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Teoria Geral do Direito Civil I

Direito – conjunto de normas dotadas de proteção coativa que visam reger a vida em
sociedade. O Direito tem por função realizar a justiça, garantir a segurança e o bem-estar
económico e social de uma sociedade, num dado tempo.
o O objeto material do Direito, isto é, a matéria a que ele se reporta é a vida social, as relações
das pessoas entre si (relações inter-humanas). Assim sendo o Direito não é uma mera
realidade abstrata, uma vez que resolvem os casos concretos da vida em sociedade.

Direito Público e Direito Privado


Ordem jurídica única que se divide em ramos – os Ramos de Direito
Existem dois ramos fundamentais – o Direito Público e Direito Privado:
o O critério que prevalece para distinguir este dois ramos é o critério da posição dos sujeitos:
− Uma relação jurídica é considerada de Dto. Público se nela intervir pelo menos uma
entidade dotada de autoridade pública, isto é, se exercer o poder de soberania (“ius
imperii”) do qual o Estado é dotado na sua missão de soberania. Do mesmo modo
uma relação é considerada Dto Privado quando nenhum dos seus intervenientes está
munido de autoridade pública, mesmo que um destes intervenientes sejam o Estado
ou outras entidades públicas, nas relações jurídicas privadas o Estado está no
mesmo patamar que os particulares, uma vez que não está munido da sua autoridade
pública.
O Direito Civil é a doutrina geral do Direito Privado, é também o repositório dos princípios
que orientam o Direito Privado, assim como também serve de base de interpretação sistemática
do Direito Privado.

Fontes do Direito (Civil e Privado):


o Imediatas: Leis, normas corporativas (art.º 1.º CC), são os modos de formação do Dto.
o Mediatas: Costume, Doutrina e Jurisprudência, são os modos de revelação (interpretação)
do Dto.

Código Civil de 1966:


Divididos em 5 livros:
o Livro I – Parte Geral: trata dos princípios gerais do Direito Civil em Portugal;
o Livro II – Direito das Obrigações: estuda as espécies obrigacionais, as suas características,
efeitos e extinção;
o Livro III – Direito das Coisas (Reais): trata dos direitos de propriedade, dos bens móveis e
imóveis, assim como a transferência desses direitos;
o Livro IV – Direito da Família: regula a estrutura, organização e proteção da família e os
direitos e obrigações decorrentes dessas relações jurídicas;
o Livro V – Direito das Sucessões: cuida da transmissão de bens, direitos e obrigações em
decorrência da morte.

Princípios fundamentais do Dto Civil:


1. Reconhecimento da pessoa humana e dos Direitos de Personalidade:
Todos os seres humanos têm personalidade jurídica, isto é, a aptidão de ser titular de direitos e
obrigações (66.º CC); cessa com a morte (68.º CC). O conceito técnico-jurídico de pessoa é
diferente do conceito de ser humano. As pessoas humanas têm direitos de personalidade
inerentes à sua natureza:
a) Ser pessoa: artigos 70.º, 71.º, 72.º, 79.º, 80.º, 81.º CC;
b) Autonomia Privada (artigos 26.º e 61.º CRP; art.º 405.º CC):
A produção de efeitos está ligada à vontade humana.
o Atos Jurídicos vs. Negócios Jurídicos:
- Ato Jurídico: é a manifestação da vontade humana que produz efeitos jurídicos;
- Negócio Jurídico: é o ato jurídico lícito (de acordo com a lei); assente numa ou mais
declarações de vontade humana dirigidas à produção de determinados efeitos jurídicos,
que o ordenamento reconhece em concordância com a vontade das partes.
- É também importante definir Facto Jurídico: causa ou fonte de relação jurídica, o
acontecimento da vida social, natural ou voluntário, que produz efeitos jurídicos. Ao
contrário do ato jurídico, o facto jurídico NÃO depende da vontade humana.
Autonomia privada pode ser definida como a “autorregulação” dos seus interesses pelos
sujeitos de Direito (autogovernação da sua esfera jurídica). É a “soberania do querer”, o
“império da vontade” que caracteriza o Direito Subjetivo.
o Para que serve:
- Modelação da vida social;
- Possibilita a troca de bens e serviços;
- Consolida os direitos e obrigações na esfera jurídica dos sujeitos.

