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Teoria Geral do Direito Civil

Direito privado rege as relações entre os particulares, o Direito Civil constitui o núcleo
fundamental do D. Privado que não tenha sido autonomizado como são os casos do D.
Comercial e do Direito do trabalho. Esses ramos do Direito autónomo (por especialização
relativamente ás normas do Direito Civil) são D privado especial enquanto que o D. Civil é o D.
Privado comum.

A Teoria Geral do Direito Civil é, pois, a Teoria Geral do Direito Privado. O D. Civil
disciplina substancialmente as relações entre pessoas, e porque se trata de um ordenamento
jurídico tutela coercivamente os interesses das pessoas e regula a vida quotidiana do Homem
comum.

A lei é a fonte mais importante do D. Civil português. O repositório fundamental do


nosso Direito Civil é o código Civil aprovado pelo DL 47 344 de 25 de novembro de 1966.

Este código recorre a conceitos gerais e abstratos. É este um tipo de formulação que se
traduz na elaboração dos tipos de situações da vida mediante conceitos definidos e recortados
aos quais o juiz deve subsumir nas situações a decidir em concreto no art. 210º CC.

Há um conjunto de princípios fundamentais do D. Civil, quais sejam:

1. O reconhecimento da pessoa e dos direitos de personalidade;


2. O Princípio da liberdade contratual;
3. A responsabilidade civil;
4. A concessão da personalidade jurídica ás pessoas coletivas;
5. A propriedade privada;
6. A família;
7. O fenómeno sucessório.

1º O reconhecimento da pessoa e dos direitos de personalidade

O Direito só pode ser concebido tendo por destinatários os seres humanos em


convivência. Ao aplicar-se a essa convivência o Direito desencadeia uma teia de relações
jurídicas entre as pessoas traduzidas em direitos e deveres jurídicos.

Assim, e num sentido técnico, ser pessoa é ter aptidão para ser sujeito de direitos e
obrigações. Nesse sentido técnico-jurídico não há coincidência entre a noção de pessoa
(sujeito de direitos) e a noção de ser humano. De tal ordem é assim que o ordenamento
jurídico também regula e protege os direitos das chamadas pessoas coletivas ou pessoas
jurídicas.

De acordo com o nº1 do art. 68º CC a personalidade jurídica é reconhecida a todo o ser
humano a partir do seu nascimento completo e com vida (Nascimento completo- quando
corta o cordão umbilical, distinto da progenitora).

Toda a pessoa jurídica é titular de alguns direitos e obrigações. Mesmo que por
hipótese no domínio patrimonial não lhe pertençam quaisquer direitos (quase inconcebível)
sempre o sujeito será titular de um certo número de direitos absolutos que se impõem ao
respeito de todos os outros e que são designados no CC por direito, de personalidade 70º e
seguintes.
Os direitos de personalidade que constituem um conteúdo mínimo e imprescindível da
esfera jurídica de casa pessoa incidem sobre a sua vida, a sua saúde física, a sua integridade
física, a sua honra, a sua liberdade física e psicológica, o seu nome, a sua imagem e a reserva
sobre a intimidade da sua vida privada.

O direito protege os vários modos de ser físicos ou morais da personalidade do sujeito.


A sua violação pode constituir facto jurídico ilícito até do foro criminal passível de privação de
liberdade. Nessas hipóteses e noutras em que a violação dos direitos não constitui um crime,
existe sempre um faco ilícito civil que faz desencadear a responsabilidade civil do infrator que
fica obrigado a indemnizar os prejuízos que haja causado.

Os direitos de personalidade são irrenunciáveis podendo apenas ser objeto de


limitações voluntárias que não sejam contrárias aos princípios da ordem pública (art. 81º CC).
Assim, é admissível o consentimento para na intervenção cirúrgica sem o qual existiria facto
ilícito. Por contrariarem princípios de ordem publica são factos ilícitos as mutilações, a
eutanásia e o auxílio ao suicídio mesmo que consentidos pelo sujeito.

(Titular de direito- alguém que tem o dever correspondente ao meu direito, todos
quantos tenham nascido completos e com vida, seja que direito for. Por exemplo se eu tenho
direito á propriedade é porque todos os outros têm o dever se não invadir nem perturbar o
meu espaço.)

2º Princípio da liberdade contratual

Um outro princípio fundamental do Direito Civil português, é o da liberdade


contratual, art.405º CC.

A produção de efeitos jurídicos resulta principalmente de atos de vontade ou


declarações de vontade dirigidas a essa produção de efeitos. Os atos jurídicos cujos efeitos são
produzidos por força da manifestação de uma intenção e em coincidência com o teor
declarado designam-se por negócios jurídicos.

O negócio jurídico é uma manifestação de princípio da autonomia da vontade


subjacente a todo o D. Privado. A autonomia da vontade consiste no poder reconhecido ás
pessoas de autogoverno da sua esfera jurídica, isto é, de autorregulamentação dos seus
interesses.

Mas a autonomia da vontade não se revela apenas através do negócio jurídico, pois
também se manifesta no poder de livre exercício dos seus direitos e dos seus bens.

Assim, tanto é exercício da autonomia da vontade a conclusão de um contrato de


compra e venda, em certas condições, como é consumo ou destruição de um bem de que se é
proprietário ou ainda a exigência ou não do cumprimento de obrigações de outrem.

A autonomia da vontade está presente nos domínios em que o D. Civil tem uma função
de modelação e disciplina da vida social. Já não está presente nos domínios em que cabe ao D.
Civil uma função de proteção ou de defesa de direitos constituídos.

O dever de indemnizar, que resulta da responsabilidade civil, não se constitui por força
de uma declaração de vontade de quem causou o dano. Os negócios jurídicos classificam-se
em:

A) Negócios jurídicos unilaterais;


B) Negócios jurídicos bilaterais.

São negócios jurídicos unilaterais os que concluem com uma só declaração de


vontade ou com várias, mas proferidas num sentido unívoco. Por exemplo o testamento, a
procuração, etc.

São negócios jurídicos bilaterais ou contratos os que são constituídos por uma ou
mais declarações de vontade contrários entre si, mas convergentes para um fim/objetivo
comum. Por exemplo compra e venda, arrendamento, aluguer, prestação de serviço, doação,
etc. (Para ser um contrato as declarações têm que ser opostas.)

Ato jurídico
simples
Facto jurídico Unilateral

Negócio Sinalagmáticos
jurídico Bilateral

Não Sinalagmáticos

A liberdade de celebração de contratos que resulta expressamente do 405º CC,


consiste na faculdade de livremente realizar ou recusar a celebração de contratos uma vez
que, em regra, ninguém pode ser imposta a obrigação de celebrar contratos, assim como
também não pode existir sanção por não querer celebrar contratos.

Como restrições a esta liberdade de celebração de contratos podem verificar-se:

A) A consagração de dever jurídico de contratar (ex. a obrigação de realizar um


contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel);
B) A proibição de celebração de contratos de determinadas pessoas (ex. o art. 877º
CC), a sujeição do contrato á autorização ou consentimento de outrem (ex. art
1682º nº1 e 3 CC; art. 1682º -a).

Tão importante ou até mais do que a liberdade que as pessoas têm de celebrar ou não
contratos do art.405º CC resulta ainda uma outra liberdade qual seja a de modelação do
conteúdo contratual.

Esta liberdade consiste na faculdade conferida ás pessoas de fixarem livremente o


conteúdo dos contratos, celebrando os contratos de tipo previstos no Código Civil com ou sem
aditamentos ou estipulando contratos de conteúdo diverso/distinto do que a lei prevê. Podem,
pois, as pessoas:

A) Realizar contratos com as características/conteúdo dos contratos previstos e


regulados na lei (contratos típicos);
B) Celebrar contratos típicos, mas acrescentando-lhes as clausulas que entenderem
(contratos mistos e/ou coligados);
C) Celebrar contratos totalmente distintos dos que a lei prevê (contratos atípicos);

No entanto, também esta liberdade sofre restrições:

A) O objeto de quaisquer contratos tem de obedecer aos requisitos previstos no art.


208º CC;
B) São anuláveis os negócios usuários (usura) art.282º CC;
C) A conduta dos sujeitos contratantes deve pautar-se pelo princípio da boa fé art.
676 nº2 CC;
D) Sujeição, ás vezes, a normas de carater imperativo e por tanto inderrogáveis (não
podem ser afastadas).

3º Responsabilidade Civil

Na vida social os comportamentos (por ação ou omissão) adotados por uma pessoa,
causam muitas vezes prejuízos de outras. Ao direito coloca-se o problema de saber quem deve
suportar o dano causado.

Quando a lei impõe ao autor de certos atos a obrigação de reparar danos causados a
outrem, estamos a falar de responsabilidade Civil. A responsabilidade Civil consiste na
necessidade imposta por lei a quem causa prejuízos a outrem de colocar o ofendido na
situação em que estaria sem a lesão, art. 483º e 562º CC.

