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O Fim do Voto de Qualidade: o que esperar para o futuro?

Live realizada em 22 de abril de 2020.

Debatedores:
Everardo Maciel (Dir. Vice-Pres. da ABDF, Ex-Sec. da Faz. de PE e Ex-Sec. da RFB)
Roberto Quiroga – Conselheiro da ABDF e Advogado
Roberto Duque Estrada – Diretor da ABDF e Advogado
Gisele Bossa – Conselheira do CARF e Professora
Zabetta Macarini – Diretora Executiva do Getap e Advogada

Mediadora:
Suzy Hoffman – Conselheira da ABDF e Advogada

A live realizada teve o intuito de discutir aspectos referentes ao fim do


voto de qualidade, estabelecido pela Medida Provisória (MP nº 899/19) do contribuinte
legal, convertida na Lei nº 13.988, de 14 de abril de 2020, e as possíveis
consequências da nova legislação.

A redação do art. 28 da Lei nº 13.988/20, incluiu o art. 19-E à Lei nº


10.522/02, estabelecendo que “Em caso de empate no julgamento do processo
administrativo de determinação e exigência do crédito tributário, não se aplica o voto
de qualidade a que se refere o § 9º do art. 25 do Decreto nº 70.235, de 6 de março de
1972, resolvendo-se favoravelmente ao contribuinte.”.

A Conselheira do CARF, Gisele Bossa, iniciou a discussão expondo que a


sanção da Lei prevendo o fim do voto de qualidade gerou uma bipolarização muito
grande entre Fisco e contribuintes.

De um lado, os defensores dos contribuintes enalteceram a medida, sob o


argumento de que a extinção do voto de qualidade seria um avanço para os
contribuintes, na medida em que haveria uma diminuição de judicialização de
processos administrativos perante o judiciário.

Neste sentido, o advogado Roberto Duque Estrada endossou a afirmativa,


justificando que os contribuintes sofreram muito nos últimos anos com o abuso do uso
do voto de qualidade pelos Presidentes da Turmas e do CSRF, que tornaram o órgão
julgador como “casa do Fisco” em detrimento dos contribuintes. Assim, acredita que a
intenção do legislador foi dar voz aos contribuintes em prol de arbitrariedades do Fisco.

Por outro lado, Bossa afirma que diversos juristas, tributaristas, e até
mesmo técnicos da Receita Federal do Brasil (RFB) e membros dos órgãos de
julgamento, alegam que o fim do voto de qualidade pode comprometer a arrecadação
tributária e até interromper as representações fiscais que são abertas para investigação
posterior de órgãos como Ministério Público e Polícia Federal, como por exemplo, a
Lava Jato.

Entretanto, a Conselheira acredita que é preciso, num primeiro momento,


enfrentar a nova realidade, e, se necessário, realizar potenciais ajustes no regimento
interno do CARF para a melhor aplicação da nova legislação.
De todo o modo, no papel de Conselheira, não enxerga o fim do voto de
qualidade como um problema, uma vez que as decisões proferidas pelo CARF não têm
o intuito de ser pró fisco ou pró contribuinte, mas sim pró legis, baseadas na verdade
dos fatos, na convicção do julgador, e na legislação aplicável ao caso.

Questionada sobre os efeitos da nova Lei em relação aos processos que


estão em andamento no CARF, a Conselheira Gisele esclarece que certamente haverá
inúmeras questões trazidas em sede de Embargos de Declaração, o que poderá levar
a discussão ser revisitada como um todo, sendo factível julgar em prol do contribuinte.

O advogado Roberto Quiroga, por sua vez, faz menção aos casos que já
estão no Judiciário e alerta pela necessidade de se levar em consideração o princípio
da isonomia, devendo-se, ainda, ter muita cautela na análise dos casos, em especial
quanto a retroatividade da Lei e a abrangência às penalidades ou até mesmo os
créditos tributários.

Finalmente, a advogada Zabetta Macarini pondera que surgirão novas


propostas legislativas e inúmeras discussões no tocante a manutenção ou não do voto
de qualidade, a retroatividade da Lei, entre outros aspectos que precisarão ser
oportunamente avaliados, conforme o surgimento das necessidades.

Na visão do professor Everardo Maciel, o voto de qualidade é apenas um


aspecto do processo administrativo. Assim, acredita que o fim do voto de qualidade é
um pretexto para discutir uma questão muito mais ampla, que é o processo como um
todo; isto porque o volume de litígio tributário no Brasil tem uma dimensão gigantesca,
acompanhada de uma evidente morosidade e insegurança jurídica.

Para sustentar seu ponto de vista, aponta que o problema inicial é o


lançamento indiscriminado e sem limites, que, de plano, já causa inúmeros danos aos
contribuintes, e que se estende morosamente até o Judiciário, onde vemos situações
semelhantes sendo julgadas de maneiras diferentes, o que demonstra total
insegurança jurídica, além de ofensa a princípios constitucionais, como o da isonomia.

Por isso, considerando que o voto de qualidade é apenas um aspecto de


um processo mais amplo, o professor Everardo assinala para a necessidade de um
aprimoramento no procedimento fiscal geral, em especial, por um procedimento
processual administrativo, que até hoje não existe no nosso atual ordenamento jurídico.

Além disso, acredita que seja necessário uma total reformulação do órgão
de julgamento (em suas palavra, um “novo CARF”), cujo órgão seja composto por
Conselheiros concursados (em número ímpar de membros), bem como que seja
autônomo e independente jurídica, econômica e financeiramente, além de ser
vinculado ao Judiciário, e não ao Ministério da Economia, de modo a ter competência
para solucionar, consultar e expedir decisões de caráter vinculante para as questões
tributárias.

Ao final da discussão, a advogada Zabetta, reforçou a necessidade de


revisão do processo como um todo, mas sustentou que, neste momento de discussões
e incertezas trazidas com o fim do voto de qualidade e os efeitos que essa nova
legislação vai causar daqui pra frente, é importante se buscar alternativas para a
solução dos litígios.
Nesse sentido, apontou que a melhor alternativa é a aproximação dos
contribuintes ao Fisco (princípio da cooperação), como já tem sido realizado há algum
tempo pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) ao propor transações,
negociações de dívidas, possibilidades de parcelamentos, entre outros mecanismos,
visando diminuir o contencioso tributário e as exacerbadas discussões.

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