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Bibliografia.
ISBN 978-85-430-0290-3
14-00644 CDD-170
Fevereiro 2014
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Apresentação.............................................................................................. VI
Referências bibliográficas..................................................................143
discussões para reflexões. Além disso, possuem uma estrutura didática que propõe uma di-
nâmica única, a qual convida o leitor a levar para seu dia a dia os aspectos teóricos apresen-
tados. Veja como isso funciona na prática:
A seção “Panorama” aprofunda os tópicos abordados ao mostrar como eles funcionam na
prática, promovendo interessantes reflexões.
Panorama
Leia o texto abaixo para responder às questões 1 e 2. disso, esse posto cobrava preços mais elevados
Marcos Sampaio, gerente de Recursos Huma- que os demais postos da cidade.
nos da empresa Modelo, companhia que atua Ora, por que então eles escolhiam aquele posto
no setor de vendas de planos de saúde, está para abastecer e fazer a manutenção do carro?
enfrentando um dilema. Marcos recentemente Simples: em razão do alto número de abasteci-
muito tempo.
necessidades, fazemos uso dessas relações sociais. Somos parte
da sociedade mais ampla chamada humanidade, interagimos com
outras pessoas que habitam na mesma região geográfica que nós.
Além disso, desenvolvemos relacionamentos específicos com de-
terminadas pessoas para também alcançar objetivos. Assim, pode-
mos dizer que o homem participa de várias sociedades ao mesmo
tempo, em diferentes níveis e tipos, dos objetivos e interesses que
Boa leitura!
mantêm a sua sobrevivência.
Temas
1 – O que é filosofia?
Você certamente já ouviu falar em filosofia, mas talvez não saiba ao
certo defini‑la. No primeiro capítulo deste livro, você vai conhecer o
significado da palavra filosofia, além de entender sua importância
para a evolução do conhecimento.
2 – Filosofias brasileiras
Você sabia que existe filosofia também no Brasil? Apesar de ser me-
nos conhecida, a filosofia brasileira é importante para nossa trajetó-
ria histórica. Neste tema, você vai conhecer os principais pensadores
da filosofia brasileira, suas influências e seu papel no desenvolvimen-
to das ideias no Brasil.
3 – Filosofia hoje
Neste tema, você vai ver um panorama da filosofia hoje, no mundo e
no Brasil, com destaque para algumas áreas de aplicação, sua relação
com as profissões e a maneira como ela é ensinada.
Introdução
Você sabe o que é filosofia? Certamente é algo de que já ouviu falar,
mas talvez não saiba, com exatidão, explicar o que é. Isso é normal − até
porque cada um tem sua própria definição do que é filosofia.
O que é filosofia?
Filosofia em 140 caracteres
“O que é filosofia para você?” Ao fazer essa pergunta a
variadas pessoas, certamente ouviríamos respostas bem distin-
tas. Procure redigir você mesmo sua resposta, em poucas pala-
vras. Depois, você pode retornar a ela, revisá‑la e compará‑la
com as apresentadas a seguir. Elas foram enviadas por canais
de comunicação na Internet e o desafio era responder em 140
caracteres:
@holanda74: É o exercício de criatividade e de terapêutica
sobre as eternas dúvidas da condição humana.
@educacaoonline: Filosofia é a oportunidade de pensar sobre
o que realmente existe, na esperança de saber quem se é. (Fer-
nando Pimentel)
@pgentil: É descobrir a realidade através de questionamentos
importantes da nossa existência utilizando a razão.
@retorta: É a capacidade de construir raciocínios lógicos e
sustentáveis.
@Luciano Gamez: Apoiando-se na história do pensamento
ocidental, a filosofia nasce na Grécia (séc. VI a.C.) e promove a
passagem do saber mítico ao racional.
@RenataKordeiro: Filosofia é a arte de pensar quando tudo
parece ser vão e encontrar uma finalidade para tudo o que
ocorre.
O que é filosofia?
Como você deve desconfiar, a origem da palavra filosofia está
no grego. Repare no significado dos elementos que a formam:
phílos = amigo + sophía = sabedoria, conhecimento, saber
Na Grécia antiga, o filósofo era considerado amigo ou amante
da sabedoria. Filosofia significava amor ao saber. Para os gregos
antigos, o espanto e a admiração em relação à vida e à realidade
levavam os homens a filosofar.
Entretanto, o que hoje chamamos de filosofia mudou ao longo
da história da humanidade. Na Antiguidade, as diferenças entre
ciência e filosofia não eram muito claras, e os primeiros filósofos
foram também os primeiros cientistas. Pode‑se dizer que a filoso-
fia é a “ciência‑mãe”, da qual pouco a pouco foram se separando
formas de pensar e métodos que mais tarde se especializaram e se
tornaram independentes − essas formas de pensar e métodos são
aquilo que hoje você chama de ciência.
Como afirma Lindberg (1983, p. 511):
Não existia nada na Antiguidade correspondendo à ciência mo-
derna como um todo, ou a ramificações da ciência moderna tais
como a física, a química, a geologia, a zoologia e a psicologia. Os
temas dessas disciplinas modernas pertenciam todos à filosofia
natural e, portanto, a um projeto filosófico mais amplo.
Exemplo
Quer um exemplo de senso comum? Todo cozinheiro sabe que não pode
ficar abrindo o forno enquanto um bolo assa, senão fica solado. Como a
pessoa aprende isso? Fazendo um curso de física para conhecer o efeito
do ar frio sobre a massa? Não. Simplesmente ouvindo amigos e familiares
mais experientes. O conhecimento do senso comum é construído por
tentativa e erro e passado pelo boca a boca, de geração a geração.
Teoria Aperfeiçoamento
(abstração) (abstração)
Observação Teste
(realidade) (realidade)
Empírico (senso comum) – conhecimento que usamos para orientar nossas ações no dia a dia. É o que
nos leva, por exemplo, a não tirar algo do forno quente sem nos protegermos.
Teológico – conhecimento religioso, que em geral não aceita ser questionado. É o que guia as crenças
religiosas.
Espiritual – conhecimento que algumas pessoas utilizam com mais habilidade que outras, nas decisões
intuitivas e que não se baseiam em lógica, mas em elementos pouco tangíveis. Possibilita, por exemplo,
que uma pessoa tenha pressentimentos em relação a situações, pessoas etc., guiando assim suas ações.
Artístico – conhecimento relacionado à produção e apreciação de obras de artes. Permite, por exemplo,
que artistas como Tom Jobim componham músicas lindas e que críticos possam produzir leituras instigan-
tes de obras de arte.
Científico – conhecimento que normalmente os cientistas utilizam em suas descobertas e teorias. Possibi-
litou, por exemplo, que Einstein produzisse sua teoria da relatividade.
Filosófico – conhecimento que vamos explorar neste livro. Ele inspirou brilhantes pensadores como Nietz
sche, Sartre e Platão.
com Carraher (1993), enquanto pensador crítico, você precisa to- a mesma raiz de
conhecer. Ela diz
lerar e mesmo preferir estados cognitivos de conflito, em que o
respeito a nossos
problema ainda não esteja totalmente compreendido. Se ficar an-
processos mentais
sioso por não saber “a resposta correta”, isso pode impedir a ex-
relacionados à
ploração mais completa do problema.
aprendizagem, à
Como dito, o senso crítico exige tolerância a estados cognitivos
percepção, à memória e
de conflito, ou seja, a capacidade de permanecer em dúvida enquan-
ao próprio raciocínio.
to se exploram conceitos. A luz não aparece de imediato, ela pode
Filosofias brasileiras
Neste tema, você vai conhecer os principais pensadores da fi-
losofia brasileira, suas influências e seu papel no desenvolvimento
das ideias no Brasil.
Em Crítica da razão tupiniquim, obra de 1977, Roberto Go- trecho, ele ergue o
brado “contra todos os
mes discute a falta de originalidade da filosofia brasileira, que re-
importadores de
fletiria nossa colonização e dependência cultural. Gomes aponta a
consciência enlatada”.
ausência de uma tradição filosófica e de um pensamento brasilei-
ro: temos autores de obras filosóficas, não filósofos. O pensamen-
to do brasileiro não estaria baseado na realidade brasileira, mas,
ao contrário, na mera assimilação de ideias estrangeiras, estranhas
à nossa realidade.
Saiba mais
Chamamos de doutrinas contratualistas aquelas que defendem a ideia de que os
seres humanos estão em pé de igualdade: ninguém “pode mais” do que o outro
apenas porque nasceu rico, ou porque pertence à nobreza ou a determinada et-
nia. Quem pensa desse modo acha que as pessoas devem estabelecer contratos
(explícitos ou não) para viver em sociedade. A representação política, por exem-
plo, é uma forma de contrato: você vota em um deputado e fica “combinado” que
ele vai representá‑lo na Câmara.
Período colonial
A história da filosofia nacional deveria começar com as cos-
movisões (visões do Cosmos), os costumes, a mitologia e a arte
dos índios que habitavam nosso país antes da chegada dos portu-
gueses. Você conhece algum registro escrito das crenças ou da
“filosofia” indígena brasileira?
A filosofia indígena chegou até nós oralmente, por meio da vi-
são de intérpretes, o que pode carregar distorções e interpretações
equivocadas. Ainda precisamos aguardar que a filosofia dos “brasi-
líndios” seja reconstruída com o estudo de documentos históricos.
Período imperial
Você sabe quem foi Frei Caneca? O pernambucano Joaquim
da Silva Rabelo, também chamado Frei Joaquim do Amor Divi-
no Rabelo, ou simplesmente Frei Caneca (1774-1825), foi uma
personalidade de destaque na transição da Colônia para o Impé-
rio. Ele criticava o absolutismo e a concentração de poder na
figura do imperador, propondo a independência e um governo
constitucional.
Reivindicava, ainda, a participação ativa do clero na vida
política brasileira, com o argumento de que as sociedades ci-
vis nasciam do mandamento divino. Em defesa dessas ideias,
Frei Caneca se envolveu intensamente em diversos movimen-
tos políticos radicais, como a Revolução Pernambucana (1817)
e a Confederação do Equador (1824), além de ter atuado como
jornalista.
Fique atento
Depois que os jesuítas foram expulsos, na segunda metade do século XVIII, en-
trou em voga uma nova concepção de filosofia, que se reduzia à ciência aplica-
da. Era o chamado empirismo mitigado. Mas, no Império, o empirismo mitigado
também ficou para trás, e a filosofia brasileira passou a ser dominada pelo ecle‑
tismo espiritualista, inspirado nos pensadores franceses Maine de Biran (1766-
1824) e Victor Cousin (1792-1867). O ecletismo espiritualista (ou espiritualismo
eclético), que pode ser considerado a primeira corrente filosófica estruturada no
Brasil, procurou fundir ideias de vários sistemas filosóficos, incorporando‑as à
tradição brasileira. A filosofia intuicionista de Maine de Biran buscava conciliar o
sensualismo e o racionalismo; Victor Cousin, por sua vez, pregava a fusão do
historicismo, do psicologismo e do espiritualismo como método.
Período republicano
Com a Proclamação da República, o país começou a se rees-
truturar do ponto de vista administrativo. A partir de então, surgi-
ram importantes instituições culturais no país. No final do século
XIX, foram fundadas escolas superiores, institutos de pesquisa
(como o Instituto Butantan, em São Paulo, e o Instituto Oswaldo
Cruz, no Rio de Janeiro, ambos em 1899) e comissões geográficas
e geológicas. Além disso, um grande número de faculdades pas-
sou a oferecer o ensino superior de filosofia.
Filosofia hoje
Neste tema, você vai ver um panorama da filosofia hoje, no
mundo e no Brasil, com destaque para algumas áreas de aplicação
Administração
Saiba mais
Você acha estranho que um administrador precise ter conheci-
Uma dica de leitura mentos sobre filosofia? A princípio, pode parecer que sim. Afinal,
especial para os a administração deve sempre estar atenta ao mercado, não é mes-
administradores mo? E o filósofo não vive no mundo da lua, nas nuvens?
interessados em Ao contrário, Roberto de Mello e Souza defende a ideia de que
filosofia é: MATTAR, o executivo, no mundo moderno, precisa ampliar seus horizontes
João. Filosofia e ética na intelectuais para não correr o risco de se tornar apenas um técnico,
administração. 2. ed. São em vez de um verdadeiro administrador.
Paulo: Saraiva, 2010.
Para tema, escolhi algumas notas sobre história da filosofia cujo
estudo tanto me tem alegrado, formado e desenvolvido, me
tem ensinado literalmente a “pensar” melhor e portanto a enxer-
gar mais claramente meu mundo de administrador profissional,
a tomar decisões mais adequadas, a ter mais equilíbrio, a ser
Link mais criativo, a julgar com mais sabedoria. (Mello e Souza,
Para compreender um 1992, p. 15)
pouco mais como
funciona a filosofia
clínica, você pode ler Filosofia clínica
on‑line o livro Filosofia Você conhece a filosofia clínica? É um interessante campo
clínica − Propedêutica de de atuação para filósofos, próximo da atuação dos psicólogos.