A responsabilidade civil atua através do nascimento da obrigação de indemnização


que, tem em vista tornar o lesado indemne (sem dano). Esta reconstituição da situação em
que o lesado estaria sem a infração, deve ter lugar mediante a reconstituição natural, isto é, a
restauração natural da situação antes da lesão art.566º nº1 CC. Porém, quando a
reconstituição natural for impossível ou insuficiente haverá lugar á indemnização em dinheiro,
isto é, a uma reconstituição por equivalente. Esta é a forma mais comum de colocar o lesado
sem dano.

Os danos sofridos pelo lesado podem ser de duas espécies:

A) Danos patrimoniais, isto é, os prejuízos sofridos pelo lesado que sejam suscetíveis
de avaliação pecuniária. Neste dano de natureza patrimonial estão compreendidos
o dano emergente (prejuízo imediato sofrido pelo lesado) e o lucro cessante (as
vantagens que deixaram de entrar no património do lesado em consequência da
lesão. Por ex. um taxista que teve um acidente de carro por conta de outrem), art.
564º nº1 CC.
B) Danos não patrimoniais ou morais que pela sua gravidade merecem a tutela do
direito, art.494º nº1 CC. Os danos não patrimoniais resultam da lesão de bens
estranhos ao património do lesado, como por exemplo a integridade física e
psíquica, a liberdade, a honra, a reputação, etc. Não é possível atribuir um “preço”
a este tipo de dano, mas é possível e exigível que sejam compensados.

Daqui decorre que a expressão de indemnização está pensada estritamente para os


danos patrimoniais e a compensação para os danos morais.

Como pressupostos para o surgimento da responsabilidade Civil temos:

1. A existência de um dano;
2. A existência de uma ligação causal entre o facto gerador de responsabilidade e o
prejuízo (nexo de causa);
3. Ilicitude do facto, isto é, o ato causador do dano tem de ser violador de direitos
subjetivos ou de interesses legítimos e que mereçam proteção legal;
4. Que seja culposo o comportamento, isto é, passível de uma censura ético-jurídica
ao sujeito que praticou o ato.
A culpa pode resultar da existência de uma intenção de causar um dano (dolo) ou da
omissão dos deveres de cuidado diligência ou perícia exigíveis para evitar o dano (negligencia
ou mera culpa).

O art.494º CC apresenta um tratamento diferenciado no que toca á responsabilidade


civil consoante a culpa corresponda a dolo ou negligência.

Ao lado da responsabilidade civil existe a responsabilidade criminal, visando esta


satisfazer não os interesses individuais dos lesados, mas sim os interesses da comunidade
ofendida que foi pelo ato criminoso. Isto vale por dizer que o mesmo comportamento do
sujeito pode ser gerador simultaneamente de responsabilidade civil e criminal.

De acordo com o art.483º CC a responsabilidade civil exige em regra a culpa do agente.


Porém, o nosso ordenamento jurídico reconhece excecionalmente casos de responsabilidade
civil sem culpa. É o que se designa por responsabilidade pelo risco reconhecida em domínio
em que o Homem tira partido de atividades que potenciando interesses seus importem um
aumento do risco para os outros. São casos de responsabilidade objetiva ou pelo risco
previstos nos art. 500º, 502º, 503º, 509º,… CC.

Tal qual como pode haver responsabilidade civil sem culpa também, excecionalmente,
pode haer responsabilidade civil por atos lícitos. Correspondem ás situações que, apesar da
situação do agente ser conforme ao agente, parece excessivo não dar ao lesado o direito á
reparação. São exemplos a responsabilidade emergente de certos casos de estado de
necessidade, art. 339º nº2 CC.

Responsabilidade Contratual e Extracontratual

A Responsabilidade Contratual é originada pela violação de um direito de crédito ou


de uma obrigação em sentido técnico. É, pois, responsabilidade do devedor para com o credor
pelo não cumprimento da obrigação.

A Responsabilidade Extracontratual, também conhecida como aquiliana ou delitual,


resulta da violação de um dever geral de abstenção contraposto a um direito absoluto (direito
real e direito de personalidade).

4º Concessão da personalidade jurídica ás pessoas coletivas

A par da personalidade jurídica reconhecida a todos as pessoas singulares o nosso


ordenamento jurídico verifica certos requisitos e atribui personalidade jurídica ás chamadas
pessoas coletivas. As pessoas coletivas são coletividades de pessoas ou complexos
patrimoniais organizados com vista a um fim comum ou coletivo ás quais o ordenamento
jurídico atribui a qualidade de sujeitos de direitos.

As pessoas coletivas tornam-se centros de uma esfera jurídica própria, mas autónoma,
em relação ao conjunto de direitos e deveres de cada uma das pessoas dos seus membros.
Possuem património próprio separado do das pessoas singulares ligadas á pessoa coletiva. São
titulares de direitos e de deveres jurídicos e assumem obrigações através da prática de atos
jurídicos realizados em seu nome pelos seus órgãos.

Conforme resulta do art.157º CC há três modalidades de pessoas coletivas:


A) Associações que são coletividades de pessoas que não têm por fim o lucro económico
dos seus associados;
B) Fundações que são complexos patrimoniais ou massas de bens afetados por uma
liberalidade com vista á prossecução de uma finalidade estabelecida pelo fundador ou
em harmonia com a sua vontade;
C) Sociedades que são conjunto de duas ou mais pessoas que contribuem com bens ou
serviços para o exercício de uma atividade económica com objetivo de obter lucro e
distribui-lo pelos sócios. De entre as sociedades ganham especial relevo as sociedades
comerciais sendo as mais importantes as sociedades por quotas e as sociedades
anónimas.

5º A propriedade privada

No desenvolvimento da sua vida os sujeitos servem-se das coisas utilizando-as para


satisfazer as suas necessidades e para conseguir os seus objetivos. Enquanto que as pessoas
são fins em si mesmas, as coisas são meios colocados ao dispor dos fins delas. A detenção, o
uso, e a disposição das coisas permite que se satisfação necessidades julgadas pelas pessoas
como fundamentais ou secundárias. É missão fundamental do ordenamento jurídico organizar,
segundo valores juridicamente atendíveis, corresponderes que as pessoas têm sobre as coisas
e também o conteúdo das relações jurídicas que se estabelecem entre os sujeitos e as coisas.

Ao longo da história, e no momento atual, encontramos uma variada gama de formas


de apropriação, domínio e uso dos bens pelas pessoas. O modelo romano de propriedade veio
a ser definido na celebre qualificação tripartida do poder ( ius utendi, ius fruendi, ius abutendi
(poder de usar, fruir e dispor, respetivamente )). É este ainda o nosso modelo da propriedade
individual privada. Corresponde ao principio da plena propriedade privada (plena in re
potestas ). Esta é a realidade que se mantem em todos os países que respeitam a propriedade
privada dos seus cidadãos.

A tutela constitucional da propriedade privada está expressamente consagrada no


art.62º nº1 CRP, segundo o qual a todos é garantido o direito á propriedade privada e á sua
transmissão em vida ou por morte nos termos da constituição. De igual os artigos 61 e 89 da
CRP apresentam ou refletem a tutela da iniciativa e da propriedade privada.

Tal modo assim é, que só mediante o pagamento da justa indemnização pode ser
efetuada a expropriação por utilidade pública. O código civil não define o direito de
propriedade, mas o art.1305 CC caracteriza-o dizendo que, o proprietário goza de modo pleno
e exclusivo dos direitos de usar, fruir e dispor das coisas que lhe pertencem dentro dos limites
da lei com observância das limitações por ela imposta.

Assim, e como características do direito de propriedade em sentido jurídico:

1. O titular tem em princípio todos os poderes (usar, usufruir e dispor);


2. O direito de propriedade é elástico, isto é, é dotado de uma força expansiva na medida
em que extinto que seja um outro direito real que o limite reconstitui-se a plenitude
dos poderes do proprietário sobre a coisa;
3. O direito de propriedade é um direito perpétuo, o que implica não poder extinguir-se
pelo não uso.

Para alem do direito de propriedade que é o direito real por excelência e como vimos, o
único até com reflexo na CRP, o nosso ordenamento jurídico apresenta/consagra outros
direitos reais que ligados ao direito de propriedade são qualificados como direitos reais
menores ou limitados. O direito de propriedade é pois, o direito real máximo, isto é, aquele
que tem um conteúdo pleno.

Ao contrário do direito de propriedade os direitos reais limitados não conferem ao seu


titular a plenitude dos poderes sobre determinada coisa. Conferem apenas a possibilidade de
exercer certos poderes sobre uma coisa, mas não a plenitude dos poderes correspondentes á
clássica tripartição.