o Distinções relevantes:
- Negócio Jurídico Unilateral: há apenas uma declaração de vontade ou, no caso de haver
mais do que uma, todas têm o mesmo conteúdo, são iguais;
- Negócio Jurídico Bilateral (contrato): há duas ou mais declarações de vontade, de
conteúdo diferente ou contrário, mas convergente, ajustando-se reciprocamente, com o
objetivo de produzir um resultado unitário.
Liberdade contratual (art.º 405.º CC) como principal manifestação da autonomia
privada:
- Liberdade de celebração e conclusão de contratos;
- Liberdade de modelação do conteúdo contratual;
- Liberdade de adesão.
Limitações:
- O objeto do contrato tem de respeitar o art.º 280.º do CC;
- São anuláveis os negócios usuários (art.º 282.º do CC);
- Algumas áreas da vida estão limitadas por normas imperativas, em particular quando
relativas à família, às sucessões, entre outras.

2. Responsabilidade Civil:
Os comportamentos (atos ou omissões) causam muitas vezes prejuízos a outras pessoas. Quem
suporta esse prejuízo?
A responsabilidade civil consiste na necessidade imposta pela lei a quem causa prejuízos a
outrem de colocar o ofendido na situação em que estaria sem a lesão, obrigação de
indemnização. Ver artigos 483.º (princípio geral), 484.º, 485.º e 486.º do CC.

A responsabilidade civil pode ser:


- Responsabilidade Civil Contratual: imposição da reparação dos danos resultantes da
violação de um acordo prévio entre as partes, um contrato.
No caso de incumprimento contratual, a parte que deixa de cumprir o contrato fica obrigada
a indemnizar a outra parte pelos prejuízos resultantes do seu incumprimento.
- Responsabilidade Civil Extracontratual: tem origem num ato ilícito não contratual que
causa prejuízo.
Enquanto que na responsabilidade civil contratual há um vínculo anterior entre o credor e
o devedor, na responsabilidade civil extracontratual não existe nenhum vínculo anterior
entre as partes, assim sendo é com o facto ilícito que é constituída a relação jurídica.
Na responsabilidade civil o interesse diretamente violado é o da vítima (interesse privado).
Caso a vítima permanecer inerte ou resignar a seu direito (não tomar ação, não fizer nada)
nenhuma responsabilidade civil haverá para o causador do dano.
A responsabilidade civil é patrimonial, isto é, o património do devedor é quem responde por
suas obrigações. Esta obrigação de indemnização transmite-se aos herdeiros do devedor, no
caso da sua morte, e pode ainda ser cumprida por terceiros, o que importa é a reparação do
dano causado.

Responsabilidade Civil Extracontratual


Podemos distinguir:
1. Responsabilidade por factos ilícitos;
2. Responsabilidade pelo risco;
Tem 4 pressupostos essenciais:
- Facto ilícito: traduz-se no evento, na ação ou omissão (contrária à lei), enquanto ocorrência
resultante da ação humana lesiva de bens jurídicos pessoais e patrimonial de outrem.
- Nexo de imputação subjetiva: exprime a ligação psicológica do agente (quem praticou o
facto ilícito) com a produção do acidente e traduz o grau de censurabilidade que a conduta
merece.
- Dano: representa o desvaler infligido aos bens alheios por ação do facto ilícito.
- Nexo de causalidade: revela-se no juízo de imputação objetiva do dano ao facto que o
produz (o dano tem que corresponder ao facto ilícito praticado).

Facto ilícito:
O primeiro requisito para se verificar responsabilidade é a existência de um facto humano
voluntário.
Não será facto relevante para este efeito o evento natural onde não intervenha a vontade
humana minimamente determinante. ex: uma inundação que cause danos na habitação de uma
pessoa não é facto para efeitos de responsabilidade civil extracontratual- não é um facto
humano voluntário.

