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FICHA CATALOGRÁFICA
FOLHA DE APROVAÇÃO
______________________________________________________
Prof. Dra. Elizabeth Moraes Gonçalves
Orientadora e Presidente da Banca Examinadora
__________________________________________________
Prof. Dra. Marli dos Santos
Coordenadora do Programa de Pós-Graduação
AGRADECIMENTOS
Tive muita sorte nessa caminhada de poder contar com pessoas cruciais, que me
ajudaram, me ensinaram, me criticaram, abriram e também fecharam meus olhos em
determinadas ocasiões, mas seria inviável citar a todas. Mas posso dizer que essa Tese é
repleta de Cláudia, Ivan, Aline, Ivy, Cláudio, Kamila, Faro, Danilo, Catharina, Tereza,
Renata, Alexino, Wilson, Márcia...
De modo particular e nominal agradeço à minha orientadora Elizabeth Moraes
Gonçalves que me deu autonomia necessária, me mostrou o lado humano e generoso do
pesquisador, e constantemente me lembrava de que minha melhor obra ainda estava por vir.
Ao Programa de Pós-Graduação da Universidade Metodista de São Paulo que me
proporcionou o ambiente adequado para o desenvolvimento dos trabalhos acadêmicos e me
concedeu a bolsa de estudos que me permitiu a dedicação exclusivamente à pesquisa. Devo,
portanto, agradecer aqui explicitamente também aos órgãos de fomento CNPq (Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e Capes (Coordenação de
Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior), esta última por ter me proporcionado a
experiência do Programa de Doutorado Sanduíche no Exterior, realizado na Universidade
Complutense de Madri entre fevereiro e julho de 2013. Uma experiência pessoal e acadêmica
que marcou minha trajetória de vida e que seria inviável sem o apoio do coorientador Jesus
Miguel Flores Vivar e da amiga quase madrileña Juliana Colussi.
Agradeço também à banca examinadora que se prontificou a contribuir com a minha
pesquisa, aos colegas de doutorado que confiaram em mim como representante discente, à
Katia Franca e Vanete Viegas, funcionárias da Umesp, que tão prontamente me atenderam
sempre que precisei. De modo particular, sou grata à compreensão e ao apoio do meu
companheiro Rafael Tadashi, sem sua colaboração não sei se seria possível tanto empenho
para pensar a cibercultura ambientalista.
Ainda não posso esquecer do Instituto Ambiental Vidágua, o principal responsável
pela minha imersão e entrega ao mundo ambientalista.
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RESUMO
ABSTRACT
RESUMEN
Nuestra Tesis prevé la existencia de una cibercultura ambientalista, propia del movimiento
ambiental, que tiene una dinámica comunicativa caracterizada por estrategias de discurso y
movilización específicas. El movimiento ambiental, representado por la organización
internacional Greenpeace, supo apropiarse de las herramientas digitales, difundir la
problemática ambiental en un escenario de redes sociales digitales, ciberactivismo,
interactividad y composición de una esfera pública en red, que colocamos en debate. Para
entender el panorama, ejecutamos una amplia discusión teórica, en contacto permanente con
el objeto de estudio, tratando la trayectoria del ambientalismo y su territorio de movimiento
social, las tecnologías de la sociabilidad, la internet y sus medias como espacio de resistencia
y control, asimilando la cibercultura como la propia cultura de la contemporaneidad, sellada
por las influencias tecnológicas. Realizamos entrevistas con voluntarios, seguidores, además
de los responsables por la comunicación de Greenpeace que nos permitieron ver las
motivaciones de la participación y confirmar que el compromiso en la causa ambiental fue
despertado por las facilidades del ciberespacio y por la credibilidad que la organización
adquirió. Las estrategias discursivas fueron descubiertas por medio de la metodología del
Análisis del Discurso, con énfasis en la identificación del ethos y de las escenas de
enunciación, basada en un protocolo de análisis que elaboramos para comprender la manera
de decir que lleva a los sujetos a creer en el discurso ambiental. En la primera etapa de
análisis formulamos un diagnóstico de perspectiva cuantitativa para conocer las
campañas/temáticas principales y para evaluar la repercusión de los asuntos en las redes
sociales y en la media convencional. Posteriormente, elegimos los textos de las principales
campañas que fueron analizados cualitativamente, considerando los términos léxicos, las
técnicas de argumentación y los elementos destacables, además de los aspectos externos al
texto como fotos, vídeos, colores y escenas predominantes. El discurso de la cibercultura
ambiental muestra el ethos de un amigo, compañero, que oscila entre el drama y la
agresividad para llamar la atención a la causa. Problemas graves como denuncias ambientales
son abordados con un ethos lúdico, quizá infantil, haciendo uso de un lenguaje coloquial y de
códigos de la cultura contemporánea – dibujos animados, juegos virtuales, animales que
cantan y bailan – que para nuestros ojos revelan una escena esquizofrénica, pero es justamente
lo que garante el éxito de las campañas.
LISTA DE FIGURAS
‘Abraço-me, pois às palavras que escrevi, desejo-lhes longa vida e recomeço a escrita no
ponto em que tinha parado. Não há outra resposta’ (por enquanto).
José Saramago
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................................................................... 11
CONCLUSÃO.................................................................................................................... 198
REFERÊNCIAS................................................................................................................. 207
APÊNDICE 1
1.1 Entrevistas realizadas com os representantes do Greenpeace......................................... 219
1.2 Íntegra das entrevistas realizadas com colaborador, voluntário e ou ciberativista.......... 224
APÊNDICE 2
2.1 Levantamento demonstrativo dos destaques do portal do Greenpeace Brasil entre junho de
2012 e junho de 2013....................................................................................................... 244
ANEXOS
Telas Facebook Greenpeace Brasil....................................................................................... 260
12
INTRODUÇÃO
resistência”, onde situamos as formas de viver em sociedade e suas esferas impactadas pelas
tecnologias, retomando os conceitos de era eletrônica, sociedade da informação, mas
centralizando na leitura da sociedade em rede, que tem como espinha dorsal a Internet, a
“estrutura organizativa e o instrumento de comunicação que permite a flexibilidade e a
temporalidade da mobilização” (CASTELLS, 2003, p.277). 2) “Cibercultura e suas declaradas
perspectivas”, considerando as prerrogativas do ciberespaço para demarcar a cibercultura
como a própria cultura contemporânea que não se restringe a manifestações no espaço virtual,
mas novas formas de sociabilidade pautadas pelas influências tecnológicas, problematizando
autores como Gonzáles (2012); Levy (1999); Lemos (2004), Rudiger (2011ab) e Santaella
(2008). 3) “Ciber política, ativismo, redes sociais digitais, interatividade”, um item para
debater as formas de comunicação e mobilização que pulsam no ciberespaço; as diferentes
mídias, as comunidades virtuais e as oniscientes redes sociais digitais que ganham espaço
como plataformas cotidianas. Nesse caso, convém esclarecermos que termos como em rede,
online, digital, virtual são usados ao longo da Tese como apoios similares para indicar formas
de comunicação que se moldam na Internet. Nossas atenções estão voltadas mais
profundamente, nesse último componente, ao ciberativismo, como tática amplamente
utilizada e propagada pelo Greenpeace, e suas derivações - infoativismo, netativismo,
netwars, multidões inteligentes. E na proposta de entender os precedentes e a formatação atual
do ativismo em rede recorremos a Mattelart (2006), Di Felice (2013) e Ugarte (2007) este
último resumindo o ciberativismo como a forma de empoderamento pessoal, que se conquista
no discurso, nas ferramentas e na visibilidade. Finalizamos o capítulo com o entendimento de
que a sociedade em rede representa uma alternativa aos controles midiáticos, uma proposta de
autonomização do sujeito comunicativo, que oferece espaço para a sociedade civil expandir
seus objetivos, suas reivindicações, conquistar simpatizantes e estabelecer novas formas de
atuação. Mas também pode favorecer grupos dominantes, estimular o individualismo ou
fomentar uma cidadania limitada, restrita aos que têm acesso e habilidade para lidar com o
emaranhado de ferramentas. É um terreno árido onde não convêm afirmações categóricas,
mas ponderações, criação de proposituras e múltiplos olhares.
Uma dessas visões aponta para as TICs como facilitadoras e fomentadoras da
participação, que podem estimular e liberar o debate, remodelando a proposta da esfera
pública, e é justamente a partir desse argumento que desenvolvemos o Capítulo IV: ‘O
potencial político do movimento ambiental em rede’.
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Internet. Quase a totalidade dos entrevistados começou a participar das questões ambientais
após o surgimento e consolidação das redes sociais digitais. Para os representantes do
Greenpeace, a Internet também teve papel determinante para a luta ambiental. Mas persiste o
formato verticalizado em que tudo é decidido e implantado hierarquicamente pela
organização.
O discurso, corresponsável por essa participação, foi construído e difundido na
cibercultura, e no Capítulo V nossa tarefa foi desvendá-lo. No último capítulo apresentamos,
então, as análises das campanhas do Greenpeace Brasil e uma breve comparação com o
discurso espanhol, que nos foi propiciada pela experiência no Programa de Doutorado
Sanduíche no Exterior, realizado na Universidad Complutense de Madrid.
Em um primeiro momento, como parte do nosso protocolo de análise, elaboramos um
diagnóstico baseado no próprio trabalho empírico-exploratório e, para melhor visualização
dos resultados encontrados, formatamos um levantamento demonstrativo, presente no
APÊNDICE 2, com as principais campanhas e temáticas pautadas pelo Greenpeace.
Elegemos para as análises os conteúdos em destaque, localizados de forma randômica na
página inicial do portal institucional, porque verificamos que ali estavam as propostas
principais da organização, seu agendamento prioritário, aquilo que ela realmente queria
viabilizar e divulgar. O levantamento de caráter quantitativo elencou 87 destaques durante um
ano da nossa observação – junho de 2012 a junho de 2013. Incluímos na tabela os campos
para discriminar os títulos, os temas/campanha principais e a repercussão que cada um dos
destaques alcançou no próprio portal, nas redes sociais digitais Twitter e Facebook. Também
informamos se o assunto conseguiu repercussão na mídia convencional e se tinha proposta
política agregada ao conteúdo. A intenção foi compreender, de maneira mais mensurável, a
dinâmica comunicativa, os assuntos principais, o impacto alcançado e se extrapolavam de fato
o ambiente virtual.
Com isso, conseguimos identificar a tendência hiper e transmidiática do Greenpeace,
que constrói universos comunicacionais diferentes para cada campanha, a participação
massiva que conquista na rede Facebook em detrimento do próprio portal, sua habilidade em
investir no virtual com táticas diferenciadas e imagéticas, mas sempre amarrando a propostas
concretas de modificações legislativas, projetos e lobbys políticos. Também foi a partir dessa
quantificação que identificamos as principais campanhas desenvolvidas pela organização no
período da nossa investigação: Salve o Ártico e Desmatamento Zero. A primeira delas,
desenvolvida em nível internacional, denuncia as consequências do degelo no Ártico que vem
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1
De acordo com o portal institucional - www.greenpeace.org/brasil/pt/quemsomos, acesso em 25 fev.2014, a
ONG conta 35 mil colaboradores e 300 voluntários. O Facebook do Greenpeace Brasil ultrapassa 1 milhão de
seguidores. Em entrevista concedida a nossa tese o coordenador de web do Greenpeace, Élcio Figueiredo,
informou que existem mais de 900 mil pessoas cadastradas como ciberativistas – APÊNDICE 1.
21
2
Entendemos redes sociais digitais como sistemas de comunicação pela Internet que conecta rede de pessoas
em uma proposta colaborativa de compartilhamento, troca de informações e agregação de afinidades
(RECUERO, 2010). No Capítulo III definimos e exemplificamos melhor o conceito.
23
3
Os termos são colocados por Maingueneau (1997, p.45) retomando Aristóteles, originalmente, como
phronesis – ponderação e prudência, areté - atitude franca, de verdade e virtude e eunóia – imagem agradável
e benevolente.
24
4
Charaudeau e Maingueneau (2004, p.97) definem o código linguageiro como um posicionamento que
mobiliza a linguagem, resultante de variedades de língua acessíveis tanto no tempo como no espaço, em uma
conjuntura determinada.
25
Obviamente que há outras questões no processo, não menos relacionáveis, como a doutrina,
as filosofias, as ideias que movimentam o indivíduo. Mas, pensando preliminarmente no
fiador, este pode transparecer na enunciação do movimento ambiental como um indivíduo
panfletário, catastrófico, apelativo, mas, em outros momentos, como parceiro ou solidário. E a
fala ambientalista tem um fiador e ativa um mundo ético característico, que pode restringir o
meio ambiente aos estereótipos de fauna e flora, por exemplo, colocando a natureza como
algo externo, isolado, que o homem tem que defender.
Na mesma linha, Amossy (2005, p.120) argumenta que a eficácia da palavra está
ligada à autoridade do orador. Nesse sentido, ela indaga se o ethos deve ser considerado uma
“construção puramente linguageira ou uma posição institucional?” A autora retoma Bourdieu
ao afirmar que não existe relação pura de comunicação, porque a palavra e sua força não se
concretizam propriamente na linguística, mas implicam na autoridade do locutor: “o discurso
não pode ter autoridade se não for pronunciado pela pessoa legitimada a pronunciá-lo, em
uma situação legítima, portanto, diante dos receptores legítimos” (AMOSSY, 2005, p.120). O
ethos, nesse contexto, consiste em grande parte na autoridade exterior do locutor, ou seja, sua
fala concentra capital simbólico acumulado. Tem-se, então, a perspectiva interacional, no
sentido da troca entre os participantes, e institucional, considerando que a troca está
relacionada à função social de tais integrantes. Há, assim, na construção do ethos, a imagem
que se faz do público a quem se vai dirigir e, ao mesmo tempo, o orador constrói sua própria
percepção em função da imagem que ele faz de seu auditório, conforme Amossy (2005,
p.134), “a imagem de si que o locutor constrói em seu discurso é modelada pelas
representações sociais que ele julga partilhadas por cada uma das frações de seu público”.
O estereótipo, para Amossy (2005, p.125), desempenha papel essencial no
estabelecimento do ethos, no sentido em que pensa o real por meio de uma “representação
cultural preexistente, um esquema coletivo cristalizado”, ao mesmo tempo em que é ativado
pelo corpo do fiador, como prefere Maingueneau (2008), ou remete a imaginários sociais, na
opinião de Charaudeau (2008). O fato é que se procura atingir o público por meio de
premissas éticas e políticas, às quais ele é suscetível de aderir imediatamente, e a
estereotipagem é a muleta nesse caso, um modelo para construir a imagem do público e
consentir um discurso de acordo. Assim, é relevante pensar no ethos do movimento ambiental
na perspectiva institucional e construção discursiva, buscando entender quem é o auditório do
Greenpeace. Haja vista a emergência do movimento ambiental na modernidade, o discurso
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seria voltado para jovens? Com formação superior? Público plenamente educado? Ou mais
focado nos próprios entusiastas da causa?
Mas as modalidades de apresentação em uma situação discursiva preveem a criação de
cenas de enunciação, da qual o ethos é parte constitutiva, desdobrando um código linguageiro
para abordar um conteúdo. E aqui não se trata de uma simples cena ou mesmo um quadro
estável e ou independente, “mas aquilo que a enunciação instaura progressivamente como seu
próprio dispositivo de fala” (MAINGUENEAU, 2008, p.70).
As cenas de enunciação são compreendidas em três categorias principais, para
Maingueneau. A primeira como englobante, sendo o tipo de discurso um regulamento
pragmático necessário para que o investigador se situe ao interpretá-lo. Em seguida, a
genérica, que está relacionada ao gênero ou subgênero, que forma o quadro cênico do texto,
definida como “espaço estável no interior do qual o enunciado adquire sentido – o espaço do
tipo e do gênero de discurso” (MAINGUENEAU, 2004, p.87), onde se permitem cenografias
diferentes. O próprio estatuto da enunciação, para o autor, depende dos gêneros, e as possíveis
coerções de gênero estão presentes desde, por exemplo, o ethos pré-discursivo. Esse tipo de
classificação organiza a estrutura narrativa e a própria práxis discursiva, mas não será nosso
foco. Enquanto nossa cena englobante pode ser delimitada como o discurso ambiental
veiculado na Internet, a cena genérica, de acordo com nossa proposta de análise, são as
campanhas realizadas e disponibilizadas como uma seção/gênero dentro do tipo de discurso,
que possibilita diferentes cenografias. Mas é só no decurso do texto que é possível identificar
a cenografia que legitima o discurso, agrega o ethos, o conteúdo e o próprio código
linguageiro e, de maneira mais autoral, se enreda com base em uma dêixis discursiva, que
veremos mais à frente.
Essa tal cenografia é construída dentro do próprio texto, que pode ter apelos e
construções variadas, como é o caso dos discursos políticos, publicitários e até mesmo os
ambientais, que mobilizam diferentes cenografias, “uma vez que, para persuadir seu
coenunciador, devem captar seu imaginário, atribuir-lhe uma identidade invocando uma cena
de fala valorizada” (MAINGUENEAU, 2005, p.76). A cenografia não só legitima o
enunciado como atua como um recurso argumentativo utilizado para se aproximar do leitor,
ou, melhor, harmonizar-se com o perfil de seu público ideal. E não se restringe a um tipo
único de cenografia, pois o repertório de cenas varia em função do grupo visado pelo
discurso. Há, normalmente, uma cena genérica rotineira da comunicação pela Internet para
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remete a um lugar do discurso fundador, muito pertinente à nossa análise. Portanto, o discurso
ambiental aqui analisado não é propriamente o produzido em 2012/2013, mas aquele no
interior de uma cibercultura, que emerge na crise do capitalismo, em uma configuração pós-
moderna, midiática, moldado pelas tecnologias que delimita a cena e autoriza o discurso. “De
uma maneira ou de outra, trata-se de estabelecer uma cena e uma cronologia conforme as
restrições da formação discursiva” (MAINGUENEAU, 2007, p.93). Assim, o trabalho ganha
força e estatuto para entender o discurso como algo amplo, em movimento, mas constituído
em valores sócio históricos. Os discursos, ou melhor, a aceitação deles, está diretamente
relacionada à conjuntura em que eles se inscrevem e às instituições que os representam. O
discurso ambiental da década de 1980, por exemplo, não tinha a mesma efetividade e espaço
na sociedade que ocupa hoje. A dêixis revela-se como legitimadora do sujeito, do lugar e do
tempo de um discurso, como o ambiental, que se evidencia como orientador de posições na
sociedade contemporânea.
Isso posto, nossa tarefa foi identificar o ethos - a construção da imagem do movimento
ambiental, no contexto da cibercultura, indicando também os elementos que compõem a
cenografia: os conteúdos e as cenas construídas para persuadir o público e que caracterizam a
força política e de mobilização da organização. Para tanto, percorremos um caminho que
passa por um amplo processo empírico, composição de um diagnóstico quantitativo, para
posterior análise qualitativa com base em um conjunto de itens que nos pareceram mais
pertinentes para oferecer resultados de consistência para a nossa Tese. Nossos passos são
detalhados a seguir.
Nossa proposta aqui foi estabelecer um padrão para as análises de discurso das
campanhas do Greenpeace, apresentando e justificando as escolhas que nos levaram a
formatação de um protocolo de análise – um modelo de conhecimento e reconhecimento
discurso ambiental - com auxílio das leituras da Análise do Discurso, em especial
Maingueneau (1997, 2007, 2008a,b), Charaudeau (2008) e também, neste momento, Perelman
e Olbrechts-Tyteca (1996). A constituição do ethos, como já evidenciada, foi peculiar para
entender a adesão dos sujeitos à posição do discurso ambiental que, por meio da Internet, não
só apoiam, mas fazem doações, participam de manifestos, assinam petições, repercutem
mensagens. Por mais que meio ambiente seja um assunto universal, atrativo, com inerentes
30
gerar relação conflituosa é uma realidade no discurso ambientalista combativo, que traz em si
uma memória polêmica, mas suas nuances precisam ser desvendadas com propriedade.
Normalmente, as organizações ambientalistas ressaltam assuntos em controvérsia, insistem
em pontos de crítica, realizam acusações diretas e condenam o discurso, o posicionamento do
outro, desqualificando-o. “A polêmica não se instaura de imediato; ela só se legitima ao
aparecer como a repetição de uma série de outras que definem a própria memória polêmica de
uma formação discursiva” (MAINGUENEAU, 1997, p.124).
Contemplamos aqui também os verbos utilizados, incluindo os verbos introdutórios de
opinião ou aqueles destinados a introduzir declarações ou discursos relatados, como prefere
Maingueneau (1997, p.88). Os verbos revelam conjecturas: segurança (afirma, assegura)
verdade (revela, desvela) opinião (acredita, pensa, julga). No mais, intuímos sobre o peso, o
valor das palavras utilizadas e sua conotação. Convém exemplificar aqui, com apoio de
Charaudeau (2008) que o exagero de expressões técnicas, por exemplo, pode remeter ao ethos
de competente, enquanto termos como ‘talvez’ e ‘pode ser’ ilustram um ethos não autoritário
e o uso de palavras coloquiais e gírias podem revelar intimidade (ou a tentativa de) com o
interlocutor.
5
Perelman e Olbrechts-Tyteca (2000, p.30 - 31) fazem uma discussão exaustiva sobre as diferenças entre
persuasão e convencimento, e definem, em suma, que para o resultado final da argumentação persuadir vai
além de convencer, pois “a convicção não passa da primeira fase que leva a ação”. Já para o caráter racional da
adesão, convencer está acima de persuadir, uma vez que se faz por elementos objetivos e concretos, ao
contrário da persuasão que prioriza aspectos emotivos.
35
1.3.3 Destacabilidade
Este item se mostrou bastante pertinente para a nossa análise, pois abrange uma
tendência do discurso ambientalista, que é o uso de máximas, expressões, o que Maingueneau
(2008) denomina enquanto destacabilidade. Em suma, pequenos enunciados com vocação de
dizer e tomar uma posição, que se transvestem em fórmulas. E ainda que o conteúdo não seja
original, esses breves enunciados, inseridos como títulos, intertítulos ou mesmo no final de
frases ou em legendas, devem ser percebidos como inéditos e imemoriais, dependendo do
formato.
Um dos exemplos é o que o autor denomina enquanto máxima heroica, que são curtas,
bem estruturadas, de modo a impressionar, a serem facilmente memorizáveis e reutilizáveis.
Elas devem, além disso, ser pronunciadas com o “ethos enfático conveniente”
(MAINGUENEAU, 2008, p.77). São asserções generalizantes completas, que podem ser
destacadas do próprio ambiente textual, mas são dignas de ser consagradas e autonomizadas,
atribuídas a um sujeito em específico, ou, no nosso caso, a uma instituição. A relação com o
heroísmo se dá pela autonomia da enunciação que preceitua a si próprio e aos outros. Os
gestos do herói se universalizam e o pequeno enunciado auxilia a corroborar isso.
Maingueneau (2008) também denomina, no âmbito da destacabilidade, a
sobreasseveração, uma expressão recortada (e ou que se sobressai do texto), para formar um
contexto semântico apropriado para a realização do discurso, revelando também uma tomada
de posição em meio a um conflito de valores. Aqui as ideias do texto são transformadas em
uma proposta, uma espécie de sentença, com a figura de um enunciador forte e presente que
revela um ethos, inicialmente autorizado, que estabelece valores e dá força à argumentação. A
sobreasseveração pode ser fraca quando diretamente relacionada ao texto de origem e forte
quando dissociadas da origem, portanto, são fragmentos associados ou mesmo dissociados do
texto.
37
6
Em tradução livre hashtag significa rótulo/etiqueta, e são termos utilizados para indicar o assunto em pauta,
especialmente no Twitter, normalmente precedida do símbolo #. Essas hashtags são elementos importantes de
destacabilidade e merecem investigação até pela centralidade que adquirem nas redes digitais.
38
7
Realizamos durante fevereiro a julho de 2013 um estágio doutoral na Universidad Complutense de Madrid,
por meio do Programa de Doutorado Sanduíche no Exterior (PDSE/Capes). Na ocasião, nos empenhamos, entre
outras coisas, em entender a comunicação em rede do Greenpeace Espanha e publicamos artigos e trabalhos
sobre os diferentes discursos da organização naquele país. O portal na Espanha pode ser acessado pelo
endereço: www.greenpeace.es.
8
Trata-se de um portal do Greenpeace para contemplar todos os países em que atua, publicado em inglês, com
informações institucionais e as campanhas desenvolvidas em âmbito global:
www.greenpeace.org/internacional.
41
9
Hiperlinks são elementos lógicos que interligam os computadores da Rede. Mais comumente são endereços
de páginas web, palavras destacadas que quando ‘clicadas’ direcionam para o ambiente da informação.
Diretamente relacionados estão os conceitos de hipertexto, blocos de texto que oferecem acesso instantâneo a
outros conteúdos por meio de links, e hipermídia no caso direcionando para produtos audiovisuais, imagens e
sons em uma combinação multimídia (PINHO, 2003).
10
Hotsites ou microsites são denominações dadas a páginas da web de menor tamanho com foco em
determinado serviço, ou campanha no nosso caso, elaborados com conteúdo bastante específico e de forma
temporária (PINHO, 2003, p.250).
42
Logo abaixo dos destaques figura um banner solicitando doação, seguido do item
‘Últimas atualizações’, que conta com menu de ‘Notícias’, ‘Fotos’, ‘Vídeos’ e ‘Publicações’.
As laterais são reservadas para banners das campanhas em destaque, com solicitações para
assinar petição vigente (na imagem que ilustra o item, por exemplo, está a campanha do
Desmatamento Zero), e para doação de recursos financeiros ‘Precisamos da sua ajuda’. A
solicitação de recursos financeiros é uma constante, está presente nas seções fixas, nos
banners nas laterais, logo abaixo dos destaques e, ainda, sempre constam no slider randômico,
com variedade de fotos e mensagens, direcionando para a página de doação financeira. Há
uma real insistência em pedir doações que vamos problematizar nas análises.
Ainda na página constam os ícones das redes sociais digitais ‘Conheça o Greenpeace
nas redes’, e a ação ‘Doe um tweet’ que consiste em incentivar o internauta a aderir a um
aplicativo que permite que o Greenpeace publique, automaticamente, em seu perfil do
microblog, tweets sobre campanhas e ações. No rodapé da página existe uma espécie de
resumo do site, com todos os ícones em texto corrido. Além dos itens ‘Em destaque’; ‘Fique
atualizado’ (assine a newsletter/Feed RSS), um mapa com ‘Contatos do Greenpeace no
mundo’, e o quadro ‘Fatos sobre o Greenpeace’: ‘Em ação desde 1972; 3 navios no oceano; 2
mil funcionários; 3.875.000 colaboradores’.
Retomando as seções fixas, na barra superior estão os itens ‘Quem somos’, divididos
nos subitens ‘Greenpeace no Brasil’ (com texto sobre a fundação da organização e vídeo
comemorativo sobre as ações desenvolvidas durante os 20 anos no país); ‘História do
Greenpeace’ (contando o ‘O surgimento do Greenpeace’) e ‘Missão e valores’ (com
descrição sobre os referidos itens). A seção ‘O que fazemos’, descreve as principais áreas de
atuação no momento no Brasil, desmembrada, na ocasião da nossa observação, em
‘Amazônia’, com o texto ‘Amazônia – Patrimônio brasileiro, futuro da humanidade’, trazendo
informações sobre a situação no bioma e as ações já realizadas pelo Greenpeace, e ‘Clima e
Energia’, com texto corrido sobre condições energéticas, aquecimento global e possibilidades
de fontes alternativas de energia.
No item ‘Participe’ constam as opções ‘Ajude com o seu blog’, que disponibiliza
ferramentas para o usuário compartilhar no seu espaço pessoal os banners de campanhas e
petições, conteúdos, oferecendo, inclusive, um canal para os blogueiros interessados em
receber e compartilhar informações do Greenpeace. Na sequência estão os subitens
‘Ciberativista’, que vamos discutir com mais afinco na sequência, ‘Seja um colaborador’, para
contribuir financeiramente, e ‘Voluntário’, explicando o trabalho voluntário e com opção de
43
lei, criação de áreas de preservação. São delineadas em banners de divulgação, que compõem
uma cenografia com fotos, chamadas com caráter de slogan, como ‘Assine pelo
Desmatamento Zero’ e hiperlink para página com mais explicações ou para os hotsites. Além
de fotos, vídeos e jogos desenvolvidos especialmente para a campanha e para incentivar a
participação.
No espaço da petição consta o cadastro para assinar a petição, com breve enunciado,
que privilegia a quantidade de assinaturas e o nome do último ‘ciberativista’ a aderir. No
período da nossa observação identificamos duas campanhas principais, que traziam petições,
contavam com hotsites, e foram o alvo das nossas análises. A campanha Desmatamento Zero
(www.ligadasflorestas.org) que intenta, em parceria com outras organizações ambientalistas,
coletar assinaturas suficientes para solicitar a criação de uma lei de iniciativa popular que
proíba a supressão de florestas em todo território nacional. A comunicação nesse caso visa
incentivar a coleta de assinaturas, propondo, inclusive, uma competição entre os usuários para
‘premiar’ quem mais participa – assinando, divulgando a campanha, compartilhando e
também coletando assinaturas presenciais. E seguindo na mesma linha está a campanha Salve
o Ártico (www.salveoartico.org.br), de caráter internacional, que também destaca os números
de assinaturas e a divulgação nominal dos internautas que assinaram o documento que tem
por objetivo exigir das Nações Unidas a criação de um santuário mundial na área do Polo
Norte. Temos, portanto, petições específicas, com propostas de políticas públicas, incitação à
participação do usuário, mas de maneira bastante passiva. Basta incluir os dados pessoais e
clicar. Além do tema e da própria petição já estarem pré-definidos, a preocupação é mais com
a quantidade de assinaturas do que propriamente em detalhar o motivo do documento.
Como já constatamos, os comentários no portal são permitidos unicamente para
cadastrados e passam por um filtro prévio, por isso mesmo as redes sociais digitais se
apresentam como um espaço mais aberto e participativo. O Twitter e Facebook, por exemplo,
são meios de interação cotidiana do Greenpeace e mereceram nosso acompanhamento, com
levantamentos de dados empíricos importantes que foram destrinchados no Capítulo V, mas
convém antecipar o cenário.
O Facebook do Greenpeace, criado em outubro de 2009, mostra-se como um espaço
de comunicação muito utilizado pelos usuários até pela dinâmica mais livre, possibilidade de
postagem imediata de comentários, compartilhamentos, adesões, já que a intervenção direta
no portal não é permitida. Trata-se de uma fanpage (página para o fã, como o próprio nome
diz, criada para manter relacionamento mais direto com os seguidores e sem limitação de
45
participantes) que atende à dinâmica da rede social com conteúdo reduzido, slogans,
priorização de imagens, sempre com link para a página principal, e atualização frequente
(mais de um novo post por dia). Em março de 2014, contava com mais de um milhão de
curtidores/seguidores. Os números de atualizações, assim como de comentários e curtições é
muito variável e inviável de ser mensurado. Para termos um exemplo, dentro da nossa
amostra verificamos um post sobre a campanha Salve o Ártico, com foto do urso polar, no dia
23 de agosto de 2012, que registrou 34.800 curtidas, 1.884 comentários e mais de 30 mil
compartilhamentos. A mesma campanha, pouco tempo depois, em 17 de outubro do mesmo
ano, com foto de urso, contou com 25 mil curtidas, 1.111 comentários e 12 mil
compartilhamentos. Já em 14 de maio de 2012 um post sobre um protesto ao vivo contra a
cadeia de produção de ferro gusa teve 169 curtições, seis comentários e 94
compartilhamentos.
