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Valores Culturais

da Natureza

Meio Ambiente
Fundação Escola Nacional de Administração Pública

Diretoria de Desenvolvimento Profissional

Conteudista/s
Erika Fernandes Pinto (Conteudista, 2022).

Curso desenvolvido no âmbito da Diretoria de Desenvolvimento Profissional – DDPRO

Enap, 2022
Fundação Escola Nacional de Administração Pública
Diretoria de Desenvolvimento Profissional
SAIS - Área 2-A - 70610-900 — Brasília, DF
Sumário
Módulo 1 – Relação sociedade e natureza e os valores culturais da
natureza
Unidade 1 – A interdependência entre cultura e natureza e
os desafios da conservação..................................................................................... 6
1.1. Relações pessoas, lugares e natureza..................................................................... 7
1.2. Desafios da Conservação da natureza.................................................................... 8

Unidade 2 – Conceito e Tipologias de valores culturais da natureza............... 11


2.1 Um conceito em construção.................................................................................... 11
2.2 Tipologias de Valores Culturais da Natureza......................................................... 13

Módulo 2 – A evolução do tema no cenário internacional


Unidade 1 – Os valores culturais da natureza nos fóruns mundiais
de conservação ...................................................................................................... 27
1.1 Do reconhecimento do conflito à proposição de soluções ................................. 27

Unidade 2 – Políticas públicas globais que embasam o reconhecimento


de valores culturais da natureza.......................................................................... 37
2.2 Valores culturais da natureza nas políticas de proteção do
patrimônio mundial......................................................................................................... 39

Unidade 1 – Sociobiodiversidade brasileira......................................................... 43


1.1 Reconhecimento dos povos e comunidades tradicionais do Brasil.................... 43

Módulo 3 – Valores culturais da natureza no contexto brasileiro


Unidade 2 – Interfaces com as políticas públicas nacionais.............................. 50
2.1 Do reconhecimento constitucional......................................................................... 50
2.2 Políticas de conservação da natureza..................................................................... 52
2.3 Políticas de patrimônio cultural............................................................................... 55

Unidade 3 – Caminhos para integrar valores culturais da natureza


nas estratégias de conservação............................................................................ 62
3.1 Primeiros debates nacionais ................................................................................... 62

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3.2 Por uma conservação com coração........................................................................ 65

Referências.............................................................................................................. 68

GLOSSÁRIO............................................................................................................... 70

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Olá!

Desejamos boas-vindas ao curso Valores Culturais da Natureza.

Este curso tem o objetivo habilitar o participante a compreender a intrínseca relação


entre cultura e natureza, identificar as diversas tipologias de valores culturais da
natureza e perceber a importância de promover estratégias de conservação da
natureza integrando essas dimensões.

Apresentação do curso

Desejamos um excelente estudo!

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Módulo

1 Relação sociedade e natureza e os


valores culturais da natureza

Neste módulo, aprenderemos que diferentes motivações levam as pessoas a se


importarem com a manutenção de áreas naturais bem conservadas. Entenderemos
o porquê essa temática vem sendo destacada como uma abordagem fundamental
para ampliar a efetividade das estratégias de conservação. Conheceremos o conceito
de VCN e as principais tipologias que vêm sendo caracterizadas nos documentos de
referência sobre o assunto, com exemplos ligados à nossa realidade brasileira.

Unidade 1 – A interdependência entre cultura e


natureza e os desafios da conservação

Ao final desta unidade, você será capaz de compreender que a importância da


natureza para as pessoas inclui aspectos materiais e imateriais que configura
vínculos de pertencimento com lugares e que eles são essenciais para as estratégias
de conservação da natureza.

1 – Boas vindas aos alunos do curso

2 – Conheça um pouco da história e da trajetória da autora do


curso – parte 1: infância e juventude

3 – Conheça um pouco da história e da trajetória da autora do


curso – parte 2: cultura e natureza juntos? A descoberta da
etnobiologia

4 – Conheça um pouco da história e da trajetória da autora do


curso – parte 3: atuação na gestão pública

5 – Conheça um pouco da história e da trajetória da autora do


curso – parte 4: doutorado e missão de vida

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1.1. Relações pessoas, lugares e natureza
Já parou para refletir por que você gosta da natureza?

Foto: Eric Rudolph via Wikipedia – https://images.app.goo.gl/6wxiERiuTtGwwYUV6)

Embora existam diversas possibilidades de respostas para essa pergunta, estudos


têm mostrado que a importância da natureza para as pessoas vai além de aspectos
materiais, utilitários ou econômicos. Pode incluir também significados simbólicos e
relações de afeto que são difíceis de descrever e mensurar.

Eles estão relacionados com a história, a memória e a identidade de diversos grupos


sociais, envolvendo saberes e práticas que conformam ligações culturais tanto
materiais como imateriais.

De forma geral, cultura material e imaterial expressam características dos habitantes


de uma região ou de um determinado grupo social. Embora indissociáveis, essas
dimensões são diferenciadas em função das estratégias de proteção adotadas nas
políticas patrimoniais.

+ Cultura material: relaciona-se a elementos concretos ou tangíveis, como


construções, objetos e instrumentos.

+ Cultura imaterial: relaciona-se a elementos mais abstratos ou intangíveis,


como conhecimentos, hábitos, tradições, celebrações e rituais.

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Longe de serem secundários, esses fatores comumente configuram vínculos de
pertencimento e noções de respeito e cuidado das populações humanas com os
espaços naturais, sendo determinantes na sua forma de ver e se relacionar com a
natureza.

Sentimento de pertencimento: envolve relações que


determinados grupos sociais estabelecem com um lugar, que
vão além do mero estabelecimento de moradia ou exercício de
práticas produtivas. Inclui aspectos afetivos, vínculos espirituais,
valores materiais e imateriais que constroem uma identidade
cultural associada a um território específico.

Dada a sua relevância social, não é estranho que esses aspectos sejam pouco
compreendidos e levados em consideração no campo das pesquisas e da formulação
de políticas públicas, notadamente nas estratégias de conservação da natureza?

Ao negligenciar essa importante dimensão da relação sociedade e natureza, muitos


conflitos vêm sendo gerados, enquanto oportunidades são perdidas, e potenciais
parcerias subestimadas.

Por que isso acontece?

1.2. Desafios da Conservação da natureza


Na maior parte do mundo, as políticas de conservação são baseadas em uma divisão
conceitual e instrumental onde natureza e cultura são vistas como elementos
distintos e dissociados.

De forma semelhante, a noção de biodiversidade também nasceu de uma ideologia


histórica dominante que vê os seres humanos como elementos separados e
potencialmente prejudiciais a ela.

Nesse contexto, as estratégias de conservação da natureza, em geral, vêm sendo


pautadas em argumentações técnico-científicas, a partir principalmente das
denominadas Ciências Naturais, nas quais apenas evidências objetivas dos sistemas
naturais são avaliadas e consideradas (HARMON; PUTNEY, 2003; VERSCHUUREN et
al., 2010)

Isso contribui para a disseminação de uma visão de natureza desumanizada e


biologizada, além de desencantada de seus significados simbólicos (FERNANDES-
PINTO, 2017).

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Mas isso tem gerado vários problemas e desafios, desde o acirramento de
conflitos socioambientais até a perda de oportunidades de cooperação em prol da
conservação.

Sensibilizar a sociedade e obter o seu apoio na implementação de estratégias de


conservação da natureza ainda está entre os maiores desafios enfrentados pelas
políticas públicas. Isso envolve tanto comunidades locais que habitam determinadas
áreas ambientalmente importantes como a sociedade em geral.

No cenário internacional, essa problemática vem ganhando uma importância


crescente nas últimas décadas. Por um lado, pela necessidade de tornar as estratégias
de conservação da natureza mais inclusivas, eficazes e socialmente justas; por
outro, pela urgência de angariar apoio social, envolvendo e ampliando o escopo de
potenciais parceiros da conservação.

Vem se fortalecendo o entendimento de que conservar a natureza é algo que não


depende apenas de informações científicas, da atuação de gestores públicos e
de investimentos governamentais. Depende também de apoio da sociedade, que
precisa encampar iniciativas nessa direção!

No meio ambientalista, fomos acostumados a ressaltar os aspectos negativos


da interação entre sociedade e natureza. Índices de desmatamento, queimadas,
poluição, extinção de espécies, perda de ecossistemas únicos, mudanças climáticas,
entre muitos outros.

Esses são assuntos importantes que não podem ser desconsiderados, porque a
degradação ambiental atingiu uma escala planetária. E afeta a todos!

Chegamos a um momento da história em que, especialmente nas sociedades


urbanas, o ser humano passou a se considerar como algo à parte da natureza,
tomando a natureza como algo separado dos seres humanos - como mera matéria-
prima e fonte de recursos a serem explorados.

As estratégias de “desenvolvimento sustentável” e “comércio verde” não parecem


estar resolvendo a situação. Precisamos de novas soluções para velhos problemas!

Mas a conexão entre cultura e natureza é muito profunda. Ela se manifesta de


diversas formas. Também existem aspectos positivos nessa interação, e nem
todas as ações humanas no ambiente são destrutivas!

Tais ações criam relações de afeto, de pertencimento e de cuidado por parte dos
seres humanos para com as paisagens e outros elementos da natureza.

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Fonte:  Jacobs Stock Photography Ltd / Getty Images

Diante desse cenário, compreender os laços que conectam positivamente pessoas,


lugares e natureza tem sido reafirmado como fundamental para superar obstáculos
e aumentar a efetividade das estratégias de conservação (FERNANDES-PINTO, 2017).

Para alguns autores, como Verschuuren e Brown (2018), laços culturais e espirituais
estão entre os mais fortes impulsionadores e motivadores para a manutenção de
áreas naturais.

É na conexão entre conhecimentos com as artes e as emoções que se conforma o


que Alexander Von Humboldt (1769 – 1859) chamou de vínculo profundamente
arraigado que impulsiona o sentimento de admiração e respeito pelo mundo
natural (WULF, 2016).

Mas afinal, o que são valores culturais da natureza? O que eles incluem?
É o que veremos na próxima unidade.

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Unidade 2 – Conceito e Tipologias de valores
culturais da natureza

Ao final desta unidade, você será capaz de compreender o conceito


de valores culturais da natureza, suas premissas e limitações e
identificar suas principais tipologias.

2.1 Um conceito em construção


Como vimos na unidade anterior, as motivações humanas para a conservação de
áreas naturais envolvem não apenas aspectos econômicos, utilitários e econômicos.
Elas estão associadas também a valores culturais materiais e imateriais que
conformam vínculos de pertencimento.

Ainda assim, esses aspectos são pouco considerados e compreendidos na formulação


de políticas públicas, gerando vários problemas.

