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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS


CURSO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS - LICENCIATURA

Roberto Gabriel Ferreira

Proposta de sequência didática para o ensino de conservação da biodiversidade


utilizando o jogo de tabuleiro Wingspan

Florianópolis, SC
2022
Roberto Gabriel Ferreira

Proposta de sequência didática para o ensino de conservação da biodiversidade


utilizando o jogo de tabuleiro Wingspan

Trabalho de Conclusão de Curso submetido ao curso de


Ciências Biológicas - Licenciatura do Centro de
Ciências Biológicas da Universidade Federal de Santa
Catarina como requisito parcial para a obtenção do
título de Licenciado em Ciências Biológicas.

Orientadora: Profa Andrea Rita Marrero

Florianópolis, SC
2022
Roberto Gabriel Ferreira

Proposta de sequência didática para o ensino de conservação da biodiversidade


utilizando o jogo de tabuleiro Wingspan

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado para obtenção do título de
Licenciado em Ciências Biológicas e aprovado em sua forma final pelo Curso de Ciências
Biológicas.

Florianópolis, 05 de dezembro de 2022.

________________________
Profª. Dra. Daniela de Toni
Coordenadora do Curso

Banca Examinadora

________________________
Profa. Dra. Andrea Rita Marrero
Orientadora Universidade Federal de Santa Catarina
________________________
Prof. Dr. Guilherme Renzo Rocha Brito
Avaliador Universidade Federal de Santa Catarina
________________________
Prof. Me. Ramon Diedrich
Avaliador Universidade Federal de Santa Catarina
________________________
Prof. Dr. Renato Hajenius Aché de Freitas
Suplente Universidade Federal de Santa Catarina
AGRADECIMENTOS

Minha trajetória acadêmica tem sido bastante sinuosa, uma montanha russa onde
muitas vezes escalei até o topo e outras vezes disparo com velocidade até o chão. Começo
agradecendo a mim mesmo pela resiliência, me mantendo firme em todas as curvas desse
caminho, mas, em muitos momentos precisei de outras mãos que me apoiassem quando as
minhas já não conseguiam se firmar. Sou muito grato a minha mãe, minha primeira professora
e educadora que me despertou a paixão pela escrita e leitura. Também sou grato ao meu pai,
que sempre se preocupou com minha educação e com meu desempenho acadêmico. Sou grato
à minha irmã Cristina e ao meu irmão Marcelo, que sempre me apoiaram e me motivaram a
estudar cada vez mais. Apesar de quase nunca falar isso, amo muito vocês.
Agradeço ao LABINAT e ao PET Biologia, que me proporcionaram diversos
aprendizados acadêmicos e interpessoais durante esses anos. Agradeço a professora Andrea
Marrero, que aceitou orientar esse trabalho e foi essencial para várias decisões tomadas.
Menção honrosa à ilustríssima Alexandra Elbakyan, figura revolucionária no acesso ao
conhecimento científico para milhões de pesquisadores. Ao falecido Norberto, professor e
gamificador durante o ensino médio que me inspirou a seguir essa trajetória, esteja em paz.
Agradeço o meu querido amigo Well, que vem me acompanhando e apoiando há anos.
Também a Luana, Mônica, Gil, Lucas, Kevin, Lew e Rodrigo pela parceria. Também tenho
muito a agradecer a Lolo, Margot e sua família, que foram muito importantes em boa parte
dessa trajetória. Também agradeço as novas amizades que fiz durante a graduação, Gio, Dani,
Ene, Gomes, Rafa, Haruna, Jady, Liri, Raoni. Levo com carinho no coração todas as pessoas
que passaram e que perduram em minha vida, garanto que me construí com pedacinhos de
cada um de vocês.
Por fim agradeço a UFSC e ao CCB, pela oportunidade de trocar conhecimentos e de
construir aprendizado juntos. Espero que num futuro próximo todas as pessoas tenham as
mesmas condições de acesso e permanência que eu tive, para construção de um amanhã
melhor para o mundo.
RESUMO

Os jogos de tabuleiro são uma ferramenta lúdica amplamente utilizada para finalidades
educativas. Por desenvolver outras competências além do conteúdo de aula, esse trabalho
acadêmico selecionou o jogo Wingspan para abordar o ensino de conservação ambiental para
estudantes do 9º ano do ensino fundamental. A pesquisa destacou a importância da educação
ambiental na construção de um conhecimento não-segmentado, conectando conhecimento
específico, fatores socioculturais e contexto político. Também foi identificado os principais
aspectos cognitivos e sociais de jogos de tabuleiro para justificar seu uso, além disso, também
elencou os elementos essenciais no Wingspan que são centrais ao tratar de temáticas
ambientais, como biopirataria e tráfico de animais silvestres. Foi elaborado um roteiro para
profissionais docentes que desejem utilizar o jogo em sala de aula ao trabalhar o tema
“Conservação ambiental”, desenvolvendo as habilidades EF09CI12 e a EF09CI13 de acordo
com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC). A sequência didática foi fundamentada na
teoria cognitivista e na aprendizagem baseada em problemas, considerando as competências e
habilidades da BNCC que estudantes dessa fase devem desenvolver. O roteiro proposto conta
com seis momentos, que envolvem jogar, pesquisar e avaliar. Dessa forma, o presente
trabalho de conclusão de curso tornou viável o uso do jogo de tabuleiro Wingspan como
ferramenta pedagógica, garantindo um ensino de ciências que integre fatores cognitivos,
sociais e emocionais.

Palavras-chave: Aprendizagem baseada em problemas; Wingspan; Jogo de tabuleiro;


Conservação ambiental.

ABSTRACT

Board Games are a ludic tool widely used for educational purposes. For developing other
skills beyond the class content, this academic work chose the game Wingspan to address the
teaching of environmental conservation for students of 8º year of elementary school. The
research highlighted the importance of environmental education in the building of a
non-segmented knowledge, connecting specific knowledge, sociocultural factors, and political
context. Also was identified the main cognitive and social aspects of board games to justify
their use. In addition, it also listed the most essential elements in Wingspan that are central
when dealing with environmental issues, such as biopiracy and wildlife trafficking. A guide
was prepared for teaching professionals who wish to use the game in the classroom when
working on the theme “Environmental conservation”, developing the skills EF09CI12 and
EF09CI13 according to the Common National Curriculum Base (CNCB). The didactic
sequence was based on cognitive theory and problem-based learning, considering the CNCB
skills and abilities that students should develop in this phase. The proposed guide has six
moments, which involve playing, researching, and evaluating. In this way, the present final
thesis made the use of the Wingspan board game viable as a pedagogical tool, guaranteeing
science teaching that integrates cognitive, social, and emotional factors.

Keywords: Problem-based Learning; Wingspan; Board Game; Environmental Conservation.


SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 9
2 OBJETIVOS 11
2.1 Objetivo geral 11

2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS 11

3 REFERENCIAL TEÓRICO 12
3.1 CONTEXTUALIZAÇÃO SOBRE O USO DE JOGOS DE TABULEIRO NA
EDUCAÇÃO 12

3.2 EDUCAÇÃO AMBIENTAL E CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE 16

3.3 MECÂNICA, ESTÉTICA E POTENCIALIDADES DE WINGSPAN 21

4 PROPOSTA DIDÁTICA 34
4.1 PRIMEIRA E SEGUNDA AULA: O JOGO 35
4.2 TERCEIRA AULA: BRAINSTORM 36
4.3 QUARTA E QUINTA AULA: TEORIZAÇÃO E HIPÓTESES 37
4.4 SEXTA AULA: APLICAÇÃO À REALIDADE 38
4.5 AVALIAÇÃO 38
4.6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 39
5 CONCLUSÃO 41
REFERÊNCIAS 43
APÊNDICE 46
9