O Art.483 faz referência a 2 formas de ilicitude:


- Violação de um direito de outrem: inclui-se a violação de direitos subjetivos. Especialmente
as ofensas de direitos absolutos, como os direitos de personalidade e reais que podem dar
lugar à obrigação de indemnizar. Ex.: a perturbação do exercício do direito do proprietário,
mediante a emissão de fumos, cheiros ou ruídos-art.1346º. E a usurpação do nome; a
publicação de cartas confidenciais.
- Violação da lei que protege interesses alheios: trata-se da infração de leis que embora
protejam interesses particulares, não conferem aos respetivos titulares quaisquer direitos
subjetivos e ainda a infração de leis que visando a proteção de interesses coletivos, atendem
a interesses particulares subjacentes. Ex.: violação de regras de transito ou a violação de
regras de estacionamento; infração de uma lei que imponha medidas sanitárias.
A violação de um direito subjetivo absoluto verifica-se, por exemplo no caso do crime de
injúrias e difamação. São direitos de personalidade com a consagração constitucional. Os
direitos reais também são direitos absolutos, pelo que a sua violação confere direito a
indemnização.
O caso mais comum de responsabilidade civil extracontratual por violação de normas que
visam a proteção de interesses alheios são os acidentes de viação.
Os requisitos para que se preencha este segundo tipo de ilicitude são:
− que a lesão os interesses do particular se verifiquem através da violação de uma norma
legal;
− que a norma violada tutele diretamente interesses particulares e não que os interesses
particulares sejam protegidos porque tal resulta da proteção de interesses coletivos;
− que o dano verificado seja daqueles que a norma visa ao tutelar interesses privados.

Constituem ilícitos especialmente previstos na lei:


− a ofensa do crédito ou do bom nome;
− a prestação de conselhos, recomendações ou informações simples omissões;
− o homicídio doloso ou negligente;
− as ofensas à integridade física dolosa ou negligente;
− a injúria ou difamação.
− Aquele que, com dolo, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal
destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos
resultantes da violação.
− Art.487º-Culpa;
− Art.488º-Imputabilidade;
− Art.497º-Responsabilidade solidária;
− Art.498º-Prescrição.

As causas exclusão da ilicitude são circunstâncias que excluem a responsabilidade civil. Estas
causas são uma exceção ao art.1 da CRP.
1. Ação Direto-prevista no 336ºCC
É a situação em que se encontra justificado o recurso à força com o fim de assegurar o
próprio direito quando se verifique a impossibilidade de recorrer em tempo útil aos meios
coercivos normais, e desde que o agente use a força o estritamente necessária. Ex.: Um
filho menor é confiado pelo tribunal à guarda do pai. Num dia, a mãe apodera-se da criança
e tenta fugir. Nestas situações é lícito o impedimento pela força pelo pai para evitar a fuga,
contanto que não exceda os limites impostos pela lei.
2. Legítima defesa-337ºCC
É a situação em que se considera justificado o ato destinado a afastar qualquer agressão
dirigida contra o agente ou contra terceiro, desde que se verifique os seguintes requisitos: -
agressão atual e ilícita; -defesa proporcional. Ex.: António está para lançar fogo a uma seara
de bento. Carlos, que ao passar pelo local se aperceba da situação, agride António,
impedindo-o de consumar o ato. A conduta de António é lícita na medida em que visa
defender o património de Bento e não usou do que os meios necessários.
3. Estado de necessidade-337º
É a situação de constrangimento em que fica quem sacrifica coisa alheia com fim de afastar
um perigo atual de um perigo manifestamente superior. O estado necessidade torna lícitos
certos atos que de outro modo não seriam:
Ex.1: Para apagar um incendio em certa propriedade, causam-se danos na propriedade
contígua. A obrigação de indemnizar cabe ao dono da que foi incendida.
Ex.2: António, para levar o seu irmão ao hospital em estado grave, utiliza um automóvel
alheio, tendo-lhe causado alguns danos. António deverá indemnizar o proprietário do
referido automóvel pelo prejuízo causado.
O nexo de imputação subjetiva(culpa):
Culpa em sentido lato é a imputação de um ato ilícito ao seu autor. A culpa para a
responsabilização civil abrange tanto o dolo como a negligência, ou seja, todas as espécies de
comportamentos contrárias ao direito, sejam intencionais ou não, mas sempre imputáveis ao
causador do dano.

O Dano:
Quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se
tivesse verificado o evento que obriga à reparação. Tal reconstituição é possível de alcançar
através de reconstituição natural (art.º 562.º) ou mediante o pagamento de uma indemnização
em dinheiro (art.º 566.º).
No entanto na responsabilidade civil, a indemnização nunca poderá exceder o montante dos
prejuízos que é a regra comum ou critério geral para a fixação do montante da indemnização,
quer seja fundada em dolo como em culpa. O dano ou prejuízo é sempre a ofensa ou a lesão de
um interesse. O dano poderá ser patrimonial (avaliável em dinheiro) ou moral (não avaliável
em dinheiro).

