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Universidade do Sul de Santa Catarina

Sociologia do Crime e da Violência


Disciplina na modalidade a distância

2ª edição

Palhoça
UnisulVirtual
2008

sociologia_do_crime.indb 1 10/12/2007 10:10:39


Créditos
Unisul - Universidade do Sul de Santa Catarina
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Apresentação

Este livro didático corresponde à disciplina Sociologia do Crime


e da Violência.

O material foi elaborado visando a uma aprendizagem autônoma,


abordando conteúdos especialmente selecionados e adotando uma
linguagem que facilite seu estudo a distância.

Por falar em distância, isto não significa que você estará sozinho.
Não esqueça que sua caminhada nesta disciplina também
será acompanhada constantemente pelo Sistema Tutorial da
UnisulVirtual. Entre em contato sempre que sentir necessidade,
seja por correio postal, fax, telefone, e-mail ou Ambiente Virtual
de Aprendizagem - AVA. Nossa equipe terá o maior prazer em
atendê-lo, pois sua aprendizagem é nosso principal objetivo.

Bom estudo e sucesso!

Equipe UnisulVirtual.

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Ana Cristina Borba Alves

Sociologia do Crime e da Violência


Livro didático

Design instrucional
Carmen Maria Cipriani Pandini

2ª edição

Palhoça
UnisulVirtual
2008

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Copyright © UnisulVirtual 2008
Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida por qualquer meio sem a prévia autorização desta instituição.

Edição – Livro Didático


Professora Conteudista
Ana Cristina Borba Alves

Design Instrucional
Carmen Maria Cipriani Pandini
Luiz Henrique Queriquelli (2ª edição)

ISBN 978-85-7817-058-5

Projeto Gráfico e Capa


Equipe UnisulVirtual

Diagramação
Pedro Teixeira

Revisão Ortográfica
Rejane Martins

341.597
A48 Alves, Ana Cristina Borba
Sociologia do crime e da violência : livro didático / Ana Cristina Borba Alves ; design
instrucional Carmen Maria Cipriani Pandini, [Luiz Henrique Queriquelli]. – 2. ed.
– Palhoça : UnisulVirtual, 2008.

120 p. : il. ; 28 cm.

Inclui bibliografia.
ISBN 978-85-7817-058-5

1. Crime – Aspectos sociológicos. 2. Violência (Direito). I. Pandini, Carmen Maria


Cipriani. II. Queriquelli, Luiz Henrique. III. Título.

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Universitária da Unisul

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Sumário

Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3
Palavras da professora. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .9
Plano de estudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11

UNIDADE 1 – Pensamentos Criminológicos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15


UNIDADE 2 – Modernas escolas sociológicas da criminologia . . . . . . . . . 31
UNIDADE 3 – O policiamento comunitário como alternativa à
Segurança Pública. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53
UNIDADE 4 – A gramática da exclusão/inclusão e a realidade
socioeconômica brasileira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77

Para concluir o estudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109


Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111
Sobre a professora conteudista . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 117
Respostas e comentários das atividades de auto-avaliação . . . . . . . . . . . . 119

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Palavras da professora
Você está iniciando o estudo da disciplina “ Sociologia do
Crime e da Violência”.

A existência do crime, da criminalidade sempre permeou


a história da humanidade, contudo, atualmente, o seu
aumento exagerado tem preocupado a todos: sociedade e
governantes.

Para entender este fenômeno é preciso que tenhamos


em mente que vivemos numa sociedade complexa e que
diversos são os fatores ocasionadores da criminalidade,
quais sejam: fatores individuais, sociais, psicológicos,
econômicos, coletivos, dentre outros.

Por isso, para que consigamos compreender é necessário


que lancemos sobre esse fenômeno, vários olhares, com
auxílio dos diversos campos do saber, ou seja, um olhar
transdiciplinar, pois torna-se quase que despiciendo falar
hoje que o Direito Penal sozinho, isoladamente, não
tem conseguido prevenir e combater a criminalidade,
pois, essa luta há que ser travada não só por nossos
governantes, mas pela sociedade como um todo.

Assim, para o estudo serão apresentadas de uma


forma sintética as escolas sociológicas que estudaram o
fenômeno do crime, da criminalidade, do criminoso, da
vítima e o meio social em que viveram. Após, um breve
relato sobre a realidade socioeconômica, a desigualdade
social, a gestão sóciopolítico da sociedade brasileira.
E, derradeiramente, a proposição de um policiamento
comunitário como forma de prevenção da criminalidade.

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Convido você a ingressar nesta disciplina e espero que obtenha
o máximo aproveitamento, possibilitando ter noções gerais
acerca de todos os fenômenos que envolvem o crime, violência
e criminalidade e, sobretudo a convocá-los a pensar mais
seriamente que esse problema não é apenas um problema dos
gestores oficiais da segurança pública, mas um problema que tem
que ser enfrentado por toda a sociedade brasileira.

Bons estudos!

Professora Ana Cristina Borba Alves

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Plano de estudo

Ementa
Teorias da sociologia e criminologia. Aspectos sociológicos
dos crimes. O crime e a violência como fenômeno social.
Correlação entre crime, desigualdades e desemprego.
Crime e anomia. Violência legítima. Crime e violência na
sociedade contemporânea. A evolução da criminalidade.
Violência urbana. As explicações sociológicas para a
violência e a criminalidade na sociedade brasileira: causas
estruturais, políticas, institucionais e culturais. A sociologia
do crime e da violência e a atividade policial.

Objetivos
„ Estudar as escolas sociológicas do crime para
possibilitar uma visão mais aprofundada das
questões que circundam o crime.
„ Permitir uma visão contextualizada relacionando
a criminalidade não só com a figura do crime de
da pessoa do criminoso, mas, também, analisar
outras questões e pessoas envolvidas, como a
vítima e o controle social (informal e formal).
„ Conhecer a realidade socioeconômica brasileira e
sua possível correlação com a criminalidade.
„ Promover um espaço de conscientização acerca
da necessidade de um empenho e participação de
toda sociedade para combate à criminalidade e,
não apenas dos governantes.

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Carga Horária
60 horas-aula

4 créditos

Cronograma de estudo
Utilize o cronograma a seguir para organizar seus períodos
de estudo. E não esqueça de anotar as datas de realização das
atividades de avaliação.

Carga
Semanas Eventos Atividades Datas-chave
horária
Leitura da mensagem do tutor no mural e do plano
de ensino.
Início da disciplina
Atividades no AVA.

Estudo da Unidade 1 do livro didático.


1
Unidade 1 Atividades de auto-avaliação.

Atividades no AVA.

Estudo da Unidade 2 do livro didático.

Unidade 2 Atividades de auto-avaliação.

Atividades no AVA.

Estudo da Unidade 3 do livro didático.

Unidade 3 Atividades no AVA .

Avaliação a distância.

Estudo da Unidade 4 do livro didático.


2
Atividades no AVA.
Unidade 4
Atividades de auto-avaliação.

Atividades no AVA.
Avaliação presencial.
Avaliação presencial de 2ª chamada.
Avaliação presencial final (caso necessário).

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1
UNIDADE 1

Pensamentos Criminológicos

Objetivos de aprendizagem
„ Analisar e compreender o pensamento criminológico
a partir das várias tendências: biológicas, psicológicas,
psiquiátricas e sociológicas contextualizando nos
diversos momentos da ciência e da sociedade.

Seções de estudo
Seção 1 Momento pré-científico da criminologia.

Seção 2 Momento semicientífico da criminologia.

Seção 3 Momento científico da criminologia.

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Para início de estudo


O estudo da criminologia não é uma descoberta recente,
pois, ainda que de uma forma elementar e rudimentar, desde
a existência do crime e do interesse que ele e o delinqüente
despertavam na sociedade e, o conseqüente reflexo cultural sobre
a civilização, pode-se dizer que, em um sentido mais amplo,
já se tratava de criminologia. Contudo, em sentido estrito, a
criminologia, como ciência, de base empírica, surgiu próximo ao
final do século XIX, juntamente com a Escola Positiva italiana
que teve como principais nomes Lombroso, Garófalo e Ferri,
sendo que esta última generalizou como método de investigação
o empírico-indutivo.

A Scuola Positiva traça uma linha divisória nas etapas de


evolução das idéias dos pensamentos criminológicos, sendo que
a etapa anterior ficou conhecida como momento pré-científico
e após seu surgimento nasce a etapa científica da criminologia,
quando a especulação do pensamento abstrato-dedutivo passa à
observação, indução e ao método positivo.

Ao pensamento criminológico seguiram-se várias tendências de


cunho biológico, psicológico, psiquiátrico, até chegar à sociologia,
que é a forma predominante e de maior abrangência dos estudos
na área de Criminologia atualmente.

- Para iniciar os estudos desta disciplina você vai conhecer os aspectos


históricos, esses ajudarão você a compreender melhor o conceito de
criminologia. Vamos lá?

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Sociologia do Crime e da Violência

SEÇÃO 1 - Momento pré-científico da criminologia

A criminologia é uma ciência que se ocupa do crime,


do delinqüente, da vítima e do controle social e dos
delitos, concorda? Baseia-se em observações, fatos e
leva em consideração a prática, mais do que opiniões
e argumentos, é uma ciência que necessita dos
saberes de outras áreas e disciplinas como a Biologia,
a Psicologia, a Sociologia, a Política, a Ética, o Direito,
etc.
Quando a criminologia surgiu tratava de explicar a
origem da delinqüência utilizando o método das
ciências, o esquema causal e explicativo, ou seja,
buscava a causa do efeito produzido. Pensava-se que
erradicando a causa se eliminaria o efeito, como se
isso pudesse ser controlado e compreendido somente
por meio da medicina ou da psiquiatria. Pense nisso...
Vamos construir uma compreensão contextualizada
sobre o conceito de criminologia?
Use o espaço a seguir e escreva palavras que têm
relação com essa ciência. No final deste estudo vamos
compor um quadro de pertinência à criminologia,
contextualizando pensamentos e práticas. Vamos lá?

- Vamos ao estudo dos momentos que situam a criminologia na


história?

O momento pré-científico da criminologia antecede à etapa


semicientífica e ao pensamento criminológico positivista que,
numa classificação mais atual, é considerado o marco inicial da

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Universidade do Sul de Santa Catarina

In: Introdução crítica ao estudo etapa científica da criminologia. Nesse período destacaram-se
do sistema penal: elementos algumas escolas que serão mencionadas nesta unidade.
para a compreensão da atividade
repressiva do Estado. Rogério Dutra Os dados das escolas que seguem foram escritos tendo como
Santos (Org.) Florianópolis: Diploma
Legal, 1999.
base a obra de Laisa Pavan. Algumas considerações sobre
“antecedentes” no art. 59 do Código Penal.

Veja, a seguir, quais são as escolas que correspondem a esse


momento histórico.

Fisionomistas
Essa corrente criminológica tem como precursor Della Porta
(1535-1616). Centravam seu estudo na aparência externa do
indivíduo e na sua expressão corporal. Por meio da observação e
análise em visitas a reclusos, prática de necropsia, dentre outros,
apregoavam que a partir dos dados fisionômicos de uma pessoa
pode-se deduzir seus caracteres psíquicos. O primeiro passo era
fazer um “retrato do criminoso”, ou seja, homem que apresentava
pele pálida, cabelo longo, grandes orelhas e olhos pequenos.

Segue-se com Lavater (1741-1801) que escreve em 1776 A arte de


estudar a fisionomia na qual estuhda a craniometria.

Veja que para ele a natureza é pura fisionomia. Tudo que se


passa na alma de um homem é refletido em seu rosto e, como
conseqüência disso, a beleza ou feiúra são reflexos da bondade ou
maldade da pessoa.

O homem delinqüente tem maldade natural, nariz


oblíquo, não tem a barba pontiaguda, tem a palavra
negligente, olhos grandes e ferozes, sempre raivosos,
brilhantes, as pálpebras abertas, círculos de um
vermelho sombrio a rodear a pupila, uma lágrima
colocada nos ângulos interiores, etc. Pode-se dizer, na
verdade, que Lavater foi o precursor de Lombroso na
tese do criminoso nato.

Adepto dessa corrente, Marques de Moscardi, um juiz


napolitano, escreveu seu Edito de Valério (édito = preceito,
decreto, lei) que prescrevia que “quando se tem dúvida entre
dois presumidos culpados, condena-se o mais feio”. A forma
processual do dispositivo da sentença era a seguinte: “ouvidas as

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Sociologia do Crime e da Violência

testemunhas de acusação e de defesa e visto o rosto e a cabeça do


acusado, condene-o”.

Penitenciaristas
A ciência penitenciária teve como pioneiros John Howard (1726-
1790), com a obra The state of prisions in England and Wales de
1777, e Bentham (1748-1832) com a obra Panóptico – prisão celular
de 1791.

No século XVIII, analisaram o sistema carcerário da Europa,


propondo a tese da reforma do delinqüente como fim prioritário
da Administração.
ELBERT, Carlos Alberto.
Carlos Albert Elbert, criminólogo argentino, menciona que Manual básico de
Howard teve grande influência na sanção de muitas leis e criminologia. Trad. Ney
regulamentações inglesas, que tendiam a uma melhora na Fayet Jr. Porto Alegre:
Ricardo Lenz, 2003. p. 44
preservação da saúde e situação carcerária dos presos. Na
realização de uma de suas idéias, a separação dos presos por sexo,
idade, condição e em razão da gravidade dos delitos cometidos,
conseguiu a individualização da pena na fase de execução, com a
introdução de celas individuais no sistema penitenciário. Em sua
obra O estado das prisões, conseguiu difundir suas análises críticas
por toda Europa, travando o início de uma luta por condições
mais humanas para os presos.

Carlos Elbert (2003, p.44) afirma que Benthan, por sua


vez, exerceu grande influência na reforma penal inglesa do
século XIX e em outras legislações, como a francesa por
exemplo. Sua principal obra é teórica, contudo, a criação do
Panóptico – que consistia na construção de penitenciárias com
um centro de controle para observação sobre todas alas dos
pavilhões, semelhante a uma roda de carro – foi que alcançou
universalidade.

Benthan, atribuindo um fim utilitarista ao castigo,


justifica que a razão da existência da pena e do
cárcere é a sua função de transformação do indivíduo
criminoso.

Ainda, segundo o criminólogo argentino acima citado, é um dos


utilitaristas mais representativos ao defender que a concepção da

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Universidade do Sul de Santa Catarina

pena, para justificar-se, deve ter uma finalidade útil (ELBERT,


2003, p. 45.).

Frenologistas
Os frenologistas estudaram as diversas faculdades ou disposições
inatas do indivíduo fundados na conformação e protuberâncias
do crânio. Tentaram explicar o comportamento humano pela
malformação cerebral.

Franz Joseph Gall (1758-1828) estudou as protuberâncias e


depressões cranianas e as relações com certos atos humanos.
Acreditou que cada ponto cerebral que localizou é causador de
um tipo de crime: homicídio, patrimonial, de sentido moral, etc.

Spurzheim (1776-1832), discípulo de Gall, por sua vez, traça uma


carta craneoscópica – imitando as geográficas. Difundiu
na Inglaterra a obra de Gall, sustentando que diversas
enfermidades mentais são afecções cerebrais.

Antropologistas
Com essa corrente de pensamento criminológico surge
a idéia de que o criminoso é uma variedade mórbida
da espécie humana. Lucas (1808-1885) enuncia o
conceito de atavismo, referindo que a tendência criminal
é hereditária e já se encontra presente no individuo desde o
momento de seu nascimento.

Gaspar Virgílio, dois anos antes de Lombroso, criou o conceito


de “criminoso nato”, após realizar um exame antropológico em
mais ou menos trezentos condenados, quando analisou anomalias
congênitas, estigmas corporais e enfermidades orgânicas, em
especial no sistema nervoso.

Darwin (1809-1882) concebe o criminoso como espécie atávica e


não-evolucionada. Três de suas teses, num dado momento, foram
acolhidas pela Escola Positiva:

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Sociologia do Crime e da Violência

a concepção do delinqüente como espécie atávica, não-


evolucionada; a máxima significação concedida à carga ou ao
legado que um indivíduo recebe por meio da hereditariedade; e
uma nova imagem do ser humano, privado da importância e do
protagonismo que lhe conferira o mundo clássico.
MOLINA, Antonio García-
Pablos; GOMES, Luiz Flávio.
Escola Cartográfica Criminologia: introdução
a seus fundamentos
Essa escola também é conhecida como Estatística Moral, tem teóricos, introdução às
Quetelet como seu principal autor (1796-1874). São precursores bases criminológicas
do positivismo sociológico e do método estatístico. da Lei 9.099/95 – Lei
dos Juizados Especiais
Essa escola concebe o delito como “fenômeno coletivo e fato Criminais. 3 ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais,
social – regular e normal – regido por leis naturais, como
2000. p. 169.
qualquer outro acontecimento”, devendo ser submetido a uma
análise quantitativa. O crime é um fenômeno social, de massas, e
não um evento individual, pois cada sociedade tem uma taxa de
criminalidade anual tão inevitável como a taxa de nascimentos
e falecimentos. Defende que o “único método adequado para a
investigação do crime como fenômeno social e sua magnitude é o
método estatístico.

SEÇÃO 2 - Momento semicientífico da criminologia


Na seção anterior você estudou as escolas que pertencem ao
momento científico, nesta seção você vai ter a oportunidade
de ver quais são as escolas que correspondem ao período, ou
momento “semicientífico”, da história. Vamos lá?

A antropologia de Lombroso
Cesare Lombroso (1835-1909) inicia, com sua principal
obra L’uomo delinquente, a fase que chamou de científica da
criminologia, entretanto, numa classificação mais atual,
foi denominada como etapa semicientífica.

Lombroso tem seu interesse científico centrado nas taras


genéticas hereditárias ou congênitas, após repetidamente
observar loucos e criminosos perturbados, o que o levou a
concluir, gradativamente, que existia uma relação de caráter

Unidade 1 21

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Universidade do Sul de Santa Catarina

biológico entre a degeneração e os instintos perversos ou


destrutivos (ELBERT, 2003, p. 55).

Estabeleceu uma antropologia criminal focando sua atenção em


perfis somáticos e biológicos do indivíduo criminoso, chegando a
convencer-se de que a degeneração e a não-evolução se encaixam
de tal forma que, em cada criminoso, pode-se identificar um
Importante consignar Carlos A. bom número de sinais degenerativos, como a relação peso-altura,
Elbert ao referir: “Não obstante, capacidade craniana ou características externas como a visão
parece incompreensível que um estrábica, orelhas grandes, assimetrias, lábios leporinos, verrugas,
observador sério e consciencioso dentre outros (ELBERT, 2003, p. 55-56.)
como Lombroso tenha agido
tão precipitadamente, quando
Ao autopsiar Villela, assaltante calabrês, verifica que esse tem
acreditou ter descoberto uma
deformação cerebral congênita no
uma fossa occipital igual ao dos vertebrados superiores, mas
crânio de um famoso delinqüente diferente do homo sapiens – aplicando a teoria da degeneração de
em que realizou autópsia. Este Morel – atavismo.
“achado” de uma fosseta occpital
média, que não era encontrada Veja que mais tarde, ao examinar crimes de sangue cometidos
em crânios normais, o induziu ao pelo soldado Misdea, constata que o ataque epiléptico que
erro essencial de generalizá-la,
causa convulsões poderia ser substituído por impulsos violentos.
atribuindo-lhe razão de ser da
conduta delinqüente. Associou
Assim se lançam as bases para a sua teoria básica – atavismo
o aumento de tamanho da –, degeneração pela doença, criminoso nato, com certas
parte média do cerebelo (muito características: fronte fugidia, assimetria do rosto, cara larga e
desenvolvida em roedores e chata, grande desenvolvimento das maçãs do rosto, lábios finos,
macacos) ao atavismo, como forma
canhoto, cabelos abundantes, barba rala; ladrões com olhar
regressiva do homem a etapas de
sua genealogia primitiva (ELBERT,
errante, móvel e oblíquo; assassinos com olhar duro, vítreo,
2003, p. 56). injetado de sangue.

Para Lombroso “o delinqüente nato era uma


subespécie humana diferente, por suas características,
da morfologia do homem honrado”. (ELBERT, 2003, p.
56.)

O mundo circundante era motivo desencadeador de uma


predisposição inata, própria do sujeito em referência. Ele não
nega os fatores exógenos, apenas afirma que esses só servem
como desencadeadores dos fatores clínicos.

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Sociologia do Crime e da Violência

“O certo é que, em O homem delinqüente, Lombroso lança


afirmações tão erradas quanto espetaculares.” (ELBERT, 2003,
p. 56).

Pode-se destacar como principais fundamentos da tese


lombrosiana:

„ o crime é um fenômeno biológico e não um ente


jurídico. Por essa razão o método que deve ser
utilizado para o seu estudo é o experimental
(indutivo);
„ o criminoso é um ser atávico e representa a regressão
do homem ao primitivismo. É um selvagem que já
nasce delinqüente;
„ o criminoso nato tem como características biológicas
assimetria craniana, fronte fugidia, é canhoto, tem
cabelos abundantes e barba rala; e
DIAS, Jorge de Figueiredo;
„ a causa da degeneração que conduz ao nascimento do
ANDRADE, Manuel da
criminoso é a epilepsia, que ataca os centros nervosos. Costa. Criminologia: o
homem delinqüente e a
sociedade criminógena.
Apesar da criminologia lombrosiana estar bastante ultrapassada Coimbra: Coimbra Editora,
na atualidade, não se pode olvidar sua importância para o início 1992. p. 11.
de uma criminologia científica, conforme ressaltou Figueiredo
Dias ao destacar que, nesse período, “Independentemente da
validade intrínseca das suas hipóteses explicativas – muitas delas
parecendo hoje, pelo menos, bizarras –, a verdade é que tal escola
representou um salto qualitativo no tratamento do crime. Com
ela nasceu a criminologia científica, como disciplina construída
segundo os métodos e os instrumentos das ‘verdadeiras’ ciências”.

