Você está na página 1de 18

SUMÁRIO

1- A PRÁTICA DO ACONSELHAMENTO PASTORAL ....................................................2


2- O VALOR DO ACONSELHAMENTO PARA O CONSELHEIRO....................................2
3- UMA POSTURA DO CONSELHEIRO ........................................................................3
4- ESCLARECENDO A QUESTÃO DA ACEITAÇÃO DA PESSOA ...................................3
5- LIDANDO COM OS TIPOS DE PESSOAS .................................................................4
5.1. OS QUE DESEJAM APENAS FALAR................................................................................ 4
5.2. OS QUE QUEREM APENAS SE JUSTIFICAR ..................................................................... 5
5.3. AS QUE DESEJAM BAND-AID ESPIRITUAL ................................................................... 6
5.4. ALGUMAS SUGESTÕES COMPLEMENTARES .................................................................... 7
6- O PERFIL E ATRIBUTOS DO CONSELHEIRO BÍBLICO ...........................................7
6.1. O P ERFIL DO CONSELHEIRO ........................................................................................ 8
6.2. ALGUMAS ATITUDES NECESSÁRIAS AO CONSELHEIRO ................................................... 10
6.3. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ....................................................................................... 12
7- ACONSELHAMENTO PASTORAL OU ACONSELHAMENTO PSICOLÓGICO? ...........12
7.1. ENTÃO, A PSICOLOGIA É RUIM? ................................................................................. 13
8- ERROS QUE DEVEM SER EVITADOS NO USO DA PSICOLOGIA............................14
9- CONCLUSÃO........................................................................................................17
ACONSELHAMENTO CRISTÃO - 2

1- A PRÁTICA DO ACONSELHAMENTO
PASTORAL
A questão preliminar na prática do aconselhamento pastoral é esta: O que queremos,
exatamente, com o ministério de aconselhamento pastoral? Bancar o psicólogo, ser
importante, dominar as pessoas, impor nosso ponto de vista? Na década dos oitentas, o
charme nas igrejas não era o louvor, mas era o aconselhamento.
Muitas pessoas querem fazer cursos na área de Aconselhamento Pastoral, porque
querem desenvolver o ministério de aconselhamento nas igrejas. Todavia, duas
características comuns em muitos dos interessados são evidentes:
1. São pessoas dominadoras.
2. São pessoas com pontos de vista muito fortes e que lutam por eles.
É curioso como o temperamento das pessoas as impele para certas funções nas
igrejas. Pessoas apaixonadas pela evangelização, não incomumente, são pessoas agressivas.
Alguns gurus evangélicos e pessoas que se atribuem títulos pomposos são pessoas com
enormes carências emocionais. Elas buscam compensação nas atividades eclesiásticas. O
conselheiro precisa se sondar: o que o motiva é amor às pessoas, consciência de missão, ou
desejo de controle?
Voltemos à década dos oitentas. Enfatizava-se muito o discipulado, que hoje aparece
com roupa nova, chamado de mentoreamento. Os candidatos a conselheiros queriam
discipular pessoas, mas dava para notar que não era para fazerem discípulos de Cristo, e
sim discípulos delas. Não era para levar as pessoas à estatura de varão perfeito, como
encontramos recomendado em Efésios 4.13. Era para reproduzir pessoas à sua imagem e
semelhança. Ainda hoje, buscamos muito fazer clones nossos em nossas igrejas. Ou
dominar pessoas. O líder precisa sondar bem suas intenções. Principalmente se ele se vale
do aconselhamento. Que deseja: ovelhas maduras ou pessoas submissas a ele? Aconselhar
ou dominar? Ver o desenvolvimento da pessoa ou reproduzir-se nela?

2- O VALOR DO ACONSELHAMENTO
PARA O CONSELHEIRO
Ao aconselhar, o pastor não apenas cumpre uma tarefa atinente ao seu ministério. Ele
se capacita para o ministério pastoral, no trato com o rebanho. Ðescobre suas necessidades,
vê as carências do povo e assim diagnostica seu estágio espiritual, como também vê por
onde deve andar no ensino do púlpito. O gabinete pastoral é um termômetro que indica
algumas enfermidades da igreja, e assinala para o pastor o que ele deve pregar, se deseja a
terapia que vem da Palavra de Deus.
Uma ressalva deve ser feita, no entanto: o gabinete pastoral não vai ao púlpito. O que
se ouve no gabinete morre no gabinete, mas o que se trata no gabinete sinaliza áreas que
devem ser abordadas pelo púlpito. Se constantemente o pastor está administrando crises
conjugais, isto é sinal de que precisa pregar mais sobre família. Se casos de mundanismo e
baixa espiritualidade causam os problemas que surgem no gabinete, o obreiro descobrirá
que a igreja está precisando de santificação. Precisamos reconhecer o fato de que somos
pastores e não terapeutas seculares, e que lidamos com igreja e não com uma clínica
psicológica. Lamentavelmente, muitos pastores estão deixando a Bíblia, substituindo-a por
ensinos de psicólogos seculares, sem temor a Deus, e caindo no mesmo equívoco de tantos
conselheiros não cristãos, o de pensar que nossa tarefa é tornar as pessoas aliviadas de
seus fardos, e se sentirem bem consigo mesmas. Nossa principal tarefa como conselheiros
não é aliviar o fardo das pessoas, mas orientá-las dentro dos princípios da Bíblia. Vivendo
os valores da Palavra de Deus as pessoas terão o alívio que o Espírito Santo dá.

Universidade da Bíblia ® | www.universidadedabiblia.com.br


www.universidadedabiblia.net
ACONSELHAMENTO CRISTÃO - 3

Nossa tarefa, portanto, não é de ajudar os pecadores a viverem bem com seus
pecados, mas “anunciar todo o conselho de Deus” (At 20.27). Assim fazendo, cumprimos
nossa missão, ajudamos as pessoas e formatamos o povo de Deus dentro da Palavra de
Deus. O aconselhamento ajuda o obreiro a cumprir sua missão, que é a de levar o povo do
Senhor à maturidade: “Desse modo todos nós chegaremos a ser um na nossa fé e no nosso
conhecimento do Filho de Deus. E assim seremos pessoas maduras e alcançaremos a altura
espiritual de Cristo. Então não seremos mais como crianças, arrastados pelas ondas e
empurrados por qualquer vento de ensinamentos de pessoas falsas. Essas pessoas
inventam mentiras e, por meio delas, levam outros para caminhos errados” (Ef 4.13-14). E,
secundariamente, ajuda o obreiro a conhecer o tipo de alimento que seu rebanho necessita.
O conselheiro precisa estar atento para o fato de muitas pessoas o procurarão
buscando confirmação de suas atitudes, e querendo apenas apoio e compreensão. Nem
sempre desejarão mexer na causa fundamental do problema. O conselheiro deve ser
compreensivo, mas nunca conivente com o erro e com o pecado.

3- UMA POSTURA DO CONSELHEIRO


Sentir indignação com o pecado é uma coisa. Sentir indignação com o pecador é outra.
O Novo Testamento fala, por exemplo, para não sermos ansiosos. Mas quando lidou com a
ansiedade de Marta, Jesus não lhe “deu uma dura”, mas foi terno: “Aí o Senhor respondeu:
– Marta, Marta, você está agitada e preocupada com muitas coisas, mas apenas uma é
necessária! Maria escolheu a melhor de todas, e esta ninguém vai tomar dela” (Lc 10.41-
42). Haverá momentos em que o conselheiro se frustrará porque vê que a pessoa está sendo
infantil ou apenas desejando aliviar um sintoma do seu pecado, ao invés de lidar com o
pecado. É preciso misericórdia. Sem abandonar a firmeza.
Além desta postura de aceitação da pessoa, o conselheiro precisa cultivar a imagem
(que deve corresponder à realidade) de ser uma pessoa confiável. Observe este comentário
em uma obra de aconselhamento profissional, secular: “O paciente tem vários graus de
consciência do processo, experimentado principalmente na forma de suas fantasias sobre o
médico e de uma sensação de segurança e confiança a seu respeito”. O conselheiro precisa
passar a imagem real de uma pessoa confiável. Ele precisa dar ao aconselhado a sensação
de segurança e de confiança a seu respeito. As pessoas confiavam em Jesus. Lembremos
disto. Certa vez, um homem, membro de outra igreja, me pediu aconselhamento. Eu lhe
disse para procurar seu pastor e ele me falou que o problema era o seu pastor, e me disse:
“Quando eu era católico, sabia que quando eu confessava meus pecados ao padre, ele
guardaria sigilo. Morria no confessionário. Tudo que eu conto para meu pastor vira
ilustração de sermão. Ele não cita meu nome, mas quem me conhece sabe que sou eu”.
Se você almeja ser um conselheiro cristão, estas duas virtudes são indispensáveis:
aceitação da pessoa e manutenção de sigilo. Um obreiro falastrão nem sempre obterá
confiança das pessoas.