1 INTRODUÇÃO

O Brasil é um país de escalas continentais que conta com mais de 116.000 espécies de
animais, abrigando cerca de 20% do total de espécies de todo o planeta (BRASIL, s.d.). Essa
enorme biodiversidade também esconde uma atividade ilícita tão lucrativa quanto nociva ao
equilíbrio ambiental: o tráfico de animais silvestres. Estima-se que 38 milhões de animais
silvestres sejam retirados anualmente dos ecossistemas brasileiros vítimas de venda irregular
em território nacional e em outros países (RENCTAS, 2002). Essa atividade é extremamente
danosa aos animais, uma vez que muitos sofrem durante o transporte, podendo levá-los à
morte. Além disso, provocar uma mudança de habitat pode trazer graves impactos para saúde
pública, tanto partindo de seu ambiente de origem como na chegada ao ambiente de destino.
Segundo o IBGE (2008), durante o período de 1999 a 2000, foram registradas 36.573
apreensões de aves da fauna silvestre, representando cerca de 82% de todas as apreensões. O
grupo das aves é um dos mais afetados com o comércio ilegal, somando fatores como falta de
fiscalização, baixa taxa de coleta de dados, punições brandas perante a lei e educação precária
frustram as tentativas de impedir o avanço desta prática. Desta forma, o professor de ciências
recebe a responsabilidade de discutir e trazer estes dados à sala de aula.
Visando promover um aprendizado completo, muitos professores e educadores buscam
alternativas à educação tradicional explorando diversos recursos de aprendizagem disponíveis
para profissionais da educação. Dependendo do conteúdo ministrado, pode-se recorrer a estes
materiais para melhorar o entendimento dos estudantes, já que a maior parte do tempo, o
ensino é feito através de materiais e comunicações escritos, orais e audiovisuais (MORÁN,
2015). Entretanto, existe uma grande ameaça por correntes que pregam o ensino bancário,
onde as instituições educacionais passam a priorizar a entrega de conteúdos programáticos
durante o ano letivo, ao invés de propor um ensino crítico que esteja pautado na realidade e no
contexto socioeconômico dos estudantes. As correntes neoliberais atingem a educação de
forma sórdida, apontando quais conhecimentos são válidos e inválidos, promovendo
mecanismos verticalizados para avaliação do sistema e retirando autonomia pedagógica de
instituições e de professores (GENTILI, 1996).
Na tentativa de escapar do ensino tradicional a utilização de metodologias ativas para
o aprendizado pode despertar maior interesse dos estudantes para os conteúdos teóricos das
disciplinas de ciências, metodologias que muitas vezes envolvem o uso ativo do corpo além
10

da cognição e abrem espaço para reflexões em conjunto. A utilização de elementos de jogos


como forma de resolução de problemas práticos ou como artifício para engajar um público
específico ou um assunto determinado para evitar tarefas tediosas, contrasta com
metodologias de ensino tradicional onde o aluno é agente passivo (DETERDING et al., 2011).
O uso de jogos de tabuleiro para o ensino de ciências pode se tornar uma ferramenta
importante tanto no espaço de sala de aula como nos períodos contraturno. A mecânica e
estética envolvidas em jogos permitem que os estudantes possam participar da aula de forma
ativa e lúdica, estimulando a retenção e o engajamento dos jogadores de forma mais efetiva
em comparação com o ensino tradicional, mudando processos cognitivos, promovendo
motivação e resolução de problemas (WOUTERS et al., 2013; KAPP, 2012, apud
KIRYAKOVA et al., 2014). Além dos benefícios cognitivos, o uso de jogos na educação
também promove o desenvolvimento de habilidades sociais e emocionais (CAMPOS;
BORTOLOTO; FELÍCIO, 2003), fundamentais para a formação do indivíduo para o convívio
em sociedade.
Considerando isso, a possibilidade de explorar este nicho utilizando o jogo de
tabuleiro Wingspan conciliando educação com jogos e a conscientização sobre o tráfico de
animais silvestres, em específico sobre o grupo das aves. Wingspan é um jogo comercial
desenvolvido pela designer de jogos Elizabeth Hargrave e comercializado no Brasil pela
editora Grok Games. Esse jogo de estratégia pode ser jogado em até 5 jogadores tendo como
objetivo principal conseguir pontos de vitória através das cartas de aves, ovos e comida
estocada.
Para o devido uso desta ferramenta paradidática, o presente trabalho de conclusão de
curso apresenta uma sequência didática que viabiliza o uso deste jogo em sala de aula para
turmas do 9º ano do ensino fundamental, buscando discutir iniciativas para promover a
conservação da biodiversidade, em específico, no combate ao tráfico de animais silvestres,
considerando o desenvolvimento mútuo nos âmbitos cognitivo e social das interações em
grupo que jogos de tabuleiro proporcionam.
11

2 OBJETIVOS

2.1 OBJETIVO GERAL


Propor uma sequência didática utilizando o jogo de tabuleiro Wingspan como
ferramenta para a conscientização ao tráfico de animais silvestres, desenvolvendo habilidades
e competências a partir das recomendações da Base Nacional Comum Curricular (BNCC)
2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
● Realizar um levantamento bibliográfico sobre potencialidades do uso de jogos na
educação.
● Qualificar e identificar os elementos mecânicos e estéticos no Wingspan que possam
levantar a relevância sobre a temática.
● Elaborar um manual para uso docente, viabilizando o Wingspan como elemento
central da proposta.
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3 REFERENCIAL TEÓRICO

3.1 CONTEXTUALIZAÇÃO SOBRE O USO DE JOGOS DE TABULEIRO NA


EDUCAÇÃO

Ao propor o uso de jogos de tabuleiro e outras atividades lúdicas em sala de aula,


deve-se questionar qual a importância que este material terá para o ensino com questões como
“esse método será mais efetivo que o ensino tradicional?” ou “teria um tabuleiro com peões o
mesmo significado quando vira recurso de ensino, destinado à aprendizagem?”
(KISHIMOTO, 1994). Kishimoto também aborda sobre a pouca seriedade de jogos e atos
lúdicos, que pode ser uma contraposição às atividades cotidianas no contexto escolar. O uso
de jogos e elementos ludificados no ensino pode trazer preocupações ao professor e
responsáveis e demanda suporte pedagógico para seu uso, sendo importante considerar que as
metodologias precisam acompanhar os objetivos pretendidos (MORÁN, 2015), caso contrário
podem ser considerada apenas recreação e falta de planejamento do plano de aula encontrando
certa resistência dos pais e tutores dos estudantes. A argumentação de Antunes (1998) sobre
essa visão pressupõe a dependência de intencionalidade do professor ao propor essa prática,
para que ela discorra de forma pedagógica:

Em geral, o elemento que separa um jogo pedagógico de um outro de caráter apenas


lúdico é que os jogos ou brinquedos pedagógicos são desenvolvidos com a intenção
explícita de provocar uma aprendizagem significativa, estimular a construção de um
novo conhecimento e, principalmente, despertar o desenvolvimento de uma
habilidade operatória.

A partir dessa perspectiva, pode-se incutir que qualquer jogo de tabuleiro


acompanhado de conhecimentos adequados e planejamento assume caráter educativo. Isso
abre um importante nicho a ser explorado, que é da utilização de jogos modernos adaptados
para o ensino de ciências, vislumbrando um cenário no Brasil onde os jogos podem ser
adquiridos e utilizados com finalidades educacionais. Quanto mais elementos houver no jogo
que possam ser adequados à proposta do professor, mais opções o docente pode ter no
momento de realizar a atividade. Também é possível refletir se um jogo de tabuleiro quando
usado como recurso didático pode, de fato, trazer benefícios para além do ensino
convencional. A proposição de métodos de ensino alternativos permite ao professor tomar
13

uma postura diferente do ensino tradicional, onde ele atua não somente como um transmissor
de conhecimento mas sugere práticas que possibilitem o estudante de criar saberes por conta
própria, segundo FREIRE (1996) ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as
possibilidades para a sua produção ou a sua construção. Existe uma formalidade do processo
de pesquisa e documentação de dados, que em suma se resume a escritas discursivas sobre o
tema pesquisado. Ensinar ciências de formas alternativas também é romper com os moldes
científicos, por exemplo, a escrita é uma representação linguística capaz de converter uma
experiência, um fato, uma narrativa em um registro definitivo, tendo suas raízes fortes em
nosso sistema educacional tradicional, se tornando difícil imaginar uma aula que não use a
escrita, nem mesmo como uma ferramenta secundária em processos avaliativos. Skliar (2014)
comenta sobre a escrita acadêmica, que de forma geral se tornou um modelo padronizado
dentro do ensino em diferentes níveis educacionais.