Já na rede de microblog Twitter conta com 660 mil seguidores (março de 2014) e já
publicou 15 mil tweets/atualizações, desde setembro de 2008, quando foi criado o perfil. Estes
números indicam a média de nove tweets por dia, que ganham um alcance imensurável com a
possibilidade de retweet, que consiste em cada seguidor replicar a mensagem, e seus
seguidores também, assim sucessivamente, gerando um ciclo que não se pode controlar. A
mensagem, nesse caso, deve ser adaptada aos 140 caracteres, com isso o Greenpeace abusa
dos itens de destacabilidade, a partir de máximas e slogans que resumem as ações. Além de se
apropriar das hashtags - as etiquetas, que se convertem em links e criam uma espécie de fio
condutor para congregar as pessoas que estão postando sobre o mesmo assunto. Exemplos
como #desmatamentozerojá #detoxmoda #salveoartico são replicadas e reproduzidas pelos
seguidores e estabelecem uma cadeia de busca, com forte repercussão e visibilidade. Para
Tascon e Abad (2011, p.12) trata-se do sistema público mais impressionante para distribuir
informação. “Twitter é, sobretudo, informação compartilhada e feedback contínuo sobre o que
se diz”.
Vale comentar aqui outra modalidade de engajamento e de interação com o público, o
#PapoGreenpeace, que é divulgado, postado e manejado pelas redes supracitadas. Trata-se de
uma videoconferência em tempo real em que os ativistas e funcionários do Greenpeace
conversam com internautas, esclarecem campanhas e situações ambientais. Durante a
exibição ao vivo, a plataforma permite a integração com Twitter e Facebook, o envio de
perguntas e comentários, que são lidos por um entrevistador/moderador, além de
disponibilizar um chat para que os visitantes possam discutir entre si.
46
11
Realizamos entrevistas por telefone e por e-mail com os responsáveis pela comunicação da organização na
Espanha, na ocasião do Programa de Doutorado Sanduíche no Exterior em junho de 2013, e no Brasil entre
julho e agosto de 2012, que seguem na íntegra no APÊNDICE 1.
12
Contatamos 100 voluntários, ciberativistas e seguidores do Greenpeace e aplicamos questionário para
entendimento das motivações da participação. As 25 respostas obtidas estão também no APÊNDICE 1.
47
organização faz jus ao papel de pioneira no ambiente virtual, e está alinhada às práticas da
cibercultura, sabe lidar com diferentes meios e investe estrategicamente nas mídias sociais
digitais. Outra questão determinante para avançarmos na nossa reflexão é que a comunicação
em rede ampliou sobremaneira as possibilidades de participação e criou novas formas de
engajamento na causa ambiental.
Mas é preciso entender todo esse cenário de forma aprofundada e embasada
teoricamente. No Capítulo II contextualizamos o ambientalismo na contemporaneidade e suas
formas de comunicação, defendendo a assertiva que o Greenpeace se configura como um
legítimo movimento social. Também traçamos um histórico da organização e de seus
antecedentes midiáticos.
49
13
Embora existam desde o século XIX como fundações, instituições, associações de caridade e grupos
religiosos, o termo específico Organização Não Governamental, foi uma criação da ONU (Organizações das
Nações Unidas), utilizado pela primeira vez na década de 1950 para designar as instituições que não pertencem
ao setor governamental, 1°setor, nem ao privado/mercado, 2° setor. (VIEIRA, 2001). Compondo assim um
3°Setor, categoria híbrida de organizações privadas, com fins públicos. Essa designação é vista por um lado
como um verdadeiro fenômeno de participação social e fortalecimento da democracia, por outro, como forma
de enfraquecer e ou se aliar com o Estado, favorecendo a proposta neoliberal e de expansão da dinâmica
capitalista. Preferimos avaliar ONGs como potencial integrante de movimentos sociais antisistêmicos, como
representantes legítimos de setores da sociedade civil, que carregam muito mais tensão com o Estado e com os
setores produtivos do que consenso.
14
Os novos movimentos sociais surgem, segundo Gohn (2000), na década de 1970, justamente época da
fundação do Greenpeace, o que revela mais que mera coincidência. Essa categorização esbarra em premissas
do chamado neomarxismo, ao colocar em questão elementos como ideologia, lutas sociais, ação coletiva.
Sendo respaldada por autores como Manuel Castells e Alain Touraine, no sentido de entender “a cultura, a
ideologia, as lutas sociais cotidianas, a solidariedade entre as pessoas de um grupo ou movimento social e o
processo de identidade criado” (GOHN, 2000, p.121). São movimentos caracterizados por sua natureza
reflexiva, com poder de persuasão e estão fortemente relacionados com a capacidade de influenciar a opinião
pública, produzir públicos e novas pautas de ação coletiva (LARAÑA, 1999; MELUCCI, 2001).
51
15
Em artigo publicado na revista Razón y Palabra (n.84, set/nov.2013) La participación ciudadana en al web
de Greenpeace: comunicación, discurso y emoción en la red, elencamos as características e conjunturas, que
para nós, tornam o Greenpeace um legítimo movimento social, tendo por base autores que conceitualizam a
problemática como Laranã (1999) (2001) e Melucci (2001).
52
além de “esclarecer as estratégias de poder destes novos movimentos da sociedade civil para
transformar a racionalidade dominante, incorporando os valores éticos e princípios produtivos
do ambientalismo” (LEFF, 2001, p.108). A nossa investigação, confluindo indiretamente com
a proposta do autor, está centralizada também em compreender a eficácia das propostas de
luta desse movimento plural, a força política real que pode exercer e como a comunicação, em
especial a virtual, auxilia nesse processo. Motes que trazem outras cogitações não menos
importantes relacionadas à identidade social dessas organizações, às influências na
sociabilidade e polêmicas como: São supervalorizados no contexto da luta ambiental na
contemporaneidade ou minimizados como grupos dispersos sem força política concreta ou
resultados práticos? (LEFF, 2001).
É fato que o rótulo do ambientalismo agrega diferentes campos de conhecimento,
atuação, princípios e perspectivas que buscam entender a articulação dos múltiplos processos
que integram o ambiente e as relações sociedade-natureza. (LEFF, 2001, p. 116). Formado
por propostas de equidade, sustentabilidade, diversidade, autogestão e democracia, o
ambientalismo, para Leff (2001), enquanto grupo organizado, chega até mesmo a reorientar os
objetivos e estratégias de outros movimentos sociais ou mesmo outras esferas da sociedade.
Isso porque, consegue reivindicar maior participação em assuntos políticos, tem táticas de
inserção em aparelhos do Estado, ao mesmo tempo em que atua de forma descentralizada,
com relações políticas horizontais, problematiza o conhecimento e as formas de
relacionamento e participação, com estratégias de comunicação e mobilização bastante
demarcadas. São grupos variados, que abarcam uma heterogeneidade de atores, que carregam
uma inerente transdisciplinaridade para tratar da preservação do meio ambiente - outro
conceito não menos difuso que traz diversas considerações 16 - e por muito tempo ficou
reduzido a questões de fauna e flora, não concebendo a interdependência necessária com
fatores sociais, econômicos e políticos.
Viola e Leis (1995), que estudam o ambientalismo desde sua fundação, propõem uma
concepção bastante ampla de movimento ambiental, que será retomada aqui. O
16
Em nossa dissertação de mestrado, Os paradigmas da imprensa na cobertura das políticas ambientais
(Unesp/2009), utilizamos Leff (2002) para definição de meio ambiente e pensamos pertinente retomá-lo para
entender um conceito implícito na biologia evolutiva e que foi importado por Lamarck da mecânica
newtoniana, mas atualmente é reduzido ao sistema de relações entre os diferentes indivíduos. O termo
ambiental aparece como um campo de problematização, que resultou em especialidades ou disciplinas
ambientais, que não necessariamente constitui um novo objeto científico. Neste sentido, as pretendidas
ciências ambientais são inexistentes e o conceito de meio ambiente passa a ter carga ideológica e é
ressignificado a cada contexto. Já Giddens (1991) (1994b), em uma avaliação comparativa situa a natural como
aquilo que é livre da intervenção humana e o meio ambiente como a natureza transfigurada pela ação do
homem e propõe pensar, então, no fim da natureza, já que ela foi totalmente socializada.
53
17
Giddens (1994a) (1991), com apoio de Beck e Lash (1994b), cita entre as consequências da modernidade, os
riscos produzidos, ou seja, aqueles que são resultados das intervenções humanas na natureza e nas condições
da vida social, que têm efeitos imprevisíveis e causam as incertezas, a constante preocupação com desastres
ecológicos, a fragilidade das circunstâncias e a reflexividade social/modernidade reflexiva (que acarreta
também na destradicionalização e na instabilidade das práticas sociais).
18
Conceito largamente utilizado que provém da expressão “Desenvolvimento Sustentável” definida
oficialmente no relatório da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento da ONU, ‘Nosso Futuro Comum’
(1991), e está relacionado a satisfazer as necessidades atuais sem comprometer a geração futura.
54
19
Sociedade civil como um espaço de disputa, lutas e processos políticos, base da vida social que no sentido
gramsciano, explicado por Bobbio (1999), envolve a esfera das relações entre indivíduos, entre grupos, entre
classes sociais, que se desenvolvem a margem das relações de poder que caracterizam as instituições estatais.
Compreende o escopo das relações econômicas, ideológico-culturais, toda vida espiritual e intelectual, suas
formas de organização espontâneas ou voluntárias. Mas a sociedade civil mantém relação intrínseca com o
Estado, inclusive atuando como seu conteúdo ético, enquanto o Estado é o reflexo da sociedade civil. Para
Gramsci a sociedade civil é sempre organizada, “representa o momento ativo e positivo do desenvolvimento
histórico” (BOBBIO, 1998, p. 55), embora ela esteja propensa aos valores e interesses hegemônicos.
55
Vale ressaltar que o Greenpeace, como uma ONG internacional com representação em
países com condições socioeconômicas diversas, coloca-se em uma situação peculiar, pois
atua de forma global, com temáticas e campanhas integradas internacionalmente, ao mesmo
tempo em que deve contemplar as diferentes nuances, performances, objetivos da preservação
ambiental em cada país, cultura, realidade social e política.
Ainda na questão ambiental, há o conflito de interesses e o campo político
heterogêneo, “onde se mesclam interesses sociais, significados culturais e processos materiais
que configuram diferentes racionalidades, onde o ‘ecológico’ pode continuar subordinado
(por razões estratégicas, táticas e históricas) a reivindicações de autonomia cultural e
democracia política (...)” (LEFF, 2001 p. 73). Um pouco mais adiante o mesmo autor destaca
que as demandas ambientais atuam também de forma multidimensional e estimulam a
participação democrática da sociedade não só no uso e no manejo dos recursos, mas também
na defesa do ambiente, nas críticas à economia de mercado, ao estilo de vida predatório,
propondo novas formas de desenvolvimento e uma mudança civilizatória.
O fato é que o movimento ambiental, pela sua multiplicidade e versatilidade, foi o que
mais questionou as condições presentes de vida. “Sob a chancela do movimento ecológico,
veremos o desenvolvimento de lutas em torno de questões as mais diversas: extinção das
espécies, desmatamento, uso de agrotóxicos, urbanização desenfreada, explosão demográfica,
poluição do ar e da água” (CASTELLS, 2000, p.12) Ele avalia ainda que não há setor de lutas
e reivindicações que o movimento ecológico não seja capaz de incorporar – daí a dificuldade
em precisar categoricamente esses movimentos. Portanto, pensando aqui nas organizações
ambientalistas (institucionalizadas ou não) com o propósito específico da defesa do meio
ambiente e da qualidade de vida, traçaremos mais algumas linhas menos conceituais e mais
históricas para adentrar o percurso dessas entidades.
A trajetória ambientalista remonta ao velho continente, como lembra Tavolaro (2001).
A primeira campanha pela proteção da vida selvagem de que se tem notícia se deu em defesa
das aves marinhas, que eram abatidas por caçadores, ao longo da costa de Yorkshire, na Grã-
Bretanha. Foi então que, em 1867, os residentes da área fundaram a Society for the Protection
of Seabirds, já fazendo uso de um jornal, no caso, o Times, para divulgar e ampliar a
campanha. A relação estreita e programada que o movimento ambientalista tem com a mídia
fica evidenciada desde esse primeiro momento. Mais tarde, as consequências da revolução
industrial também suscitaram a luta a favor do meio ambiente, ainda que de forma incipiente,
57
mas com duras críticas às formas de produção econômica, que resultavam em degradações
ambientais e sociais das mais diferentes maneiras.
Apesar de remontar séculos anteriores, a luta ambiental que nos interessa aqui ganha
força, especificamente, entre os anos 1950 e 1960, no significativo contexto pós II Guerra
Mundial, com os movimentos contraculturais povoando a cena política e colocando em pauta
a apropriação da natureza, a defesa dos recursos naturais, as formas de consumo e os modelos
de desenvolvimento econômico e social. Os impactos destrutivos da guerra acabaram,
inclusive, por revitalizar e orientar os atores sociais, especialmente no ocidente, pela
necessidade da reconstrução, da preservação ambiental, de novas formas de sociabilidade,
apostando na não violência, na cultura da paz e nas comunidades hippies. Nesse contexto, o
aniquilamento causado pela bomba atômica no Japão e os riscos dos testes nucleares
impulsionaram o movimento ambiental, inclusive a própria fundação do Greenpeace, que
surge justamente em manifestações contrárias a geração de energia nuclear.
Em 1962, a publicação do romance de Rachel Carson, Silent Spring (Primavera
Silenciosa), criou uma celeuma e deu relevância e abrangência à causa ambiental ao descrever
os efeitos dos agrotóxicos no meio ambiente e denunciar abertamente a degradação da
natureza, especificamente nos Estados Unidos. Com isso, teve origem a revolução ambiental
estadunidense, pautada pelo questionamento da civilização urbano-industrial, do crescimento
populacional e dos impactos devastadores na natureza, pregando o uso conservacionista de
recursos – demandas que refletiram significativamente em países da Europa, além de Canadá,
Japão até conquistar a América Latina (LEIS E VIOLA,1995).
Se antes a proposta ecológica estava restrita às elites dos países dominantes, afetadas
pela industrialização, foi a partir da década de 1960 que os ideais ambientalistas começam a
permear as classes populares e, com base na opinião pública, dão margem para a formação de
um movimento que, senão de massas, ao menos com uma amplitude considerável
(CASTELLS, 2000, p.154). Vale lembrar também que, nesse momento, vem ganhando corpo
a configuração da sociedade em rede, ao mesmo tempo em que se fala em uma condição pós-
moderna, que tem como fatores caracterizadores os elementos da cultura da mídia e do
espetáculo, que repercutem na trajetória do movimento ambientalista, e que vamos discutir na
sequência.
A problemática ambiental é alçada a fenômeno politicamente significativo a partir dos
eventos e conferências na área, que envolvem comunidades científicas, políticos, empresários
e setores da sociedade civil. A primeira delas foi a Conferência de Estocolmo, em 1972, que
58
ainda que reduzisse a questão a soluções técnicas, deu início ao aprofundamento crítico da
temática. “Problemas antes tomados como periféricos atingem o centro da cena política e
cultural, e questões antes menores começam a receber o status de categoria explicativa”
(FERREIRA E FERREIRA, 1995, p.13). Mas, no Brasil, as autoras explicam que a posição
desenvolvimentista era muito forte e a questão ambiental foi colocada como antítese do
desenvolvimento nacional, com isso, até o fim do regime militar as propostas ecologistas não
tiveram influência no debate político do Brasil. O avanço da problemática pelo mundo foi
respingando por aqui e ganhou uma dimensão global impossível de ser ignorada.
Um pouco antes de Estocolmo, em 1968, surgiu o Clube de Roma, que reuniu
diferentes personalidades políticas e acadêmicas, para discussão de problemas ambientais, e
culminou na célebre publicação “Os Limites do Crescimento”, pautando questões, até então
incomuns, como geração de energia, saneamento, saúde, crescimento populacional. A
organização continua ativa (www.clubofrome.org), publicando relatórios em parceria com
Unesco e OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Em 1972
também foi criado o Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente), mais tarde
em 1983, a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente da ONU, que publicou o relatório
‘Nosso Futuro Comum’ (1989), documento preparatório à Rio 92, trouxe as diretrizes
ambientais e definições de termos como Desenvolvimento Sustentável.
Mas foi a Comissão do Meio Ambiente para o Desenvolvimento Sustentável, a Rio 92,
o maior e mais importante evento ambiental que, de fato, deu visibilidade ao postulado do
desenvolvimento sustentável e da preservação ambiental em nível internacional. A
Conferência, considerada o boom do ambientalismo, impulsionou a criação das organizações
voltadas para a problemática. O próprio Greenpeace fixa bases no Brasil no contexto desse
evento, em 1992. As proporções foram gigantescas: participação de 35 mil visitantes, dois mil
representantes de governo, 179 chefes de Estado, sete mil jornalistas e pelo menos três mil
ONGs, no Fórum Global, evento paralelo para discussão das questões ambientais, atos de
mobilização e pressões nos governos. Com isso, a questão ambiental e, por consequência, os
movimentos envolvidos foram colocados nos holofotes da mídia. Os conceitos e propostas da
Rio 92, como o próprio desenvolvimento sustentável, gestão ambiental, Agenda 21, Carta da
Terra, Convenção Mudanças Climáticas e da Diversidade Biológica 20 se consolidaram como
20
Realizada de 3 a 14 de junho de 1992, no Rio de Janeiro, a Rio 92 buscou firmar compromissos e metas entre
os países participantes e, para isso, estabeleceu diferentes acordos como a Agenda 21 documento de
propostas para alcançar o desenvolvimento sustentável, e as convenções que traçam diretrizes, no caso, para
reduzir a emissão de substâncias nocivas na atmosfera e para proteger a biodiversidade.
59
21
Os dados do evento foram extraídos do site oficial: www.rio20.gov.br. O documento final, na íntegra,
encontra-se em http://www.rio20.gov.br/documentos/documentos-da-conferencia/o-futuro-que-queremos/.
60
parcerias governamentais, mas, por outro lado, pode apresentar estratégias altamente
midiatizadas, como bem colocam os autores.
pública sobre a degradação ambiental, com campanhas locais, por exemplo, combate à
poluição e preservação de ecossistemas naturais, sem aliar a temática social. O Greenpeace,
criado nesse contexto da década de 1970, fase fundacional das organizações, carrega as
reminiscências do período e faz das denúncias, ainda hoje, seu carro-chefe, mas podemos
avaliar que consegue superar a estrutura mais radical ao fazer petições, moções, projetos,
discussões, assim como estudos que evidenciam uma postura mais propositiva.
Já em 1980 os desafios mostraram-se mais amplos e incluíam a superação da pobreza,
a participação e o controle social do desenvolvimento. Na década seguinte, consolidadas em
bases mais humanas e profissionais, as organizações foram se aperfeiçoando e abrindo espaço
enquanto movimento consolidado, excedendo o âmbito da denúncia para atuar com propostas
políticas, objetivos bem definidos e maior influência na sociedade.
22
A transciplinaridade ambiental é evidenciada na obra de Leff (2002) como a inerente relação e integração das
questões ambientais com outras áreas do conhecimento. Nesse sentido, ele prega a necessidade, inclusive, de
uma epistemologia ambiental.
62
viáveis de preservação ambiental. “As entidades se capacitam cada vez mais para exercer uma
nítida influência sobre as agências estatais de meio ambiente, o poder legislativo, a
comunidade científica e o empresariado”.
Segundo Tavolaro (2001), com essa trajetória os grupos ambientais se consolidaram
como um movimento social e conseguiram se aliar a setores populares e adquirir uma
perspectiva mais ampla, não defendendo apenas o verde e regiões selvagens, mas também
ambientes urbanos que estão longe de serem intocáveis, e trazem à tona a tal “natureza
artificial” (TAVOLARO, 2001, p.132), o homem como parte desse meio ambiente, e os
problemas urbanos como um componente latente entre as reivindicações ambientalistas.
Neste cenário de diferentes qualificações e abrangência da causa, Tavolaro (2001)
aposta em um “novo” ambientalismo, já não tão novo assim, que emerge na modernidade, em
meio à artificialização intensa, abarca diversas vertentes e contextos, em um mundo complexo
onde também cabem mitos, sacralização e crenças imbricadas na própria dinâmica dos
fenômenos ambientais e, mais diretamente, nos temores de uma catástrofe natural. O processo
de racionalização, que está na base do mundo moderno, não trouxe apenas uma postura de
subjugo à natureza, como lembra o Tavolaro (2001, p.40), mas a “busca de um pretenso
equilíbrio no convívio humano com a natureza”. O movimento então, nas democracias
industriais avançadas, tem seu eixo reconfigurado para repensar o materialismo e o consumo
excessivo que caracterizam as sociedades modernas.
23
Castells (2000, p.155) descreve três tempos: o cronológico como aquele formato linear, característico do
capitalismo e dos sistemas industriais; o intemporal voltado para instantaneidade e eliminação de
continuidades, próprio do paradigma informacional e, por fim, o glacial como uma proposta altruísta. Trata-se,
grosso modo, de cuidar de nossos descendentes, como pressupõe o próprio conceito de desenvolvimento
sustentável – termo referência do movimento ambiental.
64
Com isso, Castells avalia que os ecologistas inspiram a criação de uma nova
identidade, fundamentada nas lutas sobre apropriação da ciência, do tempo e do espaço, ainda
que no âmbito de diversidade e contradições. “A cultura verde, na forma proposta por um
movimento ambientalista multifacetado, é o antídoto à cultura da virtualidade real que
caracteriza os processos dominantes de nossas sociedades”. (CASTELLS, 2000, p.160). O
autor continua acompanhando e analisando os diferentes movimentos da sociedade, e se
mantém fiel ao pensamento da estrutura da sociedade em rede que não só viabiliza como
facilita as mobilizações, induz novas possibilidades de democracia e alternativa política. A
Internet como um espaço de livre manifestação, que inaugurou uma era da comunicação
compartilhada, que iremos discutir com mais intensidade no próximo capítulo 24.
E o movimento ambiental soube se atualizar para difundir a causa, conseguir adeptos,
lançar manifestos, divulgar informações, propor formas de mobilização, por meio de portais,
redes digitais, plataformas multimídias. Neste contexto, temos uma arquitetura em rede que
possibilita um ativismo online, que, na opinião de Jacobi (2007, p.467), instrumentaliza o
alcance das novas tecnologias da informação, exerce pressão, cria consciência ambiental,
atuando local e mundialmente. As novas tecnologias e o trabalho em rede possibilitam,
especialmente, a publicização das problemáticas, aumentando, portanto, o grau de
legitimidade e credibilidade das ONGs, provoca e estimula o interesse da sociedade e também
de agências de financiamento, governos e empresas, que acabam por introduzir e dar destaque
à problemática em suas agendas. Na rede temos também a globalização da percepção dos
riscos. ONGs transnacionais, como o Greenpeace, exercem papel fundamental na
disseminação das informações e imagens em escala mundial, “fortalecendo a necessidade dos
riscos serem percebidos como globais, alertando sobre o seu alcance e a necessidade de
impedir que aconteçam” (JACOBI, 2007, p.467).
Essa perspectiva leva, inclusive, a idealizar a existência de uma sociedade civil
mundial, como colocam Vieira (2001) e Marzochi (2009), que seria forjada por organizações
internacionais como o Greenpeace, no decorrer das atuações e mobilizações, com abrangência
24
Em entrevista concedida à TV internacional da Rússia, em julho de 2012, e disponível em:
http://www.outraspalavras.net/2012/08/03/castells-quer-tecer-alternativas/ Castells fala sobre as redes de
indignação e esperança que são possibilitadas pelas tecnologias. Ele comenta a importância de movimentos
como os Indignados e os Occupy, que tiveram início em 2011, usaram a Internet como espaço livre de
comunicação ao mesmo tempo em que ocuparam os espaços públicos. Em julho de 2011, em um discurso para
os acampados em Barcelona (Espanha), Castells reforçou a ideia da comunicação como espaço de democracia e
poder, e falou sobre suas longas observações que mostram o quanto a autonomia comunicativa da internet foi
importante para organizar e ampliar as mobilizações sociais pelo mundo, e que esse processo não pode parar.
O discurso foi transcrito em http://www.outraspalavras.net/2011/07/18/castells-propoe-outra-democracia/.
65
e repercussão internacional. Uma sociedade internacional em uma esfera pública mundial, que
teria sido facilitada pelo trabalho das ONGs com status na ONU, pelas significativas e
diversas conferências, tratados mundiais, movimentos globalizados e antiglobalização, e
também pela difusão das redes eletrônicas. Mas essa arguição é delicada, uma vez que as
tensões próprias de cada nação, de cada estrutura sociopolítica permanecem, independente da
atuação em âmbito internacional organizações 25.
Por fim, é neste movimento, que não é único, mas carrega consigo uma multiplicidade
de proposições, diversidade cultural, diferentes associações, que integra uma cultura verde,
uma cultura ambientalista agora reconceitualizada no contexto das tecnologias da
comunicação, que se concentra nosso trabalho. O ambientalismo que parte para a rede
congrega um discurso próprio e estratégias de mobilização, ciberativismo, que se transformam
em componentes indispensáveis da nova luta ambiental. É preciso entender, porém, que esse
ambientalismo emerge na contemporaneidade, amparado por uma sociedade em rede, mas
também por outras nomeações não menos importantes como a condição pós-moderna, a
modernidade líquida, inconclusa, que situam o tempo, o espaço e as contradições da
denominada cibercultura, que tem seu lugar cravado a partir, principalmente, de 1960, e
acabam por caracterizar o âmbito dos movimentos ambientais na comunicação. Nas próximas
páginas pretendemos clarear essa paisagem.
25
Marzochi (2009, p.39) em sua tese de doutorado sobre a metamodernidade e contrapoder do Greenpeace
levanta questões como se é possível “considerar a existência, pelo menos empírica, de algum tipo de governo
ou governança global, como um conjunto entrelaçado de Estados, organizações multilaterais, ONGs
internacionais e nacionais, articulados por forças hegemônicas, que nos permita admitir a realização de uma
Sociedade Civil Mundial em torno desta constelação internacional de instituições?” Mas conclui que se a
sociedade civil e o Estado estão intrinsicamente ligados, como propõe Gramsci, se não existe um Estado
Mundial, tampouco é provável a definição de uma sociedade civil mundial, que abarque as diferenças culturais
e as representações politicas em escala global.
66
26
Giddens (1991, p.8) define a modernidade em período de tempo e espaço como “estilo, costume de vida ou
organização social que emergiram na Europa a partir do século XVII e que ulteriormente se tornaram mais ou
menos mundiais em sua influência”. Mas que passa por um período de transição que ocasionou as diferentes
abordagens da pós-modernidade, que ele não rejeita, mas prioriza a investigação da natureza da modernidade
(reflexiva) e suas consequências na vida social.
67
Aliás, Martins (2000, p.19) reconhece que o tema da modernidade está profundamente
comprometido com a ideia de progresso 27, mas não se pode escamotear o aspecto transitório.
“Modernidade é a realidade social e cultural produzida pela consciência da transitoriedade do
novo e do atual”. E, nesse cenário, o autor (2000. p.50) lança a ideia da modernidade
inconclusa e coloca inúmeras hesitações que são pertinentes reiterar, “é como se fossemos
pós-moderno antes mesmo de chegarmos a modernidade, há muito misturando numa colagem
desarticulada tempos históricos e realidades sociais”. O autor fala também em modernidade
anômala, por conta da falta de crítica, de autonomia em reconhecer que tudo é transitório,
passageiro; “é modernidade, mas sua constituição e difusão se enredam em referenciais do
tradicionalismo sem se tornar conservadorismo (…) estamos em face do inconcluso, do
insuficiente, do postiço” (MARTINS, 2000, p.54). Propostas que convergem com a
conceituação da pós-modernidade: uma crise que enfatiza o lado fragmentário, efêmero e
caótico, enquanto rejeita representar e exprimir o eterno e imutável (HARVEY, 2004, p.111).
O ambientalismo aflora uma sociabilidade característica desta modernidade
inconclusa, com estruturas complexas e contraditórias, como lembram Tavolaro (2001) e
Martins (2000), que trazem a natureza enquanto objeto de discussão, de debate, de decisão, de
reflexão, também como referência para relações e busca de identidade, balizando
comportamentos em um mundo agora midiatizado, onde as pautas ambientais são cada vez
mais constantes e ganham espaço na sociedade, inclusive para as relações sociais e
reprodução cultural. Esse momento de modernidade inconclusa propiciou diferentes
denominações que buscaram entender e clarear os confrontos da sociedade, como é o caso da
condição pós-moderna, proposta por Harvey (2004) e da modernidade líquida, delineada por
Bauman (2001), que trazem ainda mais densidade para a discussão do movimento ambiental e
mostram nuances importantes, principalmente no aspecto da visibilidade e transitoriedade dos
movimentos ambientais.
As grandes mudanças, em especial na qualidade da vida urbana, com intensos
processos sociais e tecnológicos, na década de 1960, exigiram novas conceituações, não
exatamente de uma superação total do moderno, mas de uma condição diferenciada e difícil
de definir exatamente, que representa “alguma espécie de reação ao modernismo ou de
27
O termo progresso é utilizado no fragmento acima como ideia positiva de avanço na sociedade,
melhoramento futuro, crescimento do bem-estar. Mas o conceito demanda diferentes interpretações,
dependendo do momento histórico e das correntes teóricas que não influem no contexto da nossa Tese, mas
que consultamos em Bobbio (2001). O progresso, que indicou o desenvolvimento da razão no início da
modernidade, entra em crise no século XX com as mudanças tecnológicas (que geram possibilidades e
precariedades) e com a proposta de um modelo que repense a natureza interior e exterior ao homem. “A fé no
progresso depende do tipo de valor que se escolhe como medida” (BOBBIO, 2001, p.1010).
69
afastamento dele” (HARVEY, 2004, p.19), também visto como uma exaustão moldada por
uma lógica cultural do capitalismo avançado. De fato, o ponto de partida para entender o pós-
moderno reside na sua relação com o moderno, entendendo a modernidade como o transitório,
o contingente, como a sensação avassaladora de fragmentação, efemeridade e mudança
caótica. Mas, aos poucos, na avaliação de Harvey (2004), o modernismo perdeu seu atrativo
de antídoto revolucionário e deu lugar a uma ideologia reacionária e tradicionalista, que fez
surgir os vários movimentos contraculturais e antimodernistas, que contestam essa realidade,
entre eles, o ambiental.
Nesse contexto, Harvey (2004, p.47) acata a proposta de condição (e não conceito),
pois é improvável definir se o pós-modernismo é um estilo, uma revolta, um conceito
periodizador dos anos 60 e 70, uma domesticação ou comercialização do próprio
modernismo, um fenômeno urbano marcado pela busca por sinais de posição, de moda ou
marcas de excentricidade individual. Ou, ainda, uma resposta às políticas neoconservadoras
em uma época de pós-industrialização.
Começo com o que parece ser o fato mais espantoso sobre o pós-
modernismo: sua total aceitação do efêmero, do fragmentário, do
descontínuo e do caótico (…) Mas o pós-modernismo responde a isso de
uma maneira bem particular; ele não tenta transcendê-lo, opor-se a e sequer
definir os elementos 'eternos e imutáveis' que poderiam estar contidos nele.
O pós-modernismo nada, e até se espoja, nas fragmentárias e caóticas
correntes da mudança, como se isso fosse tudo o que existisse (HARVEY,
2004, p.49).
Mais recentemente Harvey (2012 ab) reforçou suas ideias ao falar sobre a provável
falência do modelo capitalista e os movimentos atuais de contestação política 28, que refletem
a mobilidade e a fragmentação de forma ainda mais acentuada nos dias de hoje. Ele reitera
também a predominância da vida urbana, como fenômeno pós-moderno, e os grandes
impasses da contemporaneidade, na sua visão: desigualdade social e a degradação ambiental.