4- ESCLARECENDO A QUESTÃO DA
ACEITAÇÃO DA PESSOA
O psicólogo Carl Rogers escreveu um livro intitulado Tornar-se Pessoa (título em
português). Sua terapia é centrada na pessoa. Veja esta citação sua: “Em meus primeiros
anos de atividade profissional, eu fazia a pergunta: ‘Como posso tratar, ou curar, ou mudar
esta pessoa?’. Agora, eu formulo a pergunta da seguinte maneira: ‘Como posso proporcionar
um relacionamento que essa pessoa possa usar para o próprio crescimento pessoal?’”.
Este é o aconselhamento centrado na pessoa. A idéia é que a pessoa tem as respostas
dentro de si e pode crescer sozinha, usando informações para seu benefício. Isto é o que
Rogers vê de mais importante no aconselhamento, o tornar-se pessoa. Mas a pergunta que o
conselheiro cristão deverá fazer é mais ou menos nestes termos: “Como posso ajudar esta

Universidade da Bíblia ® | www.universidadedabiblia.com.br


www.universidadedabiblia.net
ACONSELHAMENTO CRISTÃO - 4

pessoa a entender o que Deus deseja que ela faça nesta circunstância?”. Mais que tornar-se
pessoa, seu propósito é levar o aconselhando a tornar-se cristão maduro. A terapia centrada
na pessoa parte do pressuposto de que as pessoas são boas e podem ser sua própria
referência, prescindindo de um modelo externo. É a crença de que o homem é bom.
Infelizmente, alguns evangélicos têm perdido os referenciais da Palavra de Deus e feito
psicologia, sociologia e filosofia segundo os parâmetros do mundo, esquecido de uma
doutrina fundamental para nós, a Queda. Eles se encantam com o ensino de homens sem
Deus e desprezam o ensino do próprio Deus. O homem é pecador e não pode ser seu próprio
referencial. Vivemos numa época que despreza a correção e valoriza o “eu”. As pregações e
os cultos, em boa parte, são para exaltar o eu pecaminoso, vaidoso e cobiçoso, não a pessoa
e os ensinos de Jesus. O aconselhamento pastoral não pode ser massagem no ego nem
centrar-se em outra base que não seja o ensino das Escrituras.
O conselheiro cristão deve aceitar a pessoa, mas deve aceitar a autoridade das
Escrituras sobre todas as pessoas, mesmo as que não são crentes. Eis uma citação de
Crabb: “As categorias bíblicas são suficientes para responder às perguntas do conselheiro…
Nossa tarefa é pensar sobre a vida dentro das categorias que as Escrituras fornecem. A
autoridade para nosso pensamento depende de em que grau ele brota das categorias
bíblicas claramente ensinadas”. Em outras palavras: o ensino bíblico é suficiente para
responder a todas as indagações que um conselheiro tenha.

5- LIDANDO COM OS TIPOS DE


PESSOAS
5.1. Os Que Desejam Apenas Falar

No trato com as pessoas, o conselheiro encontrará aquela que o procurará apenas


para desabafar. Ela fala, fala, nunca pergunta (e quando pergunta é apenas de maneira
retórica, esperando apoio, mas nunca uma resposta objetiva) nem se mostra inclinada a
ouvir. O papel do conselheiro não é interromper e cortar a pessoa. Deve ouvir. Mas deve ter
cuidado. Há pessoas que gostam de alugar ouvidos para fazerem seus monólogos. Não
querem resolver nada, apenas falar. Pode ser bom para a pessoa, embora enfade o
conselheiro. Mas pode ser ruim para a pessoa se serve como subterfúgio para ela nunca se
decidir a fazer o que deve.
“De que esta pessoa precisa, realmente?”. Esta deve ser a pergunta do conselheiro.
Ela necessita apenas desabafar ou isto é uma prática de vida, em que ela aluga ouvidos
para descarregar sua ira ou frustração? Há os que querem audiência cativa, um auditório,
mesmo que de uma pessoa apenas, para se exibirem. Já notou a conversa das pessoas nas
ruas, ônibus, filas de ônibus, lanchonetes? Como elas contam vantagens e se exibem? Há
sempre pessoas contando histórias em que elas são heroínas. Cuidado com isto. As pessoas
têm carências emocionais muito grandes, entre elas a de aceitação, de serem bem vistas, de
serem respeitadas e admiradas. O conselheiro é visto como uma pessoa cuja admiração deve
ser conquistada. Mas não pode ser manipulado. E seu tempo não deve ser gasto em
contemplação de pessoas. Menos ainda sua atividade pastoral pode ser usada para validar
comportamentos vaidosos.
Lidando com a pessoa que não ouve, apenas fala, pergunte-lhe, após algum tempo
ouvindo-a: “Exatamente, o que você espera de mim?”. Procure, com gentileza, levar a pessoa
a refletir sobre o que está fazendo ali. Se ela disser que é apenas um desabafo, ótimo. Ouça
seu desabafo. Ela precisa disso. Mas se nada tem a dizer, desejando apenas um auditório
cativo, há um problema. Seu tempo é para ser usado com pessoas necessitadas, e gabinete
pastoral não é sala de espera nem lugar de passatempo, e o pastor-conselheiro não é ouvido
cativo para qualquer coisa.
Nunca seja grosseiro, mas nunca seja um poste. Há um livro de aconselhamento
popular cujo título é muito interessante: Cuidado com os vampiros emocionais. Você
encontrará pessoas que apenas sugam e querem que você seja passivo. Uma pessoa me
procurou durante quase um ano de aconselhamento, e sempre para abordar o mesmo
Universidade da Bíblia ® | www.universidadedabiblia.com.br
www.universidadedabiblia.net
ACONSELHAMENTO CRISTÃO - 5

problema. A solução era visível, mas a pessoa nunca a consumava. Depois de tanto tempo
tratando da mesma questão (quase que podia gravar o que dizia numa reunião para fazê-la
ouvir na outra), precisei perguntar: “Além de alugar meus ouvidos e de se lamentar, o que
você pretende, realmente?”. Talvez tenha sido pouco delicado de minha parte, mas entendi
que já havia tempo e relacionamento com a pessoa que me permitia agir desta maneira.
Graças a Deus ela entendeu que a solução era clara, estava em suas mãos e era questão
apenas de executá-la. E ela fez o que devia. Mas durante quase um ano apenas falou.
Avistar-se comigo não era solução, mas agravava o problema, porque quando alguém lhe
falava sobre a situação que ela enfrentava, sua resposta-desculpa era: “Estou me
aconselhando com o pastor”. Não estava se aconselhando com o pastor. Estava usando o
pastor para justificar sua imobilidade. E o pastor estava ficando com a imagem de quem
aconselhava sem aconselhar, na realidade. Esta é uma das preocupações que o conselheiro
deve ter. Ele será usado por pessoas, em várias circunstâncias. Cuidado com o que o fala e
cuidado como se porta. Cuidado com o que não fala e cuidado com o que deixa de fazer,
como não se porta.

5.2. Os Que Querem Apenas se Justificar

Quando Jesus se defrontou com os doutores da lei, em certa ocasião, um deles sentiu-
se acuado. Diz Lucas 10.29: “Porém o professor da Lei, querendo se desculpar, perguntou: –
Mas quem é o meu próximo?”. Muitas vezes, sem respostas, as pessoas querem se justificar,
e apresentam desculpas.
Um jovem, certa vez, disse ao pastor que estava sendo assediado por sua chefe. E que
seu emprego estava em risco se ele não aceitasse sair com ela. Já disposto a sair com ela,
procurou o pastor, e depois de expor a situação, fez esta observação: “Pois é, pastor,
antigamente os homens é que davam em cima das mulheres. Hoje as mulheres dão em cima
dos homens. Os tempos mudaram. A Bíblia não podia prever uma situação dessas”.
Calmamente, o pastor lhe perguntou: “Você já leu a história de José do Egito?”. O rapaz não
queria aconselhamento. Já decidira que ia pecar e buscava apenas justificativa. Lembre-se,
conselheiro: as pessoas não gostam que seus erros e pecados venham à tona. Tentam fazer
aventais de folhas de figueira para si, ou acusam os outros pelos seus pecados. Sua função
não é acusar. O Diabo é o acusador (Ap 12.10) e o Espírito Santo é o convencedor (Jo 16.8).
Você não deve fazer o trabalho nem de um nem de outro. Sua função é ser um instrumento
e deixar que o Espírito faça a obra. Não acuse nem tente convencer. Apenas mostre a
Palavra de Deus.
Tenho observado que muita gente procura o pastor para obter confirmação do que já
decidiu. Elas não procuram orientação, mas apoio para questões já assumidas. Podem até
ter feito uma decisão acertada (e são elas que devem tomar sua decisão, e não o pastor),
mas o conselheiro precisa ter bastante cautela. Já vivi a experiência muito desagradável de
ver um homem, que abandonou a esposa, ter usado minhas palavras para sua aventura
extraconjugal. Por isso, tenha cuidado. Seja bem claro no que diz, e em alguns momentos
seja mesmo assertivo. No caso em tela, eu disse: “Bem, você é quem deve tomar a decisão
sobre o que vai fazer”, não como conclusão da conversa, mas em algum momento da
conversa. Ele tomou esta frase como desculpa. Hoje eu diria, claramente, que ele está
errado, que deveria se apresentar diante de Deus pedindo forças e restauração do seu
matrimônio. Paguei pela falta de clareza.
O jargão mais empregado hoje, como desculpa para fazer coisas erradas, é “Eu tenho o
direito de ser feliz!”. As pessoas fogem da palavra “dever” como alguns cristãos de hoje
fogem da cruz. Mas não pode haver direitos sem a contrapartida dos deveres. As pessoas
têm o dever de fazerem as coisas certas, de serem honestas e íntegras. Nunca acharão
felicidade cometendo o erro. A consciência as acusará, e depois haverá conseqüências. A
preocupação do conselheiro não deve ser a de agradar, mas a de esclarecer. Ele não decide,
mas deverá deixar claro para o aconselhando as conseqüências de suas decisões. Eis uma
citação muito simples de Luiz Marins: “Uma das maiores pretensões que muita gente tem é
a de querer agradar a todo mundo. Isso simplesmente não existe. Nem Cristo agradou a
todo mundo em sua época. Por isso digo que é uma atitude pretensiosa querer agradar a
todos”. Desagradar às pessoas é muito arriscado, em nossas igrejas, principalmente se as
Universidade da Bíblia ® | www.universidadedabiblia.com.br
www.universidadedabiblia.net
ACONSELHAMENTO CRISTÃO - 6