Dentro dos direitos reais limitados há que distinguir:

1. Direitos reais de gozo


2. Direitos reais de garantia
3. Direitos reais de aquisição

Os direitos reais de gozo são aqueles que conferem ao seu titular um poder de
utilização, total ou parcial, de uma coisa, e por vezes, também o da apropriação dos frutos
naturais ou civis que a coisa produza. No nosso ordenamento jurídico esses direitos reais de
gozo são : usufruto, uso e habitação, direito de superfície e as servidões prediais.

Os direitos reais de garantia são direitos que conferem ao seu titular o poder de pelo
valor de uma coisa ou pelo valor dos rendimentos da coisa possa o credor obter, com
preferência sobre os outros credores o pagamento da divida de que é titular ativo. Os direitos
reais de garantia são o penhor, a hipoteca, os privilégios creditórios, a consignação de
rendimentos e o direito de retenção.

Os direitos reais de aquisição são os que conferem a um determinado individuo a


possibilidade de se apropriar de determinada coisa. Configuram situações especiais face ás
quais determinados sujeitos podem exercer uma especial faculdade com vista á aquisição da
propriedade de uma coisa. O mais importante direito real de aquisição no nosso ordenamento
jurídico é o direito legal de preferência e o direito de preferência com eficácia real.

Os direitos reais de garantia são acessórios dos direitos de crédito designadamente no


que se refere á sua extinção. Quer isto dizer, que ao extinguir-se o direito de crédito extingue-
se igualmente o direito real de garantia que lhe estiver associado. Porém, esta característica de
acessoriedade não implica que estes direitos reais de garantia não sejam verdadeiros direitos
reais, pois comungam das características típicas de qual
6º A família

O direito civil português contem entre os seus princípios básicos o reconhecimento da


família, o direito da família caracteriza-se por um acentuado predomínio de normas de
caracter imperativo. Aliás só mesmo a propósito das regras relativas á escolha do regime de
bens é que se pode afirmar que no direito da família encontramos reflexos do princípio da
liberdade contratual.

A CRP contém normas relativas á família e delas decorre:

a) O direito á celebração do casamento, art. 36º nº1 CRP;


b) O direito á constituição da família, art. 36 nº1 CRP;
c) Competência da lei civil para revelar os efeitos e a dissolução do casamento, art. 36º
nº2 CRP;
d) A admissibilidade do divorcio, art. 32º nº2 CRP;
e) Igualdade dos cônjuges quanto á capacidade civil e á educação dos filhos art.36º nº3
CRP;
f) Não discriminação dos filhos nascidos do casamento e fora dele art.36º nº4 CRP;
g) Atribuição aos pais do poder-dever de educação dos filhos art. 36º nº5 CRP;
h) Reconhecimento e proteção da maternidade como valor social, art.68º CRP;
i) Proteção da infância, art. 69º CRP;
j) Reconhecimento da constituição da família e sua proteção, art. 67º CRP.

O CC. dedica ao direito da família o livro IV. De acordo com o art. 1576º CC, família é o
conjunto das pessoas unidas por vínculos emergentes do casamento, do parentesco, da
afinidade e da adoção. O casamento seja ele civil ou católico dissolve-se por morte ou por
divórcio, sendo que este pode ser por mútuo consenso, ou sem o consentimento do outro
cônjuge, nos termos do art. 1773º CC.

Sem que haja dissolução do casamento podem ocorrer duas circunstâncias


modificativas dele. Falamos da simples separação judicial de bens e da separação judicial ou
por mútuo consentimento de pessoas e bens. O parentesco vem definido no art. 1578º e
corresponde ao vínculo que se estabelece entre duas pessoas em resultado de uma delas
descender da outra ou de ambas procederem de um progenitor comum. Se o vínculo resultar
do facto de uma pessoa descender da outra, diz-se que o parentesco é na linha reta (1580 nº1
1º parte). Caso procedam de um progenitor comum a linha diz-se colateral nos termos do art.
1580 n1 2 parte.

A afinidade é o vínculo que une cada um dos cônjuges aos parentes do outro conforme
resulta do art.1584º. Intimamente ligado com o parentesco encontramos a filiação. É a
prepósito da filiação que se regula o estabelecimento da paternidade e da maternidade.

A maternidade pode estabelecer-se por 3 meios:

a) Declaração de maternidade, art. 1803º e seguintes;


b) Averiguação oficiosa, art. 1808º e seguintes;
c) Reconhecimento judicial, art. 1814º.

Quando ao estabelecimento da paternidade: se em causa estiverem filhos nascidos ou


concebidos na constância do matrimónio, presume-se que o pai é o marido da mãe, art. 1828º.
Quanto aos filhos nascidos ou concebidos fora do casamento, o estabelecimento da
paternidade faz-se por :
a) Perfilhação art 1849
b) Averiguação oficiosa, art 1864º
c) Reconhecimento oficial, art 1869 e 1870;

A adoção é o vínculo que se estabelece entre duas pessoas e dele resulta o parentesco
legal por oposição ao parentesco natural.

7º princípio das sucessões

O fenómeno sucessório

A sucessão consiste no chamamento de uma ou mais pessoas á titularidade das


relações jurídicas patrimoniais de uma pessoa falecida e a consequente devolução dos bens
que a esta pertenciam. O nº1 do art.62º CRP consagra o direito á transmissão dos bens por
morte.

O CC no seu art.2024º prevê:

a) A sucessão legitimária, que impõem a devolução de parte dos bens a certas


pessoas mesmo contra a vontade do autor da sucessão (art.2056º e segs.);

b) A sucessão legítima, que consiste no chamamento dos herdeiros legítimos á


sucessão pelo facto de o autor da sucessão não ter válida e eficazmente disposto dos seus
bens (art.2131º e segs). O chamamento faz-se por classes de sucessíveis (art.2133º) preferindo
dentro de cada classe os parentes de grau mais próximo, em relação aos de grau mais
afastado. Quanto aos herdeiros legitimários (cônjuge ascendente e ascendente art.2157) deve
o autor da sucessão, respeitar as respetivas legitimas sob pena de as liberalidades a terceiros
feitas em vida ou mortis causa que ofendam essas legitimas serem reduzidas por
inoficiosidade. Da herança existe sempre uma “fatia” de bens da qual em quaisquer
circunstâncias pode o autor da sucessão dispor livremente, a isto se chama a quota disponível.

c) Sucessão testamentária, que consiste no chamamento á sucessão dos


herdeiros designados no testamento (herdeiros testamentários). No testamento que é um
negócio jurídico unilateral e livremente revogável, o testador dispõe de todos os seus bens ou
de parte deles.

O testamento pode revestir formas comuns (testamento publico e testamento cerrado


art.2205 e 2206º CC e formas especiais como por exemplo: testamentos militares, testamento
a bordo de navio ou aeronave, testamento em caso de calamidade publica etc. art. 2210º,
2214º, 2219º e 2220º CC).

Os sucessíveis testamentários podem ser herdeiros testamentários se sucederem na


totalidade ou numa quota parte do património do falecido ou legatários caso sucedam em
bem ou bens determinados ou determináveis.

d) A sucessão contratual, só é admitida em casos excecionais e de reduzida


extensão. Em rigor falamos das doações mortis causa realizadas aquando a da celebração das
convenções antinupciais.

Nos termos dos art.2039º e seguintes prevê-se a chamada representação sucessória


quando a lei chama os descendentes de um herdeiro ou legatário a ocupar o lugar ou posição
jurídica daquele que não pode ou não quis aceitar a herança ou o legado.

Teoria geral da relação jurídica


Relação jurídica é a relação da vida social disciplinada pelo direito mediante a
atribuição a uma pessoa de um direito subjetivo e a imposição a outra pessoa de um dever
jurídico ou de uma sujeição.

O Direito subjetivo pode ser definido como o poder jurídico de livremente exigir ou
pretender de outrem um comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) ou de por um
ato livre de vontade só por si ou integrado por um ato de autoridade publica produzir
determinados efeitos jurídicos que inevitavelmente se impõem a outra pessoa. Os direitos
potestativos são poderes jurídicos de, por um ato livre de vontade só por si ou integrado por
uma decisão judicial produzir efeitos jurídicos que inelutavelmente se impõem á contraparte.
Do lado passivo desta relação jurídica temos alguém num estado de sujeição. Ao Direito
subjetivo propriamente dito contrapõe-se o dever jurídico que consiste na necessidade de
realizar o comportamento a que tem direito o titular ativo da relação jurídica.

A relação jurídica tem 4 elementos, são eles:

a) Sujeitos;

b) Objeto;

c) Facto jurídico;

d) Garantia.

I. Os sujeitos da relação jurídica são as pessoas entre quem se estabelece o


vínculo jurídico respetivo. Quando nos referimos a pessoas abrangemos naturalmente quer as
pessoas físicas quer as pessoas coléticas.