Cabe aqui ressaltar, em que pese já se ter chegado


ao século XXI, “podemos afirmar que ainda está
muito arraigada no saber cotidiano a idéia de que o
delinqüente é um enfermo que deve ser tratado, ou
eliminado, segundo as circunstâncias.” (ELBERT, 2003,
p. 57).

E, ainda, em que pese toda crítica sofrida muito há de


lombrosiano em nosso sistema penal, conforme consigna Carlos
Alberto Elbert (2003) que “são usuais até hoje as classificações

Unidade 1 23

sociologia_do_crime.indb 23 10/12/2007 10:10:45


Universidade do Sul de Santa Catarina

de delinqüentes, de cunho lombrosiano, que seguem sendo


utilizadas nas polícias e serviços penitenciários, cujas academias
de formação ensinam visões de fenômeno criminal marcadamente
influenciadas por idéias positivistas.”

Vertente sociológica
A obra Sociologia criminal de Ferri surgiu em 1892 – sendo
que a primeira edição datava de 1880 –, acredita-se ter sido o
antecedente jurídico mais importante, um marco de uma ciência
jurídica, de conhecimentos e classificações que derivam do campo
antropológico e médico, contrapondo-se à chamada Escola
Clássica (ELBERT, 2003, p. 54.).

Ferri (1856-1929) lançou sua crítica aos clássicos ao pronunciar


que “o livre arbítrio é uma mera ficção” e defender que “o crime é
um efeito de causas múltiplas”. Veja algumas indicações:

a) antropológicas – sexo, idade, estado civil, classe social;


b) físicas – raça, clima, fertilidade do solo, temperatura
(homicídios predominam nos países quentes, furtos
nos países frios); e
c) sociais – as migrações, a vida política, a opinião
pública, a família, a religião, a educação, etc.

Nessa corrente houve a reclassificação dos criminosos:

a) nato, conforme Lombroso;


b) louco, portador de anomalia mental;
c) habitual, produto do meio;
d) ocasional, levado ao cometimento do crime por
circunstância;
e) passional, age pela emoção; e
f) culposos, categoria criada na 5ª edição de seu livro.

24

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Sociologia do Crime e da Violência

A Escola de Lyon e as teorias ambientais


Tem como precursores Gabriel Tarde (1843-1904) e Alejandro
Lacassagne (1843-1924), médico e biólogo e fundadores da
Escola Sociológica Francesa.

Lacassagne se contrapôs à tese de Lombroso, criando


uma autêntica união sociobiológica, segundo a qual o
indivíduo é um micróbio inocente até se deparar com
um meio ambiente próprio, ao qual denominou como
caldo de cultura, encontrando que lhe autorizam a se
transformar em um criminoso. (ELBERT, 2003, p. 54).

Para ele o delinqüente é inseparável de seu caldo e de sua cultura,


do meio social em que se desenvolve. A sociedade é quem cria
o criminoso, tendo a miséria fator preponderante da grande
quantidade de delinqüentes, advogando, ainda, “que as sociedades
se aperfeiçoem, melhorem a sorte dos humildes e dos pequenos e
farão diminuir o crime” (DIAS; ANDRADE, 1992, p. 24).

Gabriel Tarde, por sua vez, tem como um dos temas centrais de
sua obra a mudança da fenomenologia criminal em decorrência
das transformações sociais e da sucessão dos tipos de sociedade.
Não aceitou a tese de Durkheim da normalidade do crime. Sendo
o crime um fato social, o crime é ao mesmo tempo um fato anti-
social: “na mesma medida, argumenta, em que um cancro não
deixa de condenar à morte um organismo pelo fato de participar
da sua vida.” (DIAS; ANDRADE, 1992, p. 25).

Mais tarde criou, ainda, a teoria da imitação segundo a qual


um homem imita o outro na proporção direta ao contato que
mantém entre si, sendo que essa imitação funciona de cima para
baixo – do pai para o filho, do superior para o subordinado, do
nobre para o plebeu, do urbano para o rural. Assim, sempre que
haja contato social maléfico haverá a criminalidade latente. De
certa forma antecipou um dos postulados das teses da associação
diferencial de Sutherland (DIAS; ANDRADE, 1992, p. 25).

Unidade 1 25

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Universidade do Sul de Santa Catarina

A Escola Sociológica Alemã (Escola de Marburgo ou Jovem Escola de


Política Criminal)
Franz Von Liszt (1851-1919) foi o fundador dessa escola,
juntamente com Prins e Van Hamel da Associação Internacional
de Criminalística.

Distante das lutas de escolas objetivava destacar a necessidade,


para o criminalista, “de investigações sociológicas e
antropológicas, tomando como tarefa comum ‘a investigação’
científica do crime, de suas causas e dos meios para combatê-
lo”.(MOLINA; GOMES, 2000, p. 192).

Carlos Alberto Elbert refere que o maior esforço de Von Liszt


concentrou-se na luta por um “equilíbrio integrador entre Direito
Penal e Criminologia, podendo-se dizer que, naquele momento
de sua vida, estava localizado em uma zona intermediária ou
eclética entre ambas disciplinas.” (ELBERT, 2003, p. 62).

Von Liszt foi mais pragmático que teórico e centrou suas atenções
para “obter conhecimentos úteis para melhorar a práxis das
ciências penais, integradas em uma colaboração harmônica, além
das disputas teóricas em curso” (ELBERT, 2003, p. 62).
Análise científica da realidade criminal, dirigida à busca das causas do
crime, em lugar de uma contemplação filosófica ou jurídica desse, pois a
ótica jurídica, dogmática, é complementária, porém não substitutiva da
empírica; desdramatização e relativização do problema do livre-arbítrio,
o que conduz a um dualismo penal que compatibiliza as penas e as
medidas de segurança, baseadas, respectivamente, na culpabilidade e na
periculosidade; a defesa social apresenta-se como objetivo prioritário da
função penal, embora se acentue a importância da prevenção especial
(MOLINA; GOMES, 2000, p. 193).

Von Liszt defendeu, ainda, a necessidade de estabelecer


simultaneamente penas e medidas de segurança, ao invés de
substituir as penas por tratamentos. Contestou severamente
os teóricos retribucionistas da pena, defendendo que deveria
ter “uma finalidade útil, preventiva, mas com uma incidência
terapêutica dirigida, especialmente em favor do criminoso, ou
seja, o que veio a se denominar função especial-preventiva”
(ELBERTE, 2003, p. 62).

26

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Sociologia do Crime e da Violência

Período humanitário
O período humanista tem como precursor Marques de
Beccaria – Cesar Bonesana (1764) – com a obra Dos
delitos e das penas, inspirado em Montesquieu e
Rosseau – Contratualismo e Racionalismo.

Veja em que constituem suas principais idéias:

a) só as leis podem fixar as penas,


não sendo permitido ao juiz aplicar
sanções arbitrariamente;
b) fim das penas de morte e das sanções cruéis;
c) as leis devem ser simples, conhecidas pelo povo e
obedecidas por todos os cidadãos;
d) devem ser admitidas em juízo todas as provas,
inclusive a palavra dos condenados (mortos civis) e das
mulheres;
e) fim do confisco e das penas infamantes que recaem
sobre a família do condenado.

Não se permite o testemunho secreto, a tortura para o


interrogatório e os Juízos de Deus que não levam à verdade.
(BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Trad. Torrieri
Guimarães. São Paulo: Hemuns, 1983).

A Escola Clássica
As idéias fundamentais se baseiam no Iluminismo. Tem como
precursor Beccaria e seus principais sucessores: Carrara, com a
obra Programa di diritto criminale (1859), e Feurbach, com Tratado
sobre a gênese do Direito Penal (1801).

Veja as idéias básicas (MOLINA; GOMES, 2000, p. 160-161):

a) o crime é um ente jurídico, o que significa dizer que o


crime é a violação do direito como exigência racional
(e não como norma do direito positivo);

Unidade 1 27

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Universidade do Sul de Santa Catarina

b) a responsabilidade penal é fundada no livre-arbítrio,


sendo a liberdade de querer um axioma fundamental
para o sistema punitivo;
c) a pena é a retribuição jurídica e o restabelecimento da
ordem externa violada pelo direito; e
d) o método é lógico-abstrato, já que se trata de uma
ciência jurídica e não-experimental (método dedutivo).

SEÇÃO 3 - Momento científico da criminologia


Acompanhe, a seguir, o que corresponde ao momento científico
da criminologia. Veja quais são as escolas que pertencem a esse
período.

A Escola Positivista
As idéias fundamentais da Criminologia Positivista se baseiam
no experimentalismo positivista de Augusto Comte (Filosofia),
no evolucionismo de Darwin e Lamarck. Tem como principais
nomes: Lombroso, com a obra L’uomo delinquente, de 1876;
Enrico Ferri, com a obra Sociologia criminal, datada de 1880; e
Garófalo, com a obra Delito natural.

Garófalo (1852-1834) cria o conceito de delito natural como


sendo “a violação daqueles sentimentos altruístas – piedade e
probidade – que se encontram como medida em toda sociedade.”
Defensor impiedoso da pena de morte como mecanismo de
seleção artificial da raça criminosa – “darwinismo social”.

Ferri, aperfeiçoando as idéias de Lombroso, classifica os


criminosos em cinco categorias:

1) nato (conforme Lombroso);


2) louco (portador de doença mental);
3) ocasional (indivíduo sem firmeza de caráter e versátil
na prática do crime);
4) habitual (produto do meio social);
5) passional (homem honesto, mas nervoso e de
sensibilidade exagerada).

28

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Sociologia do Crime e da Violência

Veja, a seguir, os princípios básicos do Positivismo:

„ o crime é um fenômeno natural e social sujeito às


influências do meio e de múltiplos fatores, exigindo o
estudo pelo método experimental;
„ a responsabilidade penal é de responsabilidade social
por viver o criminoso em sociedade, e tem por base a
periculosidade;
„ a pena é a medida de defesa social, visando a
recuperação do criminoso ou a sua neutralização; e
„ criminoso é sempre psicologicamente um anormal,
temporária ou permanentemente.

Esta foi uma breve análise que teve por finalidade situar você no
contexto das teorias que definem ou redefinem o ser humano na
sociedade diante da “Sociologia do Crime, ou da Criminologia”.

- Realize, a seguir, as atividades de auto-avaliação, leia a síntese da


unidade e procure aprofundar seus conhecimentos no item Saiba mais,
para depois começar o estudo da Unidade 2.

Atividades de auto-avaliação

1) Primeiramente você deverá identificar em dois jornais, um de


circulação local, e outro, de circulação nacional, notícias relacionadas a
crimes. A partir daí, recorte e aponte como o criminoso é descrito? Você
reconhece alguma das escolas estudas na descrição do criminoso?

Unidade 1 29

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Síntese

Nessa primeira unidade você teve oportunidade de estudar os


diferentes momentos do estudo da criminologia.
Veja que cada uma das escolas estudada traz presente, um
entendimento do criminoso, os preconceitos sociais presentes na
sociedade.

É importante que você perceba, também, como esse é um


assunto que desperta interesse de vários estudiosos, e todas essas
escolas procuraram generalizações sobre os motivos que levam o
indivíduo a cometer um crime.

Saiba mais

Para aprofundar conhecimentos sobre os assuntos tratados você


poderá ler:

BISSOLI FILHO, Francisco. Estigmas da criminalização:


dos antecedentes à reincidência criminal. Florianópolis: Obra
Jurídica, 1998. 230 p.

FOUCAULT, Michel. Os anormais: curso no Collège de France


(1974-1975). Trad. Eduardo Brandão. São Paulo: Martins
Fontes, 2001. 479 p.

GOFFMAN, Erving. Estigma: notas sobre a manipulação da


identidade deteriorada. 4 ed. Rio de Janeiro: Guanabara, 1988.
158 p.

______. Manicômios, prisões e conventos. 6 ed. Trad. Dante


Moreira de Leite. São Paulo: Perspectiva, 1999. 312 p.

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2
UNIDADE 2

Modernas escolas sociológicas


da criminologia

Objetivos de aprendizagem
„ Analisar as contribuições da escola da Criminologia do
consenso
„ Compreender as contribuições da Escola da
Criminologia do Conflito

Seções de estudo
Seção 1 Criminologia do consenso.

Seção 2 Criminologia do conflito.

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Para início de estudo


Diante de atos criminosos, não raras vezes nos perguntamos o
que leva um indivíduo, ou um grupo a cometer tais ações, não é
mesmo?

Tentativas de responder essa pergunta é antiga, tal como vimos


na unidade anterior. Nesta unidade você terá a oportunidade de
estudar como algumas escolas sociológicas tentam responder a
essa questão.

- Vamos ao estudo? Faça as relações possíveis com sua prática.


Certamente sua leitura e análise terá mais significado.

SEÇÃO 1 - Criminologia do consenso


As correntes da Sociologia Criminal que serão estudas a seguir
– Escola de Chicago, Teoria da Associação Diferencial, Teoria
da Subcultura Delinqüente e Teoria da Anomia – fazem parte da
Sociologia do Consenso e prestam homenagem ao Positivismo,
porque partem do pressuposto que aceitava-se a ordem social
como um dado neutro e o criminoso alguém diferente do homem
normal.

A questão fundamental que pretendem responder é “por que


o criminoso comete crimes” e “por que o criminoso costuma e
continua a cometer crimes”.

A Escola de Chicago
Escola de Chicago: teoria ‘ecológica’ A Escola de Chicago é o berço da moderna Sociologia
e sociologia criminal urbana (Park; americana. Nela nasceram as teorias que vamos ver em seguida.
et al.). Outros modelos ‘espaciais’: Caracterizou-se por seu empirismo e por sua finalidade
estudos de áreas sociais e teoria
pragmática, isto é, pelo emprego da observação direta em
do defensible space (Newman).
(MOLINA; GOMES, 2000. p. 271-272). todas as investigações (da observação dos fatos são induzidas as
oportunas teses) e pela finalidade da prática a que se orientavam:
um diagnóstico confiável sobre os urgentes problemas sociais da
realidade norte-americana de seu tempo. Seus representantes
iniciais não eram sociólogos nem juristas, senão jornalistas,
predominando, em todo o caso, como setor de procedência, o
amplo espectro das ciências do espírito”

32

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Sociologia do Crime e da Violência

Apesar das divergências que separavam entre si as diferentes


escolas sociológicas americanas, havia de certa forma um
consenso entre elas: “o de que o crime representa uma forma
normal de adaptação individual ou coletiva às coordenadas da
estrutura social ou cultural” (DIAS; ANDRADE, 1992, p.
32), se contrapondo a um dos postulados positivistas, o de que
a responsabilidade penal é responsabilidade social, por viver o
criminoso em sociedade, tendo por base a periculosidade.

Para o Positivismo Criminológico, o infrator é um prisioneiro de


sua própria patologia (determinismo biológico) ou de processos
causas alheios ao mesmo (determinismo social): um ser escravo
de sua carga hereditária, enclausurado em si e separado dos
demais, que mira o passado e sabe, fatalmente escrito, seu futuro:
um animal selvagem e perigoso” (MOLINA; GOMES, 2000, p.
70).

Com o crescimento desenfreado da população, traduzido por


uma explosão demográfica historicamente coincidente com a
chegada de vários grupos de imigrantes, migração de negros e
grande industrialização, Chicago se desenvolveu de uma forma
desordenada e com ela surge uma criminalidade descontrolada,
vindo a deparar-se com problemas característicos dos guetos que
surgiram.

“Quando, no outono de 1892, surgiu a Universidade


de Chicago, a cidade tornara-se, juntamente
com Nova York e Filadélfia, uma das três maiores
cidades americanas, com uma assombrosa taxa de
crescimento: o povoado que contava com 4.470
habitantes no recenseamento de 1840, e representava
então a fronteira oeste dos Estados Unidos, tinha 1
milhão e cem mil, cinqüenta anos depois, em 1890, e
chegaria a ter cerca de 3 milhões e meio em 1930”.
Para saber mais consulte: COULON, Alain. A escola de
Chigado. Trad. Tomás R. Bueno. São Paulo: Papirus,
1995. p. 11 In: E. Burgess e C. Newccomb (Orgs.)
Census data of the city of Chicago. Chigaco: University
of Chicago Press, 1931. p. 5.

Unidade 2 33

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Universidade do Sul de Santa Catarina

O “...gueto deparava-se não só como criminógeno, mas também


como transmissor da cultura delinqüente que criava.” (DIAS;
ANDRADE, 1992. p. 35).

Você sabe como pode ser definido o termo


“desorganização social”?

Foi Willian Thomas que trouxe o conceito de desorganização


social, descrevendo como sendo o afrouxamento da influência das
regras sociais de conduta existentes sobre os membros individuais
do grupo (COULON, 1995. p. 34-35).

Acompanhe o que aconteceu na prática...

Os novos habitantes de Chicago, originados na sua maioria de


imigração e migração de negros, não conseguiam assimilar a
nova cultura do local, tampouco, logravam êxito em impor sua
cultura à nova sociedade em que estavam inseridos.

Perderam suas raízes, uma vez que se encontravam desgarrados


de seu grupo social, sua família, sua escola, seu local de trabalho.

Por meio dessa perda de raízes surge o pensamento de


que a quebra desses vínculos – que exerciam o papel do
controle informal da conduta criminógena –, é que origina a
criminalidade, que se transmite pelo contágio social.

Veja que o abandono das religiões que tinham sua base fundante
no cristianismo, que segundo Disraelli, proclamava o amor
ao próximo, na moderna sociedade formada em Chicago, não
mais existia, eis que o individualismo iniciava seu reino (DIAS;
ANDRADE, 1992, p. 269).

34

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Sociologia do Crime e da Violência

Park e Burgess foram os precursores da Escola de


Chicago, tendo como ponto fundamental para seu
estudo a divisão da cidade em cinco zonas: 1ª Zona:
central (onde concentrava a área de serviços); 2ª Zona:
de transição, onde se concentravam os pobres, negros
e imigrantes, sempre invadida pelo comércio da zona
central, zona dos bordéis, guetos, favelas, cortiços; 3ª
Zona: área residencial de trabalhadores; 4ª Zona: área
habitada pela classe média; 5ª Zona: habitada pelas
classes econômicas mais altas (DIAS; ANDRADE, 1992,
p. 275).

Com base nessa divisão Shaw e Mckay, com acesso aos registros
policiais, fizeram estudo de 60 mil casos individuais entre
1900/1940 (DIAS; ANDRADE, 1992, p. 276).

Observaram que quanto mais a zona se distanciava do eixo


central, menores eram os índices de criminalidade registrados. O
crime distribuía-se ecologicamente, obedecendo a uma tendência
gradual. Constataram que na segunda zona era a área em que
existiam maiores dados estatísticos de criminalidade, ou seja,
24,5 por 100 habitantes, enquanto que nas demais zonas o índice
era de 3,5 por 100 habitantes (DIAS; ANDRADE, 1992, p.
276).

Desse estudo surgiram os conceitos de “desorganização social” e


“tradição delinqüente”, sendo o primeiro a falta de códigos morais
e modelos de controle de conduta e o segundo a transmissão
aos jovens delinqüentes dos valores desviados, adquiridos pelos
pais (primeiros sinais aqui da teoria da subcultura delinqüente),
ou por meio de gangues, grupos delinqüentes que são o marco
inicial das carreiras criminosas por aprendizagem social (DIAS;
ANDRADE, 1992, p. 277).

Os elogios recebidos por essa escola foram em


razão da associação da teoria à prática, que gerou a
implementação de projetos urbanísticos reformistas,
bem como da mobilização das instituições locais,
como escola, grupos desportivos, igrejas, associações
de bairro, dentre outros.

Unidade 2 35

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Entretanto, críticas também houveram, sendo a principal delas


em função de que os resultados obtidos por meio da pesquisa
foram calcados nos dados oficiais, sendo ignorado por completo a
existência da cifra negra, que, se considerada, com certeza seriam
Augusto Thompson conceitua como constatados índices de criminalidade imensamente superiores aos
sendo a “brecha constatada entre os obtidos (DIAS; ANDRADE, 1992, p. 280).
crimes cometidos e os registrados”
(Quem são os criminosos? O crime e Foi ressaltado ainda o excessivo simplismo da análise realizada,
o criminoso: entes políticos. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 1998. p. 3
espécie de determinismo social, bem como a adoção de um
caráter de classe ao conceito de delito.

Teoria da associação diferencial


Essa corrente da criminologia teve início com a contribuição de
Edwin Sutherland, nos idos de 1924, fundada no pensamento de
Grabriel Tarde, no século XIX. (ALBERGARIA, 1988).

Em contraposição ao Positivismo, que centrava sua análise no


perfil biológico do criminoso, essa teoria parte do pressuposto
que o comportamento criminoso é um comportamento
aprendido. O crime não é herdado, nem gerado por si próprio. O
homem aprende as condutas desviadas e associa-se com referência
nela.

Edwin Sutherland expôs a sua teoria por meio de várias


proposições (ALBERGARIA, 1988, p. 124-125). Vamos
conhecê-las?