pessoas desagradadas são poderosas na igreja. Muito pastor já perdeu pastorado por não se
curvar. Não é necessário ser desagradável, mas é indispensável ser honesto.
A pessoa que quer se justificar pode se valer de lisonjas ou passar por vítima. No
primeiro caso, ela o elogia, procurando desarmá-lo e trazê-lo para o lado dela. No segundo,
procura levá-lo a se condoer dela. Afinal, quem está sofrendo merece compaixão e não
crítica. Preste bastante atenção quando a conversação sair da área dos fatos e entrar na
área de sentimentos e de interpretações subjetivas. Uma boa atitude é a de sempre procurar
uma razoável objetividade. Sei que é difícil, em casos que envolvem emoções, manter-se
objetivo. Mas o conselheiro deve evitar opinar em casos que o envolvam diretamente, ou
alguém de sua família (em casos de relacionamentos na igreja), e manter sempre o foco no
ensino bíblico.
Dizer que a pessoa deve cumprir ou obedecer a Bíblia será de pouco valor. É melhor
perguntar: “O que você acha que a Bíblia diz sobre o assunto?”. Muitas vezes, a pessoa
interpretará a Bíblia de modo que lhe agrade. Lembremos de Pedro, falando das cartas de
Paulo: “Nas cartas dele há algumas coisas difíceis de entender, que os ignorantes e os fracos
na fé explicam de maneira errada, como fazem também com outras partes das Escrituras
Sagradas. E assim eles causam a sua própria destruição.” (2Pe 3.16). Evite o bate-boca
bíblico. Cite a Bíblia, cite outra passagem, refute, e depois deixe com a pessoa a decisão.
Apenas não permita que a Palavra de Deus seja torcida para apoiar posições erradas.

5.3. As Que Desejam BAND-AID Espiritual

Muitos dos problemas dos crentes são causados pelo Maligno e outros por pessoas
que erram com elas. Mas eles também criam seus próprios problemas, quando vivem em
desarmonia com a Palavra de Deus. Há gente que tem dificuldades financeiras porque
ganha pouco, mas uma parcela enorme dos problemas financeiros não é causada pelo
pouco que a pessoa ganha, mas pelo muito que ela gasta. Uma das questões essenciais para
o conselheiro é descobrir qual a fonte dos problemas do aconselhando. Nem sempre é
externa. Muitas vezes é interna, causada por ele. A pessoa não quer resolver, mas deseja
apenas um curativo. O aconselhamento é visto por ela como se fosse um band aid, algo que
mitiga o problema, mas não o resolve.
Numa determinada igreja, havia uma jovem que sempre tinha dificuldades financeiras.
O tesoureiro da igreja era especialista em administração financeira, e um dia sentou-se com
ela, perguntou quanto ela ganhava, ensinou-a a fazer um orçamento e deu-lhe dicas de
como proceder. Aquela jovem se tornou madura na área de finanças. Um irmão mais atilado
notou e a ajudou. Ele viu a causa dos problemas. Esta é a questão: qual a causa do
problema?
Procure, então, descobrir a causa, ao invés de tratar apenas das conseqüências. Nem
sempre as pessoas querem mexer numa área delicada de sua vida, e querem apenas
remediar a situação. O problema continuará e sempre haverá crises na vida da pessoa. O
conselheiro mais lúcido procurará ir à raiz da questão: “Parece que volta e meia este
problema aparece em sua vida, não é? A que você atribui isso?”. A pessoa poderá até não
querer tratar do assunto, mas será chamada à reflexão sobre ele. Uma pessoa com muitas
dificuldades relacionais, sempre se justificava dizendo que tinha “temperamento forte”. Um
dia, um conselheiro lhe disse: “Você já pensou no ensino de Provérbios que diz forte é a
pessoa que se controla? Pense se seu temperamento não é fraco, na realidade”. A pessoa
retrucou: “O senhor está dizendo que sou um crente fraco?”, já indignada. O conselheiro
apenas ponderou: “Não estou afirmando isto, mas já que você tocou no assunto, à luz dos
ensinos de Provérbios sobre o autocontrole, o que você acha disso?”.
Com propriedade, ao invés de emitir opinião sobre o assunto (e logo o aconselhado
usaria o “Não julgueis” em sua defesa), o conselheiro levou o aconselhado a emitir opinião
sobre si mesmo. E a reflexão baseada na Bíblia. Um hino antigo, muito cantado no Dia da
Bíblia, diz: “És espelho, martelo e espada, és o amigo melhor do cristão”. Ela é a melhor
amiga do conselheiro e sua fonte de trabalho. Ele deve levar a pessoa a se ver na Bíblia, e a
ver a orientação para seus problemas na Palavra Sagrada. Ela deve ser o espelho que ele
usa para o aconselhando se ver a si mesmo.
Universidade da Bíblia ® | www.universidadedabiblia.com.br
www.universidadedabiblia.net
ACONSELHAMENTO CRISTÃO - 7

Quando a pessoa quer apenas band aid espiritual é oportuno evitar aceitar seu jogo.
Num determinado momento, sim, a pessoa precisa de um curativo. Mas o conselheiro deve
saber que seu papel não é apenas de passar mertiolate (do tempo em que se usava
mertiolate) nos arranhões, mas ajudar a pessoa a não se arranhar mais. Procure sempre
entender o que está por trás da situação. Preste atenção no que não foi dito, naquilo que a
pessoa tenta ocultar ou naquilo que ela logo descarta. Não seja um investigador, mas esteja
sempre atento. Num aconselhamento, nem sempre o que se diz é o mais importante, mas
sim aquilo que a pessoa tenta esconder.

5.4. Algumas Sugestões Complementares

 Prepare-se antes da entrevista e prepare-se sempre. Temos o hábito de fazer uma


oração rápida antes do culto, de mãos dadas, com o pessoal dos instrumentos. Isto
dá uma aparência de que o culto será espiritual e abençoado porque fizemos aquela
oração com ar compungido. Começamos o culto com uma oração, porque caso
contrário, Deus não vai abençoar aquele culto. Oração não é pontilear (ou como
usam hoje, em mau gosto lingüístico, “pontual”), mas deve ser uma prática na vida
do obreiro. Se o encontro foi agendado, ore antes dele. Peça sabedoria a Deus. Peça
para ele lhe dar as palavras certas e iluminar sua mente. Aliás, seus primeiros
momentos devocionais do dia devem ser pedindo sabedoria a Deus para agir
corretamente, não pecar e não falhar.
 Seja amigável, mas evite a intimidade e o excesso de camaradagem que pode
impedir sua ação como conselheiro pastoral. O pastor deve ser amigo, mas nunca
deve perder sua postura pastoral. Principalmente no aconselhamento com o sexo
oposto. Uma vez, uma jovem que aconselhei me perguntou se podia me dar um
beijo de gratidão, no rosto. Disse um “obrigado” estava bom. Em público, não
soaria mal, mas em privado é pouco recomendável. Seja cauteloso. Cautela e caldo
de galinha nunca mataram ninguém, a não a ser a galinha. Mas isto, a morte da
galinha, é outra história.
 Se o aconselhamento for a longo prazo, peça permissão para fazer anotações.
Depois, releia-as, ponha em ordem, passe a limpo. É uma maneira de guardar as
informações, até na mente (o processo de passar a limpo ajuda a memorizar) e
saber o que está se passando com a pessoa.
 No encontro posterior, recapitule com a pessoa o que anotou. Pergunte se está certo
o que anotou, se ela deseja modificar alguma coisa do que disse (não de como está,
mas do que disse). As anotações são o histórico do aconselhamento.
 Guarde as anotações consigo, em segurança. Um pastor guardava todas as
informações de aconselhamento no computador, emitindo opiniões sobre os
aconselhandos. Um dia, uma pessoa eficiente em informática invadiu seu
computador, copiou os dados, com suas opiniões, e despachou pela lista de emails
da igreja. Foi um transtorno.
 Nunca use as anotações fora do processo de aconselhamento.
Uma boa palavra, dita em um momento de necessidade, pode salvar uma vida. Por
isso, sejamos cuidadosos no falar. Podemos levantar uma pessoa e ser os instrumentos de
Deus para que ele restaure alguém. Nunca sejamos negligentes na nossa missão. Nem nos
envaideçamos.
Somos instrumentos. Apenas isto. E para ser bem usado, o instrumento precisa estar
bem preparado. Lembremos disto e sejamos instrumentos bem preparados.