II. O objeto da relação jurídica é aquilo (coisa ou direito) sobre que incidem os
poderes do titular ativo da relação jurídica.

III. Facto jurídico é todo o ato humano ou evento natural capaz de produzir efeitos
jurídicos. O facto jurídico é, ele próprio, a condição ou o pressuposto da existência da própria
relação jurídica, é, pois, a sua causa ou origem.

IV. A garantia da relação jurídica é o conjunto de providencias coercitivas


colocadas á disposição do titular ativo da relação jurídica com o objetivo de obter a satisfação
do seu direito lesado por alguém que o infringiu ou ameaça infringir.

Trata-se da possibilidade de por em movimento o aparelho sancionatório estadual


(tribunais) para reintegrar a situação correspondente ao direito lesado, em caso de infração,
ou para impedir uma receada violação. Está excluído por exigências da defesa da paz social o
recurso á força própria para obter a satisfação dos direitos. Assim para a tutela de um direito
deve o seu titular requerer perante os tribunais a providência adequada intentando uma ação
judicial.

No entanto e excecionalmente, verificando certos requisitos, a autodefesa dos direitos


pode ser licita como são os casos da ação direta (art.336º) e a legitima defesa (art.337º).

Teoria geral dos sujeitos da relação jurídica


Como já vimos, sujeitos de direitos são os entes suscetíveis de serem titulares de
direitos e obrigações o mesmo é dizer, serem titulares de relações jurídicas. São sujeitos de
direito as pessoas singulares e as pessoas coletivas.

Á personalidade jurídica é inerente a capacidade jurídica ou a capacidade de gozo dos


direitos.

I. A capacidade de exercício ou a capacidade de agir, é a idoneidade para atuar


juridicamente exercendo direitos ou cumprindo deveres, adquirindo direitos ou assumindo
obrigações por ato próprio e exclusivo ou mediante um representante voluntário, isto é, um
representante escolhido pelo próprio representado.

II. A capacidade de exercício é reconhecida por lei aos indivíduos que atinjam a
maioridade. Porem essa capacidade de exercício é também reconhecida aos indivíduos de
idade igual ou superior a 16 anos e menores de 18, que hajam casado e cujo o casamento
tenha sido autorizado por quem exerça a responsabilidade parental ou essa falta de
autorização tenha sido suprida pelo conservador do registo civil na sequência de processo
especial intentado na mesma conservatória onde corre o mesmo processo para casamento.

Pessoas singulares

De acordo com o disposto no nº1 do art.66º CC a personalidade jurídica das pessoas


singulares adquire-se no momento do nascimento completo e com vida. Porem, não só se
admite a tutela dos direitos àqueles que nasceram completos e com vida, uma vez que a lei
reconhece a proteção de interesses e de direitos aos nascituros e até nalguns casos aos
consepturos. Nascituros são os indivíduos que ainda não nasceram, mas já foram concebidos e
os consepturos são os sujeitos que nem concebidos ainda foram.

Estabelece-se o nº2 do art.66º que os direitos reconhecidos por lei aos nascituros
dependem do seu nascimento. Até que esse nascimento ocorra, completo e com vida, pode
falar-se em direitos sem sujeito. O art.952º admite a possibilidade de serem feitas doações a
nascituros ou até mesmo a consepturos. Num caso e noutro a aquisição dos direitos por parte
do nascituro e do consepturo está sempre dependente do nascimento completo e com vida,
fator que permite o reconhecimento ao sujeito da personalidade jurídica.

Quanto ao termo da personalidade jurídica, dispõe o art.68º, segundo o qual a


personalidade jurídica cessa com a morte do sujeito. No momento da morte a pessoa perde os
direitos e os deveres da sua esfera jurídica, extinguindo-se os de natureza pessoal e
transmitindo-se os de natureza patrimonial aos seus sucessores.

O nº2 do art.68º CC (remissão para o 114 e vice-versa) consagra a chamada presunção


de comoriência, isto é, presunção de morte simultânea e de natureza ilidível, ex. supondo a
existência de um casal com dois filhos, A e B. Num acidente de viação, morre o casal e o filho
A. Se se considerarem as mortes simultâneas na totalidade da herança do casal sucede apenas
o filho B. Já se considerarmos apenas simultâneas as mortes dos pais provando-se que o filho A
morreu algumas horas depois deles a herança dos pais é dividida pelos dois filhos, A e B,
passando a parte de A para o seu avô, ainda vivo. O art.68º nº3, aborda questão ligada ao
termo da personalidade jurídica, mas estabelecendo uma diferente presunção, conhecida
como presunção de morte. Esta presunção de morte distingue-se por completo da morte
presumida a que se refere o art.114º CC.
O desaparecimento da pessoa a que alude o nº3 do art.68º não pode implicar que
duvida alguma haja sobre a morte do sujeito pois, a dificuldade da determinação imediata da
morte só pode ter como causa o desaparecimento do cadáver ou a impossibilidade da sua
identificação. Nestas circunstâncias é instaurada a ação judicial com vista á declaração da
morte de alguém conhecida como processo de justificação judicial do óbito.

Não se pode, pois, confundir o desaparecimento da pessoa previsto no art.68º nº3


com a ausência em parte incerta ou desconhecida, prevista no art.114º. De tal ordem assim é
que ao próprio CC que admite no art.116º o regresso do ausente mesmo nos casos em que da
ausência tenha resultado a declaração judicial de morte presumida. A ausência não tem desde
logo como implicação única a declaração judicial da morte do ausente, embora, verificados os
pressupostos previstos nos artigos do respetivo regime jurídico (art.89º a 121º CC) possa ser
declarada a morte do ausente. Curioso é o disposto no art.116º CC ao referir que se o ausente
for declarado morto presumivelmente e o seu estado civil fosse o de casado permite-se que o
cônjuge do morto presumível possa casar com outrem sem que o casamento anterior tenha
sido dissolvido por morte. Quer isto dizer, que a declaração judicial de morte presumida não
põe termo ao casamento, embora se admita que o “viúvo/a” possa casar com outrem sem que
tenha sido extinto o outro casamento. É por esta norma que se costuma dizer, em tom jocoso,
que a lei permite afinal a bigamia. Se porventura o sujeito declarado morto presumivelmente
regressar, o seu casamento é dissolvido por divórcio ainda que verdadeiramente não corra
nenhum processo de divórcio. Dito isto a morte a que se refere em quaisquer circunstâncias o
art.68º CC e a morte presumida do art.114º CC têm todas como consequência o termo/fim da
personalidade jurídica.

A propósito das pessoas singulares, há ainda que referir os chamados direitos de


personalidade a que se referem os art.70º e seguintes. São direitos de natureza geral, porque
todas as pessoas deles são titulares, são também de natureza extrapatrimonial e absolutos.
Quanto a este último aspeto deve dizer-se que a titularidade de um qualquer direito de
personalidade faz com que do lado passivo dessa mesma relação jurídica estejam todas as
outras pessoas. A isto se chama uma obrigação passiva universal. Os direitos de personalidade
são inalienáveis e irrenunciáveis, sendo nula qualquer disposição em contrário.

Ao conferir-se a capacidade de exercício a quem tenha completado os 18 anos de


idade ou a emancipação por via do casamento, determina a existência de um lapso temporal
durante o qual o individuo apesar de ser titular de direitos e obrigações, não os pode exercer
por si só nem tao pouco constituir representante voluntário.

Falamos, pois, da menoridade. A menoridade corresponde a uma ideia de


incapacidade geral de exercício conforme decorre no art.123º CC. Porém, apesar da ideia
generalizada da incapacidade de exercício, a lei prevê que em algumas circunstâncias possam
os menores praticar atos jurídicos e negócios jurídicos. A esse propósito, o art.127º CC refere
quais os atos e/ou negócios jurídicos que os menores identificados podem celebrar sem que se
ponha em causa a sua falta de capacidade de exercício. De tal ordem assim é, que os negócios
jurídicos celebrados por um menor nos termos desse 127º são tão validos quanto aqueles que
sejam celebrados por quem tenha já adquirido capacidade de exercício.

Para além do disposto no art.127º CC, duas outras circunstâncias a lei prevê
reveladoras também do reconhecimento de atuação por si só dos menores. Falamos da
possibilidade de o menor celebrar casamento, desde que tenha idade igual ou superior a 16
anos art.1601º CC, e também o direito que o menor de 16 anos tem para perfilhar. A
perfilhação é um modo entre outros do estabelecimento da paternidade. A incapacidade de
exercício do menor cessa quando atingir os 18 anos ou for emancipado pelo casamento.

Sem prejuízo do que atras referimos a propósito do art.127º CC, os negócios jurídicos
celebrados pelos menores são anuláveis nos termos dos artigos 125º e 126º CC. A legitimidade
e o prazo durante o qual a ação de anulação dos negócios jurídicos celebrados pelos menores
encontram-se previstas naquele mesmo art.125º CC.