Lúcio Packter, disponível A filosofia clínica é parte da filosofia acadêmica direcionada
em: <www. ao consultório, à clínica. É uma atividade realizada em hospi-
filosofiaclinica.com.br/
tais, escolas e instituições por todo o país. Com base nos traba-
Filosofia_Clnica_-_
lhos do filósofo gaúcho Lúcio Packter, desde o final dos anos
Propedeutica.pdf>.
1980, essa vertente se difundiu no Brasil e no exterior.
Há diversos centros pelo país que oferecem cursos de filoso-
fia clínica. Eles são autônomos uns dos outros, ainda que todos
respeitem o código de ética e o estatuto do filósofo clínico. Todos
eles também têm um programa em comum: historicidade, exames
das categorias, estrutura do pensamento, procedimentos clínicos,
Fique atento planejamento clínico e ética profissional. A partir dessa base, cada
centro coloca algumas disciplinas complementares que digam
A filosofia clínica é um
bom exemplo da
respeito às peculiaridades da região onde funciona. Por exemplo:
aplicação direta da antropologia filosófica, lógica, tradição regional etc.
filosofia em uma A parte teórica do curso de formação em filosofia clínica cos-
profissão que, aliás, foi tuma durar de 18 a 24 meses. Se o aluno tiver interesse em ser um
criada em nosso país. pesquisador, sem atividade de consultório, pode acompanhar as
aulas, fazer os trabalhos solicitados e depois se registrar na
Exercícios de fixação
1. Qual é o significado etimológico da palavra 4. Em quais períodos históricos a filosofia brasi-
filosofia, isto é, o significado ligado à sua ori- leira pode ser dividida?
gem, na língua grega? 5. Quais são as principais vertentes da filosofia
2. O que é filosofia para você? brasileira contemporânea?
3. Além do conhecimento filosófico, que ou- 6. O que é filosofia clínica?
tros níveis de conhecimento poderíamos 7. Mencione uma razão para ensinar filosofia
citar? para crianças.
Panorama
A morte, como experiência humana, também familiares ou de seu representante legal, e estaria
pode ser investigada filosoficamente. O que a fundamentada nos princípios constitucionais da
morte representa para você? Ela é o fim, ou ape- dignidade e de que ninguém pode ser subme-
nas um passo para uma vida diferente? Você acei- tido a tortura nem a tratamento desumano ou
taria fazer um aborto, ou desligar os aparelhos degradante.
que mantêm seu pai ou sua mãe vivos? Como você pode imaginar, a resolução do CFM
Leia o primeiro artigo da Resolução 1.805/2006 provocou e continua a provocar muita polêmica.
do Conselho Federal de Medicina (CFM), publica- A resolução foi elogiada por médicos e até por
da em 28/11/2006, no Diário Oficial da União: setores da Igreja Católica, mas foi também criti-
É permitido ao médico limitar ou suspender cada principalmente por advogados, pois, se-
procedimentos e tratamentos que prolonguem gundo eles, seria imoral e ilegal. Para muitos, a
a vida do doente, garantindo‑lhe os cuidados resolução significaria a legalização do assassina-
necessários para aliviar os sintomas que levam to e possibilitaria que pessoas fossem mortas por
ao sofrimento, na perspectiva de uma assistên- interesses diversos, em condições bastante dife-
cia integral, respeitada a vontade do paciente rentes das que o CFM teve em mente quando
ou de seu representante legal. elaborou a resolução.
O CFM defende que não se trata de eutanásia, o
que seria um crime no sentido de provocar a morte
do doente. Para o CFM, a resolução trataria da orto- Exercício
tanásia (ou eutanásia passiva), o ato de não usar Após a leitura deste panorama, realize uma dis-
recursos que prolonguem artificialmente a vida. cussão filosófica com os colegas a respeito da
A decisão de suspender o tratamento deve- morte e do que ela representa na sociedade
ria respeitar a vontade do paciente, de seus contemporânea.
Recapitulando
N
esta unidade, você aprendeu um tido, a filosofia foi fundamental para o desenvol-
pouco sobre o que é filosofia, sua uti- vimento das ciências.
lidade enquanto atividade humana e No Brasil, como você pôde ver, a filosofia não é
sua importância para o desenvolvimento do muito desenvolvida. O país é muito influenciado
conhecimento. por conceitos e conhecimentos de países estran-
Filosofia é uma palavra criada na Grécia antiga e geiros, o que limita a criação de uma tradição filo-
significa “amor ao saber”. Filosofar, portanto, é sófica própria.
uma atividade de diálogo com o conhecimento. Ao final da unidade, você pôde conhecer um pou-
O filósofo precisa conversar consigo mesmo para co o trabalho de ensino de filosofia para crianças e
aprimorar seu próprio conhecimento. Nesse sen- a aplicação dessa disciplina em outras profissões.
Temas
1 – Filosofia antiga
Você já ouviu falar em Sócrates, Platão e Aristóteles? Eles são os três
grandes nomes da filosofia antiga, surgida na época em que as mais
importantes civilizações do mundo eram a grega e a romana. Neste
tema, você vai conhecer a passagem da mitologia à filosofia na Gré-
cia Antiga, os filósofos pré‑socráticos, os sofistas e os três grandes
pensadores mencionados no início do parágrafo.
2 – Filosofia medieval
Neste tema, você vai conhecer detalhes sobre a filosofia na Idade
Média, com destaque para alguns filósofos, como Santo Agostinho e
Tomás de Aquino.
3 – Filosofia moderna
Você conhece autores como Descartes, Pascal, Spinoza e Leibniz?
Neste tema, você vai conhecer a filosofia moderna, cujos autores
mencionados são os principais expoentes, e suas principais corren-
tes, como empirismo, iluminismo e idealismo.
4 – Filosofia contemporânea
Apesar de historicamente mais próxima de nós, a filosofia contem-
porânea é de mais difícil entendimento. Vamos discuti‑la no último
tema desta unidade.
Introdução
Quando falamos em filosofia antiga, estamos nos referindo àquela
produzida no período histórico conhecido como Antiguidade. A
maior parte dos filósofos antigos escreveu (ou relatou, porque boa
parte dessa produção não está documentada) seus pensamentos en-
tre os séculos VI a.C. e IV d.C.
A filosofia ocidental nasceu na Grécia Antiga (mas isso não significa
que não se filosofava antes dos gregos). Você vai conhecer, nesta uni-
dade, os filósofos pré‑socráticos, os sofistas e os três principais nomes
Saiba mais
da filosofia antiga: Sócrates, Platão e Aristóteles.
Pela comparação entre Na Idade Média, período marcado pela forte influência da Igreja, a fi-
duas palavras gregas, losofia abordava basicamente um assunto: a religiosidade. Aqui, você
mýthos e lógos,
vai conhecer melhor a filosofia medieval e dois de seus principais no-
podemos entender a
mes: Santo Agostinho e Tomás de Aquino.
transição da mitologia
Na sequência, veio o Renascimento, período de decadência da in-
para a filosofia. No
início, a palavra mýthos
fluência religiosa e de ascensão das artes e das ciências. Empiris-
(mito) não tinha o mo, iluminismo e idealismo − essas são as principais correntes
significado de lenda dessa fase.
que tem hoje, e sim o A filosofia moderna, que você também vai conhecer melhor nesta
de “explicação para o unidade, é representada pelos pensamentos de autores como Des-
mundo”. Aos poucos, na cartes, Pascal, Spinoza e Leibniz.
Grécia Antiga, ela A filosofia contemporânea, cujo início gera discordância, também
perdeu lugar para a será discutida em detalhes.
palavra lógos (razão), Nesta unidade, você vai estudar um pouco da obra de Schopenhauer,
que assume esse Nietzsche e Marx, alguns dos principais filósofos contemporâneos.
sentido de explicação
Prepare‑se. Essa longa viagem no tempo começa agora!
da realidade, enquanto
mýthos passa a
significar lenda, fantasia.
Vemos, assim, que a
Filosofia antiga
razão, o pensamento Pré‑socráticos
racional – essa forma de
Os filósofos pré‑socráticos são assim denominados porque vi-
pensar que nos parece
veram e desenvolveram seu pensamento antes de Sócrates (mas
única, natural – surge
esse não é o caso de todos), e principalmente porque possuíam
em certo momento
histórico como forma
uma unidade temática. Considerados os primeiros filósofos oci-
de explicar a realidade.
dentais, os pré‑socráticos escreviam por aforismos ou máximas, de
forma profética.
Pitágoras de Samos
(aproximadamente 550-500 a.C.)
Você conhece o teorema de Pitágoras? Se não lembra exata-
mente, certamente você se recorda do nome do autor. Pitágoras foi
um importante nome da Grécia Antiga.
Nenhum de seus escritos, no entanto, chegou até nós. No sécu-
lo V a.C., seu discípulo Filolau começou a registrar por escrito
seus ensinamentos, mas suas obras também se perderam. As pri-
meiras biografias de Pitágoras foram registradas apenas oito sécu-
los depois de sua existência, por Iamblichus e Porfírio.
A partir do século IV a.C., a influência de Pitágoras diminuiu,
vindo a renascer no século I a.C., com o chamado neopitagorismo,
que abrigou vários escritores cujas obras sobreviveram.
Além de escola filosófica, o pitagorismo foi uma seita política,
religiosa e moral que exerceu muita influência na Antiguidade. No
Renascimento, Pitágoras foi retomado como um homem ilumina-
do e até hoje é cultuado pelas seitas esotéricas.
Para os pitagóricos, os números explicariam o Universo. Tudo
tem relação com os números − assim, a matemática e a geometria
tornam‑se elementos essenciais para a compreensão do mundo.
É importante destacar o caráter formal e abstrato do número,
em comparação com outros elementos concretos adotados como
princípios da realidade pelos pré‑socráticos (água, ar, terra etc.).
Entretanto, devemos lembrar que a concepção de números e de
unidade, para os pitagóricos, é distinta da que temos hoje.
A crença na imortalidade e na reencarnação da alma (metempsi-
cose) também marca o movimento, exercendo influência posterior-
mente na obra de Platão. O interesse de Platão pela matemática (por
conceitos, não pela realidade empírica) tem origem pitagórica.
Exemplo
O paradoxo de Aquiles imagina uma corrida de 100 metros entre o herói e
uma tartaruga. Como Aquiles é dez vezes mais veloz que a tartaruga, ela co-
meça a corrida 80 metros na frente. Quando Aquiles percorrer os 80 metros
iniciais que o separam da tartaruga, ela terá percorrido 8 metros e, portanto,
continuará na frente.
Quando Aquiles percorrer mais 8 metros, a tartaruga terá percorrido mais 0,8
metro, e assim por diante. Dessa maneira, seria impossível Aquiles ultrapassar a
tartaruga, pois sempre que chegar perto dela, ela terá andado mais um pouco.
Sofistas
No século V a.C., a Grécia passou por profundas transformações Saiba mais
sociais, políticas, econômicas e culturais. Você conhece o grau de
desenvolvimento artístico e jurídico alcançado pelos gregos na época? Os sofistas não
formaram uma escola,
Naquele tempo, foram criadas tragédias até hoje encenadas,
não tinham uma
como Édipo rei, de Sófocles, Prometeu acorrentado, de Ésquilo, e
doutrina comum nem
Medeia, de Eurípides. Na Grécia, a tragédia ganhou um caráter de
estavam organizados.
cerimônia cívica, em comparação com suas características religio-
Menos do que um
sas anteriores. A comédia, por sua vez, principalmente com Aris- movimento, eles
tófanes, assumiu um papel de crítica social. representam a
Além disso, o direito tornou‑se essencial, como princípio fun- substituição do espírito
dado na lei, num sentido universal e abstrato. Surgiu também nes- racional e científico dos
sa época a história científica em substituição ao saber mitológico, pré‑socráticos por
com as obras de Tucídides e Heródoto. outros interesses,
Todas essas transformações marcaram o estabelecimento da pedagógicos e sociais.
democracia na cidade de Atenas, onde discussões práticas sobre as Muitas vezes
relações entre o homem e o Estado tornaram‑se centrais. Assim, a classificados como
política, a ética e a teoria do conhecimento ganharam importância céticos, porque
na filosofia, em contraposição à cosmologia e à ontologia (ciência desprezavam as
que estuda o ser enquanto ser), que dominavam o interesse dos discussões filosóficas
para as quais não se
pré‑socráticos.
poderiam encontrar
Os sofistas surgem, portanto, em um cenário em que a arte da
soluções, eles fundaram
argumentação tornou‑se essencial. Mestres da oratória, eles ensina-
na filosofia um reino de
vam a desenvolver argumentos a favor e contra uma mesma posi-
relativismo e subjetivismo.