6- O PERFIL E ATRIBUTOS DO
CONSELHEIRO BÍBLICO
Universidade da Bíblia ® | www.universidadedabiblia.com.br
www.universidadedabiblia.net
ACONSELHAMENTO CRISTÃO - 8

Não basta dizer-se vocacionado para o ministério pastoral ou para o ministério do


aconselhamento para ser bem sucedido nestas atividades. Ser vocacionado não é uma
garantia de que as coisas darão certas. Prova disso é o grande número de ministérios que dá
errado e de igrejas com problemas muitas vezes causados por pastores. E, da mesma forma,
de conselheiros que não conseguem ajudar as pessoas. Há algo mais além da chamada e da
boa vontade em fazer a obra.
Ter consciência da chamada da parte de Deus e manter uma vida de comunhão com
ele ajudam muito ao obreiro. Mas ter o preparo necessário também ajuda muito. Ninguém
negará que Pedro foi chamado e usado por Cristo. Mas a sombra projetada pelo ministério
de Paulo foi maior que a projetada por Pedro. Inteligência e preparo postos a serviço de
Cristo é uma bênção. O conselheiro bíblico precisa ser bem preparado. Tanto na área de
estudo sobre o assunto e sobre a Palavra de Deus, como na área do preparo emocional. O
emocional e o espiritual devem caminhar juntos, principalmente na vida de quem cumpre a
tarefa de ajudar o povo de Deus. Por isso, é sempre oportuno lembrar, o primeiro dever do
obreiro cristão é cuidar de si mesmo. É triste a palavra da sunamita em Cânticos 1.6:
“Puseram-me por guarda de vinhas, mas a minha vinha não guardei”. Guarde a sua vinha!
Seja uma pessoa que busca a maturidade espiritual e emocional. Invista em si mesmo.
Na matéria de hoje veremos alguma coisa sobre o perfil do conselheiro. E veremos
também algumas atitudes que são necessárias no seu ofício. Comecemos pelo perfil.

6.1. O Perfil do Conselheiro

Muitos aspectos do perfil do conselheiro poderiam ser alistados aqui, mas ressaltemos
os principais à nossa tarefa de líderes cristãos.
A. Empatia. A palavra vem da mesma raiz de “simpatia” e de “antipatia”. Simpatia é
sentir na mesma direção, sentir com. Antipatia é sentir contra. Sobre empatia, o prefixo
grego en nos esclarece: é “sentir dentro”, “sentir como se fosse a pessoa”. A simpatia pode
ser entendida como uma ternura, mas a empatia é uma profunda compaixão que nos faz
colocar-nos no lugar daquela pessoa. O fundador do cristianismo foi a maior manifestação
de empatia que o mundo já viu: “O Verbo se fez carne” (Jo 1.14). Deus foi empático conosco,
na pessoa de Jesus. Empatia tem a ver com compaixão. O Salvador era profundamente
empático, porque era profundamente compassivo: “Vendo ele as multidões, compadeceu-se
delas, porque andavam desgarradas e errantes, como ovelhas que não têm pastor” (Mt 9.36).
E este é um conselho bíblico para todos os cristãos: “Alegrai-vos com os que se alegram;
chorai com os que choram” (Rm 12.15). Somos exortados a experimentar e partilhar os
sentimentos dos irmãos. O autor de Hebreus aconselhou a comunidade cristã nos seguintes
termos: “Lembrai-vos dos presos, como se estivésseis presos com eles, e dos maltratados,
como sendo-o vós mesmos também no corpo” (Hb 13.3). O conselheiro cristão deve ter este
sentimento bem aguçado. Ele não é juiz nem um crítico, mas um ajudador. E um ajudador
com compaixão.
Não somos profissionais que atendem a pessoa, ouvem-na sem experimentar emoção
alguma (algumas vezes bocejando de indiferença), e depois apenas perguntam: “Sim, o que
você pensa em fazer sobre isso?”. Somos pessoas que amam a Deus, que amam o povo de
Deus e que servem a Deus servindo a seu povo. E mostramos nosso amor a Deus no amor
ao seu povo. Empatia é mais uma postura que adotamos que um sentimento que
experimentamos. É sentir com a pessoa. A frieza ou a indiferença é mortal no trabalho do
conselheiro. Como bem frisou Collins: “É possível ajudar as pessoas mesmo sem
compreendê-las inteiramente, mas o conselheiro que consegue transmitir empatia
(principalmente no início do processo terapêutico) tem maiores chances de sucesso”. Ouvi
um pastor psicólogo criticar um pastor que chorou no sepultamento de uma de suas
ovelhas, dizendo que ele era um amador e que não sabia controlar as emoções. O pastor que
chorou não se descontrolou, não surtou nem se mostrou histérico. E merece elogios
exatamente porque não foi um profissional de religião, mas um amador. Benditos sejam os
amadores assim!
B. Respeito. Por vezes a pessoa chega e abre o seu coração, contando-nos um pecado
que julgamos ser escabroso (e às vezes é mesmo). Então ficamos chocados com a revelação e
Universidade da Bíblia ® | www.universidadedabiblia.com.br
www.universidadedabiblia.net
ACONSELHAMENTO CRISTÃO - 9

mostramos à pessoa que não esperávamos aquilo da parte dela. Ou ela nos ataca ou ataca
alguém da igreja. O conselheiro, muitas vezes, é machucado pelo aconselhando. Qual deve
ser a reação numa circunstância dessas? Kaller, em uma obra sobre aconselhamento
cristão, usa esta figura: uma pessoa não crente se aconselha com o pastor, e lhe diz: “Os
membros de sua igreja fazem pior do que as pessoas que não são crentes”. Ele alista quatro
possíveis respostas do conselheiro, e entre elas duas bem curiosas. O conselheiro poderá
dizer: “Você não sabe nada; pior que você não há nenhum” ou “Os crentes têm suas falhas,
mas as falhas dos não crentes são piores”. Diz Kaller: “Esta reação não facilitará a
continuação da conversa, mas é o início de uma discussão”. Ele mostra duas respostas que
seriam mais viáveis: “Você acha que muitos crentes não vivem de acordo com suas
crenças?” ou “Você acha os não crentes melhores que os crentes?”.
Na primeira resposta viável, o conselheiro circunscreveu a questão a uma opinião
pessoal do aconselhando, e não a deixou como um absoluto. Na segunda, deixou a porta
aberta para o aconselhando continuar a expor sua mágoa. Em nenhum dos dois casos ele
deixou a questão descambar para o bate-boca.
Respeito significa valorizar a pessoa, não a vendo como uma coitadinha ou uma
leprosa moral ou espiritual. É vê-la como sendo uma pessoa, imagem e semelhança de
Deus, valiosa aos olhos do Senhor, que no momento passa por uma crise e veio lhe pedir
ajuda. Não esfregue sal e pimenta nas feridas dela. Respeite seu desabafo, suas atitudes, e
sua postura. Isto é diferente de aceitar um comportamento errado. É respeitar a pessoa que
está querendo ajuda como pessoa. Não é um traste. Lembremos que Paulo recomendou que
apoiássemos aqueles que estão fracos.
C. Sigilo. O que um conselheiro ouve deve morrer com ele. Ele não passa para frente
nem mesmo com pessoas interessadas no assunto. Muitas vezes alguém me procura e
depois uma pessoa da família ou do relacionamento com esta pessoa vem me perguntar o
que foi dito. Geralmente me nego, dizendo que o que a pessoa me contou pertence ao sigilo.
Se quiser saber, que meu indagador lhe pergunte. Lembre-se que comentar o que lhe foi dito
em confiança acabará não apenas com sua atividade, mas com seu caráter. E você terá
traído quem confiou em você. Poucas coisas são tão ruins para um pastor ou para um
conselheiro que ser conhecido como fofoqueiro, como alguém que passa para frente coisas
que ouviu em confidência. Há pastores que contam de púlpito experiências de gabinete. Não
citam o nome da pessoa, mas deixam pistas claras de quem sejam. Isto é muito ruim.
Abrir o coração com alguém é tarefa difícil. Muitas vezes é um desnudar da alma, e é
doloroso para a pessoa. Já ouvi muitos casos tristes e dolorosos em gabinete, desde
violência sexual que uma criança sofreu por parte de pai até o uso de drogas por líderes da
igreja. Por vezes, o peso era esmagador e eu me sentia deprimido, querendo um buraco para
me enfiar. Mas sabia que não podia partilhar com ninguém. Um conselheiro deve ser
sigiloso. Por isso que deve ser uma pessoa que cuide de sua vida espiritual e se fortaleça,
sempre, com o Grande Conselheiro, Deus. É a vinha dele que ele deve guardar.
D. Sobriedade. O Novo Testamento faz várias referências à sobriedade. Nós é que
pouco mencionamos esta virtude cristã. Há líderes que amam holofotes ou são pouco
discretos. Têm grande necessidade de atenção. Jesus exortou à discrição na vida espiritual,
quando deixou recomendações sobre a oração e o jejum. Sobriedade tem a ver com
discrição. Não se faz alarde de que estamos ajudando alguém. O trabalho do conselheiro é
um trabalho de bastidores, que se faz nos bastidores, e não em público. Como o
aconselhamento envolve questões emocionais, e por vezes delicadas, o conselheiro deve
lembrar que a imagem do aconselhando deve ser poupada. Repreensão pública ou
conselhos dados em voz alta prejudicam muito. Ninguém precisa ouvir a conversa. Por isso,
quando atender, fale baixo. Uma das tarefas do conselheiro é ajudar a pessoa a ser madura
e tomar decisões por si, orientada pelo Espírito Santo. Outra tarefa é levantar a pessoa.
Neste sentido, expô-la em público, como alguém tutelado, é prejudicial. Somos conselheiros
e não pais de criancinhas travessas que devem ser chamadas à atenção.
Há conselheiros que gostam de publicidade para que os demais vejam como ele é
importante ou como está sendo usado por Deus. Remo Machado, psicólogo cristão, faz esta
afirmação, em uma de suas obras: “Caso Deus seja o centro de nossa vida, ele tem um
plano para nossa existência, e se ele nos delegou a posição de psicoterapeutas, devemos
Universidade da Bíblia ® | www.universidadedabiblia.com.br
www.universidadedabiblia.net
ACONSELHAMENTO CRISTÃO - 10