Embora certo que quase sem exceções o menor não tem capacidade de exercício nem
pode escolher quem o represente, a lei prevê um modo de suprimento dessa incapacidade de
exercício. Esse modo de suprimento é a representação legal. No caso, falamos especialmente
no poder/dever conferido aos sujeitos titulares da agora conhecida como responsabilidade
parental (anteriormente designada por: poder paternal). Para além da responsabilidade
parental, fala ainda a lei em tutela quando aquela responsabilidade parental não possa ou não
deva ser levada a efeito pelos progenitores do menor.
Incapacidades conjugais ou ilegitimidades conjugais

As restrições á livre atuação jurídica derivadas do casamento são tradicionalmente


designadas por capacidades e têm por objetivo proteger os interesses do outro cônjuge e da
família. A regra administrativa dos bens do casal é a de que cada um deles tem a administração
dos seus bens próprios, art.1678 nº1 CC, pertencendo a ambos em conjunto a administração
dos bens comuns,art.1678º nº3 2º parte CC. Carecem do consentimento de ambos os cônjuges
nos regimes de comunhão (comunhão geral e comunhão de adquiridos) a alienação ou
oneração, arrendamento e a constituição de direitos pessoais de gozo sobre imoveis próprios
ou comuns. Assim nos dizem os art.1682º -A nº1 a) e art.1682º -A nº1 b CC).

A ilegitimidade ou a incapacidade conjugal supre-se pelo consentimento do outro


cônjuge que tem de ser especial para cada caso, pode ter forma especial e pode até nalguns
casos ser judicialmente suprida a falta de consentimento quando este se mostre que resultou
de uma injustificada recusa de o prestar. Os negócios jurídicos celebrados sem o consentimento
conjugal são inválidos embora essa falta de consentimento possa conduzir quer á
nulidade(art.892ºCC), quer á anulabilidade (art.1689º CC). Para alem das incapacidades atras
tratadas há ainda que abordar a chamada incapacidade acidental prevista no art.257º CC. De
acordo com esta norma estão abrangidos todos os casos em que a declaração negocial é feita
por quem devido a qualquer causa (ex. embriaguez, a estado hipnótico, intoxicação, delírio, ira,
etc.) estiver transitoriamente incapacitado de expressar a sua vontade de um modo livre e
esclarecido.

Pessoas coletivas

As pessoas coletivas são organizações constituídas por uma coletividade de pessoas ou


por uma massa de bens dirigidos á realização de interesses comuns ou coletivos ás quais a ordem
jurídica atribui personalidade jurídica.

São 2 os elementos constitutivos das pessoas coletivas:

1. O substrato, que é o elemento de facto, isto é, o conjunto de dados anteriores á


aquisição da personalidade jurídica, e por isso é qualificado como elemento material;
2. O reconhecimento, que é o elemento de direito transformador de uma organização ou
ente de facto num ente ou pessoa jurídica, e por tal motivo, é designado por elemento
formal.

O substrato divide-se em vários subelementos:

a) Elemento pessoal ou matrimonial, que é respetivamente o conjunto das pessoas que


fazem parte da pessoa coletiva e o conjunto ou a massa de bens;
b) Elemento teleológico que é, o fim ou a causa determinante da formação da coletividade
pessoal. É a finalidade prosseguida pela pessoa coletiva;
c) Elemento intencional, trata-se do prepósito de se obter uma nova pessoa jurídica
distinta das pessoas que dela fazem parte;
d) Elemento organizatório, traduz-se num conjunto de regras disciplinadoras das
características e do funcionamento da pessoa coletiva.

Os órgãos das pessoas coletivas podem ser deliberativos ou executivo, e não se confundem
nem com a pessoa dos associados, nem com a pessoa dos eventuais procuradores ou
mandatários.
Os factos jurídicos desencadeiam determinados efeitos geralmente associados á ideia
de aquisição, modificação ou extinção de relações jurídicas.

Aquisição de direitos:

A aquisição de direitos pode ser originária ou derivada, por sua vez, a aquisição
derivada de direitos pode ser translativa ou constitutiva. Na aquisição originária o direito
adquirido não depende da existência de um direito anterior que poderá até não existir. Ex. a
ocupação de coisas moveis (art.1318º e ss CC), a usucapião (art.1287º e ss CC) e aquisição de
direitos de autor pela criação artística, literária etc. Na aquisição derivada de direitos o direito
adquirido funda-se na existência de um direito na titularidade de outra pessoa. A existência
desse direito anterior, e a sua extinção ou limitação geram a aquisição do direito pelo novo
titular. Ex. aquisição do direito de propriedade ou de outro direito real por força da realização
de um contrato.

A aquisição derivada translativa, que é também a mais vulgar, o direito adquirido é o mesmo
que já pertencia ou anterior titular. Na aquisição derivada constitutiva, o direito adquirido,
funda-se num direito mais amplo do antigo titular. Forma-se á custa dele limitando-o ou
comprimindo-o. Ex. o caso do proprietário de um prédio constituir uma servidão, ou outro
direito real de gozo ou até de garantia a favor de outrem.

Modificação de direitos:

Ocorre quando alterado ou mudado um elemento de um direito permanece a


identidade desse direito apesar da modificação. A modificação do direito pode ser subjetiva ou
objetiva. Diz-se que é subjetiva quando tem lugar a substituição de um titular por outro titular
do direito. A modificação diz-se objetiva quando se muda o conteúdo ou o objeto de direito
embora mantendo-se a sua identidade.

Extinção de direitos:

A extinção ocorre quando um direito deixa de existir na esfera jurídica de uma pessoa.
A extinção também pode ser subjetiva ou objetiva. É subjetiva quando apenas se muda a
pessoa do seu titular extinguindo-se o direito na pessoa do outro. A extinção é objetiva se o
direito desaparece, deixando de existir para o seu titular ou para qualquer outra pessoa. Há
duas formas particulares de extinção dos direitos conhecidas como a prescrição e a
caducidade. Se o titular de um direito o não exercer durante certo período de tempo fixado na
lei ou em negócios jurídicos extingue-se esse direito. Diz-se, pois, que o direito prescreveu ou
caducou.

O art.298º nº2 CC diz-nos que quando um direito deva ser exercido durante certo
prazo aplicam-se as regras da caducidade, salvo quando a lei se referir expressamente á
prescrição. Há importantes diferenças entre o regime da prescrição (art.300º a 327º CC) e
o regime da caducidade (art.328º a 333º CC):

a) Admitem-se estipulações por acordo sobre a caducidade (art.333º) o mesmo não


acontecendo a respeito do regime da prescrição que é inderrogável (art.300º);
b) A caducidade é apreciada oficiosamente pelo tribunal (art.333º) enquanto que a
prescrição tem de ser invocada (art.303º);
c) A caducidade não admite em princípio causas de suspensão nem de interrupção
(art.328º) o contrário da prescrição que se suspende e interrompe nos casos previstos
na lei (art.318º e ss; art.323º e ss);
d) A caducidade só é impedida, em regra, pela prática do ato (art.331º) enquanto que a
prescrição se interrompe pela citação ou notificação judicial de qualquer ato que
exprima direta ou indiretamente a intenção de exercer o direito (art.323º);
Estas diferenças de regime residem do facto de a prescrição se dirigir
fundamentalmente á realização de objetivos de conveniência ou oportunidade, enquanto que
na caducidade só o aspeto objetivo da certeza e da segurança é tomada em conta. O prazo
ordinário da prescrição é de vinte anos (art.309º) prevendo a lei para certos casos prescrição
de 5 anos (art.310º).