ção. Eles viajaram por toda a Grécia, fazendo conferências e Nesse reino, o homem é
fundando uma forma de ensino itinerante e remunerada. São os pri- a medida das coisas, da
meiros professores da história. Essa nova forma de educação, que se natureza e de todos os
iniciou com os sofistas, deveria acompanhar o homem da infância valores. É do sofista
até a idade adulta. A dialética, a poética, a linguagem, a retórica e a Protágoras a conhecida
gramática ocupavam lugar de destaque entre os sofistas. máxima: “O homem é a
A partir dos sofistas, o homem substitui a natureza como obje- medida de todas as
to principal da reflexão filosófica. Podemos considerar que a filo- coisas”. Daí surge a ideia
sofia tornou‑se antropológica. Os sofistas mais conhecidos que de que com os sofistas
viveram no século V a.C. são Protágoras, Górgias, Hípias, Pródi- iniciou‑se o verdadeiro
co, Crítias, Antífon, Trasímaco e Licófron. humanismo ocidental.
igualmente. Por certo, tinha de ser assim e penso que não houve
excessos. (PLATÃO. In: PESSANHA, 1980, p. 25)
Saiba mais
Sócrates posicionava‑se contra os sofistas, seus contemporâ-
Metalinguagem é uma
neos, buscando valores absolutos por meio de uma forma de co-
linguagem usada para
nhecimento científica. Ele questionava o senso comum, as crenças
descrever algo sobre
e as opiniões, opondo o conhecimento à opinião.
outra linguagem
O processo de questionamento a que expunha seus interlocu-
(linguagem objeto). De
tores nos debates, denominado maiêutica, talvez seja sua maior modo mais amplo, a
herança para a filosofia. Ao contrário dos sofistas, Sócrates uti- metalinguagem pode
lizava um método pelo qual não se propunha a ensinar, mas ape- referir‑se a qualquer
nas a aprender, por meio de perguntas que levavam seus terminologia usada para
interlocutores a reconhecer que não sabiam o que achavam que descrever uma
sabiam. Seus diálogos podem ser considerados aporéticos, pois linguagem em si
geram apenas impasse, sem conclusão. Indicam um caminho, mesma. Descrições
não a resposta. Por meio de seu método de exame e refutação, gramaticais ou uma
ele não procurava produzir vitórias nos debates, como os sofis- discussão sobre o uso
tas, mas fazer o parto de conceitos (em seus interlocutores) e da linguagem são
chegar à verdade. exemplos de
Com Sócrates, a linguagem tornou‑se o fundamento do discur- metalinguagem.
so filosófico, apesar da importância também da ética e da lógica
em seu pensamento. A filosofia passou a ser encarada, em sua es-
sência, como um método linguístico de construção conceitual.
Os diálogos de Platão (próximo filósofo a ser estudado) são Fique atento
exercícios de metalinguagem riquíssimos. As próprias ideias e as Paralelamente à era de
palavras são tomadas como objetos do filosofar. A linguagem pas- Sócrates, no mesmo
sa a ser um dos assuntos centrais do discurso filosófico. período surgiram três
Sócrates, assim como os sofistas, contribuiu para o movimento outras escolas filosóficas
da mudança de foco da filosofia: da natureza para o homem. Ele na Grécia: a escola
não refletia sobre a natureza, mas sobre o ser humano. Não busca- megárica (de Mégara;
va os princípios do Universo, mas os fins para o homem. fundada por Euclides,
“Conhece‑te a ti mesmo” é um dos ensinamentos que Sócrates trouxe importantes
deixou para a posteridade. A ele estão também associadas máximas contribuições para o
como “Só sei que nada sei” e “A virtude é o conhecimento; nin- desenvolvimento da
guém erra ou pratica o mal intencionalmente, mas por ignorância”. lógica), a escola cínica e
a escola cirenaica. Essas
Platão (c. de 427-347 a.C.) escolas tiveram vida
A conhecida expressão “amor platônico” tem sua origem em longa, prolongando sua
Platão, que foi um dos maiores filósofos da Grécia Antiga. Platão influência até o período
foi tão importante que até hoje sua obra influencia a filosofia. posterior a Platão e
Aristóteles.
Após seu falecimento, seus discípulos Espeusipo e Xenócrates ou seja, significa “além
da natureza ou da física”.
o sucederam na Academia, continuando seu trabalho em metafísi-
Uma das disciplinas
ca, lógica e matemática. Depois, com Arcesilau e Carnéades, a
fundamentais da
“Nova Academia”, ou “Academia Helenista”, adotou o ceticismo,
filosofia, a metafísica
questionando os conceitos absolutos de verdade e mentira, basean
trata de problemas
do‑se nos diálogos platônicos aporéticos, aqueles que terminam
centrais da filosofia
sem conclusão.
teórica: as tentativas de
Posteriormente, o neoplatonismo antigo, ou platonismo médio, descrever os
abandonou o ceticismo e procurou combinar o pensamento de Pla- fundamentos, as
tão com outras posturas, como o estoicismo, o aristotelismo e o condições, as leis, a
judaísmo. estrutura básica, as
causas ou os princípios
primeiros, bem como o
sentido e a finalidade
Saiba mais
da realidade como um
Estoicismo é uma doutrina filosófica que afirma que todo o Universo é corpó- todo, isto é, dos seres
reo e governado por um logos (ou razão universal) que ordena todas as coi- em geral. Algumas de
sas: tudo surge a partir dele e de acordo com ele; graças a ele o mundo é um suas questões são: há
kosmos (”harmonia”, em grego). Aristotelismo é a escola filosófica adepta das um sentido para a
doutrinas de Aristóteles (384-322 a.C.), que influenciaram a criação da lógica existência do mundo?
formal e da ética, e exerceram e ainda exercem enorme influência no pensa- Existe um Deus? Se
mento ocidental. Judaísmo é uma das três principais religiões abraâmicas, existe, como podemos
definida como a “religião, filosofia e modo de vida” do povo judeu. conhecê‑lo?
Filosofia medieval
Filosofia e cultura na Idade Média Link
A Escola de Atenas
O pensamento medieval distingue‑se radicalmente do pensa-
(Scuola di Atene), famosa
mento da Grécia Antiga pela preponderância do cristianismo, que,
pintura do renascentista
como estrutura sociopolítica e religiosa, estabeleceu os parâmetros
italiano Rafael,
dentro dos quais a filosofia pôde se desenvolver (Giles, 1995).
representa a Academia
A filosofia medieval foi precedida pela filosofia patrística (sé-
de Platão e alguns
culos I‑VII), que inclui a doutrina dos padres da Igreja, que fazem filósofos que estudamos
apologia do cristianismo. Com as filosofias ligadas à religião, até agora: Zenão de
como a escola neoplatônica cristã da Alexandria, São Clemente de Eleia, Pitágoras,
Alexandria e Orígenes, surge a noção, desconhecida pelos gregos Parmênides, Sócrates e
antigos, de verdades reveladas. Na Idade Média, houve resistência Heráclito. Bem no
ao uso da filosofia pagã grega, e o conflito entre razão e fé marcou centro da pintura
a filosofia desse período. aparecem Platão e
“Idade das Trevas.” Você já conhecia esse termo que se refere Aristóteles. Platão está
à Idade Média? Bem negativa e hoje tida como obsoleta, essa ex- segurando o Timeu e
pressão indica que no período medieval, quando comparado com apontando para cima;
a Grécia e a Roma antigas e com a Idade Moderna, nada de muito Aristóteles está
importante foi produzido, não apenas em filosofia, mas nas artes segurando a Ética e tem
em geral. Esse conceito hoje é muito controverso. Estudos mostram a mão na horizontal,
que, na verdade, não se trata de um período pobre intelectual e artis- indicando o mundo
ticamente. Você pode questionar, inclusive, a própria continuidade terreno. Nesses gestos,
do que se chama Idade Média. Costumeiramente, fala‑se de movi- Rafael consegue
resumir essa polaridade
mentos de renascença − a carolíngia (durante o reinado de Carlos
que construiu o campo
Magno) e a do século XII, por exemplo − em plena Idade Média.
para as filosofias
A Idade Média ocidental inclui duas civilizações bastante distin-
sucessoras dos dois
tas. A primeira vai de aproximadamente 400 (decadência do Império
grandes nomes da
Romano) até 800. Nesse período, dominado pela cultura dos bárba-
filosofia grega. Você
ros que invadiram a Europa Ocidental, houve uma baixa sensível da
pode ver essa pintura
atividade intelectual e econômica. A segunda civilização começa de Rafael no link: <en.
com a Renascença carolíngia do século IX e vai até o fim do século wikipedia.org/wiki/
XIII, com realizações consideráveis na literatura, na filosofia e na File:Sanzio_01.jpg>.
arte e um alto grau de prosperidade e liberdade (Burns, 1966).
Hauser (1982), em História social da literatura e da arte, divi-
de a Idade Média em três períodos: a economia natural da primiti-
va Idade Média, a cavalaria galante da alta Idade Média e a cultura
burguesa urbana da última etapa.
Com a destruição do Império Romano e as invasões bárbaras,
ocorreu uma alteração radical na história europeia ocidental tanto
Júnior (1996), por exemplo, divide os “mitos” medievais (e aqui que houve uma história
subterrânea na Idade
os mitos bíblicos são incluídos) em alguns tipos: os que tratavam
Média, reprimida em
da origem do mundo, do homem, dos fenômenos naturais e so-
sua fala. O cantochão,
ciais; os que narravam as manifestações de personagens divinos
ou canto gregoriano,
ou semidivinos, heróis e feiticeiros; os que apresentavam persona-
por exemplo, era
gens históricos ou imaginários, como salvadores da sociedade registrado em
cristã; os que criticavam o presente histórico, descrevendo fenô- partituras, mas o
menos e/ou personagens ligados ao fim dos tempos; e os edênicos, mesmo não ocorria
que falavam do Éden perdido ou de um Paraíso a ser recuperado com a música profana.
e/ou conquistado. Decamerão, de Giovanni
Boccaccio (1313-75),
Filosofia moderna
Filosofia do Renascimento (séculos XIV‑XVI)
O conceito de Renascimento, assim como o de Idade Média,
vem sendo cada vez mais discutido e criticado. O nominalismo
medieval, por exemplo, tem sido destacado como essencial para o
espírito naturalista e científico do Renascimento.
Na segunda metade da Idade Média, já se anunciavam os fatos
que seriam determinantes do espírito renascentista. São eles: as
civilizações sarracena e bizantina (cujos monges e sábios trouxe-
ram manuscritos helênicos para o Ocidente após a tomada de
Constantinopla pelos turcos, renovando, assim, o interesse pelos
estudos clássicos nos mosteiros e nas catedrais), o crescimento do
comércio e das cidades, o desenvolvimento das universidades e de
suas bibliotecas e o surgimento da impressão tipográfica.
Y
6
B (6,5)
O esquema baseado nos eixos 5
x e y que aprendemos no ensino 4
médio é chamado sistema de A (–5,3)
3
coordenadas no plano cartesiano
2
(ou espaço cartesiano) por causa
de seu criador, Descartes, o pai da –6 –5 –4 –3 –2 –1 1
D (0,0)
geometria analítica. x
–1 1 2 3 4 5 6
–2
–3
–4 C (4,5;–3,5)
–5
–6
Exemplo
O princípio de Pascal (ou lei de Pascal) é representado pela fórmula:
ΔP = ρg(Δh)
onde:
ΔP = pressão hidrostática ou diferença de pressão entre dois pontos da colu-
na de fluido, devido ao peso do fluido;
ρ = densidade do fluido;
g = aceleração da gravidade da Terra ao nível do mar;
Δh = altura do fluido ou diferença entre dois pontos da coluna de fluido.
Spinoza (1632-1677)
O filósofo holandês Baruch Spinoza é outro nome de destaque
na história da filosofia moderna. A ética e a metafísica são os tra-
ços mais importantes de sua obra. Ética, publicada depois de sua
morte, é um trabalho bastante influente na filosofia ocidental. Ela
é apresentada como um sistema dedutivo, à maneira de Euclides,
geômetra da Grécia Antiga que viveu no século III a.C.
Spinoza defendia uma metafísica monista, baseada na noção
de substância e tendo Deus como princípio, identificado com a
natureza. Por isso, seu sistema é denominado panteísta ou natura-
lista. Vários autores chegam a interpretar sua filosofia como mís-
tica. Por isso, ele exerceu influência não só na história da filosofia,
mas também na da literatura.
Leibniz (1646-1716)
Gottfried Wilhelm Leibniz, filósofo e matemático alemão, é
outro nome que deve ser lembrado nesse período. Para ele, a mô-
nada é a substância simples que compõe tanto o mundo espiritual
quanto o material. O processo cognitivo, segundo Leibniz, dá‑se
por meio da memória, da razão e dos sentidos. O pensamento de
Leibniz foi essencial para o desenvolvimento do cálculo e da lógi-
ca, principalmente a lógica simbólica.
Durante sua vida, pouco de seu trabalho foi publicado. Além
da filosofia, Leibniz deixou contribuições importantes nos cam-
pos da geologia, linguística, historiografia e física.
Outros nomes
Vários outros nomes poderiam ser apontados na história da
filosofia moderna, que em geral também se destacaram em outros
ramos do conhecimento, como Galileu Galilei (1564-1642), Pier-
re Gassendi (1592-1655), Nicolas Malebranche (1638-1715) e
Isaac Newton (1643-1727).
Empirismo
Para esclarecer o conceito de empirismo, você pode imaginar
uma cena simples, na qual uma mãe diz ao filho que não se apro-
xime do fogão para que não se queime. A criança não segue a
orientação e só acredita que o fogão é de fato quente quando “tes-
ta” o que foi dito pela mãe, colocando a mão na chama acesa do
fogão. Assim, ela usa um dos sentidos − o tato − para adquirir, por
meio da experiência, um conhecimento.