usá-la para enaltecimento do nome de Deus, e não para o nosso engrandecimento pessoal”.
Sobriedade é esta característica assumida de que somos apenas instrumentos, a glória é de
Deus, fazemos o que temos que fazer e saímos de cena, sem esperar aplausos ou
reconhecimento. O conselheiro não faz alarde do seu trabalho. A vaidade sempre é notada,
sempre desgasta o vaidoso e geralmente cobra um preço muito elevado. E as pessoas que
aconselhamos não devem ser vistas como troféus a exibir.
E. Desprendimento. Isso significa que o conselheiro não deve levar vantagem na tarefa
de aconselhar. Por vezes, o conselheiro é profissional, um psicólogo ou outro tipo de
terapeuta. Neste caso, ele cobrará consultas. O levar vantagem, neste contexto, significa que
o conselheiro não usa as informações que recebe, nem antes nem depois do processo de
aconselhamento. Suponhamos que o conselheiro seja o pastor ou o líder de um trabalho.
Um irmão o procura e lhe revela um problema e pede ajuda. Não será justo o conselheiro
divulgar publicamente uma possível incapacidade da pessoa para o exercício de uma função
para a qual ela vier a ser indicada. Evidentemente que se for um caso grave, como uma
pessoa que tenha tendências pedófilas sendo indicada para cuidar de crianças, o
conselheiro precisará agir. Mas isso exige cautela. A questão principal é de ordem pessoal:
não levar vantagem. Não impugnar a pessoa para um cargo ou função porque tem outro
nome que é seu preferido ou porque o ambiciona, etc. Deve se lembrar também que Cristo
pode transformar uma vida e que um pecado que uma pessoa cometeu no passado não
será, necessariamente, cometido outra vez pela pessoa.
F. Capacitação. Já tangenciamos este aspecto anteriormente. Trata-se da capacitação
para o serviço a desempenhar e da capacitação espiritual para poder desempenhar o
serviço. Precisamos ter em mente que nenhum de nós, como líder cristão, é um produto
acabado. No que se presume ser sua última carta, já idoso, Paulo pede a Timóteo: “Quando
vieres, traze a capa que deixei em Trôade, em casa de Carpo, e os livros, especialmente os
pergaminhos” (2Tm 4.13). Os especialistas distinguem entre “livros” e “pergaminhos”. O
primeiro termo aludiria a obras seculares, e o segundo teria o sentido de livros canônicos,
isto é, os escritos sagrados. Ele está detido na cadeia, e prestes a ser executado, mas ainda
quer os livros. O obreiro cristão em geral e o conselheiro em particular sempre devem querer
crescer. Adquirir livros, ouvir palestras, fazer cursos, tudo isso ajuda muito o conselheiro.
Mas o preparo espiritual nunca pode ser negligenciado. O Pr. Falcão dá como sendo um dos
aspectos mais importantes na vida do conselheiro ao ajudar alguém em crise: “Orar por si
mesmo e colocar-se nas mãos de Deus para prestar uma ajuda afetiva” . Desempenhamos
uma atividade espiritual e nunca podemos nos esquecer disso. A autoridade espiritual que
vem da comunhão com Deus e da submissão à sua Palavra é sempre notada na vida de
quem a tem. E quem a tem não precisa alardear.

6.2. Algumas Atitudes Necessárias ao Conselheiro

Tendo considerado algo do perfil do conselheiro, vejamos algumas atitudes que ele
deve tomar quando exerce seu papel.
A. Ele Deve Proceder Sem Preconceito Quando Aconselha. Pode ser que a pessoa
aconselhada esteja em pecado e deva ser orientada quanto a isso, mas não compete ao
conselheiro, como conselheiro, condená-la. No aconselhamento não se prega. Conversa-se e
se mostra à pessoa a situação em que ela se encontra e as alternativas a tomar na sua vida.
Em outras ocasiões, o conselheiro administrará conflitos de relacionamentos entre partes.
Deve evitar se posicionar contra um ou contra outro. Ele deve ser uma ponte e não um juiz.
Pode ser que a questão esteja bem clara e ele tenha uma posição bem definida, mas deve se
lembrar que está ali para conciliar partes.
Já me aconteceu, em passado remoto, aconselhar um líder da igreja com problemas de
drogas. No íntimo, por dentro, fiquei muito indignado com este comportamento vindo de um
líder em que eu e a igreja confiávamos, mas sabia que perderia a pessoa se manifestasse
este sentimento. Ela já estava bastante frustrada e envergonhada. Não manifestei minha
postura de censura. Ela já sabia que estava errada. Tratamos de como superar a situação.
Mostrei-lhe empatia. A pessoa superou o problema e até hoje está na liderança (pedi
permissão a ela para citar o evento, sem nomear e localizar, e ela me concedeu). Precisamos

Universidade da Bíblia ® | www.universidadedabiblia.com.br


www.universidadedabiblia.net
ACONSELHAMENTO CRISTÃO - 11

ter muita cautela e lutar para impedir que nossos sentimentos pessoais de aceitação ou
rejeição nos levem a tomar atitudes que bloqueiem o processo de aconselhamento.
B. Ele Deve Evitar Dar Ordens. Inconscientemente, o conselheiro tem o desejo de
dominar e exercer controle na vida da pessoa aconselhada. Até porque se sente em
condições de orientar a outra parte. Nosso papel é levar a pessoa a ver a vontade de Deus
para sua vida. E precisamos ser humildes para reconhecer que nem sempre a vontade de
Deus é a nossa, como conselheiros. Podemos mostrar à pessoa as opções e as
conseqüências das opções, mas deve ser deixada com ela a decisão a tomar. É assim que ela
amadurecerá. Quando dizemos às pessoas o que fazer, elas criam dependência emocional. E
isto não é bom. O conselheiro poderá dizer que executou bem sua função quando a pessoa
chegar a um ponto em que o aconselhado não mais precisar mais dele como orientador.
Essa idéia de “guru” ou de um mentor que tutoreia a pessoa a por toda sua vida não é uma
medida salutar. É antibíblica. Conforme Efésios 4.13, o exercício de dons na igreja é para
que os crentes cheguem “ao estado de homem feito, à medida da estatura da plenitude de
Cristo” (Ef 4.13). Conduzir alguém pela mão por toda a vida não faz desse alguém uma
pessoa neste patamar de adulto em Cristo. Há muito manipulador querendo ser mentor.
C. O Conselheiro Deve Cultivar Objetividade e Não Ser Envolvido Emocionalmente.
Não confunda as coisas nem tente fazer “pegadinhas”, dizendo que isto é o oposto da
empatia mostrada como necessária. Terapeutas profissionais não devem aconselhar
parentes ou pessoas a eles ligadas emocionalmente. Sua análise sempre será prejudicada
porque terá envolvimento emocional. Há uma linha divisória entre empatia e envolvimento
emocional. A empatia é produto da misericórdia cristã. O envolvimento sucede quando o
conselheiro se sente perturbado porque aquilo o atinge diretamente. Por vezes, ele está
passando por um problema semelhante ao que a pessoa que lhe procura está passando e
sente desnorteado, ou sem condições de fazê-lo. Não é errado um conselheiro ter problemas
e passar por lutas, é preciso dizer neste contexto. O problema é quando o aconselhando está
numa situação idêntica e o conselheiro sente que está sem condições.
A eficácia do aconselhamento, neste caso, será reduzida. Ao mesmo tempo, em
contrapartida, o conselheiro poderá ver nesta situação como a pessoa está sofrendo. Mas
sua orientação poderá ser apenas um reflexo do que ele faria. E as pessoas reagem de
maneira diferente. O conselheiro poderá mostrar um caminho que ele tem condições de
percorrer, mas talvez a outra pessoa não tenha. Ele precisará refletir bastante, orar e ter
humildade para, se for o caso, dizer à pessoa que naquele momento não poderá ajudá-la. Se
tiver certeza de que estará mais capacitada exatamente por estar vencendo o problema, deve
ajudar. Mas se estiver sendo abatida pelo problema, terá pouco o que dizer. E deverá ter a
humildade de reconhecer isto.
D. Saber Filtrar o Que Está Sendo Dito. Nem sempre as palavras revelam. Por vezes
mascaram. Para filtrar bem, o conselheiro precisa de um bom filtro (ou um coador). É
oportuno lembrar que vivemos numa sociedade massificada pelo egoísmo e que as pessoas,
em sua maior parte, têm motivações egoístas. Até mesmo na área espiritual. O conselheiro
precisa ter um bom parâmetro para avaliar e orientar. Por exemplo: qual é a finalidade da
vida? É a busca de felicidade? É o que as pessoas buscam, e o que muitas pregações
sinalizam. Mas é este o propósito de Deus para nós?
Cabem aqui as oportunas palavras de Larry Crabb:
“Veja os títulos de tantos livros cristãos da atualidade: “O segredo cristão de uma vida
feliz”; “Desenvolva todo o seu potencial”; “A mulher total”; “A mulher completa”. Muitos
contêm conceitos excelentes e verdadeiramente bíblicos, mas sua mensagem, clara ou
implícita, às vezes nos dirige mais à preocupação com a auto-expressão e menos a um
interesse em conformar-nos com a imagem de Cristo. A Bíblia, porém, ensina que, seu eu
permanecer em obediência na verdade, a fim de tornar-me mais com Deus e assim torná-lo
mais conhecido, o resultado será finalmente a minha felicidade.”
Um problema muito sério é que os crentes estão buscando felicidade, e não mais
santidade, como se pudessem ser felizes à parte de sua comunhão com Deus. Com esta
visão, a vida cristã passa a ser a busca de satisfação de necessidades pessoais (algumas
irrelevantes e supérfluas). É um conceito mundano. Assim, o trabalho do conselheiro passa