Classificação dos negócios jurídicos

1. negócios jurídicos unilaterais VS negócios jurídicos bilaterais ou contratos;


2. negócios jurídicos entre vivos VS negócios jurídicos mortis causa;
3. negócios jurídicos consensuais ou não solenes VS negócios jurídicos formais ou
solenes;
4. negócios jurídicos reais;
5. negócios jurídicos obrigacionais, familiares, sucessórios e reais;
6. negócios jurídicos patrimoniais VS negócios jurídicos pessoais;
7. negócios jurídicos onerosos VS negócios jurídicos gratuitos;
8. negócios jurídicos comutativos VS negócios jurídicos aleatórios;
9. negócios jurídicos de mera administração VS negócios jurídicos de disposição;

1. negócios jurídicos unilaterais VS negócios jurídicos bilaterais ou contratos


Nos negócios jurídicos unilaterais há uma só declaração de vontade ou varias,
mas paralelas, formando um só grupo. Há um só lado, uma só parte; ex. testamento e
procuração. Nestes negócios jurídicos é desnecessária a existência de contraparte, isto
é, não é necessária a concordância de outrem. Aos negócios jurídicos unilaterais
aplicam se os princípios da tipicidade; só se admitem como tal NJU que se mostrarem
previstos na lei art.457º CC. Estes NJU podem ser recetícios quando a declaração
negocial se tornar eficaz quando for levada ao conhecimento de outra pessoa e não
recetícios quando bastar a emissão da declaração negocial (=declaração de vontade).
Nos negócios jurídicos bilaterais ou contratos há duas ou mais declarações de
vontade de conteúdo oposto, mas convergente ajustando-se na sua pretensão comum
de produzir um resultado jurídico unitário embora com significado distinto para cada
uma das partes.
2. negócios jurídicos entre vivos VS negócios jurídicos mortis causa
Os negócios jurídicos dizem se entre vivos destinam-se a reproduzir efeitos
jurídicos em vida das partes. Pertencem a esta categoria quase todos os negócios
jurídicos.
Os negócios jurídicos mortis causa só produzem efeitos depois da morte da
respetiva parte ou alguma delas. O exemplo mais evidente de negócio jurídico mortis
causa é o testamento.
3. negócios jurídicos consensuais ou não solenes VS negócios jurídicos formais ou
solenes
Os negócios jurídicos consensuais ou não solenes são os que podem ser
celebrados por quaisquer meios declarativos aptos a exteriorizar a vontade negocial
para pertencerem a esta categoria é porque a lei não exige nenhuma forma especial.
Vigora no CC o princípio da liberdade de forma ou liberdade declarativa, art.219º. Quer
isto dizer que a validade da declaração negocial não depende da observância de forma
especial, salvo quando a lei o exigir. Quando a lei o exigir e não for observada a forma
exigida a declaração negocial é nula (art.220º).
Ao invés, os negócios jurídicos formais ou solenes são aqueles para os quais a lei
indica a necessidade de observância de determinada forma, formalismo ou
determinada solenidade. Ex.: documento particular, documento autêntico ou
documento autenticado.
4. negócios jurídicos reais
Os negócios jurídicos reais são aqueles em que se exige, além da declaração de
vontade das partes, com forma especial ou sem ela, a pratica anterior ou simultânea
de um certo ato de natureza material quase sempre associado á entrega da coisa. São
também conhecidos como negócios jurídicos quaod constitutinem (reais quanto á sua
constituição) ex. contrato de deposito art.1185º CC, comodato art.1129º, mutuo
art.1142º.
5. negócios jurídicos obrigacionais, familiares, sucessórios e reais
Nos negócios jurídicos sucessórios, o princípio da liberdade contratual sofre
importantes restrições resultantes de normas imperativas previstas no direito das
sucessões como por exemplo as que se referem á sucessão legitimária. Nos negócios
jurídicos familiares e pessoais como por exemplo o casamento, a perfilhação, a
adoção, a liberdade contratual está praticamente excluída, podendo apenas os
interessados celebrar ou deixar de celebrar o negócio jurídico, mas não lhe podem
fixar livremente o conteúdo deles nem celebrar contratos diferentes dos previstos na
lei. Nos negócios jurídicos familiares patrimoniais, como são exemplo as convenções
antenupciais, existe liberdade de estipulação conforme resulta do art.1698º. Nos
negócios jurídicos reais, o princípio da liberdade contratual sofre considerável
limitação derivada do princípio da tipicidade art.1306º CC. São negócios jurídicos que
têm em vista a constituição, a transmissão, a modificação ou a extinção de direitos
reais.
6. negócios jurídicos patrimoniais VS negócios jurídicos pessoais
Nos negócios patrimoniais e por exigência de tutela de confiança do
declaratário e dos interesses do comercio jurídico a vontade manifestada impõem-se
sobre a vontade real.
7. negócios jurídicos onerosos VS negócios jurídicos gratuitos
Os negócios jurídicos onerosos pressupõem atribuições patrimoniais para
ambas as partes, cada uma delas obtendo da outra uma vantagem recíproca.
Implicam, pois, sacrifícios de natureza patrimonial ou económica para ambas as partes.
Ao invés nos negócios jurídicos gratuitos só há sacrifício de natureza natural ou
económico para uma das partes. Uma das partes tem a intenção de efetuar uma
atribuição patrimonial a outra sem qualquer contrapartida. A estes negócios jurídicos
está associado o chamado espírito de liberalidade.
8. negócios jurídicos comutativos VS negócios jurídicos aleatórios
Nos negócios aleatórios as partes submetem se a uma possibilidade de ganhar
ou perder não dependendo de si mas sim de factos ocasionais ou fortuitos a produção
de efeitos jurídicos. Os negócios jurídicos comutativos são aqueles em que as
atribuições patrimoniais são certas por nenhuma delas estar sujeita a qualquer alea
(sorte, acaso).
9. negócios jurídicos de mera administração VS negócios jurídicos de disposição
Os negócios jurídicos de mera administração são os que, dizendo respeito á
gestão de património afetam a sua substância, alteram a forma ou a composição do
capital administrado, atingem o fundo ou a raiz dos bens.

Pressupostos gerais de validade dos negócios jurídicos


Esses pressupostos de validade são 2 quais sejam a capacidade e a
legitimidade. Quanto á capacidade relembra se aqui que a de exercício corresponde á
idoneidade para atuar juridicamente exercendo ou adquirindo direitos cumprindo ou
assumindo obrigações por ato próprio ou através de representante voluntario. A
legitimidade corresponde em rigor á relação que existe entre o sujeito e o conteúdo do
ato.

Elementos essenciais do negócio jurídico


A declaração negocial
O cc regula a declaração negocial no art.217º e ss. A declaração negocial,
também conhecida por declaração de vontade negocial, é o comportamento que
exteriormente observado cria a aparência de um certo conteúdo de vontade negocial.
A vontade negocial é a intenção de realizar ou obter certos efeitos práticos com o
animo que sejam juridicamente tutelados pelo direito.

Não só qualquer direito, mas um em concreto.


Tem aquilo que se quis ou aquilo que se disse ou escreveu
O ordenamento jurídico acha importante que haja sempre
que possível um nexo entre um e outro.
A declaração negocial compreende dois elementos:
1. A declaração propriamente dita, que é o elemento externo da declaração e
consiste no comportamento declarativo;
2. A vontade, que é o elemento interno da declaração negocial e que consiste no
querer que normalmente coincide com o sentido objetivo da declaração
*Pode faltar a vontade de agir, assim por exemplo, se uma pessoa
distraidamente faz um gesto que é interpretado como declaração negocial ou quando
haja coação física ou violência absoluta diz-se que faltou a vontade de agir. Pode ainda
faltar a vontade da declaração, como por exemplo, alguém assina um contrato
julgando estar a assinar uma carta de felicitações ou um individuo entra num leilão faz
um gesto de saudação a um amigo, gesto esse que é interpretado como licitação do
objeto em leilão. Pode haver um desvio da vontade negocial, isto é, o declarante
atribui aos termos da declaração um sentido diverso do sentido que exteriormente é
captado. Em todos estes casos existe divergência entre a vontade e a declaração (ou
elemento interno e externo) ou existe uma coincidência entre os dois elementos da
declaração, mas o processo formativo da vontade é anómalo.
Os art.217º e 219º CC ainda a propósito da declaração negocial consagram o
princípio da liberdade declarativa quanto á forma ou liberdade de forma. É, no
entanto, um princípio que tem inúmeras exceções, pois são muitos os negócios
jurídicos para os quais a lei exige uma forma especial onde se plasmem as vontades
negociais**.
 A declaração negocial é expressa quando for feita por palavras escritas ou
quaisquer outros meios diretos, frontais e imediatos de expressão da vontade.
 A declaração negocial é tacita quando o seu conteúdo direto se infere de um
outro.
Ainda que excecionalmente a lei confere valor de declaração negocial ao silencio
(art.218º). Deste normativo decorre o princípio segundo o qual o silencio não vale
como declaração negocial, a não ser que esse valor lhe seja atribuído por lei convenção
ou uso.

*Ex. de apontar uma pistola á cabeça **Ex. contrato de compra e venda de


telemóvel
Não teria vontade de vender, mas a partir
desse momento formou vontade de vender Um compra outro vende
e acabou então por o fazer.
Para casa a lei não quis que fosse
Elemento externo- exteriorização suficiente que fossem apenas
verbalizadas, tem que estar escritas com
Elemento interno- processo mental de
maior ou menor solenidade.
formação de vontade.
Art.219º CC
__________________________________________________________________________

Interpretação e integração dos negócios jurídicos

A interpretação dos negócios jurídicos é a atividade dirigida a fixar o sentido e o


alcance dos negócios jurídicos segundo as respetivas declarações negociais, trata se de
determinar o conteúdo das declarações de vontade. Os art.236º e ss CC referem-se á
interpretação dos negócios jurídicos. As integrações dos negócios jurídicos têm em vista a
regulamentação das questões não previstas pelas partes ao procederem á celebração dos
negócios jurídicos. O critério a utilizar para esse fim é o do art.239º CC.

