e disputas internas. Conforme Bourdieu,
a definição de um campo se dá quando se estabelecem as disputas e os
interesses que estão em jogo, estas são irredutíveis às disputas e interesses
de outros campos.
Para que um campo funcione é necessário a existência de lutas entre
indivíduos motivados a jogar o jogo proposto estes indivíduos devem ser
dotados de habitus que impliquem o conhecimento e fundamental
reconhecimento das regras do jogo (1980 a).
É mister ressaltar a importância para a sociologia da incorporação da
perspectiva analítica da noção de campo, que, além de permitir detalhar a
singularidade histórica, permite a abordagem de diferentes fenômenos.
Bourdieu identifica a existência de diferentes tipos de capitais.
Para ele cada campo social tem uma forma dominante de capital, o
“capital econômico”, fundado na apropriação de bens materiais, o “capital
social” que constitui as relações estratégicas de apoio para a atuação dos
agentes sociais e o “capital cultural” que tem nas posses dos títulos escolares
umas de suas manifestações institucionais. Estes tipos de capitais mantêm
uma relação estreita sob certas condições, a posse de um conduz à condição
para a obtenção de um outro.
Cada campo exige a posse de um determinado tipo de capital. As
posições dominantes dos agentes sociais são determinadas e hierarquizadas
de acordo com a quantidade da posse deste capital que cada campo demanda,
portanto, quem tem mais capital ocupa mais autoridade dentro do campo e
aqueles que têm menor quantidade de capital exigido dentro de seu campo,
tendem a tomar posições de contestação em relação à estrutura de relação de
poder, desenvolvendo estratégias de transformações. É importante ressaltar
que, conforme Bourdieu, todo ator social tende a ajustar o seu esquema de
pensamento, percepção e ações às exigências objetivas do seu espaço social.
O que preserva o campo é a relação com o habitus, sendo este o responsável
pela preservação dos seus princípios de organização e funcionamento, assim
como o de reatualização dos antagonismos existentes no campo.
Bourdieu analisa essa relação no bojo da escola. Para ele a escola tende
a legitimar o capital cultural que é mais valorizado socialmente. Dentro desta
lógica, para se dar bem na sociedade, o individuo deve incorporar um certo tipo
de cultura que envolve uma relação de poder e para garantir o acesso ao
capital econômico, é necessário à incorporação do capital cultural legítimo.
Este processo de identificação com a cultura legítima é um processo doloroso
que envolve corpo, mente, etc. É o que Bourdieu chama de “violência
simbólica”, em que ele reconhece a pluralidade de culturas, mas, reconhece
também a existência daquela que o indivíduo deve incorporar para obter
sucesso na sociedade que elege certos habitus como legítimos.

Considerações finais

A guisa de conclusão é valido ressaltar que a teoria sociológica de


Bourdieu nos coloca ‘cara a cara’ com a realidade social que tem como base
uma consistente relação de troca, mas que esta relação está estabelecida
entre desiguais. Somente alguns conseguem manter o controle dos bens
simbólicos atuando coercitivamente sobre os demais, reforçando uma relação
de domínio e poder. Cabe à sociologia da educação contemporânea o papel de
dar continuidade aos trabalhos deste grande mestre, buscando a superação,
nesta sociedade do impossível, criando, no mínimo respostas prováveis que
reconheçam e busquem dirimir tantas desigualdades, é necessário manter uma
lucidez, pois, como pensava Bourdieu, não existe uma teoria universal,
verdadeira e totalizante. O papel da nova sociologia deve superar o
espontaneismo e tomar como base a pesquisa empírica/analítica.
Referências Bibliográficas

BOURDIEU, Pierre. Esquisse d’une théorie de la pratique.Geneve: Droz,

________. Escritos de Educação.(org.) Maria Alice Nogueira e Afrânio Catani.


Petrópolis: Editora Vozes, 1998.

________. Le métier de sociologue. Paris: Mouton, 1968.

________. Questions de sociologie. Paris: Éditions de Minuit, 1980 a.

________. & PASSERON, Jean-Claude. La reproduction: elements pour une


théorie du système d’enseignement. Paris: Éditions de Minuit, 1970.

________. Le sens pratique. Paris: Éditions de Minuit, 1980 b.

DURKHEIM, Émile. Le régles de la méthode sociologique. Paris: PUF, 1983.

_________, Weber, Marx e Parsons. Introdução ao pensamento


sociológico.(coletânea de textos organizada por: Ana Maria de Castro e
Edmundo Fernandes Dias). São Paulo: Ed. Moraes. 1992.

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