Universidade da Bíblia ® | www.universidadedabiblia.com.br


www.universidadedabiblia.net
ACONSELHAMENTO CRISTÃO - 12

a ser mais o de um terapeuta secular, levando as pessoas a se aceitarem como são e a


buscarem necessidades muitas vezes mundanas, que um servo cristão que ajuda os crentes
na sua caminha a uma vida mais profunda com Deus. Muitos dos problemas espirituais e
emocionais não estão ligados à área espiritual ou da vontade de Deus, mas a projetos
pessoais que os indivíduos têm, muitos deles modelados pelo padrão do mundo. Eles não
alcançam tais projetos e se frustram. Tenho observado, em quarenta anos de ministério (o
que não me torna infalível, mas me faz entender muitas coisas) que grande parte da aflição
dos crentes é por coisas das quais não precisam e sem as quais pode viver. Mas deixam-se
modelar pela massificação mundana de uma sociedade materialista que espiritualmente é
decadente. Eles querem ser como o mundo. E querem as coisas que o mundo quer.
O conselheiro deve ter em conta que lidará com muitas pessoas que têm problemas
por causa de necessidades que não devem ser atendidas. Cito Crabb, a respeito: “Os
conselheiros cristãos devem ser sensíveis à profundidade do egoísmo na natureza humana.
É temerosamente fácil ajudar alguém a atingir um alvo não-bíblico. É nossa
responsabilidade, como membros do mesmo Corpo, continuamente recordar e exortar uns
aos outros a fim de manter em vista o alvo de todo verdadeiro aconselhamento: libertar as
pessoas para que possam melhor adorar e servir a Deus, ajudando-as a se tornarem mais
semelhantes ao Senhor. Em suma, o alvo é maturidade.”
A atividade de aconselhar biblicamente não é a de dar pirulitos a crianças frustradas,
mas ajudar as pessoas a entenderem o propósito de Deus para a vida delas. Há uma
diferença enorme entre desejos e necessidades. É preciso saber a distinção entre os dois. E o
conselheiro, algumas vezes, terá que levar a pessoa a entender isso.

6.3. Algumas Considerações

Como obreiros que querem o bom andamento da obra de Deus, podemos cair num
estado emocional comum a muitos: a impaciência por não vermos os frutos imediatos do
nosso trabalho. Orientamos uma pessoa com zelo e bastante cuidado, mas vemos que
apesar de nossa orientação ser clara ela continua apresentando as mesmas falhas.
Lembremos que muitas vezes o problema vem se arrastando há tempos, e a pessoa demorou
a pedir auxílio. Desconstruir o que foi construído de maneira errada e reconstruir de
maneira certa nem sempre se consegue em prazo curto. Voltando a Collins:
“Muitos conselheiros ficam desanimados e até ansiosos quando não vêem progresso
imediato em seus aconselhandos. Os problemas geralmente levam muito tempo para se
desenvolverem e presumir que eles desaparecerão rapidamente por causa da intervenção do
conselheiro não é uma postura muito realista. Mudanças instantâneas acontecem, mas são
raras. O mais comum é levar um tempo até que o aconselhando abandone sua maneira de
pensar e seu comportamento anteriores, substituindo-os por algo novo e melhor.”
Assim sendo, não se culpe se não vir resultado imediato ou se a pessoa custar a
aceitar sua orientação. Sua missão não é produzir resultados, mas fazer o melhor que
puder, na dependência do Espírito Santo. O resto compete a Deus, que fará a obra no tempo
dele. Que sempre é o certo.

7- ACONSELHAMENTO PASTORAL OU
ACONSELHAMENTO PSICOLÓGICO?
Esta é a primeira questão que desejo considerar: o que estudaremos será
aconselhamento pastoral ou aconselhamento bíblico? Muitos pastores têm se travestido de
psicólogos e, nesta disciplina, muitos seminários têm se preocupado mais com
aconselhamento psicológico que pastoral. Freud, Adler, Mortimer, Jung, Erickson e outros
têm tomado o espaço da Bíblia. Pessoalmente, vi um professor da disciplina ironizar a
Bíblia, quando depreciava seu ensino para formação do caráter e para resolução dos
problemas emocionais das pessoas. Para ele, a área espiritual nada tinha a ver com a
emocional e psicológica. A Bíblia podia ser usada para outras coisas, mas para o

Universidade da Bíblia ® | www.universidadedabiblia.com.br


www.universidadedabiblia.net
ACONSELHAMENTO CRISTÃO - 13

aconselhamento, ele, particularmente, “usava a ciência”. E segundo ele, este era o erro de
muitos pastores “fundamentalistas”, o de prenderem-se à Bíblia e aos princípios e valores
cristãos. Só a “ciência” podia ajudar as pessoas. Contraditoriamente, este professor era
pastor, e aos domingos pregava sobre a autoridade e a suficiência das Escrituras, do púlpito
que ocupava. Parece que tanto a autoridade quanto a suficiência eram parciais. Ou sua
teologia era esquizofrênica.
Somos líderes cristãos, alguns de nós somos pastores e outros entre nós almejam
serem pastores. Como pastores e líderes, temos que aconselhar as pessoas. Precisamos ser
psicólogos para aconselhar o povo de Deus? Antes do surgimento da Psicologia, como se
dava o aconselhamento? Não havia? Como a igreja fazia? Ela sempre errou?
Aconselhar não é algo restrito a psicólogos (se é que psicólogos aconselham). Pais
aconselham, amigos aconselham, mulheres aconselham seus maridos (e bem-aventurados
os que têm uma mulher sábia, e mais bem-aventurados quando prestam atenção aos
conselhos dela!) e pastores aconselham. Nosso texto básico é a Bíblia e o seu ensino é a
nossa linha de orientação. Ela não é “anticiência” nem “antipsicologia”. Ela é a Palavra de
Deus, afirma a vontade de Deus, e os homens devem se submeter a ela. Ela não é negativa,
no sentido de ser contra isso ou contra aquilo. Ela é, positivamente, a Palavra viva de um
Deus vivo. Ela afirma o que Deus deseja que façamos e sejamos. Apropriando-nos da
expressão contida em Romanos 12.2, podemos dizer que ela é a “boa, agradável, e perfeita
vontade de Deus”. O Salmo 19 mostra a Palavra de Deus como o que há de melhor para
orientar, formar, direcionar, acalmar e aconselhar a pessoa: “A lei do Senhor é perfeita, e
refrigera a alma; o testemunho do Senhor é fiel, e dá sabedoria aos simples. Os preceitos do
Senhor são retos, e alegram o coração; o mandamento do Senhor é puro, e alumia os olhos.
O temor do Senhor é limpo, e permanece para sempre; os juízos do Senhor são verdadeiros e
inteiramente justos” (Sl 19.7-9). Qualquer tentativa de tornar uma pessoa saudável e
equilibrada e que ignore o valor da Bíblia será uma tentativa frustrada. Não há rumo seguro
para a vida fora dela. Além disto, há a questão do senhorio de Cristo sobre nossas vidas.
Como bem disse Lutero: “Não há uma área sequer de nossa vida que Cristo não diga: ‘É
meu!’”. O cristão é servo de Cristo e é regido pelas Escrituras em todas as áreas de sua
vida.

