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O inquérito instaurado ex o�cio pelo STF para �ns de investigar as fake news (notícias falsas) e ameaças praticadas em
detrimento dos Ministros da Corte (com fundamento no artigo 43 do regimento interno) reveste-te de
inconstitucionalidade patente, por violação aos princípios constitucionais do sistema acusatório (separação das
funções de julgar, acusar e defender, a teor do disposto no art. 129, I, da CF/88), e do Juízo Natural previsto no art.5º, LIII,
da Constituição Federal (garantia fundamental do cidadão de que será julgado pelo Juízo competente
e imparcial, vedando a incidência do intitulado “ juízo ou tribunal de exceção”, conforme artigo 5º, XXXVII, da Carta
Magna).
Com efeito, as violações ao Juízo natural e ao sistema acusatório se consubstanciam pela incidência de uma investigação
presidida e efetivada por um Ministro Relator, sem que fosse previamente submetido à livre distribuição e encaminhada
ao Ministério Público para manifestação em relação à conveniência legal da continuidade das investigações, na condição
de titular da ação penal pública e �scal da ordem jurídica.
Além disso, em razão da ausência de fato determinado, a investigação viola os princípios do Estado Democrático de
Direito, segurança jurídica, devido processo legal, legalidade, e razoabilidade, uma vez que propicia investigações, sem
direcionamento especí�co em relação à individualização dos investigados e dos fatos supostamente típicos.
Não se pode olvidar que a então procuradora-geral da República Raquel Dodge requereu o arquivamento da
mencionada investigação, tendo sido negado o pedido pelo Ministro Alexandre de Moraes, sob a equivocada premissa de
que a privatividade da ação penal pública não teria conferido ao Ministério Público a possibilidade de ” interpretar o
regimento da corte e anular decisões judiciaios do Supremo Tribunal Federal” (STF, Inquérito 4781, Rel. Alexandre de
Moraes,j.16/04/2019).
Nesse ponto, é válido registrar que, em situação semelhante, a Suprema Corte (por intermédio do mesmo Ministro
Relator Alexandre de Moraes) declarou a inconstitucionalidade de regimento interno do TJBA ( Tribunal de Justiça do
Estado da Bahia), em razão da previsão no aludido diploma normativo da incidência de investigação de magistrados, sem
a participação do Ministério Público, inclusive mediante a inconstitucional hipótese de efetivação de arquivamento pelo
próprio Judiciário, in verbis:
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A liberação para apreciação pelo plenário do STF do anômalo inquérito... https://www.leandrobastosnunes.com.br/a-liberacao-para-apreciacao-pel...
judicial” (STF, Pet. 3.825/MT, Rel. Min. GILMAR MENDES), fazendo cessar toda e qualquer ilegal coação por parte do Estado-
acusador (HC 106.124, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 22/11/2011, DJe de 10/9/2013). 2.
Flagrante inconstitucionalidade do artigo 379, parágrafo único do Regimento Interno do Tribunal de Justiça da Bahia,
que exclui a participação do Ministério Público na investigação e decisão sobre o arquivamento de investigação contra
magistrados, dando ciência posterior da decisão. 3. Medida Cautelar con�rmada. Ação Direta de Inconstitucionalidade
conhecida e julgada procedente (STF, ADI 4693, Pleno, Rel. Alexandre de Moraes, j. 11/10/2018).
Ora, o que a Suprema Corte está estabelecendo é a possibilidade de investigar (de ofício) fatos generalizados e
posteriormente julgá-los, violando frontalmente o princípio da imparcialidade do Poder Judiciário, assim como o
disposto no artigo 8º da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, a qual prescreve:
“1. Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal
competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal
formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, �scal ou de qualquer
outra natureza”.
Além disso, se a própria Corte Superior tipi�car supostos fatos, atribuindo a existência de indícios de crimes, sem ouvir
previamente o titular da ação penal ( Ministério Público), indaga-se: depois de concluída a apuração, poderia o Supremo
rejeitar o pronunciamento do titular da ação penal ( no sentido do arquivamento das apurações ou oferecimento de
denúncia)?
Neste caso, a situação con�gurará uma grave incoerência jurídica, já que o titular da ação penal receberá os autos de
uma investigação, na qual sequer teve a oportunidade de emitir parecer ou pronunciamento acerca das diligências
investigatórias promovidas ex o�cio pelo Poder Judiciário.