Classificação de Danos:
1. Danos Patrimoniais e Danos não Patrimoniais:
− Danos patrimoniais: são aqueles que incidem sobre interesses de natureza material ou
económica, uma vez que se refletem no património do lesado. Ex.: Os estragos feitos
numa coisa ou privação do seu uso.
− Danos não patrimoniais (art.º 496.º): São objeto de indemnização, logo avaliáveis
pecuniariamente. Os valores que são violados é que não são traduzidos em dinheiro.
Ex.: o sofrimento ocasionado pela morte de uma pessoa; o desgosto derivado de uma
injuria ou as dores físicas produzidas por uma agressão.

2. Danos pessoais e Danos não pessoais:


− Danos pessoais: são aqueles que são produzidos em pessoas.
− Danos não pessoais: verificam-se sobre coisas, tanto uns como outro podem apresentar-
se como danos patrimoniais ou não patrimoniais.

3. Dano emergente e Lucro cessante:


− Dano emergente: compreende a perda ou diminuição de valores já existentes no
património do lesado;
− Lucro cessante: refere-se aos benefícios que ele deixou de obter em consequência da
lesão - ao acréscimo patrimonial frustrado (564º/1).
Em princípio, tanto os danos emergentes como os dos lucros cessantes são
indemnizáveis, no entanto, não é uma regra absoluta.

4. Danos presentes e Danos futuros:


− Danos presentes: já se verificam, designadamente à data da fixação da indemnização;
− Danos futuros: são indemnizáveis na medida em que sejam previsíveis. Se essa
previsibilidade for infalível, serão futuros certos; se forem apenas possíveis, serão
danos futuros eventuais.
5. Danos direitos e Danos indiretos:
− Os danos diretos resultam imediatamente do ato ilícito, os indiretos são os restantes.

A responsabilidade pelo Risco (art.499º e seguintes):


- Art.500º-Resp. do comitente;
- Art.501º-Resp. do Estado e de outras pessoas coletivas públicas;
- Art.502º-Danos causados por animais;
- Art.503º e seguintes-Acidentes causados por veículos;
- Art.509º-Danos causados por instalações de energia elétrica ou gás.
São extensivas aos casos de responsabilidade pelo risco, na parte aplicável e na falta de
preceitos legais em contrário, as disposições que regulam a responsabilidade por factos ilícitos.

Responsabilidade Civil ≠ Responsabilidade Penal


Na responsabilidade penal o agente infringe uma norma de direito público, o interesse lesado
é da sociedade (interesse público). A responsabilidade penal é intransmissível.
Embora a responsabilidade civil possa existir sem responsabilidade penal (nem todos os factos
ilícitos são puníveis criminalmente), os ilícitos criminais que tenham um lesado particular
também geram responsabilidade civil extracontratual.

Responsabilidade Civil Restituição Natural - art.º 562.º

Se não for possível? Indemnização em Dinheiro - art.º 566.º

3. Boa-Fé
− Exprime a preocupação pela ordem jurídica dos valores ético-jurídicos da comunidade;
− Cria uma abertura no Direito, reconhecendo como válidas considerações normativas de
fontes não jurídicas;
− Assume relevância principal no âmbito dos contratos (ex.: Art.º 243.º n.º 2 ou art.º 291.º n.º
3 do Código Civil);
− Acompanha a relação contratual desde o início, acompanha a sua vida, e continua após a
sua cessação;
− Conexa com o princípio da confiança – atribuindo efeitos jurídicos a uma situação que
seria, de outra forma, apenas aparente.

4. Concessão da personalidade jurídica às pessoas coletivas


Ao lado da personalidade jurídica reconhecida a todas as pessoas singulares- seres humanos
nascidos completamente e com vida o nosso direito civil, verificados certos requisitos, atribui
personalidade jurídica às chamadas pessoas coletivas.
Estas são coletividades de pessoas ou complexos patrimoniais organizados em vista de um fim
comum ou coletivo a que o ordenamento jurídico atribui a qualidade de sujeitos de direitos.
Podemos distinguir 3 modalidades fundamentais em correspondência com a classificação feia
pelo CC de 1966 (157º):
− As associações: coletividades de pessoas que não têm por escopo o lucro económico dos
associados;
− As fundações: complexos patrimoniais ou massas de bens afetados por uma liberdade à
prossecução de uma finalidade estabelecida pelo fundador ou em harmonia com a sua
vontade;
− As sociedades: conjunto de pessoas 2 ou mais, que contribuem com bens ou serviços para
o exercício de uma atividade económica dirigida à obtenção de lucros e à sua distribuição
pelos sócios.

