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CONTEÚDOS EM
CANAIS SOCIAIS
O storytelling
como estratégia
de marketing
Luciana Manfroi
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Introdução
A julgar pelos desenhos nas cavernas de pinturas rupestres, os seres humanos
contam histórias desde antes de começarem a falar, quando os caçadores-coletores
primitivos se comunicavam por meio de gestos ou de forma pictórica. Nos tempos
modernos, as narrativas se tornaram uma importante estratégia de comunicação
de marketing envolvendo as marcas, sobretudo pelo seu poder de conectar as
pessoas em nível emocional. Com isso, as marcas se apropriam de narrativas de
gêneros ficcionais para se envolver em histórias que despertem emoções e um
sentido para o consumidor que supere o consumo da mercadoria ou do serviço.
Neste capítulo, vamos definir os conceitos que envolvem o storytelling. Além
disso, vamos analisar as estratégias de marketing baseadas nas narrativas e
exemplificar casos de sucesso no uso da narrativa da marca para cumprir de
forma assertiva os objetivos de comunicação.
2 O storytelling como estratégia de marketing
O que é storytelling?
Todos somos contadores de histórias desde pequenos. Você se lembra das
suas histórias favoritas? Todas as crianças inventam mundos paralelos, pois
adoram histórias. Se não estão vivenciando as tramas, estão criando alguma.
Mas até adultos são assim. Você continua a sonhar acordado? Planeja o futuro?
Pensa em viver em outro lugar? Como é esse lugar? Você é feliz? Gosta do que
faz? Independentemente da idade, estamos constantemente vivendo histórias,
sejam as passadas, em que nossa memória busca eventos nas lembranças,
sejam as futuras, em que estamos vivendo planos que criamos para um
cenário prospectivo. Isso atesta que nossos cérebros estão conectados para
se envolver em narrativas, que, por consequência, tornam-se estratégicas
quando usadas com propósito e uma direção clara.
Mas, afinal, no que consiste uma história? Essencialmente, uma história
conta como e por que a vida muda. Começa com uma situação em que a
vida está relativamente em equilíbrio e, então, há um evento que acaba
com esse equilíbrio. Você consegue um novo emprego, o seu chefe morre de
ataque cardíaco ou um grande cliente ameaça ir embora. A história continua
descrevendo como, em um esforço para restaurar o equilíbrio, as expecta-
tivas subjetivas do protagonista se chocam com uma realidade objetiva não
cooperativa. Um bom contador de histórias descreve como é lidar com essas
forças opostas, convocando o protagonista a cavar mais fundo, trabalhar
com recursos escassos, tomar decisões difíceis, agir apesar dos riscos e,
finalmente, descobrir a verdade. Todos os grandes contadores de histórias
desde o início dos tempos lidaram com esse conflito fundamental entre a
expectativa subjetiva e a realidade cruel. Grosso modo, trata-se da jornada
do herói, sobre a qual discutiremos mais adiante (FRYER, 2003).
De fato, as histórias organizam coerentemente eventos aleatórios e criam
experiências, tornando-se uma maneira de entender e compartilhar a nossa
compreensão do mundo. Sem histórias, teríamos uma vida programada em
tarefas lineares e não se fundamentaria a experiência de viver.
Você já deve ter se emocionado ao escutar alguém contando uma história
sobre alguma circunstância: um encontro surpresa, uma viagem inesquecível,
uma vitória impressionante em um jogo, um início ou uma ruptura de uma
relação, entre outras tantas. Da mesma forma, você já deve ter percebido que
as pessoas contam as suas histórias de maneiras diferentes. Há, portanto,
boas histórias e histórias nem tão convincentes. Por que será que algumas
pessoas nos fazem “viajar” junto nas suas narrativas, enquanto outras não
nos prendem tanto? Será que é o evento em si que desperta mais curiosidade
e emoção ou será a maneira de contar?
O storytelling como estratégia de marketing 3
Veja que as etapas estão reguladas pela continuidade das ações e dos
conflitos entre elas. O marketing se apropria dessas etapas pela sequência
contexto > ações > conflito > resultados. A assertividade da campanha de-
penderá da capacidade de criar histórias envolventes pelos profissionais de
marketing que não apenas chamem a atenção dos clientes ou clientes em
potencial, mas que estimulem a criação de conteúdo pelos usuários.