7.1. Então, a Psicologia é Ruim?

Não é a questão se a Psicologia, como ciência que alega ser, é ruim ou não. A questão
é que ela não é a palavra última sobre o homem, sobre valores, sobre a vida. E no momento
exato em que qualquer um de seus princípios colida com a verdade cristã, ela deve ser
rejeitada. Psicólogos não são Deus nem foram homens inspirados por Deus para escrever a
nova revelação. Este é o ponto.
Para considerar melhor este tópico, fiquemos com uma aguda observação de
Powlinson: “A área do aconselhamento tem se divorciado da Palavra. Na mente da maioria
das pessoas, aconselhamento é algo essencialmente diferente da pregação. As verdades e os
métodos usados no aconselhamento são raramente concebidos como o ministério da Palavra
dirigida sob medida a um indivíduo. A maioria daqueles que acreditam na Bíblia diria com
facilidade “Prega a Palavra”. Eles se levantariam revoltados diante de uma pregação cujo
conteúdo fosse qualquer outro que não a Palavra. Em geral, os crentes concordam que a
verdade revelada em Deus deve controlar o púlpito. A Palavra é verdadeira e suficiente para
o ministério dirigido às multidões. Entretanto, não é natural dizermos: “Aconselhe a
Palavra”. A maioria daqueles que acreditam na Bíblia rendem-se diante de conselhos não-
bíblicos. A Palavra é apenas um recurso entre vários recursos possíveis, tanto nos livros de
auto-ajuda como na sala de aconselhamento ou ao redor da mesa da cozinha. A Palavra
tende a ter um papel secundário, adicionada a uma mensagem que lhe é alheia. Ou talvez
não tenha mesmo papel algum, tida como insuficiente para lidar com os problemas das
pessoas (…). Jay Adams expressou bem esta questão: “A Palavra deve ser ministrada no
aconselhamento com tanta prontidão quanto na pregação”.
Não se trata, portanto, de afirmar se a Psicologia é boa ou ruim, mas de afirmar a
autoridade da Palavra de Deus em todas as áreas da vida humana. E podemos levantar
outra questão dentro desta consideração: “De qual Psicologia está se falando?”. Sim, porque
Universidade da Bíblia ® | www.universidadedabiblia.com.br
www.universidadedabiblia.net
ACONSELHAMENTO CRISTÃO - 14

talvez seja mais correto afirmar que há Psicologias e não Psicologia. Num ensaio intitulado
“Por que aconselhamento bíblico e não psicológico?”, John Street faz a seguinte observação:
“O que é psicologia? Anda que seja um termo comum e com freqüência usado, sua
conotação é equivocada. Definições populares e escolásticas cobrem uma ampla gama
semântica a partir do processo de pesquisa científica para a teoria e prática terapêutica de
doenças mentais biológicas a clínicas. Os sistemas incluem biopsicologia, psicologia
experimental, psicologia cognitiva, psicologia do desenvolvimento, psicologia clínica,
psicologia social, psicologia industrial-organizacional, e psicologia transcultural. Em adição,
uma sortida de teorias psicoterapêuticas orienta muito dos sistemas psicológicos –
psicodinâmicos, humanístico, existencial, sistemas familiares, comportamental-cognitivo,
psicoterapia ou psicoterapia pós-moderna. Como afirmamos, a breve história da Psicologia
está deleteriamente marcada com um numero incontável de modelos descartáveis. Em
outras palavras, a psicologia está longe de ser uma disciplina especial. Seria melhor se
referir a “psicologias”, uma vez que a pletora de teorias e sistemas atuais e passadas é
abundante.”
Ainda que pareça má vontade contra a Psicologia e contra os psicólogos (e é preciso
ressaltar que não é – trata-se apenas de não subordinar a Bíblia a ela), há uma referência
mais a fazer, extraída do mesmo ensaio de Street: “A psicologia é uma disciplina científica?
A resposta para esta pergunta é, na melhor das hipóteses, discutível. Certamente há
aspectos desta disciplina que usam raciocínios científicos rígidos cuidadosamente
elaborados. Ainda assim, no entanto, as pressuposições a priori necessárias para trazer
algum significado importante são patentemente evolucionárias. A psicologia é mais bem
vista como uma cosmovisão materialista – behaviorismo, humanismo, determinismo,
existencialismo, epifenomenalismo e simples utilitarismo pragmático.”
Esta consideração de Street merece ser bem pensada. Nada na estrutura da Psicologia
é possível de comprovação. Assim como pensadores materialistas impugnam a Teologia,
negando-lhe o caráter de ciência porque suas afirmações não podem ser provadas (Deus,
alma, vida eterna, por exemplo), podemos lembrar que ego, id, superego são afirmações que
não podem ser provadas como tais. São questões apenas opinadas. Da mesma maneira
rotulam-se, mas não se provam certas atitudes: transferência, contratransferência,
projeção, etc. São termos pomposos, mas que não podem ser provados. São opiniões. Até
respeitáveis, até bem embasadas, mas são opiniões. Não se prova a alma, é verdade. Da
mesma maneira, não se prova o superego.
Por outro lado, precisamos reconhecer também que a Bíblia não é um manual de
aconselhamento. É outro aspecto que precisa ser analisado com objetividade. Ela não é uma
enciclopédia contendo tópicos de aconselhamento que alistam o tratamento ou o remédio
para os problemas das pessoas. Pinçar versículos bíblicos como calmantes ou estimulantes
pode ser uma prática comum entre nós, mas não é a maneira correta de se usar a Bíblia.
Mas assim mesmo, ela é a Palavra de Deus, e se temos uma compreensão do seu todo,
podemos entender sua orientação para a vida do homem, tanto no todo como nos
particulares.
Muitos dos conceitos da Psicologia são válidos e podem ser usados com segurança por
um conselheiro cristão. Da mesma maneira, muito da técnica de aconselhamento
psicológico pode ser aplicada ao aconselhamento bíblico e pastoral, também com segurança.
Mas a atitude de dicotomizar a vida cristã, relativizando a autoridade e aplicabilidade da
Bíblia à área espiritual da vida humana, é errada. Dizer que ela é a verdade espiritual, mas
não é a verdade para a vida, os sentimentos e atitudes das pessoas é uma incongruência. E
parece sem sentido um pastor, no púlpito, afirmar a suficiência da Bíblia para orientar a
vida das pessoas, e mais tarde, atendendo uma das pessoas que estava no culto, negar esta
suficiência e valer-se de orientação de homens que rejeitam a Bíblia e afirmam a absoluta
animalidade do homem, negando-lhe qualquer traço de criação divina.

8- ERROS QUE DEVEM SER EVITADOS


NO USO DA PSICOLOGIA
Universidade da Bíblia ® | www.universidadedabiblia.com.br
www.universidadedabiblia.net
ACONSELHAMENTO CRISTÃO - 15