1º) O comportamento criminoso é aprendido, não é


hereditário.
2º) O comportamento criminoso é aprendido por meio de
um processo de interação (comunicação).
3º) É aprendido no grupo.
4º) O comportamento criminoso compreende a
aprendizagem de técnicas do crime e orientação de
tendências de móveis e atitudes.
5º) Essa orientação é função da interpretação favorável ou
desfavorável das normas legais, o que dá o conflito de
cultura.

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Sociologia do Crime e da Violência

6º) Um indivíduo torna-se criminoso quando a


interpretação desfavorável prevalece sobre a
interpretação favorável. O indivíduo se encontra em
contato com modelos criminais e não-criminosos.
7º) A associação diferencial varia em freqüência, duração,
anterioridade e interioridade.
8º) A formação criminal põe em jogo os mesmos
mecanismos de aprendizagem da formação não-
criminal.
9º) O comportamento criminal é a expressão de
necessidades e valores, mas não os explica, pois o
comportamento não-criminoso é a expressão dos
mesmos valores: o ladrão furta para ter dinheiro, o
honesto trabalha para ter dinheiro.

De acordo com Molina e Gomes, “... o comportamento delituoso


se aprende do mesmo modo que o indivíduo aprende também
outras condutas e atividades lícitas, em sua interação com pessoas
e grupos e mediante um complexo processo de comunicação.
O indivíduo aprende assim não só a conduta delitiva, senão
também os próprios valores criminais, as técnicas comissivas
e os mecanismos subjetivos de racionalização (justificação ou
autojustificação) do comportamento desviado.” (MOLINA;
GOMES, 2000, p. 306).

Em síntese, o pressuposto lógico da teoria da aprendizagem de


Sutherland consiste na idéia de organização social diferencial
que, por sua vez, conecta com as concepções do conflito social;
organização social diferencial significa, conforme o autor citado,
que no seio da comunidade existem de fato diversas associações
estruturadas em torno de distintos interesses e metas (MOLINA;
GOMES, 2000, p. 308).

Teoria da subcultura delinqüente


A Teoria da subcultura delinqüente funda-se na teoria de
Merton e destina-se à explicação da delinqüência juvenil.
(ALBERGARIA, 1988. p. 131).

Unidade 2 37

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Surge a partir da análise das sociedades chamadas complexas,


podendo ser traduzida, inicialmente, como uma cultura dentro da
cultura dominante.

É a existência de regras opostas ou divergentes às da cultura


dominante.

Para Cohen, a subcultura delinqüente, assim formada, traduz-


se em não-utilitária, pois nem sempre o produto do crime é
utilizado; maliciosa, pois um dos principais motivos que levam
os grupos subculturais a cometer crimes é o prazer em causar
a desconformidade em outras pessoas; e negativística, porque
o objetivo do cometimento do crime é demonstrar que são
avessos totais às normas e valores da cultura dominante (DIAS;
ANDRADE, 1992, p. 36 e 293).

Aparece como um produto de soluções coletivas das classes


sociais excluídas do consumo dos valores sociais, econômicos,
morais da classe dominante. Os menores da classe subcultural
por não possuírem em seu meio as condições para lograr êxito
e se destacarem perante os valores da classe média – que são
por ele internalizados –, acabam quase sempre fracassando e
sofrendo um julgamento negativo, o que os levaria a suprir os
problemas decorrentes de status, necessidades e frustrações a que
estão sujeitas as classes mais baixas, por meio do cometimento de
delitos (DIAS; ANDRADE, 1992, p. 293-295).

- Veja que há dessa forma um rechaço deliberado dos valores afetos à


classe dominante.

O grande mérito dessa teoria foi a análise de uma cultura de


grupo, coletiva, e não uma opção individual pelo crime. A Teoria
de Cohen, para a época, foi considerada progressista, o que, aliás,
gerou uma forte perseguição pelo Macarthismo.

Segundo Bobbio “Macarthismo é um termo de uso político


norte-americano. Indica a atitude de um anticomunista absoluto,
concretizada numa visão política maniquéia e numa verdadeira
e autêntica perseguição aos homens e instituições declarados
antiamericanos.. Historicamente, o Macarthismo representa
o auge da Guerra Fria na política interna dos Estados Unidos,
coincidindo com os anos 1950-1954, em que finda a trajetória
do senador republicano do Wisconsin, Joseph MacCarthy

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Sociologia do Crime e da Violência

(1907-1957)” (BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola;


PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política. 2 ed. Trad.
João Ferreira, Carmem C. Varriale e outros. Brasília: Editora
Universidade de Brasília, 1986. p. 725)

Gerou um melhor equacionamento, – não-criminal –, entre a


sociedade e os grupos como hippies, beatniks, chicanos, negros,
homossexuais, feministas, esquerdistas, vietniks (pacifistas
contrários à Guerra do Vietnam) e outras minorias do poder.

A grande crítica sofrida por essa teoria foi a análise exclusiva de


um determinado tipo e parcela da criminalidade, esquecendo-se
do todo (ALBERGARIA, 1988, p. 133).

Teoria da anomia
Durkhein, Merton, Cloward e Ohlin seguem com a
Teoria da anomia (ausência de normas) que radica a
explicação do crime no defasamento entre a estrutura
cultural e a estrutura social. A primeira impõe a todos
os cidadãos a prossecução dos mesmos fins e prescreve
para todos os mesmos meios legítimos. A segunda
reparte desigualmente as possibilidades de acesso a esses
meios e induz, por isso, o recurso a meios ilegítimos
(DIAS; ANDRADE, 1992, p. 36).

Noutros termos, pode ser considerada a réplica mais significativa


às teorias estruturais de cunho marxista. Distancia-se do modelo
clínico de interpretação do crime, por não interpretá-lo como
anomalia. Considera, pois, o crime como o resultado de um
normal funcionamento da sociedade.

São dois seus pontos principais (MOLINA; GOMES, 2000, p.


280). Vamos conhecê-los?

1º) A normalidade do crime: não é uma patologia. Surge


inevitavelmente ligado ao desenvolvimento do sistema social e a
fenômenos normais do cotidiano.

2º) A funcionalidade do crime: a existência do crime não pode


ser considerada um fato somente nocivo, posto que, ao contrário,
é funcional para a estabilidade e a mudança social. O anormal
não é a existência do delito, senão um súbito incremento ou
descenso dos números médios ou das taxas de criminalidade.

Unidade 2 39

sociologia_do_crime.indb 39 10/12/2007 10:10:47


Universidade do Sul de Santa Catarina

Refere que uma sociedade sem crimes é pouco desenvolvida,


monolítica, imóvel e primitiva. Esse súbito incremento da
criminalidade decorre da anomia que é um desmoronamento das
normas vigentes em dada sociedade que debilitam a consciência
coletiva (MOLINA; GOMES, p. 281).

Ao descrever a sociedade americana, Merton menciona-a como


uma sociedade que não oferece caminhos legais (oportunidades)
para ascender aos níveis de bem-estar desejados, será pressionada
para o cometimento de condutas irregulares.

Cloward e Ohlin sustentam que esse grau de desviação não é


igual na sociedade: é especialmente intensa no caso da juventude
e das classes sociais menos privilegiadas, extratos sociais que
estão mais sujeitos a tensões e pressões sociais decorrentes da
falta de perspectivas de ascensão na pirâmide social (MOLINA;
GOMES, p. 284).

Para Merton, aqueles que não conseguem resistir às tensões entre


cultura e estrutura social podem se desviar de quatro formas:

a) ritualismo – o ritualista é aquele incapaz de realizar os


objetivos valorados e renuncia a eles, mas continua conformando-
se com as regras prevalecentes que regem o trabalho e o esforço;

b) retraimento – ao contrário do ritualista que renuncia aos


fins culturais e sociais, mas adere às normas, no retraimento
o indivíduo renuncia a ambos. É o total escape às regras de
convivência, há uma rejeição das metas culturais e dos meios
institucionalizados;

c) inovação – aqui o agente passa a usar técnicas novas para


atingir seus objetivos pessoais, ou seja, os bens morais, valorativos
e materiais que a sociedade coloca para serem consumidos. É a
delinqüência propriamente dita; e

d) rebelião – aqui há uma recusa total dos valores dominantes.

O indivíduo afasta-se do sistema social e cultural, que julga


injusto, para reconstruir sua sociedade com fins e normas
próprios (MOLINA; GOMES, 2000, p. 283-284).

- Veja, a seguir, a criminologia do conflito.

40

sociologia_do_crime.indb 40 10/12/2007 10:10:47


Sociologia do Crime e da Violência

SEÇÃO 2 - Criminologia do conflito


Também conhecida como Teoria do
etiquetamento, da rotulação, criminologia da
reação social, dentre outros, surgiu de uma forma
revolucionária ao pretender fornecer respostas a
um contexto social dentro do qual o crime se
insere, se contrapondo ao modelo de investigação
criminológica calcada no Positivismo, em que
estudava o comportamento criminoso, como se
sua qualidade criminal existisse objetivamente,
como se os tipos penais fossem neutros,
esquecendo-se que os mesmos são criados pelos
homens.

Surgiu nos anos 60, nos EUA, tendo como principais autores:
Beckers – Outsiders (1963), Lemert – Social pathology e Goffman
– Asylums (1961) (Manicômios, prisões e conventos). Foi o marco
inicial da Sociologia do Conflito na área da Criminologia.

Segundo Baratta, “para seu desenvolvimento contribuíram, de


diferentes modos, autores que podem ser classificados conforme
três direções da Sociologia Contemporânea: o Interacionismo
Simbólico (H. Becker, E. Goffman, J. Kituse, E,M. Lemert,
E.M. Shur, F. Sack); a Fenomenologia e a Etnometodologia (P.
Berger e T. Luckmann, A. Cicourel, H. Garfinkel, P. McHugh,
T.J. Scheff ).

Segundo o Interacionismo simbólico, a sociedade


– ou seja, a realidade social – é constituída por uma
infinidade de interações concretas entre indivíduos,
aos quais um processo de tipificação confere um
significado que se afasta das situações concretas e
continua a estende-se por meio da linguagem.

Também, segundo a Etnometodologia, a sociedade não é uma


realidade que se possa conhecer sobre o plano objetivo, mas o
produto de uma “construção social”, obtida graças a um processo
de definição e de tipificação por parte de indivíduos e grupos
diversos.

Unidade 2 41

sociologia_do_crime.indb 41 10/12/2007 10:10:47


Universidade do Sul de Santa Catarina

E, por conseqüência, segundo o Interacionismo e a


Etnometodologia, estudar a realidade social (por exemplo,
o desvio) significa, essencialmente, estudar esses processos,
partindo dos que são aplicados a simples comportamentos e
chegando até as construções mais complexas, como a própria
concepção da ordem social , K.F.(BARATTA, 1999, p. 92).

Contrariamente às escolas que surgiram no bojo da Sociologia


do Consenso, em que há um grande acesso das grandes massas
a cotas consideráveis de bem-estar social, com o conflito do
Vietnã, a campanha pelos direitos civis, o movimento hippie, a
luta dos estudantes e minorias negras convertem num fermento
de ruptura potencializador para o surgimento da Sociologia do
Conflito.

O Labeling caracteriza-se pelo relativismo jurídico


e moral, pela acentuação do pluralismo cultural e
pela manifesta simpatia para com as minorias mais
desclassificadas.

Provocou uma mudança drástica no objeto da investigação


criminológica: ao invés de se perguntar: “por que é que o
criminoso comete crimes?” – pergunta-se: “por que aquele
fato cometido pelo indivíduo fora selecionado como crime?”,
“por que é que algumas pessoas são tratadas como criminosos,
quais as conseqüências desse tratamento e qual a fonte da sua
legitimidade?”.

Segundo Becker,

...de alguma maneira, quando os sociólogos estudavam


o crime não compreendiam o problema dessa forma.
Em vez disso, aceitavam a noção de senso comum de
que havia algo de errado com os criminosos ou então
eles não agiriam daquela maneira. Perguntavam: ‘Por
que as pessoas entram no crime? Por que não param?
Como podemos pará-las?’ O estudo do crime perdeu sua
conexão com o curso do desenvolvimento sociológico e
se tornou uma deformação muito bizarra da Sociologia,
projetada para descobrir porque as pessoas estavam
fazendo coisas erradas em vez de descobrir a organização
da interação naquela esfera de vida. (BECKER, 1977, p.
21-22).

42

sociologia_do_crime.indb 42 10/12/2007 10:10:47


Sociologia do Crime e da Violência

Parte-se do princípio que a desviação não é uma qualidade


ontológica da ação, mas antes o resultado de uma reação social e
que o delinqüente apenas se distingue do homem normal devido
a estigmatização que sofre e introjeta dentro de si.

Daí que o tema central dessa perspectiva criminológica seja


precisamente o estudo do processo de interação, no termo do qual
um indivíduo é estigmatizado como delinqüente, introjeta dentro
de si esse estereótipo criado pela sociedade e acaba reagindo à
forma com que o outro lhe vê.

Figueiredo Dias e Manuel da Costa Andrade enumeram alguns


conceitos elaborados pela teoria, tais como: ...identidade (‘self ’),
auto-image, outros significantes, audiência social, profecia-que-
a-si-mesma-se-cumpre, moral crusaders (moral entrepreneurs),
conceitos adscritícios, delinqüência potencial. Para além desses,
sobressaem ainda conceitos como: estereótipo, interpretação
retrospectiva, negociação, delinqüência secundária, cerimônias
degradantes, instituições totais e role-engulfment (DIAS;
ANDRADE, 1992. p. 347).

Conheça como se configuram esses conceitos.

a) Identidade (‘self ’) – o labeling approach não aceitou o


pensamento determinista e os modelos estruturais e estáticos, não
só em relação à abordagem do comportamento como, também,
no que concerne à compreensão da própria identidade individual.

Para essa teoria, “a identidade, o self, não é um dado, uma


estrutura sobre a qual actuam [sic] as ‘causas’ endógenas ou
exógenas, mas algo que se vai adquirindo e modelando ao longo
do processo de interacção [sic] entre o sujeito e os outros”.
(DIAS; ANDRADE, 1992, p. 50).

b) A “Deviance” – ou delinqüência primária, é poligenética e


devida a uma variedade de fatores culturais, sociais, psicológicos
e sociológicos, contudo, a teoria não tem como fundamento
a explicação da desviação primária, mas sim, tenta oferecer
respostas e questiona os fatores que levam a uma desviação
secundária.

Unidade 2 43

sociologia_do_crime.indb 43 10/12/2007 10:10:48


Universidade do Sul de Santa Catarina

c) Já, a “deviance” – ou delinqüência secundária, traduz-se


numa resposta de adaptação aos problemas ocasionados pela
reação social à desviação primária. Teoria do estigma ou etiqueta.

Trata-se fundamentalmente de problemas sociais provocados


pela estigmatização, punição, segregação e controlo social, fatos
que têm o efeito comum de diferenciar o ambiente simbólico
e interacional a que uma pessoa responde, comprometendo
drasticamente a sua socialização. Tais fatos convertem-se em
eventos centrais na existência de quem os experimenta, alterando
a sua estrutura psíquica, criando uma organização especial de
papéis sociais e de atitudes para consigo (DIAS; ANDRADE,
1992. p. 350).

d) Cerimônias degradantes – processos ritualizados a que


se submete o réu. Em conseqüência disso é despojado de sua
identidade, recebendo outra, degradada. O julgamento criminal
é uma das mais expressivas das cerimônias degradantes, contudo,
não é a única.

e) Instituição total – locais isolados de moradia que submetem


o indivíduo à reclusão com rotina diária, com administração
formal, mortificação, despersonalização, humilhações,
profanações do eu, etc.

f) Estigmas – segundo Goffman são marcas ou impressão


que desde os gregos eram empregadas como indicativo de uma
degenerescência: os estigmas do mal, da loucura, da doença. Na
Antiguidade Clássica, por meio do estigma procurava-se tornar
visível qualquer coisa de extraordinário, mau, sobre o status de
quem o apresentasse. O estigma “avisava” a existência de um
escravo, de um criminoso, de uma pessoa cujo contato deveria ser
evitado.

g) Estereótipos – são idéias ou convicções classificatórias


preconcebidas sobre alguém, resultantes de expectativas, hábitos
de julgamentos ou falsas generalizações (HOUAISS, Antônio;
VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da língua
portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. p. 1252).

44

sociologia_do_crime.indb 44 10/12/2007 10:10:48


Sociologia do Crime e da Violência

Para ser rotulada de criminosa, uma pessoa precisa somente (BECKER, Howard S. Uma
cometer uma infração criminosa, e isso é tudo a que o termo teoria da ação coletiva.
Trad. Márcia Bandeira
formalmente se refere. Entretanto, a palavra traz várias de Mello Leite Nunes.
conotações que especificam traços auxiliares característicos de Rio de Janeiro: Zahar
qualquer portador do rótulo. Presume-se que um homem que Editores1977. p. 79-80)
tenha sido condenado como arrombador e, portanto, rotulado Ou seja, eles não podem
como criminoso, é provavelmente uma pessoa que arrombará ou, ainda, segundo a
definição de Feest e
outras casas; a polícia, ao prender infratores conhecidos para Blankenburg, “sistemas
investigação, após um crime haver sido cometido, opera com base de representações,
nessa premissa. Além disso, considera-se que ele provavelmente parcialmente
cometeu outros tipos de crimes também, porque mostrou ser uma inconscientes e
pessoa sem “respeito pela lei”. grandemente
contraditórias entre si,
que orientam as pessoas
na sua actividade [sic]
h) Audiências sociais – a que estão submetidas as pessoas que quotidiana”. (DIAS;
ANDRADE, 1992, p. 348).
cometem crimes.

Tratar uma pessoa como se ela fosse desviante em geral, e não


especificamente, produz uma profecia que se auto-realiza. Ela
coloca em movimento vários mecanismos que conspiram para
moldar o indivíduo segundo a imagem que as pessoas têm dele.
Em primeiro lugar, uma pessoa tende a ser excluída, depois
de identificada como desviante, da participação em grupos
mais convencionais, mesmo que as conseqüências específicas
da atividade desviante particular não pudessem nunca, por si
próprias, ter causado o isolamento, não fosse o conhecimento e a
reação públicos a ela. (BECKER, Howard S. Uma teoria da ação
coletiva. Trad. Márcia Bandeira de Mello Leite Nunes. Rio de
Janeiro: Zahar Editores, 1977. p. 80-81).

Com toda a restrição de contatos a que acaba sendo submetida


a pessoa considerada como delinqüente – principalmente
quando acaba sendo segregada –, ajuda a conservar estereótipos
antagônicos, pois, “Desenvolvem-se dois mundos sociais e
culturais diferentes, que caminham juntos com pontos de contato
oficial, mas com pouca interpenetração”. (GOFFMAN, 1999. p.
20).

Unidade 2 45

sociologia_do_crime.indb 45 10/12/2007 10:10:48


Universidade do Sul de Santa Catarina

i) Profecia-que-a-si-mesma-se-cumpre – na compreensão do
modelo explicativo do labeling, que pretende identificar os fatores
que levam a uma “estigmatização com sucesso”, acaba-se por
identificar o que há de mais perverso no sistema criminal ao qual
o indivíduo é inserido, ou seja, a questão da introjeção dentro de
si da figura do delinqüente. É que ele próprio acaba por se achar
delinqüente a partir da construção de sua nova auto-imagem
e, a partir daí, acaba reagindo do modo com que o outro lhe
vê, ou seja, assimila, introjeta e assume dentro de si a figura do
delinqüente, dando uma resposta às audiências sociais, por isso, é
uma profecia que a si mesmo se cumpre.

Sobre isso Becker escreve:

“Tratar uma pessoa como se ela não fosse, afinal, mais do


que um delinqüente, tem o efeito de uma profecia-que-a-
si-mesma-se-cumpre. Põe em movimento um conjunto de
mecanismos que compelem a pessoa a conformar-se e a
corresponder à imagem que o público tem dela. Quando
o desviante é apanhado, é tratado de harmonia como
diagnóstico vulgar. E é o tratamento que provavelmente
provocará uma aumento da delinqüência”. (DIAS;
ANDRADE, 1992, p. 352).

j) Role-engulfment ou carreira criminal – surge como


conseqüência que a interação e a auto-imagem provocam “a
conformação às expectativas estereotipadas da sociedade, a auto-
representação como delinqüente” e tendem a polarizar-se em
torno do papel desviante e que na maioria das vezes acaba por ser
irreversível (DIAS; ANDRADE, 1992, p. 353).

O legado científico deixado pelo labeling, em primeiro lugar,


foi a acentuação da multidisciplinariedade, para a análise e o
estudo da criminalidade, com “...o alargamento considerável do
criminologicamente relevante” (DIAS; ANDRADE, 1992, p.
355).

“Será ocioso sublinhar a originalidade e a validade do contributo


científico do labeling approach, numa perspectiva de compreensão
global do problema criminal” (DIAS; ANDRADE, 1992, p.
355).

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sociologia_do_crime.indb 46 10/12/2007 10:10:48


Sociologia do Crime e da Violência

E, num “...segundo lugar, a primeira tentativa sistemática do


que designamos por sociologia da sociedade punitiva; deve-
se-lhe, em terceiro lugar, a introdução de novas técnicas de
investigação e de uma nova linguagem, bem como a descoberta
de novas variáveis criminógenas; e deve-se-lhe, por último, o ter
provocado uma das revoluções mais profundas no pensamento
político-criminal” (DIAS; ANDRADE, 1992, p. 355).

No campo político-criminal aconselha prudente não-intervenção


(última ratio), fomentou movimentos de descriminalização e
defendeu a não-intervenção radical.

Contudo, sofreu várias críticas. Veja quais são.

Uma das principais críticas sofridas pela teoria foi a de que não
explica a primeira desviação, mas somente a secundária. Ignora,
pois, as causas primeiras da criminalidade. Criou-se, ademais,
um certo determinismo de reação social.