Para alterar esse cenário, é fundamental ampliar a compreensão sobre os laços que
conectam positivamente pessoas, lugares e natureza.

Dessa problemática, nasceu a noção de Valores Culturais da Natureza (VCN),


conceito este que vem sendo utilizado na literatura especializada nas últimas
décadas e que pode ser adaptado a diversos contextos.

Apresentamos aqui a definição que vem sendo utilizada no âmbito do Programa do


ICMBio sobre integração de valores culturais na gestão das unidades de conservação,
proposta por Fernandes-Pinto (2021).

Valores culturais da natureza envolvem significados simbólicos,


vínculos históricos e ancestrais, bens, saberes, tradições
e práticas de diferentes grupos sociais (antigos ou atuais)
associados a paisagens, fenômenos ou elementos específicos da
fauna, flora e geologia que contribuem direta ou indiretamente
para a conservação.

Como os debates sobre essa temática ainda são recentes no Brasil, esse é considerado
um conceito em construção, passível de ajustes e complementações.

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Chama-se a atenção para o fato dele não se referir a todos os aspectos culturais,
e sim destacar aqueles que promovem ou resultam na manutenção de áreas
naturais bem conservadas.

Assim como nas diretrizes internacionais da IUCN sobre a temática (VERSCHUUREN


et al., 2021), enfatiza-se que o conceito não se aplica a práticas culturais que
prejudicam os ambientes ou que não favorecem uma conexão positiva entre
sociedade e natureza.

Entenda melhor o que são contribuições diretas e indiretas para a conservação da


natureza:

+ Como contribuições diretas para a conservação da natureza, trata-se de ações


que promovem a manutenção in situ da biodiversidade, estratégias de
diversificação das espécies nativas, de restauração ambiental ou florestal e a
proteção direta de áreas, entre outras.

+ Como contribuições indiretas, destacam-se aquelas que estimulam o senso de


pertencimento, afeto, carinho, cuidado e respeito com as áreas naturais; que
enaltecem sua beleza, ampliam o conhecimento sobre as paisagens, sensibilizam
para a importância da conservação e favorecem uma conexão positiva mais
aprofundada entre pessoas e lugares.

Isso envolve um rico, complexo e heterogêneo universo de possibilidades que


refletem a diversidade de modos de vida, visões de mundo e percepções de
natureza que perpassam o contexto de diferentes grupos sociais.

Reforça-se, assim, no escopo desse trabalho, o compromisso de reconhecimento


dos direitos dos povos e comunidades tradicionais que vivem em estreita relação e
dependência com os ecossistemas naturais, além da necessidade de fortalecimento
da colaboração com esses grupos sociais para a conservação da natureza e
implementação de áreas protegidas.

Cabe lembrar, no entanto, que os aspectos que compõem valores culturais da natureza
são altamente dependentes do contexto e podem mudar ao longo do tempo. Pode
haver divergências de entendimentos entre grupos – ou entre um mesmo grupo –,
fazendo emergir questões complexas que desafiam ainda mais a gestão.

Busca-se, nessa direção, registrar valores relacionados à memória coletiva dos


diferentes grupos sociais que habitam ou habitaram um território. Por diferentes
razões, no entanto, determinados conhecimentos podem subsistir apenas na
lembrança de poucos indivíduos (em geral, idosos), tornando-os os últimos guardiões
de referências culturais vulneráveis ou ameaçadas de extinção.

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Vamos conhecer as categorias mais comuns de valores culturais da natureza?

Vamos conhecer os valores culturais da natureza?

2.2 Tipologias de Valores Culturais da Natureza


Apresenta-se, nesta unidade, as tipologias mais comuns de Valores Culturais da
Natureza (VCN), agrupadas em dez categorias. Elas foram propostas tendo por base
documentos internacionais de referência sobre a temática, especialmente HARMON;
PUTNEY (2003) e VERSCHUUREN et al. (2021) e a experiência sobre o assunto no
contexto brasileiro.

São elas:

1. Valores cênicos e perceptivos

2. Oportunidades de lazer e recreação

3. Valores históricos e arqueológicos

4. Importância para o conhecimento científico e a educação

5. Contribuições para o bem-estar e a saúde humana

6. Fonte de inspiração artística

7. Valores etnológicos e identitários

8. Formas diferenciadas de manejo e produtos da sociobiodiversidade

9. Elementos orais e linguísticos relacionados à natureza

10. Fonte de experiências religiosas e espirituais

Essas categorias não esgotam as possibilidades, de forma que não se deve deixar de
considerar outras tipologias que podem surgir em contextos específicos.

Vamos conhecer um pouco cada uma delas?

• Valores cênicos e perceptivos: aspectos qualitativos da experiência de


contato com a natureza e seus elementos.

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Essa tipologia inclui valores subjetivos como:

• A apreciação estética da beleza visual das paisagens;


• Experiências sensoriais (ex.: toque do vento, da água, da bruma da
cachoeira, sombra das árvores);
• Auditivas (ex.: canto dos pássaros, som das águas, o farfalhar do vento
na vegetação, a percepção do silêncio);
• Olfativas (ex.: cheiro do mato, do mar, das flores);
• Despertar de sentimentos como tranquilidade, paz, harmonia, bem-
estar e comunhão com a natureza.

Cataratas do Iguaçu, na divisa do Brasil com a Argentina – Foto de André Dib – Acervo ICMBio

Oportunidades de lazer e recreação: a experiência e o prazer de estar em contato


com áreas naturais bem conservadas.

Representam o valor cultural mais conhecido e divulgado da natureza, com destaque


para aquelas atividades associadas ao ecoturismo, como caminhadas em trilhas,
banhos de rio e cachoeiras, observação da fauna e da flora, contemplação das
paisagens, entre outras.

Essas são práticas que, em geral, incluem benefícios para aqueles que visitam
as áreas, os prestadores de serviços e as comunidades locais. Dependendo do
contexto, também contribuem para estimular a reflexão e a conscientização sobre a
importância da conservação da natureza.

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Cachoeira na RPPN Serra dos Topázios, Cristalina/GO – Foto
Érika Fernandes Pinto – Acervo SNS Brasil

Além das atividades mais comuns associadas ao ecoturismo, estão representadas


nessa categoria iniciativas de: turismo de aventura, práticas de esportes ao ar livre,
turismo de base comunitária e etnoturismo.

Podem ter relação com roteiros turísticos temáticos, caminhos históricos e trilhas
de grandes travessias.

Atividades consideradas não convencionais também podem fazer parte do rol de


interesses sociais na interação com áreas naturais, como a observação astrológica
e a astrofotografia, a observação de OVNIS e fenômenos ufológicos, a promoção de
práticas terapêuticas e uma série de interações envolvendo o campo da religiosidade
e da espiritualidade.

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Conheça algumas experiências de
turismo de base comunitária – TBC
em unidades de conservação
brasileiras que criam oportunidades
de vivências com comunidades locais
(ICMBio, 2019).

Iniciativas que, além de trazerem


benefícios econômicos para as
comunidades, contribuem para a
valorização de suas culturas, tradições
e modos de vida.

http://www.each.usp.br/turismo/livros/turismo_de_base_
comunitaria_em_ucs.pdf

• Valores históricos e arqueológicos: a natureza associada a aspectos


da história e da memória nacional, regional ou local.

Essa categoria inclui elementos das paisagens associados a fatos e eventos que:

• Marcaram a memória nacional ou regional (como locais onde ocorreram


batalhas e massacres, que serviram como esconderijo e rotas de fuga);
• Lugares de referência na topografia (marcos geográficos significativos);
• Registros materiais de ocupações humanas ancestrais (sítios
arqueológicos, sambaquis, pinturas rupestres, geoglifos, entre outros).

Apesar da diversidade de aspectos que essa categoria de valor cultural da natureza


pode conter, o reconhecimento formal de valores históricos tem, em geral, focado
mais no patrimônio arquitetônico construído e, em alguns casos, no arqueológico,
sujeitos a legislações especiais para sua proteção.

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Ciudad Perdida no Parque Nacional Sierra Nevada de Santa Marta na Colômbia,
um sítio arqueológico de valor cultural e espiritual para os povos indígenas que
habitam o território (Foto Érika Fernandes Pinto- Acervo SNS Brasil)

• Importância para o conhecimento científico e a educação: retrata o


valor de áreas naturais como fonte de descobertas científicas relevantes,
como o registro de novas espécies biológicas, a presença de espécies
raras e ameaçadas de extinção, a ocorrência de fenômenos naturais
singulares, entre outros.

Nesse contexto, consideram-se as práticas e experiências educacionais promovidas


em áreas naturais e a importância do contato com a natureza no desenvolvimento
cognitivo das pessoas.

Pesquisa do Centro Brasileiro de Primatas (CBP) - Acervo ICMBio

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• Contribuições para o bem-estar e a saúde humana: a importância do
contato com a natureza para manutenção da saúde física e psicológica e
como fonte de bem-estar.

Frequentemente são atribuídos efeitos curadores e restauradores à experiência


de estar em contato direto com ambientes conservados a partir de experiências
que vão desde a simples contemplação e meditação na natureza, caminhadas e
banhos de mar, em rios, cachoeiras ou águas termais, até diversas práticas de valor
terapêutico realizadas na natureza, como os chamados banhos de floresta.

Foto: Jose Antona

O Shinrin-yoku ou “banho de floresta”, como se tornou conhecido no Brasil, consiste


em visitar florestas saudáveis com finalidades terapêuticas. Tornou-se prática em
alguns países, espalhando-se inicialmente do Japão e da Coreia do Sul para muitos
outros (Fonte: https://ecopsicologiabrasil.com/banho-de-floresta/).

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• Fonte de inspiração artística: a apreciação das paisagens, dos
elementos da flora e da fauna e dos ciclos da natureza como fonte de
inspiração e expressão para as artes em suas múltiplas formas de
manifestação, tanto tradicionais como contemporâneas (pinturas,
esculturas, gravuras, literatura, poesia, contos, artes cênicas, música,
danças, entre outras).

Obra de OtonTiel Fernandes representando a Chapada dos Veadeiros. Fonte: https://www.


guiaaltoparaiso.com.br/altoparaiso?pgid=j7wmgll8-c816603c-9e67-40e9-ae4d-adc429068f90

Segundo Verschuuren et al. (2021), nessa categoria, são incluídas as expressões


culturais que comunicam o sentido de beleza, mistério e harmonia encontrados na
natureza e que influenciaram o valor social de certos lugares naturais ou paisagens
em favor de sua conservação.

Inclui as artes decorativas que expressam a natureza em itens feitos para uso
cotidiano ou cerimonial, como roupas, biojoias, cerâmicas, arranjos florais, entre
outros.

