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A Donzelinha (Mártir da Injustiça Social)

No ano de 1888, os nordestinos passaram por uma seca de grande


intensidade, onde o quadro mostrava uma total calamidade, miséria e
escassez.

Uma família, oriunda do sertão central rumo ao Aracati, composta de um


casal, uma donzela (irmã do pai da família) com mais ou menos catorze anos
e seis crianças (mais mulheres do que homens), fazia essa caminhada em
busca de um lugar melhor do que o oferecido pela sua terra natal (Banabuiú).

A viagem era longe, cansativa e demorada. A fome e a sede eram


companheiras inseparáveis, muitas vezes era necessário parar. A água não se
via, era escassa, a não ser no fundo de perdidas cacimbas de areia.
És um exemplo de injustiça social, um exemplo de riqueza nacional mal
dividida.

Chegaram a tal ponto de cansaço, fadiga, dores musculares, fome, sede,


miséria, que resolveram sacrificar a Boca preta (cachorra), companheira de
sofrimento, podia se sentir orgulhosa por ser útil, até a morte, servindo de
alimento para matar por pouco tempo a fome daquela sofrida família, a
prática foi penosa mas necessária.

Depois de algum tempo a Esperança (burra que servia para transportar as


tralhas), teve o mesmo fim da Boca preta, dois sentimentos tomavam conta
da família, a alegria pela a carne em abundancia, tanta fartura nunca
constatada, e a tristeza pela a morte da Esperança, fiel companheira naquela
odisséia.

Depois de alguns dias da morte da Esperança, superado o impacto, a fome


voltou a perturbar, nessa altura eles já estavam saindo da Caatinga de Góes
(Jaguaruana) e chegando a Feira de Gado/Passagem das Pedras (Itaiçaba),
só restava sal, acampados ao abrigo de um tamarindo, as crianças choravam
pedido comida, os adultos torturados pela situação começaram a chorar
também.

A mocinha (donzela) não suportava mais tempo tanto sofrimento, tanta dor, e
principalmente, ver as crianças famintas, no ato iluminado de espiritualismo e
doação, disse-lhes entre lágrimas que o fizesse com ela o que fora feita com
Boca Preta e Esperança. As crianças precisariam viver, aí os noves cairam no
choro, choros que estremeceram a redondeza e chamaram a atenção de
alguns tropeiros que passavam por ali, fazendo o caminho inverso o daquela
família.

Com a chegada dos tropeiros ao tamarinheiro, o pranto de choro diminuiu, um


dos tropeiro perguntou o motivo de tanto choro ouvindo á boa distãncia. Com
a voz cheia de soluços, o pai de família lhe contou a situação.

Os tropeiros se afastaram um pouco, dialogaram um pouco entre si e


tentaram resolver aquela situação de uma forma mais humana possível,
fizeram uma proposta, trocaria uma burra pela mocinha (donzela), assim
quem sabe poderia ser muito feliz trabalhando na casa de seu patrão, em Icó.
A proposta foi aceita de imediato por parte da mocinha, o seu irmão ainda
quis intervir, mas não tinha outra alternativa e a troca foi feita.

Os tropeiros seguiram viagem acompanhados agora pela mocinha e seu leve e


baixo choro, até compreendiam a situação. Por isso, não importunavam com
perguntas e conselhos. Essa situação ajudou a mocinha a pensar num plano
de fuga pois seu coração debutante amargavam de saudade. Os tropeiros
resolveram arranchar, tiraram as cargas dos animais e teram-lhe um pouco de
comida (milho). Os homens fizeram a jantar, sempre acompanhados pelos
olhares da mocinha, todos jantaram, inclusive ela. Após algumas horas de
conversas, os homens adormeceram no sono profundo, devido o cansaço,
menos a mocinha, que não pensou duas vezes, pegou um dos animais e fugiu
ora em galopes, ora em choutos.
A vontade de ver seus familiares impedia que o medo povoasse a mente da
moça, porém, por volta das duas horas da madrugada o cansaço e sono se fez
presente, não suportando mais, resolveu parar e descansar um pouco. Pulou
no chão, amarrou a burra no tronco de uma carnaubeira e deitou-se um
pouco, dormiu profundamente. A burra coçando a cabeça fez com que o
cabresto, mal colocado visto a situação, caísse, se sentido livre fugiu.
A luminosidade do dia, batendo nos olhos da fugitiva sertaneja, acorda-a
rápido, como um susto, fazendo quase passar de um estado de sono para um
estado de desespero, pois notou que do seu transporte só sobrou o cabresto,
mas se acalmou-se e resolveu seguir viagem a pé, como de costume.
A sua família continuava a sua viagem rumo ao Aracati sempre lamentando a
ausência da donzela, mas por outra lado, achavam eles que ela teria um final
feliz. Ela por sua vez, quando acordou estava mas longe de sua querida
família, meio desorientada, pegou um caminho qualquer, com fome e sede,
sem coragem, cansada caminhou. Passava por paisagem desconhecidas,
ficava mais tempo sentada do que andando. Muito débil, levantando e caindo,
conseguiu chegar ao Rio Palhano, seco vale ressaltar, deitou-se e dormiu,
teve no estado de pré-coma. Passado o escurecimento da vista e a vontade de
alcançar os parentes deu-lhe um pouco de força para caminhar. Faltando
quase um quilomêtro e meio para chegar ao povoado de Feira de
Gados/Passagem das Pedras, caiu e não levantou mais.
Dois dias depois lenhadores que ia passando ali perto, viram um festival de
urubus, ficaram curioso para averiguar o que era, se fosse uma rês morta,
comum na época, daria quem sabe aproveitar o couro. Chegando lá, a
urubuzada voou, estupefatos, constataram que era o corpo de uma moça,
ficaram compadecidos com o estado que se encontrava aquela criatura
humana. A boca, nariz e os ouvidos exibiam os estragos acentuados, o vestido
resistente de algodãozinho garantia uma certa integridade ao corpo daquela
jovem, após alguns minutos de parmos, os lenhadores resolveram sepultar o
corpo da jovem ali mesmo. Enquanto eles carvavam quase toda a população
de Feira de Gado/Passagem das Pedras foram visitar o que chamaram de
Mártir da Injustiça Social, teve muitas orações, flores e uma pessoa
contemplado compassivamente aquele corpou falou:

- Coitada ! Uma donzelinha !

E por donzelinha ficou até hoje, nunca ninguém soube seu nome, ali caiu para
nunca mais levantar. Jaz entre a Serra do Ereré e o Rio Palhano, de lá pode
interceder por quem quer que a ela peça ajuda, consta que muita gente já
alcançou graças por seu intermédio.

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