A teoria, bastante rudimentar, não pretendia explicar porque


as pessoas roubavam bancos, mas sim como o ato de roubar
bancos veio a ter a qualidade de ser um ato desviante. A teoria
sugeria que você tinha que responder à segunda questão olhando
para o processo pelo qual as pessoas definem algumas ações
como ”ruins” a olhando para as conseqüências que tal definição
provoca. (BECKER, 1977. p. 23).

Ainda, “dum modo geral, tanto a teorização como a investigação


empírica inspiradas pelo labeling têm enfermado duma certa
ambivalência face às duas – em grande medida antagônicas
– vertentes fundamentais desta perspectiva: a interaccionista-
indeterminista, por um lado, e a estrutural-determinista, por
outro” (DIAS; ANDRADE, 1992, p. 355).

“O labeling assume um entono claramente antideterminista. O


indivíduo é visto como um ator que sofre a influência do papel
que representa, do cenário que o envolve e dos outros com que
interage, mas, simultaneamente, que a todos influencia”. (DIAS;
ANDRADE, 1992, p. 355)

É importante frisar que parte do livro que segue será


desenvolvida utilizando como marco teórico o labeling, mais
especificamente, o interacionismo simbólico.

Unidade 2 47

sociologia_do_crime.indb 47 10/12/2007 10:10:48


Universidade do Sul de Santa Catarina

A criminologia radical
O principal postulado da criminologia radical é negar a definição
de crime, pois, aceitá-la seria admitir que o direito é neutro.

A criminologia radical se preocupa em estudar os


sistemas de exploração existentes na sociedade
capitalista que interpõem a criminalidade, como
racismo, sexismo, imperialismo, dentre outros.
Use o espaço a seguir para destacar situações
correlatas a essa teoria. Faça seus registros com base
nos conhecimentos prévios. Depois, socialize com
seus colegas e tutor.

A criminologia radical intenciona realizar a defesa do homem


contra a sociedade de exploradores e não aceitar a ideologia da
defesa social como forma de defesa da sociedade contra o crime.
Postula que não é o criminoso que deve ser ressocializado, mas
a própria sociedade é quem deve ser transformada, ou, ainda,
em outras palavras, o indivíduo inserido no sistema penal,
numa sociedade capitalista, é, em verdade, vítima dessa própria
sociedade, ou seja, a sociedade é quem é a culpada.

Essa teoria define os operadores da justiça penal como


verdadeiros administradores da criminalidade, principalmente
no processo de seleção, porque não estão organizados para travar
uma luta contra o delito, mas, sim para selecionar e recrutar a
população desviada dentre as classes trabalhadoras oprimidas.
Segundo Juarez Cirino dos Santos tal classe é denominada pela
teoria marxista como lumpemproletariado.

48

sociologia_do_crime.indb 48 10/12/2007 10:10:48


Sociologia do Crime e da Violência

Tom Bottomore, utilizando partes do texto O


dezoito brumário de Luís Bonaparte, de Marx,
inicialmente extrai o conceito como sendo “o lixo
de todas as classes”, “uma massa desintegrada”,
que reunia “indivíduos arruinados e aventureiros
egressos da burguesia, vagabundos, soldados
desmobilizados, mal feitores recém-saídos da cadeia
(...) batedores de carteira, rufiões, mendigos”, etc.
E prossegue “o principal significado da expressão
lumpemproletariado não está tanto na referência a
qualquer grupo social específico que tenha papel
social e político importante, mas por ela chamar a
atenção para o fato de que, em condições extremas
de crise e de desintegração social em uma sociedade
capitalista, grande número de pessoas podem
separar-se de sua classe e vir a formar uma massa
‘desgovernada’, particularmente vulnerável às
ideologias e aos movimentos reacionários”.
Ver: BOTTOMORE, Tom. (Ed.) Dicionário do
pensamento marxista. Antonio Monteiro Guimarães
(Org.) Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1988. p. 223.

Vale assinalar que essa teoria será analisada com mais


profundidade no próximo capítulo ao, com fundamento nela,
tentar-se levantar alguns fatores que levariam ao cometimento
dos delitos contra o patrimônio. Tentar-se-á explicar as causa que
levariam à desviação primária desses delitos.

- Nesta unidade você estudou sobre as teorias criminológicas.


É importante que você faça sempre uma relação com as práticas
sociais, assim a teoria passa a ser compreendida de uma forma mais
contextualizada.

Siga agora para as demais atividades. Realize a auto-avaliação e faça


uma leitura da Síntese para guardar os termos-chave. Leia os textos
indicados no Saiba mais.

Unidade 2 49

sociologia_do_crime.indb 49 10/12/2007 10:10:48


Universidade do Sul de Santa Catarina

Atividades de auto-avaliação

1) Leia a notícia abaixo:

Terça, 22 de novembro de 2005, 21h01 Atualizada às 21h04

MS: jovem de 17 anos é presa por tráfico de drogas.

Uma jovem de 17 anos foi presa nesta segunda-feira por policiais da


Delegacia Especializada de Repressão ao Narcotráfico (Denar) na região
dos bairros Santo Eugênia e Jardim Tropical, em Campo Grande (MS).
Outras três pessoas foram detidas após denúncia de ação de traficantes
no local. A informação foi divulgada nesta terça-feira.

A polícia apreendeu R$ 178 em dinheiro, além de cinco porções de


maconha (17,4 gramas) e 34 porções de pasta-base de cocaína (14,6
gramas).

Um dos detidos, Manuel Raimundo Carneiro Matos, 38 anos, foi


apontado pela polícia como sendo o chefe da quadrilha e proprietário
do local conhecido como Boca do Viola. Ele tem várias passagens pela
polícia por furto e roubo e estava com mandado de prisão em aberto.

Agora, faça uma análise com base nas teorias de Merton.

50

sociologia_do_crime.indb 50 10/12/2007 10:10:49


Sociologia do Crime e da Violência

Síntese

As correntes da Sociologia Criminal estudadas foram a Escola de


Chicago, Teoria da Associação Diferencial, Teoria da Subcultura
Delinqüente e Teoria da Anomia que fazem parte da Sociologia
do Consenso e prestam homenagem ao Positivismo, porque
partem do pressuposto que aceitava-se a ordem social como um
dado neutro e o criminoso alguém diferente do homem normal.
A questão fundamental que se pretendeu responder foi “por que
o criminoso comete crimes” e “por que o criminoso costuma e
continua a cometer crimes”.

Minha sugestão é que aqui você registre os elementos mais


importantes desta unidade fazendo a própria síntese, o ajudará a
retomar os pontos centrais.

Saiba mais

Para aprofundar seus conhecimentos leia:

Teorias criminológicas sobre o problema do crime de Edison


Miguel da Silva Jr. Disponível em:
<www.juspuniendi.net/000.HTM>.

Acesse também o site “Scielo” Revista “Sociologias”. n.9. jan/jun,


2003. p. 370-377 e leia o artigo, disponível em PDF, intitulado
Espaço urbano e criminalidade: lições da Escola de Chicago.
Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/soc/n9/n9a14.pdf>.

Unidade 2 51

sociologia_do_crime.indb 51 10/12/2007 10:10:49


sociologia_do_crime.indb 52 10/12/2007 10:10:49
3
UNIDADE 3

O policiamento comunitário
como alternativa à Segurança
Pública

Objetivos de aprendizagem
„ Reconhecer a importância da comunidade
para a Segurança Pública e analisar o que é de
responsabilidade de todos na promoção do bem-estar
social.

Seções de estudo
Seção 1 Segurança: objetivo das pessoas e da
comunidade

Seção 2 Segurança Pública: direito e


responsabilidade de todos

sociologia_do_crime.indb 53 10/12/2007 10:10:49


Universidade do Sul de Santa Catarina

Para início de estudo


Até aqui você já avançou bastante, já teve contatos com teorias
e relacionou-as á prática cotidiana, não é mesmo? Então você
já teve a oportunidade de perceber que até bem pouco tempo
acreditava-se que a segurança pública era assunto exclusivo do
Estado. A própria polícia, como grande representante dessa
garantia, assumia na sua totalidade a responsabilidade pelos
problemas de segurança. A população, por sua vez, aguardava
ansiosamente por respostas rápidas e exigia constantemente a
multiplicação do efetivo policial.

Com o advento da Constituição Federal de 1988 a segurança


pública foi contemplada com um capítulo especial, afirmando
que a segurança pública é um dever do Estado, mas a
responsabilidade é de todos. A referida carta constitucional
representou um grande avanço em diversas questões sociais,
fazendo com que a sociedade despertasse, também, para vários
outros assuntos inerentes a sua qualidade de vida.

Você viu que a segurança pública, por sua vez, vem se tornando
a grande preocupação das pessoas, pois os problemas enfrentados
até então por metrópoles e grandes centros urbanos vem se
tornando uma realidade na vida de todo cidadão comum.

Diante disso, você estudou que a polícia vem procurando


desenvolver formas de conter o avanço da criminalidade, sendo a
filosofia de polícia comunitária a alternativa mais utilizada pelos
países desenvolvidos, entre eles os Estados Unidos, o Canadá
e o Japão. Tal filosofia tem por base a interação entre polícia e
comunidade como principal alicerce na resolução dos problemas
de segurança pública, sendo os Conselhos Comunitários de
Segurança (CONSEG) os órgãos responsáveis por organizar a
comunidade, auxiliar a polícia, promover programas educativos,
de informação e buscar melhores condições para a resolução dos
problemas locais de segurança, funcionando como um verdadeiro
fórum legítimo de reivindicações da comunidade.

54

sociologia_do_crime.indb 54 10/12/2007 10:10:49


Sociologia do Crime e da Violência

Não é novo para você também que o Estado, mesmo diante


de sua histórica limitação de oferecer condições dignas de
sobrevivência às pessoas, vem traçando verdadeiras batalhas para
frear a criminalidade. O cotidiano social, repleto de violências
de todo gênero, clama por mais proteção e sente na pele a
assustadora sensação de insegurança.

O enfraquecimento de instituições públicas e privadas tornou-se


uma constante, desarticulando, inclusive, as entidades formais
responsáveis pela segurança pública.

Com isso, urge a necessidade de mecanismos estratégicos


que satisfaçam a crise social de segurança, buscando,
fundamentalmente, a força e a união da sociedade civil
organizada.

O serviço de Segurança Pública vem sendo exercido


tradicionalmente pela figura do Estado: polícia, justiça e sistema
penitenciário. Porém sua atuação não pode ser limitada na esfera
pública, pois a sociedade, cada vez mais, detecta a deficiência
alarmante presente nas agências de controle da criminalidade. O
modelo atual, meramente repressivo, deixa clara a insuficiência da
ação estatal.

Assim, você verá nesta unidade que com o visível fracasso do


modelo tradicional-repressivo, várias polícias brasileiras passaram
a adotar a filosofia de polícia comunitária nas suas estratégias
de policiamento. Nesse contexto, os Conselhos Comunitários
de Segurança são os responsáveis por organizar a comunidade
e dela extrair informações que possam estabelecer prioridades,
contribuindo para que a polícia equacione metas e forneça
respostas adequadas ao problema.

- Vamos às seções, então?... Acompanhe o conteúdo e sempre que tiver


dificuldades procure saná-las para seguir a progressivamente na
construção de conceitos necessários à sua formação.

Unidade 3 55

sociologia_do_crime.indb 55 10/12/2007 10:10:49


Universidade do Sul de Santa Catarina

SEÇÃO 1 - Segurança: objetivo das pessoas e da


comunidade
Você percebeu que só ao estudar o tema “segurança” percebe-
se a complexidade que o envolve não é mesmo? No entanto,
paralelamente, urge a necessidade de compreender como
esse fenômeno age e se manifesta na vida humana, você não
concorda?

Veja o que dizem alguns autores:

PLÁCIDO E SILVA (1998, p.739) diz que segurança, qualquer


que seja a sua aplicação, insere o sentido de tornar a coisa livre de
perigos, livre de incertezas, assegurada de danos ou prejuízos, afastada
de todo o mal.

Já, para MOREIRA NETO (1989, p.353-354):

A segurança é uma condição existencial tanto dos


indivíduos quanto da sociedade. (...) A segurança é,
portanto, um conjunto de atividades que estabelecem
uma garantia a indivíduos, grupos, nações, Estados e
grupos de nações, contra tudo aquilo que ofereça perigo à
sua sobreexistência ou ao seu progresso.

A segurança, segundo OLIVEIRA (1998, p.20) é definida como


sendo “um sentimento, individual ou coletivo, de contenção de
riscos de toda ordem, que propicia ao ser humano a tranqüilidade
fundamental para produzir, descansar, divertir-se, enfim, viver a
plenitude da vida, sem receio de perigo iminente ou potencial a
preocupá-lo.”

No mesmo sentido CÂMARA (2001) ensina que:

Segurança é um sentimento. Resulta da percepção de


estímulos através dos sentidos que, levados ao cérebro, se
transformam em sensação e esta, por sua vez, sinaliza um
estado de espírito. Assim, um alerta é sempre disparado
ao ouvir um som assustador, ao perceber um odor de
queimado, ao degustar algo desagradável, ao avistar uma
situação arriscada ou tatear um objeto desconhecido. Daí
sentir-se inseguro, desprotegido, sujeito a situações de
risco pessoal ou de perigo, real ou imaginário.

56

sociologia_do_crime.indb 56 10/12/2007 10:10:49


Sociologia do Crime e da Violência

Analisando os conceitos dos autores você pode perceber que a


segurança é realmente um sentimento, tendo grande influência
nesse processo a percepção e as condições que o indivíduo elege
como sendo prioritárias para sua segurança, pois diante de uma
mesma situação uma pessoa pode visualizar grande perigo,
enquanto uma outra pode considerá-la completamente inofensiva.

A preocupação com a segurança confunde-se com a própria


história da humanidade. Desde os tempos mais remotos o ser
humano, ao seu modo e condizentes com a época, sempre buscou
formas de se proteger.

Paradoxalmente, apesar de ser um sentimento inerente ao


ser humano e até mesmo uma condição de tranqüilidade e
sobrevivência, a segurança é mais lembrada no momento em
que falta, situação essa que muitas vezes traz sérios danos físicos
e psicológicos, despertando cada vez mais a necessidade de se
pensar nesse tema.

Vamos aprofundar o conceito de Segurança Pública e


situá-la na legislação?

Veja o que dizem alguns autores e a Constituição Federal sobre


isso:

O autor DIAS NETO (1997, p.12) assim se posiciona acerca da


segurança pública: “Não há tema capaz de exercer tanto fascínio e
polarização quanto a segurança pública. Paradoxalmente, não há
tema mais deturpado e incompreendido”.

Diante de tal afirmação você pode perceber que falar em


segurança pública exige vasto conhecimento de uma gama de
outros assuntos que estão intrinsecamente relacionados, motivo
pelo qual se encontram, nos mais variados meios de comunicação
e no próprio seio social, idéias e conceitos antagônicos acerca
do tema, visivelmente sem sustentação e contraditórios na sua
essência.

Todavia, é importante reconhecer que a compreensão elementar


sobre a segurança pública encontram na Constituição Federal
(BRASIL, 1988), que dedicou um capítulo exclusivo ao tema,
definindo competências e elencando atribuições:

Unidade 3 57

sociologia_do_crime.indb 57 10/12/2007 10:10:49


Universidade do Sul de Santa Catarina

Art. 144 - A segurança pública, dever do Estado, direito e


responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem
pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através
dos seguintes órgãos:

I - polícia federal;
II - polícia rodoviária federal;
III - polícia ferroviária federal;
IV - polícias civis;
V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.
§1º - A polícia federal, instituída por lei como órgão
permanente, organizado e mantido pela União e
estruturado em carreira, destina-se a:
I - apurar infrações penais contra a ordem política e social
ou em detrimento de bens, serviços e interesses da
União ou de suas entidades autárquicas e empresas
públicas, assim como outras infrações cuja prática
tenha repercussão interestadual ou internacional e exija
repressão uniforme, segundo se dispuser em lei;
II - prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes
e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem
prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos
nas respectivas áreas de competência;
III - exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e
de fronteiras;
IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia
judiciária da União.
§ 2º - A polícia rodoviária federal, órgão permanente,
organizado e mantido pela União e estruturado em
carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento
ostensivo das rodovias federais.
§ 3º - A polícia ferroviária federal, órgão permanente,
organizado e mantido pela União e estruturado em
carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento
ostensivo das ferrovias federais.

58

sociologia_do_crime.indb 58 10/12/2007 10:10:49


Sociologia do Crime e da Violência

§ 4º - Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia


de carreira, incumbem, ressalvada a competência da
União, as funções de polícia judiciária e a apuração de
infrações penais, exceto as militares.
§ 5º - Às polícias militares cabem a polícia ostensiva
e a preservação da ordem pública; aos corpos de
bombeiros militares, além das atribuições definidas em
lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.
§ 6º - As polícias militares e corpos de bombeiros
militares, forças auxiliares e reserva do Exército,
subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos
Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos
Territórios.
§ 7º - A lei disciplinará a organização e o funcionamento
dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de
maneira a garantir a eficiência de suas atividades.
§ 8º - Os Municípios poderão constituir guardas
municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços
e instalações, conforme dispuser a lei.
§ 9º - A remuneração dos servidores policiais integrantes
dos órgãos relacionados neste artigo será fixada na
forma do § 4º do art. 39”.
Apesar do referido artigo não elencar de forma explícita outros
órgãos formais como responsáveis pela segurança pública, pode-
se dizer que também fazem parte desse sistema:

„ Poder Legislativo - responsável por formar as leis;


„ Ministério Público - representa o povo no
cumprimento da lei;
„ Poder Judiciário - julga o cumprimento da lei;
„ Sistema Prisional - cumprimento formal das penas.

É interessante você lembrar que, além da estrutura apresentada,


existem ainda as instâncias informais que também influenciam
de forma decisiva na segurança pública, como família, cultura,
escolas, clubes, religião, etc. Este assunto você estudou no Livro
de Introdução à Segurança Pública.

Unidade 3 59

sociologia_do_crime.indb 59 10/12/2007 10:10:49


Universidade do Sul de Santa Catarina

Veja um conceito estritamente jurídico sobre a segurança pública.


SANTIAGO (1993, p.4) a definindo como sendo:

O grau relativo de tranqüilidade que compete ao Estado


proporcionar ao cidadão garantindo-lhe os direitos de
locomoção, vida, propriedade e zelando pela manutenção
dos costumes e dos princípios de moral social. Ou, em
outras palavras, é a manifestação do poder do Estado
fundamentada na ordem jurídica, objetivando o exercício
da força na garantia do direito.

No mesmo sentido, CÂMARA (2001), por sua vez, enfatiza


que:

Segurança pública é uma atividade. Desenvolvida


pelo Estado, destina-se a empreender ações e oferecer
estímulos positivos para que os cidadãos possam conviver,
trabalhar, produzir e usufruir o lazer. As instituições
responsáveis por essa atividade atuam no sentido de
inibir, neutralizar ou reprimir a prática de atos anti-
sociais, assegurando a proteção coletiva e, por extensão,
dos bens e serviços públicos.

Acompanhe o que diz LAZZARINI (1999, p.21). Ele também


manifesta sua opinião de forma bastante legalista acerca do
assunto, entendendo que a segurança pública:

É o estado antidelitual, que resulta da observância dos


preceitos tutelados pelos códigos penais comuns e pela lei
de contravenções penais, com ações de polícia repressiva
ou preventiva típicas, afastando-se, assim, por meio de
organizações próprias, de todo o perigo, ou de todo o mal
que possa afetar a ordem pública em prejuízo da vida,
da liberdade ou dos direitos de propriedade das pessoas,
limitando as liberdades individuais, estabelecendo que a
liberdade de cada pessoa, mesmo em fazer aquilo que a lei
não lhe veda, não pode ir além da liberdade assegurada
aos demais, ofendendo-a.

Já, o MINISTÉRIO PÚBLICO (2001), (órgão discutido e


tratado no Livro de Introdução à Segurança Pública) entende
que não só o Estado, mas também a comunidade possui
responsabilidade na segurança pública, definindo-a como sendo:

60

sociologia_do_crime.indb 60 10/12/2007 10:10:49


Sociologia do Crime e da Violência

(...) uma atividade pertinente aos órgãos estatais e


à comunidade como um todo, realizada com o fito
de proteger a cidadania prevenindo e controlando
manifestações da criminalidade e da violência, efetivas ou
potenciais, garantindo o exercício pleno da cidadania nos
limites da lei.

Assim, pode-se afirmar que a segurança pública é uma atividade


que compete ao Estado proporcionar ao cidadão, porém de forma
integrada com a comunidade, não se podendo admitir a polícia
agindo unicamente de forma repressiva, mas sim buscando
conhecer o seu local de atuação e interagir com o público local,
resultando em uma segurança legitimada pela comunidade e
adequada com as suas necessidades como se verá mais adiante.

Você já estudou o que é Polícia Comunitária. Vamos


retomar alguma questão para situá-la nesta disciplina?

Você já percebeu que para que se possa compreender a segurança


pública como uma tarefa do Estado e da sociedade é fundamental o
entendimento da filosofia de polícia comunitária.

Então, vamos rever o que é Polícia comunitária?