Também considera o valor das paisagens como cenário de ensaios fotográficos e de


produções audiovisuais.

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Você conhece artistas e obras que retratam as belezas da nossa
natureza?

• Valores etnológicos e identitários: sentimento de pertencimento


relacionado a paisagens ou elementos da natureza e sua importância na
conformação da identidade de determinados grupos sociais, seus
territórios e conhecimentos.

Considera a diversidade cultural associada à natureza, representada por modos de


vida, saberes e costumes que refletem diferentes visões de mundo, destacando-se
a existência de povos e comunidades tradicionais.

Essa relação humana com as áreas pode ser atual ou ancestral, devendo-se respeitar
o direito à memória e à verdade dos grupos sociais sobre os fatos históricos ocorridos
nos territórios, que podem ter levado ao extermínio ou à expulsão de parte deles.

Cabe lembrar que o valor identitário da natureza se expressa de diversas formas,


não só em comunidades rurais, mas também urbanas, onde as áreas naturais
podem ter diferentes significados para a população.

Encaixa-se também nessa tipologia a indicação de elementos da flora e da fauna


como símbolos representativos de grupos, municípios, regiões, estados e países.

Monte Roraima na divisa do Brasil com a Guiana e Venezuela – lugar sagrado e de referência
para os povos indígenas - foto: Yosemite / Wikimedia Commons / CC BY-SA 3.0

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• Formas diferenciadas de manejo e produtos da sociobiodiversidade:
consideram as práticas tradicionais que moldam paisagens e meios de
subsistência que têm na natureza a base para a sua manutenção,
produção e uso sustentável.

Exemplos disso são:

• Extrativismo não madeireiro;


• Pesca artesanal;
• Apicultura de abelhas nativas;
• Confecção de artesanato a partir de plantas nativas;
• Sistemas agroflorestais e permaculturais;
• Agricultura familiar e a agrobiodiversidade associada;
• Pastoreio extensivo em campos nativos;
• Tecnologias tradicionais de uso seletivo do fogo;
• Outras práticas de manejo comum.

São embasados em conhecimentos tradicionais e envolvem técnicas especiais de


manejar determinados ambientes que mantêm e/ou promovem a riqueza biológica
(incluindo a agrobiodiversidade), mantendo a qualidade ambiental.

Morador tradicional carregando cacho de açaí na RESEX Cajari – Acervo ICMBio

Podem incluir várias categorias de uso da biodiversidade, como:

• Medicina tradicional;
• Agrobiodiversidade;
• Formas de conservação, processamento e preparação de alimentos;
• Gastronomia e culinária típica;
• Artesanato e produção de artefatos, objetos utilitários e decorativos;
• Arquitetura vernacular;
• Festividades relacionadas a épocas de colheitas e safras de coleta de
produtos;
• Entre outros.

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Catálogo de Produtos da
Sociobiodiversidade do Brasil
(ICMBio, 2019)

https://www.gov.br/icmbio/
pt-br/assuntos/noticias/
ultimas-noticias/icmbio-lanca-
catalogo-de-produtos-da-
sociobiodiversidade

• Elementos orais e linguísticos relacionados à natureza: vocabulários


relacionados à elementos da natureza, aostermos e expressões locais
utilizados para caracterizar e nomear lugares particulares das paisagens,
à flora e fauna, aos tipos de vegetação e solo, às condições climáticas e
aos fenômenos da natureza.

Inclui a existência de línguas e dialetos singulares relacionados a grupos culturais


que habitam áreas geográficas específicas e estudos das toponímias (investigação
da etimologia, dos significados, da história da nomeação de lugares geográficos
relevantes e suas variações).

Consideram-se também contos folclóricos, lendas, enigmas, provérbios, ditados


populares ligados aos territórios, que podem transmitir conhecimentos sobre a
natureza, derivados da sabedoria popular desenvolvida ao longo de gerações em
coevolução com determinadas paisagens.

Pedra de Xangô – lugar de referências para os povos de santo de Salvador/BA, cujo nome está
relacionado com a representação de uma divindade (Foto: Mônica Silveira – Acervo SNS Brasil).

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Para Verschuuren et al. (2021), a riqueza lexical fornece uma descrição detalhada
de elementos ou aspectos particulares da natureza que são mais relevantes para
determinados grupos sociais. A linguagem pode revelar muitos conhecimentos sobre
a natureza e a história das paisagens, além de ajudar a recuperar conhecimentos
antigos ou quase desaparecidos, incluindo relações particulares com áreas naturais.

• Fonte de experiências religiosas e espirituais: a natureza como fonte


de experiências místicas, religiosas ou espirituais como um elemento
comum na maioria das tradições e associada a sentimentos de comunhão,
paz e conexão com algo maior.

Inclui uma ampla variedade de práticas realizadas nos ambientes naturais em


rituais e cerimônias que celebram a qualidade espiritual da natureza ou onde a
natureza dá significado à experiência religiosa, no que vem sendo denominado de
espiritualidade ecológica.

Pedra Chapéu do Sol, Cristalina/GO. Foto: Collemes - Domínio público

Vão desde atividades individuais ou realizadas em pequenos grupos até grandes


celebrações coletivas que podem envolver centenas ou milhares de pessoas, como:
rezas, orações, leituras de textos sagrados, oferendas, batismos, missas, vias sacras,
rituais diversos, representações teatrais de passagens bíblicas, festejos religiosos,
peregrinações, entre outras.

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Considera a existência de elementos específicos das paisagens aos quais são
atribuídos significados espirituais especiais e que podem ser considerados sítios
naturais sagrados (Fernandes-Pinto, 2017).

Pode envolver a presença de estruturas construídas em consagração de espaços


naturais significativos, desde pequenas imagens sacras e altares até grandes
monumentos.

Contudo, é importante considerar que áreas importantes em termos de aspectos


culturais podem não estar associadas a evidências materiais notáveis nas paisagens,
especialmente quando se trata de povos indígenas.

Essa tipologia inclui também espécies da flora e da fauna consideradas sagradas,


vinculadas a lendas e mistérios ou associadas a usos ritualístico e cerimoniais. Inclui-
se também crenças sobre seres do mundo imaginal associados às paisagens, como
os personagens encantados e seres míticos, mitológicos ou fantásticos das matas,
campos, mangues, rios e mares, que podem influenciar nas regras de acesso e uso
dos recursos naturais.

Imagem do Curupira, personagem fantástico das matas brasileiras, reconhecido


como protetor da natureza. Foto: Celso Costa/Rede Amazônica

Entidades Ecologicamente Corretas

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Para saber mais sobre as diversas formas de relações
espiritual ou religiosa com áreas naturais, leia o artigo “Entre
Santos, Encantados e Orixás: uma jornada pela diversidade
de sítios naturais sagrados do Brasil” (FERNANDES-PINTO;
IRVING, 2018). https://www.academia.edu/37340574/ENTRE_
SANTOS_ENCANTADOS_E_ORIX%C3%81S_UMA_JORNADA_PELA_
DIVERSIDADE_DOS_S%C3%8DTIOS_NATURAIS_SAGRADOS_NO_
BRASIL

Diversas histórias sobre as paisagens brasileiras vêm sendo compiladas e divulgadas


pela Iniciativa Sítios Naturais Sagrados do Brasil. https://sitiosnaturaissagrados.
org/

Logo da Iniciativa sítios naturais sagrados do Brasil. Imagem: acervo pessoal: Érika Fernandes Pinto

O que você achou dessa diversidade de tipologias de valores


culturais da natureza?

Ainda que possa causar um certo estranhamento inicial pensar nos valores culturais
da natureza como objeto de políticas públicas, diversos estudos têm destacado
que esses aspectos estão entre as principais razões que levam as pessoas a se
importarem com a conservação.

Quando compreendemos que existe uma intrínseca relação entre cultura e


natureza, percebemos que não é possível tratar do ambiental sem considerar o
social de forma integrada, tampouco olhar para aspectos biológicos ou ecológicos
sem considerar as influências culturais.

Isso pode parecer óbvio, mas nem sempre foi assim.

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Por muito tempo, as políticas públicas de conservação da natureza foram construídas
e implementadas sem levar em conta os aspectos culturais que permeiam essa
relação.
Até mesmo nas ciências essas dimensões foram separadas (Ciências Naturais x
Ciências Humanas ou Sociais), reforçando-se muitas vezes uma dicotomia entre
elas.

Foi nesse contexto que o debate sobre Valores Culturais da Natureza surgiu nos
fóruns mundiais. Vamos conhecer um pouco dessa história? Esse é o tema do
próximo módulo.

Vídeo Organacast Valores


Culturais da Natureza (Episódio
4, Parte 1) https://www.youtube.
com/watch?v=op4zSeJYn2A e
(Episódio 4, Parte 2) https://
w w w . y o u t u b e . c o m /
watch?v=da69lS_8GTA

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Módulo

2 A evolução do tema no
cenário internacional

Neste módulo, veremos como o tema dos valores culturais da natureza surgiu
nos fóruns mundiais sobre políticas públicas de conservação. Conheceremos os
principais marcos e tendências do debate internacional. Além disso, vamos nos
familiarizar com o arcabouço jurídico que fundamenta essa temática globalmente
a partir de políticas que buscam valorizar uma leitura integrada da diversidade
biológica e cultural.

Unidade 1 – Os valores culturais da natureza


nos fóruns mundiais de conservação

Ao final desta unidade, você será capaz de compreender a


evolução e as tendências das discussões sobre a temática dos
valores culturais da natureza nos fóruns mundiais de conservação.
Conhecerá as principais iniciativas e programas internacionais
sobre o assunto e as publicações de referência.

1.1 Do reconhecimento do conflito à proposição de


soluções
Como vimos no Módulo 1, os Valores Culturais da Natureza, relevantes para boa
parte da sociedade, ainda são pouco compreendidos e considerados nas estratégias
de gestão ambiental.

Apenas nas últimas décadas, esse cenário começou a mudar, com a ampliação
progressiva do reconhecimento dos múltiplos valores da natureza e das suas
contribuições diretas ou indiretas para o bem-estar e a qualidade de vida humana
nos fóruns mundiais sobre políticas públicas - incluindo aqueles sobre conservação
da natureza.

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Essas temáticas ainda não convencionais na gestão pública vêm sendo promovidas,
nas últimas décadas, em eventos realizados por instituições e coligações globais
com a publicação de diversas obras de referência.

Essa é uma discussão internacionalmente crescente, mas ainda incipiente no


contexto brasileiro. Que precisamos conhecer e integrar nas nossas iniciativas em
prol da conservação.

Vamos dar uma olhada nela?

1.1.1 A emergência do debate mundial sobre a temática

No cenário internacional, a temática dos valores culturais da natureza começou a


despertar interesse a partir do final da década de 1990, quando coligações globais
começaram a promover eventos com esse enfoque e a publicar as primeiras obras
de referência.