A condição pós-moderna ainda revela a perda de uma continuidade histórica, dos
valores e crenças, incluindo a falta de profundidade, da fixação nas aparências, nas superfícies
28
Em entrevista concedida na ocasião de sua visita ao Brasil, para lançamento da obra O enigma do Capital,
Harvey (2012) falou sobre a aceleração, acumulação do capital e da mobilidade das crises do capitalismo,
prevalecendo sua visão marxista. E ele não abandona, neste contexto, as premissas da condição pós-moderna
no que se refere à compressão do espaço e tempo, a insegurança e volatidade das relações. Em uma
coletânea, também de 2012, sobre os movimentos de protesto anticapitalistas, que tomaram as ruas em
diversas partes do mundo, a partir de 2011, denominados como Occupy, Harvey, apoiador das manifestações,
centralizou a problemática nas desigualdades sociais, na luta de classes (que persiste), na vida customizada e
antinatural, típicas da pós-modernidade, que precisam ser superadas com um modelo alternativo.
70
e nos impactos imediatos. Nessa mesma linha, Baumann (2001) denomina o período enquanto
modernidade líquida, metáfora que explica, com outras palavras, a fragmentação e a
efemeridade da presente fase histórica da modernidade. Ao contrário dos sólidos, os líquidos
não mantêm sua forma, são fluídos, não se prendem em espaço e tempo, não se atêm a
modelos fixos, modificam-se com facilidade, preenchem vazios por curto período.
Um dos pontos-chave da modernidade líquida é a questão das incertezas, do
esvaziamento e da individualização, em detrimento do coletivo. Apesar de aparentemente
manter a crítica, a sociedade está esvaziada, acomodada tanto no pensamento como na ação, e
existe, para Baumann (2001), a decadência do engajamento político. E, nessa conjuntura,
avaliamos que os movimentos ambientais querem subverter essa ordem, pregando novas
formas de participação, engajamento e ativismo, mas por meio de ferramentas tecnológicas
que estão, de certa forma, adaptadas a essa liquidez (agora, o indivíduo se mobiliza sozinho,
por meio do computador, por exemplo). Baumann (2001) esclarece que enquanto o cidadão
tenta buscar o bem estar comum, com uma causa também comum, o indivíduo tende a ser
morno, cético, sua atuação deve satisfazer apenas seus próprios interesses. Esse
individualismo permeia a questão ambiental, pois mesmo em processos que se pressupõem
interesses de cidadão, do bem comum, uma vez que as causas ambientais são em sua essência
altruístas, há uma tentativa de individualização, de responsabilizar o indivíduo, de exigir que
‘cada um faça sua parte’. Isso integra a tendência dessa modernidade que acredita que as
soluções, para parecerem razoáveis e viáveis, devem ser acompanhadas da individualização
das tarefas e responsabilidades, como explica Baumann (2001). O próprio Greenpeace tem
entre seus valores institucionais estimular atitudes individuais que promovam a solução dos
problemas ambientais.
E, nessa direção, não existe espaço para revoluções sistêmicas. “Ninguém ficaria
surpreso ou intrigado pela evidente escassez de pessoas que se disporiam a ser
revolucionários: do tipo de pessoas que articulam o desejo de mudar seus planos individuais
como projeto para mudar a ordem da sociedade” (BAUMANN, 2001, p.12). Percebe-se sim, e
vamos confrontar isso mais a frente, uma mudança conjuntural com a difusão das tecnologias
da comunicação e das redes digitais, atuando na articulação de manifestações e
reivindicações. Ainda que nem sempre massivas e sistêmicas, a Internet vem possibilitando
importantes mobilizações em torno de propostas pertinentes e emancipatórias. Todavia vale a
ressalva que essa sociedade líquida está caracterizada pelo consumo em todos os âmbitos,
inclusive nas causas que adere, no movimento que se associa, na própria identidade e na
71
comunidade/rede da qual faz parte. Existe uma nova denominação de comunitário que traz a
emergência da identidade, da proximidade, da ilusão de compartilhar um objetivo comum e,
assim, eliminar as incertezas do momento, mas que pode, na realidade, não ultrapassar o nível
da excitação e da performance (Baumman, 2001, p.229).
Mas do outro lado desse esvaziamento declarado por Baumann, uma característica da
contemporaneidade, colocada por Harvey (2004), que vem ao encontro dos movimentos
sociais, é o pluralismo pós-moderno, que dá voz e vez aos diferentes grupos, que são aceitos
como legítimos e autênticos. Visualizamos agora, de maneira mais declarada, a compreensão
da diferença e da alteridade e um potencial mais aberto aos movimentos sociais de diversas
ordens, entre eles o ambiental. Apesar da prevalência de características efêmeras e apolíticas,
Harvey (2004, p.53) cita justamente as tecnologias como responsáveis por abranger este
panorama ao oferecer novas possibilidades de informação, produção, análise e transferência
de conhecimento na condição pós-moderna. Essas aparentes contradições do momento
revelam as brechas da modernidade líquida: ao mesmo tempo em que podem não propiciar
grandes revoluções dão espaço significativo para pequenas revoltas, privilegiam o indivíduo,
mas colocam em destaque as comunidades, trazem como característica principal o
esvaziamento, contudo dão vez à pluralidade de vozes, permitem também que a luta ambiental
ganhe centralidade e se utilize de diferentes estratégias para colocar em pauta questões
importantes, possibilitando a reconfiguração das formas de mobilização e ativismo.
Leff (2001, p.119) avalia também que o movimento ambiental emerge no tal vazio
pós-moderno, mas consegue apropriar-se das condições do momento, transformando a
desarticulação e o esvaziamento das motivações em um novo saber ambiental, impondo novas
demandas, mobilizações cidadãs, lutas de resistência e questionamentos do modelo de
desenvolvimento, agora com armas novas, vindas da cibernética, substituindo “a construção
social de utopias por um jogo de realidades virtuais”.
informações, mas que oferece música e vídeos para serem baixados, jogos, prêmios, fotos,
hiperlinks, diversão, celebridades e inúmeras possibilidades midiáticas. E esse espetáculo
interativo em rede o Greenpeace bem conhece e oferece no seu portal institucional,
www.greenpeace.org.br. O espaço é multi/hipermidiático com conteúdos, histórico, os temas
que a organização atua, documentos para serem baixados, ícones das redes sociais e blogs,
seção Ciberativista com as petições online em vigor, espaço multimídia onde é possível ter
acesso a fotos, vídeos, jogos e gadgets, papeis de parede, notícias, vídeos, publicações
recentes com destaque para as principais campanhas da ONG em andamento, que, além de
explicações em textos e petições, trazem também vídeos e histórias ilustrativas, avatares e
banners para compartilhar. O espetáculo tornou-se um componente central dessa comunicação
em rede.
internauta por meio das ferramentas online, dos mapas interativos, dos dossiês, das petições,
dos comentários em blogs e nas redes sociais, e não se restringem a seu objetivo principal,
mas carregam uma carga lúdica, ilustrativa, espetacular. A título de ilustração lembramos que
a campanha do Greenpeace contra exploração de petróleo em Abrolhos, no sul da Bahia,
lançada em agosto de 2011, levou o nome de “Deixe as baleias namorarem”
(http://www.greenpeace.org/brasil/pt/O-que-fazemos/Clima-e-Energia/Abrolhos/) focando no
mote de que as baleias se reproduzem, normalmente, nas águas mais quentes daquela região.
Já a manifestação contra as alterações do Código Florestal, iniciadas em setembro de 2011, foi
denominada no portal e nas redes com o slogan irreverente: “Desliga essa motosserra!”
trazendo a participação de artistas, a difusão intensa pelo Facebook e Twitter, petições
enviadas à Câmara dos Deputados e ao Senado e, inclusive, com integrantes do Greenpeace
marcando presença em Brasília com uma motosserra inflável gigante.
(http://www.greenpeace.org/brasil/pt/Blog/codigoflorestal-acompanhe-ao-vivo/blog/38250/)
O espetáculo iniciado no ambiente online, em grande parte, ultrapassa as fronteiras e
se transforma em um terreno, no mínimo arenoso, para diferenciar o real do virtual, já que as
campanhas são alicerçadas em problemas concretos e visam um resultado efetivo. Ganham
espaço também nos meios convencionais, principalmente quando a ONG, dentro de sua
especialidade, consegue oferecer imagens impactantes e diferenciadas, gerar polêmica e
garantir com isso um espaço midiático. E ainda alcançam a esfera pública (LYCARIÃO,
2011).
Com esta leitura do movimento ambiental emergindo na condição pós-moderna, na
modernidade líquida, como ator urbano, adequado à cultura da mídia, mas ao mesmo tempo
com contornos políticos importantes, podemos sugerir que, se antes o espetáculo era um
elemento pacificador e despolitizador, que afastava de questões políticas reais, agora mostra
um novo viés. O espetáculo que permeou a mídia e a vida cotidiana, e evoluiu para uma
manifestação da tecnocultura e do infoentretenimento, como bem avalia Kellner, (2003), pode
sim ser utilizado com um propósito meramente mercadológico e de acomodação, mas mostra
que também é capaz de dar espaço a resistência, a novas vertentes, proporcionar discussão e
colocar em evidência assuntos de relevância.
O espetáculo como caracterizador dessa pós-modernidade indefinida, dessa liquidez,
pode ser necessário para dar visibilidade a determinados assuntos e conseguir a aderência de
uma sociedade já refém desses componentes. O Greenpeace compreendeu isso e, desde a sua
fundação, se adequou à cultura da mídia e ganhou bases por todo o mundo. Estamos diante de
77
Assim, ou com barco ou mesmo com barreira humana, continua Gabeira (1988, p.33)
montavam a cena para denunciar a barbárie, com dimensões cinematográficas, efeito de
batalha naval e “com auxílio da imprensa, usava-se o próprio impulso dos poluidores para
projetar internacionalmente seus feitos e provocar a condenação internacional”.
Gabeira (1988) admite que as expressões lírico, romântico, poético, utópico estiveram
ligadas à história do Greenpeace, até porque teve sua criação calcada em ideais pacifistas e
em lendas indígenas do ‘guerreiros do arco-íris’, mas acredita que se trata de um movimento
moderno (ou da condição pós-moderna) que soube se apropriar das estratégias da cultura da
mídia. “Uma das chaves da modernidade do Greenpeace foi saber transformar suas ações em
imagens, foi perceber mais rápido do que qualquer outra força que sem essa tradução em
imagens espetaculares as grandes batalhas da Ecologia não decolam, não ganham o espaço
público” (GABEIRA, 1988, p.103). A organização acompanha e faz uso de técnicas
avançadas de comunicação, como facilmente observamos hoje com as diferentes tecnologias.
Mantêm sites, blog, redes sociais e atua em um âmbito multi/hipermidiático, operando um
espetáculo ambientalista em rede com repercussões na prática e nos meios de comunicação
convencionais.
80
Mas Gabeira (1988) pondera que o cenário não ganharia os holofotes se não fossem
três fatores essenciais: a importância real das denúncias, o charme e perigo das aventuras
geográficas e a luta desigual que se estabelece entre os pequenos barquinhos e os grandes
navios, por exemplo, que traduz a guerra dos cidadãos contra os grandes poderes das
empresas poluidoras ou governos descomprometidos.
A cultura da mídia, caracterizada pela representação “produzindo novos modelos de
identificação e imagem vibrantes de estilo, moda e comportamento” (KELLNER, 2001, p.27),
é incorporada por organizações, que precisam ‘vender’ suas campanhas, conquistar
seguidores, apoiadores, e para isso, fazem uso de imagens atraentes, produtos diferenciados,
personagens reconhecidos, celebridades do mundo do cinema e da TV, buscando gerar o
interesse necessário para o cidadão acompanhar a problemática e dar o seu respaldo. O
Greenpeace apropria-se, de forma deliberada e planejada de elementos ardilosos do
espetáculo para se consolidar enquanto movimento ambiental, imprimir significados e valores
para o entendimento das problemáticas ambientais. Isso porque, a organização foi capaz de
compreender que existe uma cultura veiculada pela mídia, que passou a integrar a vida
cotidiana e que domina o tempo de lazer, modela opiniões e comportamentos sociais
contribuindo para a construção do senso de classe, etnia, raça (KELLNER, 2001, apud
MIGUEL, 2009), e aqui podemos incluir também para a formação do conceito de meio
ambiente. Vale lembrar que ao mesmo tempo em que induz os sujeitos a conformar-se com a
organização vigente da sociedade, a cultura da mídia também pode oferecer recursos para
favorecer a oposição, a resistência, o conhecimento da política ambiental, as reivindicações da
área. Assim, como explica Kellner (2001, p.21), tem-se tanto a possibilidade de um modelo
que pode ser um entrave para a democracia quando reproduz ideais conservadores,
consumistas, como uma proposta avançada quando traz uma causa importante a ser discutida,
socializada, lançada no debate político.
Castells (2001), que situa o movimento ambiental na sociedade em rede, faz uma
breve avaliação do Greenpeace em sua obra ‘O Poder da Identidade’ e chega a afirmar que o
ambientalismo é um dos maiores representantes das demandas contemporâneas. Ele acredita
que o perfil da organização abarca três pontos nevrálgicos, sendo o primeiro a noção de
desaparecimento da vida no planeta, com base em uma lenda indígena norte-americana, da
etnia Cree, que traz a mensagem: “Quando a terra cair doente e os animais tiverem
desaparecido, surgirá uma tribo de pessoas de todos os credos, raças e culturas que acreditará
em ações e não em palavras e devolverá à Terra sua beleza perdida. A tribo será chamada de
81
'guerreiros do arco-íris’” 30. O segundo ponto é a atitude de testemunha dos fatos como
princípio para ação e estratégia comunicativa. E o terceiro é voltado para um comportamento
pragmático, do tipo empresarial, de abandonar a discussão filosófica e partir para medidas
práticas, independente de governos, com campanhas específicas em torno de metas palpáveis
e buscando atrair a opinião pública. É uma organização ao mesmo tempo altamente
centralizada e descentralizada, com ações integradas e específicas, presente em 40 países,
atuando na perspectiva de problemas globais e mobilizando-se em torno “do princípio da
sustentabilidade ambiental como o preceito fundamental ao qual devem estar subordinadas
todas as demais políticas e atividades”. E completa, na sua perspectiva otimista: “os
guerreiros do arco-íris atuam nas fronteiras entre ciência a serviço da vida, a formação de
redes globais, a tecnologia da comunicação e a solidariedade entre gerações” (CASTELLS,
2000, p.151).
O autor avalia ainda que o Greenpeace é fortemente focado e não dá tanta abertura ao
diálogo com outros grupos ambientais ou com filosofias diferentes, veem o Estado-Nação
como o maior obstáculo ao desenvolvimento sustentável, buscam respostas práticas,
imediatas, compromissos, atuam com lobby, com a criação de eventos que mobilizam a
opinião pública e exercem pressão sobre as autoridades, buscando a resolução específica dos
problemas, superando as formas tradicionais de políticas. O grande respaldo social
conquistado se dá por conta da legimitidade das questões levantadas, relacionadas diretamente
a valores humanistas, a uma causa nobre de sobrevivência, coloca Castells (2000).
A organização soube utilizar a seu favor as estratégias de comunicação e está na
vanguarda das TICs (Tecnologias da Informação e Comunicação) para planejamento e
execução da causa. Com isso, podemos visualizar de antemão que o impacto de movimentos,
como o Greenpeace, tem relação direta com o uso eficaz de um discurso próprio, amparado
pelas tecnologias e que garante presença marcante na mídia.
30
A mensagem é colocada por Castells (2000, p.150) e consta também no portal www.greenpeace.org.br, com
poucas diferenças de tradução.
82
cofundadores da ONG, é certo que o estilo guerrilha da paz conseguiu mudar o modo como as
pessoas pensam o mundo à sua volta.
De fato, trata-se da maior instituição ambientalista do mundo, atuando em todos os
continentes, que se autodeclara como um movimento universal, constituído por cidadãos do
mundo. Conta com escritórios em 40 países, 2.500 funcionários, quase quatro milhões de
colaboradores (entre voluntários, ativistas e financiadores), e três embarcações para
monitoramento, pesquisa e ações de mobilização (Rainbow Warrior, Artic Sunrise e
Esperanza). Entre os valores declarados pela organização estão: 1. Independência, anunciando
que não aceita doações de governos, empresas ou partidos políticos, sendo financiada pelos
mais de três milhões de colaboradores de todo o mundo 31. 2. Não violência e confronto
pacífico, buscando chamar a atenção do público para a problemática ambiental. 3.
Engajamento, na perspectiva de mudanças de atitudes individuais para colaborar, enfrentar os
problemas e promover soluções. Internacionalmente, as linhas de atuação são: Mudanças
Climáticas, Florestas, Oceanos, Agricultura, Poluição, Nuclear, Paz e Desarmamento. No
Brasil os eixos principais são: Amazônia, Clima e Energia (GREENPEACE
INTERNATIONAL; GREENPEACE BRASIL, 2012).
A base internacional da ONG está situada em Amsterdam e é comandada por um
conselho de administração que define as prioridades de atuação, o planejamento e execução
das campanhas. A estrutura internacional é responsável pela destinação de recursos
financeiros, monitoramento do desempenho global do Greenpeace, inclusive financeiro, pelo
aporte à política organizacional, concessão da marca, e também dá suporte à captação de
recursos. Integra um programa de transparência na prestação de contas, atua com uma carta de
responsabilidade internacional que fixa valores e funcionamentos, baseia-se em boa
governança e gestão compartilhada, por isso passa por auditorias externas e torna público os
relatórios financeiros anuais, disponíveis no portal do Greenpeace em cada país. As
campanhas principais são definidas no Greenpeace Internacional para todos os escritórios,
31
Há controvérsias com relação à tão proclamada independência financeira. Matéria publicada no blog
Libertad Digital e reproduzida em diversas mídias no Brasil, acusa o Greenpeace de receber, por meio de
fundações, recursos de grandes magnatas norte-americanos do setor petrolífero, automobilístico e da cadeias
de comunicações, como de Ted Turner da CNN e da família Rockefeller, controladora, entre outros, da Exxon
Mobil. Segue nas referências. A ONG, segundo informa em missão e valores, não recebe dinheiro de governos
ou órgãos multilaterais como ONU, Comunidade Europeia, mas aceita doações de fundações e organizações
não governamentais independentes. O incentivo à doação financeira de pessoas físicas, como apontamos no
Capítulo I, recebe grande atenção do Greenpeace no portal, com banners, destaques e página específica para
fazer a doação financeira por meio da Internet.
84
mas os argumentos nacionais podem ser diferentes, assim como as atuações locais,
preferencialmente, em complemento às campanhas globais.
Segundo o relatório financeiro mundial da organização, o Greenpeace Annual Report
(www.greenpeace.org/international/en/about/how-is-greenpeace-structured/reports/), que
relaciona os investimentos realizados em 2012 com campanhas, estruturas, profissionais e
outras frentes de ação, os contribuintes individuais, quase três milhões de pessoas, doaram o
equivalente a 264 milhões de euros, 9% a mais que em 2011. A título de comparação, vale
lembrar que na década de 80, segundo dados de Gabeira (1988, p.90) esse valor nao
ultrapassava os 20 milhões de dólares anuais. Os maiores contribuintes atualmente estão na
Europa, em especial, Alemanha, Holanda, Suíça, França e também nos Estados Unidos. Os
recursos do Greenpeace internacional foram investidos primeiramente em suporte
organizacional, seguido da campanha Clima e Energia e das operações marinhas. O quarto
maior valor (entre 12 frentes de investimento) foi aplicado no setor de mídia e comunicação.
As rede sociais digitais ganharam papel de destaque no relatório, contabilizam 24 milhões de
seguidores que se mobilizam, participam e colaboram com a organização por meio,
principalmente do Facebook e do Twitter. No Brasil, documento do mesmo período,
Relatório Anual 2012, (issuu.com/greenpeacebrasil/docs/relatorio_anual_2012_greenpeace),
aponta que 59% dos recursos provém do Greenpeace internacional, que agregados às doações
nacionais dos associados, totalizaram 21 milhões de reais, que foram empregados nas
campanhas, no relacionamento com os colaboradores, na própria manutenção e na informação
pública e difusão.
A organização estabeleceu sede por aqui a partir da década de 1990, mais fortemente
no impulso da Rio 92, apesar da ata de fundação datar de 20 de setembro de 1990. No dia 26
de abril de 1992, aniversário da explosão da usina nuclear de Chernobyl, o navio do
Greenpeace Rainbow Warrior zarpou para um protesto em Angra dos Reis, marcando
oficialmente a inauguração do Greenpeace no Brasil. Antes disso, porém, já vinha fazendo
denúncias sobre o lixo tóxico produzido e comercializado no Brasil por empresas como a
Produquímica. Também em 1992, a ONG deu início à investigação sobre exploração ilegal e
predatória de madeira na Amazônia, direcionando o trabalho para as problemáticas locais.
Logo depois, entre 1995 e 1999, iniciou a mobilização a favor de energia renováveis e contra
os transgênicos. Na sequência, já em 2000, a campanha contra tóxicos denunciou diferentes
empresas por contaminação de solo e água. Posteriormente, produziu guias para o consumidor
sobre as empresas que utilizam organismos geneticamente modificados, realizando campanha
85
32
Em matéria publicada no jornal O Estado de S.Paulo, em 24 de junho de 2012, Kumi Naidoo, que participava
da Rio+20, comenta a mudança de perfil da organização. Consta nas referências. Mas vale ressaltar que a
própria expansão do Greenpeace na década de 90, com atuação em países pobres da América Latina e África já
trouxe a preocupação com o social, até então relegada ao segundo plano por concentrar as atividades apenas
em países desenvolvidos. No Brasil, por exemplo, a ONG desenvolve trabalhos com indígenas e comunidades
carentes.
86
em ações burocráticas, propostas de políticas públicas e lobbies com governos, mas não
abandona as ações espetaculares, como os protestos em alto mar e as ações polêmicas que
rendem apelo midiático 33.
Todo esse percurso da organização nos permitiu não só justificar a escolha do
Greenpeace para ilustrar o entendimento da comunicação dos movimentos ambientalistas em
rede, como propõe nossa tese, mas também esclarecer o contexto estudado, levantar pistas,
indagações que nos prepararam para adentrar o âmbito das tecnologias da informação e
comunicação e a seara do discurso. As próximas fases do nosso trabalho serão planejadas
considerando, mais uma vez, Castells (2000, p.95), que coloca que os movimentos sociais
devem ser entendidos em seus próprios termos: as práticas discursivas são sua autodefinição,
contradições estruturais existem, mas a pretensão não pode ser interpretar a ‘verdadeira’
consciência dos movimentos.
Os movimentos sociais contemporâneos estão imersos nas TICS e ampliam o alcance
das lutas por meio das diferentes possibilidades de comunicação, mobilização e participação
do contexto tecnológico. Nossa tarefa seguinte é justamente abarcar o universo das
tecnologias, seus impactos, clarear o cenário da cibercultura e conjecturar sobre as propostas
de colaboração e ativismo em rede. Trabalhamos com a ideia de uma cibercultura que se
funde e confunde com a própria cultura contemporânea, e que em todas suas esferas encontra-
se afetada pelas influências tecnológicas.
33
Em setembro de 2013, 30 ativistas do Greenpeace foram presos na Rússia, acusados de vandalismo, após
realizarem um protesto em alto mar com o navio Artic Sunrise, na tentativa de estender uma faixa na
plataforma de petróleo Gazprom. Foi então desencadeada uma repercussão internacional, com mobilização
pela libertação dos ‘30 do Ártico’, entre eles a brasileira Ana Paula Maciel, com mais de 800 protestos em 46
países e três milhões de e-mails enviados para a embaixada russa. Os ativistas foram soltos dois meses depois
e anistiados de todas as acusações (http://www.greenpeace.org/brasil/pt/Noticias/Anistia-aos-30-do-Artico/).
87
34
Consideramos a concepção sintetizada por França (1995), que toma por base autores como Simmel e
Maffesoli, que desenvolveram conceitos de sociabilidade. A autora avalia que os meios de comunicação
inauguram uma nova (ou distinta) sociabilidade, com diferentes cenários, atores, linguagens, reordenamento
do espaço. A sociabilidade se amplia, vai além da tendência a se associar ou de construir um processo comum,
e entra aqui a proposta de Simmel de entendê-la como forma lúdica, marcada pela inexistência de fins práticos.
“Dentro do campo da sociabilidade, os indivíduos se comprazem em estabelecer laços, e esses laços têm em si
mesmos sua razão de ser” (FRANÇA, 1995, p.60). Enquanto Maffesoli traz a abordagem da sociabilidade para a
ordem do afetivo, do sensível e do efêmero, anulando seu fim pragmático. Este panorama da sociabilidade
como algo intangível ‘irreal’ se enquadra no entendimento que buscamos das TICs e seus processos, que são
justamente marcados pela diversidade, pelas experiências, pela linguagem, por toda uma atmosfera simbólica,
lembrados pela autora no contexto dos estudos das interações comunicativas.
88
35
O relatório L'informatisation de la société, elaborado pelos funcionários franceses Simon Nora e Alain Minc,
foi publicado em 1978, e inaugurou a preocupação sobre a crescente informatização da sociedade. Na obra, se
lança o termo telemática, que une informática e telecomunicações para se referir ao processo de
informatização à distância. O relatório foi traduzido no Brasil. NORA, Simon & MINC, Alain. A informatização da
sociedade. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1980.
89
36
O conjunto da obra A Era da Informação: Economia, Sociedade e Cultura, inclui os volumes ‘Sociedade em
Rede’, ‘O Poder da Identidade’ e ‘Fim do Milênio’. No primeiro livro sobre a sociedade em rede, Castells (1999)
traça um panorama da revolução das tecnologias da informação e comunicação, a partir da década de 70, do
ciclo de realimentação cumulativa entre inovação e uso das tecnologias, e a influência desses processos no
desenvolvimento social e econômico, no mercado de trabalho e, obviamente, na comunicação, forjando um
capitalismo informacional. E é nesse contexto que Castells (1999) emprega o termo cultura da virtualidade real,
evidenciando que realidade e virtualidade são sempre mediadas por símbolos e representações. Ainda na
esteira de McLuhan, o autor coloca os equipamentos eletrônicos, e em especial os computadores, como
amplificadores e extensores da mente humana. Todas essas questões foram reiteradas e atualizadas pelo autor
em obras posteriores. Suas releituras e propostas mais recentes trazem um viés de comunicação, poder e
mobilização que nos interessa sobremaneira e são usadas preferencialmente no presente capítulo.
90
A sociedade em rede, como aquela marcada pelos nós interconectados, que atuam de
acordo com os programas da rede e de sua interação com outros nós, que se renovam, são
eliminados e substituídos, conforme a necessidade é reiterada por Castells (2011) em obra
mais recente. Na vida social, essas redes são estruturas comunicativas complexas, que se
adaptam ao entorno operativo, com objetivos que garantem a unidade de propósito e a
flexibilidade, e são programadas pelos próprios atores sociais. Mas as redes não são uma
forma específica das sociedades contemporâneas ou mesmo da organização humana, são
estruturas de organização e interação sociais fundamentais da vida, e que sempre existiram.
Hoje, porém, ganham centralidade pela dinâmica das tecnologias. “Uma sociedade em rede é
aquela cuja estrutura social está composta de redes ativadas por tecnologias digitais da
comunicação e da informação, baseadas na microeletrônica” (CASTELLS, 2011, p.51,
tradução nossa). E com base nessa conjuntura que lançamos mão da expressão comunicação
em rede para nortear nossa Tese.
As práticas em rede se baseiam em fluxos de informação processados pelas
tecnologias da comunicação, entre o internauta, as redes e os diferentes lugares. Trata-se de
um espaço de fluxos que une “os lugares em que se localizam as atividades (e as pessoas que
as executam), as redes de comunicação material que vinculam essas atividades, e o conteúdo e
a geometria dos fluxos de informação que desenvolvem as atividades em termos de função e
significado” (CASTELLS, 2011, p.63, tradução nossa).
Ainda neste contexto de mudanças sociais, convém abarcar também a obra profética
de Tofler (2005) 37, que narra um cenário em que foi decretada a morte do industrialismo para
ascender uma nova civilização que ele denominou enquanto a Terceira Onda, que desafia
todas as velhas pressuposições, apresentando novas relações geopolíticas, estilos de vida e
modos de comunicação, proporcionados pela tecnologia. Enquanto a primeira onda, da fase
agrícola, perdurou até século XVII, quando se inicia a fase industrial que ocupou centralidade
por pouco mais de 300 anos, a terceira onda se forma em poucas décadas. A característica
desta onda é justamente o avanço tecnológico e das telecomunicações, a chamada infosfera -
canais de comunicação que formam a arquitetura da sociedade contemporânea.
Essas modificações influenciaram, inclusive, a visão de natureza lembra o autor. A
segunda onda foi marcada por uma posição da “industrealidade” (TOFLER, 2005, p. 115) que
pregava a exploração da natureza por trás de uma proposta ubíqua de progresso. Já a terceira
onda, coloca em evidência movimentos, como o ambiental, que alertam sobre os processos de
37
A primeira edição da obra A Terceira Onda do norte-americano Alvin Tofler, a qual nos referimos, é datada
de 1980.
91
destruição para evidenciar uma proposta de relações ecológicas mais equilibradas, que
minimizam impactos e pregam o resgate do natural.
A força motriz desse espaço de fluxos que é capaz de dissolver o tempo e desordenar a
sequência dos acontecimentos e conhecimentos, subverter a noção da simultaneidade, e
congregar diferentes meios e canais em uma proposta de convergência midiática é a Internet.
Castells (2003, p.277) a define como “estrutura organizativa e o instrumento de comunicação
que permite a flexibilidade e a temporalidade da mobilização”. E complementa de forma
pragmática, em obra mais atual (2011) como uma rede de comunicação utilizada para
intercambiar documentos de todos os tipos como textos, sons, vídeos, imagens, noticias,
mensagens. Ou seja, uma plataforma de difusão para o entretenimento, para tarefas
profissionais e até mobilização política e práticas de totalitarismo. Nessa mesma linha ela é
entendida como um sistema informativo ampliado, com possibilidades multimidiáticas e de
convergências. Um mega-ambiente de conexões via computadores (LYCARIÃO, 2011;
GOMES, 2011). Ou ainda, como prefere Kerckhove (2008), deve ser vista como a imprensa
submetida à aceleração da eletricidade 38.
O surgimento da Internet é relativamente recente, e adquiriu uma dimensão
inicialmente não planificada e um tanto caótica, que envolve especialistas, a contracultura
libertária da filosofia hacker, pesquisa militar e universitária. O excesso de trabalhos e dados
sobre a Rede nos limita aqui a contextualizar em poucas linhas seu histórico, que tem como
embrião a revolução da microeletrônica e as realizações da cibernética, que acontecem nas
décadas de 1950 e 1960. A cibernética trazia uma ampla discussão sobre a relação entre
38
Apesar das vantagens e qualidades inovadoras da Internet, que são levantadas prioritariamente nesta tese,
não podemos perder de vista que a rede suscitou uma sociedade de controle, como coloca Silveira (2012), mais
sofisticada, que se compõe por protocolos que definem como receber, utilizar e enviar informações, além de
armazenar os chamados rastros digitais, ou seja, todas as ações realizadas em rede. “(...) a crescente
interatividade entre os indivíduos se dá a partir de intermediários tecnológicos baseados em arquiteturas de
controle” (SILVEIRA, 2012, p.109). Powell (2012, p.9), na mesma perspectiva, enfatiza que a maioria dos textos
sobre Internet cita a arquitetura e os valores abertos, democráticos da rede, mas as formas, a própria
experiência de uso e os padrões técnicos mudam, os países se tornam mais interessados na regulamentação e
censura dos fluxos, os setores econômicos vislumbram possibilidades de ganhos mais diretos, e os padrões
legais são alterados no sentido de gerar mais controle. A denúncia de espionagem norte-americana, divulgada
em agosto/setembro de 2013 é um exemplo significativo desse controle e de formas como esse
monitoramento pode afetar, inclusive, a soberania das nações. Por isso mesmo que Castells (2011), veremos
no decorrer deste trabalho, afirma com propriedade que o poder está diretamente relacionado à criação de
redes na contemporaneidade.