Em uma primeira análise tem-se a impressão que a polícia


comunitária nada mais é do que uma outra instituição
policial. Trata-se, no entanto, de grave erro, uma vez que a
polícia comunitária é, nas palavras de TROJANOWICS e
BUCQUEROUX (1999, p.5):

(...) uma fi losofia e uma estratégia organizacional que


proporciona uma nova parceria entre a população e a
polícia. Baseia-se na premissa de que tanto a polícia
quanto a comunidade devem trabalhar juntas para
identificar, priorizar e resolver problemas contemporâneos
tais como crime, drogas, medo do crime, desordens
físicas e morais e, em geral, a decadência do bairro, com o
objetivo de melhorar a qualidade geral da vida na área.

Diante disso, percebe-se que a polícia comunitária está pautada


na parceria entre a polícia e a comunidade. São os pilares básicos
dessa filosofia. Trata-se de uma mudança comportamental da

Unidade 3 61

sociologia_do_crime.indb 61 10/12/2007 10:10:49


Universidade do Sul de Santa Catarina

polícia e não de transformação estrutural, como por exemplo,


criação de outros órgãos.

Neste contexto, mais um autor pode ser citado: WADMAN


(1999, p.iv); ele diz que:

O policiamento comunitário é ao mesmo tempo uma


fi losofia e uma estratégia organizacional que permite à
polícia e aos moradores de uma comunidade trabalharem
estreitamente juntos em novas maneiras para resolver
os problemas do crime, desordens físicas e sociais e a
decadência do bairro. A filosofia baseia-se na crença de
que os cidadãos de uma comunidade merecem poder
colaborar com as práticas policiais em troca do seu
apoio e da sua participação. Baseia-se também na crença
de que as soluções para os problemas comunitários de
atualidade exigem a liberação tanto dos cidadãos quanto
dos policiais, para explorar novas maneiras criativas de
enfrentar as preocupações do bairro, para além do estreito
enfoque sobre incidentes crimonosos isolados.

Você vai ver que na literatura é comum encontrar que o


policiamento comunitário é, ao mesmo tempo, uma filosofia
e uma estratégia organizacional. Para esclarecer melhor esse
assunto, nada melhor do que as palavras de CERQUEIRA
(1999, p.110). Veja o que ele diz:

(...) a filosofia envolve uma nova visão sobre o controle do


crime e a manutenção da ordem pública, acarretando um
novo entendimento para o papel da polícia. Esta nova
visão enfatiza a participação da comunidade nas ações
de controle do crime. A estratégia fica entendida como
o conjunto de políticas e procedimentos utilizados pela
polícia e pela comunidade para a consecução dos novos
objetivos ditados pela nova filosofia operacional.

É interessante que você perceba, que , ainda, a diferença existente


entre policiamento comunitário e polícia comunitária, sendo que
esta se refere à filosofia e aquela diz respeito à prática do órgão
de policiamento ostensivo. Assim, o policiamento comunitário
é a prática do policiamento nas ruas e logradouros das cidades
em estrito contato com a comunidade, enquanto a polícia
comunitária é uma filosofia que implica em uma mudança
comportamental nos órgãos de polícia.

62

sociologia_do_crime.indb 62 10/12/2007 10:10:50


Sociologia do Crime e da Violência

Visando a criar a parceria com a comunidade a polícia


precisa envolver os cidadãos nas questões atinentes
à segurança, alertá-las o quanto sua participação é
importante na melhoria da qualidade de vida local.

Da mesma forma, as pessoas devem ser incentivadas e


instruídas a visualizar a polícia como uma ferramenta
útil na resolução dos problemas da comunidade.

TROJANOWICS e BUCQUEROUX (1999, p.11)


alertam que, “dentro da comunidade, os cidadãos devem
participar, como plenos parceiros da polícia, dos direitos e das
responsabilidades envolvidas na identificação, priorização e
solução dos problemas”.

Você também deve achar que a conquista da confiança da


comunidade, visando a parceria, é um trabalho árduo e contínuo,
tendo a polícia o dever de tratar as pessoas com urbanidade,
respeito e tolerância, pois a truculência policial afasta as pessoas
interessadas em trabalhar pela comunidade, bem como dificulta
a interatividade e entrosamento de grupos que devem trabalhar
pelo mesmo fim.

Os “SEIS GRANDES” no contexto da segurança. Você


sabe quem são?

Ao se falar em parceria da polícia com a comunidade logo surge


a dúvida acerca de quem são as pessoas que fazem parte da
comunidade. Para elucidar OLIVEIRA (1998, p.4) diz que a
comunidade consiste em:

(...) um grupo de pessoas reunidas em qualquer área


geográfica, grande ou pequena, que tenham interesses
e preocupações em comuns sobre condições de vivência
no espaço de moradia, reconhecidos ou reconhecíveis no
campo de bem estar social.

Unidade 3 63

sociologia_do_crime.indb 63 10/12/2007 10:10:50


Universidade do Sul de Santa Catarina

A comunidade é definida por LAKATOS (1999, p.345) como


sendo

(...) essencialmente ligada ao solo, em virtude de seus


componentes viverem de maneira permanente em
determinada área, além da consciência de pertencerem,
ao mesmo tempo, ao grupo e ao lugar, e que funcionam
em conjunto, no que tange aos principais assuntos de suas
vidas. Têm consciência das necessidades dos indivíduos,
tanto dentro como fora de seu grupo imediato e, por essa
razão, apresentam tendência para cooperar estreitamente.

Na literatura específica de polícia comunitária, portanto,


destacam-se os chamados “Seis Grandes”, que são grupos que
devem ser identificados para trabalharem conjuntamente para
garantir o êxito do policiamento comunitário:

„ a unidade policial - desde o nível estratégico ao


operacional;
„ a comunidade - desde os líderes comunitários ao
cidadão comum de rua;
„ autoridades públicas eleitas - prefeito, vereadores, etc.;
„ a comunidade de negócios - desde as grandes
empresas até à pequena mercearia;
„ outras instituições - instituições públicas, instituições
sem fins lucrativos, grupos de voluntários, etc.;
„ a mídia - tanto a eletrônica quanto a escrita
(TROJANOWICS e BUCQUEROUX, 1999).
Veja que o sucesso do trabalho da polícia comunitária depende
essencialmente da cooperação e participação desses grupos,
pois são entidades determinantes no processo de identificação e
resolução de problemas.

E suma, a comunidade são todas as pessoas interessadas em


contribuir, participar, colaborar com a segurança do seu bairro,
não medindo esforços em trabalhar em prol do bem comum e
pelo exercício pleno da cidadania.

64

sociologia_do_crime.indb 64 10/12/2007 10:10:50


Sociologia do Crime e da Violência

Como funciona o Conselho de comunitário de


Segurança ?

Na filosofia de polícia comunitária fala-se muito em “parceria


com a comunidade”. Mas como se operacionaliza essa parceria?
É claro que esse processo não pode ser realizado sem uma
metodologia própria. A segurança pública é um assunto sério e
com seriedade deve ser trabalhada, não podendo cada um fazer a
seu modo e de acordo com seus interesses pessoais.

A parceria da polícia com a comunidade deve, sobretudo,


ser organizada, sob pena de ficar a mercê de procedimentos
infundados e aleatórios. Com esse objetivo instituíram-se os
Conselhos Comunitários de Segurança (CONSEG’s) que,
segundo o Regulamento dos Conselhos Comunitários de
Segurança (SANTA CATARINA, 2001):

(...) são entidades de apoio às Polícias Estaduais nas


relações com a comunidade para a solução integrada dos
problemas de segurança pública com base na filosofia de
Polícia Comunitária, vinculados, por adesão, às diretrizes
emanadas da Secretaria de Estado da Segurança Pública,
por intermédio da Comissão Coordenadora dos Assuntos
dos Conselhos Comunitários de Segurança.

No mesmo sentido, ARRUDA (1997, p.61) diz que os


CONSEG’s

“(...) são grupos de pessoas do mesmo bairro


ou município que se reúnem para discutir
e analisar, planejar e acompanhar a solução
de seus problemas comunitários de segurança,
desenvolver campanhas educativas e estreitar laços de
entendimento e cooperação entre as várias lideranças
locais”.

Dessa forma, percebe-se que os CONSEG’s são um grupo


de pessoas interessadas em fazer algo em prol da segurança
pública, em prol da comunidade e em apoio à polícia, discutindo
e analisando os problemas de segurança do bairro, propondo
soluções e acompanhando sua aplicação.

Unidade 3 65

sociologia_do_crime.indb 65 10/12/2007 10:10:50


Universidade do Sul de Santa Catarina

Com isso, a polícia estabelece um canal de comunicação com


a comunidade, e as pessoas passam a contar com um órgão de
canalização de suas necessidades.

Portanto, cabe ressaltar que o CONSEG não é um órgão que a


polícia utiliza para colher informações de forma distante e com
caráter meramente consultivo. A polícia faz parte do CONSEG,
devendo, a polícia e a comunidade, explorarem maneiras criativas
de enfrentar as preocupações de segurança do bairro.

SEÇÃO 2 - Segurança Pública: direito e


responsabilidade de todos
A seguir serão levantados os pontos cruciais acerca da
importância da participação da comunidade nos assuntos de
segurança pública, bem como a sua responsabilidade nesse
processo.

O que significa “RESPONSABILIDADE DE TODOS”? vamos discutir esse


tema?
Você sabe que o grande desafio da filosofia de polícia comunitária
é despertar as pessoas para o seu papel dentro da segurança
pública. Tal finalidade não é das mais simples, pois a cultura
da população tem grande influência na obtenção do êxito
almejado, concorda?

No Brasil ainda não se conseguiu firmar, com segurança,


o espírito de vida coletiva, de mútua ajuda, de participação
solidária, engajada em atividades comunitárias. Infelizmente,
o culto ao individualismo ainda é expressivo e o interesse por
objetivos comunitários caminha a passos tímidos.

66

sociologia_do_crime.indb 66 10/12/2007 10:10:50


Sociologia do Crime e da Violência

Sobre a experiência brasileira de parceria com a comunidade


CERQUEIRA (1999, p.88) diz que:

Não é muito profícua a experiência brasileira de parceria


da administração pública com a população; se, por um
lado, se credita isto a uma prolongada convivência com
regimes autoritários, por outro lado pode-se creditar,
também, a uma tradicional prática política, de feição
paternalista, que prefere tutelar a população a tê-la
como verdadeira parceira nas questões da administração
pública”

Todavia, é importante ressaltar que a filosofia de polícia


comunitária não pode ser implantada, mas sim trabalhada em
um conjunto de ações que possam, gradativamente, evoluir para
a verdadeira essência dessa filosofia. Isso, com certeza, requer
dedicação, persistência e, principalmente, muito trabalho.

A própria Constituição Federal (BRASIL, 1988), em seu artigo


144 proclama ser a segurança pública “(...) dever do Estado,
direito e responsabilidade de todos (...)”, ou seja, segurança
pública é assunto que diz respeito à polícia, mas não só à polícia.

Veja o que diz FELTES (1998, p.19) sobre isso. Ele ensina que o
combate ao crime é responsabilidade de todos:

O combate ao crime é, sem dúvida, uma questão que se


aplica à polícia e à sociedade como um todo. Trata-se de
uma guerra contra o crime, que, parece-nos, a polícia não
pode ganhar. O que a polícia pode fazer é trabalhar junto
com a sociedade para evitar o crime, ou tentar evitá-lo.
(...) a polícia é parte da comunidade e, nesse sentido, ela
precisa servir ao público na prevenção ao crime.

(...) A polícia não tem meios para controlar de modo tão


eficaz pessoas e situações criminogênicas; como resultado
disso, a prevenção ao crime tem que ser uma tarefa
cooperativa para todos os que moram e são responsáveis
por uma determinada cidade ou distrito. A prevenção do
crime tem que ser parte da “saúde geral” das cidades, ao
lado do cuidado com a saúde, do combate às drogas, da
melhoria do trânsito.

Unidade 3 67

sociologia_do_crime.indb 67 10/12/2007 10:10:50


Universidade do Sul de Santa Catarina

Constitucionalmente todo cidadão tem direito à segurança, mas


esse direito não pode ser exercido de forma passiva e perniciosa,
ou seja, o cidadão não pode “cruzar os braços” diante de
problemas que aumentam de forma vertiginosa e entender que
toda manifestação de violência e agressão é responsabilidade da
polícia. A segurança pública envolve diversas outras áreas sociais
que apresentam funções decisivas para se aferir a qualidade
de segurança de um local e, em uma observação mais atenta,
percebe-se que na maioria dos problemas de segurança a origem
está enfocada em outros segmentos, como a família, a escola,
órgãos de saúde, sistema de distribuição de renda, entre outros.
Então, um pai que deixa, por exemplo, de educar exemplarmente
seu filho, não se preocupando em prepará-lo para o estudo e para
o trabalho, está colaborando para, possivelmente, o surgimento
de uma pessoa com fortes tendências para a compulsividade
do crime, pois essa pessoa não teve acesso a boas referências
familiares, não conheceu limites, não sofreu repreensões ao
manifestar excessos, enfim, não exerceu a plenitude da cidadania.

Desse modo se entende que segurança pública e polícia não são


sinônimos. Talvez a propagação equivocada de que a segurança
pública é responsabilidade exclusiva da polícia tenha origem no
fato de ser a polícia o órgão mais visível, atuante e vulnerável
desse processo, bem como na exaltação de suas falhas pela
mídia, incentivando que o cidadão, de certa forma, retraia-se e,
passivamente, assista as enxurradas de violência apontando um
único responsável por esse problema de extrema complexidade.

O Papel da comunidade: qual sua força?

A experiência demonstra que a comunidade fica bastante


insegura ao ser convidada para participar dos assuntos de
segurança pública. Tal sensação é bastante compreensível, pois
o fim da ditadura militar no país ainda é muito recente, sendo
que a polícia naquela época estava longe de desempenhar o
papel constitucional a ela hoje atribuído, sendo um verdadeiro
instrumento de repressão de interesses dominantes.

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sociologia_do_crime.indb 68 10/12/2007 10:10:50


Sociologia do Crime e da Violência

Um fator que talvez deva influenciar na dificuldade de se


desenvolver o espírito comunitário no Brasil é inexistência
de grandes catástrofes, como a ação dizimadora de alguns
fenômenos da natureza, pois se percebe que em nações onde esses
fenômenos são uma constante o valor pelas causas e dimensões
sociais são mais desenvolvidas e apuradas.

Você deve concordar que a educação parece ser


uma das melhores alternativas para que as pessoas
despertem para os valores comunitários, não é ?

Mesmo assim, a polícia, hoje, procura resgatar os valores de


cidadania, tendo a comunidade como a base de seu local de
trabalho e as pessoas como parceiras na busca integrada de
soluções de problemas.

A importância do papel da comunidade está justamente no fato


de que só ela conhece, na prática, os problemas de segurança
enfrentados. É a comunidade que experimenta a falta de
segurança, os roubos, os furtos, as perturbações, e só ela tem essa
capacidade de direcionar os trabalhos de segurança condizentes
com a sua necessidade. É exatamente isso que o “caput” do artigo
144 da Constituição Federal diz quando afirma que a segurança
pública é um direito, mas também uma responsabilidade de
todos, pois as pessoas possuem informações de extremo valor e
relevância, sendo que conhecem as minúcias e as particularidades
do local onde residem. Assim, a canalização de tais informações
à polícia criará condições de respostas mais satisfatórias pelo
órgão policial, considerando que as pessoas resolvem, sem
enfrentamento direto com o criminoso, alguns problemas da
comunidade que têm repercussão direta sobre a segurança
pública.

Você já teve a oportunidade de estudar que dentro


desse entendimento os CONSEG´s funcionam como
um mecanismo de organização da comunidade, um
verdadeiro fórum de reivindicações, detectando
quais os problemas e obstáculos que dificultam
o desenvolvimento e a segurança da mesma,
impulsionando o planejamento de fórmulas que
promovam soluções para o bem-estar geral das pessoas.

Unidade 3 69

sociologia_do_crime.indb 69 10/12/2007 10:10:51


Universidade do Sul de Santa Catarina

Dessa forma, uma comunidade engajada, sentindo intensamente


a presença do Estado, sentindo-se à vontade para acessar as
autoridades policiais, tenderá a gerar informações, auxiliando a
polícia a detectar com mais precisão os problemas de segurança
local.

Fica claro, assim, o quanto cada cidadão pode fazer pelo bem-
estar de sua comunidade, a começar pela sua própria família,
colaborando com a polícia na busca de informações e mecanismos
de interação mútua, visando oferecer segurança, bem como fazer
parte da recuperação das condições de vida do bairro e trabalhar
pela paz social.

O Crime como um problema comunitário

A repressão combate a violência? O que você acha?


Registre situações que ilustram a relação de violência
e repressão. Faça uma análise crítica dos casos
apresentados.
Use este espaço para registrar suas conclusões.

Diante do avanço vertiginoso do crime e da violência o Estado


tem sofrido fortes pressões na definição de métodos adequados na
erradicação desses males. Em uma análise superficial a solução
mais acertada é o aumento significativo do número de policiais.

Todavia, sabe-se que o aumento do número de policiais não


resolve o problema, pois o modelo meramente repressivo já não
atende as necessidades de segurança.

70

sociologia_do_crime.indb 70 10/12/2007 10:10:51


Sociologia do Crime e da Violência

Mas, a repressão combate a violência? O que você


pensa sobre isso?

Veja o que alguns autores escrevem sobre essa questão.

Segundo MOLINA (2000, p.144) a repressão não combate as


verdadeiras causas do crime. Veja o que ele aponta:

A mera repressão chega sempre demasiado tarde e não


incide diretamente nas razões últimas do fato criminoso.
(...) o conhecimento científico (etiológico) do crime, de
sua gênese, dinâmica e variáveis mais significativas deve
conduzir a uma intervenção mediata e seletiva capaz de
se antecipar ao mesmo, de preveni-lo, neutralizando com
programas e estratégias adequadas às suas raízes.

AMARAL (2001) pondera que:

Só a repressão não terá força, nem mesmo com maiores


e bem armadas legiões de policiais, para conter o crime.
Conquanto indispensável e preventivo (em certos casos)
a punição é, no entanto, enfrentamento apenas do efeito
do problema. E disto já percebera Beccaria, lá em 1775,
quando proclamou ser “mais fácil, mais útil, prevenir que
reprimir”; tal inexcedível verdade, parece, longe de nossas
consciências.

Com relação ao modelo tradicional de policiamento


CERQUEIRA (1999, p.13) lembra que:

(...) o policiamento só é acionado depois que alguém


observa um crime e decide chamar a polícia; com isso
os crimes que não são vistos pela população, ou que não
produzem vítimas ou testemunhas que estejam dispostas
a acionar a polícia, não serão cobertos pelo policiamento
ostensivo. Constata-se que determinados crimes e
criminosos ficam fora do raio de ação do policiamento.

Perceba que de nada adianta equipar fortemente a polícia,


aumentar sobremaneira seu contingente se suas ações não
estiverem voltadas, essencialmente, para a prevenção, ou seja,
o trabalho policial deve atuar no sentido de se antecipar à

Unidade 3 71

sociologia_do_crime.indb 71 10/12/2007 10:10:51


Universidade do Sul de Santa Catarina

ocorrência do delito, e não agir de forma desesperada, e muitas


vezes aleatória, depois que o crime ocorreu, quando alguém
teve seu patrimônio lesado ou integridade física ou psíquica
comprometida.

As informações da comunidade são fundamentais para


o fornecimento de uma prevenção satisfatória segundo
CERQUEIRA (1999, p.105) e, ressalta:

(...) o crime não é um fenômeno casual, fortuito e


aleatório, isto é, não é um produto do azar ou da
fatalidade, senão um acontecimento altamente seletivo;
isto quer dizer que o crime tem o seu momento oportuno,
o seu espaço físico adequado, sua vítima propícia etc,
e que uma informação confiável sobre as principais
variáveis do crime oferece imensas possibilidades para
uma prevenção eficaz.

Contudo, não é demais observar que por mais ações preventivas


que se realizem o crime sempre vai ser uma constante na
sociedade, pois faz parte do atual estágio de evolução do ser
humano.

Neste sentido, AMARAL (2001) alerta que:

A violência e o crime (violência reprimida formalmente


pela lei), todavia, são comportamentos sociais inerentes
à natureza humana; cada sociedade estabelece até que
ponto há de tolera à violência. Assim o limite à violência
não é apenas legal, mas sobretudo social. A existência do
crime é fato social normal (Durkheim), embora sempre
abominável e logo punível seu autor; anormal e patologia
social é o crime em taxas altas.

Nesta mesma direção CAMARGO (1998, p.110) também


afirma que:

A criminalidade, como fenômeno social que é - inerente


à natureza humana - jamais terminará, cabendo à polícia
esforçar-se por preveni-la e contê-la. Porém, o fato
de a polícia, num contexto em que todas as formas de
prevenção indireta falharam, não ter responsabilidade
no tocante às causas da delinqüência, não significa que a
ação policial seja inútil, pois, a despeito de tudo, cabe à
polícia evitar que o homem seja o lobo do homem.

72

sociologia_do_crime.indb 72 10/12/2007 10:10:51


Sociologia do Crime e da Violência

Assim, pode-se dizer que pequenas taxas de criminalidade são


aceitáveis e consideradas normais em qualquer sociedade, sendo,
entretanto, combatidas as altas taxas de criminalidade.

Dessa forma, fica claro que a prevenção é a melhor solução para


os problemas de segurança pública. Sobre prevenção MOLINA
(2000, p.355) diz que:

(...) prevenção e comunidade são conceitos


necessariamente interligados, a tal ponto que não se pode
compreender a prevenção do crime no sentido “policial”,
nem sequer “situacional”, desligada da comunidade:
prevenção é prevenção comunitária, prevenção “na”
comunidade e prevenção “ da” comunidade. Reclama uma
mobilização de todas as forças vivas, uma dinamização
social e uma atuação ou compromisso de todas elas no
âmbito local.