Entre elas, destaca-se a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência
e a Cultura (UNESCO), a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN)
e a Convenção da Diversidade Biológica (CDB).

A primeira publicação de alcance mais amplo sobre a temática foi lançada pelo
United Nations Environment Programme (UNEP), em 1999.

Intitulada Cultural and Spiritual Values of


Biodiversity, essa publicação entrelaça pontos
de vista filosóficos, históricos, jurídicos,
científicos e pessoais, oferecendo uma rica
amostra da rede de conexões que interligam
diversidade biológica e cultural (POSEY, 1999).

Link para download https://www.unep.org/


resources/publication/cultural-and-spiritual-
values-biodiversity

Esse tema ganha verdadeiramente impulso quando passa a ser pauta dos congressos
mundiais sobre conservação da natureza organizados pela União Internacional
para a Conservação da Natureza (IUCN).

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 28


A IUCN, fundada em 1948, é considerada a
maior e mais antiga organização ambientalista
mundial.

Consiste em uma rede global que congrega


mais de 200 agências governamentais e 1200
organizações de cerca de 160 países, com a
missão de encontrar soluções para a conservação ambiental e o
desenvolvimento sustentável, em uma parceria mundial única.

Promove bianualmente os Congressos Mundiais de Conservação


da Natureza e, a cada década, eventos similares sobre parques e
outras áreas protegidas.

Essa organização tem um papel central na definição das bases,


diretrizes e tendências mundiais para as políticas e estratégias
de conservação.

Isso acontece de forma mais incisiva no V World Parks Congress, promovido pela
IUCN em Durban/África do Sul, em 2003. Esse congresso, que teve como tema
“Áreas Protegidas: benefícios além das fronteiras”, foi o primeiro evento do gênero a
contar com uma participação expressiva de lideranças indígenas de diversas partes
do mundo.

Duras críticas foram feitas por eles ao modelo de conservação do patrimônio


natural em vigência, ressaltando-se injustiças sofridas pelos grupos sociais como
consequência da forma de implementação dessas estratégias sem considerar
aspectos culturais.

Além de denunciar práticas colonialistas de conservação, os indígenas criticaram a


falta de envolvimento dos órgãos gestores de áreas protegidas com as populações
locais. Reforçaram que muitas delas incidem não apenas sobre seus territórios
de moradia e uso tradicional, mas também sobre lugares de importância cultural,
incluindo aqueles considerados sagrados.

Também desafiaram a IUCN a exigir que os diversos países reconheçam e


respeitem os direitos, responsabilidades e contribuições dos povos indígenas para
a conservação da natureza (BROSIUS, 2004; STEVENS, 2014).

Isso desencadeou uma série de debates que iniciam um processo de mudança


de paradigma nas estratégias de conservação da natureza, que vão fortalecendo,

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 29


paulatinamente, o reconhecimento da relevância dos povos indígenas e tradicionais
para manutenção da diversidade natural, bem como a legitimidade de seus
conhecimentos e práticas de manejo para a manutenção da biodiversidade.

Em 2003, foi também lançado o livro intitulado The


Full Values of Parks: from economics to the intangible
(HARMON; PUTNEY, 2003).

A obra é considerada pioneira a trazer uma visão


abrangente dos valores culturais associados às
áreas protegidas, incluindo aspectos materiais e
imateriais.

1.1.2 Um grupo de especialistas para aprofundar a temática

Para dar encaminhamento a essas diretivas, foi formado, no âmbito da Comissão


Mundial sobre Áreas Protegidas (World Commission on Protected Areas - WCPA/IUCN),
o Cultural and Spiritual Values of Protected Areas Specialist Group – CSVPA.

Esta é uma das seis comissões voluntárias


da IUCN, formada por administradores
de AP e especialistas. Conta com mais de
dois mil membros de pelo menos 140
países. Tem por objetivo promover o estabelecimento e a
administração efetiva de uma rede de trabalho mundial sobre o
tema.

Reconhecer a importância dos valores culturais e espirituais da natureza se tornou


o mote principal de trabalho do CSVPA.

Congregando especialistas de diversos países, esse grupo tem sido responsável


por formular abordagens teórico-conceituais sobre a temática, organizar acervos
de informações e publicações, realizar estudos de caso e propor diretrizes e
recomendações para integração de valores culturais e espirituais da natureza na
gestão das áreas protegidas e nas estratégias de conservação, de forma mais ampla.

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Grupo de Trabalho Especial sobre Valores Culturais e Espirituais
das Áreas Protegidas - essa iniciativa teve início em 1998, como uma
força-tarefa. Tornou-se um grupo permanente de especialistas
da IUCN em 2009. Do foco inicial nos sítios naturais sagrados, a
abordagem foi ampliada a partir de 2012 para abranger múltiplos
significados da natureza para diferentes grupos sociais (Fonte:
csvpa.org).

A partir do trabalho desse grupo, diversas iniciativas para a investigação e promoção


da importância dos valores culturais da natureza vêm sendo realizadas em diversas
regiões do planeta. Elas vêm contribuindo para a ampliação do conhecimento sobre
o tema e para avanços no debate sobre estratégias para o seu reconhecimento e
promoção.

Um desdobramento importante dessa iniciativa foi


a elaboração de um documento de referência para
o manejo de sítios naturais sagrados (SNS) em áreas
protegidas (WILD; MCLEOD, 2008), lançado no World
Conservation Congress de 2008 (Barcelona, Espanha).

Essa publicação oferece um panorama geral sobre o estado da arte da gestão


dos SNS em diferentes partes do mundo e apresenta uma gama de exemplos
de boas práticas que estão sendo desenvolvidas em alguns casos emblemáticos,
exemplificados a seguir:

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Reconhecimento de valor cultural e
espiritual do Parque Nacional do
Tongariro, na Nova Zelândia, para o
Povo Maori, a primeira área
reconhecida como paisagem
cultural na Conveção do Patrimônio
Mundial.

Gestão do uso público no


Monumento Nacional Devils Tower,
nos Estados Unidos da América,
ajustada em conformidade com os
usos religiosos indígenas.

Adaptações da gestão da área


protegida que inclui o Pico Sri Pada-
Adams no Sri Lanka, para acomodar
interesses multirreligiosos

Fonte: Parque Nacional do Tongariro - Foto: Blueromulan - CC BY-


SA 3.0; Monumento Nacional Devils Tower - Foto: powerofforever/
iStock; Pico Sri Pada-Adams - Foto: Bourgeois - CC BY-SA 3.0

Com tais iniciativas, essa problemática vem ganhando visibilidade crescente como tema-
chave nos debates internacionais, inspirando e renovando a perspectiva da aliança
com a sociedade como uma premissa para promover a conservação da natureza.

A promoção da participação e inclusão dos atores sociais envolvidos, a partir da


construção de um processo de colaboração respeitosa, é uma das orientações
centrais reforçadas nessas diretivas, reafirmando a importância da participação
social para a implementação de estratégias de conservação da natureza.

1.1.3 Inspirando soluções para despertar a consciência ecológica


Entre os grandes eventos mundiais que se configuram como marcos referenciais
para esse debate, cabe destacar também o VI Congresso Mundial de Parques, realizado
em 2014, em Sidney/Austrália.

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Essa edição, realizada 11
anos depois do
emblemático congresso
anterior de Durban/2003,
avançou nas propostas de
inserção social na gestão
de áreas protegidas.

Além disso, demonstrou que os casos mais bem-sucedidos de


conservação no mundo são aqueles que promovem parcerias
com diversos setores da sociedade.

Com o tema Parques, Pessoas, Planeta: inspirando soluções, o


evento teve como propósito estimular a concepção de formas
inovadoras de inspirar as pessoas a buscarem uma conexão mais
profunda com a natureza, envolvendo seus corações e mentes
para gerar bem-estar físico, psicológico e espiritual.

O documento final desse evento – intitulado A Promessa de Sidney – foi proposto


como referência na adoção de uma nova ética na conservação, fundamentada na
integração entre diversidade biológica e cultural e em noções de justiça, equidade e
respeito para com os diversos grupos sociais (IUCN, 2014).

Depois de Sidney, o Congresso Mundial de Conservação da Natureza seguinte foi


realizado em Honolulu, no Havaí/EUA, em 2016, com o tema O Planeta na Encruzilhada.

O evento fez um alerta para a


gravidade da situação
planetária com o iminente
risco de colapso dos
ecossistemas, a ampliação dos
efeitos das mudanças
climáticas e as taxas cada vez
mais elevadas de extinção da biodiversidade.

Além disso, conclamou os participantes de todo o mundo para


a urgência na implementação de mecanismos que permitam
transformar esse cenário, onde conservação da natureza e o
progresso humano não sejam excludentes.

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As recomendações aprovadas no evento ressaltam que tal empreitada implica em
um grande desafio coletivo de mudança de paradigmas civilizatórios e de adoção
de novas práticas que somente obterão êxito com a construção de parcerias com os
mais diversos setores da sociedade.

Nesse contexto, os valores culturais da natureza emergiram novamente como um


tema-chave para o debate, inspirando e renovando a perspectiva de reconexão
dessas dimensões como uma premissa para a conservação.

As conexões entre espiritualidade e conservação, particularmente, tiveram destaque,


reconhecendo essa ligação como uma das mais poderosas forças de transformação
das consciências humanas em prol de uma relação mais harmônica e cuidadosa
com a natureza.

Esse foi o tema de um dos cinco eventos principais na programação do congresso –


denominados de High Level Dialogues – “Conexões entre espiritualidade e conservação”,
que contou com a participação de líderes espirituais de diversas tradições religiosas.
Algo inédito também nos debates sobre conservação da natureza, considerando
que convencionalmente não costumavam dialogar com esses grupos.

Acesse o registro desse evento no Youtube em: https://www.


youtube.com/watch?v=UtsbVKqB_3k, acesso em: out./2020.
Duração: 1h52min.

Uma das recomendações aprovadas no evento reforça a importância de se construir


capacidades para promover o reconhecimento da dimensão cultural associada ao
patrimônio natural a partir da formação de pessoas que atuam nessa área.

Este curso que você está realizando dialoga diretamente com essas diretivas e
representa uma importante iniciativa que vem para colaborar com a integração
dessa temática nas estratégias de conservação.

Mas como fazer isso?

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1.1.4 Diretrizes para integrar a significância cultural e espiritual da
natureza nas estratégias de conservação

No último congresso mundial


da IUCN, realizado em 2021
(Marseille, França), foi
apresentada a publicação
Cultural and Spiritual Significance
of Nature in Protected and
Conserved Areas (VERSCHUUREN
et al., 2021).