O empirismo afirma que a única fonte de nossas ideias é a
experiência sensível. Em geral, para os empiristas, tudo o que está
Saiba mais no intelecto passou antes por nossos sentidos, que são então valo-
O método empírico e rizados. Assim, os empiristas ingleses destacam a importância da
experimental sensação e da experiência, discutindo temas como o uso de hipó-
caracterizou as ciências teses, a estrutura do raciocínio indutivo e a probabilidade.
modernas e O empirismo se coloca, portanto, contra o racionalismo de Des-
contemporâneas. cartes, Leibniz e Spinoza, chamando a atenção para o mundo em-
Por meio da observação
pírico. Não interessa para os empiristas, como interessava para os
e da indução,
racionalistas, o aspecto analítico e racional das proposições, mas
formam‑se hipóteses
sua relação com a realidade. A experiência (empeiria, em grego)
que devem ser então
verificadas e testadas
deve ser o guia e o critério de validade para nossas afirmações.
por experiências. Se o O empirismo desenvolveu‑se principalmente na Inglaterra,
empirismo não que, no final do século XVI, passava por um intenso crescimento
determinou econômico, o qual deu origem à Revolução Industrial. Em 1660,
o desenvolvimento por exemplo, foi fundada a Royal Society of London for the Impro-
das ciências naturais ou vement of Natural Knowledge (Sociedade Real de Londres para o
empíricas, ajudou, sem Progresso do Conhecimento da Natureza), interessada na aplica-
dúvida, a construir uma ção prática do conhecimento, com a qual muitos empiristas tive-
atmosfera intelectual
ram ligações estreitas.
apropriada para os
Francis Bacon (1561-1626) pode ser considerado o introdutor
métodos dessas
do método experimental indutivo moderno. Outros nomes impor-
ciências.
tantes do empirismo são John Locke (1632-1704), que desenvolveu
Idealismo
O idealismo alemão, principalmente com o iluminista Immanuel
Kant (1724-1804) e Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770‑1831),
este último classificado por alguns como contemporâneo, é um
movimento essencial na história da teoria do conhecimento, res-
saltando a importância do sujeito no conhecimento. A arquitetura
da mente, mais do que a própria realidade, passou a ser tema cen-
tral da filosofia dos idealistas.
Kant pode ser considerado um marco na filosofia moderna,
com sua tentativa de superar a dicotomia entre racionalismo e em-
pirismo. Entre suas principais obras, podemos citar: Fundamenta-
ção da metafísica dos costumes, Crítica da razão pura, Crítica da
razão prática, Crítica do juízo (ou Da faculdade de julgar, que
discute estética e teve grande influência sobre o romantismo ale-
mão) e Metafísica dos costumes (que aborda questões relaciona-
das à liberdade e à moralidade).
Enquanto a razão pura lida com a epistemologia e a razão prá-
tica se ocupa da moral, a razão possuiria ainda para Kant uma
terceira faculdade, responsável pela produção de conceitos puros
como Deus, alma, mundo e liberdade.
O pensamento de Kant foi retomado no final do século XIX e
início do século XX pelo movimento que ficou conhecido como
neokantismo, ou neocriticismo, principalmente como reação ao
hegelianismo. Seu lema era “Retorno a Kant!”.
Formaram‑se duas grandes escolas neokantianas, nas quais se
destacaram Hermann Cohen e Paul Natorp (Escola de Marburgo),
Windelband e Ricker (Escola de Baden) e Ernst Cassirer, autor de
Antropologia filosófica e da importante Filosofia das formas sim-
bólicas, em que propõe uma interpretação do conhecimento e da
cultura por processos históricos de simbolização. O neokantismo
foi um movimento influente na história da filosofia contemporâ-
nea e se estendeu para além da Alemanha.
Johann Gottlieb Fichte (1762-1814), outro importante
nome do idealismo, desenvolveu um pensamento específico,
denominado idealismo transcendental, que exerceu profunda
influência no romantismo. Ele se dedicou também à filosofia da
religião, o que gerou a acusação de ateísmo. A edição crítica de
suas obras está sendo publicada desde 1962, em um projeto que
prevê 40 volumes.
Filosofia contemporânea
Definir onde termina a filosofia moderna e onde começa a fi-
losofia contemporânea é uma tarefa que gera discordâncias entre
os estudiosos. Nesta obra, consideramos como contemporânea a
filosofia posterior ao idealismo alemão.
A filosofia contemporânea é quase toda uma reação ao idealis-
mo, incluindo desde posições solitárias como a do espanhol Geor-
ge Santayana (1863-1952) até movimentos como o neotomismo.
É difícil categorizar ou separar em escolas a filosofia contem-
porânea, pois seus autores e obras estão muito próximos de nós,
faltando‑nos o distanciamento necessário para uma melhor avalia-
ção. De qualquer maneira, podemos lembrar que vários aconteci-
mentos marcaram a história contemporânea e, consequentemente,
sua filosofia. Charles Darwin (1809-1882), autor de A origem das
espécies, com sua teoria da evolução que defende que as espé-
cies biológicas desenvolvem‑se primordialmente por variações
casuaise seleção natural, já havia abalado a crença de que os ho-
mens eram seres separados da evolução dos animais.
A teoria da relatividade embaralhou nossa visão de tempo e es-
paço, a psicanálise colocou em xeque a crença de que atuamos de
acordo com nossa consciência, o marxismo mostrou que nossas de-
cisões são determinadas por condições materiais e relações de po-
der, a inteligência artificial veio questionar se a inteligência humana
é a única forma de inteligência possível, e a engenharia genética nos
apontou um mundo em que será possível clonar seres humanos, in-
fluindo decisivamente em seu futuro antes mesmo de seu nascimen-
to. Além disso, é importante lembrar que no século passado vivemos
duas grandes guerras mundiais, o que também refletiu na filosofia.
E, por fim, o impressionante desenvolvimento das ciências naturais
também marcou o pensamento contemporâneo.
Schopenhauer (1788-1860)
Ímpar e extemporâneo na história da filosofia é o pensador
alemão Arthur Schopenhauer. Sua filosofia pessimista influen-
ciou, por exemplo, tanto o simbolismo francês quanto a literatura
portuguesa. Para ele, o pessimismo só poderia ser superado pela
arte e pela experiência estética. Sua importância sobre o pensa-
mento de Nietzsche é também decisiva.
Bergson (1859-1941)
Outro nome importante da filosofia contemporânea, que não
se vincula diretamente a nenhum movimento, é o do filósofo fran-
cês Henri Louis Bergson. Sua obra é crítica do intelectualismo, da
razão e das concepções puramente mecânicas do mundo. A reali-
dade, segundo ele, não deveria ser apenas analisada (pela ciência),
mas também intuída (pela arte ou pela filosofia).
Bergson discute também os conceitos de memória e de tempo
em filosofia, opondo o fluxo da duração à divisão do tempo em
entidades numéricas discretas, como segundos, minutos etc. Suas
ideias influenciaram diversos movimentos artísticos, literários,
sociais e políticos. Em 1927, ele recebeu o Prêmio Nobel de Lite-
ratura. Leia a seguir um trecho em que o filósofo diferencia a ciên-
cia da metafísica:
(...) a ciência positiva se dirige à observação sensível. Ela obtém
assim materiais cuja elaboração confia à faculdade de abstrair e
de generalizar, ao juízo e ao raciocínio, à inteligência. Tendo par-
tido, no passado, das matemáticas puras, ela continuou através
da mecânica, depois da física e da química; chegou tardiamente
Filosofia analítica
Surgiu inicialmente na Alemanha, estendendo‑se posterior-
mente para a Inglaterra, um movimento fundamentado na lógica
matemática que procura desenvolver uma filosofia analítica da
linguagem, centrada na análise do significado de conceitos e de
proposições.
O filósofo e matemático alemão Friedrich Ludwig Gottlob
Frege (1848-1925) pode ser considerado o precursor da filosofia
analítica. Ele foi essencial no desenvolvimento da lógica matemá-
tica, graças ao cálculo dos predicados, e criou um sistema de re-
presentação simbólica para a lógica.
Hipótese Sapir‑Whorf
Você entende a realidade a seu redor por meio da linguagem?
Ou acredita que a linguagem não interfere em sua interpretação
pessoal da realidade? Edward Sapir (1884-1939) e seu aluno Ben-
jamin Lee Whorf (1897-1941) escreveram sobre a hipótese de que
nossa percepção, pensamento e comportamento são influenciados
pela língua que falamos. A realidade seria de alguma maneira
construída pela linguagem.
As línguas possuem sistemas de representação distintos e, em
alguns pontos, não equivalentes, o que implicaria distinções na
forma de ler o mundo entre as diferentes culturas. Assim, as ma-
neiras como as pessoas percebem e classificam os objetos da rea-
lidade seriam determinadas pelas estruturas de seus sistemas
linguísticos.
As categorias características das línguas influenciariam as ca-
tegorias que construímos do mundo, nossa memória, percepção e
cognição em geral.
Hermenêutica
Você sabe interpretar textos, sinais, gestos, falas e outras ativi-
dades humanas dotadas de algum significado? A hermenêutica
destaca a importância da interpretação não apenas no caso de tex-
tos, mas em nossa relação com a realidade.
Além de significar arte ou teoria da interpretação, a herme-
nêutica é também um movimento filosófico que se iniciou com o
teólogo e filósofo Friedrich Schleiermacher (1768-1834) e se de-
senvolveu com Martin Heidegger (1889-1976) e Wilhelm Dilthey
(1833-1911), que se destacou também em filosofia da história e
crítica literária, tendo em H. G. Gadamer (1900-2002), autor de
Verdade e método, seu principal representante contemporâneo.
O que ficou conhecido como círculo hermenêutico indica não
apenas que a interpretação de cada parte depende da interpretação
do todo, mas também que, como cada interpretação está ela mes-
ma baseada em interpretação, não se pode escapar da circularida-
de da interpretação.
Pragmatismo
O pragmatismo está associado ao filósofo, matemático, lógico
e cientista norte‑americano Charles Sanders Peirce (1839-1914),
que desenvolveu uma teoria geral dos signos, ou semiótica, que
teve grande influência no século XX. Além de Peirce, há outros
pragmatistas de destaque na história da filosofia, incluindo os
clássicos William James (1842-1910), John Dewey (1859-1952) e
George Herbert Mead (1863-1931).
Para os pragmatistas, a clareza das ideias implica conceber
seus efeitos de tipo prático, ou seja, sensações e reações associa-
das com o objeto do pensamento. A máxima pragmática diz que,
para clarificar, para desenvolver o significado de uma concepção,
você deve determinar quais hábitos ela produz, pois o que uma
coisa significa é simplesmente os hábitos que ela envolve. O
pragmatismo busca os resultados, mais do que as origens, em nos-
sa compreensão das ideias.
Saiba mais
Além de movimento filosófico, o pragmatismo se difundiu para outras áreas,
como política, educação e crítica literária. Houve um ressurgimento do prag-
matismo, a que muitos dão o nome de neopragmatismo, depois da impor-
tância que assumiram algumas escolas, como o positivismo lógico, a filosofia
analítica e a filosofia da linguagem. Dois dos filósofos neopragmatistas con-
temporâneos mais importantes são Hilary Putnam (1926-) e Richard Rorty
(1931-2007), que foi professor da Universidade Stanford.
Estruturalismo
Você sabe, por exemplo, que um edifício é composto de estru-
turas até chegar a seu desenho final. Um carro pode servir de
exemplo também nessa comparação.
O estruturalismo defende que a realidade como a entendemos
também é composta de estruturas. Assim, seria possível encontrar
e estudar estruturas em arquitetura, no corpo, nas línguas, na psi-
cologia, na matemática, na geologia, na anatomia e até mesmo nas
ciências humanas e sociais. O método das ciências, portanto, teria
que identificar essas estruturas e explicar como suas partes se or-
ganizam numa totalidade, formalizando‑as.
Desenvolvido na França, entre os anos 1950 e 1960, o estrutu-
ralismo envolveu a filosofia, os campos da psicanálise e da psico-
logia, a antropologia, a linguística, as ciências sociais, a crítica
literária, a semiótica, além da matemática e da lógica, da física e
da biologia.
Nomes de destaque no movimento, incluindo os pós‑estrutura-
listas, são os linguistas Ferdinand de Saussure (1857-1913) – com
seu clássico Curso de linguística geral, Roman Jakobson (1896
‑1982), A. J. Greimas (1917-1992) e Louis Hjelmslev (1899-1965);
o antropólogo Claude Lévi‑Strauss (1908-2009); os filósofos Mi-
chel Foucault (1926-1984), Jacques Derrida (1930-2004) e Michel
Serres (1930-); o estudioso da cultura grega Jean‑Pierre Vernant
(1914-2007); o psicólogo Jacques Lacan (1901-1981); além de
Roland Barthes (1915-1980), Louis Althusser (1918-1990), Gérard
Genette (1930-), Pierre Bourdieu (1930‑2002) e George Dumézil
(1898-1986).