Assim, só se pode falar em prevenção quando a polícia e


a comunidade estiverem intensamente bem relacionadas,
trocando informações, buscando soluções e, conseqüentemente,
melhorando a qualidade de vida do local, pois o crime é um
problema que nasce na comunidade e por ela tem que ser
resolvido.

Unidade 3 73

sociologia_do_crime.indb 73 10/12/2007 10:10:51


Universidade do Sul de Santa Catarina

Atividades de auto-avaliação

1. Com base nos pressupostos estudados nesta unidade (segurança


como direito e responsabilidade de todos, segurança com base em
ações preventivas e socializadas), analise o que diz Cerqueira sobre o
modelo tradicional de policiamento e desenvolva seu ponto de vista
destacando elementos que você considera centrais na discussão na
área de segurança pública.

“o policiamento só é acionado depois que alguém observa um crime


e decide chamar a polícia; com isso os crimes que não são vistos pela
população, ou que não produzem vítimas ou testemunhas que estejam
dispostas a acionar a polícia, não serão cobertos pelo policiamento
ostensivo. Constata-se que determinados crimes e criminosos ficam
fora do raio de ação do policiamento. (CERQUEIRA, 1999, p. 13)

- Participe do Fórum nesta unidade para compartilhar essa questão. Inclua


suas considerações.

Síntese

Nesta unidade você viu segurança é um tema complexo e insere


o sentido de tornar a coisa livre de perigos, livre de incertezas,
assegurada de danos ou prejuízos, afastada de todo o mal. Você
viu, também, que a segurança é uma condição existencial tanto
dos indivíduos quanto da sociedade, por isso o conjunto de
atividades precisam de fato estabelecer uma garantia a indivíduos,
grupos, nações, Estados e grupos de nações, contra tudo aquilo
que ofereça perigo à sua sobreexistência ou ao seu progresso.

A Constituição Brasileira contempla essa preocupação no art.


144 e apesar do referido artigo não elencar de forma explícita
outros órgãos formais como responsáveis pela segurança pública,
pode-se dizer que também fazem parte desse sistema: Poder
Legislativo, Ministério Público, Poder Judiciário, Sistema
Prisional e você estudou que existem também as instancias
informais que influenciam de forma decisiva na segurança
pública, como família, cultura, escolas, clubes, religião, etc.

74

sociologia_do_crime.indb 74 10/12/2007 10:10:51


Sociologia do Crime e da Violência

O policiamento comunitário é a prática do policiamento nas ruas


e logradouros das cidades em estrito contato com a comunidade
e visa a criar uma parceria com a comunidade, a polícia precisa
envolver os cidadãos nas questões atinentes à segurança, alertá-los
o quanto sua participação é importante na melhoria da qualidade
de vida local.

Enfim, você estudou que a segurança pública é direito e


responsabilidade de todos e viu também que o trabalhos de
segurança devem ser desenvolvidos de forma preventiva como
diz Camargo (1998) pois a criminalidade, como fenômeno social
que é – inerente à natureza humana – jamais terminará, cabendo
à polícia esforçar-se por preveni-la e contê-la. Porém o fato de
a polícia, num contexto em que todas as formas de prevenção
indireta falharam, não ter responsabilidade no tocante às causas
da delinqüência, não significa que a ação policial seja inútil, pois,
a despeito de tudo, cabe à polícia evitar que o homem seja o lobo
do homem.

Saiba mais

Para apronfundar ou ampliar seus conhecimentos sobre os


assuntos tratados nesta unidade leia:

ANDRADE, Vera Regina Pereira de. A ilusão de segurança


jurídica: do controle da violência à violência do controle penal.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997.

BAUMAN, Zygmunt. Comunidade em busca por segurança no


mundo atual. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.

______. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos.


Trad. Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,
2004.

FREITAS, Wagner Cinelli de Paula. Espaço urbano e


criminalidade: lições da Escola de Chicago. São Paulo: IBCcrim,
2002.

Unidade 3 75

sociologia_do_crime.indb 75 10/12/2007 10:10:51


sociologia_do_crime.indb 76 10/12/2007 10:10:51
4
UNIDADE 4

A gramática da exclusão/
inclusão e a realidade
socioeconômica brasileira

Objetivos de aprendizagem
„ Analisar e compreender o processo de exclusão/inclusão
considerando os aspectos históricos da sociedade.

„ Situar a exclusão no contexto dos direitos humanos e da


cidadania.
„ Compreender a exclusão considerando as relações
sociais e de trabalho.

Seções de estudo
Seção 1 Exclusão/inclusão: processos complexos.

Seção 2 A exclusão dos direitos de cidadania.

Seção 3 A criminologia radical.

sociologia_do_crime.indb 77 10/12/2007 10:10:51


Universidade do Sul de Santa Catarina

Para início de estudo


Esta unidade vai tratar da exclusão e inclusão na sociedade
brasileira. Para iniciar o estudo é sugerido contextualizar a
palavra “exclusão”. Vamos ver o que diz o dicionário?

O Dicionário Houaiss registra, para a palavra exclusão, a


acepção ato de excluir-se, e o verbo excluir, por sua vez, remete
a significados como: não ter compatibilidade com; pôr de lado,
afastar, separar; deixar de admitir; não conceder direito de
inclusão; omitir; fazer com que perca a posse de; privar, despojar;
mandar embora ou para fora; retirar, expulsar. (HOUAISS;
VILLAR; FRANCO).

A palavra “exclusão” na atualidade tem sido utilizada pela mídia,


nos discursos políticos, sociais, econômicos e institucionais,
como uma espécie de aparador para retratar a desigualdade
socioeconômica reinante no país, restringindo e reduzindo seu
sentido ao âmbito meramente econômico.

Contudo, neste estudo a palavra exclusão será abordada para


além da questão econômica, pois serão analisadas várias de suas
facetas e conseqüências, a (in)justiça social e todo sofrimento
humano dela decorrente.

- Vamos às seções? Acompanhe os aspetos históricos e sociais


correlacionando-os com a realidade cotidiana em seu espaço de atuação.

SEÇÃO 1 - Exclusão/inclusão: processos complexos


Você já viu que só ao estudar o tema “segurança” percebe-se a
Buscando uma continuidade ao que foi mencionado no início do
estudo, é importante que você perceba que a exclusão, nos locais
públicos, aparece muitas vezes como sinônimo de pobreza, de
privação e despojamento dos bens e valores de uma determinada
sociedade. No entanto, Bader Sawaia questiona se há realmente
uma exclusão, ou se não poderíamos falar de uma inclusão,
contudo, perversa, uma vez que todos os excluídos são incluídos
na sociedade, porém como excluídos.

78

sociologia_do_crime.indb 78 10/12/2007 10:10:51


Sociologia do Crime e da Violência

A sociedade exclui para incluir e essa transmutação é condição


da ordem social desigual, o que implica o caráter ilusório
da inclusão. Todos estamos inseridos de algum modo, nem
sempre decente e digno, no circuito reprodutivo das atividades
econômicas, sendo a grande maioria da humanidade inserida por
meio da insuficiência e das privações, que se desdobram para fora
do econômico (SAWAIA, 2001. p. 08).

Observe que o que há, segundo a análise do mencionado autor,


é a dialética exclusão/inclusão. Jock Young diz que, até os anos
1980, a palavra ”marginalização” é usada para designar esse
grupo adventício. São as pessoas que a modernidade deixou
para trás, bolsões de pobreza e de privação na sociedade
afluente. A partir de então, porém, a expressão passa a ser
“exclusão social”, abrangendo uma expulsão mais dinâmica
da sociedade e, o que é muito importante, um declínio na
motivação de integrar os pobres na sociedade (YOUNG,
2002. p. 41).

É interessante notar que a lógica dialética mostra que a exclusão


é um processo complexo e de muitas faces, com configurações
de dimensões materiais, políticas, interacionistas e subjetivas.
A exclusão não gera somente a pobreza, pois essa é produto do
sistema, mas traduz-se no processo que envolve o homem por
inteiro e suas relações com os outros, pois:

A lógica dialética explicita a reversibilidade da relação


entre subjetividade e legitimação social e revela as
filigranas do processo que liga o excluído ao resto
da sociedade no processo de manutenção da ordem
social, como por exemplo, o papel central que a
idéia de nós desempenha no mecanismo psicológico
principal da coação social nas sociedades onde
prevalece o fantasma do uno e da desigualdade,
que é o de culpabilização individual. O pobre é
constantemente incluído, por mediações de diferentes
ordens, no nós que o exclui, gerando o sentimento de
culpa individual pela exclusão. (SAWAIA, 2001, p. 08-
09)

Unidade 4 79

sociologia_do_crime.indb 79 10/12/2007 10:10:52


Universidade do Sul de Santa Catarina

Essa inclusão ocorre de forma perversa, porque, além de fazer


os pobres se sentirem culpados e responsáveis pela própria
pobreza, faz com que adquiram um status social desvalorizado e
estigmatizado e via de conseqüência, vêem-se obrigados a viver
isolados, até mesmo daqueles que se encontram em situação
idêntica, a fim de dissimular a inferioridade de seu “eu”. Você
concorda com isso?

Acerca do assunto, veja o que Léo Rosa de Andrade expressou na


obra A culpa do outro:
Se olharmos as favelas, os alagados, as paliçadas, as periferias, os morros,
o submundo, os desgraçados em geral, veremos os filhos dos escravos,
dos índios, dos imigrantes mal sucedidos, veremos os migrantes, os bóias-
frias, os sem-terras, os sem-teto, veremos os produzidos e reproduzidos
nessas circunstâncias. São a nação miserável, os nascidos e crescidos na
parte miserável da pátria. Os que os perceberam sempre lhes lançaram
acometimentos auto-exculpatórios, atribuindo-lhes desemprego por
vagabundagem, ignorância por vadiação, prole exagerada por descuido,
doença por falta de higiene. Enfim, aos excluídos é imputada a condição
de responsáveis pelas circunstâncias históricas que lhes aniquila quaisquer
meios e todas as chances, como se eles fossem voluntários da própria
miséria.

Jailson de Souza e Silva a respeito A exclusão, assim, além de toda ausência de bens materiais de
refere que esse efeito perverso consumo que provoca, cria no indivíduo uma sensação de fracasso
ocorreu devido ao fato de que a
pessoal, na medida em que o responsabiliza pessoalmente por sua
responsabilidade pelo fracasso
social fora transferida ao indivíduo. pobreza, por não ter conseguido ascender socialmente. Produz,
(SILVA, Jailson de Souza e. Por que ainda, uma estigmatização do excluído. O estigma de um sujeito
uns e não outros: caminhada de desqualificado, que marca feito cicatriz.
jovens pobres para a universidade.
Rio de Janeiro: 7Letras, 2003. p. E, em decorrência disso, surge a figura de um Estado
158.) assistencialista que, segundo Vera Telles, faz com que os direitos
sejam transformados em ajuda, em favores (TELES, apud
SAWAIA, 2001, p. 24).

80

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Sociologia do Crime e da Violência

SEÇÃO 2 - A exclusão dos direitos de cidadania


Enquanto, por efeito de leis e costumes, houver proscrição social,
forçando a existência, em plena civilização, de verdadeiros infernos,
e desvirtuando, por humana fatalidade, um destino por natureza
divino; enquanto os três problemas do século – a degradação do homem
pelo proletariado, a prostituição da mulher pela fome, e a atrofia da
criança pela ignorância – não forem resolvidos; enquanto houver
lugares onde seja possível a asfixia social; em outras palavras, e de
um ponto de vista mais amplo ainda, enquanto sobre a terra houver
ignorância e miséria, livros como este não serão inúteis.

Hauteville-House, 1862
Prefácio de Victor Hugo à sua obra “Os miseráveis”

Qual a relação entre cidadania e ser um cidadão?


Vamos conceituar os termos?

O Dicionário Houaiss reconhece ao vocábulo “cidadão” o


significado de “indivíduo que, como membro de um Estado,
usufrui de direitos civis e políticos garantidos pelo mesmo
Estado e desempenha os deveres que, nesta condição, lhe são
atribuídos” e ainda “aquele que goza de direitos constitucionais e
respeita as liberdades democráticas”; e, para o termo “cidadania”,
aponta o sentido de “qualidade ou condição de cidadão” e
“condição de pessoa que, como membro de um Estado, se acha
no gozo de direitos que lhe permitem participar da vida política”
(HOUAISS; VILLAR; FRANCO, 2001, p. 714).

Das acepções referidas, se depreende que todos aqueles de quem


foi expropriado o direito de gozar os direitos civis e políticos de
um Estado viriam a formar uma categoria de “não-cidadãos”, ou
seja, os excluídos, concorda?

E quem seriam esses excluídos?

Unidade 4 81

sociologia_do_crime.indb 81 10/12/2007 10:10:52


Universidade do Sul de Santa Catarina

Num primeiro momento, seriam os marginais, pedintes,


mendigos que povoaram e povoam os espaços sociais, formando
universos estigmatizados e estereotipados que atravessaram
por toda a história da humanidade. Hodiernamente podemos
somar a essa classe excluída também pessoas idosas, deficientes,
desadaptados sociais, minorias étnicas ou de cor, desempregados
de longa duração, jovens impossibilitados de ascender ao mercado
de trabalho, bem como todos explorados detentores de um
subemprego, os trabalhadores do mercado informal e ainda,
aqueles que recebem um mísero salário mínimo, dentre outros.

Sílvia Tatiana Maurer Lane questiona: “Quem são os excluídos,


disfarçados em incluídos?”, ao mesmo tempo em que responde:

São aqueles que para não denunciarem as injustiças


decorrentes da ideologia dominante, necessária para a
manutenção do poder de alguns e de um status quo, são
“incluídos” no sistema.
São os negros que denunciam a escravidão, hoje
disfarçada em preconceitos ou discriminações ambíguas.
São os deficientes que denunciam a ausência da saúde
pública e de educação reabilitadora.
São os pobres que denunciam a injustiça econômica e a
má distribuição de renda que impede o acesso à saúde e
educação.
São os índios “protegidos” em reservas, que são
considerados incluídos, apesar da autodestruição.

E, muito mais... Esses excluídos, muitas vezes são constituídos


de cidadãos explorados das mais diversas formas, disfarçados em
incluídos.

Muitas pessoas e suas situações acabam por serem


vinculadas à gramática da exclusão/inclusão
representando as mais diversas formas e sentidos
originados dessa relação inclusão/exclusão.

Mariangela Belfiore Wanderley diz que “Sob esse rótulo


estão contidos inúmeros processos e categorias, uma série de
manifestações que aparecem como fraturas e rupturas do vínculo
social” (SAWAIA, 2001, p. 17).

82

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Sociologia do Crime e da Violência

Veja que “do ponto de vista epistemológico o fenômeno da


exclusão é tão vasto e complexo que é quase impossível delimitá-
lo. Entretanto, fazendo um recorte ocidental, pode-se dizer que
excluídos são todos aqueles que são rejeitados de nossos mercados
materiais ou simbólicos, de nossos valores.” (XIBERRAS, apud
SAWAIA, 2001, p. 17).

É por isso que a palavra exclusão não pode ser


entendida de uma forma reducionista, ligada apenas
à questão econômica, porque os excluídos não
são somente aqueles rejeitados física, geográfica e
materialmente, “não apenas do mercado e de suas
trocas, mas de todas as riquezas espirituais, seus
valores não são reconhecidos, ou seja, há também
uma exclusão cultural.” (SAWAIA, 2001, p. 17-18).

A insatisfação face à situação social, a frustração de aspirações


e o desejo podem dar lugar a uma variedade de respostas
políticas, religiosas e culturais capazes de abrir possibilidades
para os imediatamente concernidos, mas também podem,
freqüentemente de propósito, fechar e restringir as possibilidades
de outros. Também podem criar respostas criminais, e essas
encerram muito freqüentemente a característica de restringir
terceiros (YOUNG, 2002, p. 30).

O mesmo autor, ainda, diz que os excluídos acabam sendo


impedidos de “entrar na pista de corridas da sociedade
meritocrática, ainda que permaneçam colados a aparelhos de
televisão e outras mídias que exibem tentadoramente os prêmios
e recompensas da sociedade abastada.” (Ibid., p. 31).

Como funciona o princípio da eficiência e a


concretização dos direitos básicos fundamentais de
cidadania insertos na Constituição Federal Brasileira?

O princípio da eficiência foi inserido no ordenamento jurídico


nacional por meio da emenda constitucional nº 19, de 4 de junho
de 1998, que o inscreveu entre os princípios constitucionais
da administração pública, insertos no artigo 37, caput, da
Constituição Federal, o qual passou a ter a seguinte redação:

Unidade 4 83

sociologia_do_crime.indb 83 10/12/2007 10:10:52


Universidade do Sul de Santa Catarina

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos poderes


da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá
aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade
e eficiência, e, também ao seguinte (...). (BRASIL. Constituição (1988).
Constituição da República Federativa do Brasil. 31 ed. São Paulo: Saraiva,
2003.)

Posteriormente, a lei nº 9.784/99 (que regula o processo


administrativo no âmbito da Administração Pública Federal)
fez referência a ele em seu artigo 2º, caput, que assim dispôs:
“A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos
princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade,
proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório,
segurança jurídica, interesse público e eficiência.” (SANTOS,
2003. p. 195).

Hely Lopes Meirelles já ensinava que “o princípio da eficiência


exige que a atividade administrativa seja exercida com presteza,
perfeição, e rendimento funcional”.

Celso Antonio Bandeira de Mello (2003, p. 111), por sua vez,


ao falar sobre o princípio da eficiência, referia que “trata-se,
evidentemente, de algo mais do que desejável”.

Prossegue ainda dizendo que tal princípio não pode ser admitido
“senão na intimidade do princípio da legalidade, pois jamais uma
suposta busca de eficiência justificaria postergação daquele que é
o dever administrativo por excelência.” (Ibid., p. 112).

Mencionado princípio, segundo o mesmo autor, é uma faceta um


mais abrangente há muito tratado no direito italiano, qual seja, o
princípio da “boa administração” (Id.).

Para Hely Lopes Meirelles, o princípio da eficiência constitui o


mais moderno dos princípios da função administrativa, que “já
não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade,
exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório
atendimento das necessidades da comunidade e de seus
membros.”

Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2003, p. 83) diz que o princípio


da eficiência se apresenta sob dois aspectos: um que diz respeito
ao modo de atuação do agente público, “do qual se espera o

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Sociologia do Crime e da Violência

melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr


os melhores resultados” , e o outro, que interessa ser discutido,
refere-se “ao modo de organizar, estruturar, disciplinar a
administração pública, também com o mesmo objetivo
de alcançar os melhores resultados na prestação do
serviço público.”

Contudo, alguns autores, como Luiz Alberto dos


Santos, tecem críticas à inserção do princípio da
eficiência no texto constitucional, pois entendem que
tal não é princípio da administração pública, mas sim
finalidade precípua dessa, o objetivo a ser perseguido
pelo administrador público (SANTOS, apud
SANTOS, 2003, p. 201).

Para Heraldo Garcia Vitta (apud SANTOS, 2003, p. 201-


202), segundo relata Alvacir Correa dos Santos, mostra-se
desnecessária a introdução do princípio da eficiência no caput
do art. 37 da CF, pois, se o Brasil é um Estado Democrático de
Direito, e tem como fundamentos, entre outros, a cidadania, a
dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e
da livre iniciativa, e tem como objetivos fundamentais construir
uma sociedade livre, justa e solidária, erradicar a pobreza e a
marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais
(CF, art. 1º e 3º), a evidência que a “administração pública
deverá ser eficiente, visar o bem comum, enfim, é dever jurídico
(e não meramente ético) de todo e qualquer governo ter boa
administração”.

Acompanhe o que diz Alvacir Correa dos Santos sobre isso: “O


princípio da eficiência não veio ao ordenamento jurídico como
princípio constitucional somente para consagração da tecnocracia,
mas sim para que o Estado atinja seus fins maiores, como a
prestação de serviços em favor do bem comum através dos meios
legais e morais que o justificam”. Prossegue dizendo ainda que
esse princípio deve ser visualizado principalmente em função de
determinados valores protegidos pela Constituição, a exemplo
dos valores da soberania, da cidadania, da dignidade da pessoa
humana, do trabalho, da livre iniciativa e do pluralismo político
(Ibid. p. 193).

Unidade 4 85

sociologia_do_crime.indb 85 10/12/2007 10:10:52


Universidade do Sul de Santa Catarina

Percebe-se que esse princípio surgiu como um poderoso


instrumento para a consolidação dos direitos fundamentais
prometidos na Constituição, a fim de viabilizar a construção de
um Estado Democrático de Direito no país.

No Brasil, observa-se, há muito, a impotência do Estado-Nação


no controle das conjunturas nacionais. A desigualdade social
aumenta cada vez mais e, com ela, aumenta o número de pessoas
excluídas do mercado de trabalho e, via de conseqüência, dos
direitos de cidadania.

De outro lado, há uma minoria com renda muito elevada,


ou relativamente elevada, formando-se, assim, “dois Brasis”:
um dos muito ricos e outro dos muito pobres. Isso porque o
Estado brasileiro não tem conseguido ser eficiente, para dar
concretização aos direitos fundamentais básicos ao exercício da
cidadania, prometidos no início da Constituição Federal.