5. Propriedade Privada (art.º 1305.º CC)


A tutela constitucional da propriedade privada está expressamente consagrada no art.62º/1
CPR, segundo o qual: “A todos é garantido o direito à propriedade privada e à sua transmissão
em vida ou morte, nos termos da Constituição” - bem como nos art.º 61.º, 82.º e 86.º, relativos
à tutela da iniciativa e da propriedade privadas. A Constituição no art.º 82.º refere a existência
simultânea de 3 setores de propriedade dos meios de produção:
a) o setor público, constituído pelos meios
b) de produção cujas propriedade e gestão pertencem ao Estado ou a outras entidades públicas;
c) o setor privado, constituído pelos meios de produção cuja propriedade ou gestão a pessoas
singulares ou coletivas privadas;
d) O setor cooperativo e social, que compreende os meios de produção geridos por
cooperativas, os meios de produção geridos por comunidades locais, os meios de produção
objeto de exploração coletiva por trabalhadores e os meios de produção geridos por pessoas
coletivas, sem caráter lucrativo (art.º 82.º, n.º 1,2,3 e 4).
O CC não define o direito de propriedade, mas o art.º 1305.º caracteriza-o, dizendo que o
“proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das
coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com observância das restrições por ela
impostas”.
Face a este artigo o proprietário parece deter os poderes correspondentes ao seu direito, de um
modo pleno e exclusivo.
Não implica isto que o sistema não introduza cláusulas de limitação a esses poderes, quer
através de disposições legais avulsas que estabelecem restrições de direito publico e restrições
de direito privado à propriedade, quer através de uma cláusula como a do art.º 334.º.
O direito de propriedade é um direito perpétuo, o que imediatamente implica não poder
extinguir-se pelo não uso.

6. Relevância da Família
O direito civil português contém entre os seus princípios básicos o reconhecimento da família.
é uma realidade natural e social, cuja existência se manifesta, antes de mais, em planos ou
domínios da vida estranhos ao plano jurídico. Se a família e os valores e sentimentos nela
contidos têm um fundamento pessoal, por que a razão disciplina do Direito esta matéria?
Por duas ordens de razões:
1. A ordenação da família não contém uma disciplina de todos os problemas respetivos em
termos acabados, tornando-se necessária uma formulação certa, precisa e completa do
regime jurídico correspondente;
2. Existirem regras jurídicas que disciplinam a família, consagra vivamente o sentimento dos
deveres e direitos dos membros da família, e permite, em situações de crise, disciplinar com
justiça e certeza a posição dos sujeitos.
O Direito da Família é caracterizado por um acentuado predomínio de normas imperativas, isto
é, de normas que os particulares não podem afastar. É um ramo do direito civil muito sensível
às modificações das estruturas políticas, económicas e sociais, designadamente religiosas.
Basta pensar no tratamento que cada sociedade dá ao problema da admissibilidade ou rejeição
do divórcio, do casamento religiosa ou civil, da união de facto em condições análogas às dos
cônjuges, do casamento entre pessoas do mesmo sexo.

A atual CRP os arts.36º, 67º, 68º e 69º contém normas respeitantes à família. Ao direito da
família dedica o CC um livro- o Livro 4 (arts.1576º a 2020º), como exigência dos novos
princípios constitucionais.
Art.º 1576.º - podemos considerar a família como o conjunto das pessoas unidas por vínculo
emergentes do casamento, do parentesco, da afinidade e da adoção.
A reforma de 1977 deu uma redação ao art.1577º, passando a definir o casamento como “o
contrato celebrado entre 2 pessoas de sexo diferente que pretendem constituir família mediante
uma plena comunhão de vida, nos termos das disposições deste CC”.
Redação da seguinte Lei n.º 9/2010: Art.º 1577.º - Noção do casamento. Nos termos do
art.1587º, o casamento é católico ou civil.
O casamento (civil ou católico) dissolve-se por morte ou por divórcio.