92
organismos vivos e máquinas/ modelos mecânicos 39. No final da década de 1960, com a
criação da Arpanet (Agência de Projetos de Investigação Avançados) pelo Departamento da
Defesa dos Estados Unidos para combater a ameaça da tecnologia soviética, foram
desenvolvidos sistemas operativos que permitiam aos programadores/usuários interatuar
diretamente com os computadores. A Internet passa a existir mais especificamente em 1969,
mas somente depois de 20 anos que se propaga, impulsionada pelas mudanças de
regulamentação, difusão dos computadores pessoais, programas de software mais
simplificados, criação da World Wide Web, por Tim Berners-Lee, e dos protocolos de
comunicação (RHEINGOLD 2004, CASTELLS, 2011; RUDIGER, 2011a). A metáfora da
teia (web) que liga informações, pessoas, processos foi muito apropriada.
Na década de 1990, as redes eletrônicas entre os computadores pessoais e a
transformação das ferramentas de informação em recurso ordinário possibilitaram
desenvolvimento de criações comunicativas, construções coletivas, realidade virtual, e a
Internet toma impulso como plataforma de comunicação cotidiana, como lembra Rudiger
(2011a). E o epicentro do processo é o computador pessoal, ligado às redes informáticas. É
nesta fase, com o crescimento da web e o consequente aumento da demanda social por
tecnologias e comunicação, que movimentos, organizações sociais, entendendo o alcance das
redes, passam a integrar e se adequar à rede mundial de computadores. O Greenpeace, por
exemplo, lança sua primeira página eletrônica no Brasil em 1994. Nosso posicionamento aqui
é entender a Internet/web enquanto rede das redes, propiciada, produzida, distribuída e exibida
pela máquina computacional (no caso o computador em si entre outras plataformas
derivadas). No interior desta máquina em rede, que agrega atributos de outros meios, pulsam
formas de comunicação que podem ser definidas como mídias digitais/em rede/online 40.
39
Norbert Wiener é um dos pioneiros a esclarecer a cibernética, como ciência da pilotagem, e desenvolve uma
teoria geral sobre sistemas tecnológicos de comando, visualizando processos informáticos descentralizados e
interativos (MATTELART, 2006), ou seja, não há mais controle central ou hierarquia para tomada de decisões. A
obra de John von Neumman, The Computer and the Brain (1958), também integra esse entendimento com a
abordagem do funcionamento do computador e suas conexões com os fundamentos do cérebro.
40
Para o propósito da definição de mídia digital nos apoiamos em Santaella (2008) que evidencia a ampliação
da palavra mídia e sua utilização tanto no contexto de comunicação de massa, como de transmissão de
informação e publicidade, mais recentemente se referindo aos meios eletrônicos e “incluindo aparelhos,
dispositivos ou mesmo programas auxiliares da comunicação” (SANTAELLA, 2008, p.62). A generalização do
termo se faz necessária e não nos incomoda, mas para indicar os processos de comunicação mediados por
computador, com proposta de interação e interatividade preferimos pensar em comunicação em rede e redes
sociais digitais. Apesar de identificá-lo em uma vertente muito mais mercadológica, faremos uso
eventualmente do termo mídias - digitais, online, em rede, usando os complementos como um item
diferenciador e até mesmo explicativo.
93
Mais recentemente a web 2.0, 3.0, as redes sociais digitais, a utilização dos celulares
como dispositivos de comunicação móveis dão o tom das tecnologias atuais. Sanchez (2012)
fala em tecnologias da Internet, e explica que enquanto a 1.0 facilitava os processos
cognitivos de comunicação, em virtude da relação com o hipertexto, a 2.0 cria base para
desenvolvimento de processos comunicativos e interativos, embasados em plataformas
sociais. “A web 2.0 refere-se a uma série de aplicações e páginas da Internet que utiliza da
inteligência coletiva para proporcionar serviços interativos em rede, ao mesmo tempo em que
permite ao usuário o controle de seus dados”(SANCHEZ, 2012, p.80). O modelo 2.0 traz
como característica principal a colaboração com outros usuários, participação em grupos,
criação e compartilhamento de conteúdos, capacidade de influência na computação social.
Entre os exemplos desse fenômeno, Sanchez (2012) cita as redes sociais digitais (como
Twitter e Facebook), as páginas wikis, blogs, serviços de alojamento de vídeos, de
intercâmbio de documentos. Já a web 3.0 41, ainda em concepção, funcionaria a partir de uma
inteligência artificial, como uma entidade onipresente que facilitaria os processos de
comunicação sem sequer precisar da intervenção direta do usuário. Mas a web 2.0,
proclamada por Tim O´Reily, como lembra Ugarte (2007, p.115, tradução nossa) que,
aparentemente, põe fim à velha divisão produtor/consumidor, pode se mostrar uma farsa.
Pretensamente democrática, oculta um filtro que carrega inclinações próprias de identidade do
pequeno grupo de usuários mais influentes ou da oligarquia participativa, que impõe certa
linha editorial ou mesmo controle ideológico (UGARTE, 2007). E aqui lembramos das
próprias corporações econômicas que dominam a web com uma proposta de cultura
participativa. Cotarelo (2010) segue na linha crítica e afirma que, muitas vezes, o modelo 2.0
fica restrito a quem tem não só recursos econômicos, mas tempo e qualificação para intervir.
A possibilidade de desenvolver práticas colaborativas, participativas em rede também pode
estar sendo supervalorizada, pois avaliando empiricamente o uso cotidiano da Internet temos
um cenário, predominantemente, de troca de banalidades e de uso funcional por parte dos
usuários.
O fato é que qualquer estrutura informacional se depara com relações de poder, certo
controle e desafios de participação (que iremos discutir mais a frente), e isso não é diferente
na comunicação em rede do Greenpeace, que é o foco da nossa investigação Mas a dinâmica
41
Ugarte (2007) fala também em web 2.1, terminologia que não encontramos em literatura nacional, como um
incremento da 2.0, focada na coprodução. Na definição do autor, refere-se a uma rede de bricolagens, que
reúne usuários dispostos a criar, publicar, compartilhar, reciclar os materiais próprios e alheios. Também se
discute, nesse argumento, o desenvolvimento de uma web semântica.
94
42
As ideias de Castells foram extraídas de seu discurso ‘Comunicação, poder e democracia’, pronunciado aos
indignados da Espanha, na Praça Catalunha, Barcelona, em 2011. O evento está disponível em
http://www.youtube.com/watch?v=2nWa32CTfxs, pelo coletivo Villaweb, consta nas referências.
96
43
E aqui vale entender a diferença entre técnica e tecnologia. Enquanto a técnica corresponde às atividades
práticas diversas (do original grego tekhnè) o saber fazer humano que pode ir desde a elaboração de leis às
belas artes; a tecnologia é a técnica moderna, ou melhor, atividade técnica resultante de ciência aplicada. A
técnica moderna teria como base “um modo de produção provocante da natureza” (LEMOS, 2004, p.33) que
naturaliza os objetos técnicos e se funde com a ciência, compondo o que conhecemos hoje como tecnologia.
“Enquanto a técnica é um saber fazer, cuja natureza intelectual se caracteriza por habilidades que são
introjetadas por um indivíduo, a tecnologia inclui a técnica, mas avança além dela” (SANTAELLA, 2008, p.152)
Ainda podemos recorrer a Ortega y Gasset (1987) que se referia à técnica do artesão e à técnica como ciência
pura.
98
de McLuhan (2002), que já avaliava que os meios não são meramente substituídos, mas se
renovam, se adaptam, são influenciados por modos e gêneros anteriores.
Para Sodré (2010), inédito mesmo é o armazenamento de grande quantidade de
informação e sua acelerada transmissão jamais vistas na história, com a virtual anulação do
espaço, novos canais de distribuição, a própria digitalização da simulação, e uma certa ilusão
de ubiquidade humana. Estamos diante de um quarto bios 44, na proposta do autor,
caracterizado pela tecnocultura, pela midiatização, e pela consequente multiplicação das
tecnointerações setoriais, “uma espécie de prótese tecnológica e mercadológica da realidade
sensível” (SODRÉ, 2010, p.21). Ele alerta ainda que as tecnologias não podem ser vistas
como meros canais de informações e sim como dispositivos geradores do real.
As tecnologias provocaram um novo modelo de visibilidade pública, impulsionada por
um outro espaço-tempo social e pela velocidade do fluxo, e um certo individualismo de
grupo, ou seja, as pessoas buscam, agora, modalidades individualistas de representação ao
invés de associações, sindicatos ou partidos políticos, por exemplo, o que o autor classifica
como “epifenômeno da individualização generalizada da sociedade contemporânea” (SODRÉ,
2010, p.40). Neste ponto, Castells (2011, p.176, tradução nossa) fala sobre o individualismo
como uma característica inerente da sociedade em rede.
44
Sodré (2010), em sua obra, propõe mais um ‘bios’ entre os modos de vida identificados por Aristóteles.
Segundo a tríade original do filósofo, o primeiro deles é o bios theoretikos (da vida contemplativa), na
sequência o apolaustikos (da vida prazerosa) e o terceiro como o bios politikos (da vida política). A vida
midiatizada, que inclui a realidade tecnológica do virtual, seria, portanto, o 4º bios (bios midiático), que implica
em “uma redescrição da realidade tradicional pelo pensamento que incorpore a nova ordem tecnológica, e a
experiência do individuo com o mundo virtual (...)” (SODRÉ, 2010, p.255).
99
incluímos o Greenpeace, são o ‘netocratas’ da rede, que não tomam decisões sozinhos, mas
apostam em sua trajetória, prestígio e identificação para propor ações comuns (UGARTE,
2007, p.36, tradução nossa).
Estas questões remetem às temáticas da participação, do ativismo, do uso das redes,
que serão discutidas com mais propriedade nas próximas etapas. Por enquanto, nos
preocupamos em entender a cultura moldada pelas tecnologias, ou melhor, a cibercultura que
apresentamos no próximo item.
Começamos por entender cibercultura como uma cultura contemporânea, que emerge,
por volta da década de 1960 e, portanto, é moldada pelas tecnologias. Não se trata aqui de
manifestações apenas restritas ao espaço virtual, mas de novas formas de sociabilidade
pautadas pelas influências tecnológicas. A interpretação do universo se dá pelas lentes do
prefixo ciber, e o próprio movimento ambiental, cada vez mais agregado e condicionado às
TICS, coopera com essa maneira de ver o mundo e se relacionar com ele. Mas um conceito
abrangente como o de cibercultura merece uma discussão ampla para conhecer as diferentes
considerações, interpretações e usos. Quem nos ajuda mais diretamente nessa análise é
Rudiger (2011ab) que aprofunda o conceito em sua obra Teorias da Cibercultura e faz um
apanhado geral do campo, traça um panorama histórico e uma trajetória de reflexão dos
principais intérpretes a respeito da cibercultura. Na introdução já traz uma observação
importante.
sujeitos interconectados que “constituem uma nova fronteira da comunicação e do real, e que
se expressam por meio de figuras e imagens retóricas provenientes da literatura pós-moderna
e das ciências da vida”. Trata-se de um campo dos saberes da economia, cultura, diálogo
humano e, podemos apontar também, da causa ambiental, que utiliza deste espaço com
propriedade. Já Lemos (2004) analisa o ciberespaço como um terreno de comunhão, sem
dimensões, um universo de informações que através das técnicas, coloca em contato pessoas
de diferentes locais, culturas e contextos, se destacando como um fenômeno social, que
implica em interatividade, colaboração, convergência midiática. Trata-se para o autor de um
espaço simbólico, que propicia os ritos de passagem da porção física e analógica para a digital
e não tangível. Lemos (2004, p.128) chega a falar “em espaço mágico, caracterizado pela
ubiquidade, tempo real e espaço não físico”.
O termo ciberespaço foi inaugurado em 1984, na obra de ficção científica,
Neuromancer de William Gibson 45. Inicialmente literário e com ácida criticidade, foi usado
para denominar o refúgio dos protagonistas que viviam na clandestinidade, cometendo atos
ilícitos. Tratava-se, naquele contexto, de um terreno de luta e conflito entre atores sociais e
suas relações de domínio, controle, poder e violência. (SANCHEZ, 2012; MARZOCHI, 2009,
MARTINS E DOMINGUEZ, 2006 – OVEJAS ELETRÓNICAS). Se originariamente surge
como uma distopia, as literaturas atuais, em especial no campo da comunicação, consagram
um interessante paradoxo ao descrever o ciberespaço como um ambiente libertário e inovador.
O fato é que o ciberespaço, “os computadores e a Internet são já, eles mesmos, efeito do que,
estrito senso, se pode chamar de cibercultura” (RUDIGER, 2011a, p.8)
A origem do nome, porém, é mais antiga, data da década de 60, e é atribuído a
engenheira e empresária norte-americana Alice Hilton, fundadora do Instituto de Pesquisas
Ciberculturais em 1964. Ela usou o termo, nas explicações de Rudiger (2011a) para se referir
à exigência ética da nova era de automação e máquinas inteligentes, e evidenciou que o
progresso da tecnologia levaria inevitavelmente à promoção de uma cultura ciber.
Rudiger (2011a, p.9) evidencia a cibercultura originariamente como “cultivo do
mundo, nós incluídos, em termos cibernéticos”. Esta menção ao cultivo está relacionada
diretamente à cultura, que o próprio Rudiger (2011b), em outra obra, prega o monitoramento e
a definição desse conceito agregado (ciber+cultura), sob o risco de se deparar com um
45
Willliam Gibson continua publicando livros com o gênero ciberpunk. A trilogia Blue Ant com livros publicados
em 2004 (‘Reconhecimento de Padrões’) e os dois últimos no ano de 2014 (‘Território Fantasma’ e ‘História
Zero’) repete a distopia ‘alta tecnologia, baixo nível de vida’, como declarou o autor em recente entrevista ao
jornal O Estado de S.Paulo (consta nas referências).
102
máquinas do ciberespaço” (LEMOS, 2004, p.134). E uma das questões que marcam a
cibercultura, de acordo com Lemos, é o imaginário ciberpunk, que se estabeleceu na rede por
meio da ficção científica, artes, moda, pela filosofia hacker, underground da Internet, mais
voltada para a cultura jovem, urbana, antiautoritária e libertária, que tem suas origens na
contracultura dos anos 1960.
Em obra mais recente, escrita em parceria, Lemos e Levy (2010) reiteram o conceito
de cibercultura como conjunto tecnocultural que insurge no século XX, que modifica hábitos
sociais, práticas de consumo cultural, ritmos de produção e distribuição da informação,
relações de trabalho e a própria sociabilidade. E persistem na potência liberadora da
cibercultura, como lugar de produção e conexão livre entre pessoas e grupos. Entre os
princípios da cibercultura, agora atualizados, os autores destacam a liberação da palavra, a
conexão e conversação mundial e a reconfiguração social, cultural e política (LEMOS; LEVY
2010, p.25-26).
Em uma perspectiva mais psicológica, de construção da identidade, Turkle 48 que antes
avaliava o ciberespaço como possibilidade de explorar as várias dimensões do sujeito, as
múltiplas e fluidas identidades (na esteira de Bauman e do conceito de identidade líquida),
mostra-se preocupada com o modo como a tecnologia alterou e continua modificando nossas
vidas, ao ponto de nos deslocar da complexidade humana. A cibercultura facilitaria os
relacionamentos a distância, mas dissolveria laços concretos, minimizando solidariedades e as
próprias complicações imperativas da vida cotidiana, com falsa ilusão de companhia,
compartilhamento e afeto (TURKLE, 2011, RUDIGER, 2011). O próprio subtítulo resume o
fio condutor da obra de Turkle: "porque esperamos mais da tecnologia e menos de nós
mesmos" (Why we expect more from technology and less from each other). A preocupação da
autora não é irrelevante, mas se pensamos aqui na cibercultura como um processo em curso,
que realmente modifica estruturas, modos de vida, de sociabilidade, teremos que lidar com os
desafios desagradáveis da nova configuração, como a própria tecnologização do ser.
Na tentativa de caracterizar a cibercultura de forma um tanto pragmática, mas
necessária, elencamos seus pontos principais com auxílio das propostas iniciais de Levy
(1999) e Santaella (2008): digitalização, uso de hiperdocumentos ou hipertextos, como
‘matriz de textos potenciais’ estruturados em rede, não sequenciais e multidimensionais que
48
A autora fez uma apresentação esclarecedora pelo coletivo norte-americano TED (Technology,
Entertainment, Design) para esclarecer sua obra Alone Together, que contribuiu para entendermos a
modificação de sua linha de raciocínio. Disponível para acesso em:
http://www.youtube.com/watch?v=t7Xr3AsBEK4.
106
permitem percorrer um mundo vasto de informações e meios com certa autonomia (LEVY,
1999, p.57). Inserimos também a ferramenta de hipermídia na perspectiva da descontinuidade,
do arquivamento, recuperação e distribuição de informações em diferentes meios. Ademais do
processamento automático, intercâmbio de arquivos, navegação não linear, informação em
fluxo, convergência midiática, reciprocidade, interatividade, formação de comunidades, e
incluímos ainda as diferentes formas de participação política e reivindicatória, a possibilidade
de redefinição do espaço público e a hibridização entre os mundos tangíveis e intangíveis.
Rudiger (2011a, p.3) ainda amplia o segmento.
Mas insistimos que não se trata apenas do âmbito virtual, devemos considerar as
conexões objetivas da cibercultura com os blocos econômicos, os movimentos políticos, as
formas de vida cotidiana. A cibercultura definitivamente não está limitada a tela dos
dispositivos. Em termos filosóficos Levy (1999) lembra que o virtual se trata daquilo que
existe em potência, sem estar presente, e não em ato, mas é integrante da realidade. O uso
corrente do termo virtual se apoia em algo irreal, falso, ilusório, uma vez que a realidade é
comumente vinculada à presença tangível. Adotamos a definição de virtual como “toda
entidade ‘desterritorializada’, capaz de gerar diversas manifestações concretas, em diferentes
momentos e locais determinados, sem, contudo estar ela mesma presa a um lugar ou tempo
em particular” (LEVY, 1999, p. 47). A virtualização como procedimento já iniciado com a
escrita, TV e rádio foi acelerada no ciberespaço.
Na visão de Trivinho (2010) a cibercultura equivale a um processo sócio histórico bem
mais vasto e complexo do que podemos contemplar nos referenciais, e prega livrar o conceito
da versão pragmática que o faz refém absoluto da rede, e “dar-lhe fogo mais extensivo em
matéria de iluminação sobre o real” (TRIVINHO, 2010, p.67). Ele desenvolve, com apoio do
filósofo francês Paul Virillo, a noção de dromocracia cibercultural, entendendo que a
velocidade tecnológica, o imperativo da saturação e a orientação para o excesso vem
estruturando a vida social. O conceito de dromocracia embasado na violência da velocidade
da técnica “equivale a um macrovetor dinâmico exponencial de organização/desorganização
107
por Tofler, no âmbito das TICs vai muito além de um canal de retorno e de um discurso
unilateral. A interatividade é a passagem da mediação para a criação, um palanque da cultura
digital. “Os usuários deixam de ser objetos de manipulação para converterem-se em sujeitos
que manipulam”, acredita Vilches (2003, p.234), que coloca uma questão interessante: os
usuários manipulam os meios ou os conteúdos? Os conteúdos são mais diretamente alterados.
Mas a interatividade afeta a comunicação em sua própria gestão e desde a programação,
armazenamento e consumo, criando uma audiência ativa. “Trata-se de um diálogo entre uma
pessoa e uma máquina, na qual a noção de informação está presente como linguagem, como
interface, como programa e como produto” (VILCHES, 2003, p.237).
A interatividade integra uma ordem de interação, que faz parte da vida social, como
um processo de modificação mútuo entre sujeitos e coisas. O mundo das interações cotidianas
produz intercâmbios simbólicos complexos, mesmo que não percebidos de forma consciente.
A interação pode ocorrer na troca de informações, mas também involuntariamente, na forma
de vestir, falar, por afinidade abstrata (RHEINGOLD, 2004, p.197, tradução nossa). Di Felice
(2008, p.46) lembra que o conceito de interação está ligado à possibilidade de o indivíduo
interpretar e ressignificar mensagens de uma dinâmica comunicativa, ainda com a rede
“indicam-se as práticas habitativas e conectivas de interações entre mente, sujeito, redes,
circuitos, informações e inteligências”. Um cenário de interação midiática e territorial vem
sendo substituído por uma proposta atópica, colaborativa e interativa, evidencia Di Felice
(2008, p.52). A atopia como o lugar anormal, indefinido, em que o território e a tecnologia se
definem dinâmica e interativamente.
A questão da interação também é debatida por Maia e Mendonça (2008, p.127 -128),
que recorrem a Simmel e Goffman, e se preocupam em definir os âmbitos interacionais como
“instâncias em que os integrantes de um ator coletivo interagem com outros atores”. A
interação como ação mutuamente determinada, o processo de comunicação entre os atores,
que no modelo online é mediado pelo computador e pela multiplicidade de ferramentas. Esta
interação está muito marcada pela percepção que temos daqueles com quem estamos
interatuando (numa vinculação estreita, a nosso ver, com a própria noção de ethos). Enquanto
a interatividade com a máquina, como um caso específico de interação, é uma troca
comunicativa entre atores que implica em mediação por interface tecnológica, em geração e
influência de conteúdo, autonomia do sujeito e canais de retorno. Pensamos, portanto na
interação como ação mais imediata, envolvendo os atores sociais, enquanto a interatividade
como uma possibilidade, uma prática em potencial.
110
começaram a se mobilizar por meio das tecnologias, para se envolver, principalmente, com
políticas locais. Surgem, então, as primeiras redes de mobilização online pelo meio ambiente,
são os caso da Econet, em 1982, e dois anos depois o PeaceNet, que conseguiram se organizar
ao redor do mundo, usando uma rede de voluntários, de forma descentralizada e a baixo custo
para divulgar o tema e conseguir adeptos. Outra iniciativa foi o Greennet o provedor de
serviços de Internet que dá suporte as iniciativas individuais e coletivas que promovem a paz
e a defesa do meio ambiente.
Quem propicia a prática das tecnologias sociais, da descentralização, criação coletiva e
colaborativa, pregando acesso ilimitado e total aos computadores é a cultura hacker e suas
propostas de hackativismo, que disponibilizam ferramentas para participação (RHEINGOLD,
2004, TASCÓN; QUINTANA, 2012). Grupos ciberpunks, coletivos como o Computer
Professional for Social Responsability e o Eletronic Frontier Foundation (Fundação de
Fronteira Eletrônica) inauguraram os protestos pela rede. São grupos que reuniam desde
personalidades da cultura underground, libertários, hackers até advogados e jornalistas
agrupados em torno de listas de e-mails e interessados em discutir a Internet como nova
fronteira aberta para campanhas e manifestos (TASCÓN; QUINTANA, 2012, p.153).
Mas a organização virtual e o ativismo contemporâneo popular têm seu marco
fundamental com os movimentos antiglobalização e de críticas ferrenhas ao FMI (Fundo
Monetário Internacional), Banco Mundial e OMC (Organização Mundial do Comércio), em
Seattle, na década de 1990, e com a atuação do movimento zapatista. Os protestos em Seattle
se organizaram de forma elementar pela rede, mas criando inovações como o Indymedia
(1999), que como um projeto de mídia independente, além de realizar a cobertura dos
protestos, permitia a participação do usuário para publicar conteúdos, comentar histórias,
intervir diretamente 49.
Já a mobilização em rede do Exército Zapatista de Libertação Nacional,
principalmente através de mensagens eletrônicas, conseguiu não só divulgar sua causa,
evidenciar os conflitos no campo e denunciar os latifúndios, mas se firmar como
representantes legítimos da questão indígena no México. Os zapatistas mudaram a atuação das
guerrilhas e as táticas de luta ao colocar em destaque as novas tecnologias da comunicação e
49
O portal está disponível em www.indymedia.org, e a iniciativa acabou acarretando nos Centros de Mídia
Independente (CMI) com representações em diferentes países e em 13 municípios do Brasil
(www.midiaindependente.org), com a proposta de dar continuidade às redes de informação colaborativas e
contra hegemônicas. O conceito e a proposta dos CMI foram esmiuçados por Maria das Graças Targino, na
obra Jornalismo Cidadão.
114
Por isso, toda essa lírica discursiva leva implícito um forte componente
identitário que facilita a comunicação entre pares desconhecidos sem que
seja necessária a mediação de um centro, quer dizer, assegura um caráter
distribuído de rede e, portanto, a robustez de seu conjunto (UGARTE, 2007,
p.65, tradução nossa).
convocar seguidores. Identificamos, neste momento, uma real aproximação com a proposta de
mídia radical 51, como a expressão de movimentos sociais com forte carga comunicativa, que
dependem “não da argumentação lógica, mas de sua força concentrada e esteticamente
concebida” (DOWNING, 2002, p.92). Uma forma contra-hegemônica de produção de
informação e manifestação, com diferentes estratégias, para além da narrativa textual e formas
convencionais de comunicação. Entre as estratégias está o culture jamming – uma proposta de
ativismo com técnicas de guerrilha, manipulação de imagens, alteração ou exagero nas
informações, interferência cultural com elementos de humor, exaltação das situações de
denúncia, ridicularização da imagem e ou da posição do oponente, em uma tentativa de alterar
os códigos, pregar contra a uniformidade cultural, o consumismo e outros valores transmitidos
por corporações, por exemplo (TASCÓN; QUINTANA, 2012).
Downing (2002, p.150) faz referência justamente à comunicação radical do
Greenpeace, que emprega verdadeiras “bombas mentais”, como forma de comunicar efêmera,
mas efetiva na memória consciente. A utilização de imagens impactantes, referências
culturais, ações parodiadas é capaz de romper o ceticismo, a conversa cotidiana para causar
um impacto emocional profundo. Nesse sentido, Ugarte (2007) lembra que as pessoas querem
participar de algo criativo, prazeroso, integrar o estilo de vida proposto, uma maneira de viver
– fatores que são impulsionados pelas estratégias de comunicação. Na proposta de
ciberativismo do Greenpeace (como a disponibilização de meios para participação online:
compartilhando conteúdos, comentando as temáticas e assinando as petições) mantém
inclusive uma seção específica no portal, com a chancela ‘Proteste nas ruas da Internet’. E
faz uso das táticas de mídia radical quando os ativistas escalam monumentos, plataformas de
petróleo e penduram faixas de acusação em empresas potencialmente poluidoras. Uma das
campanhas emblemáticas durante a nossa observação, Detox Moda
(www.greenpeace.org/brasil/pt/O-que-fazemos/Toxicos/Zara), usou modelos esquálidas e
“afetadas pela poluição”, em uma satirização das publicidades de moda para fazer uma
denúncia contra grifes como Zara e Levis, acusadas de utilizar produtos contaminantes em
suas confecções.
51
Downing (2002) conceitua a mídia radical em uma proposta mais ampla, incluindo as diversas formas de
expressão comunicativa dos movimentos sociais, como folders, eventos, conversas, mural, teatro, dança,
música, protestos. E serviria a dois propósitos. “Expressar verticalmente, a partir dos setores subordinados,
oposição direta à estrutura de poder e seu comportamento”, e “obter, horizontalmente, apoio e solidariedade
e construir uma rede de relações contrárias às políticas públicas ou mesmo à própria sobrevivência da
estrutura de poder” (DOWNING, 2002, p.23) Assim, a mídia radical pode ser vista como necessária para
construir a contra hegemonia, e a Internet se mostra como terreno fértil para a prática.
117
52
Temos como exemplos destas táticas ativistas em rede, uma forma de culture jamming digital, o
Anonymous, grupo que surgiu em 2003, priorizando o anonimato e o livre curso da informação, sem se
preocupar com filosofia ou programa político consistente. Atua no ‘dissenso digital’ e com ação direta, que
envolvem desde brincadeiras inocentes, macabras, revelando informações constrangedoras, copiando e
derrubando portais inimigos, ao ativismo online de apoio político a iniciativas democráticas e se estabelece
como “irreverente e rebelde marca de políticas ativistas” (COLEMAN, 2012, p.93).
118
propostas trazem reflexão, mas nossa hipótese é de reconfiguração dos movimentos sociais
com ascensão das TICs, e não pensamos em questionar sua relevância ou mesmo prognosticar
sua eliminação. Até porque, como Ugarte (2007) colocou com pertinência, existe ainda um
ativismo em rede centralizado em um eixo organizativo, realizado com ferramentas da
Internet, que busca estratégias de mobilização pela web e a interação com diferentes públicos,
exerce força política, mas atua com uma organização prévia e mantém determinada
configuração vertical, tanto na forma como nos processos de tomada de decisões.
O ciberativismo ainda faz parte de um movimento mais amplo de ciberpolítica, na
abordagem de Cotarelo (2010), que envolve dois processos sociais principais: 1) como os
líderes políticos utilizam a Internet e 2) como a sociedade civil usa as TICs para participar de
processos políticos. O autor avalia que a Internet é hoje capaz de suscitar debates por conta
própria, de estabelecer uma prática política ‘cosmopolita’ que não centraliza os meios de
comunicação tradicionais, apesar deles ainda terem seu espaço e relevância da esfera pública.
A mobilização em rede, muitas vezes, é espontânea, se organiza à margem das ações de
partidos políticos, não é fomentada exclusivamente por um comitê central ou presidência,
“mas surge na marcha cotidiana dos assuntos que estão na rede, ali se discute, perfila e se
levanta os resultados que se quer alcançar” (COTARELO, 2010, p.138, tradução nossa).
Trata-se, para o autor, de uma ágora polifônica, onde todas as questões estão abertas e sujeitas
ao debate, em um território criativo e aberto, onde o caráter burocrático dos partidos e ou
instituições contrasta com a horizontalidade e imediatismo da rede. Mas o ciberativismo
enquanto prática política, redentora, livre e engajada não é consenso.
Blanco (2006), por exemplo, na publicação coletiva sobre usos políticos e sociais da
rede, reconhece que as tecnologias aumentaram a capacidade de processar e armazenar
informações, sugerindo um novo espaço público, do qual iremos tratar mais a frente, com
usos institucionais e cotidianos que favorecem agregações, mobilizações, ações conjuntas.
Porém, é preciso cuidado com a mera pose revolucionária, com o frenesi do ativismo
cotidiano que limita a capacidade de reflexão. “O ativismo cibernético se alimenta do mito de
que a revolução se pode alcançar sem levantar-se do computador e os ativistas se convertem
nos futuro pantheon guerrilheiro” (BLANCO, 2006, p.7, tradução nossa). Um ativismo muitas
vezes segregado a quem tem capacidade de consumo tecnológico. Nesse sentido, Blanco
coloca que para avaliar as TICs temos que conhecer para quais objetivos se empregam e quem
se beneficia delas.
119
Além disso, o mesmo autor avalia que a atuação ‘política’ por meio das tecnologias é
repleta de facilidades, mas está orientada para a ação, não contemplação, para o presente, não
para a tradição. Uma dinâmica particular que é mais propensa a gerar discrepâncias do que
consensos, a enfatizar as diferenças sobre as coincidências, não confere solidariedade e
responsabilidades concretas, além disso, o anonimato na rede “garante menor implicação, e
facilidade de pertencer a coletivos heterogêneos” (BLANCO, 2006, p.14, tradução nossa).
O ativismo, neste contexto, deve ser contemplado na perspectiva das tecnologias como
dispositivos geradores de real, como já nos alertou Sodré (2010). O autor constata a tendência
de o ativismo contemporâneo aliar participação social com interatividade midiática em uma
rede técnica de ação direta, que torna a comunicação o agente produtor do acontecimento
ativista, e não mais o mero produto. Ainda que dominada pelas dimensões do entretenimento
e da estética. No entanto, a mesma fórmula que angaria adesões, mostra que os atores
públicos agora saem da prática concreta da política para o que Sodré denomina como
performance imagística. O que está em cena é mais a performatividade midiática do que o
conteúdo programático ou a proposta política em questão. O que pode ocorrer é a substituição
do discurso objetivista e racionalista pela narratividade emocionalista, baseada na “percepção
esteticista da performance”(SODRÉ, 2010, p.41), priorizando, por exemplo, as imagens como
criadoras de cenários ilusórios, mas altamente instantâneos e persuasivos.