A realidade acima acaba de ser estampada em recente


estudo realizado e publicado pelo IBGE.
Segundo chamada da reportagem acerca de tal
estudo, realizada pela revista Isto É, o Brasil chegou
ao “FOSSO ABISSAL – Estudo do IBGE mostra que o
binômio concentração de renda e desigualdade social
foi o mal do século XX no Brasil.
Sobre isso ver: Fosso Abissal: estudo de IBGE
mostra que o binômino concentração de renda e
desigualdade social foi o mal do século XX no Brasil.
Isto É, 08 out. 2003. p. 46.

É interessante destacar que coexistem em nosso país diferentes


causas de pobreza e de exclusão social, pois “as noções de pobre
e pobreza figuram no horizonte histórico da sociedade brasileira
e são explicativas das formas como o cenário público brasileiro
tratou a questão social” (SAWAIA, 2001, p. 19).

Ocorre que em um século, o Brasil se transformou em uma


respeitável economia industrial, mudou-se de mala e cuia da
roça para a cidade e esteve entre os cinco países com maior
crescimento do PIB, ao lado de países bilionários como Japão,
Finlândia, Noruega e Coréia. Mas um passeio pela história da
distribuição das riquezas não deixa dúvidas: os governantes e

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sociologia_do_crime.indb 86 10/12/2007 10:10:52


Sociologia do Crime e da Violência

economistas que guiaram a Nação nesses 100 anos merecem


uma bela salva de vaias. Dois importantes estudos divulgados
na semana passada consolidam a certeza de que, na busca da
justiça social, objetivo maior de toda nação moderna, o Brasil
foi um fracasso. (Fosso Abissal: estudo de IBGE mostra que o
binômino concentração de renda e desigualdade social foi o mal
do século XX no Brasil. Isto É. 08 out. 2003. p. 46

Segundo Vera Telles (apud SAWAIA, 2001, p. 19),

Poder-se-ia dizer que, tal como uma sombra, a pobreza


acompanha a história brasileira, compondo um elenco
de problemas, impasses e também virtualidades de um
país que fez e ainda faz do progresso (hoje formulado
em termos de uma suposta modernização) um projeto
nacional.

Então a exclusão é um fenômeno recente?

Veja o que diz José de Souza Martins (apud SAWAIA, 2001, p.


27) sobre isso.

A exclusão social é um problema brasileiro de 500 anos e


“nossa história traz capítulos freqüentes de dominação de vastos
segmentos populacionais sem cidadania”

Segundo José de Souza Martins, “nossa cultura barroca de


fachada, com base na conquista, exclui índios, camponeses no
campo e, na cidade, migrantes, favelados, encortiçados, sem teto,
etc., em uma fenomenologia bastante conhecida.”

A exclusão na história: situações e motivos


Se fizermos um rápido passeio histórico, poderemos observar que
da Era colonial ao Brasil do Império e das Repúblicas – velha,
nova e contemporânea, com agravamento durante a ditadura
militar – os processos sociais excludentes sempre estiveram
presentes em nossa história.

Unidade 4 87

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Universidade do Sul de Santa Catarina

O que aconteceu nas décadas de 60 e 70? O que


acontece na sociedade? E qual a relação com o
processo de exclusão?

Nas décadas de 60 e 70 travou-se outro debate no Brasil acerca


do enraizamento da pobreza (e a exclusão subjacente) e das
contradições do modo de produção capitalista. “Fazendo parte de
um exército industrial de reserva, pessoas se deslocam do campo
esvaziado e buscam melhores condições de vida na cidade.”
(SAWAIA, 2001, p. 28-29)

Esse êxodo rural faz com que as pessoas que chegam do campo
integrem as engrenagens produtivas de forma desigual.

Depois do período nacional-desenvolvimentista, no auge


do chamado “milagre econômico”, os militares e setores
conservadores apresentaram “pseudo-soluções” para as questões
sociais, dentre elas as propostas habitacionais para os setores
populares por meio dos financiamentos concedidos pelo BNH,
bem como “o controle da vida sindical dos trabalhadores, arrocho
salarial como combate à inflação, a falta de liberdade política de
expressão e organização e assim por diante.” (Ibid., p. 29).

Naquele momento, alguns intelectuais brasileiros,


“assumindo o preconceito contra as ‘classes perigosas’,
viam os pobres como ‘populações marginais’ ou
atrasadas, que poderiam integrar-se ao novo mundo
urbano e moderno” (Id.).

Dentre as várias concepções de marginalidade que vigoravam


nos anos 70, Maura Pardini Bicudo Véras apontou algumas
referências importantes, eis que não assumiu o dualismo “atrasado
x moderno”, “não-integrado x integrado”, “rural x urbano”,
quando então os estudos passaram a ver as relações econômicas
e sociológicas atinentes ao capitalismo como constitutivas do
sistema de produção. “As populações marginais aparecem, nesse
contexto, como conseqüência da acumulação capitalista, um
exército industrial de reserva singular.” (Ibid., p. 30).

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Sociologia do Crime e da Violência

Anos 80. Quais características guardam à exclusão?

Já nos anos 80, período que ficou conhecido como “década


perdida”, contrariamente aos anos 60 e 70, momento em que se
dirigia a atenção aos favelados e à migração, como representantes
emblemáticos dos excluídos na cidade, pelo aumento da pobreza
e da recessão econômica, simultaneamente se vivia a chamada
“transição democrática”, voltava-se a atenção para a questão
da democracia, da apartação urbana e os efeitos perversos
da legislação urbanística, a importância do território para a
cidadania, bem como a falência das políticas, movimentos e lutas
sociais (SAWAIA, 2001, p. 31).

Nesse período, houve, em especial, a discussão acerca do


território, a questão espacial e a cidadania, despontando temas
relacionados à urbanização, às relações entre espaço e sociedade e
à divisão do mundo, com destaque especial para as reflexões sobre
espaço e cidadania.

Segundo Milton Santos (apud SAWAIA, 2001, p. 32), o


componente território implica que seus habitantes, além de
terem acesso aos bens e serviços indispensáveis, tenham também
uma adequada gestão deles, que devem ser assegurados a toda
a coletividade. Mencionou, ainda, que o Terceiro Mundo é
composto por “não-cidadãos” (em especial, originados do
“milagre econômico brasileiro”, que agravou consideravelmente os
contrastes entre o exagerado número de pobres e a concentração
de riquezas nas mãos de uma minoria), porque se fundou na
sociedade do consumo, da mercantilização e na monetarização.
Assim, “cada homem vale pelo lugar onde está. O seu valor como
produtor, consumidor, cidadão depende de sua localização no
território”.

E prosseguiu, “a possibilidade de ser mais ou menos cidadão


depende, em larga proporção, do ponto do território onde se
está.” (Id.).

Unidade 4 89

sociologia_do_crime.indb 89 10/12/2007 10:10:53


Universidade do Sul de Santa Catarina

Com o reconhecimento do componente espacial da pobreza,


percebe-se que a exclusão do direito de acessibilidade no
território nega ao cidadão o direito de ter um lugar, permanecer
no lugar (criar raízes), perdendo seu território identitário, bem
como seu espaço de memória, ou ainda, quando o conseguem,
lhes é negado o direito de mobilidade, pois “há em todas as
cidades, uma parcela da população que não dispõe de condições
para se transferir da casa onde mora, isto é, para mudar de bairro
e que pode vir a explicar sua pobreza pelo fato de sua residência
não contar com serviços públicos”. (Ibid., p. 33)

Essa parcela dos excluídos, quando, ainda que de forma


precária, consegue conquistar algum espaço no território, nem
sempre tem respeitado seu direito de permanecer no lugar e de
criar raízes, pois o capitalismo predatório, juntamente com as
políticas urbanas que privilegiam interesses privados e o sistema
de circulação (ruas, rodovias e avenidas) muitas vezes acabam
por descaracterizar bairros (por exemplo, no caso de remoção
para construção de obra pública ou para reintegração de posse),
expulsando moradores das favelas, encortiçados e moradores de
loteamentos irregulares, sem-teto, sem-terra, sem-raízes, que são
despejados, removidos como se objetos quaisquer fossem.

Jock Young escreve que por meio de uma série de medidas cria-
se uma fronteira clara entre o grupo nuclear (incluídos no espaço
urbano) e os de fora (excluídos do espaço urbano).

Essas medidas são representadas:


Pelo planejamento urbano, a rede de estradas que divide cidades, o
gradeamento de propriedades privadas, o bloqueio de áreas para evitar
o acesso fácil, mas acima de tudo pelo dinheiro: o custo do transporte
público no centro, o custo dos bens nas lojas, o policiamento das áreas
nucleares, seja dos shoppings suburbanos ou dos guetos, seja por polícia
particular ou pública, são voltados para a remoção de incertezas, para
limpar as ruas de alcoólatras, doentes mentais ou simplesmente dos
que se reúnem em grupos. É uma polícia atuarial, que o tempo todo
calcula o que pode causar desordem e mal-estar, mandando circular
os inconvenientes em vez de prender os criminosos. Ela é ajudada pela
introdução disseminada de circuitos fechados de televisão (que na
verdade são mais efetivos em lidar com incivilidades do que com crimes
sérios planejados) e pela aplicação de inúmeras legislações de controle
dos comportamentos desordeiros.

90

sociologia_do_crime.indb 90 10/12/2007 10:10:53


Sociologia do Crime e da Violência

Os de fora
O grupo dos que estão fora vira bode expiatório para os problemas da
sociedade mais ampla: eles são uma subclasse, que vive no ócio e no
crime. Suas áreas são a morada de mães solteiras e pais irresponsáveis,
sua economia a da droga, da prostituição e do comércio de objetos
roubados. Eles são as impurezas sociais do mundo moderno recente, que
David Sibbley, em seu eloqüente Geographies of exclusion (Geografias
de Exclusão) (1995), vê como vítimas de geografias de saneamento
e moralização reminiscentes dos reformadores do século XIX. Mas a
diferença dos reformadores do final do século XIX até a década de 1960, o
objetivo não é eliminar fisicamente suas áreas e integrar seus membros no
corpo político, é manter à margem e excluir. (YOUNG, 2002, p. 40-41).

E a década de 90, como se configura diante do


fenômeno da exclusão?

Veja que nos anos 90 o conceito de exclusão foi reeditado


como sinônimo de não-cidadania, imprimindo um significado
dinâmico e multidimensional à palavra. A exclusão deixou de
ser vista sob o ângulo reducionista que a vinculava somente à
economia, para reconhecer que, além do desemprego, existem
outras dimensões de precariedade econômica e social, como
por exemplo “instabilidade conjugal, vida social e familiar
inadequadas, baixo nível de participação nas atividades
sociais, etc., em uma espiral viciosa de produção da exclusão.”
(SAWAIA, 2001, p. 35).

Além da exclusão do direito ao trabalho e, conseqüentemente, à


renda, os indivíduos e grupos são excluídos também das trocas
sociais e dos direitos de integração social e identidade, pois, como
conseqüências da exclusão da renda, lhes são excluídos também
o direito à habitação, educação, saúde, acesso a serviços e valores
culturais. É que a essa parcela só tem cabido a miséria. Assim,
os excluídos também podem ser identificados como miseráveis.
Segundo Léo Rosa de Andrade.

Unidade 4 91

sociologia_do_crime.indb 91 10/12/2007 10:10:53


Universidade do Sul de Santa Catarina

Aos miseráveis, pelos tempos da nossa história, só se


lhes deu a condição de miséria. Eles foram constituídos
como os pobres desta terra e se lhes foram concedidos
os guetos e a condição de peça de engrenagem do modo
de produção que vigorasse. Em um mundo que pertence
a alguns, os demais foram constituído como os outros.
A importância fundamental da afirmação, em se a
aceitando, está em compreender que o grave problema,
que tem duas partes envolvidas, está no fato de que
só uma formula o problema que pede solução. E na
formulação do problema o outro é o próprio problema.
Como a formulação do problema amarra a solução, e
como uma parte do país não está sentada entre os que
a encaminham, resta-lhe receber o que vier: ainda que
venha sobre si ou mesmo contra si, virá com o aviso
de que, se não funcionar, a culpa será sua. Não tem
funcionado e a culpa tem sido do pressuposto culpado.

No decorrer da história brasileira, o imenso contingente que


compõe a categoria pobreza, de uma forma cada vez mais
perversa, tem sido discriminado e até mesmo segregado,
sendo encarado como um grupo de indivíduos inteiramente
desnecessários ao universo produtivo, porque, ao que parece, não
há mais possibilidade de sua inclusão no mercado de trabalho e
na sociedade. É que, segundo Aldaíza Sposatti (apud SAWAIA,
2001, p. 20),

A desigualdade social, econômica e política na sociedade


brasileira chegou a tal grau que se torna incompatível
com a democratização da sociedade. Por decorrência, tem
se falado na existência da apartação social. No Brasil a
discriminação é econômica, cultural e política, além de
étnica.

Este processo deve ser entendido como exclusão, isto


é, uma impossibilidade de poder partilhar o que leva
à vivência da privação, da recusa, do abandono e da
expulsão inclusive, com violência, de um conjunto
significativo da população, por isso, uma exclusão social
e não pessoal. Não se trata de um processo individual,
embora atinja pessoas, mas de uma lógica que está
presente nas várias formas de relações econômicas,
sociais, culturais e políticas da sociedade brasileira. Esta
situação de privação coletiva é que se está entendendo
por exclusão social. Ela inclui pobreza, discriminação,
subalternidade, não eqüidade, não acessibilidade, não
representação pública.

92

sociologia_do_crime.indb 92 10/12/2007 10:10:53


Sociologia do Crime e da Violência

E essa apartação social vai desencadeando um processo pelo qual


o outro passa a ser visto como um ser à parte. É um fenômeno
que separa o outro não somente como um desigual, mas como
um não-semelhante, um não-cidadão, um ser expulso não apenas
dos meios de consumo, dos bens, serviços, etc., mas um ser
apartado do gênero humano. Isso porque, segundo Léo Rosa de
Andrade,

O outro está, sem a sua participação, constituído como


outro. Deveríamos ser eus articulados, não somos.
Poderíamos ser o outro generalizado, pois, sem dúvida,
o eu se constitui, ou surge em mim, a partir das relações
sociais com o outro. Mas há não alternativa, dado que
os outros não estão entre os eus determinantes, que
não seja admitir sua existência e reconhecer seu direito
de existir. Esta é uma condição alicerce para qualquer
desdobramento preocupado com outras possibilidades
para a sociedade.

No mundo das relações sociais, a exclusão do mercado formal


e informal de trabalho transforma o indivíduo em integrante
de um contingente populacional desnecessário ao restante da
sociedade e, via de conseqüência, fragiliza suas relações com o
outro, enfraquecendo seus vínculos, seja na família, vizinhança,
comunidade, instituições, conduzindo-o ao isolamento social e à
exclusão. Jock Young refere, ainda, que essa sociedade excludente
cria uma propensão ao individualismo e uma separação que antes
era entre classes, agora opera dentre os indivíduos de uma mesma
classe, pois os excluídos, criam uma identidade que é rejeitadora
e excludente, excluem outros mediante agressão e dispensa, e são,
por sua vez, excluídos e dispensados por outros, sejam diretores
de escola, seguranças de shoppings ou supermercados, cidadãos
“honestos” ou o policial em sua ronda.

A dialética da exclusão está em curso, uma amplificação do


desvio que acentua progressivamente a marginalidade, num
processo pírrico que envolve tanto a sociedade mais ampla como,
crucialmente, seus próprios atores, os quais, na melhor hipótese,
se metem na armadilha de uma série de empregos sem nenhuma
perspectiva, ou, na pior, de uma subclasse de ociosidade e
desespero (YOUNG, 2002, p. 31).

Unidade 4 93

sociologia_do_crime.indb 93 10/12/2007 10:10:53


Universidade do Sul de Santa Catarina

Léo Rosa de Andrade a respeito ressaltou que:

Não se trata, este conflito brasileiro, ou entre brasileiros,


de uma contenda em que as partes propugnem em
defesa de formas de busca de um bem comum. Não há
qualquer conversa. Não há relações estabelecidas entre as
partes. O que ocorre é que alguns brasileiros cravaram-
se em condições adequadas para si e outro tanto não foi
incluído, nem se lhe deu meios; nem ao menos se lhe
aludiu com inclusão. A incorporação prática deste outro
tanto nunca esteve em pauta. Não se confunda falar sobre
eles, fazê-los objeto de estudos os mais diversos com estar
e dialogar com eles.

Mariângela Belfiore Wanderley (apud SAWAIA, 2003, p. 25),


citando Elimar Pinheiro Nascimento, sobre esse contingente
excluído, anotou que:

No caso do Brasil, consideradas as particularidades


socio-econômicas, ideo-políticas e culturais, poder-se-ia
dizer que estão sendo forjados, entre nós, personagens
que são incômodos politicamente (a eles são atribuídos os
males de nossa política, os “descamisados de Collor”, por
exemplo); ameaçadores socialmente (são perigosos, pois
não são simplesmente pobres, mas bandidos potenciais
– a representação do pobre está se modificando entre
nós: a sua identidade está cada vez mais relacionada a
do bandido marginal) e desnecessários economicamente
(uma massa crescente de pessoas que não tem mais
possibilidade de obter emprego, pois são despreparados).

Constata-se a coexistência de dois Estados brasileiros: para uma


minoria o Estado do Bem-Estar e para a maioria um Estado do
Mal-Estar.

A já citada pesquisa do IBGE demonstra claramente a assertiva


acima, cabendo citar alguns trechos interpretativos extraídos do
Caderno especial que a Folha de São Paulo lançou a respeito:

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Sociologia do Crime e da Violência

Segundo o IBGE, o 1% dos mais endinheirados ganha o mesmo que os


50% mais pobres.
País fica mais rico e mais desigual.
O século 20 foi aquele em que o Brasil aumentou sua riqueza, mas não a
dividiu. Em cem anos, a riqueza total cresceu quase 12 vezes em relação à
população; no entanto, a distribuição de renda piorou na segunda metade
do século.
A concentração de renda é tão grande que, na virada do século 20 para o
21, o 1% mais rico dos brasileiros ganhava praticamente o mesmo que os
50% mais pobres.
O Brasil que encerrou o século 20 era um país mais velho, mais urbano,
mais feminino, mais alfabetizado, mais industrializado. A desigualdade é a
marca nacional, seja desigualdade de renda, racial, de gênero ou regional.
Apesar do enriquecimento, a renda ficou mais concentrada a partir de
1960 (quando estão disponíveis os primeiros dados sobre o tema). Em
1999, o 1% mais rico da população em idade ativa e com rendimento
concentrava 13% da renda – quase o mesmo que os 50% mais pobres,
13,9%.
O Brasil teve um crescimento fantástico, mas não aprendeu a dividir a
riqueza. O crescimento econômico, comparável ao de poucos países nesse
século, levou a uma evolução sem resolução de uma série de problemas,
que seguem agora para o século 21, afirma o Diretor do IBGE, Eduardo
Pereira Nunes.
De acordo com o relatório de 2003 do Pnud (Programa das Nações Unidas
para o desenvolvimento), o Brasil encerrou o século 20 com a sexta
pior distribuição de renda do mundo, perdendo apenas para Namíbia,
Botsuana, Serra leoa, República Centro-Africana e Suazilândia.
Segundo o assessor de desenvolvimento sustentável do pnud, José Carlos
Libânio, a América Latina tem os maiores níveis de desigualdade do
mundo, e o Brasil, na América Latina, é o mais desigual. (O Brasil do Século
20. Folha de São Paulo, 30 set. 2003. Especial).
Os indicadores sobre saúde reforçam que o Brasil pode e deve ser
classificado como “Belíndia”, mistura de Bélgica, país rico, com Índia,
pobre. A mortalidade infantil cai sistematicamente, e a principal causa de
morte são as doenças circulatórias (coisa de Primeiro Mundo), mas milhões
de brasileiros ainda morrem de doenças infecciosas e parasitárias típicas
de Terceiro Mundo. (País tem doenças modernas sem ter eliminado as
antigas. Folha de São Paulo, 30 set. 2003. Especial 4).
Para o historiador Nicolau Sevcenko, da USP, a associação entre
crescimento e alguma capacidade de inclusão – que foi real durante
certo período do século 20 – persiste na visão e nas expectativas que os
brasileiros têm do próprio país, embora não corresponda mais à realidade.

Unidade 4 95

sociologia_do_crime.indb 95 10/12/2007 10:10:53


Universidade do Sul de Santa Catarina

O Brasil, ele diz, comentando os números do IBGE, acompanhou o


movimento geral do século 20 de ganhos quantitativos em urbanização,
industrialização, expectativa de vida, entre outros, sem no entanto ser
capaz de realizar suficiente inclusão social, o que só piora depois que o
crescimento econômico estancou.
O problema não é tanto do quantitativo total, mas da questão
redistributiva. O país cresceu, mas não redistribuiu, não só recursos
econômicos, mas também oportunidades sociais. (O grau de segregação
aqui é extremo. Folha de São Paulo, 30 set. 2003. Especial 5).

Analisando a reportagem, pode-se dizer que há um Estado que


se apresenta máximo para uma minoria e mínimo para uma
maioria; você concorda? Você também percebeu isso?

Perceba que esse Estado mínimo, por sua vez, se eximiu


da responsabilidade de integrar os diferentes (excluídos),
transferindo a responsabilidade pela exclusão ao próprio excluído
que, como diferente, alguns inclusive passaram a serem vistos
como objetos sem nenhuma utilidade econômica. São os estorvos
que estão sendo empurrados para fora ou, em determinados
casos, incluídos em prisões, guetos, favelas, etc. Jacinto Nelson de
Miranda Coutinho (2000, p. 76) diz que

Afinal, a deificação do mercado, quando vista pelo


eficientismo, glorifica o consumidor (homo oeconomicus,
que substituiu o homo faber: Assman), mas, naturalmente,
toma o não-consumidor (excluído) como um empecilho.
Ora, para ele resta o desamor de seu semelhante, em um
mundo de competição.