O discutível modelo da escrita acadêmica se instalou vertical e transversalmente no


mundo educativo como se houvesse algum proveito decisivo nisso. Ensaiar, narrar,
ou contar não parecem ser registros amigáveis nos dias atuais.[...] Se não se trata
somente de escrever o que acontece com nossas próprias palavras, teríamos que sair
em busca de outras experiências e de outras palavras.

Aprofundando este pensamento, é possível refletir como algumas ferramentas comuns do


profissional docente são utilizadas sem reflexão crítica, se tornando indispensáveis quando
não é vislumbrado o ensino alternativo. Já os jogos, quando utilizados como ferramentas
necessitam da criticidade em sua proposição, caso contrário, poderão ser vistos como
brincadeira sem fundamentação teórica.
Incorporada sob o nome de Gamificação, a utilização de jogos na educação tem
trazido resultados positivos quanto ao desempenho acadêmico e visa solucionar parcialmente
os problemas da falta de interesse em relação a um determinado assunto tornando a aula
agradável (KIRYAKOVA; ANGELOVA; YORDANOVA, 2014). Pode ser um recurso de
aprendizagem identificando problemas pontuais associados a conceitos científicos, uma vez
que alguns jogos simulam eventos reais, com o objetivo de reforçar um fenômeno ou conceito
através de um ambiente problematizado (WEST, 2015). Carvalho (2013) traz uma reflexão
baseada nos estudos de Vygotsky: a autora afirma que os processos sociais e psicológicos
humanos se firmam através de ferramentas, ou artefatos culturais, que medeiam a interação
entre os indivíduos e entre esses e o mundo físico. Os jogos de tabuleiro modernos também
podem ser incorporados como recursos de aprendizagem através de metodologias de ensino
14

denominadas Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) e Metodologia da


Problematização (MP), onde o estudante tem possibilidade de desenvolver autoaprendizado,
em vez de receber o conhecimento de forma passiva como proposto no ensino tradicional. A
aplicação de jogos de tabuleiro em sala de aula pode ser um importante recurso para o
professor desenvolver habilidade de resolução de problemas com os estudantes (CAMPOS;
BORTOLOTO; FELÍCIO, 2003). Cabe considerar como um mecanismo de observação da
realidade que, embora ficcional, contém elementos da realidade simulada através do jogo e de
seus elementos mecânicos e estéticos. Estudos na área da neurociência indicam que o cérebro
tende a processar informações imaginárias e reais de forma semelhante (REDDAN; WAGER;
SCHILLER, 2018), apoiando a ideia do jogo como um espaço de simulação. Zuanon, Diniz e
Nascimento (2010) indicam que o ensino por meio de jogos facilita dinâmicas cognitivas de
processamento de informações, favorecendo a construção contínua de processos internos de
estruturação de realidades. Este argumento corrobora a construção de um conceito real
utilizando simulações fictícias. Berbel (1998) define a metodologia da problematização da
seguinte forma:
Na Metodologia da Problematização, os problemas são identificados pelos alunos,
pela observação da realidade, na qual as questões de estudo estão acontecendo.
Observada de diferentes ângulos, a realidade manifesta-se para alunos e professores
com suas características e contradições, nos fatos concretos e daí são extraídos os
problemas. A realidade é problematizada pelos alunos. Não há restrições quanto aos
aspectos incluídos na formulação dos problemas, já que são extraídos da realidade
social, dinâmica e complexa.

A resolução de problemas é uma alternativa valiosa no ensino e para Polya (1978) possui
quatro etapas:
1) Compreensão do problema, identificando as partes principais do problema, sob
vários pontos de vista.
2) Estabelecimento de um plano, identificando o caminho a partir de sua própria
experiência.
3) Execução do plano, mantendo bons hábitos mentais e de concentração
4) Retrospecto, onde há uma validação do trajeto feito, analisando a própria resolução
do problema e refletindo criticamente sobre as decisões tomadas.

Uma das teorias da educação que preza pelo desenvolvimento de habilidades


intelectuais através da resolução de problemas é o cognitivismo. Essa corrente teórica teve
15

influência principalmente de Jean Piaget e Jerome Bruner durante a década de 1960. A teoria
cognitivista enfatiza o papel da curiosidade e a possibilidade de aceitar várias formas de
resolver as questões propostas, defendendo ideias que o estudante é um solucionador de
problemas e aprende pela descoberta (KRASILCHIK, 2004). Solucionar problemas é uma
atividade que envolve processos mentais dificilmente observáveis (KRASILCHIK, 2004),
mas que na vida prática é uma habilidade de grande estima.
Jogos de tabuleiro são geralmente jogos coletivos, onde o grupo de jogadores pode ter
visões diferentes do jogo dependendo da sua estratégia individual ou ponto de vista pessoal.
Ao adequá-los para a metodologia da problematização, os problemas identificados pelos
estudantes podem ser ressignificados pelo professor para o contexto da sala de aula. A
utilização deste recurso foi analisada em jogos modernos comerciais com temas pertinentes
para o ensino de ciências e biologia, com elaboração de planos de ensino adequando o uso de
jogos de tabuleiro modernos como uma parte fundamental deste plano alternativo
(DIEDRICH, 2019).
Dentro do grupo de alunos, deve-se sempre considerar as opções de de estudantes que
gostam de jogar, estudantes que não gostam de jogar e estudantes indiferentes à prática
aplicada. O jogo permite a experiência, mas não é a experiência (SCHELL, 2008), o que
significa que cada jogador pode experimentar uma experiência diferente do jogo partindo de
seu entendimento de mundo, de seu contexto social e até do humor no dia em que ele viveu a
experiência. Os jogos de tabuleiro podem auxiliar na compreensão e trazer diversos benefícios
aos estudantes, mas, assim como qualquer outra proposta didática, devem ser utilizados com
cautela. O professor deve ter a responsabilidade de adequar e supervisionar o andamento da
atividade, verificando a existência de alunos desinteressados ou com dificuldades e
adequando a prática ou, em segunda instância, propondo atividades alternativas para aqueles
que não conseguirem se adaptar a esse modelo de ensino.
Partindo dessas premissas, jogar em sala de aula é uma atividade positiva, que
possibilita que os estudantes compreendam melhor o conteúdo, desde que amparada por
objetivos traçados de uma forma adequada. São diversos os benefícios que o ato de jogar
garante, principalmente por infundir o desenvolvimento cognitivo de conhecimentos teóricos
com a promoção de elementos sociais. Diante disso, o próximo tópico abordará sobre como
definir o planejamento para o tema “conservação da biodiversidade”, utilizando documentos
oficiais como referência.
16

3.2 EDUCAÇÃO AMBIENTAL E CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE

Em abril de 2017 foi aprovada a Base Nacional Comum Curricular (BNCC).


Acompanhado da Lei De Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e do Plano
Nacional de Educação (PNE), a BNCC visa trazer de forma mais direta as expectativas da
escola quanto às atividades que os estudantes do ensino fundamental e médio devem
desenvolver durante o período escolar. O documento traz essas expectativas na forma de
competências e habilidades que deverão ser desenvolvidas ao longo dos anos e também
durante o ano letivo. O documento também elenca dez competências gerais que devem ser
desenvolvidas na educação básica (educação infantil, ensino fundamental e ensino médio).
Vale ressaltar que estas competências devem ser desenvolvidas ao longo de todo o ensino
básico, guiando as atividades a englobar sempre que possível alguma destas competências:
1) Valorizar e utilizar os conhecimentos historicamente construídos sobre o mundo
físico, social, cultural e digital para entender e explicar a realidade, continuar aprendendo e
colaborar para a construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva (BNCC, 2017).
2) Exercitar a curiosidade intelectual e recorrer à abordagem própria das ciências,
incluindo a investigação, a reflexão, a análise crítica, a imaginação e a criatividade, para
investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular e resolver problemas e criar soluções
(inclusive tecnológicas) com base nos conhecimentos das diferentes áreas (BNCC, 2017).
3) Valorizar e fruir as diversas manifestações artísticas e culturais, das locais às
mundiais, e também participar de práticas diversificadas da produção artístico-cultural
(BNCC, 2017).
4) Utilizar diferentes linguagens – verbal (oral ou visual-motora, como Libras, e
escrita), corporal, visual, sonora e digital –, bem como conhecimentos das linguagens
artística, matemática e científica, para se expressar e partilhar informações, experiências,
ideias e sentimentos em diferentes contextos e produzir sentidos que levem ao entendimento
mútuo (BNCC, 2017).
5) Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de
forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as
escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos,
17