Quanto ao divórcio, de notar as 2 modalidades atualmente admitidas (art.1773º): por mútuo


consentimento e sem consentimento.
Pode, porém, sem dissolução do vínculo conjugal, ter lugar uma separação dos cônjuges e dos
bens. Estão previstas na lei civil:
a) simples separação judicial de bens (art.1767º): qualquer dos cônjuges (não administrador)
pode requerer a simples separação judicial de bens quando estiver em perigo de perder o
que é seu pela má administração do outro cônjuge;
b) a separação judicial de pessoas e bens (art.1794º): pode ser requerida nos mesmos termos
do divórcio e, portanto, pode ser requerida por ambos os cônjuges, de comum acordo
(separação por mútuo consentimento), ou por um deles contra o outro, com algum dos
fundamentos previstos nos Arts.1779º e 1781º (separação litigiosa).

- Parentesco - Art.º 1578.º; é o vínculo entre 2 pessoas resultantes de uma delas descender
da outra ou ambas terem um progenitor comum.

- Afinidade - Art.º 1584.º; o vínculo que liga um dos cônjuges aos parentes do outro. Já não
há afinidade nem qualquer vínculo jurídico familiar entre um dos cônjuges e os afins do
outro.

- Adoção - Art.º 1586.º; define como: “O vínculo que, à semelhança da filiação natural, mas
independentemente dos laços do sangue, se estabelece legalmente entre 2 pessoas nos
termos do art.º 1973.º e seguintes.

É uma fonte de relações familiares que foi reintroduzida no nosso ordenamento jurídico
pelo atual CC. Trata-se de um vínculo que estabelece entre 2 pessoas um parentesco legal,
por oposição ao parentesco natural, do tipo paternidade filiação.

7. Fenómeno sucessório
− O destino das relações jurídicas depois da morte
− O chamamento dos sucessores à herança
− A quota indisponível
− O testamento e o contrato sucessório

Relação Jurídica
Relação Jurídica - vínculo entre 2 ou mais pessoas (singulares ou coletivas) ao qual as normas
jurídicas atribuem direitos e obrigações.
É composta por:
- Sujeito: as pessoas (singulares ou coletivas) entre as quais existe um vínculo digno de
proteção jurídica;
- Objeto: é o que dá origem à relação jurídica, corresponde à realidade sobre que recai o
poder do sujeito ativo, realidade essa que pode ser uma coisa (art.º 202.º a 212.º CC), uma
prestação, uma pessoa ou um direito. Tem de respeitar o artigo 280.º do CC;
- Facto Jurídico: todo o facto humano ou evento natural produtor de efeitos jurídicos;
- Garantia: é o conjunto de providências coercivas postas à disposição do titular do direito,
destina-se, em princípio, à indemnização de danos patrimoniais ou não patrimoniais
causados pelo incumprimento de uma obrigação.
Assim sendo a relação jurídica existe entre sujeitos, incide sobre um objeto, emerge de um
facto jurídico e está dotada de garantia.

Direito Subjetivo e Direito Potestativo


Direito Subjetivo – poder atribuído pela ordem jurídica a uma pessoa de, livremente, pretender
de outra um certo comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão), ou de, por um ato da
sua livre vontade ou auxiliado por ações de uma autoridade pública, produzir determinados
efeitos jurídicos que se impõem na esfera jurídica alheia.

SÃO Direitos subjetivos:


- Os direitos de crédito (dtos relativos);
- Os direitos reais (dtos absolutos);
- Os direitos de personalidade (dtos absolutos);
- Os direitos de família.

NÃO são Direitos subjetivos:


- Os poderes-deveres, oi poderes funcionais, isto é, os poderes que não podem ser exercidos
livremente pelo titular (ex.: os poderes integrados no poder paternal);
- Os poderes jurídicos stricto sensu ou faculdades (ex.: faculdade de contratar ou de ocupar
uma terra).

Direitos potestativos – poderes jurídicos de, por um ato de livre vontade, só por si ou de acordo
com uma decisão judicial, produz efeitos jurídicos que se impõem à outra parte.