Divergência entre a vontade e a declaração (ou vícios na formulação da vontade)

Normalmente o elemento interno (vontade) e o elemento externo da declaração


negocial (declaração propriamente dita) coincidem. Pode, contudo, verificar-se, por causas
diversas, uma divergência entre esses dois elementos da declaração negocial. Quando assim
for, estaremos perante um vicio na formulação da vontade. Essa divergência entre a vontade
real e a declaração, isto é, entre o “querido” e o “declarado” pode ser intencional ou não
intencional. Há a divergência intencional quando o declarante imite consciente e livremente
uma declaração com um sentido diverso da sua vontade real pelo que a divergência assim é
voluntária.

O CC prevê várias situações de divergência intencional entre a vontade e a declaração. As


situações são:

a) A simulação
b) A reserva mental
c) As declarações não serias
Na simulação o declarante imite uma declaração não coincidente com a sua vontade real
por força de um coluio/acordo com o declaratário com a intenção de enganar ou prejudicar
um terceiro ex.: A finge vender um prédio a B por coluio com este com a intenção de
prejudicar os credores de A. A e B não pretendem na realidade celebrar qualquer negócio
jurídico, mas apenas criar uma aparência para terceiros.

O conceito de simulação encontra-se vertido no nº1 do art 240º. Para que haja simulação ´w
necessário que se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos:

1. A intencionalidade da divergência entre a vontade e a declaração


2. O acordo entre declarante e declaratario
3. O intuito de enganar ou prejudicar terceiros
A simulação pode ser absoluta ou relativa.

 Na simulação absoluta as partes celebram um negócio jurídico, mas na realidade não


pretendem celebrar esse nem outro qualquer.
 A simulação diz-se relativa quando as partes celebram um certo negócio jurídico, mas
na realidade pretendem celebrar um outro de tipo ou conteúdo diverso.
Significa isto que de trás de um negócio jurídico simulado existe um outro que queriam
ter celebrado, mas não celebraram. O negócio jurídico simulado, quer na simulação absoluta
quer na simulação relativa é nulo nos termos do art.240º nº2 CC. Colhendo o regime geral do
art.286º CC qualquer interessado e o tribunal oficiosamente pode suscitar ou conhecer
respetivamente da nulidade. Também pode ser suscitado ou conhecida a todo o tempo.
Acresce que aos próprios simuladores é reconhecida a legitimidade para invocar a nulidade do
negócio jurídico por eles simuladamente realizado.
Porem no que toca á simulação relativa é necessário apurar qual a consequência
jurídica para o negócio dissimulado, isto é, para aquele negócio que as partes pretenderam
realizar, mas não realizaram intensionalmente. O negócio jurídico dissimulado pode ser de
natureza subjetiva quando a simulação diga respeito aos sujeitos envolvidos no negócio ou
pode ser de natureza objetiva quando diga respeito ao conteúdo do negocio jurídico. Ex.:
formando a vontade de doar certo prédio a B , A doa esse prédio a C em coluio com este para
que seja posteriormente C mais tarde doe a B o indicado prédio (António está casado com a
Berta, não pode doar ao seu cônjuge aquele imóvel, simuladamente doa a C e C que não tem
nada a ver com o casal vende ao cônjuge). Este exemplo podia servir para contornar norma
legal que proíbe a doação de A a B art.953º e 2196º CC.

Já sabemos que na simulação relativa o negócio jurídico simulado é nulo, tal qual na
simulação absoluta. Quanto ao negócio dissimulado, diz-nos o art.241º CC, que o negócio
dissimulado será objeto do tratamento jurídico que lhe caberia se tivesse sido concluído sem
dissimulação. Nestes termos poderá o negócio dissimulado ser valido ou inválido consoante as
consequências que teriam lugar se tivesse sido esse o negócio efetivamente celebrado.

Para além disto e de modo a que eventualmente o negocio dissimulado possa vir a ser
qualificado como valido é necessário atender ao nº2 do art.241º CC segundo o qual se o
negocio dissimulado for de natureza formal só é valido se tiver sido observada a forma exigida
na lei. Na reserva mental o declarante imite uma declaração intencionalmente divergente da
sua vontade real mas sem qualquer coluio com o declaratário pois visa precisamente enganar
ou prejudica-lo ex.: A declarada a B querer fazer-lhe uma declaração ou empréstimo sem que
na realidade tenha essa intenção pois apenas pretende evitar que B não se suicide. Há reserva
mental sempre que é emitida uma declaração negocial contraria á vontade real com o intuito
de enganar ou declaratário. Assim nos diz nº1 do art.244º. No nº2 do mesmo normativo prevê-
se a irrelevância da reserva mental exceto se for conhecida do próprio declaratario. Sendo
conhecida do próprio declaratario aplica-se á reserva mental conhecida adaptadamente o nº2
do art.240º CC.

Nas declarações não sérias, o declarante emite uma declaração intencionalmente não
coincidente com a sua vontade real, mas sem intuito de enganar ou prejudicar qualquer
pessoa e está convencido que o declaratário se pode aperceber do caracter não serio da
declaração. Embora haja divergência entre a vontade e a declaração naos e pretende enganar
o declaratario ou terceiros, pois procede-se na expectativa de que a falta de seriedade das
declarações não passa despercebida art.245 nº1. As declarações negociais não sérias quando
feitas, pois, com a expectativa que o declaratario não pode deixar de perceber da falta de
seriedade da declaração não produz qualquer efeito jurídico nos termos do nº2 do art.245º CC

Divergência não intencional

Há divergência não intencional quando a não coincidência entre a vontade e a


declaração não é voluntaria porque o declarante não se apercebe de divergência ou porque é
forçado irresistivelmente a emitir uma declaração divergente do seu real propósito.

O CC prevê 3 situações de divergência não intencional de vontade e a declaração são elas:

1. Erro obstáculo/erro na declaração;


2. Falta de consciência de declaração;
3. Coação física ou violência absoluta.
No erro obstáculo ou na declaração, o declarante emite declaração divergente da
vontade real sem ter consciência dessa falta de coincidência daí que se trate de um lapso/
engano/ equívoco. Ex.: é o que sucede quando o declarante está equivocado sobre o
verdadeiro nome de um objeto atribuindo lhe uma denominação que na verdade corresponde
a outro objeto. O princípio geral regulador destas hipóteses consta do art.247º CC exigindo-se
para a anulação do negócio que o declaratário conhecesse ou não devesse ignorar a
essencialidade para o declarante do elemento sobre o qual incidiu o erro.

Na falta de consciência da declaração o declarante emite uma declaração sem sequer


ter vontade de agir, isto é, sem sequer ter vontade de imitir uma qualquer declaração negocial.
O declarante imite uma declaração sem ter consciência ou intenção de o estar a fazer. Adota,
no entanto, um comportamento que vale objetivamente como manifestação de uma vontade
que efetivamente não tem. Ex.: uma pessoa entra num leilão e levanta o braço para
cumprimentar o leiloeiro que é seu amigo. O sujeito quer adotar aquele comportamento
(levantar o braço) mas não quer a declaração negocial que está a ser considerada (licitação).
Esta hipótese é abrangida pelo art.246º CC do qual resulta que o negócio jurídico assim
realizado não produz qualquer efeito.

Na coação física ou violência absoluta o declarante é como que transformado num


autómato sendo forçado a dizer ou a escrever o que não quer não por força de um ameaça,
mas pela utilização de força física que é de tal ordem irresistível que o instrumentaliza e leva a
adotar o comportamento. Ex.: alguém agarrando a mão de outrem fá-lo desenhar a sua
assinatura num documento.

Vícios na formação da vontade (falta de vontade)

A ordem jurídica exige que a vontade se haja formado de um modo julgado normal e
são. Essa vontade deve, pois, ser formada de um modo livre esclarecido e ponderado. A
vontade não se formará de modo livre, esclarecido ou ponderado, se o declarante tiver medo
provocado por coação moral se houver erro ou se se verificar ainda que transitoriamente uma
situação de incapacidade. Os vícios na formação da vontade são perturbações no processo
formativo da vontade operando de tal modo que a vontade embora coincida com a declaração
é determinada por motivos anómalos e ilegítimos.

O CC prevê 4 espécies de vícios na formação da vontade:

a) Erro vício art.252º CC;


b) Dolo art.254º CC;
c) Coação moral art.255º e 256º CC;
d) Incapacidade acidental art.257º CC.
No erro vício pode afirmar-se que em causa está o desconhecimento ou a falsa
representação da realidade que foi determinante da decisão de realizar o negócio jurídico em
causa. Trata-se pois da ignorância de uma qualquer circunstancia de facto ou de direito quer
isto dizer que se o sujeito estivesse esclarecido acerca dessa circunstância, isto é, se tivesse o
exato conhecimento da realidade não teria realizado qualquer negocio ou não o teria feito nos
termos em que o celebrou. Ex.: A compra um quadro por julgar ser de um autor consagrado,
mas na realidade não o é A compra o objeto por 1000€ por supor erradamente que ele era de
ouro embora fosse de prata dourada.