resolver problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva (BNCC,


2017).
6) Valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais e apropriar-se de
conhecimentos e experiências que lhe possibilitem entender as relações próprias do mundo do
trabalho e fazer escolhas alinhadas ao exercício da cidadania e ao seu projeto de vida, com
liberdade, autonomia, consciência crítica e responsabilidade (BNCC, 2017).
7) Argumentar com base em fatos, dados e informações confiáveis, para formular,
negociar e defender ideias, pontos de vista e decisões comuns que respeitem e promovam os
direitos humanos, a consciência socioambiental e o consumo responsável em âmbito local,
regional e global, com posicionamento ético em relação ao cuidado de si mesmo, dos outros e
do planeta (BNCC, 2017).
8) Conhecer-se, apreciar-se e cuidar de sua saúde física e emocional,
compreendendo-se na diversidade humana e reconhecendo suas emoções e as dos outros, com
autocrítica e capacidade para lidar com elas (BNCC, 2017).
9) Exercitar a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação, fazendo-se
respeitar e promovendo o respeito ao outro e aos direitos humanos, com acolhimento e
valorização da diversidade de indivíduos e de grupos sociais, seus saberes, identidades,
culturas e potencialidades, sem preconceitos de qualquer natureza (BNCC, 2017).
10) Agir pessoal e coletivamente com autonomia, responsabilidade, flexibilidade,
resiliência e determinação, tomando decisões com base em princípios éticos, democráticos,
inclusivos, sustentáveis e solidários (BNCC, 2017).
Destas competências gerais, a proposta deste trabalho permite desenvolver as
competências de número 1, 2, 4, 5, 6, 7, 9 e 10. Dentro da unidade temática de “vida e
evolução” sugeridas pela BNCC, o objeto de conhecimento denominado “conservação da
biodiversidade” aparece como uma proposição recomendada para estudantes do 9º ano do
ensino fundamental. Duas das habilidades que o professor deve promover em sala de aula são
a EF09CI12 e a EF09CI13:

(EF09CI12) Justificar a importância das unidades de conservação para a preservação


da biodiversidade e do patrimônio nacional, considerando os diferentes tipos de
unidades (parques, reservas e florestas nacionais), as populações humanas e as
atividades a eles relacionados. (EF09CI13) Propor iniciativas individuais e coletivas
para a solução de problemas ambientais da cidade ou da comunidade, com base na
análise de ações de consumo consciente e de sustentabilidade bem-sucedidas.
18

Estas habilidades são relevantes para os estudantes, visto que os ecossistemas estão
sofrendo mudanças rápidas em seus processos ambientais, socioeconômicos e demográficos
(EDELMAN, 2014). Estes processos ambientais são influenciados diretamente por ações
antrópicas, como destruição, fragmentação ou distúrbio do habitat; exaustão dos recursos;
alteração dos regimes de incêndio; modificação no regime de águas e contaminação
(BRANDON, 2005). O Brasil é um país de extensão continental, grande parte do seu
território permanece dentro da zona tropical, concentrando a maior parte da sua
biodiversidade. Em uma pesquisa simples no documento da BNCC, o conjunto de palavras
[educação ambiental] é citada apenas 4 vezes, sendo uma delas no texto e as outras 3 em
referências. A citação no texto é uma referência a documentos legislativos como a Lei nº
9.795/1999, o Parecer CNE/CP nº 14/2012 e a Resolução CNE/CP nº 2/201218, que abordam
sobre a educação ambiental.
A educação ambiental é uma ferramenta importante para conscientização e
sensibilização de estudantes, à medida que discute os impactos socioambientais do ser
humano no ambiente. Existem correntes de pensamento que assumem que grande parte da
crise ambiental que vivemos são distantes do cidadão comum, que as pequenas ações pouco
influenciam no contexto geral do planeta, ao contrário do que vemos no discurso do Capital,
não é apenas o consumo individual que possibilita a crise ambiental, mas sim a própria
existência do capital (PEDRUZZI et. al., 2015). Isso não significa que ações individuais e de
projetos não tenham impacto, mas exigem aprofundamento um pouco mais a percepção de
que existe uma infinidade de questões amplas que regem a atual crise ambiental como fatores
sociais, econômicos e, principalmente políticos (LISBOA J., PODEWILS T., PEDRUZZI, A.,
2018). Pedruzzi et. al. (2015) comentam sobre aspectos de uma educação ambiental crítica:

[...] O objetivo principal da Educação Ambiental Crítica é proporcionar ao


educando uma visão não fragmentada da realidade, focando, principalmente, na
complexidade das relações envolvidas em todo o problema, sejam elas sociais,
econômicos ou políticas, ou seja, ir além e, saindo do senso - comum, chegar até a
origem da crise ambiental atual para, a partir desta reflexão, propor
alternativas que visem transformar a realidade ao invés de apenas mascarar o
problema.

É importante considerar o ser humano como integrante do meio ambiente, como uma
peça capaz de atuar tanto de forma positiva como de forma negativa. Visualizar o ser humano
como causador de destruição no ambiente, mas também discutir como essa mesma espécie é
19

capaz de remediar esta destruição, através das ferramentas certas. A capacidade de


compreender e buscar soluções para os problemas ambientais precisam estar atreladas às
necessidades humanas, e esta produção de conhecimento deve necessariamente contemplar as
inter-relações do meio natural com o social (JACOBI, 1998). O desenvolvimento de práticas
de educação ambiental por professores de ciências deve levar em consideração a conservação
do meio ambiente atrelado a fatores socioculturais. Segundo Oliveira (2007) para muitos
professores, educar para o meio ambiente diz respeito apenas à conservação da natureza,
deixando as questões culturais, sociais, econômicas, políticas e históricas, inerentes a essa
temática, à margem das discussões. Para garantir um ensino integralizado, cabe aos
professores de ciências tomarem posturas diferentes ao promover práticas que discutam
questões ambientais, buscando sempre inserir-se de forma crítica dentro do contexto social
dos estudantes, da comunidade ou da localidade onde a instituição de ensino se encontra. No
ensino de ciências, é importante estar conectado à realidade do estudante, caso contrário, esta
mesma ciência se tornará irrelevante e elitista.

A ciência se converte em cientificismo quando esquecemos de seus condicionantes


sociais, econômicos ou políticos, ou quando não percebemos que suas fórmulas
podem servir não para promover o bem-estar social, mas para aprofundar as
desigualdades entre pessoas, grupos ou nações (DAMKE, 1995 apud TEIXEIRA,
2003).

Ao discutir sobre conservação da biodiversidade devemos destacar dois tipos de


danos que são decorrentes de ações antrópicas e possuem elevada agressividade à fauna, flora
e funga: a biopirataria e o tráfico de animais silvestres.

A biopirataria é a atividade que envolve o acesso aos recursos genéticos de um


determinado país ou aos conhecimentos tradicionais associados a tais recursos
genéticos (ou a ambos) sem o respeito aos princípios da Conversão da
Biodiversidade, isto é, sem autorização do país de origem e de suas comunidades
locais e a repartição de benefícios. A Convenção da Biodiversidade estabelece que
os benefícios gerados pela utilização dos recursos genéticos coletados nos países
megadiversos devem ser compartilhados com estes e com as comunidades locais
detentoras de conhecimentos associados a estes (SANTILLI, J. 2005, apud GOMES,
R. 2007, p. 3).
A biopirataria atinge três esferas principais: Cultural, quando há uma apropriação das
riquezas culturais de povos indígenas e populações tradicionais; Ambiental, quando existe
uma apropriação das espécies existentes em território nacional, seja através de tráfico ou
mesmo de extração da informações genéticas; e econômico, visto que algumas espécies são
20

estudadas, patenteadas e comercializadas como produtos estrangeiros, retirando recursos