Podem ser:
- Constitutivos – produzem a constituição de uma nova relação jurídica;
- Modificativos – produzem a modificação de uma relação jurídica já existente;
- Extintivos – produzem a extinção de uma relação jurídica existente.

Personalidade e Capacidade Jurídica


Personalidade Jurídica – aptidão de uma pessoa (singular ou coletiva) para ser titular de
relações jurídicas, é inerente ao ser humano, adquirindo-se no momento do nascimento
completo e com vida e perdendo-se com a morte, conforme disposto nos artigos 66.º a 68.º do
CC. As pessoas coletivas têm personalidade jurídica em certos termos (art.º 160.º).
Capacidade Jurídica – aptidão para ser titular de um círculo de relações jurídicas mais ou menos
restrito, pelo que pode, ao contrário do que se passa com a personalidade jurídica, sofre de
algumas limitações.

Pode ser:
- Capacidade de gozo: é o conteúdo necessário da personalidade jurídica, ligada à faceta da
titularidade, pelo que consiste na aptidão de ser sujeito ativo ou passivo de relações
jurídicas.
- Capacidade de exercício: capacidade de agir, é a suscetibilidade de praticar atos jurídicos
pessoal e livremente, ou seja, a capacidade para atuar juridicamente, exercendo direito ou
cumprindo deveres, adquirindo direitos ou assumindo obrigações.
As incapacidades (menoridade ou maior acompanhado) são de exercício, não de gozo.
A capacidade jurídica surge com a maioridade ou a emancipação para as pessoas singulares.

Incapacidade Jurídica
Incapacidade de exercício – casos em que o grau de imaturidade ou impreparação das pessoas
afeta a capacidade do governo das suas vidas e bens, não está apto para exercer um
determinando direito de que é titular, esta incapacidade pode ser suprida.
Incapacidade de gozo – casos em que determinada pessoa não tem aptidão para ser sujeito ativo
e passivo de certas relações jurídicas. Ao contrário da incapacidade de exercício, a
incapacidade de gozo é insuprível.

Menoridade:
Entende-se por menoridade a situação de incapacidade jurídica dos menores. A incapacidade
jurídica do menor tem início com o seu nascimento e cessa com a maioridade, aos dezoito anos
(causa normal do termo da incapacidade do menor nos termos do artigo 130.º do Código Civil),
ou ainda com a emancipação pelo casamento, a partir dos 16 anos (artigos 132.º e 1601.º, alínea
a) do CC). Os efeitos da menoridade relativamente à capacidade de gozo são limitados,
podendo afirmar-se que o menor tem capacidade genérica de gozo (artigo 67.º do CC). As
limitações previstas relativamente à capacidade de gozo têm incidência sobretudo no plano não
patrimonial (por exemplo, limitações relativas à capacidade de contrair casamento e de
perfilhar – artigos 1601.º e 1850.º do CC – e ao direito de testar – artigo 2189.º do CC). É no
plano da capacidade de exercício que se projetam, com relevância, os efeitos da menoridade,
podendo ser afirmado que os menores apresentam uma incapacidade genérica de exercício
(artigo 123.º do CC), que determina a anulabilidade dos atos por estes praticados (artigo 125.º
do CC). No entanto, esta incapacidade de exercício não é absoluta, já que o artigo 127.º do CC,
entre outras disposições legais, prevê uma série de exceções, isto é, um conjunto de atos para
os quais o menor é considerado capaz. Em estrita conexão com o problema da capacidade dos
menores, coloca-se a questão da sua imputabilidade, isto é, a suscetibilidade de o menor
responder pelas consequências dos seus atos ilícitos e danosos. Neste contexto, resulta do n.º 2
do artigo 488.º do CC que o menor se presume civilmente inimputável até perfazer sete anos
de idade, ainda que esta presunção possa ser afastada. Os meios de suprimento da incapacidade
do menor são as responsabilidades parentais, reguladas nos artigos 1877.º e seguintes do CC
(meio principal de suprimento), a tutela (meio subsidiário das responsabilidades parentais) e a
administração de bens (meio complementar dos meios anteriormente indicados).