A proposta de gerador do real nos leva a refletir sobre o real versus virtual – polêmica
corrente, especialmente quando se fala em processos políticos na rede. Aqui ressaltamos mais
uma vez o virtual como potência e como parte do real e não algo separado. Preferimos não
eliminar a relevância dos laços concretos, mas não nos preocupamos com a contraposição
simplória entre real e virtual, justamente por entendermos que os fenômenos contemporâneos
não podem ser assim restringidos, o virtual não é de qualquer forma irreal, e exerce influência
no mundo físico e a recíproca é verdadeira, são contextos permeáveis. Os dispositivos, a
capacidade física tecnológica, o modo online se tornaram invisíveis, já inundaram o cotidiano.
“A rede se apoderou da vida, se integrou a ela por completo, a transformou e segue no
processo de transformação a um ritmo frenético de inovação tecnológica. A rede articula uma
realidade muito complexa, feita por indivíduos que acumulam múltiplas identidades”
(COTARELO, 2010, p.231, tradução nossa).
Nesse sentido, os grupos e ativistas podem atuar exclusivamente na rede e ou também
presencialmente, dependendo dos propósitos. Vilches (2003) acredita que certos grupos
apenas online jamais seriam tão bem-sucedidos fora do ambiente virtual, ao passo que outros
120
refletem comunidades fortes no mundo físico real. Para Mattelart (2006), no entanto, no
campo dos movimentos sociais tradicionais, mesmo que saibam manejar com destreza os
instrumentos digitais, precisam antes de tudo de um trabalho engajado com trajetória e
história que ultrapassem os limites da rede. De fato o percurso dos movimentos é importante,
mas a dinâmica da rede na contemporaneidade evidencia que os grupos podem ser criados e
dissolvidos instantaneamente; os tópicos podem mudar ou permanecer constantes, as
mobilizações podem se esgotar ou se expandir, uma efemeridade que não é necessariamente
negativa ou implica em demérito das ações. É natural o desgaste, o surgimento e
desaparecimento de coletivos e reivindicações na Internet, faz parte, inclusive, dos códigos de
ativismo da rede. A Internet tem próprias regras e códigos e quem maneja tem a mínima
noção disso e é capaz de distinguir perfis e reivindicações, fazer relações entre autores e
mensagens, entre as referências mais citadas (TASCÓN; QUINTANA, 2012).
Para minimizar a insegurança e avaliar a eficiência das ações em rede, Tascón e
Quintana (2012, p.255, tradução nossa) recorrem ao programa de cinco níveis elaborado pelos
analistas de corporação norte-americana Arquilla e Ronfeldt e que pode nos orientar
pragmaticamente. Os níveis são o organizativo/desenho da organização; o narrativo ou a
história que se conta; o grau doutrinal, abrangendo métodos e estratégias capazes de orientar
os envolvidos; o tecnológico/sistemas de informação e, por último, o nível social, que indica
os laços entre os membros da rede. Assim, as mobilizações mais bem sucedidas devem aliar
um nível organizativo distribuído, ter uma história bem contada, com métodos e estratégias
bem definidos, sistemas avançados e organizados de comunicação, com laços sociais e
pessoais fortes na comunidade em que atua. Coloquemos o Greenpeace como um exemplo
prático para avaliar esses níveis: ainda que desenvolva táticas de ciberativismo, com propostas
de interatividade e participação, discurso adequado, com histórias convincentes, sistemas de
informação e comunicação apropriados e de fácil acesso, atua de forma centralizada, vertical,
mais global e menos comunitária, pelo que observamos.
Voltando ao entendimento do ativismo contemporâneo, mais recentemente estamos
assistindo novas formas de agregação coletiva 53, os levantes espontâneos que se agrupam por
meio de tecnologias móveis, como os celulares, formando o que Rheingold (2004, p.25,
53
Entre outras formas de agregação coletiva mais recentes estão as ciberturbas como culminação da
mobilização nas ruas, de um processo de discussão social levado a cabo por meios eletrônicos de comunicação,
rompendo a divisão entre ciberativistas e mobilizados, evidenciando a capacidade convocatória dos
movimentos (UGARTE, 2007, p.73, tradução nossa). E os swarmings, os levantes espontâneos, de núcleos
difusos que se unem momentaneamente em torno de um mesmo objetivo, posteriormente, se dispersam
novamente pelas redes.
121
tradução nossa) chama de multidões inteligentes, cuja força provém, “da penetração das novas
tecnologias informáticas e de telecomunicação nas antigas práticas sociais de associação e
cooperação”. As multidões, agregadas pelos computadores, estão formadas por pessoas
capazes de atuar conjuntamente ainda que não se conheçam, mas que se conectam e cooperam
como nunca visto em outras épocas porque empregam sistemas informáticos e de
telecomunicações. É bem provável, ressalta Rheingold, que essas tecnologias produzam
efeitos contraditórios e simultâneos como aquisição de novos poderes e perda simultânea de
antigas liberdades. As multidões que fomentam a agitação, ignorando as pressões dos
tecnocratas, das autoridades e ou do mercado, podem servir à resistência ou ao controle social.
O autor lembra que é absurdo pressupor que as multidões inteligentes produzem só resultados
positivos, mas o potencial violento ou controlador não pode esconder as capacidades
(interessantes) dessas novas formas de ação coletiva (RHEINGOLD, 2004, p.190, tradução
nossa). Trata-se, segundo o mesmo autor, de uma nova esfera midiática que se torna tão
influente, lucrativa e ubíqua como as esferas anteriores criadas pela imprensa, rádio e
televisão.
Outra visão interessante vem de Tascón e Quintana (2012, p.253, tradução nossa).“As
multidões conectadas levam tempo arrebatando as elites narradoras (meios) os mecanismos
(canais e códigos) para a construção da realidade e têm erodido a legitimidade, com notável
ajuda por sua parte, dos poderes políticos e econômicos”.
As formas de mobilização, convocação, ativismo em rede acontecem pelos sites, blogs
e ou pelas redes digitais sociais. Estas últimas ganham centralidade no ativismo online e
atraem os indivíduos para compartilhar informações ‘em troca’ de relações sociais, de capital
de conhecimento e confiança. Ou seja, um indivíduo deposita parte de suas informações e seu
estado de ânimo na rede e, em contrapartida, obtém visibilidade, mais conhecimento e
oportunidade de relações pessoais, profissionais, comunitárias e até exposição de intimidades
(RHEINGOLD, 2004). Uma forma de sociabilidade compactuada pela vontade de unir-se a
grupos, a comunidades, demarcar identidades, ainda que prevaleçam os interesses individuais.
As redes sociais digitais se tornaram meios de uso cotidiano e permitem construir um perfil
público e articular-se com uma lista de usuário, criar e fortalecer vínculos. Estes sistemas de
comunicação têm seus próprios códigos e valores pautados em fatores que foram elencados
por Recuero (2010) e que conseguimos visualizar muito bem na proposta das redes sociais
digitais do próprio Greenpeace. A autora menciona, por exemplo, a visibilidade, que tem
relação com a própria presença do ator na rede, mas é impulsionada com a complexificação
122
A questão que fica é se as pessoas têm habilidades e autonomia para usufruir das
vantagens da rede, mas não temos como mensurar essas possibilidades. O consumo é
54
O número de usuários de Internet no mundo passa de 40 milhões em 1995 para quase 1 bilhão e 400 milhões
em 2008 (CASTELLS, 2011, p.97), com taxa de penetração que chega a 80% nos países industrializados. Dados
apresentados por Tascón e Quintana (2012) apontam que mais de um terço da população mundial pode ser
considerada internauta, obviamente que com diferenças gritantes entre o continente africano e europeu. No
Brasil, dados do Ibope Media, em 2013, apontavam uma população de 102 milhões de internautas, quase 50%
de penetração populacional.
123
subjetivo, busca-se algum tipo de capital social, pessoal, uma ressignificação dos contextos,
agregada a possibilidade de constituição de múltiplas identidades. Um consumo que pode ser
influenciado pelas ferramentas, pela visibilidade e pelo discurso, como colocou Ugarte (2007)
e como de fato identificamos na comunicação do Greenpeace.
A tecnologia como dispositivo ajuda a criar narrativas, ferramentas, estratégias para
minimizar hierarquias institucionais, facilitar a participação e o engajamento. Mas não nos
convém o pensamento único da comunicação virtual como criadora de solidariedades
horizontais e substituta direta de representações políticas. A rede de computadores oferece,
sim, espaços para que as organizações possam atuar de forma mais livre e colaborativa, expor
suas iniciativas, reivindicações, angariar adeptos, mas também podem favorecer pequenos
grupos, reforçar padrões dominantes. Um campo de embates e conflitos que estamos
decifrando por meio da experiência virtual do Greenpeace, que utiliza das TICs para
proporcionar (ou não) o debate, estimular a participação, e remodelar, ao menos
conceitualmente, a noção de esfera pública. Como fazem isso? Como compõem a esfera
pública em rede? Procuramos responder essas e outras questões a partir do próximo capítulo,
mas antes disso será preciso resgatar o conceito original e a trajetória da esfera pública
enquanto espaço público discursivo. “O modelo discursivo é o único compatível com as
inclinações sociais gerais de nossas sociedades e com aspirações emancipatórias dos novos
movimentos sociais” (VIEIRA, 2001, p.63).
124
A proposta de uma esfera pública em rede na cibercultura, facilitada pelas TICs, com
potencial para discussão e deliberação, se faz presente também no movimento
ambiental. Mas o que faz as pessoas aderirem ao debate? O que leva à participação e ao
engajamento? O discurso ganha centralidade.
55
Não nos prenderemos à definição de democracia e suas tradições no pensamento político clássico, medieval
e moderno, como colocados por Bobbio (1998), pois não faz parte do escopo da nossa tese. Porém, na medida
em que citamos e nos referimos em outras oportunidades à questão democrática acreditamos ser conveniente
esclarecer que nos referimos à forma de governo que tem como elemento caracterizador a soberania popular,
a participação do povo nos processos políticos. A participação entendida como “manifestação daquela
liberdade particular que indo além do direito de exprimir a própria opinião, de reunir-se ou de associar-se para
influir na política do país, compreende ainda o direito de eleger representantes para o parlamento e de ser
eleito” (BOBBIO, 1998, P.324).
125
movimento ambiental, por exemplo, protagonista de lutas por melhores condições de vida, se
apresenta como um efetivo produtor de conteúdo, pregando mobilização e interatividade na
rede virtual, colocando assuntos polêmicos em pautas, delineando novas práticas de
comunicação e de debates públicos, que podem indicar justamente a composição de uma
esfera pública em rede.
A esfera pública como conceito compactuado por Habermas se estabelece, como
lembram Freitag e Rouanet (2001), na instância na qual se forma a opinião, a partir da atuação
de atores públicos e privados. Uma instância de argumentação e debate que alicerça o projeto
de modernidade. “Surge uma esfera pública quando e onde todos os afetados por uma norma
social ou politica de ação empreendem um discurso prático, avaliando sua validade”
(VIEIRA, 2001, p.59). Mas se em seu embrião a esfera pública sustentava a veia crítica em
relação ao poder, não tardou a ser refuncionalizada para dar aceitação à estrutura política
dominante.
Gomes (2008) traça uma perspectiva histórica, consoante Habermas, para
compreender os momentos de ressignificação da esfera pública, sendo a primeira delas, a
grega, que originou os espaços para discussão, acalentados na figura da Ágora. Na sociedade
burguesa a esfera pública ganha caráter autônomo, já que a sociedade civil, emancipada do
Estado, passou a adentrar as discussões e assuntos considerados privados, como o econômico,
passam a ter relevância coletiva e patente. A esfera pública começa a se desenhar na
modernidade como lugar em que sujeitos contrapõem argumentações para chegar ao
esclarecimento em torno de uma questão, ou seja, discutir em sociedade com fins públicos.
Indo além, em conformidade com o padrão ideológico, Gomes (2008, p.35) reforça que se
trata do “âmbito da vida social que se materializa – em várias arenas, por vários instrumentos
e em torno de variados objetos de interesse específicos – numa discussão constante entre
pessoas privadas em público”. Pressupõe-se ainda uma mediação racional para equilibrar os
posicionamentos sem permitir uma mera competição verbal, uma vez que aqueles que
discutem devem empregar argumentos dispostos em posições e contraposições voltados para a
obtenção de um consenso possível. Freitag e Rounet (2001) acordam que o debate, neste
sentido, deveria ter como única intenção admitida a busca cooperativa da verdade, com
possibilidades idênticas de argumentação entre os pares. Em suma, a esfera pública, segundo
Gomes (2008), deve ser um domínio da vida social protegido de influências de poder,
dinheiro ou hierarquias sociais, o argumento é que deve ser impor. Mas esta proposta de
esfera pública autêntica não resistiu às sociedades dominadas pelos meios de comunicação de
126
massa, como o próprio Habermas reconhece com veemência na obra Mudança Estrutural da
Esfera Pública (1984) e Gomes reitera. A influência foi direta, principalmente, lembra Gomes
(2008), por conta do vínculo que a mídia estabelece com o público, agindo como
intermediadora do raciocínio de pessoas privadas e criando a espécie de um fórum público,
substituindo os salões e comunidades de comensais que até o século XVII eram lembrados
como espaços determinantes da discussão.
Nesse contexto, Gomes (2008, p.46) acredita que se formou uma “pseudoesfera
pública, encenada, fictícia, cuja característica maior parece consistir em ser dominada pela
comunicação e pela cultura de massas”. Além de se diluírem os contornos entre público e
privado, entre sociedade civil e Estado, também se perderam os princípios da argumentação,
mediação, consenso, uma vez que na esfera dos meios de comunicação de massa não há mais
preocupação com a discutibilidade e racionalidade, mas com a visibilidade. Interesses
privados ganham configuração política e o público não mais é o legitimador das decisões,
apenas cumpre um papel.
Para ele, a discursividade toma o centro, pois não é mais preciso argumentação e sim
uma posição que garanta a adesão do público. A imprensa atua, portanto, no sentido de
colocar em público o que convém para obter o assentimento dos privados, a simpatia, a boa
vontade, com estratégias menos racionais, mais emocionais e até mesmo sedutoras.
Podemos ter, como propõe o modelo autêntico habermasiano, uma opinião partilhada
por um grande número de pessoas, mas que não precisa ser legitimada enquanto pública, e
sim ter aceitação e ser moldada por estratégias midiáticas, uma vez que a encenação suplantou
a discussão. A concepção da vida democrática é reduzida a regra da maioria, perde-se a
proposta fundamental da argumentação dos pontos de vista para encontrar o consenso, tomar
decisões e compatibilizar divergências no interior de uma comunidade política. Trata-se de
uma exibição midiática que depende da concordância plebiscitária do público (HABERMAS,
1984, GOMES, 2008).
127
fica mais reservada aos donos de meios de produção e ou seus funcionários, e indica uma
possibilidade mais democrática. Podemos ter na rede, inclusive, um modelo discursivo, bem
próximo do apregoado por Habermas, que ocorre em uma ‘situação ideal de fala’, todos os
participantes têm oportunidade de iniciar, continuar discussão, comentar, criticar, opinar
“tematizar relações de poder”, sem constrangimentos diretos (VIEIRA, 2001, p.60).
Tofler (2005) comenta os contornos que o sistema de representatividade ganha no
momento tecnológico. O que se forma no ciberespaço, por exemplo, é uma sociedade de
minorias que defende interesses legítimos, pauta questões políticas importantes, mas que
raramente irá atender ao consenso. As minorias mostram poder estratégico e precisam ter seu
papel fortalecido e valorizado no sentido substancial da discussão, argumentação, deixando
para o segundo plano a questão da concordância. É justamente o que acontece no movimento
ambiental e em outros movimentos que utilizam as TICs para segmentação de interesses, para
abrir possibilidades de debates específicos, configurando uma esfera pública em rede. Quem
intervém nesse espaço são públicos específicos ou pessoas interessadas em determinado tipo
de discussão. São embriões de pequenas e variadas esferas públicas que atendem a dinâmica
da rede, ao mesmo tempo em que podem fortalecer a estrutura democrática por meio do
debate público.
Entre os dispositivos que compõem a esfera em rede, Benkler (2006) enumera a troca
de e-mails, as listas de discussões através de correios eletrônicos, as próprias páginas da
Internet como desenvolvedoras de plataformas diferenciadas que vão desde o texto fixo, a
blogs, vídeos, chats, com interfaces de fácil utilização, atualizável e sem restrições. Villarreal
e Gil (2002) elencam os mesmos meios, que propiciam diferentes usos, possibilidades e
alcance irrestrito de publicações e informações pretensamente livres. Trata-se, na visão deles,
de novos e dinâmicos meios de organização e solidariedade popular. E incluímos aqui ainda
as redes sociais digitais, tais como Twitter e Facebook, que ganham centralidade nas
discussões e congregam em um mesmo espaço mensagens, vídeos, debates, comunidades. La
Fuente (2010) comenta duas tendências que nos interessam como terreno de discussão online,
sendo os portais de domínio dos ativistas, vinculados a certas causas que geram discussões
encabeçadas por organizações e coletivos, normalmente não governamentais em torno de um
objetivo. E as redes sociais com caráter ‘parapolítico’, ainda que não tratem de aspectos
políticos especificamente, deixam circular livremente conteúdos políticos e abrigam espaço
para distintos tipos de ações como convocatórias de mobilizações, difusão de notícias, adesão
simbólica às causas, reivindicações (LA FUENTE, 2010, p.146, tradução nossa). As redes,
129
avalia La Fuente (2010, p.153, tradução nossa), são impressionantes em escala, alcance
rapidez de mobilização, mas seus resultados finais podem ser limitados, não muito efetivos,
voltados mais para o indivíduo e de forma efêmera. Os atores individuais se unem em
momentos concretos e de forma esporádica e variável, para expressar suas preferências
políticas, sociais e culturais. E nesse momento podemos estar diante das tais esferas de
minorias ou ‘temporárias’.
Lemos e Levy (2010) apostam que com a cibercultura e a consequente facilitação dos
processos políticos, decisões online e globalizadas, ampliação da discutibilidade, formação de
comunidades de interesse, a política se transformou em um negócio doméstico. Mas seria
precoce aqui afirmar que se consolidou uma cultura política na rede, o que acreditamos ter é
um embate de discursos e trocas argumentativas na esfera pública que garantem que as
questões políticas se tornem mais genéricas, sejam partilhadas e reconhecidas (MENDONÇA;
MAIA, 2008, p.125).
O fato é que a comunicação em rede proporciona que diferentes atores discutam por
uma causa única, que pode se bastar no ambiente online ou suscitar planejamento para a ação
política, muitas vezes à margem dos meios tradicionais, desempenhando um papel voltado
para o interesse público, formulação de propostas e até derrubada de regimes políticos 56. Um
modelo que não depende de conquistar grandes audiências, mas engajar participantes, não
mero espectadores passivos, ainda que defendam interesses específicos.
Lemos e Levy (2010, p.13) preferem falar em nova esfera pública digital que não é
mais recortada por territórios, mas mundial, que exerce pressão mais intensa sobre governos,
políticos, dá voz a grupos minoritários. “Os valores e os modos de ação trazidos pela nova
esfera pública são a abertura, as relações entre pares e a colaboração”. E, neste sentido, estas
formas de participação que se desenvolvem em rede apontam para a possibilidade de uma
ciberdemocracia, favorecida pela ampliação da capacidade de adquirir informações, de
56
Temos os exemplos recentes dos movimentos diaspóricos no norte da África, a Primavera Árabe, as
mobilizações e ocupações em praças públicas, com mais intensidade os Indignados na Espanha e o Occupy Wall
Street nos Estados Unidos, que se organizaram pela rede durante o ano de 2011. Em junho de 2013, o Brasil
também vivenciou protestos planejados pelas redes sociais digitais que, inicialmente contra o aumento do
transporte público, ganhou força e chegou a reunir 50 mil pessoas em ato no centro de São Paulo. No ensaio
publicado na revista Chasqui (n.123, set.2013), Narrativa transmídia, ativismo e os múltiplos discursos dos
protestos brasileiros de 2013, pudemos, Gonçalves, Renó e Miguel, contextualizar os protestos urbanos 2.0 e
entendê-los na concepção da comunicação, tecnologias e discurso.
130
expressão, de associação e de deliberação 57 dos cidadãos na tal esfera pública digital. “Em
suma, a computação social aumenta as possibilidades da inteligência coletiva e, por sua vez, a
potência do ‘povo’” (LEMOS; LEVY, 2010, p.14).
A noção de democracia envolve a ideia de direitos e liberdade, cidadania, deliberação3,
debate aberto e mídia livre, e a estrutura aberta, livre, colaborativa da Internet, ferramentas de
conversação, disseminação da opinião pública, potencializa a relação entre comunicação e
política (LEMOS; LEVY 2010, p.55). Os autores vão além e vislumbram o surgimento de
uma cidadania planetária que quebra “a hegemonia de um único discurso sobre o que é
público, oferecendo como contraponto uma miríade de vozes (opiniões emergentes)”
(LEMOS; LEVY, 2010, p.60). E nesse contexto, reiteram os autores, a ciberdemocracia
amplia a circulação da palavra e aperfeiçoa a esfera pública midiática, antes restrita ao poder
das grandes corporações.
A ciberdemocracia como um conjunto de práticas comunicativas, facilitado pelo uso
das TICs, entre os autores interessados e com condições de transparência (DADER, 2009).
Gomes (2011, p.28) entende como formas de democracia digital, ou seja, emprego de
dispositivos eletrônicos, aplicativos, ferramentas, “de tecnologias de comunicação para
suplementar, reforçar ou corrigir aspectos de práticas políticas e sociais do Estado e dos
cidadãos, em benefício do teor democrático da comunidade política”. As iniciativas digitais
democraticamente relevantes, para o autor, devem aumentar as formas de cidadania, a
liberdade de expressão e opinião, os meios de transparência política, consolidar e reforçar
uma sociedade de direitos, promover o aumento da diversidade de agentes e agendas na esfera
pública, e a representação das minorias. Os instrumentos podem fortalecer a “capacidade
concorrencial da democracia”, além de “consolidar e reforçar uma sociedade de direitos”
(GOMES, 2011, p.29). Mas não basta apenas oferecer instrumentos para fomentar a
ciberdemocracia ou mesmo a cultura da participação é preciso ter acesso e estar habilitado
para o engajamento online.
Já Di Felicce (2008, p.30) fala em tecnologias da democracia. “O ponto de saída dessa
visão era a constatação do surgimento de uma nova forma de sociabilidade ligada a formas de
interação comunicativa, não mais realizadas através da forma tradicional presencial ‘cara a
cara’, mas desenvolvidas através de uma interação mediada”. A influência da comunicação e
3
Para definir deliberação recorremos a Maia (2008) que adota a acepção no sentido de troca argumentativa, o
que nos parece pertinente, e define como o “processo social de oferecer e examinar argumentos, envolvendo
duas ou mais pessoas, para a busca cooperativa de soluções em circunstâncias de conflito ou de divergências”
(MAIA, 2008, p.16). Na política deliberativa o foco deixa de ser a votação e seu resultado final para contemplar
a dinâmica pela qual se forma a opinião na esfera pública (MAIA, 2008, p.55).
131
58
Vieira (2001, p.237) problematiza a questão da cidadania e suas diferentes tradições e a entende enquanto
construção histórica, “intimamente ligada às lutas pela conquista dos direitos do cidadão moderno”. Mas se
antes existia uma relação direta entre cidadania e Estado-nação, com o avanço da globalização (e incluiríamos
aqui da sociedade em rede) o Estado perde o monopólio das regras e o conceito de cidadão ultrapassa
questões territoriais ou mesmo de conquista de direitos formais. É nesse meandro que o autor fala em
múltiplas cidadanias, cidadania global, cosmopolita que se aproxima da proposta de cibercidadania que nos
referimos no presente capítulo. Cidadania baseada em status, participação, identidade e ou acesso a direitos
garantidos por instituições locais, nacionais, transnacionais ou para melhor contextualização como “o modo de
incorporação de indivíduos e grupos ao contexto social” (VIEIRA, 2001, p.48).
132
59
As consultas públicas digitais são realizadas em portais governamentais e possibilitam a participação, por
meio de envio de sugestões, debates e ou preenchimento de formulários online que serão, teoricamente,
incorporados em documentos oficiais. Um exemplo foi a consulta relacionada à atualização do Plano Nacional
sobre Mudança do Clima, visando a implantação de uma política nacional sobre o tema, realizada entre
outubro e novembro de 2013 (Disponível em: http://www.mma.gov.br/clima/politica-nacional-sobre-
mudanca-do-clima). Enquanto a Lei de Acesso à Informação no Brasil (12527/2011) estabelece a
obrigatoriedade da União, Estado e Municípios tornar públicas informações de interesse coletivo independente
de solicitação, especialmente pela Internet.
60
Espaço e esfera pública são usados aqui com a mesma noção, já que os conceitos de fato se encontram.
Preferimos, no entanto, priorizar o termo esfera pública, por ter sua definição mais alicerçada no Estado
moderno, que se diferencia da esfera privada e dá espaço para a opinião pública. Enquanto o espaço público é
visto comumente de forma mais abrangente, como o lugar da ação dos indivíduos, da livre manifestação das
faculdades humanas (BOBBIO, 1998).
133
Há ainda no modelo em rede o papel do mediador, como propõe a esfera pública ideal,
aquele que deve atuar para chegar ao consenso entre as partes, fomentando a discussão,
portanto, deve ir além da técnica. “A esfera pública em rede não é feita de ferramentas, mas
de práticas de produção social que essas ferramentas permitem” (BENKLER, 2006, p.219,
tradução nossa). Mas é importante avaliar se esta mediação funciona para estruturar o debate
ou meramente como um filtro para permitir ou não os comentários em portais ou rede, que é o
que comumente se tem na Internet.
No caso do Greenpeace, as notícias/campanhas são publicadas no portal/blog, ganham
versão para o Facebook e para o Twitter e apresentam uma tendência plebiscitária, com certa
ênfase na quantidade de compartilhamentos, com incentivo a ‘curtidas’, e ao grande número
de apoiadores e ratificadores das moções. Na página inicial, inclusive, são citados
nominalmente os usuários que assinaram as petições em andamento. O público, formado
obviamente por pessoas interessadas na causa e devidamente cadastradas, pode intervir pelo
sistema de comentários no portal, mas as opiniões, além de poucas são publicadas de forma
isolada, sem um fio condutor entre os assuntos e o Greenpeace faz realmente a opção de
pouco intervir. O coordenador de web no Brasil, Élcio Figueiredo, reconhece que a
intervenção é mínima, só realizada quando extremamente necessário (no caso, ele cita
discussões de baixo nível, com xingamentos, comentários ofensivos e que não agregam à
temática). “Esperamos a resposta de própria comunidade, esperamos que ela assuma o debate,
encaramos a rede da forma que ela foi concebida é um local aberto, esperamos que as pessoas
procurem as informações e defendam suas opiniões” (FIGUEIREDO, 2012). Mas ele
reconhece que nem sempre conseguem responder às solicitações a contento por falta de
equipe realmente. Já na Espanha a responsável pela comunicação comenta que procuram
responder tudo o que perguntam nas redes sociais digitais “No Twitter damos uma média de
20 respostas por dia, em dias de pico, chegamos a 500 respostas diárias” (SAN ROMÁN,
2013, tradução nossa) 61. Mas não há incentivo ou mediação de debates.
61
As entrevistas com os representantes do Greenpeace Brasil e Espanha foram concedidas por e-mail para a
nossa Tese e estão disponibilizadas na íntegra no APÊNDICE 1.
135
Maia (2008) reconhece que Habermas faz diferentes reformulações da esfera pública.
E frisa que em sua perspectiva contemporânea de esfera pública (Em Direito e Democracia,
1997) ele contempla justamente os diversos públicos que integram as diferentes arenas de
debate.
argumentação e explicação, para então serem lançados ao debate público, com a Internet se
estabelecendo como papel central de disponibilização de conteúdos.
De fato, a mídia convencional ainda é o termômetro das tensões da opinião pública e a
efetividade discursiva meramente digital pode ser contestada, por esse motivo, buscamos
alcançar se as campanhas do Greenpeace conseguem respaldo também nos veículos de
comunicação tradicionais para entender sua real importância na esfera pública. Mas nossa
tarefa principal é desvendar a narrativa construída pela organização que não só provoca
oportunidades ou momentos de esferas públicas, como também pode criar marcos de
motivação para a participação, na nossa reflexão. Reiteremos que não basta oferecer
instrumentos de participação e debate, é preciso que as pessoas tenham habilidade, disposição
e se engajem, usufruam dos instrumentos de ciberdemocracia, cibercidadania entre tantas
nomenclaturas que surgem para respaldar a estrutura participativa da cibercultura. Nas
próximas páginas, buscamos não esgotar uma temática tão complexa, que envolve
subjetividade e tantas nuances, mas levantar as hipóteses principais e revelar certas tendências
de participação que vão contribuir para o aprofundamento da nossa tese.
e engajamento 62 – três palavras-chave neste tópico. São muitos os fatores que podem levar as
pessoas a participarem de movimentos sociais e ações coletivas, em especial pela Internet
hoje, mas discutir razões de participação e motivação não é tarefa simples. Laraña (1999)
lembra que se antes a adesão se caracterizava por se identificar com um movimento de forma
consciente, integrar um grupo, compartilhar ideais comuns de pertencimento e solidariedade,
atualmente, na sociedade complexa, as motivações aumentam e é difícil falar em unidade de
um movimento, consenso entre os seguidores: os movimentos são frutos de negociações e
conflitos constantes.
Melucci (2001, p.143, tradução nossa) também problematiza a questão da
participação.
As pessoas não formam parte de um grupo, não se engajam em uma causa
porque compartilham uma condição objetiva ou porque tomaram uma
decisão definitiva ou irreversível, mas sim porque continuam elegendo entre
distintas opções e assumem a responsabilidade sobre o que isso implica.
62
Referimo-nos aqui ao engajamento em seu sentido corrente, denotativo e diretamente relacionado à
participação e envolvimento. Engajar como ato de se comprometer, se empenhar por uma causa ou ideal, ser
atraído por linha de pensamento ou ideologia política (HOUAISS; VILLAR).
140
convencer o cidadão e fazer o contrapeso quando as ações não são tão práticas ou
relacionadas com a vida diária. Por meio do discurso, os movimentos difundem significados
que incidem em motivações individuais, constroem verdadeiros estímulos à participação, e
conseguem incluir questões para debate na esfera pública. Inclusive os movimentos chegam a
se afastar do debate político mais amplo em seu discurso para estar mais próximos da vida
cotidiana de seus seguidores, acreditam os autores.
Outra questão que tem relação com a participação e com a construção de um discurso
apropriado é a ressonância cultural, termo explicado por McAdam (2001), que recorre à
cultura em suas diferentes manifestações para entender a aparição e desenvolvimento dos
movimentos sociais. Parte dos êxitos dos movimentos sociais depende “da ressonância
cultural dos marcos de referência promovidos pelos organizadores” e também por “associar
suas reivindicações a controvérsias públicas de grande ressonância na sociedade em geral”.
(MCADAM, 2001, p. 45, tradução nossa). Portanto, os movimentos suscitam formas de
consciência, são capazes de pautar temas que geram identificação, repercussão na sociedade e
ainda propõem uma visão de mundo que se faz legítima e motiva as pessoas à participação
para buscar uma eventual transformação em diversos setores da sociedade. Essa ressonância
cultural, em nossa opinião, pode ocorrer de diferentes maneiras: por meio de reivindicação
que afeta diretamente um grupo determinado, pelas formas de comunicar e expressar os
problemas com elementos culturais facilmente reconhecidos, e até mesmo nos meios atrativos
oferecidos para a participação. No caso do Greenpeace, o fato de atuar pela Internet, em redes
sociais digitais, facilitando formas de participação online é determinante para o engajamento,
e confirmamos isso nas entrevistas com os seguidores da ONG. Ao mesmo tempo, o discurso
eleito, com linguagem jovem, sensibilizadora, com muitas imagens, vinculação com o
cotidiano e com temas de interesse como a moda, os desenhos animados e os animais em
extinção geram identificação cultural e determinam o êxito das campanhas.