financeiros que poderiam fomentar pesquisa, tecnologia e desenvolvimento industrial,
utilizando essas mesmas espécies pirateadas (REZENDE, E., RIBEIRO M., 2005).
A biopirataria representa muitos riscos a países de elevada diversidade biológica,
como o Brasil. Há um grande interesse internacional em realizar pesquisas em espécies
nativas, principalmente em busca de novos fármacos e fitoterápicos, usando princípios ativos
oriundos das espécies do Brasil. Algumas espécies são procuradas para extração de princípios
ativos, como espécies vegetais e artrópodes. Entretanto, existem diversas espécies de
vertebrados que são de interesse para a indústria farmacêutica, como aquelas que produzem
químicos específicos para defesa contra predadores, como sapos e cobras. Já outros grupos de
vertebrados como aves e mamíferos são explorados pela sua beleza estética e excentricidade,
sofrendo principalmente pelo tráfico.
O tráfico de animais silvestres é uma atividade ilegal altamente rentável, que consiste
na captura e venda da fauna local para outros países. Esta atividade é extremamente danosa à
fauna local, além do risco iminente de tornar uma espécie invasora caso ela seja liberada em
ambiente selvagem no país de destino. O tráfico também facilita a introdução de espécies em
novas regiões, gerando competição por recursos com espécies nativas, alterações
ecossistêmicas e destruição de lavouras e plantações (SMITH, 2009). Os riscos também se
expandem para fins de saúde pública, principalmente por estes animais adicionaram uma
carga de vírus, bactérias e parasitas potencialmente patogênicos, existindo também uma
grande preocupação com a introdução de patógenos que representam ameaça para a saúde
pública, agricultura e biodiversidade (SMITH, 2009). Além do dano à saúde, econômico e
ecossistêmico, também é necessário pensar em questões de bem-estar animal, visto que
durante o tráfico causa grande sofrimento no comércio e deslocamento destes indivíduos.
Estas espécies comercializadas geralmente são transportadas em situações de grande estresse,
com pouco espaço, sem água e alimento, resultando em um elevado índice de mortandade
(RENCTAS, 2002). Diante disso, no próximo tópico serão abordados os potenciais elementos
presentes no jogo Wingspan que podem ser aliados ao discutir sobre questões de conservação
da biodiversidade, com ênfase no grupo das aves.
21

3.3 MECÂNICA, ESTÉTICA E POTENCIALIDADES DE WINGSPAN

Desenvolvedores de jogos necessitam pensar em diversos aspectos quando começam a


criar um jogo novo. Tanto jogos de tabuleiro como jogos digitais possuem elementos em
comum que precisam ser trabalhados com cautela para resultar em um jogo de qualidade. De
acordo com Schell (2008) existem quatro elementos que devem estar inerentemente
conectados quando um jogo é desenvolvido, também conhecido com pirâmide elementar de
Schell:
1 Mecânicas: São as regras do jogos, elas descrevem os objetivos, o que pode e
não pode ser feito e como os jogadores podem tentar alcançar estes objetivos e
o que acontece quando eles tentam.
2 Estória: É definido como a sequência de eventos de seu jogo, qual história que
ele conta ou quais eventos aconteceram antes do jogo iniciar. Assim como
qualquer contador de histórias, deve-se escolher elementos estéticos que
ajudem a reforçar ideias da história e quais tecnologias são mais adequadas às
particularidades da história.
3 Estética: São as impressões sensoriais que o jogo produz, podem ser visual,
sonora, tátil, aliado a estória, pode surtir grande impacto no jogador. Possui um
grande potencial de imersão, ao permitir que o jogador visualize o espaço
imaginário onde ele está inserido. Geralmente é o elemento mais visível em
um jogo.
4 Tecnologia: É definido pelos materiais e interações que compõem o jogo,
como lápis, caneta, peças plásticas, tabuleiro, cartas. A escolha de certos
materiais podem abrir possibilidade para diferentes estéticas e mecânicas. Este
elemento geralmente é o menos visível.
22

Figura 1 - Pirâmide Elementar de Schell.

Fonte: Schell (2008)

Estes elementos podem estar mais ou menos presentes dentro de diferentes jogos e são
caracterizados entre elementos mais visíveis e menos visíveis. É importante entender que
esses quatro elementos são essenciais em qualquer jogo, e nenhum é mais importante que o
outro (SCHELL, 2008).
Wingspan é um jogo inspirado em atrair pássaros para sua reserva de animais
silvestres, feito através das cartas de aves. West (2019) comenta sobre o jogo como uma
ferramenta de reflexão sobre a biodiversidade e zoologia:

Você não está, contudo, apenas atraindo pássaros para ganhar pontos. Você está
efetivamente construindo um motor da biodiversidade. É um desafio, uma aula de
biologia e uma diversão de roer as unhas. [...] Esse é um jogo para pensar e
estratégico com muitas partes interligadas. (West, 2019, tradução do autor)

Como um jogo casual Wingspan possui três grandes potencialidades a serem


exploradas, mecânicas, estéticas e de estória. O conjunto de mecânicas deste jogo possui
elementos bastante diferentes de outros jogos: o jogador possui pontos de ação e na sua
rodada ele pode fazer até 8 ações diferentes em seu turno, entre baixar cartas, colocar ovos e
estocar comida. Algumas cartas interagem com outras mecânicas, como por exemplo, cartas
23

que botam um ovo em outra carta de ave (Figura 2). Outras cartas interagem com o ambiente
inteiro, podendo dar vantagens para o próprio jogador e também para os outros jogadores da
mesa (Figura 3). Há ainda algumas cartas que têm algum efeito específico quando outro
jogador faz determinado tipo de ação, durante o turno ou uma vez entre os turnos, geralmente
estes poderes vão de acordo com a biologia das espécies (WEST, 2019)(Figura 4). Além
disso, existem outras duas formas de ganhar pontos: através dos objetivos globais, onde ao
final das 4 rodadas o jogador que tiver cumprido o objetivo receberá pontuação adicional
(Figura 5), e através das cartas bônus, onde cada jogador recebe uma como um objetivo
individual a cumprir durante a partida. (Figura 6)
Partindo para uma análise estética, o jogo é visualmente lindo, obviamente um
trabalho feito com amor (WEST, 2019). Existe um grande apelo visual aos elementos que
compõem o jogo, suas cartas permitem uma fácil visualização das aves que estão ali
apresentadas, com representações imagéticas ilustradas e coloridas, com alto detalhismo na
impressão (Figura 7). Além disso, as peças de ovos garantem uma imersão maior do jogador
ao visualizar essas estruturas em forma de miniaturas plásticas (Figura 8). O jogo também
possui uma torre de dados em forma de comedouro de pássaros, ampliando a imersão diante
da estética tridimensional (Figura 9). Dados e peças de comida também são customizados,
feitos com material resistente e colorido (Figura 10). Os tabuleiros individuais também são
ilustrados representando os três habitats possíveis para as aves do jogo, florestas, campos e
pântanos (Figura 11).
A biologia dos animais é bastante explorada dentro do jogo, e, partindo do conceito da
Tétrade Elementar de Schell, algumas características apresentadas nas cartas se encaixam
como elemento integrante da estória. Todas as cartas de ave possuem uma breve curiosidade
na parte inferior, geralmente contando algum fato sobre hábitos particulares deste animal.
Podemos também verificar outras informações relevantes sobre zoologia e comportamento,
como por exemplo a envergadura das asas, habitat, distribuição geográfica, tipo de nidificação
e a dieta do animal. As cartas de objetivos também auxiliam promovendo uma narrativa para
o jogo, pois permitem a interação com as aves a partir de uma profissão ou função social,
como por exemplo a carta “gerente de pesca” dá mais pontos conforme você tenha mais aves
que comem peixes ou também a carta “historiador” que garante pontos no fim do jogo se você
tiver aves que contenham nomes de pessoas.
24

Figura 2 - Carta que adiciona 1 ovo em outra

Fonte: elaborado pelo autor


25

Figura 3 - Carta que interage com todos os jogadores.

Fonte: elaborado pelo autor


26

Figura 4 - Carta que ativa apenas uma vez entre turnos.

Fonte: elaborado pelo autor


27

Figura 5 - Carta de objetivos coletivos.

Fonte: elaborado pelo autor


28

Figura 6 - Carta de objetivos individuais.

Fonte: elaborado pelo autor


29

Figura 7 - Cartas mostrando a ilustração com alto detalhismo e rica em cores.

Fonte: elaborado pelo autor


30

Figura 8 - Representações de ovos de pássaros em material plástico.

Fonte: elaborado pelo autor


31

Figura 9 - Torre de dados e dados de comida.

Fonte: elaborado pelo autor


32

Figura 10 - Peças de comida em material resistente.