Fenomenologia existencial
A fenomenologia existencial, ou o existencialismo, destaca a
existência do homem como um dos mais importantes fenômenos
filosóficos, questionando o sentido e significado da vida.
Muitos consideram o escritor russo Fiodor Dostoievski (1821
‑1881) o iniciador do existencialismo. Mas há outros nomes
importantes, como Heidegger, já citado no tópico sobre herme-
nêutica; Jean‑Paul Sartre (1905-1980), que se destacou também
no romance e teatro; o escritor e filósofo francês Albert Camus
(1913‑1960); Maurice Merleau‑Ponty (1908-1961); o filóso-
fo‑dramaturgo e músico Gabriel Marcel (1889-1973); o filósofo e
psicólogo alemão Karl Theodor Jaspers (1883-1969); entre outros.
Heidegger se destacou por retomar a ontologia e a discussão
sobre o ser − o que somos e o ser‑aí (Dasein) −, fazendo releituras
de Heráclito e Parmênides. Segundo ele, acostumamo-nos com o
ser e, então, não nos lembramos mais de perguntar sobre seu sig-
nificado. Para o filósofo alemão, a noção de verdade seria anterior
à relação linguagem/objetos, identificada com o Dasein. Em sua
obra, Heidegger realizou também uma interessante reflexão sobre
a morte. Ele exerceu influência sobre a filosofia contemporânea
em várias correntes.
Sartre, autor de O ser e o nada, entre várias outras obras, foi
um dos mais populares intelectuais do século XX. Seu pensa-
mento é baseado em duas noções fundamentais: a liberdade e a
Marxismo
Você acha que a filosofia apenas interpreta e entende o mundo,
ou é preciso também mudá‑lo? Para Karl Marx (1818-1883), os
filósofos haviam se limitado até então a interpretar o mundo, mas
o importante seria transformá‑lo.
Nesse sentido, ele se propõe a inverter o homem do idealista
Hegel. Seu materialismo dialético defende que o homem é um ser
social e o conhecimento é socialmente determinado. O capital foi
uma obra que exerceu enorme influência no pensamento e na prá-
tica do século XX, explorando o universo do trabalho, da luta de
classes e das relações de poder.
Escola de Frankfurt
Em 1924, foi fundado o Instituto de Pesquisas Sociais em
Frankfurt, onde se formou o movimento que ficou conhecido
como Escola de Frankfurt, logo se expandindo para outros países,
como França e Suíça. Entre seus membros, podemos destacar os
filósofos alemães Herbert Marcuse (1898-1979), Max Horkhei-
mer (1895-1973), Theodor W. Adorno (1903-1969) e Walter
Benjamin (1892-1940).
Fundamentada no marxismo, a Escola de Frankfurt desen-
volveu uma filosofia social, ou sociologia crítica, influenciada
também pela psicanálise. O psicanalista alemão Erich Fromm
(1900-1980), por exemplo, aproximou‑se, mas depois se afas-
tou do movimento. Em Eros e civilização, Marcuse aproximou o
Nietzsche (1844-1900)
O filósofo alemão Friedrich Nietzsche é um dos nomes mais
importantes da filosofia contemporânea, principalmente por sua
crítica à filosofia tradicional e ao cristianismo. Na passagem da
mitologia para a filosofia na Grécia Antiga, segundo Nietzsche,
teríamos abandonado o espírito dionisíaco em favor do espírito de
retidão apolíneo. Escrevendo por aforismos e fragmentos, ele cha-
ma a atenção para a vida na Terra, em oposição ao mundo das
ideias ou à vida cristã pós‑morte.
Saiba mais
Uma boa opção para conhecer a filosofia de Nietzsche é Dias de Nietzsche em
Turim (2001), de Júlio Bressane. O filme se desenrola por meio de uma narra-
tiva in off com textos de Nietzsche e lindas imagens que representam sua
passagem por Turim, entre abril de 1888 e janeiro de 1889, onde escreveu
suas últimas obras. A história termina com uma cena de Nietzsche − em uma
crise de loucura − dançando com a máscara de Dionísio. Depois desse episó-
dio, até sua morte em 1900, o filósofo ficou sob a tutela da mãe e da irmã, que
viria a falsificar alguns de seus textos, em favor do nazismo.
Exercícios de fixação
1. Quem é considerado o primeiro filósofo grego? 9. O que é iluminismo?
2. Diferencie mýthos (mito) e lógos (logos). 10. Mencione características do idealismo.
3. Quem foi Sócrates? 11. Cite alguns dos principais filósofos contem-
4. O que é sofista?
porâneos.
5. Mencione algumas diferenças da filosofia de
12. Quem foi Schopenhauer?
Platão e de Aristóteles.
13. O que é a hermenêutica?
6. Qual é a principal característica da filosofia
medieval? 14. O que é estruturalismo?
7. Quem foi Tomás de Aquino? 15. Cite características do marxismo.
8. O que é empirismo? 16. Quem foi Nietzsche?
Panorama
Platão diria: “Este animal não tem nenhuma exis‑ de conhecimento real”. Kant diria: “Este animal é
tência verdadeira, mas apenas uma aparente, cons‑ um fenômeno no tempo, no espaço e na causali‑
tante vir a ser, uma existência relativa, que pode ser dade, formas que, por sua vez, são as condições a
chamada tanto não‑ser quanto ser. O que é verda‑ priori completas da experiência possível, presentes
deiramente é apenas a Ideia estampada naquele em nossa faculdade de conhecimento, não deter‑
animal, o animal em si mesmo, que não depende minações da coisa‑em‑si. Por consequência, este
de nada, mas é em si e para si, nunca veio a ser, nun‑ animal, tal qual o percebemos neste determinado
ca se extingue, mas sempre é da mesma maneira. tempo, neste dado lugar, como vindo a ser no en‑
Enquanto reconhecemos nesse animal a sua Ideia, cadeamento da experiência – isto é, na cadeia de
é por completo indiferente e sem significação se te‑ causas e efeitos, e por conta disso necessariamente
mos aqui e agora diante de nós este animal ou seu indivíduo que perece – não é coisa‑em‑si, mas um
ancestral que viveu há milhares de anos; também fenômeno válido apenas em relação ao nosso co‑
é indiferente se ele se encontra aqui ou num lugar nhecimento. Para conhecer o que ele possa ser em
distante, se se oferece desta ou daquela maneira à si, por conseguinte independentemente de todas
consideração, nesta ou naquela posição, ação, se, as determinações encontradas no tempo, no espa‑
finalmente, é este ou algum outro indivíduo de sua ço e na causalidade, seria preciso um outro modo
espécie. Tudo isso é nulo e tais diferenças têm signifi‑ de conhecimento além daquele que unicamente
cado apenas em relação ao fenômeno. Unicamente nos é possível pelos sentidos e pelo entendimento”.
a Ideia do animal possui ser verdadeiro e é objeto (Schopenhauer, 2005, p. 239.)
Exercício
1. Como Schopenhauer e baseando‑se no tex-
to dele, escreva um texto para diferenciar a
filosofia de Platão da de Kant.
Recapitulando
S
e você apenas conhecia a frase “Só sei que período foram Santo Agostinho e Tomás de
nada sei”, nesta unidade você pôde apren- Aquino.
der um pouco mais sobre o autor dela, Na filosofia moderna, surgiram nomes importan-
Sócrates. tes como Descartes, Pascal, Spinoza e Leibniz. Após
Platão e Aristóteles, outros dos principais filósofos o Renascimento, os sistemas sociais evoluíram em
antigos, interessavam-se pela ética individual e favor do processo de criação do conhecimento,
pela política. Além disso, Aristóteles tinha uma livrando‑se das amarras da religiosidade. Você tam-
bém aprendeu detalhes, por exemplo, de algumas
paixão pelas classificações. Animais, vegetais, mi-
das principais correntes filosóficas do período,
nerais, virtudes, paixões, faculdades psicológicas
como empirismo, iluminismo e idealismo.
e intelectuais, nada escapava de sua vontade de
A filosofia contemporânea é mais complexa. En-
classificar. O objeto de sua filosofia não era ape-
volve disciplinas como a psicologia e a comunica-
nas o homem, mas o Universo, incluindo seus
ção. Alguns dos autores desse período merecem
processos naturais.
destaque especial, como Marx e Schopenhauer.
Na Idade Média, a filosofia perdeu o foco científi- O materialismo e a luta de classes de Marx, que
co iniciado com Aristóteles. Seu objetivo passou influenciaram a Revolução Comunista na União
a ser confirmar os ensinamentos disseminados Soviética, ajudam-no a entender o mundo como
pela Igreja Católica. Os principais nomes desse ele é hoje.
Temas
1 – O homem em sociedade
Inicialmente, vamos mostrar a importância da vida em sociedade e
algumas consequências centrais que essa forma de viver traz para os
seres humanos. Discutiremos alguns conflitos de interesses que ten-
dem a ocorrer nos diversos níveis e tipos de sociedade em que nos
situamos.
2 – O conceito de Ética
Neste tema, apresentaremos as origens da Ética e seus objetivos
como ramo científico do conhecimento.
3 – Fontes das regras morais e comportamento ético
O próximo passo será a discussão de onde nascem as regras éticas e
como o comportamento alinhado a essas regras é produzido nas
sociedades.
4 – Algumas doutrinas éticas
Esta unidade termina com a apresentação de uma revisão históri-
ca das concepções que diferentes correntes filosóficas possuem a
respeito da ética.
Introdução
Você consegue pensar em um mundo onde as pessoas não acredi-
tem na ética? Já imaginou como seria viver em uma sociedade em
que ninguém se preocupa em adotar comportamentos éticos? Que
consequências isso traria para cada integrante dessa sociedade?
Ao propor esse cenário, convidamos você a imaginar uma situação
em que diversas pessoas interagem, cada uma com seu próprio inte-
resse. Elas fazem parte de uma sociedade em que seus componentes
decidem que não haverá normas éticas ou comportamentos espera-
dos. Cada um será livre para buscar e alcançar seus próprios interesses
de acordo com os meios que julgarem mais adequados.
Agora, vamos imaginar mais uma coisa. Nessa comunidade, pense
em um cruzamento movimentado, onde todos os motoristas querem
chegar o mais rápido possível a seu destino. Por um lado, pode pare-
cer que os membros dessa sociedade são pessoas mais livres, não é?
Eles nem precisam esperar o sinal verde!
Entretanto, como todos os motoristas acabam tendo o mesmo racio-
cínio – defender os seus interesses à custa dos alheios –, em poucos
minutos, carros que vêm da direita, esquerda, norte e sul se embara-
lham no cruzamento. Vemos então um bando de condutores irritados
uns com os outros, ouvimos buzinas ensurdecedoras e gritos de ofen-
sas mútuas. Opa, algo deu errado!
O que aconteceu? Eles são livres! Vivem em uma sociedade em que
todos têm a liberdade para buscar seus objetivos sem se preocupar
com ética ou outros conceitos que aparentemente limitam o nosso le-
que de ações. Embora essa seja a impressão inicial, no fim das contas,
percebemos que uma sociedade sem padrões éticos de conduta seria
um grande fracasso. Nas cidades reais, como as que vivemos, mesmo
cheias de semáforos, guardas de trânsito, legislações e a expectativa
de sermos gentis com o outro no trânsito, você provavelmente che-
garia ao seu destino antes dos habitantes dessa fictícia terra sem ética.
Nesta unidade, vamos estudar a ética e aprender mais sobre alguns
dos aspectos que se encontram nessa reflexão inicial. O que signifi-
ca viver em sociedade? Que consequências a vida coletiva traz para a
nossa forma de viver? Abordaremos também a Ética como ciência. De
onde vêm as regras morais? O que leva uma pessoa a assumir um com-
portamento ético? Esses são questionamentos que vamos explorar.
E aí, vamos iniciar a nossa viagem? O sinal verde está aberto!
O homem em sociedade
Vamos imaginar que você acaba de ser transportado sozinho
para um planeta onde não há vida humana. Foi designado para
passar dez dias nesse lugar coletando informações que serão usa-
das em pesquisas futuras. Após fazer seu trabalho, recebe um co-
municado da equipe que lhe enviou para a missão, informando
que, por causa de um problema técnico, não será possível resgatá-
-lo desse planeta. Em outras palavras, você acaba de saber que
passará o resto de sua vida isolado em um lugar distante, sem
comunicação com outros seres humanos. Tudo o que você recebe-
rá serão alimentos que lhe possibilitarão viver por mais algumas
décadas.
Embora essa situação seja extremamente pitoresca e distante
da nossa realidade, ela serve para nos fazer pensar a respeito de
uma questão filosófica importante: como seria viver sem o conta-
to com outras pessoas? O que mudaria na sua forma de pensar e
viver? As respostas a essas perguntas nos conduzem a outras ques-
tões a respeito do mundo e da sociedade em que vivemos: como a
vida em conjunto com outras pessoas influencia a nossa forma de
ver o mundo e os dilemas que enfrentamos no dia a dia? Neste tó-
pico, vamos discutir a respeito dos níveis de sociedade e procurar
entender um pouco mais profundamente as consequências que a
vida social traz para todos nós. Vamos lá?