Organizada por alguns especialistas no


tema – inspirados por discussões em
eventos em diferentes partes do
mundo –, a obra apresenta seis
princípios abrangentes que são base
para 41 diretrizes, ilustradas com
exemplos de aplicação em diversos
contextos.

Complementarmente, são apresentados dez estudos de caso de


diversas regiões geográficas, grupos sociais e tipos de governança,
que ajudam a demonstrar como valores culturais podem ser
integrados na gestão de diferentes categorias de APs e as lições
aprendidas.

https://csvpa.org/best-practice-guidelines/cultural-and-
spiritual-significance-of-nature/

A obra, a qual integra a série de boas práticas da IUCN, instiga os órgãos


governamentais a aprofundar o conhecimento sobre a temática e incorporá-la na
gestão das APs de formas inovadoras, a fim de torná-las mais integradas, holísticas,
justas, inclusivas e eficazes.

Vamos conhecer alguns dos princípios que embasam essa discussão?

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Com base nessas premissas, diversas iniciativas de reconhecimento dos valores
culturais da natureza e de integração desses aspectos em estratégias de conservação
têm surgido em diferentes regiões do mundo.

Elas vêm sendo respaldadas por algumas políticas globais que buscam fazer uma
leitura integrada entre cultura e natureza. Vamos conhecê-las?
Esse é o tema da próxima unidade.

Áreas Protegidas e Valores Culturais da Natureza

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 36


Unidade 2 – Políticas públicas globais que
embasam o reconhecimento de valores
culturais da natureza

Ao final desta unidade, você terá conhecimento sobre as


políticas mundiais que embasam inciativas de reconhecimento e
promoção de valores culturais da natureza.

2.1 Contribuições dos povos tradicionais para a conservação da natureza

Como vimos na unidade anterior, faz algumas décadas que o tema dos valores
culturais da natureza vem sendo debatido nos fóruns internacionais sobre políticas
públicas de conservação da natureza.

Tem-se deflagrado iniciativas em todo o mundo, refletindo avanços no reconhecimento


dos direitos dos povos originários e na proposição de políticas públicas que buscam
valorizar uma leitura integrada da diversidade biológica e cultural. Vamos conhecer
as principais?

Ainda no início da década de 1990, a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB,


1992) representa um marco para o reconhecimento da importância dos povos
tradicionais e de seus saberes para a proteção da natureza, reafirmando que valores
culturais intrínsecos também estão associados à biodiversidade.

A CDB foi aprovada no âmbito da


Conferência das Nações Unidas sobre
Meio Ambiente e Desenvolvimento
(CNUMAD), realizada no Rio de Janeiro/
Brasil, em 1992.

Adotada por mais de 190 países, essa


convenção vem se consolidando como
a principal referência mundial sobre
questões relacionadas à proteção da
natureza.

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 37


Nessa perspectiva, o mais marcante dispositivo da CDB é o seu artigo 8j, que, entre
outros aspectos, solicita aos países membros da Organização das Nações Unidas
(ONU) que

respeitem, preservem e mantenham o conhecimento,


as inovações e as práticas das comunidades indígenas
e locais que incorporam estilos de vida tradicionais
relevantes para a conservação e o uso sustentado da
diversidade biológica. (CDB, 2004)

O artigo 10c, por sua vez, estimula a

proteger e encorajar a utilização costumeira de


recursos biológicos de acordo com práticas culturais
compatíveis com as exigências de conservação ou
utilização sustentável. (CDB, 2004)

Esses dispositivos oferecem uma abertura para o reconhecimento de diversas


formas de conservação de áreas e dos valores culturais da natureza.

Dois documentos em particular se sobressaem no debate sobre valores culturais da


natureza:

Diretrizes Voluntárias Akwé:Kon para avaliação


das repercussões sociais e culturais, além das
ambientais, de projetos de desenvolvimento
que possam afetar lugares sagrados ou terras
ocupadas e utilizadas tradicionalmente por
povos indígenas (CDB, 2004).

https://iucn.oscar.ncsu.edu/mediawiki/
images/c/c1/Akwe-brochure-en.pdf

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Código de Conduta Ética Tkarihwaié:ri para
garantir o respeito ao patrimônio cultural e
intelectual das comunidades indígenas e
locais relevantes para a conservação e
utilização sustentável da diversidade
biológica (CDB, 2011)

https://www.cbd.int/traditional/code/
ethicalconduct-brochure-en.pdf

Apesar de ainda pouco aplicadas nos países signatários da CDB, essas diretrizes
exemplificam como os aspectos culturais devem ser considerados em intervenções
ambientais, em diálogo com os grupos sociais, internalizando em seus textos a
compreensão da relação intrínseca entre diversidade cultural e biológica.

Essas recomendações da CDB encontram respaldo também na Convenção no. 169


da Organização Internacional do Trabalho sobre povos indígenas e tribais (OIT,
1989) e na Declaração das Nações Unidas sobre Direitos dos Povos Indígenas
(ONU, 2007).

A primeira traz como aspectos mais relevantes o princípio da autoidentificação


como critério de determinação da condição de povos indígenas e tribais e a garantia
ao direito à consulta prévia, livre e informada a esses grupos sociais sobre
iniciativas e projetos que afetem seus territórios.

A segunda resulta de um processo de construção associado a 25 anos de debates


e controvérsias. Representa uma conquista primordial para a consolidação dos
direitos dos povos indígenas à nível mundial e vem inspirando o estabelecimento de
diretrizes para políticas e legislações nacionais que reforçam o papel desses grupos
sociais para a manutenção da diversidade natural.

2.2 Valores culturais da natureza nas políticas de


proteção do patrimônio mundial
No campo das políticas de proteção do patrimônio mundial, promovidas pela
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO),
também existem diplomas legais que embasam o reconhecimento e a proteção de
valores culturais da natureza.

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 39


A UNESCO, fundada em 1945, é uma
organização internacional que tem por
missão contribuir para a paz mundial, a
erradicação da pobreza, o desenvolvimento
sustentável e o diálogo intercultural por
intermédio da educação, da ciência, da
cultura, da comunicação e da informação.

Responde pela implementação da Convenção do Patrimônio


Mundial e do Programa Homem e Biosfera (MAB).

Cabe destacar a Convenção do Patrimônio Mundial, aprovada em 1972, considerada


o primeiro instrumento global a abordar natureza e cultura conjuntamente.

Entretanto, as práticas de registro e tombamento dos bens assim reconhecidos


ainda são operadas sob a égide da divisão entre as dimensões natural e cultural.
Esse representa um desafio a ser enfrentado na revisão dessa política.

Além disso, predominou durante décadas o entendimento de que patrimônio


cultural era, fundamentalmente, composto por bens materiais com características de
grandeza e excepcionalidade (SANT´ANNA, 2009), o que limitava o reconhecimento
de elementos relacionados a povos nativos.

Diante disso, alguns países – especialmente aqueles de tradição não europeia –


passaram a demandar estudos para a formulação de instrumentos de proteção e
reconhecimento de manifestações culturais populares.

Uma primeira resposta a essa reivindicação foi dada a partir da Recomendação


sobre a Salvaguarda das Culturas Tradicionais e Populares, lançada em
1989 pela UNESCO (link: http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/
Recomendacao%20Paris%201989.pdf), considerada o marco impulsionador das
discussões acerca da proteção dos bens de natureza imaterial no mundo ocidental
que influenciou diretamente a valorização da cultura dos povos originário e
tradicionais nas políticas patrimoniais.

A partir de então, uma perspectiva mais integrada de natureza e cultura nas


suas dimensões materiais e imateriais vem sendo reafirmada em normativas
subsequentes como:

+ Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural (UNESCO, 2001) http://


www.dominiopublico.gov.br/download/texto/ue000115.pdf.

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 40


+ Convenção para Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial (UNESCO,
2003) http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/ConvencaoSalvaguar
da.pdf.
+ Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões
Culturais (UNESCO, 2005) http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-
2010/2007/decreto/d6177.htm.

O que você acha de conhecer melhor esses documentos para uma compreensão
mais aprofundada de como eles podem ser integrados a estratégias de conservação?

Essas normativas internacionais vêm se constituindo em dispositivos fundamentais


para o reconhecimento das dimensões simbólicas e dos valores culturais associados
ao patrimônio natural. Vêm também ajudando a fortalecer o debate sobre a
importância desses aspectos nas iniciativas de conservação da natureza.

Se reconhece que, por um lado, há diversas práticas culturais que dependem dos
elementos naturais para serem expressadas. Por outro, que muitos grupos sociais
também são responsáveis por manter, manejar e promover a biodiversidade, como
ilustrado na figura a seguir:

Fonte: https://www.cbd.int/lbcd/about – adaptado para o português pelo ICMBio).

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 41


Essas iniciativas mostram que, no plano internacional, a leitura integrada das
políticas ambientais e culturais não é apenas uma tendência, mas uma realidade e
uma necessidade que vem sendo enfatizada pelas principais organizações mundiais
que têm interface com a promoção de estratégias de conservação.

As recomendações internacionais formuladas sobre o tema alertam para a urgência


de ações concretas de proteção dos significados culturais da natureza em seus
contextos locais.

Esse é campo de interesse crescente e cada vez mais proeminente entre profissionais
de conservação e acadêmicos.

Entretanto, em grande parte dos países, o conhecimento sobre essa problemática é


limitado e as iniciativas de promoção desses valores em políticas públicas nacionais
são ainda incipientes (WILD; MCLEOD, 2008; FERNANDES-PINTO; IRVING, 2017,
VERSCHUUREN; BROWN, 2018).

Esse parece ser o caso do Brasil, um país que conjuga uma das maiores diversidades
biológicas do mundo a uma expressiva diversidade cultural.

Assim, apesar do amplo debate internacional sobre esses temas, ainda há muito
a trilhar para que as recomendações envolvendo os valores culturais da natureza
sejam internalizadas nas políticas nacionais.

Como esse debate se relaciona com o contexto brasileiro?

É o que veremos no próximo módulo.

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 42


Módulo

3 Valores culturais da natureza


no contexto brasileiro

Neste módulo, veremos como o debate sobre reconhecimento de valores culturais


da natureza se relaciona com o contexto brasileiro, a expressiva sociobiodiversidade
do país e as políticas públicas nacionais. Vamos conhecer também iniciativas em
curso que vem trilhando caminhos para promover a integração dos valores culturais
da natureza nas estratégias de conservação.

Unidade 1 – Sociobiodiversidade brasileira

Ao final desta unidade, você será capaz de compreender por


que o Brasil é um país multicultural e os direitos que devem ser
harmonizados e levados em consideração nas estratégias de
conservação.