Fonte: elaborado pelo autor


33

Figura 11 - Tabuleiro do jogo.

Fonte: elaborado pelo autor

O jogo também possui partidas relativamente rápidas quando comparado com outros
jogos de tabuleiro modernos. Cada ação dura em torno de 30 segundos, e pode ser planejada
enquanto outros jogadores fazem seu turno. O tempo total de jogo é curto, as informações
contidas na caixa mostram que uma partida dura em média entre 40 a 70 minutos. Apesar de
possuir algumas regras bastante específicas, o jogo não é complexo de aprender, entretanto, o
manual tem organização confusa e explicação prolongada. Todas estas características
permitem que esse jogo seja adequado para ser adaptado em sala de aula. Diante disso, foi
elaborada uma sequência didática viabilizando o uso deste jogo como uma ferramenta auxiliar
para discutir sobre conservação da biodiversidade, em especial, sobre o grupo das aves.
34

4 PROPOSTA DIDÁTICA

Seguindo os objetivos metodológicos propostos, o presente trabalho buscou


desenvolver uma sequência didática a ser aplicada para estudantes do 9º ano do ensino
fundamental. Para a realização desta sequência didática, é necessário a utilização de seis
blocos de aula, levando em conta todo o processo de jogar, pesquisar, e avaliar. Também é
fundamental levar em consideração que essa sequência didática é baseada na metodologia da
problematização, ou seja, ela segue as etapas metodológicas adaptando alguns pontos para a
realidade simulada do jogo, também conhecida como Método do Arco (Figura 12) ou Arco de
Maguerez (BORDENAVE; PEREIRA, 1991), os cinco pontos do método são:
1 Observação da realidade, onde os alunos analisam a situação-alvo, esta
observação permitirá aos alunos identificar dificuldades, carências,
discrepâncias, de várias ordens, que serão transformadas em problemas, ou
seja, serão problematizadas (BERBEL, 1998);
2 Pontos-chave, a partir das informações coletadas, o estudante levanta as
possíveis causas desse problema e elenca os principais pontos que deverão ser
estudados mais a fundo;
3 Teorização, momento em que os estudantes buscam informações mais
específicas sobre o tema, analisando e pesquisando em diversos meios cada
ponto elencado anteriormente;
4 Hipóteses de solução, o estudo realizado deverá fornecer elementos para os
alunos, crítica e criativamente, elaborarem as possíveis soluções. O que precisa
acontecer para que o problema seja solucionado? O que precisa ser
providenciado? O que pode realmente ser feito? (BERBEL, 1998);
5 Aplicação à realidade, momento final, onde as respostas encontradas durante
todo o percurso são de fatos aplicadas ou encaminhadas, retornando para a
sociedade uma solução do problema levantado no início da problematização.
35

Figura 12 - Representação do Método do Arco ou Arco de Maguerez.

Fonte: Aprendizagem Ativa na Educação em Saúde: Percurso Histórico


e Aplicações

Para a aplicação desta metodologia, foram utilizadas algumas características


padronizadas, que podem sofrer adaptações de acordo com a escola a ser aplicada, são elas:
1) O tempo de cada bloco de aula será de 45 minutos;
2) As escolas contam com pelo menos 6 caixas do jogo Wingspan e/ou várias cópias
do jogo digital, disponível na plataforma Steam ou Tabletopia;
3) O momento do jogo necessariamente precisa contar com um bloco de duas aulas
seguidas.
4) Todos os estudantes têm acesso a computador com internet, mesmo que, no espaço
da escola, para realização de uma pesquisa.

4.1 PRIMEIRA E SEGUNDA AULA: O JOGO

Na primeira e segunda aula, o professor aplicará o jogo para os estudantes. Existem


diversos guias online e vídeos que podem auxiliar o professor com uma explicação mais
36

sucinta das regras, estima-se que a duração da explicação de regras dure em torno de 20
minutos. Em seguida, o professor deve montar grupos contendo no máximo 5 estudantes por
grupo, e iniciar o jogo distribuindo igualmente as peças e tabuleiros para todos. Nesta etapa, o
professor deve monitorar o andamento da atividade, prestando auxílio aos estudantes com as
regras da dinâmica.
Para levantar questionamentos sobre a conservação ambiental e retirada de aves dos
ecossistemas, ao final da rodada 2 o professor deverá remover aleatoriamente uma das cartas
dos tabuleiros de cada um dos estudantes. A remoção pode ou não afetar a estratégia dos
estudantes e afetar na sua pontuação final, promovendo uma reflexão a partir do lúdico sobre
como a extinção local de algumas espécies pode afetar também todo o ecossistema,
interferindo também em outras espécies.
Durante a atividade, o docente também deve levantar algumas questões que devem
ser respondidas durante o momento do jogo, estas questões guiarão os estudantes a uma
reflexão a partir da observação da realidade, atendendo ao primeiro ponto do arco de
maguerez. Estas questões também estão disponíveis no apêndice 1:
1) As fichas de comida são limitadas, o que acontece se eu inserir muitas aves que
comem o mesmo tipo de alimento?
2) Qual curiosidade das aves mais te chamou atenção?
3) Por que existe nome científico e nome popular nas cartas? Escolha uma ave e anote
seu nome científico no caderno.
4) O que aconteceu quando uma das aves foi retirada? Modificou sua estratégia?
Como isso poderia acontecer na vida real?

4.2 TERCEIRA AULA: BRAINSTORM

Na terceira aula, a condução inicial se dará a partir de um brainstorm, atividade em


que o grupo levanta ideias diversas para solucionar um problema em comum, nela, o
professor utilizará o quadro para elencar os pontos-chave que foram entendidos pelos
estudantes na aula-jogo. Este momento é um momento coletivo, onde todos estudantes e
professor compartilham ideias de forma horizontal. Reunir estes pontos-chave permite que
outros estudantes de fora daquele grupo inicial possam perceber as reflexões e conclusões de
outros grupos. É importante o professor guiar a atividade conforme estas palavras aparecem
37

conectando com o tema de conservação da biodiversidade, também esperando que surjam


palavras que não estejam dentro do tema.
Ainda nesta aula, o professor deve utilizar os últimos 15 minutos para propor uma
pesquisa para os estudantes, que deverá ser realizada em um momento extraclasse para serem
trazidas respondidas na próxima aula, de forma a prepará-los para a próxima aula de
teorização. As questões que devem ser pesquisadas são:
1) O que é o tráfico de animais silvestres?
2) O que é a biopirataria?
3) Na aula passada você anotou o nome científico de uma ave no seu caderno,
pesquise se ela está ameaçada. Escolha também 2 aves no guia de identificação
de aves traficadas e informe: Nome popular; nome da espécie; distribuição
geográfica; tamanho da ave; principais características.

4.3 QUARTA E QUINTA AULA: TEORIZAÇÃO E HIPÓTESES

A aula de teorização é o mais próximo de uma aula convencional dentro da


sequência didática. Aqui o professor deve elaborar uma aula baseada nas respostas elencadas
pelos estudantes no brainstorm, inclusive, mostrando-os novamente os pontos-chave que
foram levantados na aula anterior. Nesta aula de teorização o repertório teórico do professor
pode variar conforme os elementos apontados pelos estudantes, aqui é imprescindível
trabalhar com criatividade e adaptatividade, mas alguns elementos são fundamentais de serem
discutidos independente dos temas levantados pelos estudantes:
1) Comércio de animais exóticos
2) Dados sobre tráfico de animais silvestres
3) Legislação brasileira sobre este tema
Como material auxiliar para conduzir a aula, o professor pode utilizar os livros
gratuitos “Guia de identificação de aves traficadas no Brasil (COSTA et. al., 2016)” e
“Ciência contra o tráfico: Avanços no Combate ao Comércio Ilegal de Animais Silvestres
(COSTA et. al., 2017)”
Nos últimos 15 minutos para o final da aula, o professor deve conduzir os estudantes
a levantar hipóteses para solucionar este problema. Algumas alternativas podem ser propostas
pelo professor, mas não devem ser utilizadas como regra, pois o fundamental é que os
38

estudantes consigam exercer a criatividade e pensamento crítico de forma autônoma, alguns


exemplos são: fundação de uma reserva ecológica, encaminhamento de uma carta a algum
deputado propondo alguma lei ou criação de material para divulgação e conscientização. Cada
grupo deverá escolher uma das alternativas elencadas e deverá produzir algum material fora
do período de aula, que deverá ser apresentado na aula seguinte. O ideal é que cada grupo
produza uma proposta diferente, mas não é uma regra, o professor deve auxiliar para que este
produto final da pesquisa seja o mais diversificado possível entre os grupos, por exemplo, se
algum grupo desejar tratar sobre legislação pode trazer uma alteração para as leis já
existentes, ou então propor uma nova lei e apresentar o documento escrito.
O objetivo da apresentação final não é discutir ou apresentar novamente o que foi
discutido nas aulas de teorização, como tráfico de animais ou biopirataria, mas sim mostrar
alternativas concretas para solucionar o problema.