Exemplo
As competições esportivas são exemplos de conflitos entre objetivos de
diferentes pessoas ou grupos. Em uma partida de tênis, os dois atletas que
se enfrentam buscam o mesmo anseio individual, o de vencer a partida. Em
um jogo de futebol, os jogadores de cada time envolvido têm metas cole-
tivas que se conflitam. No entanto, jogadores de um mesmo time também
podem possuir objetivos antagônicos. Dois atacantes podem ter o mesmo
intento de serem artilheiros de uma competição. É possível também que os
diferentes objetivos de um mesmo jogador se conflitem. Um atleta pode,
ao mesmo tempo, querer que sua equipe vença uma partida, mas também
desejar perder, caso a vitória de seu time beneficie uma equipe rival da
mesma cidade.
Exemplo
Fons Trompenaars, um pesquisador alemão, realizou uma ampla pesquisa na
qual ele apresentou dilemas a pessoas de diferentes nacionalidades e pediu
que elas dissessem como reagiriam diante da situação apresentada. Em uma
das questões, ele mostrou a seguinte situação: imagine que você acaba de
presenciar um acidente de carro no qual o seu melhor amigo – que é uma
pessoa que você considera justa e confiável – dirigia acima da velocidade
permitida na via e atropelou outra pessoa. Seu advogado lhe informa que, se
você jurar no tribunal que seu amigo estava dentro da velocidade permitida,
poderá livrá-lo de problemas sérios. Diante disso, você acha que seu amigo
deve esperar que você minta perante a justiça? A pesquisa de Trompenaars
(1994) mostra que enquanto 96% dos canadenses acreditam que o amigo
não deve esperar por uma mentira no tribunal, apenas 26% dos sul-coreanos
apresentaram a mesma opinião.
as mulheres brasileiras usam nas praias. Por sua vez, uma mulher
brasileira se assustaria ao visitar o norte da Nigéria e conhecer as
diversas famílias polígamas que habitam aquela região.
Mais uma vez, não é possível apontar nessa situação quem está
certo ou errado – as mulheres brasileiras, árabes ou nigerianas.
Saiba mais Se você está mais habituado à cultura brasileira, é provável que
O hijab é o vestuário não se espante com os biquínis usados pelas brasileiras. É comum
cujo uso é ensinado também que brasileiros, ao encontrarem mulheres muçulmanas
pela doutrina islâmica. vestindo hijabs ou mulheres nigerianas que compartilham o mes-
Segundo essa religião, mo esposo, sintam algum nível de estranheza.
Deus revelou ao Profeta Dessa forma, os valores que você confere às situações e ob-
Muhammad que as jetos e a sua concepção de justiça social não são um produto
mulheres muçulmanas exclusivo seu. Todos somos influenciados, durante o nosso de-
deveriam se cobrir com senvolvimento, pelas formas compartilhadas de agir e pensar que
um véu ao sair de sua predominam no local onde nascemos. No entanto, nós não somos
casa, de forma a
um mero produto do meio em que vivemos. Dentro de um mesmo
preservar a sua honra e
país, as pessoas nascem em estados, cidades e bairros diferentes
castidade.
e chegam ao mundo nos braços de famílias que possuem hábitos,
religiões e condições financeiras e educacionais distintas.
Além disso, cada indivíduo também realiza escolhas. Por essa
razão, pessoas que cresceram em uma mesma imediação geográ-
fica, família ou sob condições financeiras e educacionais seme-
lhantes podem apresentar várias percepções a respeito do que vem
a ser bom ou mau, justo ou injusto e certo ou errado. Ao longo
do tempo, as pessoas podem também alterar suas visões a partir
dos caminhos que decidiram seguir. É bastante provável que, ao
pensar em como você era há cinco anos, se lembrará de algumas
situações que considerava justas, mas que hoje soam de forma
diferente. Todos nós mudamos, e você não seria uma exceção, não
é mesmo?
Como você pode ver, as diferenças que as pessoas e as socie-
dades possuem entre si podem ser explicadas pelo fato de que
possuímos valores distintos. Nós não damos o mesmo valor às
coisas. E é justamente essa diferença que faz com que tenhamos
conflitos na sociedade. Somos um conjunto de pessoas que bus-
cam alcançar objetivos, às vezes conflitantes, e que se baseiam
em diferentes valores. Não é nada fácil e simples viver em so-
ciedade! Essa situação nos conduz frequentemente a problemas
de natureza moral.
Conflitos morais
Você já deu uma olhada nas notícias que estão sendo transmi-
tidas hoje na Internet, jornais e canais de televisão? Independen-
temente do momento em que estiver lendo este livro, podemos
imaginar que o noticiário do dia apresente denúncias de fraudes,
escândalos, subornos e outros atos que consideramos moralmente
inaceitáveis. Por que isso acontece?
Embora não tenhamos uma resposta única, óbvia e definitiva,
é possível apontar algumas razões. Primeiro, é preciso entender
que cada sociedade possui alguns entendimentos compartilhados
por seus integrantes no que diz respeito ao que é e o que não é
moralmente aceitável. Como dissemos, as pessoas são diferentes
umas das outras. Entretanto, existem certas definições morais que
são compartilhadas pelos membros de sociedades. Esses são os
chamados valores culturais.
Exemplo
No Brasil, há uma característica cultural que é conhecida internacionalmente:
o famoso jeitinho brasileiro. Trata-se da informalidade e da improvisação no
agir diante de situações imprevisíveis ou complicadas. As soluções encontra-
das por meio de um jeitinho não se baseiam em uma aplicação universal de
regras ou normas, mas em uma flexibilização destas em prol da resolução
de problemas.
O conceito de ética
Certamente você já ouviu as pessoas usarem a palavra ética
em várias situações do cotidiano. As frases “Está faltando
ética neste país” e “Essa pessoa não agiu de forma ética” são
exemplos de situações comuns em que o termo é empregado em
conversas informais que temos com amigos. Podemos enten-
der ética em seu uso popular como princípios de conduta que
orientam a ação de uma pessoa ou grupo. Entretanto, neste livro,
vamos buscar também entender a Ética como um ramo do conhe-
cimento filosófico.
Origens
A palavra ética possui sua origem no grego ethos, que quer
dizer costume, maneira habitual de agir ou índole. Seu significado
é muito próximo ao de moral, palavra que vem do latim mos e
moris, que significa normas que representam o comportamento
esperado. Neste livro, usamos ambos os termos como sinônimos.
A palavra moral às vezes é usada com um sentido associado à
religiosidade, mas aqui entenderemos esse termo como as normas
que exprimem as formas de agir e que são consideradas desejáveis
em uma sociedade.
Como acontece com diversos outros termos, ética é uma pala-
vra que possui um significado um pouco diferente quando tratada
no âmbito de uma área científica. A ética é um ramo da filosofia,
ciência na qual o termo é visto como o estudo dos padrões de jul-
gamentos morais. Físicos estudam os padrões das interações que
ocorrem na natureza. Psicólogos analisam os comportamentos e
os processos mentais típicos dos seres humanos. Sociólogos se
dedicam a compreender o coletivo como um aspecto da vida indi-
vidual e os padrões que podem ser encontrados nas relações entre
as pessoas. Já os filósofos que se dedicam ao estudo da ética têm
como objeto de estudo a ação e a conduta humana sob um olhar
filosófico. Assim, podemos ver que a ética é uma ciência como
tantas outras que conhecemos.
Exemplo
No ambiente empresarial, diversas empresas enfrentam alguns problemas de
caráter ético que não se apresentam na sociedade em geral. Por exemplo,
várias empresas possuem funcionários que desempenham atividades de tra-
balho fora da cidade, estado ou país em que vivem. Com isso, as empresas
precisam pagar passagens aéreas para que esses profissionais possam se
deslocar a trabalho. Ao longo do tempo, com tantos voos, esses profissionais
acumulam milhas junto às companhias aéreas que podem ser trocadas por
voos de interesse particular. De fato, há profissionais que viajam todos os
anos com a família para o exterior usando a pontuação acumulada em voos
realizados com fins profissionais. No entanto, é comum que alguns colegas
de trabalho dessas pessoas considerem esse fato como um privilégio injusto.
Há quem defenda que, nesses casos, o correto seria distribuir ou sortear as
milhas entre todos os funcionários, para que não haja benefícios extra a de-
terminados funcionários em razão de sua função exigir o deslocamento a
trabalho. Por outro lado, há quem defenda que esse privilégio seja uma com-
pensação justa, uma vez que o funcionário passa vários dias do ano longe de
sua rotina familiar.
Julgamentos normativos
Se a Ética é um ramo da filosofia que busca estudar a mora-
lidade, tente refletir sobre a seguinte questão: como um cientista
O comportamento ético
Em qualquer sociedade, as regras éticas são violadas. Seja por
governos, empresas, família ou pessoas, sempre há indivíduos ou
grupos que agem em desacordo com o comportamento que se es-
pera naquele ambiente. Nesses casos, podemos dizer que há falta
de ética.
Em geral, podemos afirmar que as sociedades e seus indiví-
duos são prejudicados quando há falta de ética nas ações huma-
nas. Você é prejudicado a cada vez que um cidadão não paga seus
impostos, quando um policial deixa de executar suas atividades
profissionais e usa o seu tempo de trabalho para resolver proble-
mas pessoais ou quando um político usa os recursos públicos para
fins individuais. Por essa razão, as sociedades buscam organizar
formas de penalidades para aqueles que forem identificados como
transgressores às leis.
Caso a falta de ética ocorra por meio da violação de uma lei,
o infrator deverá sofrer as consequências previstas na legislação.
Algumas vezes, as pessoas não violam leis, mas ainda assim agem
em desacordo com o comportamento esperado. Nesse caso, é co-
mum as pessoas dizerem que o ato não é ilegal, mas imoral. Ape-
sar de não correr o risco de sofrer algum tipo de penalidade na
Justiça, a pessoa pode passar por outros tipos de penalidade, como
a desaprovação pública.
As penalidades são essenciais para a produção do comporta-
mento ético em uma sociedade. Todos nós nos deparamos com
situações em que temos que optar por cumprir ou violar uma
Exemplo
Em várias avenidas de cidades brasileiras, foi criada a faixa exclusiva para ôni-
bus, com o objetivo de estimular o uso de transporte público e diminuir o
trânsito de carros. Essa faixa faz com que, em horários de pico, os ônibus cir-
culem pela cidade com mais rapidez que os carros. Caso um motorista de um
veículo particular de passeio decida usar a faixa exclusiva, ele poderá ser mul-
tado. Geralmente esses motoristas, preocupados com a fiscalização e as pos-
síveis penalidades, respeitam a lei e se mantêm nas faixas dedicadas a carros.
Entretanto, se um dia você estiver com uma mulher de sua família a caminho
do hospital para ter um bebê, é provável que reavalie a relação entre o bene-
fício e as penalidades que a transgressão poderia causar. A transgressão que,
em um dia comum, poderia representar o benefício de apenas alguns minu-
tos a menos no trânsito, nesse caso, significaria a proteção da vida da mãe e
de seu bebê.
Assimetria de informações
A assimetria de informações refere-se ao diferente conheci-
mento que duas ou mais pessoas possuem com relação a aspectos
de negociação em um conflito de interesses. Vamos explicar esse
conceito de maneira mais detalhada.
Você já pegou um táxi em uma cidade ou bairro desconhecido?
Se sim, já viveu uma situação em que houve assimetria de infor-
mações. Enquanto o taxista provavelmente dominava os trajetos
principais da região, você deve ter se sentido perdido e, até certo
Utilitarismo
Segundo o utilitarismo, o comportamento ético é aquele que Saiba mais
propicia a felicidade – aqui entendida como a presença dos pra-
O utilitarismo é uma
zeres superiores e ausência de dor – a um maior número possível
doutrina ética
de pessoas. As ações justas são as que promovem a felicidade e as
formulada
injustas afastam o homem de ser feliz. principalmente pelos
De acordo com essa corrente de pensamento, a ética é relativa. filósofos Jeremy
Ela se altera ao longo do tempo, não havendo uma ética universal, Bentham (1748-1832) e
superior e permanente: ela é vista como um conceito socialmente John Mill (1806-1873).
construído.
Exercícios de fixação
1. Cite três exemplos de sociedades que se en- 7. “Alguns profissionais prestam serviços sobre
quadrem em cada um dos três níveis apre- os quais seus clientes não conseguem ava-
sentados no texto. liar a qualidade, o que pode ser visto como
2. Por que, em algumas situações em que há uma oportunidade para o comportamento
conflitos de interesses entre pessoas ou gru- não ético”. Você concorda com essa afirma-
pos, não é possível definir quem está certo ção? Justifique.
ou errado? 8. Discorra a respeito do conceito de ética na
3. Diferencie o conceito de ética apresentado no Grécia antiga.
senso comum da ideia de ética como ciência. 9. Compare as principais doutrinas éticas da éti-
4. O que são julgamentos normativos? ca estoica, epicurista, kantiana e utilitarista.
5. Explique quatro fontes de onde se originam 10. Faça um resumo dos três novos conheci-
as regras morais. mentos a respeito de Ética que você adqui-
6. Comente a relação entre penalidades e riu durante o estudo desta unidade.
comportamento ético.