1.1 Reconhecimento dos povos e comunidades


tradicionais do Brasil

Fonte: http://concursobrasileirodeenredos.blogspot.com/2015/07/

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 43


Com sua vasta dimensão territorial (8,5 milhões km² de terras e 3,5 milhões km²
de costa marinha) e variedade de ambientes, o Brasil conjuga uma das maiores
riquezas biológicas do mundo a uma expressiva pluralidade sociocultural.

Aliada à exuberância natural, o país abriga uma rica diversidade cultural, formada
por mais de 300 povos indígenas, comunidades remanescentes de quilombos e
populações tradicionais, representadas por um diversificado conjunto de grupos
sociais de múltiplas origens.

Comunidades remanescentes de quilombos – grupos étnico-


raciais, segundo critérios de auto atribuição, com trajetória
histórica própria, dotados de relações territoriais específicas,
com presunção de ancestralidade negra relacionada com a
resistência à opressão histórica sofrida (de acordo com artigo 2o
do Decreto nº 4887/2003).

Populações tradicionais – são grupos culturalmente diferenciados


e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias
de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos
naturais como condição para sua reprodução cultural, social,
religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos,
inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição (de
acordo com a definição de Povos e comunidades tradicionais do
inciso I, artigo 3º do Decreto Federal nº 6.040 de 2007).

Fonte: http://www.megatimes.com.br/2013/12/indio-brasileiro-historia-e.html

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 44


Além disso, o Brasil recebeu, ao longo de sua história, fluxos de imigrantes oriundos
de diversos países, favorecendo a formação de uma nação verdadeiramente
multicultural.

Os diversos grupos sociais presentes no território nacional possuem modos de vida


adaptados a determinados ambientes e uma profunda sabedoria sobre as espécies
da fauna e da flora, bem como dos ciclos naturais, traduzidos em complexos sistemas
chamados de conhecimentos ecológicos tradicionais.

Eles compõem o que é chamado de sociobiodiversidade


brasileira.

Vamos conhecer alguns dos grupos sociais que compõem


essa nação multicultural chamada Brasil?

Seringueiros Ribeirinhos Castanheiros Extrativistas

Quebradeiras de
Andirobeiros Vazanteiros Geraizeiros
coco babaçu

Pantaneiros
Caatingueiros Retireiros Veredeiros do Pantanal
Matogrossense

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 45


Catadoras de Pomeranos dos Fundo e Fecho de
Morroquianos
mangaba Pontões Capixaba Pasto

Apanhadores de
Cipozeiros da Faxinalenses dos
Flores Sempre Piaçaveiros
Mata Atlântica Campos Sulinos
Vivas

Pescadores
Ciganos Caiçaras Ilhéus
artesanais

Isqueiros Povos de Terreiro Quilombolas Indígenas

Fonte: http://portalypade.mma.gov.br/

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 46


Para saber mais, acesse o Portal Ypadê/MMA: http://portalypade.
mma.gov.br/.

Sociobiodiversidade Brasileira

Quanta diversidade, não?

Você conhecia esses grupos ou eles representam uma novidade?

Boa parte desses grupos sociais enfrentaram, ao longo da história, diversas lutas
para que seus direitos territoriais e culturais começassem a ser reconhecidos no
país e para que políticas públicas direcionadas a eles fossem instituídas.

A Constituição Federal de 1988 foi um grande marco nesse debate, ao reconhecer


o Brasil como uma nação multicultural e estabelecer dispositivos legais específicos
sobre os direitos de povos indígenas e comunidades remanescentes de quilombos,
como detalhado nos quadros a seguir:

+ DIREITOS DOS POVOS INDÍGENAS


O artigo 231 da Constituição Federal de 1988 reconhece aos índios
direitos originários sobre as terras por eles ocupadas tradicionalmente.
Elas são entendidas, de acordo com parágrafo 1º, como “as por eles
habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades
produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais
necessários a seu bem-estar e as necessárias à sua reprodução física e
cultural, segundo seus usos, costumes e tradições”.

Ao estabelecer esses direitos como originários, entende-se que a


demarcação das terras indígenas (TI) tem um caráter meramente
declaratório – um ato de reconhecimento de uma situação preexistente
–, sendo um dever da União promover a demarcação da área e garantir a
sua proteção (SANTILLI, 2005).

O processo de reconhecimento tem início na Funai, mas as Terras


Indígenas são declaradas por ato do Ministério da Justiça e homologadas
por decreto presidencial. Os ritos de demarcação encontram-se
regulamentados no Decreto Federal nº 1.775 de 1996 (Link: http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D1775.htm).

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As terras indígenas somam, na atualidade, aproximadamente 700
áreas – em diferentes estágios do seu processo de reconhecimento – e
representam cerca de 12% do território nacional.

+ DIREITOS DAS COMUNIDADES QUILOMBOLAS


O artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitória da
Constituição Federal de 1988 reconhece aos remanescentes das
comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras a
propriedade definitiva, devendo o Estado emitir os títulos respectivos.

A formação dos quilombos guarda uma história de resistência e de


luta dos negros escravizados no período colonial por reconhecimento
e direito à sua cultura e dignidade. Os quilombos representavam uma
forma de organização social alternativa à ordem escravista, e essas
comunidades estavam, em sua maior parte, invisibilizadas até o advento
da Constituição de 1988.

O procedimento de identificação, reconhecimento, delimitação,


demarcação e titulação de territórios quilombolas é regulamentado pelo
Decreto Federal nº. 4.887 de 2003 (Link: http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/decreto/2003/d4887.htm), e o Incra é o órgão competente para
tal na esfera federal.

Estima a existência de cerca de 5 mil comunidades quilombolas no país,


das quais aproximadamente 3.500 foram mapeadas pela Fundação
Palmares (Fonte: http://www.palmares.gov.br/?p=3041).

Entretanto, há um grande passivo na aplicação das políticas públicas


referentes a esses grupos sociais, e apenas 5% dos territórios encontram-
se titulados (Fonte: CONAQ) http://conaq.org.br/noticias/so-cerca-de-
5-das-32-mil-comunidades-quilombolas-reconhecidas-no-brasil-sao-
demarcadas/.

Mas ainda há muitos desafios para que essas políticas sejam de fato implementadas
e respeitadas.

Com relação a outros grupos sociais considerados povos e comunidades tradicionais


não elencados diretamente na Constituição Federal, seus direitos vêm sendo
reconhecidos por diferentes instrumentos jurídicos, como a Política Nacional de
Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT),
instituída em 2007 por meio do Decreto nº 6.040.

Muitos deles vem se mobilizando em organizações e articulações próprias, espalhadas


por todo o país. O Conselho Nacional dos Povos e Comunidades Tradicionais, por

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 48


exemplo, conta com quase 30 representações desses segmentos. Mas há muitos
outros ainda a serem considerados.

A formulação da PNPCT deflagrou um processo de emergência do autoreconhecimento


de comunidades tradicionais que se afirmam através de uma identidade coletiva e
pela manutenção de territórios de uso comum. “Vozes e rostos que emergem da
invisibilidade histórica mostrando que os vazios demográficos têm gente” (SIQUEIRA;
FERNANDES-PINTO, 2007, p.8)

Nesse contexto, ressurgem grupos sociais que, apesar de novos para a sociedade
brasileira em geral, sempre estiveram presentes em diversos recantos do país.
Um processo que contribui para trazer para o campo das relações políticas a
complexidade identitária da diversidade de grupos sociais formadores da sociedade
nacional.

Você já parou para pensar na importância dessa sociobiodiversidade


e como ela se relaciona com as estratégias de conservação da
natureza?

Vamos refletir sobre isso começando por entender as interfaces desse tema com
algumas legislações brasileiras. Esse é o tema da próxima unidade.

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 49


Unidade 2 – Interfaces com as políticas públicas
nacionais

Ao final desta unidade, você será capaz de compreender as


legislações nacionais que são relevantes no debate sobre
reconhecimento de valores culturais da natureza e reconhecer
possibilidades de articulação entre políticas ambientais e
culturais.

2.1 Do reconhecimento constitucional


A Constituição Federal, em seu artigo 225, ao estabelecer o “meio ambiente
ecologicamente equilibrado” como direito dos brasileiros, “bem de uso comum e
essencial à sadia qualidade de vida”, atribui ao “Poder Público e à coletividade o dever
de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações” (BRASIL, 1988).

Para tanto, o Poder Público dispõe de uma série de instrumentos de gestão, tais
como o manejo ecológico das espécies e ecossistemas, a fiscalização ambiental,
a realização de estudos prévios de impacto ambiental, programas de Educação
Ambiental e a criação de espaços territoriais especialmente protegidos.

Esses instrumentos visam à concretização de um direito fundamental – um


meio ambiente sadio e equilibrado - em uma perspectiva de solidariedade
intergeracional, o que deve ser dar em constante diálogo com a sociedade.

Entendendo sociedade como algo não homogêneo, e sim o reflexo de um conjunto


variado de grupos sociais agregados de forma desigual, é necessária atenção para
essas múltiplas perspectivas a fim de garantir equidade na condução de políticas
públicas e na implementação dos instrumentos de gestão ambiental.

Quando os valores culturais da natureza e as múltiplas formas de interação com


o ambiente não são considerados, pode-se incorrer em decisões equivocadas que
resultarão em conflitos com grupos que poderiam ser aliados da conservação,
“criminalizando” suas práticas culturais.

Assim, um meio ambiente sadio e equilibrado não pode ser entendido somente
como busca por um status aceitável quanto à integridade do meio físico. Deve ser
considerada a integridade do conjunto de significados que a natureza representa
para os diversos grupos formadores da sociedade nacional.

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Fonte: https://gestaodesegurancaprivada.com.br/constituicao-o-que-
e-para-que-serve-tipos-constituicao-brasileira-1988/

No contexto das políticas públicas brasileiras, a perspectiva de reconhecimento de


valores culturais da natureza é amparada principalmente pelos artigos 215 e 216 da
Constituição Federal de 1988.

Considera-se como patrimônio cultural brasileiro “os bens de natureza material


e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência
à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade
brasileira”. Incluindo-se, entre outros aspectos, “as formas de expressão e os modos
de criar, fazer e viver” (BRASIL, 1988).
Estes incluem:

I – as formas de expressão;

II – os modos de criar, fazer e viver;

III – as criações científicas, artísticas e tecnológicas;

IV – as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às


manifestações artístico-culturais;

V – os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico,


arqueológico, paleontológico, ecológico e científico. (BRASIL, 1988)

Esse mesmo dispositivo constitucional determina que é dever do poder público


promover e proteger, de múltiplas formas. o patrimônio cultural brasileiro. Note

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 51


que essa não é uma atribuição específica de um único setor governamental, e sim
do poder público em geral. O que inclui também os órgãos executores das políticas
ambientais.