Maior acompanhado:
(Lei 49/2018, de 14/08; art.º 138.º a 156.º CC; art.º 891.º e ss CPC)
Define judicialmente tipos de atos para cuja prática o maior necessita de intervenção de um
acompanhante.
- Causas: razões de saúde, deficiência ou de comportamento que impeça o exercício “pleno,
pessoal, consciente” dos direitos ou cumprimento de obrigações, ainda que
temporariamente.
As medidas devem ser concretizadas caso a caso e podem traduzir-se em representação ou em
assistência, ou em “intervenções de outro tipo”, que a sentença determine totais ou parciais
(art.º 145.º CC)
O acompanhamento limita-se ao necessário (art.º 145.º CC) e só podem abranger direitos
pessoais e negócios da vida corrente (art.º 147.º CC).
O acompanhamento pode ser requerido pelo próprio, ou por terceiros com autorização do
visado, sendo esta autorização suprível pelo tribunal (art.º 141.º CC). O Ministério público tem
legitimidade e não carece de autorização. A vontade do acompanhado é relevante na escolha
do acompanhante (art.º 143.º CC). O acompanhante deve privilegiar a saúde e bem-estar do
acompanhado (art.º 146.º CC).
Os atos praticados sem o necessário acompanhamento são considerados inválidos.

Quando pode alguém estar incapacitado de querer ou entender?


Artigo 257.º (Incapacidade acidental)
1. A declaração negocial feita por quem, devido a qualquer causa, se encontrava acidentalmente
incapacitado de entender o sentido dela ou não tinha o livre exercício da sua vontade é anulável,
desde que o facto seja notório ou conhecido do declaratário.
2. O facto é notório, quando uma pessoa de normal diligência o teria podido notar.

Domicílio
- Art.º 82.º - Domicílio voluntário geral
- Art.º 83.º - Domicílio profissional
- Art.º 87.º - Domicílio legal dos empregados públicos
Ausência - regime jurídico do seu suprimento
- Art.º 89.º - Nomeação de curador provisório
- Art.º 91.º - Legitimidade
- Art.º 94.º - Direitos e obrigações do curador provisório
- Art.º 98.º - Termo da curadoria
- Art.º 99.º - Justificação da ausência
- Art.º 100.º - Legitimidade
- Art.º 104.º - Curadores definitivos
- Art.º 112.º - Termo da curadoria definitiva
Morte presumida:
- Art.º 114.º - Requisitos
- Art.º 115.º - Efeitos
- Art.º 118.º - Óbito em data diversa
- Art.º 119.º - Regresso do ausente
- Art.º 120.º - Direitos que sobrevivem ao ausente

Pessoas Coletivas
Pessoas Coletivas – constituídas por uma coletividade de pessoas ou por uma massa de bens,
dirigidos à realização de interesses comuns ou coletivos, às quais a ordem jurídica atribui
personalidade jurídica.

São pessoas autónomas, com património próprio, sendo, portanto, centros de imputações de
direitos e deveres. O Estado, os Municípios, as fundações, as sociedades comerciais, as
sociedades civis, etc., são pessoas coletivas.
(Ver art.º 157.º, 159.º, 162.º, 166.º do CC)

As pessoas coletivas do CC:


- Normas de aplicação geral – art.º 157.º e ss
- Associações - art.º 167.º e ss
- Associações sem personalidade jurídica - art.º 195.º e ss
- Fundações - art.º 185.º e ss
- Sociedades civis – art.º 980.º e ss

Sociedades:
Podem ser civis ou comerciais. As sociedades civis são aquelas em que duas ou mais pessoas
se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício em comum de certa atividade
económica, que não seja de mera fruição, a fim de repartirem os lucros resultantes dessa
atividade (art.º 980.º CC). As sociedades comerciais têm por objeto a prática de comércio e
adotam uma das formas enunciadas pelo Código das Sociedades Comerciais. As sociedades
civis têm personalidade jurídica, ao passo que as comerciais não têm, a princípio.

Objeto da Relação Jurídica - art.º 280.º CC


O objeto da relação jurídica é o objeto de direito subjetivo que constitui o lado ativo de uma
relação jurídica.
Objetos possíveis: Pessoas (ex.: poder paternal), prestações (ex.: direitos de crédito), coisas
corpóreas e incorpóreas (art.º 202.º a 212.º), e direitos subjetivos.

Objeto de um direito ≠ Conteúdo de um direito


- Objeto de um direito é aquilo sobre que recaem os poderes do titular do direito em questão;
- Conteúdo de um direito é o conjunto de poderes ou faculdades que o direito subjetivo
comporta.

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