O que nos apoia também no entendimento da participação em movimentos como o
Greenpeace, e está diretamente vinculada com a comunicação produzida, é a emoção. Os
marcos emocionais são capazes de gerar e conduzir para a conquista da participação com um
grau maior de apoio, como bem explica Flam (2005). As emoções são parte da dinâmica dos
movimentos. Os sentimentos de indignação, injustiça, medo, esperança, vergonha e até
mesmo a euforia são fatores de empoderamento dos movimentos. Um discurso bem
construído com forte carga emotiva, imagens impactantes, que seja capaz de evidenciar
aspectos da realidade, causando raiva, ira, tem muito mais capacidade de motivação e de
141
ressonância entre os potenciais seguidores do que uma comunicação racional. Por isso mesmo
que para a difusão dos problemas e suas consequências muitos movimentos sociais, por
exemplo, utilizam do exagero e do viés sentimental para impulsionar o comportamento
coletivo. O apelo emocional é também um elemento significativo para promover as interações
na esfera pública. Ademais, não podemos nos esquecer de que o medo das catástrofes
ambientais, de certos comportamentos em uma sociedade de risco, também podem supor a
urgência de mudanças e levar os indivíduos reflexivos a responderem às incertezas com
mobilização. O que está relacionado com a modernidade reflexiva exposta por Giddens
(1991), que já discutimos na ocasião do primeiro capítulo.
Portanto, temos aqui os fatores principais que avaliamos como responsáveis pela
ampla participação em movimentos sociais: sua relação com o cotidiano, capacidade de
ressonância cultural entre os prováveis seguidores, um discurso apropriado que gera
identificação (compondo um ethos acertado 63) e a força das emoções para motivar a
participação. Todos estes fatores estão refletidos na comunicação praticada pelo Greenpeace.
Nosso intuito agora é entender melhor se estas motivações permanecem no contexto
das TICs. Nesse sentido, as facilidades das ferramentas e dispositivos virtuais podem
incrementar, aumentar, produzir novas formas de participação política? De engajamento
cívico? As questões colocadas por Gomes (2011) são válidas para entender o potencial desses
mecanismos, as novas formas de participação na contemporaneidade e, no nosso caso, o papel
do discurso nesse processo. Mas o espectro é amplo, e existem diferentes formas de
participação, gradação, “de um lado, pela participação política em que a Internet (isto é, as
ferramentas, as linguagens, os produtos e os aparelhos e as máquinas de conexão digital) é
instrumental, de outro, pela participação civil em que Internet é essencial” (GOMES, 2011,
p.20). Sem esquecer que a participação requer um estímulo, um motivo, um benefício privado
ao próprio participante e, ao mesmo tempo, no âmbito da democracia, o vínculo coletivo, do
contrato social, lembra o autor. Fatores que encontram ecos nos marcos de motivação que
discutimos anteriormente.
E existem diferenças em participar usando e-mails, lendo jornais e sites políticos pela
Internet e se engajar em fóruns, redes, empregar ferramentas digitais para participar de
iniciativas com propósitos políticos. A participação online “passa por questões relacionadas
ao desejo tanto quanto por questões relacionadas a meios, motivos e oportunidades de
63
Rememoramos o ethos enquanto representação do corpo do enunciador, que envolve o caráter e a
corporalidade, os traços psicológicos e físicos que mobilizam a afetividade do destinatário (MAINGUENEAU,
1998, 2008).
142
participação” (GOMES, 2011, p.39) e, com isso, está relacionada a diferentes fatores:
motivações próprias, oportunidades adequadas para atingir fins desejáveis, disponibilidade de
ferramentas, recompensas ou constrangimentos ao participar (ou não). Além disso, a energia e
o esforço dispendido devem ser recompensados pelo benefício da ação (ao menos
emocionalmente ou aquele que se acredita que terá).
Mas a participação não deve ser automática ou apenas propiciada pelas facilidades e
agilidades das tecnologias, ela deve ser qualificada, relevante e efetiva. “As pessoas precisam
de meios para participar tanto quanto precisam de liberdade e de informação que os habilitem
a tanto” (GOMES, 2011, p.37). O que está em jogo, na visão do autor, é a qualidade e a
oportunidade de todo cidadão integrar a esfera pública e a vida política, fortalecer a esfera
civil e habilitar minorias políticas. Mas apenas uma parte menor da ação ou da participação
política se dá mediante iniciativas digitais, embora estas sejam as formas especialmente
fecundas de ‘empowerment civil’ (GOMES, 2011, p.40).
Há um verdadeiro obstáculo na participação quando engloba debates complexos, que
exigem conhecimento prévio, aprofundado e que acabam por favorecer grupos privilegiados
de acesso. O que acontece em consultas públicas digitais bastante específicas. Maia (2008)
avalia ainda que muitos movimentos sociais com inabilidade em comunicar, tematizar
restrições, explicar os meios e os fins das problemáticas acabam também por criar nichos
onde só os politicamente formados e entendidos conseguem questionar o que se deve fazer, o
que modificar e como agir. É preciso uma linguagem adequada para construir verdadeiros
espaços de discussão e motivação.
Quando se pretende inclusivo, o debate não pode ser especializado, reforça Maia, que
orienta usar linguagem comum, com códigos culturais reconhecíveis, visando à
compreensibilidade dos problemas e a cooperação dialógica entre os diferentes públicos.
E nesse sentido, frisamos a importância de um ethos apropriado, uma forma de dizer
que suscite o empenho de participação. Em um interessante trabalho sobre a ação social no
143
ciberespaço, a autora Gurak (2003) examina de que maneira a interação social online facilita
ou dificulta as atividades retóricas tradicionais como os discursos e o debate. Ela conclui que
as formas das mensagens em rede se diferem da presencial, justamente por conta da
velocidade, alcance, da otimização de tempo e de recursos, que muitas vezes leva a produção
e difusão de informações pouco precisas. Mas estas características não são o principal para o
êxito das mobilizações, e sim o ethos comunitário, compartilhado pelos seguidores. Ou seja, a
identificação que o discurso pode criar é determinante na opinião da autora para a
participação.
Voltando a Maia (2011, p.50), em outra obra ela coloca que a emergência das
ferramentas da Internet contribuiu para revigorar a participação política e sustentar o
entusiasmo pela sociedade civil, aqui entendida como “o domínio das ações voluntárias, os
movimentos sociais e outras formas de comunicação pública, como os media”. O que nos
interessa na abordagem da autora é entender se a comunicação em rede reconfigura formas de
participação política. O certo é que ao mesmo tempo em que as TICs podem fortalecer a
democracia e facilitar a participação cívica (restaurar comunidades, prover encontros
independente de local geográfico, superar tempo e espaço) podem “sustentar regimes
ditatoriais, criar assimetrias, aumentar desigualdade e aprofundar injustiças, principalmente
entre aqueles que têm e os que não têm acesso” (MAIA, 2011, p.68).
A autora revela ainda os obstáculos tradicionais ao exercício da democracia que são,
principalmente, falta de informação, apatia e desconexão entre cidadãos e seus representantes,
continuam existindo mesmo em sociedades com amplo acesso às tecnologias. Por isso
insistimos que a Internet por si só, sua mera existência, não promove a participação política,
mas facilita e disponibiliza estratégias de aproximação, mobilização, reforça e cria novos
vínculos. As atividades virtuais e físicas estão integradas, inclusive na participação política,
não existe um universo paralelo e autônomo. “Ao invés disso, a Internet deve ser entendida de
modo integrado ao conjunto da vida, suplementando as interações face a face e o uso de
outras tecnologias de comunicação mais tradicionais” (MAIA, 2011, p.71).
Movimentos sociais históricos sempre tiveram atuação política, exerciam militância
antes das tecnologias e o que fazem agora é ampliar o trabalho, incrementar e reforçar a
participação. Como é o caso do movimento ambiental que atua nas dimensões online e
presencial, oferece um amplo e bem sucedido repertório de ações simbólicas, alicerçados em
um discurso próprio, que antes restrito a espaços limitados, com a rede passam a ter alcance
global (TASCON; QUINTANA, 2012).
144
Esse argumento nos remete novamente à entrevista que realizamos com o coordenador
de web do Greenpeace, Élcio Figueiredo, que confia no virtual como extensão do real e
comenta o esforço da ONG em atingir todas as dimensões “Se você faz um bom trabalho nas
ruas isso irá refletir na Internet, na mesma direção, o que você faz na Internet reflete na
campanha nas ruas” (FIGUEIREDO, 2012). Mobilizações em torno de temáticas que se
iniciam online, por exemplo, ganham respaldo ao serem pautadas pela mídia convencional, ao
influenciarem ações concretas e políticas públicas. No caso da reforma do Código Florestal
brasileiro, entre março e junho de 2012, foi nítida a participação dos movimentos ambientais
em diversas esferas: se organizaram pela rede, fizeram manifestações presenciais, enviando
moções e petições aos representantes políticos e conseguindo, ao menos, adiar a votação das
alterações.
Dader (2009) investiga a construção das campanhas políticas em rede, e apresenta
similaridades com a expressão comunicativa dos movimentos ambientais. Partidos e
candidatos, por exemplo, aproveitam o potencial das novas ferramentas em uma perspectiva
de marketing eleitoral e nem tanto de propostas deliberativas e participativas. Dader (2009)
inferiu, em suas análises de campanhas políticas espanhola e americana, uma satisfação das
funções de difusão, propagação informativa e de persuasão e emotividade, muito mais que de
transparência informativa, mobilização e participação. E mesmo quando tem oportunidade e
ferramentas para oferecer um debate plural, a comunicação praticada, nesses casos, privilegia
o cartaz publicitário. As funções de persuasão e emotividade não precisam necessariamente
ser eliminadas, já que elas exercem tarefa de convencimento, por exemplo, mas não se pode
negligenciar informações detalhadas e necessárias para o exercício cidadão. (DADER, 2009,
p.59).
Ao mesmo tempo em que a mobilização e as redes de protesto representam uma
inovação das formas de participação e representação, as campanhas na Internet são muitas
vezes flexíveis, diversas, sem espessura ideológica e com propósitos políticos difusos. Com
isso, a “aplicação da Internet depende amplamente dos propósitos de seus usuários e do
contexto social” (MAIA, 2011, p.74), além dos diversos usos na heterogeneidade das
organizações.
Uma performance adequada, como já nos lembrou Sodré (2006), com um discurso,
muitas vezes fundamentado no extraordinário, no espetacular, ajudam a alcançar a dimensão
do engajamento. Lycarião (2011) e Marzochi (2009) que também desenvolveram
investigações com o Greenpeace nos ajudam a ampliar o cenário. Lycarião não vê a estratégia
145
da espetacularização como negativa. Para ele, a Internet, seus portais, blogs e redes digitais
contribuem para dar sustentação ao debate público, independentemente de fazerem uso de
imagens impactantes, táticas pirotécnicas e atenderem a sociedade do espetáculo. E defende a
tese que a espetacularização da comunicação política, “pode se mostrar como uma excelente
oportunidade para que os atores críticos produzam contribuições relevantes para a esfera
pública”. Assim, é válido “sob determinadas circunstâncias e lógicas de ação”, que os atores
cívicos se valorem de elementos estéticos e expressivos para ganharem visibilidade e
conquistarem uma parcela considerável da população, contribuindo com o debate, com a
circulação discursiva (LYCARIÃO, 2011, p.258-259). De fato, pensamos que a
espetacularização pode contribuir para colocar, ao menos, as temáticas em evidência. É
possível avaliar que o espetáculo, aliado a elementos da cultura da mídia, como já
confrontamos no Capítulo II, como celebridades, personagens, priorização de imagens, são
fortes estruturadores da comunicação, proporcionam visibilidade à ONG, colocam as
temáticas em evidência e dão pistas para entender suas estratégias discursivas.
Já para Marzochi (2009, p.290) a prática pode ser perniciosa e há o risco de se
“aumentar a relevância do problema ao invés de solucioná-lo para que a organização continue
(...)”. As pesquisas científicas, por exemplo, são transformadas em informações palatáveis
para o leigo, e utilizadas como argumento sólido, porém sempre simplificadas, sem descrever
os procedimentos, as teorias, muitas vezes focadas nas pesquisas da própria organização,
“colocando-se até mesmo fora do debate sobre os diferentes projetos políticos relativos à
questão ambiental” (MARZOCHI, 2011, p.322). O emblemático é que apesar do Greenpeace
acompanhar e muitas vezes encabeçar propostas de políticas ambientais nacionais e globais,
junto com outras organizações, mantém um perfil autossuficiente de referenciar os próprios
levantamentos e pesquisas, o que nos evidencia um tipo de ethos professoral, de autoridade,
que constrói os próprios argumentos e toma pra si as conquistas.
No entanto, compartilhamos da opinião de Lycarião de que o Greenpeace tem grande
repercussão, inclusive na mídia convencional, justamente porque utiliza da dramatização, do
inusitado, não complexifica a pauta, mas a deixa interessante e palatável, enquanto reserva
para o portal o detalhamento das questões. “Ou seja, o âmbito interacional do Greenpeace na
Internet acompanha, de modo atualizado e dinâmico, as inserções discursivas que a entidade
consegue nos media e permite um aprofundamento, até o nível desejado, dessas mesmas
inserções” (LYCARIÃO, 2011, p.287). Procedimento que é confirmado pela própria
146
organização. “No blog e website temos um conteúdo mais consistente e precisamos que as
pessoas conheçam nosso trabalho mais profundamente” (FIGUEIREDO, 2012).
Mas diversas perguntas nos surgem no decorrer desta discussão. Que mecanismos de
participação são usados pelo Greenpeace na cibercultura? Eles atuam apenas para fidelizar,
angariar recursos, realizar o marketing, ou efetivamente são usados para fomentar o debate,
incorporar críticas e dúvidas dos usuários? Qual o papel do discurso nesse processo?
Entendendo o ato de participar como ir além do mero acesso às páginas eletrônicas e redes
digitais, como forma de atuar, ainda que minimamente, com comentários, compartilhamentos,
assinatura e replicação de documentos.
Temos alguns indícios de respostas.
No portal do Greenpeace a forma de intervenção mais direta é por meio de
comentários, que pela nossa livre coleta de dados observamos que são poucos, não são
respondidos diretamente e tampouco suscitam uma discussão. Não há mediação de debates e
nem, muitas vezes, respostas diretas da organização aos questionamentos. O coordenador de
web no Brasil, como já colocamos, justifica que eles não intervêm porque acreditam que a
sociedade deve encabeçar o debate. Mas averiguamos no âmbito do portal que não existe
uma estrutura colaborativa que permita, por exemplo, a proposição de conteúdos e discussões,
documentos abertos com opções personalizadas, e a proposta mais próxima da interatividade é
o item ciberativista, que permite integrar um modelo de mobilização, assinando petições,
moções, divulgando as campanhas em blogs e outros espaços, ‘doando um tweet’ (que
consiste em autorizar, por meio de um aplicativo, que o Greenpeace publique as campanhas
diretamente no perfil do usuário). Uma diferença interessante que vamos detalhar na análise
de discurso comparativa entre Brasil e Espanha, mas vale adiantarmos aqui é que as petições
no Greenpeace Espanha, por exemplo, podem ser personalizadas, ou seja, existe um modelo,
mas o usuário tem autonomia para escrever sua própria reivindicação, já no Brasil o formato é
fechado.
Nas redes sociais digitais há um compartilhamento muito mais significativo, o número
de comentários é surpreendente em certas ocasiões e o debate é mais propício, o que pode ser
atribuído à dinâmica mais livre do Facebook, sem necessidade de cadastro ou de passar por
filtros prévios. A média de comentários que verificamos durante nosso período de observação
foi de 75 em cada publicação sobre Desmatamento Zero e 271 em cada novo post sobre a
147
Campanha Salve o Ártico, um deles registrando espantosos 1.800 comentários 64. O que nos
revela uma esfera de discutibilidade e participação aberta e massiva. Obviamente que as
intervenções são diversas e difíceis de padronizar – vão desde um simples ‘apoio’ a
manifestações de piedade, críticas, sugestões, até retaliações, questionamentos e xingamentos
diretos. Também notamos uma participação mais significativa quando o Greenpeace realiza
ações virtuais específicas como as twitadas (em que os internautas são convocados a publicar
tweets de campanhas, com hashtags específicas para dar visibilidade à questão na rede) e o
#PapoGreenpeace 65, uma espécie de videoconferência, realizada esporadicamente, com
representantes da ONG, explicando uma campanha ou assunto ambiental em evidência,
sendo possível enviar perguntas e comentários. O interessante ali é que na página de
transmissão do vídeo há a possibilidade de participação por chat, onde verificamos um real
debate não filtrado, encadeado, com questões bastante específicas sendo discutidas, como os
custos do desmatamento, a anistia aos desmatadores, o Cadastro de Áreas Rurais e obras de
infraestrutura, além de questionarem o trabalho dos ativistas, mas em nenhum momento
houve resposta do Greenpeace.
Marzochi (2009) também identificou que embora o Greenpeace conte com chats,
fórum de discussão e atenda os interessados por meio de correio eletrônico, na maior parte das
vezes, não incorpora as sugestões e nem busca decisões coletivas para suas ações. Todas as
campanhas e atividades são definidas hierarquicamente. A autora faz outra consideração
importante sobre a participação no Greenpeace que é referente ao trabalho do ativista e
ciberativista. Este último atua diretamente na organização e é treinado para ações presenciais
de impacto, envolvendo escalada, alpinismo, conhecimento de atividades aéreas e náuticas.
Enquanto os ciberativistas exercem uma função anônima, sem compromissos, pautada em
ações virtuais. E para tal basta se cadastrar como e “assinar e compartilhar nossas petições on-
line, comentar nossas notícias, publicar reportagens, vídeos e banners do Greenpeace em sua
rede social ou blog” (www.greenpeace.org/brasil/pt/Participe/Ciberativista/). Já identificamos
64
Lembrando que nossas explorações foram realizadas durante junho de 2012 a junho de 2013 no Facebook e
Twitter do Greenpeace, com foco nas campanhas principais: Desmatamento Zero e Salve o Ártico. As
quantificações, realizadas a partir dos destaques do portal institucional, estão disponíveis na tabela do
APÊNDICE 2, e são devidamente comentadas no Capítulo IV.
65
Pudemos acompanhar o papo Greenpeace em duas ocasiões, sobre a mobilização nacional pelo
Desmatamento Zero, em 5 dezembro de 2013, e verificamos que pelo menos 30 pessoas acompanharam a
transmissão. E outra oportunidade, em 16 de janeiro de 2014, com 130 pessoas assistindo à conferência com a
ativista Ana Paula Maciel, que ficou detida na Rússia após protesto no Ártico. Os eventos são anunciados
antecipadamente e há link no portal e nas redes sociais digitais para aceder à plataforma de transmissão de
vídeo livestream. A videoconferência estava disponível em: http://www.greenpeace.org/brasil/pt/Blog/papo-
greenpeace-sobre-a-mobilizao-nacional-pe/blog/47576/.
148
66
Contatamos voluntários de forma presencial durante o evento da Rio+20 e fizemos abordagens pela própria
Internet (identificando, por exemplo, aqueles que seguiam a organização e interagiam com comentários) para
enviar questionários referentes ao engajamento em rede. Foram mais de 100 contatos e obtivemos 25
respostas, que seguem na íntegra no APÊNDICE 1.
149
mais interessados e preocupados com a própria participação, como é possível comprovar nas
respostas.
As respostas nos levaram a visualizar que a participação começou a ocorrer por meio
exclusivamente da Internet. Apenas três dos entrevistados participavam do Greenpeace antes
das facilidades tecnológicas, sendo uma com oito anos de atuação como voluntária e ativista,
e outras duas que acompanham a ONG desde sua fundação. Mas as motivações para a
participação envolvem o reconhecimento e o histórico de longa data do Greenpeace, em uma
relação com o ethos pré-discursivo, que podem ser comprovadas com respostas como “Acho
o Greenpeace uma das mais sérias defensoras do meio ambiente” (PETRONILHO, 2013); “O
que me levou a acompanhar o Facebook do Greenpeace é o grande nome que eles têm”
(ZACARIAS, 2013). E também estímulos mais romantizados como o amor pela natureza, a
vontade de agir para mudar o mundo, a consciência dos problemas ambientais e outras
respostas no sentido mais altruísta que foram frequentes entre os voluntários.
A maioria dos abordados limita sua participação ao ambiente virtual e participa de
mobilizações online, por meio, principalmente, de assinaturas de petição e compartilhamento
de informações, mesmo sem reconhecer o engajamento. Seis entrevistados afirmaram que já
participaram de ações presenciais. Sendo quatro deles atuando como voluntários, uma que
participou de manifestação em São Paulo e outra que coletou assinaturas de forma presencial
e enviou para o Greenpeace. Mais da metade dos entrevistados, 60%, acredita que a
participação é tímida, definindo como bem limitada, pequena, gostaria de ajudar mais e
outras: “Defino minha contribuição como muito pequena, mas a que posso dar” (CANTO,
2013); “Minha contribuição é mínima (infinitamente inferior ao que gostaria: tomo
conhecimento das ações, compartilho mensagens)” (OLIVEIRA 2013). Alguns até citando
que gostariam de ajudar financeiramente (ou que pretendem fazer em breve).
O contato com as redes sociais digitais do Greenpeace é constante: 50% afirma tomar
conhecimento das atividades pelo menos uma vez por semana, isso sem considerar uma parte
que não soube estimar a frequência, com um dos entrevistados citando que chega a acessar o
portal três vezes por dia. O que confirma mais uma vez o protagonismo das tecnologias para o
reconhecimento dos problemas ambientais. As respostas evidenciam a confiança nas
informações da organização e o empenho em fazer o que o Greenpeace propõe: “faço muita
divulgação, online, Facebook, e-mail, já participei de algumas manifestações que ocorreram
aqui perto de casa, no vão do MASP, solicitando assinaturas em projetos como
Desmatamento Zero, ou solicitando que as pessoas conheçam o importantíssimo trabalho do
150
Greenpeace (...)” (PETRONILHO, 2013). “Tenho feito o que eles sugerem, liguei para a
embaixada (desligaram na minha cara), mando e-mails e todos os dias compartilho algo sobre
a prisão deles” (ROCHA, 2013) “(...) fiquei sem abastecer meu carro em postos desta
bandeira até o Greenpeace postar que eles haviam parado com as ações” (FERREIRA, 2013);
“assino e compartilho o que eles pedem” (MOREIRA, 2013). Poucas respostas, três delas
mais especificamente, mostraram desconfiança e questionaram certas práticas da ONG. “As
pessoas parecem gostar do espetáculo oferecido. Das ‘grandes’ causas. Coisas como ‘eles
estão ali por nós’, acho um equívoco ‘idealista’ (MIRANDA, 2014); “o site mostra problemas
ambientais, mas deveria melhorar a relação com os internautas para que os mesmos possam se
interessar e buscar se aprofundar melhor no que se trata de meio ambiente” (LIMA, 2013).
Concluímos que a comunicação em rede se estabeleceu como alicerce das ações do
Greenpeace, o que é comprovado pelo coordenador de web, Élcio Figueiredo. “Hoje o
trabalho online é essencial para a organização. Muitas vezes precisamos primeiro dar voz a
nossas campanhas no mundo virtual para depois repercutirem no off-line”. E as mídias na
Internet são usadas com propriedade, linguagem diferenciada e com o viés multimídia e
transmidiático.
Na nossa visão, não existe um canal sem existência do outro, por exemplo, o
Twitter é um suporte a outros canais como website e blog. No blog e website
temos um conteúdo mais consistente e precisamos que as pessoas conheçam
nosso trabalho mais profundamente. O que vale ressaltar é que a Internet
muda muito e precisamos ficar ligados nessas mudanças. No Brasil, por
exemplo, o Orkut já foi nosso principal canal nas redes sociais, depois
tivemos o Twitter, hoje em dia é o Facebook, mas o e-mail continua sendo
um dos meios mais efetivos (FIGUEIREDO, 2012).
ponto de partida o destaque do portal, para investigar se o respectivo assunto também figurou
nas redes sociais digitais naquele momento ou em datas próximas, e procurando deixar claro
quando se tratava de um post exatamente igual ao assunto do portal ou quando estava apenas
relacionado.
Os tweets são um indicativo do agendamento da organização, ou seja, dos assuntos
que ela elege para ganhar as redes sociais digitais e atingir os diferentes seguidores, enquanto
o procedimento do retweet, ou seja, a replicação de uma publicação sinaliza para aceitação,
concordância com a mensagem e o interesse em divulgá-la. Um post com 168 retweets, como
foi o caso do Dia do Meio Ambiente (item 77 do APÊNDICE 2), por exemplo, significa que
este mesmo número de pessoas optou por colocar esta informação em seu perfil para que seus
seguidores a conheçam e também possam replicá-la, e assim sucessivamente em um ciclo que
não se pode controlar ou mensurar. Esta mesma dinâmica existe nos compartilhamentos do
Facebook que também são postados na página do usuário e outro seguidor pode compartilhar
atingindo uma permanência e um alcance abundante na rede.
Os comentários no Facebook, assim como no portal, são importantes para
entendermos quais os assuntos que geram mais interesse, provocam intervenções, sinalizando
para a composição de uma esfera pública, ainda que temporária e restrita. Enquanto o ‘curtir’
indica, ao menos, que concordou e aprovou a informação.
As postagens no microblog Twitter, os tweets, não ultrapassam os 140 caracteres,
estão sempre acompanhadas de hiperlinks para o portal, para as páginas das campanhas, fotos
e vídeos, e ainda agregam as hashtags, que garantem a visibilidade da mensagem, sua
permanência na rede social e sua etiquetagem enquanto assunto consolidado, como são os
casos #desmatamentozero, #desafiodamoda, #vemprarua, #brasilcomflorestas,
#euvotopelasflorestas, #salveoártico, #detoxmoda. As duas hashtags de maior evidência
durante nossa análise, verificadas em todos os dias do nosso período de observação no
Twitter, foram às relacionadas às campanhas do Desmatamento Zero e ao Salve o Ártico. As
hashtags, para nossa análise, atuam como elemento de destacabilidade muito acertado para
criar o fio condutor necessário para os assuntos. A linguagem coloquial também desperta a
atenção nas mensagens, como nos exemplos aleatórios que guardamos nas nossas observações
e citamos a título de reconhecimento: “Boa noite, antes de dormir ajude a salvar minha casa”,
“Exerça sua cidadania, assine pelo desmatamento zero”, e o estilo direto, chamando a pessoa
à ação: “Você sabia que a casa dos ursos polares pode desaparecer nas mãos de empresas
petroleiras? Assine para salvar o Ártico”, “Ajude-nos, assine e compartilhe”, “Tirou da gaveta
155
seu título de eleitor? Aproveite para apoiar a lei de iniciativa popular do #DesmatamentoZero,
“Enquanto você lê esse tweet, madeireiras pressionam populações tradicionais na Amazônia”,
“Se você não concorda com o absurdo que está acontecendo na Amazônia, então salve as
florestas(...)” O tom de ineditismo também tem lugar com as etiquetas #urgentes,
#denuncia 67. Neste momento antecipamos a formação do ethos do parceiro, do amigo que
informa, orienta e dá alertas.
No Facebook todos os posts trazem, além do texto normalmente curto, direto, com
hiperlink para o portal e páginas adjacentes, fotos ou vídeos relacionados. As imagens são
prioritariamente focadas em animais, no caso principalmente no nosso período de estudos, de
ursos polares que são os símbolos da campanha Salve o Ártico, além de animais nativos como
araras, macacos, onça, pássaros. Também estão presentes imagens de desmatamento,
degradação ambiental e de ações ativistas, em uma priorização do estereótipo ambiental
enquanto preservação de fauna e flora e de protestos espetaculares, materializando a figura do
herói. Foram os casos da ocupação da plataforma da petroleira Russa Gazprom, em agosto de
2012 (item 23), para exigir o fim da exploração de petróleo no Ártico e, em novembro do
mesmo ano, dos protestos nas lojas da Zara, como parte da campanha Detox/vítimas da moda
(item 49), que acusava grifes de moda de utilizarem produtos contaminantes em suas
confecções. No caso dos vídeos, há imagens de ações e animais, mas também depoimentos,
principalmente, de participantes dos projetos do Greenpeace.
As redes sociais digitais, Twitter e Facebook, assumem um papel de destaque na
comunicação do Greenpeace, por estarem diretamente relacionadas às ações ciberativistas, na
visão da organização, que considera como ciberativista aquele que replica as mensagens,
divulga as ações, comenta e participa de mobilizações online. De fato as ações ali surtem mais
engajamento e participação, e se pode avaliar mais quantitativamente o sucesso das
campanhas pelo aspecto da visibilidade, autoridade, reputação e popularidade (RECUERO,
2010). Pensando nisso, avaliamos ser prudente aferir considerações de forma mais específica
sobre as observações livremente realizadas nestes espaços e que nos ajudam a entender a
dinâmica comunicativa. Mas é preciso esclarecer que realizamos uma análise exploratória em
tempo real e também recorremos a mecanismos de buscas que nos permitiram avaliações,
certas quantificações para visualizar o contexto, mas não a exatidão.
67
Os exemplos foram retirados visualizando as postagens do Greenpeace no Twitter -
twitter.com/GreenpeaceBR, buscando o histórico da organização na própria rede e por meio da ferramenta de
busca gratuita http://topsy.com/. No caso do Facebook é possível obter o histórico desde a primeira postagem
no próprio perfil do usuário: www.facebook.com/GreenpeaceBrasil
156
O Greenpeace mantém conta no Twitter desde setembro de 2009, o que desponta uma
média de nove atualizações por dia, considerando os 15 mil posts da organização até março de
2014. Realiza estratégias midiáticas aproveitando as possibilidades do microblog,
disponibilizando fotos, vídeos, fazendo o acompanhamento em tempo real de certos
acontecimentos, como foram os casos das atividades realizadas durante a Rio+20, das
manifestações indígenas em Brasília em abril de 2013 e dos protestos de junho de 2013 no
Brasil. Além de propor o twitaço, uma espécie de incentivo para que os seguidores postem
mensagens com as hashtags propostas para ocasionar certo tumulto na rede e colocar o tema
em trending topics (os mais citados do Twitter) e, com isso, ganhar proeminência. Na nossa
observação acompanhamos o twitaço, que acontece com dia e hora marcada para começar e
terminar em duas ocasiões: na mobilização pela floresta com 58 tweets e no dia da árvore com
85 tweets, quantidades publicadas pelo Greenpeace e replicadas pelos seguidores de maneira
imensurável. Mas verificamos que todos os tweets durante o ano contaram com retweets, ou
seja, foram repassados pelos seguidores. A média de retweets no período da nossa amostra foi
de 45 por post (tomamos o cuidado de somá-los e dividi-los pelo número de posts), com
óbvias e desconcertantes variações. Os tweets com mais replicações - 292, 195 e 168 - foram
os casos respectivamente da campanha Detox Zara, dos protestos no Brasil e do Dia do Meio
Ambiente (itens 47,81,77 do APÊNDICE 2). Em contrapartida houve posts, como o do
projeto Juventude Solar, com apenas 3 retweets (item 74), o que pode ser explicado por se
tratar de uma atividade de incentivo a implantação de placas de energia solar, desenvolvida
com uma comunidade específica no Rio de Janeiro. Outro item com baixa adesão e que
também pode ser explicado pela especificidade do assunto foi sobre certificação florestal com
apenas seis retweets (item 86). Nos tweets também foi possível notar mais interferência do
Greenpeace, se comparado com Facebook e portal, respondendo aos posts e retwitando os
assuntos dos seguidores.