De fato, a difusão das redes sociais digitais fomentou ainda mais o cenário
fragmentado e complexo da comunicação, pois, nesses contextos, as pessoas
conversam e trocam conteúdo entre si, não mais apenas com as empresas,
gerando um novo tipo de conteúdo: o conteúdo gerado pelo usuário, que se
tornou um dos mais importantes tipos de mídias no cenário de marketing
(GABRIEL; KISO, 2020). Vamos falar mais sobre esse contexto a seguir.
Há um motivo pelo qual a maioria dos materiais de marketing não funcionam [...]
O marketing deles é muito complicado. O cérebro não sabe como processar as
informações. Quanto mais simples e previsível for a comunicação, mais fácil será
para o cérebro digerir. A história ajuda porque é um mecanismo de criação de
sentido. Essencialmente, as fórmulas da história colocam tudo em ordem para que
o cérebro não precise trabalhar para entender o que está acontecendo.
O que acontece é que, por vezes, as marcas exigem tanto do público que
acreditam que ele compreenderá um roteiro que, talvez, seja feito sem o emba-
samento do que realmente é o storytelling. Assim, o cérebro é sobrecarregado
com informações, contextos, tramas e dados que só existem na cabeça de
quem os criou (ou nem nela). O cérebro é atraído para a clareza e descarta a
confusão, e isso sempre deve ser respeitado nas campanhas de marketing.
Como vimos, algumas marcas utilizam o storytelling com sucesso, tor-
nando-se memoráveis. Na seção a seguir, vamos dar exemplos de marcas
que fizeram história com as suas narrativas.
12 O storytelling como estratégia de marketing
A Disney, é claro, sabe bem como contar histórias, e esse anúncio da Disneyland
Paris revela as habilidades da marca. Trata-se da história comovente de um
patinho que encontra uma revista em quadrinhos do Pato Donald e fica obcecado
pelo seu novo herói. Porém, o mau tempo está se aproximando, e o patinho
e a sua família precisam levantar voo, deixando para trás seu querido gibi.
A família passa por uma noite fria e úmida antes do reaparecimento do
sol, e depois chega inesperadamente à Disneyland Paris, onde o patinho é
saudado por ninguém menos que o Pato Donald.
Acesse o YouTube e assista ao vídeo “Budweiser: Super Bowl XLVIII puppy love”.
Era 1987 e as famílias estavam devidamente acomodadas nos seus sofás para
assistirem à programação diária. De repente, surgem alguns pontos pretos na
tela branca e um locutor de fundo: “Este homem pegou uma nação destruída,
recuperou a sua economia e devolveu o orgulho ao seu povo...”. Na medida
em que mais pontos pretos apareciam na tela branca, mais frases de louvor
eram enunciadas sobre o tal homem. Quando os pontos pretos aparecem na
íntegra, a face de um homem se revela: era Hitler.
Nos últimos segundos do comercial, aparece a logomarca da Folha de São
Paulo e a voz pronuncia o slogan: “Folha de São Paulo: o jornal que mais se
compra e o que nunca se vende”. Com esse final, a narrativa quebra o para-
digma de um herói e coloca o personagem como anti-herói, concluindo-se
que, dentro do storytelling, a marca tem um compromisso com a verdade.
Essa estrutura segue o padrão da jornada do herói e converte o público por
meio da narrativa do suspense, clássica em produtos ficcionais.
O Boticário: a linda ex
Referências
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COMERCIAL Hitler é um dos 100 melhores comerciais de todos os tempos. Acontecendo
aqui, 2013. Disponível em: https://acontecendoaqui.com.br/propaganda/comercial-
-hitler-e-um-dos-100-melhores-comerciais-de-todos-os-tempos. Acesso em: 25 ago.
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O storytelling como estratégia de marketing 15
Leituras recomendadas
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em: https://www.youtube.com/watch?v=K0Y9d65ZxKI. Acesso em: 25 ago. 2021.
COMERCIAIS que marcaram época! In: GRANDES NOMES DA PROPAGANDA. 1 Vídeo (1
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