No Brasil as políticas econômicas atuais, que poderiam ser


chamadas de neoliberais com capitalismo selvagem, geram
exclusão e ainda, em determinados casos, os que restaram
incluídos, assim restaram de forma precária e marginal, pois,
segundo José de Souza Martins, se incluem pessoas nos “...
processos econômicos, na produção e na circulação de bens e
serviços estritamente em termos daquilo que é racionalmente
conveniente e necessário à mais eficiente (e barata) reprodução do
capital.” (MARTINS, apud SAWAIA, 2003, p. 39).

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Sociologia do Crime e da Violência

Jacinto Nelson de Miranda Coutinho (2000, p. 78) denomina


como homo famelicus o excluído como não-consumidor, dizendo
que

No mundo globalizado neoliberal, os excluídos são


produtos do sistema, mas carregam a culpa de não terem
sabido alcançar sua inclusão (Hayek). Incluído, da sua
parte, é aquele que está dentro do mercado, consumindo
e, de conseqüência, produzindo.

O excluído, por seu turno, sobrevive das migalhas porque, à


margem do mercado (é um não-consumidor), coloca-se na
condição de descartável e, portanto, no quadro atual, mostra-
se como um empecilho, dado continuar demandando pelas
necessidades básicas (homo famelicus).

Criou-se uma sociedade unificada pela ideologia em torno do


consumo. Tal ideologia é reproduzida para as duas sociedades
que formam os “dois Brasis”. Com um simples toque no botão de
televisão, que diuturnamente entra nas casas e barracos, difunde-
se simultaneamente para ricos e pobres um mundo fantasioso
e colorido por meio da comunicação de massa, despertando
em todos o desejo de consumo de uma vida em que há espaço
para lazer, educação, habitação, paz e valores culturais, todos
componentes necessários a uma existência que possa ser vivida
com dignidade, como prometido na Carta Maior.

Unidade 4 97

sociologia_do_crime.indb 97 10/12/2007 10:10:53


Universidade do Sul de Santa Catarina

Observe que a ideologia de um consumismo dirigido


permeia o imaginário do homem comum, entretanto,
ele (o consumismo) origina uma nova desigualdade,
gerando dois mundos, uma sociedade formada
de duas partes que se excluem reciprocamente,
mas semelhantes “por conterem algumas mesmas
mercadorias e as mesmas idéias individualistas e
competitivas. No entanto, as oportunidades não são
iguais, o valor dos bens é diferente, a ascensão social é
bloqueada.” (SAWAIA, 2003, p. 39).
O que você tem a dizer sobre isso? Discuta esse
assunto. Use o espaço a seguir para expor suas idéias.

Jacinto Nelson de Miranda Coutinho (2000, p. 77) refere que

Na visão dos neoliberais, o Estado de Bem-Estar tornou-


se um mastodonte e, se por um lado é incapaz de cumprir
suas promessas, por outro mantém-se inexplicavelmente
metido nas relações individuais, mormente no mercado,
donde precisa sair de modo inadiável. É necessário,
segundo os arautos desta visão economicista, desmontar
esse Estado, rearranjando-o de forma tal que, na nova
postura, seja um Estado mínimo.

Não se deve olvidar que a política neoliberal, que está por trás
de uma sociedade de consumo, não se construiu sem um alto
preço a pagar pelas classes dominadas, pois uma das maiores
conseqüências da política neoliberal é a exclusão. Exclusão do
acesso aos bens de consumo, exclusão do emprego, inclusão do
subemprego, aliás, conforme diz Maura Pardini Bicudo Véras
(apud SAWAIA, 2003, p. 43),

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Sociologia do Crime e da Violência

...atualmente, criou-se até o neologismo “inempregáveis”


para referir-se aos contigentes que, na nova ordem
globalizada em que se insere o Brasil, não terão nenhuma
vez, numa certa visão fatalística de que a chamada
reestruturação produtiva dividirá os grupos entre
assimiláveis (empregáveis) e largo grupo excluído.

Ainda, importante registrar a análise de Jock Young (2002, p.


42) quando diz que “hoje em dia, a empresa de sucesso é aquela
que aumenta a produtividade ao mesmo tempo que despede
trabalhadores, e não a que aumenta o tamanho de seu pessoal”.

Francisco de Oliveira estima que aproximadamente


50% da população economicamente ativa está
fadada à marginalização, visto que a assombrosa
pobreza reinante, geradora da exclusão social, tem
se acentuado em decorrência do neoliberalismo
globalizado que se faz atuante na América Latina e no
Brasil.

Além disso, para essa parcela excluída não há nenhuma política


de proteção, sequer assistencialista, porque, segundo o mesmo
autor, as elites dominantes desistiram e não esboçam qualquer
intenção de integrá-la, quer na produção, quer no direito à
cidadania, “pretendem, sim, é segregar, confinar, em verdadeiro
apartheid entre classes, num crescente distanciamento e
incomunicabilidade, traço construído socialmente.” (SAWAIA,
2003, p. 43).

A política neoliberal estimula, cada vez mais, um Estado do


mercado total, em detrimento de um Estado providência e,
com isso, vai cindindo a sociedade brasileira em “incluídos x
excluídos”. Esse apartheid

se caracteriza pela criação de um campo semântico


em que os significados dos direitos e conquistas
civilizatórias, plasmados em direitos sociais, trabalhistas,
civis e políticos, são transformados em fatores causais
da miséria, pobreza e exclusão, em obstáculo ao
desenvolvimento econômico e mais, são transformados
em ausência de cidadania. A proteção social, por
exemplo, transforma-se em “custo Brasil”. (Ibid., p. 44)

Unidade 4 99

sociologia_do_crime.indb 99 10/12/2007 10:10:53


Essa parcela excluída engloba um contingente de pessoas
consideradas supérfluas ao mercado de trabalho, que se tornam,
segundo Francisco Oliveira, “desnecessárias economicamente”, e
essa ausência de possibilidade de inserção no mundo do trabalho
transforma-as em sujeitos desqualificados, impondo sobre eles um
estigma em razão de sua própria subvida vivida “em condições
precárias e subumanas em relação aos padrões ‘normais’ de
sociabilidade de que são perigosos ameaçadores e, por isso
mesmo, passíveis de serem eliminados.” (apud SAWAIA, 2003,
p. 45).

Francisco Oliveira (apud SAWAIA, 2003, p. 45) mencionou que

Esse lumpenproletariat, além de gerado pelo processo de


acumulação, é funcional ao sistema, não apenas enquanto
exército industrial de reserva, como queria Marx, mas
também, nas condições brasileiras, enquanto fator que vai
permitir que os segmentos integrados ao setor dinâmico
da economia – dos quais convém não esquecer as classe
médias – se beneficiem da existência de uma mão-de-
obra superexplorada, que vai lhes prestar serviços a custos
baixíssimos, liberando, assim, mais recursos que serão
realocados (na compra de bens de consumo duráveis por
exemplo) no setor dinâmico.

Perceba, contudo, a realidade hoje, ao que parece, sugere que


esse exército industrial de reserva, o lumpenproletariat, tornou-
se desnecessário economicamente, formando, ao invés de
reserva industrial, um exército de excluídos, que, em razão
de seu excessivo crescimento, constituir-se-ia em estorvo ao
funcionamento da sociedade, transformando-se, no dizer de
Lúcio Kowarick, no subcidadão público ou em não-cidadão (Id.).

Assim, da forma em que a realidade da sociedade brasileira se


apresenta, conclui-se que o Estado brasileiro tem se mostrado
ineficiente em cumprir com o prometido no concernente à
eficácia dos direitos inerentes ao direito do exercício de cidadania.

E assim, constata-se que o princípio da eficiência, tal como


ocorre com outros princípios constitucionais, tem se revelado
um instrumento ineficaz para a efetivação dos direitos de
cidadania e para a construção de uma sociedade verdadeiramente
democrática, justa e igualitária.

sociologia_do_crime.indb 100 10/12/2007 10:10:53


Sociologia do Crime e da Violência

Nesse diapasão, contudo voltada à questão da criminalidade, a


criminologia radical realizou especial estudo ao levantar como
uma de suas principais causas (da criminalidade) a ineficiência ou
falta de estrutura do Estado, conforme adiante será abordado.

SEÇÃO 3 - A criminologia radical


A criminologia radical surgiu na década de 70, no século XX,
simultaneamente nos Estados Unidos e na Europa (Inglaterra,
Alemanha, Itália, França). Nos Estados Unidos, o berço dessa
corrente foi a Escola Criminológica da Universidade Berkeley,
sob a coordenação dos sociólogos Schwendinger e T. Platt,
enquanto que na Inglaterra despontou a partir da Conferência
Nacional de Desviação, liderada por Ian Taylor, Paul Walton e
Jock Young, que inclusive editaram os mais conhecidos tratados
dessa perspectiva criminológica, intitulados: The new criminology:
for a social theory of deviance (1973) e A criminologia crítica (1975).

O principal postulado da criminologia radical é negar a definição


de crime, pois aceitá-la seria admitir que o direito é neutro.

Essa perspectiva criminológica parte de uma mesma raiz comum


ao restante da criminologia crítica, contudo, diverge dela ao
se apresentar como uma criminologia de cunho marxista,
utilizando-se da teoria de Marx para explicar o fenômeno
do crime e também de seu controle. Estuda os sistemas de
exploração existentes na sociedade capitalista, que interpõem
a criminalidade, como racismo, sexismo, imperialismo, dentre
outros.

Juarez Cirino dos Santos (1981, p. 86), em sua obra A criminologia


radical, diz que o objeto geral dessa corrente “são as relações
sociais de produção (estrutura de classes) e de reprodução
político jurídica (superestruturas de controle), que produzem
e reproduzem através dos processos de criminalização e de
execução penal, o objeto específico de conhecimento: o crime e o
controle do crime”.

Unidade 4 101

sociologia_do_crime.indb 101 10/12/2007 10:10:54


Universidade do Sul de Santa Catarina

O processo de criminalização (produção e aplicação


de normas penais) protege seletivamente os
interesses das classes dominantes, pré-seleciona os
indivíduos estigmatizáveis (classes dominadas) e
administra a punição pela posição de classe (variável e
independente) complementada pela posição precária
no mercado de trabalho e pela subsocialização
(variáveis intervenientes). (Ibid., p. 86-87).

Os defensores da criminologia radical consideram que a


criminologia, vista pela perspectiva tradicional, exerce
uma função tecnocrática que tem por finalidade garantir
a permanência do sistema vigente, enquanto que a base
da criminologia radical são as classes trabalhadoras e seu
compromisso de luta contra todos os sistemas de exploração
existentes, principalmente na sociedade capitalista, como por
exemplo, o imperialismo, racismo, sexismo, e contra todas as
formas de opressão social, buscando, por fim, a construção do
socialismo e a elaboração científica de uma teoria marxista do
direito (e do crime), dentro da sociedade capitalista. (DIAS;
ANDRADE, 1992. p. 56-60).

Juarez Cirino dos Santos (1981), a respeito dessa perspectiva


criminológica, expressou que:

O trabalho científico da criminologia radical tem


por base o conceito de Direito como lei do modo de
produção, que reproduz as relações sociais de classes, e o
conceito de Estado como organização política do poder
(de classe), que controla as relações sociais nos limites
do modo de produção: fenômenos superestruturais
condicionados pelas relações de produção e
hegemonizados pela classe que domina essas relações
(aspecto principal da contradição).

A criminologia radical, com base nas contradições de classes da


sociedade, distingue um conceito burguês de crime (em geral,
correspondente à posição de classe da burguesia), representado
pela definição legal (predominância de ações contrárias às
relações de produção), e um conceito proletário de crime (em
geral, correspondente à posição de classe do proletariado),
representado por definições reais e operacionais de relações

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Sociologia do Crime e da Violência

sociais danosas (predominância de ações contrárias à segurança


pessoal e à igualdade social, econômica e política), mudando o
foco da forma legal para as condições estruturais (necessárias e
suficientes) do crime. (Ibd., p. 88).

Trazendo essa teoria para a realidade do país, em que a maior


parte da clientela penal é formada por praticantes de pequenos
delitos contra o patrimônio – parcela da população à qual resta
a prática desse delito como uma das únicas formas de acesso aos
bens de consumo – poder-se-ia dizer que o Estado brasileiro
– ante a desigualdade social que mantém e perpetua – é o maior
responsável, ou melhor, o culpado pela seleção e inclusão da
clientela do sistema penal.

A criminologia radical, a gramática da exclusão como fator que leva à


desviação primária
Analisando a história brasileira, constata-se que o processo de
exclusão a permeia por mais de 500 anos. Tal processo nasceu
juntamente com a descoberta do território brasileiro pelos
portugueses. São mais de 500 anos de exclusão do processo
social de um contingente formado por índios, negros, mulheres,
desempregados, descamisados, sem-teto, sem-terra, enfim, os
miseráveis de todo gênero.

O Estado brasileiro, ao longo de toda a sua história, se mostrou


ineficiente na concretização dos direitos inerentes à formação
de um cidadão digno. Aliás, esses direitos foram consolidados
somente para uma minoria.

O Estado pátrio se mostrou, na verdade, altamente


eficiente na construção e sustentação de uma nação
desigual, que figura, sob tal rótulo, em um dos
primeiros lugares do ranking mundial. É um dos
países onde simultaneamente convivem as pessoas
mais ricas e as mais miseráveis do mundo. “O Brasil
é o mais rico entre os países com maior número
de pessoas miseráveis. Isso torna inexplicável a
pobreza extrema de 23 milhões de brasileiros...”
(MENDONÇA, 2002. p. 82).

Unidade 4 103

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Essa miséria espantosa torna-se inaceitável num país tão


rico como no Brasil. Trazendo a questão da exclusão para a
esfera penal. Loïc Wacquant (2001, p. 08-09), direcionando à
sociedade brasileira, escreveu:

Em primeiro lugar, por um conjunto de razões ligadas


à sua história e sua posição subordinada na estrutura
das relações econômicas internacionais (estrutura de
dominação que mascara a categoria falsamente ecumênica
de “globalização”) e a despeito do enriquecimento
coletivo das décadas de industrialização, a sociedade
brasileira continua caracterizada pelas disparidades
sociais vertiginosas e pela pobreza de massa que, ao se
combinarem, alimentam o crescimento inexorável da
violência criminal, transformada em principal flagelo
das grandes cidades. (...) O crescimento espetacular
da repressão policial nesses últimos anos permaneceu
sem efeito, pois a repressão não tem influência alguma
sobre os motores dessa criminalidade que visa criar uma
economia pela predação ali onde a economia oficial não
existe ou não existe mais.

Observe como toda essa exclusão se transforma numa inclusão,


contudo, perversa, pois inclui (no sistema penal) os cidadãos
como sujeitos estigmatizados, considerados nefastos ou perigosos
à sociedade, ou melhor, inclui como uma categoria social ou
grupo que sequer pode ser reconhecido como sujeito, pois nem
eles próprios se reconhecem como tal e, via de conseqüência,
acabam não atuando como sujeitos. Essa situação veio estampada
na revista Isto É, ao trazer dados estatísticos acerca do perfil do
preso no Brasil, mostrando que 95% dos presos são pobres ou
muito pobres, 65% são negros e mulatos, 65% não completaram
o primeiro grau e 12% são analfabetos (Fora de Controle. Isto É,
17 set. 2003. p. 41).

Alessandro Baratta (1999, p. 172), ao tratar também da questão


da exclusão, diz que:

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Sociologia do Crime e da Violência

Sob o pesado véu de pudor e da falsa consciência que


aqui se estende, não sem a contribuição de uma parte
da sociologia oficial, com a imagem falaz de uma
“sociedade das camadas médias”, a estratificação social,
isto é, a desigual repartição do aceso aos recursos e
às chances sociais, é drástica na sociedade capitalista
avançada. O ascenso dos grupos provenientes dos
diversos níveis da escala social permanece um fenômeno
limitado ou absolutamente excepcional, enquanto o
auto-recrutamento dos grupos sociais, especialmente dos
inferiores e dos marginalizados, é muito mais relevante
do que parece à luz do mito da mobilidade social.

A imensa maioria dos que ingressam no sistema penal pelo


cometimento dos delitos contra o patrimônio é constituída
justamente pela parcela da sociedade excluída do direito
de consumo, ou seja, aqueles que não conseguem ascender
socialmente pelos meios tidos como “normais”.

Da obra As prisões da miséria, de Loïc Wacquant,


extrai-se o que vem acontecendo nos Estados Unidos
e que também serve para a realidade brasileira, ou
seja, é preciso esconder do mundo e da sociedade
toda “podridão” gerada por um sistema capitalista
neoliberal – para não dizer um sistema capitalista
selvagem – regido por regras de mercado-total, em
primeiro lugar, ficando relegado às pessoas somente
aquilo que não o atrapalha.
É preciso esconder toda exclusão social e miséria por
ele geradas, representada por um “Menos Estado”
econômico-social e um “Mais Estado” penal e
penitenciário

Constata-se que o Estado brasileiro tem se mostrado


completamente ineficiente no cumprimento da promessa contida
no início de sua Lei Maior, qual seja, implementar os direitos
básicos de cidadania. A criminalidade contra o patrimônio
tem aumentado na mesma proporção do crescimento da
miséria no país. Pode-se dizer que tais fatores (ineficiência do
Estado e miséria) se encontram intimamente ligados e a eles
é possível atribuir boa parte das causas de desviação primária,
principalmente nos delitos contra o patrimônio.

Unidade 4 105

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Assim, segundo Segungo Jacinto Coutinho (2000, p. 83),


“Produzidos os excluídos, neste campo, quiçá sua única chance
de manterem-se no sistema seja através da prisão (Forrester)” e
“é assim que se sataniza o excluído, sem se questionar nada (as
razões que o levaram a tanto, como seria primário, em primeiro
lugar) bastando o agente estar naquela situação”.

- Você chega ao final do livro didático desta disciplina. Realize, a


seguir, as atividades de auto-avaliação, leia com atenção a síntese
da unidade e procure aprofundar seus conhecimentos com pesquisas
complementares.

Atividades de auto-avaliação

Nesta unidade é apresentada uma questão que servirá para uma


reflexão dos temas tratados nas seções que você estudou.

1. Aponte elementos que você considera importantes para a


compreensão do processo de exclusão na sociedade brasileira, levando
em conta aspectos histórico-sociais destacados ao longo do estudo.

106

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Sociologia do Crime e da Violência

Síntese

Nesta unidade você estudou questões sobre exclusão/inclusão


e sua relação com as diversas brasileiras, sociais, econômicas e
culturais. Viu elementos que situam os direitos humanos como
espaço de cidadania e pode verificar que as relações sociais e de
trabalho favorecem ou não um quadro de exclusão/inclusão na
sociedade.

Teve oportunidade de ver também que a criminologia deve


ser entendida a partir das circunstâncias sociais e que deve ser
analisada sob suas várias faces da justiça da (in) justiça dela
decorrente e que a própria sociedade exclui para incluir e esta
transmutação é condição da ordem social desigual, o que implica
o caráter ilusório da inclusão.

Saiba mais

Aprofunde seus conhecimentos lendo as obras citadas nesta


unidade. Faça as leituras fazendo relações com os conteúdos que
você já estudou e com a sua prática, principalmente se você atua
na área de segurança pública.

Unidade 4 107

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sociologia_do_crime.indb 108 10/12/2007 10:10:54
Para concluir o estudo

Parabéns! Você chegou ao final do Estudo da Disciplina


“Sociologia do Crime e da Violência”. Espero que você
tenha feito excelentes relações com sua prática e com
experiências de outras disciplinas.

Continue aprimorando seus conhecimentos fazendo


leituras e pesquisas complementares, pois você deve ter
percebido que diante da complexidade dos assuntos não
seria possível aprofundar com mais detalhes os conteúdos
discutidos em cada unidade.

Profa. Ana Cristina Borba Alves.

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sociologia_do_crime.indb 110 10/12/2007 10:10:55
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Sobre a professora conteudista

Ana Cristina Borba Alves

Professora de Criminologia e orientadora de projetos e


monografias do Curso de Direito da UNISUL - Campus
Tubarão.

Professora de Processo Penal I e Coordenadora do


Núcleo Temático de Direito Penal, Processo Penal
e Criminologia do Curso de Direito da UNISUL -
Campus Araranguá.

Mestranda em Direito Penal – UNISUL.

Mestranda em Ciências Criminais – PUCRS.

Juíza de Direito estadual - Comarca de Capivari de


Baixo.

A unidade 3 “O policiamento comunitário como


alternativa à Segurança Pública” tem a co-autoria
de Peterson do Livramento, graduado em Segurança
Pública e formando no curso de Direito da UNISUL.

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Respostas e comentários das
atividades de auto-avaliação

Unidade 1
É importante verificar que a análise sobre o criminoso, não
são neutras, mas trazem diferentes entendimentos sobre
as razões da criminalidade. Note que em cada notícia pode
conter diferentes interpretações.

Unidade 2
Merton afirma que a sociedade americana não oferece
caminhos legais para que os cidadãos ascendam socialmente.
Dessa forma, favorece a prática de condutas irregulares. Na
sociedade brasileira, essas oportunidades também não estão
colocadas, dessa maneira há um campo fértil para as práticas
irregulares.

Unidade 3
A resposta à questão desta unidade é pessoal e vai depender
de suas inferências sobre à questão pontuada.

Unidade 4
Resposta pessoal

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Você também pode gostar