No Facebook durante um ano de nossa observação contabilizamos 187 posts, um novo
post a cada menos de dois dias. Destes, 117 ou 60% eram referentes às duas campanhas
principais – Desmatamento Zero e Salve o Ártico, mas com textos diversos. Também
contabilizamos as curtidas e os comentários nas duas temáticas principais, para avaliar o nível
de repercussão das publicações. Verificamos no caso do Desmatamento Zero uma média de
75 comentários por post e 1.620 curtidas, e no Ártico um número mais significativo de 271
comentários e 5.400 curtidas por post. Em alguns posts a quantidade de compartilhamentos
também chama a atenção, muitas vezes superando o item curtir, a forma mais simples de
157
em uma estratégia de mais proximidade e contato com o público. Essas publicações incluímos
a título de ilustração no ANEXO 2.
Há a preocupação com as diferentes plataformas e o entendimento de que a
mensagem deve estar adequada a cada meio disponibilizado. E a maior evidência desta
assertiva é justamente que nem todos os assuntos das redes sociais digitais estão diretamente
relacionados com as temáticas do portal, ou seja, não existe aparentemente, como em muitos
casos, um procedimento automático para que todos os assuntos do portal estejam também nas
redes. Isso é ainda mais evidente no Facebook que, embora traga alguns destaques do portal,
não é regra. Pela nossa quantificação, de acordo com a tabela, apenas 30% dos destaques do
portal ganharam espaço no Facebook, enquanto quase 90% estavam no Twitter. Com isso, o
microblog tem a função bem delimitada de divulgar os assuntos em destaque, dando mais
visibilidade para, inclusive, levar as pessoas aos conteúdos institucionais. Lembrando o que
nos disse o coordenador de web do Greenpeace, o Twitter atua como uma espécie de suporte
para o portal e este, por sua vez, opera com conteúdos mais consistentes e aprofundados. Já o
Facebook se tornou uma rede de relacionamento diária que propicia mais proximidade com os
públicos.
Notamos também posts repetidos, o que indica a insistência em determinados assuntos
na tentativa de dar mais visibilidade e gerar participação, como foram os casos dos vídeos
sobre o maior desmatador da Amazônia (denúncia do Greenpeace como parte da campanha
Desmatamento Zero); com depoimentos dos participantes do Juventude Solar e a websérie
sobre o programa #Cadê? Mobilidade Urbana, que trata de reivindicar que as cidades invistam
em planos para melhorar o deslocamento dos cidadãos 68.
Voltando ao levantamento realizado, verificamos que a campanha Salve o Ártico foi a
que suscitou mais comentários e curtições, seguida pelo Desmatamento Zero, que recebeu
mais atenção do Greenpeace e o maior número de postagens e atualizações que acabou
suscitando em adesões, maior número de engajamento online e de esfera de discutibilidade.
Além da campanha Detox/vítimas da moda e dos protestos de junho de 2012 no Brasil. A
campanha Salve o Ártico, desenvolvida em âmbito global, pode ter seu sucesso explicado pela
própria constância da mensagem, mas, sobretudo pelo discurso adequado, que iremos detalhar
no próximo capítulo, e pelas imagens de efeito. As fotos graciosas de ursos polares em
diferentes performances (que constam nos ANEXOS) atingem um grau de centralidade que
68
Os vídeos estão disponíveis no canal do Youtube do Greenpeace e podem ser acessados respectivamente
pelos endereços: http://www.youtube.com/watch?v=CkeM9UG-8Dc ;
http://www.youtube.com/watch?v=juNG9Wr3yxI; http://www.youtube.com/watch?v=hf1DqkpZVQY.
159
acaba por suprir o fato da temática não fazer parte diretamente do cotidiano dos usuários
brasileiros. O que evidencia, inclusive, a superficialidade das problemáticas ambientais que
têm mais êxito quando são construídas com base em cenas lúdicas, engraçadas de ursos
dançando, por exemplo, mas com apelo emocional e afetivo. Já é diferente do caso da
campanha Detox 69, que trata de um tema diretamente relacionado à cotidianidade, envolve
empresas de moda mundialmente conhecidas e conta com o apelo das imagens publicizadas e
a proposta do consumidor consciente. Em contrapartida, as denúncias de desmatamento,
projetos como Juventude Solar (itens 74, 78, 85) e o de mobilidade urbana (itens 62, 72) não
foram bem sucedidos no Facebook. Até mesmo o post de aniversário do Greenpeace não
gerou adesões numerosas (item 68: 855 curtir, 44 comentários, 215 compartilhamentos). Os
dois primeiros citados são projetos desenvolvidos localmente – Rio de Janeiro e São Paulo –
são tratados de forma mais informativa, com seriedade, sem imagens atrativas, o que
empiricamente comprovamos que não gera tanto interesse.
No levantamento também incluímos uma coluna para visualizar se as temáticas
estavam acompanhadas de propostas políticas mais efetivas. Entendemos que a atuação do
Greenpeace por si só é, obviamente, política, mas buscamos entender a materialização desta
política em produtos reais de reinvindicação ou mesmo disponibilização de meios de
participação para seus seguidores, tais como moção, petição, acordo, incentivo, algum tipo de
lobby ou projeto político mais específico. Há casos diferenciados que, por demandar
mobilização, levantar problemáticas e estudos, também consideramos como propostas
políticas, apesar do caráter mais informal. Como o projeto Juventude Solar, que realiza
treinamento de jovens para implantarem placas de energia solar em comunidades carentes e
no caso do #Cadê? Mobilidade Urbana, as pesquisas realizadas sobre a situação dos planos de
mobilidade em cidades brasileiras. E assim notamos que 52 ou 60% dos posts contam com
propostas políticas, ou seja, não se resumem a informação ou denúncia no meio virtual, mas
sugerem ações, petições e projetos. Mas vale notar que muitos destes posts são referentes a
uma mesma iniciativa, como são os casos do Desmatamento Zero e Salve o Ártico, que
respondem por 61% do total dos conteúdos que apresentam iniciativas políticas.
69
No artigo O discurso ambientalista pelas vítimas da moda, publicado no livro Práticas Comunicacionais:
Sujeitos em (re)ação (2013) tivemos a oportunidade de investigar as estratégias discursivas da campanha
Detox, e pudemos identificar um discurso que refletia um simulacro das publicidades de moda, com uma
linguagem agressiva e persuasiva. Criou-se uma cenografia própria, fora do terreno ambientalista, que
evidenciava modelos andróginas, esquálidas, misteriosas, exaltando o glamour da moda, em uma lógica de
verossimilhança com a publicidade.
160
Por fim, elencamos se o assunto ganhou a mídia convencional. Podemos afirmar aqui
com segurança que mais de 90% dos destaques do portal foram replicados em outras páginas
da Internet, em sites de outras organizações, de comunicação independente, blogs, mas
preferimos não mencionar no levantamento, pois optamos por outra categorização, na
tentativa de entender quais assuntos conseguiram espaço em grandes jornais, revistas, TVs,
atendendo a proposta de entender os veículos tradicionais como centrais para a esfera pública.
Para isso, fizemos o acompanhamento inloco e optamos por ferramentas de busca que nos
forneceram um resultado aproximado, uma vez que não temos como controlar a cobertura
midiática realizada por todo país. No mínimo, 39 posts, ou 44% dos assuntos também foram
pautados pela mídia convencional, um resultado considerável.
A habilidade comunicativa do Greenpeace, como sabemos, antecede a Internet e suas
ferramentas, mas com a rede se potencializam as formas de comunicação e expressão, e se
arquiteta uma grande quantidade de informação, em diferentes plataformas, com linguagens
bastante apuradas, específicas a cada ocasião e que alcançam os diferentes meios de
comunicação. As informações estão, em sua maioria, agregadas a propostas políticas e há
espaço para discussão e engajamento.
Com essas aferições delineadas, nas próximas páginas adentramos no mérito das
campanhas e das temáticas trabalhadas pelo Greenpeace durante nossa observação e
justificamos nosso corpus de análise.
uma página web que explica os valores, a importância da contribuição e já com formas de
pagamento (junte-se-ao-greenpeace.org.br). As mensagens e as imagens solicitando
colaboração em dinheiro são constantemente atualizadas e estão normalmente vinculadas às
campanhas vigentes com títulos e textos bastante incisivos, persuasivos, como o próprio
slogan utilizado ‘Junte-se a nós’, que sinaliza para o ethos do amigo, do parceiro, que faz um
apelo. Além de outras expressões, que pudemos visualizar na página e que funcionam como
elementos de destacabilidade, ‘faça parte do nosso time’, ‘você pode fazer a diferença’, ‘Com
você, um futuro mais verde e sustentável é possível’. A grande visibilidade da campanha
‘Ajude o Greenpeace’, também evidenciada com a significativa quantidade de chamadas à
doação por meio de banners ao longo do próprio portal, se consolida como uma das temáticas
de mais destaque (talvez pela própria importância do tema, que garante a manutenção do
Greenpeace, que diz só receber recursos financeiros de pessoas físicas). Foram 22
atualizações, totalizando 20% dos conteúdos levantados e ainda lembremos que ele se
estabelece com um conteúdo fixo, que permaneceu no espaço durante toda nossa observação.
Seguindo na perspectiva quantitativa, para entender as campanhas que ganharam mais
espaço no portal e, portanto, mais atenção do próprio Greenpeace e teoricamente da
sociedade, localizamos a maior frequência no tema do desmatamento, materializado na
campanha Desmatamento Zero (com uma página específica criada para a campanha -
www.ligadasflorestas.org.br/). A campanha é uma iniciativa do Greenpeace com outras
organizações ambientalistas, que propõem um projeto de lei de iniciativa popular para que a
União e os órgãos públicos competentes estabeleçam a proibição da supressão de florestas
nativas em todo o território nacional. Foram pelo menos 24 atualizações que versavam sobre o
assunto e reiteravam a campanha, trazendo desde os links especificamente para o hotsite, os
convites para assinatura da petição, até pautas mais amplas como as alterações do código
florestal, denúncias de exploração ilegal de madeira, desmatamentos no Brasil e no mundo
(no APÊNDICE 1 podem ser visualizadas nos itens 12, 13, 17, 24, 28, 31 32, 35, 36, 38...).
Na sequência quantificamos a campanha Salve o Ártico, com 12 atualizações, que
também conta com uma página exclusiva e petição solicitando o fim da exploração de
petróleo no Ártico e a criação de um santuário mundial no Polo Norte
(www.salveoartico.org.br). A Campanha é encabeçada pelo Greenpeace Internacional e
ganhou destaque considerável, até por não fazer parte das problemáticas ambientais do nosso
contexto, como é o caso do desmatamento, em que o Brasil e outras entidades nacionais estão
diretamente envolvidos (itens 11, 15, 20, 21, 23, 29, 33, 59, 67, 87...).
162
história” (item 29) que foi publicada pelo Greenpeace em setembro de 2012 com grande
repercussão no Facebook: quase 17 mil curtidas, 1.300 comentários e mais de 10 mil
compartilhamentos, e “O crime compensou” (item 51) divulgada em dezembro de 2012, teve
menos repercussão nas redes sociais digitais, mas mereceu comentário no portal (importante
indicativo de interesse), alcançou a mídia convencional e contou com vídeo, fotos e até jogo
eletrônico.
Na sequência apresentamos ainda uma comparação entre o ethos do Greenpeace
Brasil e Espanha analisando o hotsite do Salve o Ártico também em espanhol, que obedece a
mesma estrutura e layout, visto que é uma campanha internacional. Mas apesar dos textos à
primeira vista aparentarem uma mera tradução, há diferenciações importantes que dão pistas
sobre as diferentes ciberculturas da mesma organização em países diferentes. Portanto, sem
pretensão de amostragem, analisamos cinco conjuntos de textos, que despontam como um
corpus relevante e categórico para a nossa tarefa de entender o discurso na cibercultura
ambiental.
Com a fase de diagnóstico já cumprida, apresentamos uma súmula do nosso protocolo
de análise, relembrando os itens nos quais estamos nos concentrando a partir de agora.
PROTOCOLO DE ANÁLISE
FASE DE DIAGNÓSTICO
ANÁLISE DO DISCURSO
• Encadeamento/técnicas argumentativas
• Elementos de destacabilidade
• Fotos/ desenhos/imagens
• Vídeos
• Cores/cena predominante
165
(texto na íntegra)
Os itálicos são grifos nossos para melhor localização dos termos referenciados nas análises.
Sabia que além de ajudar a proteger nosso planeta, colaborar com o Greenpeace é
outro jeito de ganhar pontos? Junte-se a nós e saia na frente nesse desafio.
Décadas atrás, a Amazônia era uma paisagem plena de fartura e beleza. Aos poucos,
ela foi sendo invadida por personagens que a transformaram radicalmente.
Avançaram sobre a floresta o gado e a soja, os maiores vetores de devastação na
região. Atividades muitas vezes ilegais, elas trouxeram a reboque mazelas como o
trabalho escravo, a invasão de Terras Indígenas e a exploração madeireira.
166
É um cenário desolador. Mas a gente ainda pode reescrever essa história. Em parceria
com outras organizações, o Greenpeace lançou um projeto de lei de iniciativa popular
para acabar com a destruição de nossas florestas. Preservar as matas nativas é
caminhar para um desenvolvimento verde e sustentável. A lei do desmatamento zero
é o primeiro passo para o Brasil do futuro.
Essas não são apenas fases de um jogo, são fatos de uma dura realidade que pode
virar permanente se não fizermos nada para mudá-la. Proteger as florestas é mais do
que uma responsabilidade dos brasileiros – é um direito. Para engrossar esse coro, a
Liga das Florestas precisa de mais heróis. Entre na disputa e ajude a salvar o que o
nosso país tem de mais precioso.
Texto da petição
O país pode crescer sem desmatar mais nada. As áreas abertas já são mais que
suficientes para dobrar a produção de alimentos. Ao zerar o desmatamento, o Brasil
fará a sua parte para diminuir o aquecimento global, preservar a biodiversidade e
assegurar o uso responsável da Amazônia e das demais florestas em benefício de
todos os brasileiros.
Encadeamento/técnicas argumentativas
Temos uma construção argumentativa baseada na coloquialidade, com uma linguagem
conativa que apela obviamente para o receptor, mas com uma proposta lúdica destacada já na
primeira frase: ‘Sabia que além de ajudar a proteger nosso planeta, colaborar com o
Greenpeace é outro jeito de ganhar pontos? Junte-se a nós e saia na frente nesse desafio’. A
subjetividade e a proximidade com o leitor pode ser notada pela própria metáfora do jogo, do
esforço em equipe, da liga das florestas (formada pelos próprios usuários que podem defender
a Amazônia assinando a petição do Desmatamento Zero) - ‘juntos podemos’, ‘a gente ainda
pode reescrever essa história’, ‘Entre na disputa e ajude a salvar o que o nosso país tem de
mais precioso’, ‘não são apenas fases de um jogo. Com argumentações até ingênuas:
‘Brincando, a gente exercita a cidadania e aprende um pouco mais sobre a maior riqueza do
nosso país’; (a liga das florestas) ‘precisa de mais heróis’.
168
70
A patologia esquizofrenia, como um transtorno que provoca alienação da realidade, ‘dissociação da ação e
do pensamento’ (HOUAISS; VILLAR), usamos sem nenhum apego à ciência da psiquiatria ou área relacionada,
mas em um sentido metafórico para denominar a tendência do Greenpeace em circular por discursos tão
distantes entre si e construir cenografias paradoxais.
169
Elementos de destacabilidade
Os títulos do texto exercem uma função de destacabilidade e ressaltam a postura da
invocação do receptor, com um slogan militante, pregando uma ação ‘Precisamos da sua
ajuda’, ‘Seja um herói das florestas’. A sobreasseveração ‘fim do desmatamento no Brasil’,
como afirmação que sobressai ao texto, se estabelece como uma espécie de sentença
(MAINGUENEAU, 2008) com força argumentativa. Além de outras expressões,
transformadas em hashtags e usadas sobremaneira nas redes Twitter e Facebook, que
funcionam como máximas facilmente memorizáveis e que dão o tom de urgência:
#desmatamentozero; #desmatamentozeroja!
Fotos/ desenhos/imagens
O hotsite é construído com desenhos de árvores, animais, plantas, rios. Não há fotos
reais neste espaço, mas a criação de uma floresta com contornos lúdicos, que não
correspondem à realidade, para ilustrar uma temática séria de maneira descontraída.
Vídeos
Há justamente na página inicial um vídeo, em formato de desenho animado, de quase
dois minutos de duração que resume a campanha com uma narração dos acontecimentos,
bastante similar ao texto do hotsite. E tem início com a pergunta de uma arara, animal
representativo da floresta: ‘Olá, vocês querem conhecer a floresta Amazônica?’. Com voz
graciosa, em um tom pouco afirmativo, o animal vai apresentando problemáticas de peso
como desmatamento, causa indígena, trabalho escravo, avanço das pastagens e da soja sob a
floresta, em primeira pessoa do plural ‘nós, animais da floresta’. De maneira maniqueísta
apresenta os vilões da Amazônia: o homem (trabalhador no caso, apresentado como aquele
que dirige os tratores e faz os plantios de soja com sarcasmo e alegria) e o gado (os bois que
comem gramíneas e não querem nem ouvir ‘falar em floresta’). Não distingue quem é o
homem destruidor da floresta ou qual a ‘responsabilidade do gado’, levando o público leigo a
uma real disfunção informativa. Construções argumentativas muito fragilizadas e ingênuas
para uma organização que tem uma atuação política forte. A trilha sonora dá o tom de
tranquilidade e urgência dependendo do momento, antecipando as cenas de enfrentamento.
170
Cores/cena predominante
A cena principal é de uma floresta, em desenho, que reforça a estética ambientalista
com cores como verde e azul para representar a floresta e a água. Trata-se de um espaço
lúdico, com animais selvagens afetuosos (em contraposição ao boi malvado) que agradam e
atraem os olhos, em um modelo bastante pitoresco, que desperta o sentimento, mobiliza a
afetividade do destinatário. O recurso argumentativo baseado no recreativo é reforçado com a
cenografia branda e romântica, mas totalmente vinculada aos elementos contemporâneos que
refletem no ethos do próprio público, e que de certa forma contribui para o êxito das
campanhas. O próprio formato em desenho animado carrega uma estética pop que chama
atenção e causa identificação.
A campanha ainda propõe uma competição da ‘Liga das Florestas’ entre os internautas
para estimular a participação, assinando petição, divulgando e compartilhando as
informações, com regime de pontuação para cada ação realizada. Um ranking com nome e
foto dos dez primeiros colocados consta logo na página inicial, com hiperlink para conhecer a
performance de cada um deles. Apesar de pregar a união e o trabalho em equipe, há um
evidente estímulo ao esforço individual. No próprio espaço da petição também informam
nominalmente quem já assinou. Isso valoriza a participação e o ethos do parceiro, do amigo,
mas compactua com a individualidade própria da cibercultura.
Avaliando o ethos como um processo de influência sobre o outro, ao lidar com
elementos facilmente reconhecíveis, com estereótipos que são determinantes no
estabelecimento do ethos, o Greenpeace se aproxima do seu público. Ao mesmo tempo em
que ativa um fiador característico que se identifica, por exemplo, com os termos chavões e as
imagens de fauna e flora. A persuasão, lembra bem Maingueneau (2005), só será completa se
o auditório identificar no orador um ethos comum, para dar entender que é um dos seus que se
dirige a ele.
171
(texto na íntegra)
O crime compensou
3 comentários
Há sete anos, Leo Andrade Gomes foi considerado o indivíduo que mais desmatou a
Amazônia, depois que 12.500 hectares de floresta foram derrubados na fazenda que
estava em seu nome, no Pará. Após essa e outras infrações, veio a conta: mais de R$
18 milhões em multas ambientais. E por que essa notícia agora, em 2012? Porque
desde essa época, o governo não sabe de Leo: seu CPF foi cancelado pela Receita
Federal e ele nunca foi encontrado pelo Ibama. Se está foragido ou se é um
‘fantasma’, ninguém sabe. Mas uma coisa é certa: sua multa será perdoada pelo
novo Código Florestal.
Aprovada em maio deste ano após uma pesada investida da bancada ruralista, a
nova lei manteve a anistia a quem desmatou sem autorização até o ano de 2008. No
caso de Leonardo, bastaria que ele se inscrevesse no Programa de Regularização
Ambiental, criado pelo governo, e recuperasse as Áreas de Preservação Permanente
(APP) e pronto: a dívida de R$ 18 milhões sumiria para sempre de sua vida.
172
Veja o Vídeo
O caso de Leo, porém, está longe de ter um ponto final. Quando seu nome
despontou no ranking dos desmatadores do Ministério do Meio Ambiente e a multa
milionária chegou, um advogado encaminhou, em nome do acusado, uma defesa ao
Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama). No documento, ele alega que na
época do desmatamento Leo ainda não era proprietário da fazenda Cachoeira Alta,
onde ocorreu a infração, e sim a senhora Elizabete Guimarães.
Essa história evidencia não só a impunidade que corre solta na Amazônia. Mostra,
também, a ausência, descontrole e falta de coordenação do Estado brasileiro na
região. “Uma lei do desmatamento zero pode mudar a forma como o Brasil olha para
a sua floresta. O país já desmatou mais do que o suficiente para se desenvolver, e
agora tem a chance de mostrar ao mundo que consegue continuar crescendo, mas
sem dizimar suas ricas florestas e fazendo um uso sustentável delas”, afirma Aguiar.
Itens lexicais
Notamos na presente notícia, referente a uma denúncia que foi relacionada à campanha
Desmatamento Zero, o uso de termos conflitivos próprios de uma acusação e que assinalam
um ethos de inquisidor: ‘desgovernança’/’falta de governança’, ‘impunidade’, ‘descontrole’,
‘crime’, ‘processo atropelado’, ‘acusado’, ‘defesa’, ‘anistia’. Além de verbos como ‘alegar’,
‘defender’, ‘acusar’, que revelam a posição agressiva.
Por meio da fonte de informação citada, um representante da própria organização,
ressaltam a autossuficiência e o ethos de autoridade da organização. O uso de expressões
tipicamente ambientalistas como ‘ricas florestas’, ‘uso sustentável’, que denominamos aqui
como neutralização discursiva, serve para atingir um pretenso consenso universal.
Encadeamento/técnicas argumentativas
O texto busca uma argumentação informativa, com ênfase em dados numéricos e
valores, datas e retrospectiva do caso, mas assume um tom coloquial fazendo referências
jocosas, metáforas que ajudam a contar a história com mais familiaridade, como nos exemplos
‘Se está foragido ou se é um ‘fantasma’, ninguém sabe’; ‘jogo de empurra continuou sem
solução’; ‘está longe de ter um ponto final’; ‘impunidade corre solta na Amazônia’. Ressalta o
conflito com acusações genéricas, desqualificando as autoridades: ‘ausência, descontrole e
falta de coordenação do Estado brasileiro’; ‘pesada investida da bancada ruralista’; ‘Ninguém
conseguiu decifrar. Tampouco o governo’.
A coloquialidade na argumentação fica por conta também dos questionamentos que
aparecem ao longo do texto: ‘E por que essa notícia agora, em 2012?’; ‘A fazenda, afinal, é
dela? E a multa?’. Um evidente ethos do parceiro que conta a história a um amigo. O próprio
acusado, Leonardo Andrade Gomes, é apelidado de Leo.
As próprias declarações da fonte de informação corroboram um senso comum e são
usadas para contribuir na dramatização e gerar indignação: ‘quem desmatou será premiado’;
‘vale a pena passar por cima das leis’, além do próprio título ‘o crime compensou’. E deixa
até mesmo de contextualizar e explicar termos específicos como ‘Áreas de Preservação
Permanente’, ‘Programa de Regularização Ambiental’, ‘Código Florestal’ e de detalhar
afirmações contundentes como ‘O país já desmatou mais do que o suficiente para se
desenvolver’; ‘(...) a ideia é coletar o maior número de assinaturas possível’ (quanto?).
174
Mas a gravidade da acusação é diluída pelos elementos externos ao texto que dão o
viés lúdico, como a criação do boneco Leo, representando o vilão desmatador, o vídeo ‘O
maior desmatador da Amazônia’ e o jogo ‘Ajude-nos a encontrar Leo’, com o convite para
‘achar o desmatador’.
Destacabilidade
O próprio título ‘O crime compensou’ funciona como um elemento de destacabilidade,
de fato uma sobreasseveração que é recortada e sobressai ao texto. É pouco original, mas
instaura uma memória de acusação e dá força à argumentação. Também o enunciado “O
maior desmatador da Amazônia” (utilizado no vídeo e nas redes sociais digitais) atua para
marcar o posicionamento de acusação do Greenpeace e atingir o potencial inimigo. Além da
hashtag relacionada #desmatamentozero que tematiza a notícia e serve de artefato discursivo
para o ciberativismo.
Fotos/ desenhos/imagens
A foto da capa do portal, que pode ser visualizada no início da análise, faz referência
direta à destruição causada ao mostrar uma área supostamente desmatada e destaca o título ‘O
crime compensou’. A imagem cria uma plástica interessante de movimento, com apenas uma
árvore fixada e resistindo, e está concatenada com o perfil de um texto de denúncia de uma
problemática ambiental.
Já para área do texto propriamente, na página interna, está o desenho de uma espécie
de mascote do acusado, personificado por uma sombra com um ponto de interrogação na
cabeça, uma motosserra na mão, ao lado de um toco de árvore. O convite para ajudar ‘a
encontrar o desmatador’ por meio de um jogo acompanha a imagem. Um assunto sério, fruto
de uma grave acusação, sendo tratado de maneira bastante lúdica, com jogo, desenho e um
personagem intimamente apelidado de ‘Leo’, que representa o criminoso.
Vídeos
O vídeo (disponível na própria página da notícia) um desenho animado, leva o título
de ‘O maior desmatador da Amazônia’, e tem duração de quase dois minutos. Com trilha
sonora bastante animada e que lembra histórias infantis, o enredo apresenta duas personagens
175
distintas, desenhadas em preto e branco e com traços bem simples: Leonardo Andrade, o
desmatador ‘que derrubou árvores até não poder mais’ e Fulano de Tal, um ladrão ‘que
roubou gente até não poder mais’. Mas enquanto um foi preso e considerado perigoso, o outro
foi ‘premiado’ como o maior desmatador da Amazônia. E a narração em tom entusiasmado
faz afirmações evasivas e irônicas: ‘Fique tranquilo Leonardo (...) ninguém vai se lembrar da
sua infração’. Uma argumentação simples, baseada em uma comparação burlesca, que dá um
norte cômico sem acrescentar informações. Os dados específicos sobre o caso só aparecem ao
final em uma tela preta que informa os valores da multa e, na tela seguinte, link para os
espaços virtuais do Greenpeace. O vídeo foi colocado no portal e nas redes sociais digitais
conseguindo repercussão importante.
Também como parte da mesma notícia o jogo ‘Ache o desmatador’, leva a uma página
com ilustrações de personagens (destaque para o mascote), árvores queimando e um tabuleiro
numerado onde conforme o internauta vai lendo informações sobre o caso (com opção de
compartilhar o conteúdo nas redes sociais digitais) vai avançando nas casas. Um jogo simples,
ilustrativo, porém que não acrescenta informações novas e que tem como objetivo final de
levar o usuário a assinar a petição do Desmatamento Zero: www.greenpeace.org/brasil/pt/O-
que-fazemos/Amazonia/ache-o-desmatador.
Cores/cena predominante
As cores predominantes são o verde e o branco, obedecendo ao layout tradicional do
Greenpeace, em especial no texto interno. Na página do jogo ‘ache o desmatador’ há um
cenário lúdico, com estética de desenho animado, personagens graciosos e cores tipicamente
ambientalistas: marrom e verde.
Nos deparamos com duas cenas distintas. De um lado, o peso e a gravidade da
denúncia, o texto conflitivo com acusações importantes de desmatamento, de outro, o
tratamento coloquial, lúdico, a utilização de elementos até infantis como desenhos animados e
jogo virtual. Pelas nossas lentes captamos, novamente, uma cenografia esquizofrênica que se
desloca da gravidade e da seriedade da questão para tratar como uma brincadeira para ‘achar o
desmatador’. Não desconsideramos o viés informativo do texto e sua capacidade de informar
e alertar, mas nos preocupamos com o esvaziamento da questão, principalmente porque
explicações mais técnicas e o detalhamento do caso são escamoteados e dão lugar a números e
valores. Qual a localização desse desmatamento? As consequências? O que são Áreas de
Preservação Permanente? E outra série de questões que o texto poderia suscitar.
176
(texto na íntegra)
Ursos polares estão morrendo
Mas as empresas e governos querem explorar petróleo onde o gelo está derretendo
Entenda o problema
177
Por mais de 800 mil anos, o gelo do Ártico é um elemento permanente do oceano.
Ele está derretendo por causa do uso de combustíveis fósseis e, em um futuro
próximo, o Ártico pode ficar sem gelo pela primeira vez desde que os humanos
pisaram na Terra. Isso seria devastador não só para o ecossistema local, como ursos
polares, narvais, morsas e outras espécies que vivem lá, mas também para o resto do
mundo. O gelo no topo do mundo reflete muito do calor do Sol de volta para o
espaço e, assim, mantém todo o nosso planeta resfriado, estabilizando os sistemas
climáticos dos quais dependemos para cultivar alimentos. Proteger o Ártico significa
proteger a todos nós.
Exploração de petróleo
A nova corrida pelo petróleo no Ártico está começando. Shell, BP, Exxon, Gazprom e
outras companhias petrolíferas querem assumir os riscos de um vazamento de
petróleo catastrófico no Ártico por apenas três anos de suprimento do combustível.
Pesca industrial
Frotas de pesca industrial predatória jogam suas redes nas águas do Ártico.
As populações locais que pescam de forma sustentável há anos na região podem ficar
sob ameaça se deixarmos as gigantes empresas pesqueiras continuarem a explorar
de forma predatória o oceano Ártico.
178
Precisamos acabar com a pesca industrial predatória nas águas do Ártico. Assine
agora
Guerra
As nações do Ártico se preparam para levar adiante conflitos no local. Como mostrou
o Wikileaks, os EUA já mencionaram o aumento das ameaças militares no Ártico; e a
Rússia prevê uma intervenção armada no futuro.
Nenhum país é dono do alto Ártico. E é dessa forma que deve continuar. Assine
agora
Você: a bandeira
Não há governo ou exército que proteja o Ártico; existem apenas países e empresas
que querem dividi-lo. Ajude-nos a colocar uma “bandeira pelo futuro “do polo Norte.
Existem muitas pessoas como nós no planeta. Cada uma é afetada pela situação do
Ártico: ao refletirem os raios solares, o gelo do Ártico regula nossos padrões
climáticos e o cultivo dos nossos alimentos.
Mas, juntos, temos algo mais forte do que o exército de qualquer país ou do que o
orçamento de qualquer empresa. Nossa preocupação comum, com o planeta que
deixaremos para nossos filhos, transcende todas as fronteiras que nos separam e nos
faz a força mais poderosa dos dias de hoje.
É por isso que levaremos seu nome - e de 3 milhões de pessoas - para o polo Norte
com uma bandeira para o futuro, desenhada por jovens ao redor do mundo. Ela vai
179
Mas a bandeira é apenas um símbolo. Levaremos a sua voz a cada líder político no
mundo e perguntaremos qual sua posição sobre o futuro do Ártico. Um a um, o
nosso movimento ganha força e iremos às Nações Unidas exigir um acordo global
para proteger a região.
Há 30 anos, nós lançamos uma campanha similar para proteger a Antártida. Ninguém
imaginava que iria dar certo, mas nós conseguimos, e o polo Sul não pode ser
explorado economicamente por nenhum país.
Petição
Venha conosco para o polo Norte. Assine a petição e peça o decreto de um santuário
mundial na área do polo Norte.
Itens lexicais
Observamos substantivos, adjetivos e verbos sendo utilizados em diferentes momentos
para dar peso à problemática e revelar o conflito: ‘devastador’, ‘catastrófico’, ‘desastre’,
‘predatória’, ‘ameaças’, ‘conflito’, ‘afetar’, ‘sujo’, ‘mortal’, ‘acabar’, ‘mudança radical’.