Ao introduzir as noções de direitos socioculturais e de patrimônio cultural material e


imaterial, eles inovaram no reconhecimento do caráter multicultural da sociedade
brasileira.

Durante algum tempo, a noção de patrimônio cultural esteve voltada principalmente


para a preservação de edifícios, monumentos históricos e obras de arte dos povos
colonizadores.

Diante desse contexto, o artigo 216 da Constituição Federal representou uma grande
conquista de movimentos sociais e intelectuais brasileiros que lutavam para que
a perspectiva de outros grupos formadores da sociedade nacional também fosse
considerada nas políticas patrimoniais.

Isso levou à ampliação da noção de patrimônio cultural para incluir também bens
intangíveis ou imateriais. Além disso, influenciou as políticas ambientais, dando
maior visibilidade à cultura dos povos tradicionais.

2.2 Políticas de conservação da natureza

Fonte: https://www.mma.gov.br/areas-protegidas/unidades-de-conservacao

No âmbito das políticas nacionais de áreas protegidas, o Sistema Nacional de


Unidades de Conservação da Natureza – SNUC (Lei Federal nº 9.985 de 2000), apesar

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 52


de abordar de forma incipiente o tema, expressa algumas referências a direitos de
populações locais e à perspectiva da sua integração nas estratégias de conservação
da biodiversidade.

Seus objetivos incluem “proteger as características relevantes de natureza cultural”


e “os recursos naturais necessários à subsistência de populações tradicionais”,
respeitando e valorizando seu conhecimento e sua cultura, promovendo-as social e
economicamente (BRASIL, 2000, artigo 4).

SAIBA MAIS sobre o SNUC

A criação de Unidades de Conservação (UC) tem sido a principal


estratégia utilizada no país para a proteção do patrimônio
natural.
Desde a instituição do primeiro parque nacional (o PARNA
do Itatiaia), na década de 1930, mais de duas mil UC já foram
criadas no território brasileiro – entre áreas federais, estaduais,
municipais e particulares.

O Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) no


Brasil é regido pela Lei Federal nº 9.985 de 2000 (Link: http://
www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9985.htm), regulamentada
pelo Decreto nº 4.340 de 2002 (Link: http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/decreto/2002/d4340.htm).

O sistema é composto por 12 categorias de UC, cujos objetivos


específicos se diferenciam quanto à forma de proteção e usos
permitidos em UC de proteção integral e UC de usos sustentável.

Unidades de Conservação de Proteção Integral: têm por objetivo


preservar a natureza, sendo admitido apenas o uso indireto dos
seus recursos naturais, com exceção dos casos previstos nessa
Lei. Grupo composto pelas categorias: Estação Ecológica (ESEC);
Reserva Biológica (REBIO); Parque Nacional (PARNA); Monumento
Natural (MONA) e Refúgio de Vida Silvestre (RVS).

Unidades de Conservação de Uso Sustentável: têm por objetivo


compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável
de parcela dos seus recursos naturais. Constituem esse grupo
as categorias: Área de Proteção Ambiental (APA); Área de
Relevante Interesse Ecológico (ARIE); Floresta Nacional (FLONA);
Reserva Extrativista (RESEX); Reserva de Fauna (REFAU); Reserva

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de Desenvolvimento Sustentável (RDS) e Reserva Particular do
Patrimônio Natural (RPPN).

Na atualidade, as UC estão presentes em todas as regiões do país


e abrangem cerca de 15% do território nacional (CNUC/MMA,
2020) (Link: https://www.mma.gov.br/images/arquivo/80229/
CNUC_FEV20%20-%20B_Cat.pdf). As UC federais administradas
especificamente pelo ICMBio somam 334 áreas e preservam
importantes ecossistemas naturais nos diversos biomas
brasileiros.

O Plano Nacional Estratégico de Áreas Protegidas – PNAP (Decreto Federal nº 5.758


de 2006) foi o primeiro dispositivo jurídico no país a reconhecer a importância
ambiental dos territórios indígenas, de comunidades remanescentes de quilombos
e de outras populações tradicionais, integrando-os ao conceito de áreas protegidas.

O texto do PNAP menciona a importância da


valorização dos aspectos culturais e simbólicos na
proteção da natureza e ressalta a necessidade de
fortalecer os instrumentos de participação social,
com vistas a incluir o tema da diversidade
sociocultural na gestão das UC.

Ao fazer uma associação direta entre proteção da natureza e diversidade


sociocultural, o PNAP resgata, na avaliação de Irving et al. (2013), o valor social da
biodiversidade, reconhecendo as subjetividades e simbologias culturais envolvidas
nos processos de conservação da biodiversidade e a interpretação do patrimônio
natural – temas ainda incipientes nas pesquisas acadêmicas e nas políticas públicas.

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 54


Fonte: Acervo ICMBio – Foto: Leonardo Milano

Encaminhamentos a essas diretivas foram dados também na construção da


já mencionada Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e
Comunidades Tradicionais – PNPCT (Link: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_
ato2007-2010/2007/decreto/d6040.htm) (Decreto Federal nº 6.040 de 2007).

Essa política tem o objetivo de “promover o desenvolvimento sustentável dos povos


e comunidades tradicionais, com ênfase no reconhecimento, fortalecimento e
garantia dos seus direitos territoriais, sociais, ambientais, econômicos e culturais”
(artigo 2º).

Em um contexto de invisibilidade histórica, ela representou uma grande conquista


desses segmentos da população nacional. Principalmente para aqueles que não
foram mencionados explicitamente na Constituição Federal de 1988, o que abrange
uma grande diversidade de grupos sociais não indígenas e não quilombolas.

Soma-se as políticas mencionadas anteriormente também a Política Nacional de


Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI), instituída em 2012
pelo Decreto no 7.747 de 2012 (Link http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2012/decreto/d7747.htm).

2.3 Políticas de patrimônio cultural


No Brasil, as políticas de proteção do patrimônio cultural são implementadas
nacionalmente pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artísticos Nacional – IPHAN
(Link http://portal.iphan.gov.br). Elas se distinguem em duas categorias: material e
imaterial.

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Você sabe no que elas se diferenciam?

Para saber mais sobre a diferença entre patrimônio cultural


material e imaterial no Brasil, assista ao vídeo “O Que é
Patrimônio Material e Patrimônio Imaterial?”, tempo 3min20s,
do Canal Elaborando Projetos – Sociais e Culturais. https://www.
youtube.com/watch?v=-Uz61DKiMAk

A Política de Patrimônio Cultural Material foi instituída no Brasil pela Portaria


nº 375, de 2018 (Link: http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/
PORTARIA%20375%20-%202018%20-SEI_IPHAN%20-%200732090.pdf).

Ela traz no seu texto princípios que falam da responsabilidade compartilhada


entre União, estados e municípios em proteger o patrimônio e da necessidade de
colaboração e cooperação das diferentes esferas do Poder Público e da sociedade.

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Exemplos de bens tombados como Patrimônio Cultural Material no Brasil

Casa de Chico Mendes e seu acervo – Xapuri/AC


Fonte: Acervo IPHAN http://portal.iphan.
gov.br/ac/noticias/detalhes/4179/casa-de-
chico-mendes-e-reaberta-em-xapuri-ac

Estátua do Cristo Redentor no Morro


do Corcovado – Rio de Janeiro/RJ
Fonte: Acervo IPHAN http://portal.iphan.gov.
br/noticias/detalhes/3313/cristo-redentor-rj-
completa-sete-anos-como-patrimonio-cultural

Geoglifos – AC
Fonte: Acervo IPHAN – Foto Diogo Gurgel http://
portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/822822

Há mais de dois mil bens tombados como patrimônio cultural pelo IPHAN no Brasil,
além de outros reconhecidos no âmbito estadual ou municipal. (Acesse o link: http://
portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/126 - A lista dos bens tombados no Brasil.

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Os bens culturais de natureza imaterial dizem respeito a atividades, práticas e outros
domínios da vida social que se manifestam em saberes, ofícios e modos de fazer artes em
suas diversas formas de expressão (cênicas, plásticas, musicais ou lúdicas), festas e
celebrações, além de lugares de importância diferenciada.

A proteção desses valores é regida pelo Decreto nº 3.551 de 2000 - que instituiu o Registro
de Bens Culturais de Natureza Imaterial, criou o Programa Nacional do Patrimônio
Imaterial (PNPI) e consolidou o Inventário Nacional de Referências Culturais (INCR).

Entende-se que o patrimônio imaterial é transmitido de geração a geração, sendo


constantemente recriado pelas comunidades e grupos em função de seu ambiente, de sua
interação com a natureza e de sua história, gerando um sentimento de identidade e
continuidade. Além de contribuir para promover o respeito à diversidade cultural e à
criatividade humana.

Já o INRC é uma metodologia de pesquisa desenvolvida pelo Iphan para produzir


conhecimento sobre os domínios da vida social aos quais são atribuídos sentidos e valores
e que, portanto, constituem marcos e referências de identidade para determinado grupo
social (Fonte: IPHAN).

Os INRC adotam a noção de referências culturais, incluindo uma multiplicidade de


sentidos. Buscam identificar as diversas manifestações culturais e bens de interesse de
preservação - de natureza imaterial e material - representativos dos diversos grupos sociais
formadores da sociedade. São fundamentalmente instrumentos de conhecimento, podendo
resultar na indicação de bens para registro ou tombamento, mas não necessariamente.

A noção de inventário é ampla e inclui levantamento, identificação,


pesquisa/documentação, valorização, preservação/proteção.

Quatro categorias principais de bens culturais imateriais são reconhecidas:


● saberes e modos de fazer;
● celebrações;
● linguagens (musicais, iconográficas e performáticas);
● espaços em que se produzem as práticas culturais.

Entende-se que a elaboração de um inventário de referências culturais, por si só, já dá início


a um processo de salvaguarda dos bens pelo próprio grupo social, que passa a compartilhar
histórias e saberes, valorizando sua memória coletiva.

Busca-se criar oportunidades para que os grupos reflitam sobre as mudanças que estão
ocorrendo nas suas referências culturais, lembrando que as culturas são dinâmicas, e as
transformações são próprias de qualquer contexto social (ISA, 2013).

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Acesse no link a seguir os dossiês dos bens registrados como
patrimônio cultural imaterial do Brasil: http://portal.iphan.gov.
br/publicacoes/lista?categoria=22&busca=

Veja alguns exemplos de bens culturais de natureza imaterial registrados no Brasil:

Fonte: Acervo IPHAN – http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/54

Arte Kusiwa – Pintura Corporal e Arte Gráfica Wajãpi - um sistema de


representação gráfica próprio dos povos indígenas Wajãpi, do Amapá, que sintetiza
seu modo particular de conhecer, conceber e agir sobre o universo.