4.4 SEXTA AULA: APLICAÇÃO À REALIDADE

Na última aula da sequência, os grupos dos estudantes terão até 5 minutos para
apresentar o material desenvolvido, podendo apresentar de forma escrita, oral, apresentação
de slides ou de outras formas que o estudante julgar necessário. É importante que além da
avaliação do professor, os demais estudantes também opinem sobre a proposta apresentada
pelos outros grupos, criando um ambiente de debate e promovendo sugestões de como tornar
a proposta melhor.

4.5 AVALIAÇÃO

O processo avaliativo acontecerá em três etapas, cada uma valendo 33% da nota: a
primeira avaliação acontece no momento do jogo, verificando se os estudantes estão
interagindo entre si e criando um ambiente amistoso, competitivo, sabendo lidar com derrota
e frustração. Essa avaliação pode ser bastante subjetiva, mas para ter um ponto de partida é
interessante avaliar se eles discutem o funcionamento das regras, se eles estão prestando
atenção no próprio tabuleiro e se tentam responder as questões conforme jogam. O foco desta
avaliação é o GRUPO.
39

O segundo momento avaliativo é durante a apresentação final do projeto construído


pelos estudantes. A avaliação do professor será feita ao GRUPO através dos seguintes
critérios avaliativos:
1) Criatividade da proposta
2) Desenvolvimento da proposta
3) Apresentação da proposta
4) Aplicabilidade
O terceiro momento avaliativo é ao final da apresentação, onde nos últimos 10
minutos os estudantes deverão realizar uma autoavaliação do seu processo de aprendizagem
individual e da dinâmica do professor. Os estudantes devem responder às seguintes questões
de forma INDIVIDUAL:
1) O que você aprendeu sobre o tema?
2) Como você avalia seu desempenho nesta atividade? Como poderia ser melhor?
3) Como você avalia o desempenho do seu grupo? Como poderia ser melhor?
4) Você gostou da atividade? o que sugere para melhorar?
Avaliar em etapas distintas permite que a importância da nota não fique concentrada
somente no desempenho final, é importante avaliar a trajetória percorrida pelo estudante até
que ele chegue ao seu destino final. Desta forma passamos a atuar de fato como avaliadores, e
não meramente examinadores (LUCKESI, 2005), exercendo uma análise do estudante desde o
primeiro momento do jogo até a resolução da situação problema. Também se faz importante o
objeto da autoavaliação, Luckesi (2005) afirma que a autoavaliação é fundamental para que os
sujeitos tenham autocrítica sobre suas ações. Avaliar a atividade do professor e do grupo
também são atitudes importantes, visto que é um momento dos estudantes desabafarem sobre
as expectativas que eles têm com a atividade, com o tema, com os colegas, com o professor, e
com a disciplina de ciências.

4.6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apesar de todos os momentos estarem bem demarcados, é fundamental que o


professor exerça autonomia para modificar os parâmetros da atividade de acordo com sua
realidade. O número de estudantes, de caixas do jogo disponíveis e tempo de aula podem
limitar a atividade docente, alterando as diretrizes da atividade. Sabendo que a realidade de
40

várias escolas brasileiras não contempla financeiramente a aquisição de jogos físicos, uma das
opções possíveis para a escola é adquirir diversas cópias do jogo através de plataformas
digitais. Quanto ao tempo, é possível também dialogar com outros professores a troca de
horários, prática comum no cotidiano docente.
41

5 CONCLUSÃO

O aspecto multidisciplinar da educação ambiental é um dos pontos-chave para o bom


andamento desta atividade. Tanto jogos de tabuleiro como educação ambiental trabalham com
diversos aspectos para além do conhecimento teórico. Questões sociais, culturais e políticas se
fundem com o lúdico, ao passo que discutem sobre medidas para conservação ambiental que
levem em consideração fatores ambientais e sociais.
A pesquisa realizada neste trabalho foi fundamentada partindo da hipótese inicial de
que jogos são benéficos para o ensino. Foram realizadas diversas buscas na literatura, que
foram fundamentais para o embasamento dessa hipótese, reunindo dados bastante robustos e
em diversas esferas do conhecimento que reforçam seus benefícios. O jogo de tabuleiro como
ferramenta didática contribui para desenvolvimento de características que vão além do
conhecimento específico, permitindo uma aprendizagem que desenvolve mutuamente
processos sociais e psicológicos. Foram trazidos dados de diversos autores que apontam que
jogos são benéficos para a retenção e engajamento, para resolução de problemas, para
desenvolvimento cognitivo, para ampliação das relações sociais e como forma de lidar com as
emoções.
Ao pensar em trabalhar com jogos de tabuleiro, Wingspan foi um dos primeiros
nomes que surgiram quando foi decidido abordar conservação ambiental. Os componentes
estéticos do jogo são um dos primeiros elementos que impactam a primeira vista, em seguida,
a mecânica fácil do jogo torna uma experiência prazerosa para quem joga, ao mesmo tempo
que a estratégia também pode provocar desafios. Por esses motivos, o jogo foi escolhido
como uma ferramenta em potencial para trabalhar essa temática. Ainda assim, Wingspan é um
jogo que pode ser utilizado em diversos contextos para além do ensino de conservação e
educação ambiental. Por se tratar de uma ferramenta que aborda interações de aves com o
ambiente, ela também pode ser utilizada para outros anos, como por exemplo para o ensino de
zoologia.
A sequência didática proposta teve embasamento na aprendizagem baseada em
problemas, visto que a metodologia faz um bom uso da realidade simulada do jogo como uma
forma pensar na própria realidade. No momento do jogo, a retirada de uma das cartas é um
estímulo para que os estudantes desenvolvam uma nova estratégia a partir da retirada de uma
carta que pode ser a chave do seu jogo. Também é importante que esse movimento simule a
42

retirada de um animal da natureza, promovendo o pensamento sobre a consequência das


extinções, que é uma das maiores ameaças do tráfico de animais silvestres. A prática de
elaborar um projeto também é algo que estimula a criatividade dos estudantes, ao mesmo
tempo que os faz pensar em soluções práticas para a solução de problemas reais, mesmo que
eles tenham partido de uma situação fictícia promovida pelo jogo.
A descentralização das avaliações também é um fator crucial nessa proposta. Retirar
o peso de uma única avaliação final que decreta o quanto os estudantes memorizam o
conteúdo não interessa nesse tipo de atividade. As habilidades sociais trabalhadas não são
cabíveis de avaliação diante de um teste escrito. Também é importante que avaliar de forma
contínua permite analisar toda a trajetória do estudante desde o primeiro contato com o jogo
até o projeto final desenvolvido por eles. A autoavaliação também é um ponto importante, já
que ao mesmo tempo que o estudante avalia a si mesmo, ele consegue se perceber como uma
pessoa protagonista no seu desenvolvimento, indo de acordo com o princípio das
metodologias ativas, que é colocar o aluno no centro do seu processo de aprendizagem. A
autoavaliação também permite que o estudante possa repensar sua participação na aula, pensar
em estratégias futuras para ser mais proativo, e também apontar falhas no seu próprio
processo de aprendizagem, que podem ser identificadas e reestruturadas pelo professor.
Avaliar a atividade também é um componente importante, pois é a devolutiva dos estudantes
após a aplicação da sequência, servindo para guiar o professor na aplicação dessa prática em
momentos futuros.
Por fim, é sempre importante pensarmos criticamente a atuação docente, garantindo
que nossas decisões tenham embasamento teórico e objetivos claros, lembrando que o
professor não é uma figura meramente transmissora de informações, mas sim um formador de
indivíduos com pensamento crítico. Devemos pensar em cada vez mais utilizar metodologias
ativas e criar momentos lúdicos, pensando no ensino não como conhecimentos segmentados e
desconexos, mas sim como um movimento inclusivo, onde o aluno/jogador é o a figura
central na construção do seu próprio saber.
43

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um recurso para integração dos alunos à prática docente. Revista Brasileira de Ensino de
Ciência e Tecnologia, v. 3, n. 3, 2011.
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APÊNDICE

SEQUÊNCIA DIDÁTICA

HORAS/AULA: 6 AULAS - 270 MINUTOS

NOME DO PROFESSOR (A):

TEMA: CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE

PÚBLICO-ALVO: 9º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL

DESCRIÇÃO DA PROPOSTA

Esta sequência didática busca trabalhar fundamentos de conservação ambiental com


estudantes do 9º ano do ensino fundamental a partir do jogo Wingspan. As propriedades
lúdicas de jogar tornam a prática leve e estimulante, ao passo que aborda questões ambientais,
sociais e culturais do tema.