 O conselheiro cristão deve lembrar que a autoridade última é da Bíblia e não da


Psicologia. Há muitos cristãos que aconselham pessoas com base em princípios e
valores de pessoas sem Deus, e muitas destas são pessoas pervertidas. Tudo isso
em nome da ciência ou do saber contemporâneo. Lembremos de 1Timóteo 6.3-5:
“Se alguém ensina alguma doutrina diversa, e não se conforma com as sãs palavras
de nosso Senhor Jesus Cristo, e com a doutrina que é segundo a piedade, é
soberbo, e nada sabe, mas delira acerca de questões e contendas de palavras, das
quais nascem invejas, porfias, injúrias, suspeitas maliciosas, disputas de homens
corruptos de entendimento, e privados da verdade, cuidando que a piedade é fonte
de lucro”. Chamo sua atenção para a expressão “não se conforma com as sãs
palavras de nosso Senhor Jesus Cristo”. “Conformar” é “tomar o molde”. Em nome
de uma pretensa erudição, muita gente abandona a autoridade e a suficiência das
Escrituras. Como diz Paulo, “é soberbo, e nada sabe, mas delira…”. Muitas teorias
psicológicas reivindicam uma base biológica completamente amoral para o
comportamento humano. O pecado passa a ter uma justificativa biológica. Vez por
outra se vêem balões de ensaio falando sobre o gene do adultério ou o gene da
violência, por exemplo. E, em outras ocasiões, tudo é questão de condicionamento
social ou cultural. E até mesmo racial. Sem o conceito de pecado, a moralidade se
esvai e a santidade de Deus não tem nenhum sentido. Se não há pecado não há
santidade. Se não a santidade de Deus não há pecado.
 O conselheiro cristão deve ser criterioso no uso da Bíblia. Não basta citá-la a torto e
a direito. Ela não é um amuleto nem um talismã. Não é um livro mágico. Tampouco
seus versículos podem ser isolados do contexto, como se fossem analgésicos. Isto
implica em ter uma teologia sadia, produto de uma cosmovisão bíblica também
sadia. Vi um bispo da Universal, pela televisão, defender o homossexualismo como
sendo ação de demônios. Bastaria exorcizar a pessoa que ela perderia a prática.
Expressões como “Você é escravo do demônio do medo, da ira ou da ganância”
manifestam completa ignorância do ensino bíblico global, e não se constituem em
aconselhamento bíblico. Creio na ação do Maligno, mas nossos pecados e nossos
desvios de comportamento não podem ter uma análise simplista e reducionista
assim. “Vamos quebrar a maldição das palavras de seu pai sobre você, e você
nunca mais cometerá esse pecado”. Cometemos pecados porque somos pecadores.
Erramos porque nossa personalidade é decaída. A compreensão correta da Bíblia e
a prática de uma teologia sadia ajudam o conselheiro.
 O conselheiro não pode aceitar os padrões psicológicos que atribuem todas as
nossas mazelas a doenças. Tal atitude elimina por completo a responsabilidade
humana, minando assim o ensino bíblico e a teologia sadia. A este propósito, faço
esta citação: “A idéia de que é doença a causa dos problemas pessoais vicia todas
as questões da responsabilidade humana. Este é o ponto crucial da questão. As
pessoas já não se consideram responsáveis pelos erros que cometem. Dizem que
seus problemas são alógenos (gerados doutrem) e não autógenos (gerados em si
mesmo). Em vez de assumirem responsabilidade pessoal por sua conduta, culpam
a sociedade.”
Na realidade, a aceitação destes padrões psicológicos é a negação de todo o ensino
linear das Escrituras e da teologia sadia. A visão alógena dos problemas faz da pessoa uma
inocente e nunca culpável pedra de um jogo de xadrez. Ela nunca tem culpa, mas obedece
apenas a uma mão que a manipula. Precisamos sempre ter em mente que por toda a Bíblia
o homem é chamado a escolher e a decidir. O apóstolo Paulo disse que Deus o chamara
para ser apóstolo desde o ventre de sua mãe: “Mas, quando aprouve a Deus, que desde o
ventre de minha mãe me separou, e me chamou pela sua graça, revelar seu Filho em mim,
para que eu o pregasse entre os gentios, não consultei carne e sangue” (Gl 1.15-16). Mas ele
precisou decidir que obedeceria: “Pelo que, ó rei Agripa, não fui desobediente à visão
celestial” (At 26.19). Em tudo tomamos decisões e somos moralmente responsáveis por elas.
Lembremos que todo o ensino secular (na psicologia, educação, na sociologia, na filosofia e
até na teologia liberal, que é uma secularização da teologia) se encaminha para aliviar a
consciência humana, sem arrependimento e abandono do pecado. Há um esforço enorme
em acalmar a consciência pecaminosa, sem orientá-la a deixar o pecado.

Universidade da Bíblia ® | www.universidadedabiblia.com.br


www.universidadedabiblia.net
ACONSELHAMENTO CRISTÃO - 16

 O conselheiro precisa lembrar que vivemos sob o signo da cultura do Iluminismo, e


que as ciências humanas seguem seus postulados. Um dos mais fortes pontos do
Iluminismo é a crença na bondade inata do homem. Não existe pecado. A
dessacralização do mundo e o abandono de um conceito elevado de Deus
respondem pela noção da inexistência do pecado. No orientalismo, Deus é apenas
uma força ou uma energia. Em certos segmentos evangélicos, é apenas um
cuidador, abençoador ou pouco mais que a fada madrinha para nos agraciar com
bênçãos. O abandono da imagem da santidade absoluta de Deus e da
pecaminosidade do homem aumentam o impacto deste aspecto. O homem é bom,
Deus não é um carrasco, todos os nossos problemas são passíveis de resolução
com mais educação, etc.
O conselheiro cristão não piora a situação das pessoas. Não procura agravar seu
estado emocional e espiritual. Ele não se preocupa em produzir emoções, porque isso não
lhe compete, mas sim ao Espírito Santo. Mas ele não aceita o jogo da cultura secular que
procura mitigar as emoções, vendo a culpa real como apenas “sentimento de culpa alógeno”.
As pessoas podem ter sentimento de culpa sem serem culpadas. Podem ter sido
traumatizadas. Mas, o homem sente culpa porque é culpado. A tarefa do conselheiro não é
ajudar a pessoa a viver bem com seu pecado, mas sim levá-lo a ver que o pecado afasta de
Deus e assim prejudica toda a vida da pessoa. O homem não é bondade absoluta. É mau, é
pecador. É decaído.
 A tarefa do conselheiro cristão não é fomentar a cultura do egoísmo nas pessoas. A
preocupação de muita gente hoje é consigo mesma, em viver bem, em uma zona de
conforto emocional, sem tensão alguma, e mantendo controle sobre tudo e até
mesmo sobre todos. Numa sociedade que cultua os bens, este egoísmo é fortalecido
até em certas pregações evangélicas, que enfatizam mais o ter coisas que ter
caráter. O triunfo não é sobre si, mas sobre as adversidades. E a religião se torna
um meio de obter mais bens materiais, e não em ser santo.
Vivemos a era do bem estar, e não mais a da verdade. Na realidade, nossa época é a
da “não verdade”. A verdade é irrelevante. O relevante é sentir-se bem. Assim vemos pessoas
que abandonam a ortodoxia e se envolvem com seitas de ensinos exóticos porque lá se
sentem bem com o louvor, ou com a koinonia, por exemplo. E, em muitas igrejas, o
ministério do aconselhamento se tornou o “ministério da ajuda”. A linha é ajudar pessoas, e
não mostrar às pessoas a verdade pela qual elas devem pautar suas vidas. Isto acaba
trazendo um distanciamento dos padrões de Deus. Tem razão John Betler ao afirmar:
“Mas aqueles entre nós que estão envolvidos com “ministérios de ajuda” como
aconselhamento, treinamento em discipulado ou liderança de grupos de apoio talvez
devessem estar especialmente atentos a ele, pois se defrontam tão freqüentemente com o
sofrimento humano que se apressam em ajudar sem antes consultar ao Senhor e perguntar:
“Este conselho é bíblico?” ou “Este método agradará ao Deus da verdade?”.
As pessoas são consumidoras. O lema “Penso, logo existo” foi modificado. Defasou-se
em nossa cultura. O atual é “Consumo, logo existo”. Esta visão permeia também a vida
religiosa. Muitos dos próprios fiéis estão na igreja em busca de bênçãos, de entretenimento,
de momentos agradáveis, sem compromisso. São consumidores espirituais. A competição
por fiéis é feroz, na proliferação de igrejas. Então, boa parte dos pastores tem como
preocupação maior a fidelização de clientes. Deve se dar aos freqüentadores da igreja o que
eles querem. E eles querem apoio para seus projetos, confirmação para seus alvos de vida, e
nunca admoestação ou correção. É a síndrome do fruto desejável. Na tentação ao primeiro
casal, Satanás afastou da mente deles qualquer preocupação com a verdade e firmou o
diálogo (Satanás é o primeiro conselheiro da história) em termos de apelo às necessidades
emocionais e à ganância. E conseguiu: “Então, vendo a mulher que aquela árvore era boa
para se comer, e agradável aos olhos, e árvore desejável para dar entendimento, tomou do
seu fruto, comeu, e deu a seu marido, e ele também comeu” (Gênesis 3.6). O conselheiro
cristão deve ter preocupação com a verdade revelada por Deus. Deve ter em mente que se o
aconselhando não estiver firmado na Palavra de Deus, mas em bases opostas a ela, está, na
realidade, sendo firmado sobre a areia.

Universidade da Bíblia ® | www.universidadedabiblia.com.br


www.universidadedabiblia.net
ACONSELHAMENTO CRISTÃO - 17

9- CONCLUSÃO
O conselheiro deve ter as seguintes palavras que Paulo dirigiu a Timóteo como
palavras que lhe cabem, em seu trabalho: “Conjuro-te diante de Deus e de Cristo Jesus, que
há de julgar os vivos e os mortos, pela sua vinda e pelo seu reino; prega a palavra, insta a
tempo e fora de tempo, admoesta, repreende, exorta, com toda longanimidade e ensino.
Porque virá tempo em que não suportarão a sã doutrina; mas, tendo grande desejo de ouvir
coisas agradáveis, ajuntarão para si mestres segundo os seus próprios desejos, e não só
desviarão os ouvidos da verdade, mas se voltarão às fábulas. Tu, porém, sê sóbrio em tudo,
sofre as aflições, faze a obra de um evangelista, cumpre o teu ministério” (2Timóteo 4.1-5). E
que atente ele para os verbos: admoesta, repreende e exorta. São tarefas do conselheiro
cristão. Que ele cumpra seu ministério sem ter comichão nos ouvidos, e regido pela santa
Palavra de Deus.

BIBLIOGRAFIA BÁSICA
COLLINS, Gary R. Ajudando Uns aos Outros Pelo Aconselhamento. São Paulo: Vida
Nova.

Universidade da Bíblia ® | www.universidadedabiblia.com.br


www.universidadedabiblia.net

Você também pode gostar