Para que se forme a vontade negocial tem de existir no foro intimo da pessoa, isto é,
na sua mente, a formação de uma decisão para a qual concorrem vários fatores,
nomeadamente a prévia ponderação das vantagens e das desvantagens do negocio, a
existência de certas qualidades da coisa que lhe asseguram a realização dos fins que o negocio
lhe permite alcançar. Se neste fenómeno de formação da vontade se tem como verificado
certo elemento que não existe ou existe de modo diferente do que foi mentalmente
representado ou se não se toma em conta outro por se conhecer a sua existência, a vontade
formou-se erradamente. A “divergência” não é entre o que se quis e o que se declarou mas
sim entre a vontade real coincidente com a declaração e uma certa vontade hipotética ou
conjetural, isto é, a que teria tido o sujeito não fosse o processo anómalo de formação da sua
vontade. Existe erro quando a representação mental da realidade está em desacordo com um
elemento da realidade existente no momento da formação do negócio jurídico e tem de
respeitar a uma realidade passada ou presente em relação ao momento da declaração.

O erro vicio pode revestir várias modalidades:

a) Erro sobre a pessoa do declaratário;


b) Erro sobre o objeto do negócio;
c) Erro sobre os motivos;
d) Erro sobre a base do negócio.
O erro sobre a pessoa do declaratário abrange o erro sobre a identidade e o erro sobre as
qualidades do declaratario. Está previsto no art.251º CC que manda aplicar adaptadamente o
art.247º CC. Exige-se que o declaratário ao celebrar o negócio jurídico conhecesse ou não
devesse ignorar a importância para o declarante do elemento sobre o qual está em erro.

O erro sobre o objeto de negócio pode incidir sobre a identidade ou sobre as qualidades
objetivas da coisa. Tal qual como na modalidade anterior, o negócio assim celebrado é
anulável nos termos do art.251º CC que remete para o art.247º CC. Ex.: A compra a B uma
mobília supondo que é de pau santo quando na verdade era de pinho.

Requisitos da relevância do erro sobre a pessoa do declaratário ou sobre o objeto para que o
negócio seja anulável

Requisito geral: Essencialidade. Erro essencial é aquele que levou o sujeito a concluir o
negócio em si mesmo e não apenas nos termos em que foi concluído. O erro é a causa do
negócio em termos concretos, de tal ordem que sem ele o sujeito não celebraria qualquer
negócio ou celebraria um com outro objeto ou com outra pessoa.

Requisitos especiais: O declaratário tem de conhecer ou não pode ignorar a essencialidade


para o declarante do motivo sobre que recaiu o erro.

O erro sobre os motivos insere-se no erro vicio como género, mas deste fazem parte
os casos em que o erro não se refere á pessoa do declaratário nem ao objeto de negócio. É um
erro acerca da causa que levou ou motivou a celebração do negócio (art.252º CC). Além da
essencialidade do motivo comum a todas as modalidades de erro vicio, torna-se agora
necessário, ao contrário das duas outras modalidades anteriores, que as partes hajam
reconhecido por acordo essa essencialidade. O nº1 do art.252º CC permite a anulação do
negócio desde que haja clausula expressa ou tácita no sentido de a validade do negócio ficar
dependente da existência da circunstância que diz respeito ao erro. Ex.: funcionário publico
arrenda uma casa numa determinada cidade julgando erradamente ter ficado colocado nessa
mesma cidade.

O erro sobre a base do negócio é um erro que incide sobre as circunstâncias que
constituem a base do negócio. A base do negócio é constituída pelas circunstâncias que sendo
conhecidas de ambas as partes foram tomadas em consideração por elas na celebração do
negócio e determinaram os termos concretos do conteúdo do negócio. Circunstâncias essas
que se dão como verificadas, mas que não existem ou são diferentes das que as partes
tomaram como certas. O nº2 do art.252º CC remete para os art.437º a 439º CC significando
esta remissão que o erro sobre a base do negócio é relevante nos mesmos termos em que é
relevante a alteração fundamental das circunstâncias a que se refere o art.437º CC.

b) Dolo

Encontra-se previsto no art.253 nº1 CC. Existe dolo quando se verifique o emprego de
qualquer sugestão ou artificio com intenção ou consciência de induzir ou manter em erro o
autor da declaração (dolo positivo) ou quando tenha lugar a dissimulação pelo declaratário ou
de terceiro do erro do declarante (dolo negativo). O principal efeito do dolo é a anulabilidade
do negócio jurídico art.254 nº1.

c) Coação moral art.255º CC

A coação moral consiste numa ameaça ilícita de um mal destinado a levar outrem
determinado pelo medo de consumação da ameaça a concluir o negócio jurídico. o vicio da
vontade é o receio ou o medo. Porem medo causado por uma ameaça destinada
intencionalmente a provocá-lo. O coagido (que sofre a coação) prefere celebrar um negócio
jurídico que de outro modo não o quereria, a correr o risco da concretização do mal que o
ameaça. A sua vontade é viciada, pois age dominado pelo medo da concretização da ameaça.

Elementos essenciais da coação moral:

1. Ameaça de um mal dirigido quer á pessoa do coagido á sua honra ou ao seu


património ou ainda á honra pessoa ou património terceiro 255 nº2 CC;
2. Ilicitude da ameaça 255º nº1 e 3º CC;
3. Intencionalidade da ameaça que consiste em o coator terem vista obter do coagido a
declaração negocial, ou seja, a ameaça deve ser cominatória (com consequência)
art.255 nº1 parte final;
4. Dupla causalidade, isto é, tem de existir um nexo causal entre a ameaça e a declaração
negocial. É necessário que o medo (que é o vicio da vontade) resulte da ameaça do
mal e que seja a causa da declaração no sentido de determinar no coagido a formação
de uma vontade que não teria existido senão fosse o medo da consumação do mal de
que é ameaçado;
A declaração negocial extorquida por coação moral é anulável art.256º CC

d) Incapacidade acidental art.257º CC

O CC prevê e regula a incapacidade acidental não na secção das incapacidades, mas na


relativa á falta e aos vícios da vontade dado que não se trata de uma situação permanente do
individuo, mas antes um desvio no processo formativo da vontade. O art.257º CC prevê a
anulabilidade do negócio jurídico desde que se verifique um requisito (para além da própria
incapacidade acidental) qual seja a notoriedade ou conhecimento da perturbação por parte do
declaratário. Estamos perante uma situação de incapacidade acidental quando o declarante ao
emitir a declaração se encontra por anomalia psíquica ou por qualquer outra causa
(embriaguez, sob o efeito de estupefacientes ,etc) em condições tais que não lhe permitem o
entendimento do ato que pratica com o livre exercício da sua vontade. O nº2 do 257º
apresenta uma definição de facto notório socorrendo se para o efeito do paradigma do
homem medio. Assim, será notório para o declaratário do estado por exemplo de embriaguez
se para qualquer outro declaratário minimamente diligente também ele poderia apurar da
notoriedade se se encontra-se no lugar do concreto declaratário.

Casos práticos

1. Inácio é neto de Carlos, filho de João e bisneto de pedro. Joana é irmã de João e mãe
de Tiago. Tiago é casado com Dulce e João é casado com Zulmira.
a) Elabore a respetiva arvore genealógica.
b) Indique a relação jurídico familiar entre:
1.Inácio e Pedro;
2.Tiago e Carlos;
3.Dulce e Carlos;
4.Zulmira e Dulce.

Suponha o seguinte:

2. António vendeu a Carlos 100g de um determinado produto por 500€ pois supunha que
o produto referido estava tabulado a 5€ a grama quando na realidade estava a 15€.
António pede a Carlos o pagamento da diferença. Tem a isso direito? 4 valores

3. António pretendendo ajudar o seu filho mais novo decidiu comprar lhe uma mobília
para a sua nova sala de jantar. António sabia que a predileção (gosto) do seu filho era
madeira exótica. Na loja António perguntou se a mobília exposta na montra era de pau
santo. O vendedor disse lhe que sim e António comprou a mobília. Um mês mais tarde
o filho de António verificou que a madeira em causa é pinho. António pretende ver
anulada aquela compra e venda. Quid iuris? 4 valores

4. Manuel de 15 anos de idade vendeu ao seu amigo de infância, Carlos, o seu relógio de
platina que lhe havia sido oferecido pelo seu avô dois anos antes. Aos 17 anos Manuel
morre e agora o seu pai e herdeiro pretende ver anulada aquela compra e venda entre
Manuel e Carlos. O pai de Manuel 15 dias depois daquela compra e venda teve
conhecimento dela e nada fez. Quid iuris? 4 valores

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