Fonte: Acervo IPHAN — http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/60

Cachoeira de Iauaretê - Lugar sagrado dos povos indígenas dos rios Uaupés e
Papuri - um lugar de referência fundamental para os povos indígenas que habitam
a região de São Gabriel da Cachoeira/AM. 

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Fonte: Acervo IPHAN – http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/75

Sistema Agrícola Tradicional do Rio Negro/AM - conjunto de elementos que se


articulam em torno do modo de produção e consumo de gêneros alimentícios em
seus contextos sociais e culturais, abarcando modos de fazer e conhecimentos
mantidos por uma comunidade de cerca de 22 povos indígenas.

Fonte: Acervo IPHAN – Foto de Kristian Bengtson, 2003 https://aldeiacomum.


wordpress.com/2011/11/27/unesco-ritual-yaokwa-da-tribro-brasileira-
enawene-nawe-e-inscrito-na-lista-do-patrimonio-imaterial/

O Ritual Yaokwa - importante celebração do pelo povo indígena Enawenê Nawê, o


qual habita uma aldeia na região noroeste do Mato Grosso. Essa prática é considerada
essencial para a manutenção da ordem do complexo sócio-cosmológico indígena e
o grande emblema da etnia.

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Fonte: Acervo IPHAN – http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/63/

Tambor de Crioula do Maranhão - uma forma de expressão de matriz afro-


brasileira que envolve dança circular, canto e percussão de tambores

Como vimos nesta unidade, o Brasil é um território megabiodiverso e multicultural,


repleto de grupos sociais com modos de vida adaptados a diferentes ambientes e
com conhecimentos tradicionais sobre as espécies da fauna, da flora e dos ciclos
naturais.

A legislação que rege as políticas ambientais no país expressa de diversas formas


a importância do diálogo com os grupos sociais e a sua integração nas estratégias
de conservação. Mas há muito o que avançar, sendo necessária a integração das
políticas ambientais com as políticas culturais.

Você já pensou em como as estratégias de conservação da


natureza podem dialogar com esses elementos?

Para conhecer melhor esse cenário, o ICMBio vem realizando algumas ações que
visam embasar a elaboração de um programa para integrar valores culturais na
gestão de UC e a formulação de diretrizes institucionais para tratar a temática.
Vamos conhecê-las na próxima unidade.

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Unidade 3 – Caminhos para integrar valores
culturais da natureza nas estratégias de
conservação

Ao final desta unidade, você conhecerá algumas iniciativas do


ICMBio para promover o debate sobre a integração de VCN em
estratégias de conservação e será convidado a participar dessa
construção.

3.1 Primeiros debates nacionais


Ainda que para muitos a temática dos valores culturais da natureza soe como algo
novo no debate sobre políticas públicas de conservação, vimos ao longo deste curso
que esse é um debate crescente internacionalmente e que diversas iniciativas vêm
sendo implementadas nas últimas décadas em diversas regiões do mundo.

Essas iniciativas são respaldadas por uma série de recomendações e diretrizes


internacionais que vem sendo divulgadas por organizações como a União
Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), a Organização das Nações
Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) e a Convenção da Diversidade
Biológica (CDB). Os diversos países vêm sendo convidados e instigados a testá-las,
implementá-las e adequá-las aos seus marcos regulatórios e realidades locais.

Com o objetivo de fomentar esse debate no contexto brasileiro, o ICMBio promoveu,


em julho de 2019, o Seminário Valores Culturais da Natureza: novos desafios para as
políticas públicas de conservação.

Fonte: Acervo ICMBio

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O evento contou com uma vasta programação que buscou abarcar diversas
perspectivas sobre o tema: de diferentes coordenações do ICMBio a outros órgãos
do poder público, da academia e da sociedade.

Adotou como linha mestra a ideia de que, para muitos grupos sociais, a natureza
está associada também a aspectos da sua história, memória e identidade, que, como
vimos ao longo deste curso, envolvem saberes e práticas que conformam ligações
culturais imateriais ainda pouco compreendidas e consideradas nas estratégias de
gestão ambiental.

Reforçou-se, ainda, a perspectiva de que compreender os laços que conectam


pessoas, lugares e natureza é essencial para ampliar a efetividade das políticas de
conservação da natureza, aproximando as unidades de conservação da sociedade.

Assista ao Teaser do Seminário que detalha os objetivos da


proposta e os temas abordados (4:40 minutos): https://www.
youtube.com/watch?v=54fZIvAG6nU

As abordagens incluem:

• Serviços culturais ecossistêmicos.


• Valores recreacionais, turísticos e educacionais.
• Cadeias de produtos da sociobiodiversidade.
• Sítios naturais sagrados.
• Políticas de salvaguarda do patrimônio cultural.
• Políticas indigenistas.
• Apoio a comunidades quilombolas.
• Políticas de direitos humanos e igualdade racial.
• Conservação colaborativa e perspectivas internacionais sobre o tema.
• Ecopsicologia.
• Etnoconservação.
• Possibilidades de diálogo entre ciências sociais e naturais.
• Visão da Comissão Nacional para o Fortalecimento das Reservas
Extrativistas e dos Povos Extrativistas Costeiro Marinhos (CONFREM).
• Visão da Rede Cerrado.
• Visão indígena do Santuário dos Pajés/DF.

Também foram apresentados alguns exemplos de experiências concretas de


integração de conhecimentos tradicionais e valores culturais nas estratégias
de conservação que vêm tendo sucesso e geraram mudanças de paradigma
emblemáticas na gestão pública, como: 

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 63


+ O MANEJO INTEGRADO DO FOGO (MIF) - uma estratégia que, trabalhando de
forma articulada com as comunidades locais, tem contribuído para a prevenção
da ocorrência de grandes incêndios e redução da área queimada em diversas
unidades de conservação;

+ A implementação da POLÍTICA NACIONAL DE GESTÃO AMBIENTAL E


TERRITORIAL DE TERRAS INDÍGENAS (PNGATI) em áreas de sobreposição de TI
com UC – uma iniciativa que, ao estimular a celebração de acordos com os povos
indígenas de forma a compatibilizar suas demandas e interesses com as
necessidades de conservação da natureza, vem contribuindo para reverter
cenários de conflitos, tornando inimigos aliados e parceiros em prol de objetivos
comuns.

+ O MANEJO DE CAVERNAS DE IMPORTÂNCIA CULTURAL - com diversos exemplos


de como a aliança com a sociedade têm ajudado a reduzir o impacto da visitação
em áreas sensíveis.

Todas as palestras apresentadas no seminário estão disponíveis


no Youtube. https://www.youtube.com/playlist?list=PLopDAlCig
Sa5GJTtSy-450yrY7pIq1kMq Que tal assistir algumas delas? Não
esqueça de deixar seus comentários no vídeo!

Esse seminário representou um primeiro esforço institucional do ICMBio para


promover esse debate, o qual vem se aprofundando com outras iniciativas que
devem ser consolidadas no Programa para Integração de Valores Culturais da Natureza
na Gestão de UC Federais, do qual este curso é uma das ações.
Essa é uma agenda em construção e sua contribuição é muito importante.

Vamos construir juntos esse caminho de integração dos valores culturais da natureza
nas estratégias de conservação?

Populações Tradicionais, Conservação e Valores Culturais da


Natureza

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 64


3.2 Por uma conservação com coração
No debate internacional, tem-se argumentado que o reconhecimento dos valores
culturais da natureza pode ajudar a:

• Agregar riqueza adicional ao patrimônio natural;


• Contribuir para minimizar conflitos socioambientais; e
• Fomentar uma agenda positiva, expandindo alianças e parcerias para
mostrar para a sociedade os benefícios da conservação.

Para avançar nessa direção, diversos autores e documentos internacionais têm


reforçado que os programas de conservação e interpretação ambiental não podem
ser baseados apenas em dados científicos envolvendo aspectos físicos e biológicos
das áreas.

É necessário que eles incorporem também valores culturais materiais e imateriais


que fazem sentido para a sociedade, que se mostrem capazes de envolver as pessoas,
inspirando-as a cuidar da natureza a longo prazo e a implementar mudanças de
hábitos de vida para proteger o meio ambiente.

Para isso, é preciso estar atendo para a multiplicidade de significados que a sociedade
atribui às áreas naturais e começar a “usar essa linguagem” nas estratégias de
conservação.

Reconhece-se que as razões pelas quais as comunidades locais se importam com


a natureza não são necessariamente as mesmas que os técnicos ou pesquisadores
consideram relevantes.

Nessa direção, a integração da dimensão cultural nas iniciativas de conservação


da natureza tem sido vista como uma estratégia que ajuda a desatar nós e criar
laços!!!

Isso inclui não apenas reconhecer, valorizar e proteger os significados culturais das
paisagens, mas também promover práticas positivas de interação com as áreas
naturais, pautadas no resgate da conexão positiva entre sociedade e natureza e no
respeito à diversidade de olhares e crenças.

Iniciativas desse tipo exigem, no entanto, novas abordagens de gestão, capazes de


superar o olhar fragmentado que separa natureza de cultura e de trazer uma visão
integrada dessas dimensões.

Resgatando, nesse debate, o lugar das subjetividades e do afeto!

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 65


Pois como indicado em uma placa no Parque Nacional Tayrona, na Colômbia, “no
interior do ser humano foi cortado o bosque da sua sensibilidade e secou o rio da
esperança”.

Por isso, para salvar a biodiversidade do planeta é preciso, antes de mais nada,
“reflorestar os corações humanos!”, de forma que as pessoas voltem a se importar
com o que acontece com a natureza e com os diversos seres que nela habitam.

Foto Érika Fernandes Pinto - Acervo SNS Brasil

Desafiador, não?

Mas é nesse contexto que os valores culturais da natureza emergem como um


elemento chave para promover o reencantamento. Um novo olhar para velhos
problemas, valorizando a participação da sociedade na conservação e reconhecendo
as múltiplas relações humanas com os ambientes (FERNANDES-PINTO, 2017).

Esse é um desafio em andamento.

Que tal se juntar ao time?

Esse curso é apenas um pontapé inicial para uma mudança de mentalidade em prol
de uma visão mais integradora da conservação da natureza.

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Esperamos que ele te inspire a continuar nessa jornada para juntos descobrirmos
os caminhos para tornar isso possível!

A jornada, enfim, continua!

Até Logo

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 67


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GLOSSÁRIO
N°: Termo: Definição/significado:

Conjunto de informações, interesses e valores


Conhecimentos
da relação entre a comunidade local e o meio
1 ecológicos
ambiente do qual fazem parte, transmitido atra-
tradicionais
vés de gerações.

Interrelação entre a diversidade biológica e a di-


2 Sociobiodiversidade
versidade de sistemas socioculturais.

Enap Fundação Escola Nacional de Administração Pública 70

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