Panorama
Leia o texto a seguir para responder às questões contas para a empresa, Sérgio mente, dizendo
1 e 2. que gasta diariamente os R$ 300 aos quais tem
Marcos Sampaio é o gerente de Recursos Huma- direito, quando na verdade ele gasta apenas R$
nos da empresa Modelo, uma companhia que 150 e embolsa sem o conhecimento da empre-
atua no setor de vendas de planos de saúde. Re- sa os outros R$ 150. Rui está indignado, pois,
centemente, Marcos se deparou com um sério mesmo sabendo que Sérgio é um dos melhores
problema com alguns funcionários da empresa. A vendedores da empresa, não concorda com a
Modelo paga para seus funcionários uma diária sua ação, uma vez que ele e outros funcionários
de R$ 150 para alimentação e transporte quando são honestos e sempre devolvem à empresa o
eles estão trabalhando fora da sua cidade. Além dinheiro não gasto.
disso, paga R$ 150 para hospedagem em hotéis.
Rui, um dos vendedores com melhor desem- 1. A partir dessa situação, o que você faria se fos-
penho da empresa Modelo, resolveu contar a se o gerente Marcos Sampaio?
Marcos um problema do qual ele tomou conhe- 2. Você acha que as pessoas em geral agiriam
cimento. Ele descobriu que Sérgio, outro vende- como você? Justifique sua resposta.
dor com ótimo desempenho, tem se hospedado 3. Como a empresa Modelo pode agir preventi-
em um hotel cuja diária custa R$ 50, e gastado vamente de forma a evitar problemas morais
apenas R$ 100 diários com transporte e alimen- como esse?
tação quando está viajando a serviço. Ao prestar
Recapitulando
I
niciamos esta unidade discutindo diversos ní- Nesse processo, faz-se necessário respeitar os di-
veis de sociedade. A humanidade como um reitos e interesses do outro, de forma que possa
todo, a área geográfica na qual você habita e haver uma convivência pacífica e harmoniosa.
as pessoas com quem você possui um relaciona- Entretanto, como nós possuímos origens variadas
mento de cooperação mútua podem ser enten- em termos culturais, educacionais e econômicos,
didas como diferentes formas de sociedade. Em por exemplo, muitas vezes possuímos valores dife-
comum, todos esses grupos são formados por rentes. Julgamos de forma distinta o que vem a ser
duas ou mais pessoas que se relacionam e que bom ou mau, justo ou injusto. Como consequên-
podem apresentar objetivos conflitantes. cia, essas diferenças trazem à tona conflitos mo-
Você aprendeu que o conflito entre os desejos e rais, que dizem respeito a situações em que duas
as metas dos componentes de uma sociedade de- ou mais pessoas ou sociedades se deparam com
vem ser resolvidos por meio de uma negociação. um impasse ao negociar objetivos conflitantes.
Como você pôde estudar, comentamos que desde É possível notar diariamente, ao se informar sobre
a Grécia antiga muitos pensadores têm se dedicado as sociedades em que vive, que as regras éticas
a estudar a moralidade humana. Sócrates, Platão, são frequentemente desrespeitadas pelos seres
Aristóteles, os estoicos e epicuristas, Kant e, mais re- humanos. Ao nos depararmos com a oportu-
centemente, os filósofos utilitaristas, contribuíram, nidade de obter ganhos pessoais por meio de
cada um no seu tempo, para a formação do ramo comportamentos não morais, comparamos esse
da filosofia que hoje chamamos de Ética, que pode ganho potencial com os riscos que corremos de
ser conceituada como a filosofia da moral. sermos pegos transgredindo os padrões éticos e
Nesta unidade, também vimos que a ciência Ética sofrermos as penalidades decorrentes desse ato,
busca conhecer as diferentes origens das regras sejam elas legais ou apenas morais.
morais e compreender como ocorre o comporta- Bem, chegamos ao fim da primeira unidade. Es-
mento ético. Valores humanos universais, a refle- peramos que você tenha avançado em termos
xão a partir da experiência acumulada, os textos de conhecimento a respeito da Ética e esteja
formais produzidos nas sociedades são algumas curioso para desvendar o que ainda vamos dis-
das fontes para a construção de normas éticas. cutir neste livro.
Temas
1 – A urgência da ética nos negócios
Começamos discutindo a relação entre ética e ambiente de negó-
cios e introduzindo as razões pelas quais esse tema tem recebido
tanta atenção nos meios corporativo e acadêmico. Apresentamos
instituições e personalidades que atuam como expoentes no mer-
cado atual como defensores da ética empresarial.
2 – Definindo ética empresarial
Seguimos analisando o conceito de ética empresarial, seu status
como disciplina autônoma do conhecimento e os níveis de análise
em que devem se concentrar os estudos sobre o tema. Apresenta-
mos também uma evolução histórica dos assuntos de interesse no
ramo da ética nos negócios.
3 – Dilemas e conflitos éticos empresariais
Neste tópico, avaliamos as consequências do uso do lucro como
principal critério para a tomada de decisão nas empresas e os dile-
mas éticos mais frequentes que podem advir dessa escolha.
4 – Questões éticas da prática empresarial: problemas
recorrentes
Finalizando esta unidade, apontamos alguns problemas comuns
referentes à ética nos negócios. Apresentamos também questio-
namentos que representam formas alternativas de lidar com esses
problemas.
Introdução
O ambiente empresarial é um cenário que propicia o surgimento de
problemas éticos. Em um meio em que circula tanto dinheiro, poder e
status, é de se imaginar que os conflitos de interesse que caracterizam
a formação de dilemas éticos apareçam com muita frequência. E apa-
recem mesmo!
Dê uma olhada nas capas dos jornais ou dos portais de notícia da In-
ternet dos quais você mais gosta. É muito provável que encontre no-
tícias sobre escândalos empresariais, atos de corrupção ou
personalidades sob suspeita de uso de recursos públicos ou empresa-
riais para fins pessoais.
Esse fenômeno social não poderia ser ignorado pelo mundo acadê-
mico. Essas situações se tornaram tão frequentes em nossa socieda-
de que talvez você mesmo já tenha se visto diante de alguns desses
dilemas. Diversos pesquisadores têm tentado compreender as ra-
zões, os processos e as estratégias de solução para essa avalanche de
problemas e dilemas éticos que chegam ao nosso conhecimento
diariamente.
Nesta unidade, aprofundaremos o nosso entendimento sobre ética,
mas desta vez focalizando o ambiente empresarial. O que caracteriza
a ética nos negócios como uma disciplina autônoma? Por que esse
tema tem merecido tanta atenção? Quais temas têm sido discutidos
nas últimas décadas no que se refere à moralidade nas empresas?
Que dilemas e problemas éticos os empresários enfrentam mais regu-
larmente em suas atividades profissionais? Que formas alternativas
podemos adotar para encarar essas situações? Provavelmente, você já
pensou em algumas dessas questões e, agora, poderá estudar com
mais detalhes esses assuntos de grande importância para a formação
de qualquer profissional e cidadão.
Exemplos
Na década de 1990, a empresa de materiais esportivos Nike teve seu nome
divulgado negativamente por causa de suposta conduta inadequada em fá-
bricas na Indonésia. Naquele país, os ganhos de um funcionário da empresa
que trabalha no setor de produção gira em torno de um dólar por dia. Apro-
ximadamente 85% dos trabalhadores distribuídos nas 25 fábricas da Nike na
Indonésia são mulheres jovens com idade média de 23 anos. Segundo uma
reportagem da BBC inglesa, um relatório demonstrou que a empresa forçava
os funcionários a realizar horas-extras e limitava o acesso deles a cuidados de
saúde, por exemplo. Apesar de não termos como assegurar a veracidade des-
sas informações, um fato não pode ser negado: uma notícia desse tipo divul-
gada internacionalmente por um meio de comunicação tão popular como a
rede de notícias BBC gera grandes prejuízos a qualquer empresa.
Exercícios de fixação
1. Por que razões a ética tem se tornado um 7. Que consequências podem surgir caso um
tema tão corrente no ambiente corporativo? gestor adote o lucro como único critério para
2. O que são stakeholders? Como esse conceito a tomada de decisões?
se relaciona com o de ética nos negócios? 8. Descreva dois dilemas éticos recorrentes nas
3. Defina ética nos negócios. organizações contemporâneas.
4. A disciplina ética nos negócios deve concen- 9. Cite dois problemas comumente enfrentados
trar o foco no nível micro, meso ou macro de por empresas em termos de ética e descreva
análise? Justifique. uma forma de encarar tais problemas por
5. Explique quais foram os principais interesses do meio de uma visão de negócio que não seja
campo da ética nos negócios durante as déca- fixada apenas no lucro.
das de 1950, 1960, 1970, 1980, 1990 e 2000.
6. Com base nos noticiários que você tem visto,
aponte quais são, a seu ver, os novos focos de
interesse da ética nos negócios.
Panorama
Leia o texto abaixo para responder às questões 1 e 2. disso, esse posto cobrava preços mais elevados
Marcos Sampaio, gerente de Recursos Huma- que os demais postos da cidade.
nos da empresa Modelo, companhia que atua Ora, por que então eles escolhiam aquele posto
no setor de vendas de planos de saúde, está para abastecer e fazer a manutenção do carro?
enfrentando um dilema. Marcos recentemente Simples: em razão do alto número de abasteci-
se deparou com um sério problema com alguns mentos e outros serviços que eles contratavam
funcionários da empresa. Ele ficou sabendo que para o carro da empresa, eles ganhavam do pos-
alguns vendedores que trabalhavam visitando to, como cortesia, manutenção gratuita e des-
clientes e usavam carros da empresa para reali- conto no abastecimento de combustível de seus
zar suas vendas estavam adotando uma condu- carros pessoais.
ta inadequada. Eles estavam abastecendo esse Ao receber essa denúncia de um funcionário que
carro e realizando sua manutenção sempre no soube desse desvio de conduta, Marcos se trancou
mesmo posto de combustíveis. Esse posto fica- em sua sala e, pensativo, se aproximou da janela e
va longe tanto da sede da empresa como das se deu conta do erro que havia cometido. Ele mora
regiões em que os vendedores atuavam e mo- a duas ruas do referido posto de combustíveis.
ravam, o que fazia com que esses funcionários No caso dele, apesar do preço do posto ser mais
gastassem muito combustível – que era reem- elevado que o dos concorrentes, a proximidade
bolsado pela empresa – para chegar até lá. Além de sua residência em relação ao posto fazia com
que a manutenção fosse mais vantajosa naquele ficou sabendo do que Marcos fazia. Ele se sentiu
lugar. Ele precisaria gastar muito tempo e um valor no direito de fazer o mesmo e, pouco a pouco,
considerável de combustível para abastecer o car- outros funcionários deram continuidade à mes-
ro que a empresa lhe cedia para fins profissionais ma prática. No entanto, como moram longe do
em outros postos da cidade. Assim, no caso dele, posto, o benefício pessoal que recebiam era re-
não havia desvantagem para a empresa, caso ele sultado de uma escolha que prejudicava financei-
abastecesse o carro naquele posto. Depois de um ramente a empresa.
tempo sendo cliente de tal estabelecimento, o ge-
rente do posto ofereceu para ele o benefício de Exercícios
fazer gratuitamente a manutenção de seu carro 1. Avalie a conduta do gerente Marcos Sampaio
pessoal, que ele usava nos fins de semana com sua em termos de ética.
família. Na ocasião, Marcos ficou relutante, mas de- 2. Como você lidaria com essa situação se esti-
cidiu aceitar o benefício, uma vez que não estaria vesse no lugar de Marcos?
fazendo nada de mal para a empresa. 3. De que forma a empresa poderia evitar que
O que ele não sabia é que, certo dia, um de seus casos semelhantes ocorram?
funcionários, que era amigo do gerente do posto,
Recapitulando
N
esta unidade, começamos discutindo a próprios objetivos e interesses. Você apren-
importância da ética no ambiente dos deu que esse ramo do conhecimento deve
negócios. Apresentamos diversos moti- centralizar suas atenções nos fenômenos que
vos pelos quais esse tema desperta a atenção de ocorrem no nível organizacional de análise.
acadêmicos e profissionais. Em um mundo em Dessa forma, não individualizamos o compor-
que casos de corrupção, suborno, roubos e ou- tamento nas empresas nem reduzimos esse
tros de condutas antiéticas nas organizações fenômeno ao relacionamento entre empresas
empresariais tornam-se cada vez mais frequen- e stakeholders.
tes, não podemos deixar de reconhecer a impor- Os interesses das pessoas que buscam discu-
tância de pessoas e empresas que rompem com tir a ética empresarial se alteram ao longo dos
o padrão de relativização da ética e adotam prá- anos. Como estamos em um mundo dinâmico,
ticas exemplares em suas atividades. onde estruturas sociais, valores culturais, demo-
Apesar de reconhecermos a importância de grafias e tecnologias mudam constantemente,
discutir sobre a ética nos negócios, sabemos os problemas e dilemas éticos também se alte-
que, muitas vezes, esse é um tema tratado de ram. Apresentamos algumas das preocupações
forma pouco acadêmica, baseada no senso centrais dessa área do conhecimento em dife-
comum. Ela é, por outro lado, uma disciplina rentes momentos históricos. Começamos pelas
autônoma do conhecimento, que possui seus discussões sobre alienação do trabalhador nos
processos de produção nos anos 1950, passamos Encerramos esta unidade com a apresentação de
pelos questionamentos sobre a maneira pela qual dilemas e problemas, e formas alternativas de en-
as empresas de países desenvolvidos exploravam cará-los na rotina empresarial. Espero que você
os novos mercados asiáticos e do Oriente Médio tenha avançado em termos de conhecimento so-
nos anos 1970. Fomos até os desafios ambientais bre a ética nos negócios e permaneça animado
e relacionados à informação digital na Internet para continuar a sua jornada de aprendizagem nas
nos anos mais recentes. próximas unidades deste livro.