Conforme recentemente veiculado na mídia, o Ministro Alexandre de Moraes determinou a inclusão em pauta do
mencionado inquérito para �ns de deliberação pelo plenário (https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-
estado/2019/09/03/moraes-pede-para-inquerito-das-fake-news-ser-incluido-na-pauta-do-plenario-do-stf.htm
(https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2019/09/03/moraes-pede-para-inquerito-das-fake-news-
ser-incluido-na-pauta-do-plenario-do-stf.htm )).
No que se refere à conduta do então procurador-geral da República (Rodrigo Janot), as declarações veiculadas para a
imprensa são atípicas , porquanto o iter criminis não se iniciou, �cando restrito à mera cogitação de praticar a conduta
típica de homicídio ou lesão corporal em detrimento do Ministro Gilmar Mendes, não con�gurando sequer tentativa dos
delitos previstos nos artigos 121 do código penal, e dos arts. 18,22,23,26 27, todos da Lei de segurança nacional (Lei
7.170/83).
Relativamente ao crime previsto no artigo 286 do código penal (incitação ao crime), este também não se con�gurou,
visto que o então PGR declarou fato relacionado a um pensamento que teve na época em que exercia a função de
procurador-geral da República, com o �m de antecipar o conteúdo de sua biogra�a materializada em um iminente
lançamento de livro, inexistindo qualquer elemento comprobatório de que teria agido com a intenção de incitar, de forma
indeterminada, um conjunto de pessoas para �ns de cometerem delitos em detrimento dos Membros da Corte Superior.
Outro ponto a ser destacado é o fato de que Rodrigo Janot não se submete à jurisdição do STF, porquanto não detém
mais a prerrogativa de foro, ou seja, de ser julgado por eventuais condutas criminosas perante a Suprema Corte.
De outro lado, a cogitação do fato ocorreu há 02 (anos), inexistindo, portanto, a contemporaneidade necessária para a
decretação das medidas cautelares restritivas de direitos (apreensão da arma e proibição de aproximação das
dependências do STF), em razão da inexistência de comprovação dos requisitos do periculum libertatis (urgência e
necessidade relacionadas à adoção de medidas restritivas de direitos) e fumus commissi delict (“plausibilidade da
existência de um delito”).
Nesse ponto, o correto seria abrir uma investigação (a ser conduzida pelo Ministério Público ou Polícia Federal, sob a
supervisão da legalidade pelo STF), e, caso comprovada a persistência da intenção de cometer delitos em detrimento de
Ministros da Corte, decretar medidas que visassem assegurar a integridade física e psicológica dos Membros da Suprema
Corte (após o respectivo pedido do Ministério Público ou representação da autoridade policial), e não proceder à
decretação da providência cautelar de ofício em relação a fatos atípicos e de forma extemporânea.
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A liberação para apreciação pelo plenário do STF do anômalo inquérito... https://www.leandrobastosnunes.com.br/a-liberacao-para-apreciacao-pel...
Com efeito, os meros atos de cogitação, que não chegam a se exteriorizar mediante início de conduta típica
(engatilhamento da arma e direcionamento para a vítima, tentando, no mínimo, consumar o “plano criminoso”, por
intermédio da realização de disparos) são impuníveis , conforme lições doutrinárias pací�cas do direito penal brasileiro.
Por derradeiro, cumpre registrar que, relativamente à conduta do então procurador-geral da República, a análise deste
articulista �cou adstrita apenas aos aspectos jurídicos do direito constitucional, penal e processual penal atinentes ao
inquérito e medidas decretadas pela Suprema Corte , �cando de fora qualquer avaliação e juízo de valor sob as esferas
moral, administrativa e ética.
Como visto, diante da notícia de deliberação (pelo plenário da Suprema Corte) da respectiva legalidade e
constitucionalidade das medidas de ofício adotadas no bojo do “anômalo inquérito” iniciado pelo Supremo Tribunal
Federal, espera-se que seja reconhecida a impossibilidade de prosseguimento das apurações, sem prévia manifestação do
Ministério Público.
* O autor é professor de pós-graduação do instituto de ensino Brasil Jurídico, autor de obras jurídicas, articulista,
e procurador da República.
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