Esta sequência visa desenvolver as habilidades EF09CI12 e a EF09CI13 da BNCC.

OBJETIVOS

Durante o desenvolvimento da sequência didática, o estudante deve ser capaz de:

a) jogar e socializar com outros estudantes;

b) realizar reflexões em conjunto sobre o tema proposto;

c) produzir um material informativo sobre conservação da biodiversidade;

d) apresentar seu projeto final;

e) avaliar os objetos propostos pelo professor.

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO
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1 – Apresentação da proposta e início da aula jogo.

2 – Continuação e término da aula jogo. Proposição de questões durante a atividade.

3 – Brainstorm. Proposição de questões para pesquisa fora do período de aula

4 – Fundamentação teórica.

5 – Fundamentação teórica. Proposição de hipóteses para solucionar o problema.

6 – Apresentação do projeto final. Avaliação.

METODOLOGIA

Para esta atividade foi utilizada a Aprendizagem baseada em problemas.

AULA CONTEÚDO

AULA 1 e 2 -

Na primeira e segunda aula, o professor aplicará o jogo para os estudantes. Existem


diversos guias online e vídeos que podem auxiliar o professor com uma explicação mais
sucinta das regras, sendo ideal utilizar o guia disponível na bibliografia complementar ao final
deste documento. Estima-se que a duração da explicação de regras dure em torno de 20
minutos. Em seguida, o professor deve montar grupos contendo no máximo 5 estudantes por
grupo, e iniciar o jogo distribuindo igualmente as peças e tabuleiros para todos. Nesta etapa, o
professor deve monitorar o andamento da atividade, prestando auxílio aos estudantes com as
regras da dinâmica.

Para levantar questionamentos sobre a conservação ambiental e retirada de aves dos


ecossistemas, ao final da rodada 2 o professor deverá remover aleatoriamente uma das cartas
dos tabuleiros de cada um dos estudantes. A remoção pode ou não afetar a estratégia dos
estudantes e afetar na sua pontuação final, promovendo uma reflexão a partir do lúdico sobre
como a extinção local de algumas espécies pode afetar também todo o ecossistema,
interferindo também em outras espécies.
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Durante a atividade, o docente também deve levantar algumas questões que devem
ser respondidas durante o momento do jogo, estas questões guiarão os estudantes a uma
reflexão a partir da observação da realidade, atendendo ao primeiro ponto do arco de
maguerez.
1) As fichas de comida são limitadas, o que acontece se eu inserir muitas aves que
comem o mesmo tipo de alimento?
2) Qual curiosidade das aves mais te chamou atenção?
3) Por que existe nome científico e nome popular nas cartas? Escolha uma ave e anote
seu nome científico no caderno.
4) O que aconteceu quando uma das aves foi retirada? Modificou sua estratégia?
Como isso poderia acontecer na vida real?

AULA 4 e 5

A aula de teorização é o mais próximo de uma aula convencional dentro da


sequência didática. Aqui o professor deve elaborar uma aula baseada nas respostas elencadas
pelos estudantes no brainstorm, inclusive, mostrando-os novamente os pontos-chave que
foram levantados na aula anterior. Nesta aula de teorização o repertório teórico do professor
pode variar conforme os elementos apontados pelos estudantes, aqui é imprescindível
trabalhar com criatividade e adaptatividade, mas alguns elementos são fundamentais de serem
discutidos independente dos temas levantados pelos estudantes:
1) Comércio de animais exóticos
2) Dados sobre tráfico de animais silvestres
3) Legislação brasileira sobre este tema
Como material auxiliar para conduzir a aula, o professor pode utilizar os livros
gratuitos “Guia de identificação de aves traficadas no Brasil (COSTA et. al., 2016)” e
“Ciência contra o tráfico: Avanços no Combate ao Comércio Ilegal de Animais Silvestres
(COSTA et. al., 2017)”
Nos últimos 15 minutos para o final da aula, o professor deve conduzir os estudantes
a levantar hipóteses para solucionar este problema. Algumas alternativas podem ser propostas
pelo professor, mas não devem ser utilizadas como regra, pois o fundamental é que os
estudantes consigam exercer a criatividade e pensamento crítico de forma autônoma, alguns
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exemplos são: fundação de uma reserva ecológica, encaminhamento de uma carta a algum
deputado propondo alguma lei ou criação de material para divulgação e conscientização. Cada
grupo deverá escolher uma das alternativas elencadas e deverá produzir algum material fora
do período de aula, que deverá ser apresentado na aula seguinte. O ideal é que cada grupo
produza uma proposta diferente, mas não é uma regra, o professor deve auxiliar para que este
produto final da pesquisa seja o mais diversificado possível entre os grupos, por exemplo, se
algum grupo desejar tratar sobre legislação pode trazer uma alteração para as leis já
existentes, ou então propor uma nova lei e apresentar o documento escrito.
O objetivo da apresentação final não é discutir ou apresentar novamente o que foi
discutido nas aulas de teorização, como tráfico de animais ou biopirataria, mas sim mostrar
alternativas concretas para solucionar o problema.

AULA 6

Na última aula da sequência, os grupos dos estudantes terão até 5 minutos para
apresentar o material desenvolvido, podendo apresentar de forma escrita, oral, apresentação
de slides ou de outras formas que o estudante julgar necessário. É importante que além da
avaliação do professor, os demais estudantes também opinem sobre a proposta apresentada
pelos outros grupos, criando um ambiente de debate e promovendo sugestões de como tornar
a proposta melhor.

AVALIAÇÃO

A avaliação ocorrerá em três momentos distintos, cada uma valendo ⅓ da nota do estudante:

O primeiro momento é durante o jogo, onde o professor observará a dinâmica dos grupos de
estudantes, se estão interagindo, se estão concentrados na atividade. Esse momento busca
avaliar o GRUPO.

O segundo momento é durante a apresentação do projeto final. Neste momento o professor


avalia a proposta do GRUPO através destes critérios: Criatividade da proposta;
Desenvolvimento da proposta; Apresentação da proposta; Aplicabilidade
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O terceiro momento avaliativo acontece após a apresentação, onde o professor aplicará um


questionário INDIVIDUAL para os estudantes: O que você aprendeu sobre o tema?; Como
você avalia seu desempenho nesta atividade? Como poderia ser melhor?; Como você avalia o
desempenho do seu grupo? Como poderia ser melhor? Você gostou da atividade? o que sugere
para melhorar?

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR

BERBEL, N. A. N. A problematizacao e a aprendizagem baseada em problemas.


Interface – Comunic, Saúde, Educ 2, p. 139–154, 1998.

BORDENAVE, J.D.; PEREIRA, A. M. Estratégias de ensino aprendizagem. 4. ed.


Petrópolis: Vozes, 1982.

COELHO, D., WINGSPAN | APRENDA A JOGAR #67. Youtube, 19 abr. 2019.


Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=OyEvgfFDZRQ>. Acesso em 15 nov.
2022.
COSTA, Fábio José Viana et. al.,Guia de identificação de aves traficadas no Brasil,
Florianópolis: BECONN | Produção de Conteúdo, 2016.

COSTA, Fábio José Viana et. al., Ciência contra o tráfico: Avanços no Combate ao
Comércio Ilegal de Animais Silvestres, João Pessoa: IMPRELL, 2017.

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