Temas
1 – A empresa ética
Iniciaremos apresentando os objetivos centrais da empresa ética.
Apesar de as pessoas geralmente a associarem a metas de responsa-
bilidade social e ambiental, você aprenderá que a sustentabilidade
financeira é importante para a existência da empresa ética.
2 – O modelo de empresa ética
Em seguida, destacaremos como os valores característicos nas em-
presas éticas geram mudanças estruturais que viabilizam a conduta
ética coletiva dos empregados dessas empresas.
3 – A dinâmica da empresa ética
Uma empresa ética funciona de forma diferente das empresas não
éticas. Nesse tópico, discutiremos como a estrutura da empresa ética
traz implicações para sua dinâmica de trabalho.
4 – Instrumentos de gestão da Ética empresarial
O livro chega ao fim no tópico em que abordaremos instrumentos de
gestão da ética empresarial. Mostraremos como os códigos de ética
empresarial podem ser ferramentas úteis para o processo de transfor-
mação de uma empresa não ética em uma empresa ética.
Introdução
Embora muito se fale sobre a necessidade de criar empresas éticas,
diz-se pouco a respeito de como fazer isso. Alguns podem achar que
é muito simples: basta dizer às pessoas que não façam nada que é
considerado errado e pronto! Está aí uma empresa ética!
Será que é isso mesmo? Se é tão simples assim, por que tantas em-
presas têm problemas de caráter ético? Nesta unidade, você estudará
os desafios enfrentados pelas empresas que buscam desenvolver um
conjunto de valores de caráter ético. Em um mundo em que muitos
competidores obtêm lucros por meio de políticas e práticas informais
desonestas, ser ético definitivamente não pode ser considerado algo
simples. No entanto, também não é impossível.
Como em qualquer processo de profunda mudança cultural, a tran-
sição em direção à ética empresarial exige habilidades gerenciais dos
administradores. Quais desafios são enfrentados e que ferramentas
existem para lidar com eles? Ao fim desta unidade, você fechará com
chave de ouro a sua empreitada de leitura deste livro, pois entenderá
os elementos práticos que fazem parte do processo de transformação
moral de uma empresa.
Bons estudos!
A empresa ética
Frequentemente, quando realizamos discussões a respeito da éti-
ca no meio empresarial, várias pessoas contestam a questão da
rentabilidade financeira. Se tivesse que escolher entre ter uma em-
presa rentável ou ética qual escolheria? Essa pergunta guarda em
si um problema que combateremos nesse tópico: a oposição entre
sucesso financeiro e ética.
Já mostramos de diversas maneiras que a ética é essencial para
qualquer empresa. Usando três dimensões como base, podemos
notar que a conduta empresarial ética é importante por refletir um
conjunto de padrões morais considerados indispensáveis na so-
ciedade em que vivemos. Esses padrões devem ser interiorizados
de forma a se tornarem hábitos individuais e coletivos que con-
tribuem para uma vida em sociedade mais coerente com as cren-
ças que temos a respeito dos comportamentos que são desejáveis
ou não. Além disso, a ética também é essencial por nos permitir
Saiba mais
Outplacement é uma prática empresarial que visa conduzir processos de
demissão de forma a preservar a honra e a dignidade do funcionário demitido.
Envolve apoiar o empregado que está passando pelo processo de demissão
na atividade de se preparar para processos seletivos em outras empresas,
envolvendo a confecção do currículo e contatos com agências de recolocação
e outras organizações. Seu objetivo principal é assegurar que o profissional que
está sendo demitido se reposicione no mercado.
Saiba mais
A Teoria dos Sistemas Abertos tem origem na Teoria Geral dos Sistemas,
formulada pelo biólogo austríaco Luwig von Bertalanffy. Ao aplicar os
preceitos das ideias de Bertalanffy no contexto organizacional, essa teoria
defende que as empresas são por definição sistemas abertos, pois não
podem ser corretamente compreendidas de forma isolada, mas em sua
relação de interdependência em relação ao ambiente externo. Segundo essa
teoria, ambientes mais competitivos e dinâmicos exigem que as empresas se
tornem mais flexíveis e adaptáveis (MOT TA; VASCONCELOS, 2006).
é: “Poderíamos ter feito algo para que esse funcionário não tivesse
sido submetido à possibilidade de cometer essa ação antiética?”. A
empresa nunca controlará totalmente a ação dos empregados, mas
deve buscar minimizar o espaço para o erro.
A vontade é outro elemento essencial para a criação de uma
estrutura organizacional que incentive a prática da conduta ética.
Criar esse tipo de estrutura envolve desafios como resistência, per-
da de oportunidades de obter ganhos financeiros por meio de ati-
vidades moralmente questionáveis ou cobranças de stakeholders.
A empresa ética deve persistir em sua intenção de permanecer
dessa forma e não se transformar em uma empresa não ética. É
a vontade de ser ética que determinará se a empresa sucumbirá
diante do primeiro desafio ou não. Assim como no caso de um
indivíduo que deseja abandonar um hábito indesejado, os gestores
da empresa ética precisam realizar um esforço contínuo de longo
prazo para efetivar a mudança de valores em direção à ética no
ambiente dos negócios.
Apesar da importância da memória e da vontade para o proces-
so de criar uma estrutura organizacional que leve a empresa a uma
dinâmica ética, esses elementos não são suficientes. Os arquitetos
organizacionais devem também desenhar processos firmados na
lógica. Por exemplo, muitas empresas, quando conduzem proces-
sos seletivos, entregam um documento com o título “Declaração
de Conflito de Interesses” aos candidatos. Nesse documento, cada
candidato deve declarar se possui alguma relação ou se desem-
penha alguma atividade que possa caracterizar, em um momento
futuro, um conflito que coloque em xeque a ética de seu processo
seletivo de admissão na empresa.
Se esse funcionário for primo de outro empregado, pode ser
que essa relação de parentesco em nada tenha influenciado no
processo seletivo. No entanto, em uma situação hipotética futura
em que um primo conceda uma promoção ao outro, alguém, ao
descobrir a relação de parentesco, poderá argumentar que hou-
ve favorecimento pessoal na contratação ou na promoção. Para
evitar esse problema, a lógica manda que a empresa exija que o
funcionário declare no momento de sua admissão qualquer pos-
sível conflito de interesses. Isso significa que a pessoa perderá o
direito de concorrer à vaga? Não necessariamente. Pode ser que
a empresa simplesmente determine que os primos não trabalha-
rão em um mesmo departamento. Se a empresa estiver ciente do
morais elevadas podem ser úteis nesse processo. Da mesma marketing tradicional,
geralmente usados no
forma, casos de problemas enfrentados por empresas não éti-
relacionamento com
cas também podem ser muito úteis no sentido de provocar a
clientes e consumidores
reflexão do colaborador e a conscientização a respeito da ética
em geral, para uso
no trabalho.
no relacionamento
Motivação – “por que eu e essa empresa devemos ser éticos?”
interno, ou seja, com
Essa é a pergunta que deve ser respondida nesse estágio do
empregados, nas
programa. A empresa precisa apresentar motivos que levem as empresas.
pessoas a agir de acordo com as expectativas desse programa.
Embora a motivação seja intrínseca e ninguém seja capaz de
motivar outra pessoa, a empresa deve colocar as pessoas diante
de situações e argumentos que possam aflorar seu desejo por
agir de forma ética.
Capacitação – uma mudança de paradigma na dinâmica de
atuação profissional dessa magnitude demanda treinamentos.
Por isso, a empresa deve providenciar um programa de capaci-
tação à conduta ética. Os gestores devem aprender a lidar com
conflitos éticos vivenciados por seus subordinados. Devem
Exercícios de fixação
1. A prosperidade econômica pode ser enten- ética nas empresas. Você concorda com
dida como um dos objetivos da empresa essa afirmação? Justifique.
ética? Explique. 8. Identifique e resuma o código de ética de
2. Explique a relação entre ética nas empresas uma empresa. Para realizar essa atividade, vi-
e responsabilidade ambiental. site o website de várias organizações empre-
3. Como uma empresa pode agir de maneira sariais até encontrar alguma que apresente
ética em termos sociais? nesse canal seu código de ética.
4. Exemplifique três aspectos estruturais em que 9. Qual é a diferença entre o código de ética
a empresa ética difere da empresa não ética. de uma empresa e o de uma profissão?
5. Cite dois desafios que uma empresa enfren- 10. Se você fosse contratado para implantar um
ta ao buscar adotar uma cultura ética? código de ética em uma empresa, como
6. O que é um código de ética empresarial? você procederia?
7. A implantação de um código de ética em-
presarial garante o sucesso na gestão da
Panorama
A Papel Bom Ltda. é uma empresa que produz e problema que está levando a Papel Bom Ltda. a
vende papel e que, dada a sua natureza de ope- perder mercado. As duas principais empresas con-
ração produtiva, busca desenvolver valores de correntes da Papel Bom têm praticado ações não
sustentabilidade social e ambiental. Nas unidades éticas em seus processos produtivos. Elas divul-
de manejo florestal onde se desenvolve o proces- gam publicamente que contribuem para a redu-
so de produção da Papel Bom, há quase uma ob- ção do aquecimento global e para a conservação
sessão pela preservação do meio ambiente e pela do solo e da água. No entanto, investem apenas
realização de ações sociais que promovam o bem- 30% do montante que a Papel Bom dedica a esses
-estar do entorno da empresa. objetivos. O resultado é que esses concorrentes
Recentemente, a Papel Bom Ltda. tem passado acabam sendo mais citados pelo consumidor em
por uma crise financeira. O lucro da empresa tem pesquisas de marketing sobre empresas éticas no
caído ano após ano, o que levou seus acionistas a ramo de papéis. Embora invista mais e faça um
um grande descontentamento. O conselho dire- trabalho ambiental e social muito mais sério que
tivo da empresa decidiu demitir o antigo geren- o de seus concorrentes, a Papel Bom é a empresa
te de planejamento e contratar um novo. Jorge menos lembrada em termos de ética no seu ramo
Alves, experiente executivo de planejamento, é de negócios.
o novo ocupante do cargo. Após algumas sema- Ao tomar conhecimento dessa situação, Jorge Alves,
nas de ambientação, ele identificou que há um o novo gerente de planejamento, decide mudar a
Recapitulando
V
amos recordar algumas coisas que estu- moralmente elevada demanda. Deve ser feita
damos nesta unidade? Nós começamos uma remodelação na engenharia organizacio-
pelas características da empresa ética. É nal em termos de estrutura social, participantes,
normal que as pessoas tenham uma visão razoa- objetivos, tecnologias e do entorno. Ao adotar
velmente romântica e idealista da empresa ética, uma estrutura que possibilita a expressão dos
mas nesta unidade você viu que devemos manter valores morais característicos da empresa ética,
os pés no chão ao buscarmos elevar as condutas é natural que a empresa assuma uma dinâmica
de uma empresa a um nível moral mais elevado. diferente. As pessoas podem estar acostumadas
A empresa ética só é viabilizada caso todos os a trabalhar com base em valores organizacionais
componentes de sua tríplice finalidade estiverem que partem de pressupostos distintos dos da
presentes: a empresa precisa ser lucrativa e pos- empresa ética.
suir responsabilidade social e ambiental. Geral- Um dos principais recursos para a realização des-
mente, as pessoas falam muito das características se objetivo é a adoção de um código de ética da
sociais e ambientais quando se referem à em- empresa. Esse código deve explicitar as expec-
presa ética. No entanto, mostramos que se não tativas da empresa com relação aos comporta-
houver sustentabilidade econômica e financeira, mentos de seus empregados e refletir os dilemas
a empresa não conseguirá honrar seus compro- comumente encontrados pelos integrantes da
missos com clientes, fornecedores, empregados, empresa em sua atividade de rotina.
governo ou algum outro stakeholder. Quando Chegamos ao fim deste livro. Agora você tem
isso ocorre, por mais que a empresa não agrida o conhecimentos que não possuía até começar
meio ambiente e pratique ações de responsabili- a lê-lo. A ética é essencial para a vida em cole-
dade social, não podemos dizer que temos uma tividade. As empresas tornaram-se instituições
empresa ética. poderosas. Assim, se você trabalha em uma de-
Para alcançar a tríplice finalidade, a empresa las, espero que tenha entendido o recado: pode
ética deve realizar uma reestruturação interna contribuir para a criação de um mundo mais éti-
que reflita as necessidades que uma conduta co! O sinal está aberto para a ética nas empresas!