A memória polêmica se instaura também ao acusar com veemência as empresas
petrolíferas e citá-las nominalmente (Shell, BP, Exxon, Gazprom). Aqui lembrando que a
utilização de combustíveis fósseis é uma bandeira cara ao movimento ambientalista.
Também são reforçados no âmbito do texto verbos do terreno ambientalista que
pintam um quadro facilmente reconhecível, ‘proteger’, ‘salvar’, ‘explorar’. Nesta mesma
linha, identificamos a aposta na neutralização discursiva, ou seja, o uso de expressões,
também de cunho ambiental, das quais se pressupõe o entendimento como são os casos de
‘energia limpa’, ‘energia suja’, ‘planeta verde, pacífico e saudável’, além de termos como
‘pesca industrial, predatória’, ‘pesca de forma sustentável’, que são utilizados correntemente
sem qualquer contextualização ao não ser o significado geral e intuitivo que pode suscitar no
180
leitor comum. A própria palavra ‘santuário’, que faz parte da proposta política da campanha,
não é explicada, e como remete à religiosidade pode causar certa disfunção informativa.
Outra questão importante são as generalizações presentes no léxico do discurso
ambiental para dar importância ao assunto e que evidencia imprecisão: ‘ninguém’, ‘todos
nós’, ‘resto do mundo’, ‘toda a vida na terra’, ‘o futuro dos nossos filhos’, ‘mais poderosas do
mundo’. Um dos verbos que nos chama atenção na medida em que reforça o ethos do
animador e parceiro é o ‘precisamos’ (no sentido de temos a necessidade, devemos, temos que
agir), utilizado por pelo menos três vezes, entre outros verbos empregados na primeira pessoa
do plural para garantir certa coloquialidade e intimidade.
Encadeamento/técnicas argumentativas
A hierarquização da argumentação se dá, de imediato, pelo tamanho dos textos que
vão aparecendo na página web. Conforme se avança na barra de rolagem vão surgindo títulos
grifados, parágrafos com letras garrafais que se destacam, normalmente com informações
mais impactantes, e trechos de textos em tamanho menor de caráter mais informativo.
Os dados e informações categóricas são apresentados, logo no início, sem fontes de
informação ou comprovação mais objetiva, valendo-se da autoridade ambientalista: ‘Nos
últimos 30 anos, perdemos três quartos das calotas polares’; ‘O Ártico pode ficar sem gelo
pela primeira vez desde que os humanos pisaram na terra’. Em outro momento atribui a
informação, mas de maneira bastante genérica ‘Documentos governamentais dizem que lidar
com derramamentos de petróleo em aguas geladas é quase impossível’ - documentos de quais
governos? Que tipo de documentos? Onde foram publicados?
A persuasão também pode ser explicada pela argumentação que privilegia o
imediatismo, a ação, com linguagem invocativa em diversos momentos, ativando o ethos do
amigo, do parceiro, o conselheiro que conhece o problema e precisa de ajuda: ‘Proteger o
ártico, significa proteger a todos nós’; ‘temos que agir hoje’; ‘assine agora’; ‘precisamos banir
a exploração de petróleo nas águas do ártico’; ‘precisamos acabar com a pesca industrial’. E
evidencia a importância da união: ‘nos faz a força mais poderosa nos dias de hoje’; ‘em nome
de toda a vida na terra’.
A argumentação prioritariamente agregadora revela o conflito nos momentos em que
cita diretamente as empresas petrolíferas Shell, BP, Exxon, Gazprom. Destacamos aqui o
conflito e o maniqueísmo representado no binômio Empresas/governos x Sociedade –
‘Empresas e governos querem explorar petróleo’, ‘Não há governo ou exército que proteja o
181
Ártico; existem apenas países e empresas que querem dividi-lo’. Há ainda, nesse contexto, o
tema da guerra e do risco de uma ‘intervenção armada no futuro’, sem estabelecer prazos ou
dados mais específicos sobre o possível conflito armado. O alarde continua com afirmações
até hiperbólicas como ‘um dos combustíveis mais sujos e mortais’ (petróleo); ‘uma montanha
de dinheiro para as empresas’.
Identificamos uma cena de enunciação da problemática ambiental composta por
exageros, dados sem comprovação, tratando de um tema sério, mas com uma ingenuidade
(proposital ou não) de colocar a questão como algo que pode ser resolvido todos juntos, com
união, combatendo empresas e governos sujos. Um ethos romântico, animador e ao mesmo
tempo combativo, validado por estereótipos ambientais de fácil assimilação e que buscam
identificação com o perfil de seu auditório.
Destacabilidade
São diferentes elementos de destacabilidade ao longo da página. Estão presentes logo
de início nas chamadas da página principal, nos títulos que acompanham os textos, no final de
cada bloco de texto, e ainda na petição para criação do santuário no Ártico. As chamadas, por
exemplo, vão se alternando na página e apresentam a campanha e sua problemática, atuando
como uma sobreasseveração, na medida em que são retiradas dos próprios textos e anunciam
uma sentença: ‘Ursos polares estão morrendo’; ‘Mas as empresas e governos querem explorar
petróleo onde o gelo está derretendo’; ‘A queima do petróleo causa o derretimento do gelo’;
‘Precisamos proteger as águas do Ártico da exploração de petróleo e da pesca industrial
predatória’; ‘Assine a petição e peça o decreto de um santuário mundial na área do polo
Norte’.
As solicitações para assinar a petição ao final de cada bloco de texto, identificadas
como um elemento da argumentação, funcionam também como um slogan militante: ‘Assine
agora’, ‘(...)temos que agir hoje’, ‘Agora é o Ártico que pede ajuda. Salve o Ártico’;
‘Precisamos acabar com a pesca industrial predatória nas águas do Ártico. Assine agora’;
‘Precisamos banir a exploração de petróleo nas águas do Ártico. Assine agora’, em primeira
pessoa e no modo imperativo para provocar envolvimento e evidenciar a necessidade de
participação.
A própria chamada no quadro da petição (localizada à direita da página), uma
afirmativa bem construída, funciona como um slogan positivo que dá força à argumentação:
‘Sim! Vamos criar um santuário ecológico no Ártico’.
182
Vale ainda lembrar da hashtag utilizada nas redes sociais digitais que traz apelo e
invoca a participação, com força no dizer e na posição, que acaba por se assemelhar a uma
máxima, facilmente memorizável e utilizável: #SalveoÁrtico.
Fotos/ desenhos/imagens
A página web é muito bem trabalhada com desenhos, representando o mar, animais
marinhos, submarinos e redes de pesca, além do gelo do Ártico, e fotos reais de plataforma de
petróleo, de poluição das águas e dos ursos polares – os grandes porta-vozes da campanha.
Imagens estereotipadas de animais, poluição e um planeta Terra completam a página.
É prudente aqui comentarmos o êxito que as fotos de ursos polares adquiriram nas
redes sociais digitais, em especial no Facebook, onde as postagens apresentaram números
estrondosos de engajamento online, embora a espécie não tenha relação com a natureza do
Brasil. A imagem de um urso polar branco é diferenciada, esteticamente atrativa, desperta
afetividade do auditório, ainda em situação de risco, com filhotes, em poses simulando dança,
a empatia pode aumentar e a adesão se dar muito mais pela identificação emotiva do que
propriamente pela causa da campanha. Algumas das imagens com grande repercussão nas
redes sociais digitais podem ser visualizadas no ANEXOS.
Vídeos 71
Não identificamos vídeos especificamente no hotsite, mas a campanha gerou
diferentes produções audiovisuais disponibilizadas, principalmente, no Facebook e em seu
canal no Youtube, que chamaram atenção pela abordagem paradoxal que mesclava tonalidade
humorística e dramática e que convém comentarmos. Um dos vídeos, de 18 segundos, começa
com a mensagem ‘O que pode ser pior do que isso?’, e mostra um urso pulando de um bloco
de gelo para o outro com dificuldade, em seguida, em resposta à pergunta, aparece uma tela
com o texto ‘Só o degelo do Ártico’ e mostra imagens de focas também tentando se equilibrar
no gelo. O vídeo é encerrado com a mensagem ‘Assine a petição. Salve o Ártico’. A
sequência poderia ser trágica não fosse a trilha sonora que dá o tom engraçado e cria uma
71
Os vídeos referenciados estavam disponíveis no canal do Greenpeace no Youtube e no Facebook e foram
acessados pelos endereços http://www.youtube.com/watch?v=ToMfwjYs9rY e
http://www.facebook.com/photo.php?v=10151412836503065&set=vb.159103797542&type=2&theater
183
cena tragicômica, reforçando mais uma vez a tendência em tratar assuntos sérios com
jocosidade.
Outro vídeo, de um minuto e 30 segundos, com uma cenografia mais dramática, de
emotividade e com uma produção mais elaborada, mostra um urso polar andando por um
ambiente urbanizado, farejando lixo, águas poluídas, andando por entre a fumaça dos carros e
no tráfego, evidenciando o deslocamento do animal, ao som da música melancólica do grupo
Radiohead ‘Everything in its right place’, que diz ‘Tudo está no lugar certo’, em uma
proposta irônica, mas conhecedora dos códigos culturais da contemporaneidade ao escolher
uma trilha sonora de grupo moderno de rock alternativo. A narração em tom de seriedade diz
nos últimos segundos do vídeo ‘Enquanto o Ártico se derrete, a corrida para explorar seus
recursos começa. Ninguém o escutará (o urso), mas escutará você. Junte-se ao movimento
Salve o Ártico’. Em tradução nossa porque este vídeo não foi traduzido para o português, mas
sim para o espanhol e verificado no Facebook do Greenpeace Brasil. Há ainda diferentes
vídeos sobre os protestos realizados no âmbito da campanha com uma proposta mais
documental, mas que supervaloriza o acontecimento ativista.
Cores/cena predominante
Os textos vão se apresentando em tamanhos diferentes com destaques para
informações mais impactantes, que a nosso ver tem relação com a argumentação e com a
cenografia construída.
As cores do hotsite são predominantemente o azul e o branco para assimilar
diretamente a causa do Ártico, mas alguns trechos são apresentados em preto para evidenciar
a questão do petróleo. Conforme vamos lendo as informações e avançando na página, temos a
sensação de profundidade, de ir adentrando no oceano e também nas problemáticas
relacionadas - que tem início com o derretimento do gelo, passa pela exploração de petróleo,
pesca industrial, até citar os conflitos armados pela região, finalizando com a chamada para
participação. Trata-se de um sistema de leitura não linear e dinâmica onde é possível ir
avançando a leitura e clicar em hiperlinks para ter mais informações (página web com as
principais perguntas sobre a campanha respondidas de forma mais informativa e com respaldo
de pesquisadores e estudos, o que é um santuário, como ajudar, o que pretende a campanha
para proteger o Ártico). Nesse caso, notamos a tentativa de fornecer mais informações sobre a
campanha, mas com perguntas e respostas previamente formuladas e respondidas de acordo
com o interesse da organização.
184
Uma bandeira, com a chamada para a petição, localizada na lateral direita da página
principal, permanece fixa e apresenta nominalmente o último internauta que participou e
destaca a quantidade de assinaturas, valorizando a participação.
Temos uma cenografia construída na legitimidade da fala ambientalista que
aparentemente se basta. O ethos ingênuo e agressivo tem por trás uma posição fortemente
embasada. O Greenpeace é uma organização suficientemente municiada de dados e
informações para o desenvolvimento de suas campanhas, mas prefere lidar com informações
subjetivas, dados alarmantes, figuras de forte apelo emocional como o urso polar branco. A
esquizofrenia, no sentido metafórico, é revelada mais uma vez, por exemplo, quando trata
uma ameaça de guerra (como é citado no texto) com poses de ursos simulando danças,
pulando e brincando em blocos de gelo. Novamente, também evidenciamos aqui a tentativa de
falar diretamente com seu público, em mostrar um ethos comum que exerça influência e
convencimento sobre o outro com um discurso de fácil assimilação e replicação.
Disponível em : http://www.greenpeace.org/brasil/pt/Noticias/O-maior-degelo-da-historia/
185
(texto na íntegra)
O maior degelo da história
Mais do que níveis alarmantes, o volume de gelo no Ártico nunca foi tão baixo na
história humana. O maior nível de degelo, alcançado em 2012, foi apontado por
dados preliminares do Centro Nacional de Dados sobre Neve e Gelo dos Estados
Unidos (NSIDC). A extensão de gelo que reveste o Oceano Ártico durante o verão este
ano equivale a 3,41 milhões de quilômetros quadrados, a menor de que se tem
conhecimento. Desde 1979, ano em que se iniciaram as medições, ela foi reduzida
em 45%.
O Ártico é um ecossistema vital para a Terra e as ameaças que vem sofrendo são
determinantes para o equilíbrio climático do nosso planeta. Sara Ayech, da
Campanha de Clima e Energia, faz parte da tripulação que está na expedição no
Ártico afirma que "assim como o coração bombeia sangue por nossas artérias, o
Ártico é uma das bombas que fazem as correntes do oceano circularem ao redor do
planeta".
O navio Arctic Sunrise foi a região para documentar o maior degelo da história,
pesquisar o volume atual de gelo e montar uma imagem em 3D da região que será
usada em estudos sobre as mudanças climáticas. “Estávamos assistindo o Sol nascer
sobre os bancos de gelo, alguns finos e fracos, outros tão fundos que o oceano
abaixo se coloria de um azul frio claríssimo, quando vimos pegadas na neve.
Um solitário urso polar apareceu ao longe, parecia uma mancha creme contra o mar
azul. Pareceu inimaginável que essa beleza de tirar o fôlego que víamos a nossa
186
frente pudesse estar sendo ameaçada por um punhado de empresas que se importam
mais com seus resultados trimestrais que com o futuro desta região maravilhosa”.
Você também pode ajudar a proteger o Ártico. Assine e divulgue a petição que
promove a criação de um santuário internacional e que manterá a exploração de
petróleo e a pesca predatória longe deste frágil ecossistema. Já são mais de 1,8
milhão de assinaturas de pessoas no mundo todo.
Itens lexicais
Novamente temos o uso de expressões polêmicas que corroboram o padrão discursivo
polêmico e catastrófico: ‘crise’, ‘ameaça’, ‘ganância’, ‘níveis alarmantes’; ‘na história
humana’, ‘momento decisivo na história da humanidade’, além de indicar generalização e
imprecisão que são acentuadas em termos como ‘comunidade global’, ‘grandes corporações’
‘mundo todo’. Ao mesmo tempo em que mostra coloquialidade e um ethos do parceiro ao
pregar ‘união’, ‘esperança’, ‘mudança’ e adjetivações extremas ‘beleza de tirar o fôlego’,
‘inimaginável’, ‘região maravilhosa’; ‘solitário urso polar’. E abusam dos verbos típicos do
terreno ambiental ‘proteger’, ‘explorar’, ‘lutar’.
As expressões que compõem o esquema estereotipado da questão ambiental e
apresentam uma neutralização discursiva também estão presentes quando citam ‘ecossistema
vital’, ‘equilíbrio climático’, ‘mudanças climáticas’, ‘frágil ecossistema’, ‘pesca predatória’,
‘santuário’, sem qualquer tipo de detalhamento.
Encadeamento/técnicas argumentativas
O texto pretensamente informativo usa de dados numéricos para respaldar a denúncia,
com informações do Centro Nacional de Dados sobre Neve e Gelo dos Estados Unidos, e
declarações de fontes de informação da própria instituição, o diretor-executivo e a
coordenadora da campanha, confirmando o ethos de autoridade e autossuficiência.
187
Destacabilidade
A destacabilidade está presente no próprio título, uma sobreasseveração retirada do
texto ‘O maior degelo da história’, que ganha autonomia e apelo para ser replicada nas redes
sociais. Outro item de destacabilidade e que funciona como uma sentença ‘Salve o Ártico, é
uma máxima largamente utilizada como hashtag #SalveoÁrtico.
A imagem de coração formada com as bandeiras dos países também exerce uma
espécie de destacabilidade não verbal que incrementa a argumentação e ajuda a compor uma
cenografia dramática.
Fotos/ desenhos/imagens
A foto principal que ganhou a capa do portal com o título ‘O maior degelo da história’,
mostra o coração formado com as bandeiras dos países membros da ONU (Organizações das
Nações Unidas). A mesma foto ilustra a notícia na página interna e reforça a emotividade do
discurso.
Há sete imagens na página interna, disponibilizadas por meio do álbum de fotos virtual
Flickr, que retratam o coração em diferentes ângulos, o derretimento das calotas polares, o
188
Vídeos
O vídeo postado na página tem duração de pouco mais de um minuto e mostra
entrevista com a responsável pelo centro nacional de dados sobre gelo e neve dos Estados
Unidos e com a coordenadora da campanha de clima e energia do Greenpeace. As
informações dadas são uma confirmação do que traz o texto escrito, sem complementações e
inclusive com apelos dramáticos: ‘se perdermos a cobertura de gelo do Oceano Ártico (...)
haverá uma grande mudança no clima’; ‘Isso vai afetar dramaticamente os padrões do clima
ao redor do mundo’, ‘é uma emergência no polo e o mundo precisa se unir para salvar o
Ártico’. Mais uma vez sem dados ou explicações mais específicas.
A trilha sonora de um violino melancólico acompanha o enredo bastante emotivo
construído com as imagens dos depoimentos, do horizonte branco do Ártico com as calotas
polares derretendo, dos ativistas trabalhando (pesquisando) no computador e fincando as
bandeiras no gelo para formação do coração. O surgimento do navio do Greenpeace,
imponente, em meio ao trágico cenário, fecha a narrativa de forma heroica e que frisa a
própria marca.
Cores/cena predominante
Toda a construção da notícia se dá no âmbito da página interna do próprio portal
institucional, inclusive o vídeo e as imagens estão disponibilizados ali, portanto, seguem o
padrão do texto corrido com margens verde e fundo branco.
Mas podemos notar a prevalência da imagem do coração, da imensidão da área do
Ártico, evidenciada por imagens panorâmicas, e das calotas polares derretendo, o que serve
para comprovar a denúncia feita do maior degelo da história.
Aqui a ludicidade é deixada para um segundo plano e a cenografia assume um enredo
dramático, emotivo, revelado pelas imagens, pelo texto e pelo próprio evento da ONG que
tinha como principal objetivo a formação de uma imagem impactante – o coração com as
bandeiras dos países do mundo – para divulgação massiva da campanha e do problema que
ela envolve. O feito, portanto, sem utilidade aparente, dá o tom espetacular à causa e exerce
força persuasiva para a adesão dos interlocutores. A campanha do Ártico, como já
ressaltamos, é a que mais recebeu respaldo dos seguidores internautas. A notícia em questão
189
(texto na íntegra)
Todos dependemos de la salud del Ártico. ¡Salva el Ártico!
Las compañías y los gobiernos quieren buscar petróleo en las aguas desheladas del
Ártico
Firma ahora y pide a los líderes mundiales que la zona alrededor del Polo Norte sea
declarada santuario global
El Ártico se derrite
190
El hielo del Ártico, del que todos dependemos, está desapareciendo. Y lo está
haciendo rápido. En los últimos 30 años hemos perdido tres cuartas partes de la capa
de hielo flotante de la cima de la Tierra.
Vídeo
Durante más de 800.000 años el hielo ha sido una característica permanente del
océano Ártico. Ahora se está derritiendo por el uso desmesurado de energías fósiles
sucias y, en un futuro cercano, el hielo podría desaparecer, por primera vez, desde
que los humanos pisamos la Tierra. Esto sería devastador, tanto para los pueblos
como para los osos polares, narvales, morsas y los demás moradores del Ártico, así
como para el resto de la Humanidad. El hielo refleja gran cantidad de calor solar
hacia el espacio y mantiene así fresco al planeta y estabiliza los sistemas
meteorológicos de los que dependemos para cultivar nuestros alimentos. Proteger el
hielo significa protegernos a todos.
Prospecciones petrolíferas
Ha comenzado la fiebre del Ártico. Shell, BP, Exxon y Gazprom, entre otros, prefieren
arriesgarse a un vertido en el Ártico por poder extraer petróleo que sólo cubriría la
demanda global durante tres años.
Las mismas compañías que hicieron que el Ártico comenzase a derretirse están
buscando enriquecerse con el deshielo. Quieren abrir una nueva frontera petrolífera
para obtener, teóricamente, 90.000 millones de barriles de petróleo. Esto, que
significa muchísimo dinero para ellos, solo equivale a tres años de petróleo para el
resto del mundo. Documentos gubernamentales secretos afirman que gestionar
vertidos de petróleo en aguas semicongeladas es “casi imposible”. Errores inevitables
harían añicos el delicado ecosistema ártico. Para perforar el Ártico, las petroleras
tienen que apartar los icebergs que sus plataformas encuentren en el camino, y
derretir el hielo flotante con mangueras gigantes de agua caliente. Si permitimos que
lo hagan, la llegada de un vertido catastrófico es sólo cuestión de tiempo. Ya hemos
visto el daño extremo que han causado catástrofes como la del Exxon Valdez, el
Prestige o la Deepwater Horizon. No podemos permitir que ocurra en el Ártico.
Pesca industrial
Las flotas de pesca industrial están comenzando a pescar con redes de arrastre en
aguas del Ártico
191
Las gentes del lugar han pescado de manera sostenible en el Ártico durante miles de
años, pero su actividad podría desaparecer si permitimos que las compañías
pesqueras exploten el océano Ártico.
Necesitamos parar definitivamente la pesca industrial en las aguas del Ártico. Firma
ahora
Conflictos
Los países árticos están armándose para un posible conflicto por el Ártico.
La amenaza de guerra en el Ártico es real. Los países que bordean el Ártico están
adquiriendo submarinos, cazas y rompehielos nucleares para reclamar el Ártico
mediante la fuerza. Tanto Rusia como Noruega han anunciado “batallones árticos”
para luchar por sus intereses nacionales. Junto a la creciente militarización, seis
países están intentando hacerse con partes del Ártico sin reclamar, incluyendo el
Polo Norte. Esas zonas ahora nos pertenecen a todos. Hagamos que así siga siendo y
declaremos un santuario global en el Ártico, por el bien de toda la vida en la Tierra.
El Ártico Superior no pertenece a ningún país, y así debe seguir siendo. Firma ahora
Tú / La Bandera
No hay ningún gobierno ni armada que proteja el Ártico, solo países y compañías que
están intentando hacerse con él. Ayúdanos a levantar una Bandera por el Futuro en
el Polo Norte.
Somos 7000 millones de personas en el planeta. A todos y cada uno de nosotros nos
afecta la salud del Ártico: reflejando los rayos de sol en su hielo, el Ártico estabiliza
los patrones del clima de la Tierra, y por tanto los alimentos que cultivamos y
comemos.
Frenando la nueva fiebre del petróleo en el Ártico estamos creando las condiciones
para un cambio radical en cómo generamos y usamos la energía, impulsando una
revolución energética limpia que dará energía limpia a nuestros hijos. Sabemos que
estamos plantando cara a los países y compañías más poderosos del mundo.
Pero juntos tenemos algo más importante que la fuerza militar de cualquier país o la
potencia económica de cualquier compañía. Nuestra preocupación por el planeta
que dejamos a nuestros hijos trasciende a todas las barreras que nos separan, y nos
hace poderosos.
192
Por eso estamos llevando tu nombre al Polo Norte, junto a un millón más y con una
Bandera por el Futuro, diseñada por la juventud del mundo. Mostrará nuestra visión
compartida de que un mundo verde, en paz y saludable depende del Ártico.
Pero la bandera es solo un símbolo. Llevaremos tu voz a cada líder político del mundo
para preguntarles cuál es su posición frente al Ártico. Luego miraremos hacia las
Naciones Unidas, donde pediremos un acuerdo global para proteger el Ártico. Hace
30 años lanzamos una campaña similar para proteger la Antártida. Nadie creía que
iba a tener éxito pero así fue, y conseguimos crear un parque mundial alrededor del
Polo Sur.
Itens lexicais
A campanha Salve o Ártico é de orientação internacional, portanto, temos uma
construção textual provavelmente baseada em traduções para a língua de cada país de atuação
do Greenpeace, e por isso com muitas semelhanças, ainda mais em contextos lexicais
próximos como o português e o espanhol. Em uma perspectiva comparativa, identificamos
também no Greenpeace Espanha palavras de peso que ressaltam a problemática, como
‘catastrófico’ ‘catástrofe’, ‘daño extremo (dano extremo)’, ‘cambio radical’ (mudança
radical), e outros termos não identificados no Brasil, mas que têm a mesma funcionalidade de
destacar a gravidade da temática - ‘la fiebre del Artico’ (a febre do Ártico), ‘fiebre del
petroleo’ (a febre do petróleo).
Os verbos próprios do terreno ambientalista também estão presentes: ‘salvar’,
‘proteger’, além dos termos generalizantes e pouco precisos como ‘parar para siempre’, ‘parar
definitivamente’; ‘miles de años’ (milhares de anos). No âmbito do vocabulário identificamos
ainda a neutralização discursiva, embasada em expressões até românticas, que apostam no
consenso universal do termo sem oferecer explicações como ‘delicado ecosistema’, ‘manera
sostenible’ (maneira sustentável), ‘bien de toda la vida en la Tierra’ (bem de toda a vida na
Terra), ‘planeta que dejamos a nuestros hijos’ (planeta que deixamos para os nossos filhos)
‘un mundo verde, en paz y saludable’ (um mundo verde, em paz e saudável), ‘pesca no
sostenible’ (pesca não sustentável) que vão compondo o discurso ambientalista na
193
Encadeamento/técnicas argumentativas
No caso, temos uma arquitetura textual idêntica à identificada no hotsite do
Greenpeace Brasil, que varia de tamanho e traz os destaques em dimensão maior. Também
faz uso da autoridade ambientalista, mas notamos uma preocupação em contextualizar certas
práticas citadas, como a pesca não sustentável. ‘Las flotas de pesca industrial están
comenzando a pescar con redes de arrastre en aguas del Ártico’ (As frotas de pesca
industrial estão começando a pescar com redes de arrastre nas águas do Ártico – as redes
usadas indicam a não sustentabilidade, por exemplo). Nesse mesmo sentido, temos mais dois
elementos no portal como o vídeo e o documento para download ‘El Ártico, la ultima
frontera’ sobre a situação no Ártico, como outros subsídios informativos que não
identificamos no Brasil.
Em outro momento, para dar respaldo às informações e confiança aos internautas, o
texto, nos espaços do Brasil e da Espanha, retoma o exemplo de uma campanha similar feita
há 30 anos na Antártica, que conseguiu a proibição de atividades econômicas na região. No
Brasil a informação é mais vaga, sem detalhamento dos resultados, enquanto que no conteúdo
espanhol fica mais claro que uma ação do Greenpeace conseguiu criar um parque mundial no
Polo Sul. Essas poucas diferenciações evidenciam um ethos mais preocupado em respaldar e
detalhar informações e, no sentido do enunciador procurar similaridade com seu auditório,
podemos pressupor que o público espanhol seja mais exigente ou menos disposto a aderir a
campanhas sem as informações necessárias.
Não obstante, o hotsite espanhol também traz em tantos outros momentos informações
valendo-se da própria legitimidade: ‘el Ártico es la avanzadilla del calentamiento global: se
calienta el doble de rápido que el resto de la Tierra’ (o Ártico é o avanço do aquecimento
global: esquenta duas vezes mais rápido que o resto da Terra); ‘hemos perdido tres cuartas
partes de la capa de hielo flotante de la cima de la Tierra’ (Perdemos três quartos da camada
de gelo flutuante da Terra) ‘Documentos gubernamentales secretos afirman’ (Documentos
governamentais secretos afirmam).
194
Destacabilidade
A destacabilidade está presente essencialmente no próprio nome da campanha, usado
como hashtag em redes sociais digitais #Salváelartico, que atua como uma máxima.
Também nas chamadas da página principal, que aparecem de forma rotativa no hotsite,
identificamos os excertos do próprio texto que são usados como elementos de destacabilidade,
mas na Espanha apresentam um tom mais informativo e propositivo ‘peça aos líderes’, em
contraposição com a dramaticidade no Brasil ‘Ursos polares estão morrendo’. Embora a
página também traga construções bastante similares aos destaques no Brasil: Todos
dependemos de la salud del Ártico. ¡Salva el Ártico! (Todos dependemos da saúde do Ártico.
Salve o Ártico); Las compañías y los gobiernos quieren buscar petróleo en las aguas
desheladas del Ártico (As empresas e governos querem buscar petróleo nas águas
descongeladas do Ártico); La quema de petróleo es el origen del deshielo (A queima de
petróleo é a origen do degelo); Necesitamos proteger el Ártico de las prospecciones
petrolíferas y la pesca no sostenible (Necessitamos proteger o Ártico da exploração de
petróleo e da pesca não sustentável) Firma ahora y pide a los líderes mundiales que la zona
alrededor del Polo Norte sea declarada santuario global (Assine agora e peça aos líderes
mundiais que a região do Polo Norte seja declarada um santuário global).
Aqui também na mesma perspectiva do portal brasileiro, trazem palavras de ordem
que atuam como slogan militantes ‘firma ahora’, ‘precisamos’, ‘necesitamos’, em primeira
195
pessoa do plural para evidenciar o ethos de parceria e do trabalho em conjunto. Assim como
na própria petição, texto localizado à direita na figura do portal : ‘Si, consigamos un santuário
global em el Ártico. Únete a la Revolución del Ártico y ven con nosotros al Polo Norte. (Sim,
consigamos um santuário global no Ártico. Junte-se à revolução do Ártico e venha conosco ao
Polo Norte). A expressão ‘revolução do ártico’, que não identificamos no Brasil, dá um tom
até mais agressivo e militante para a questão.
Fotos/ desenhos/imagens
O hotsite Salve o Ártico é padronizado, então na Espanha também traz fotos de
poluição, do gelo no Ártico e do urso polar como protagonista da campanha. Estão presentes
os desenhos de planeta, mares, peixes, as cores de fácil assimilação como o azul e branco e o
preto, eventualmente, para se referir ao petróleo. Composições que, apesar do impacto visual,
reforçam o estereótipo ambiental e não acrescentam informações pertinentes.
Vídeos
Uma das significativas diferenças da página na Espanha é manter um vídeo logo na
página inicial, narrado em inglês, mas com legendas em espanhol, como um meio de
informação da campanha. A produção audiovisual fala da situação do Ártico, mantendo uma
estratégia discursiva muito parecida com a verificada no hotsite, ressaltando o problema, em
tradução nossa: ‘Desfrute da vista enquanto pode porque está desaparecendo rápido’, e
continua evidenciando o conflito, mas sem detalhamento ‘neste verão a indústria petroleira se
muda para o Ártico (...) para extrair o petróleo que está aquecendo nosso planeta e derretendo
nosso gelo’, para então, falar da necessidade de criação de um santuário na região.
As imagens mostram o horizonte de gelo, o oceano, as calotas polares derretendo e os
animais nadando nas águas geladas, através de uma espécie de lente/tela que vai se fechando
até formar um planeta Terra, com a mensagem ‘Save the arctic’ e uma trilha sonora que
reforça a dramatização. O vídeo de pouco mais de um minuto atende à dinâmica ágil da
Internet e evidencia a utilização de diferentes plataformas para divulgar o assunto.
196
Cores/cena predominante
Temos a mesma estrutura, de leitura não linear, dinâmica, com textos em diferentes
tamanhos, fotos, desenhos, obedecendo a mesma ordem de argumentos de apresentar o
problema, suas causas e soluções, com hiperlinks para perguntas frequentes, mas neste caso
temos o vídeo e um documento para download que compõem uma cenografia mais
informativa.
O documento técnico intitulado ‘El Ártico, la última frontera’ foi produzido pelo
próprio Greenpeace Espanha, conforme consta no expediente do material, tem 28 páginas, em
formato pdf (próprio para documentos eletrônicos), que permite a rápida visualização ou até o
arquivamento do mesmo. Está dividido em seis capítulos: Introdução, ‘El Ártico: un paraiso
helado/Un ecosistema frágil’ (O Ártico: um paraíso gelado/Um ecossistema frágil);
‘Principales amenazas del Ártico’ (Principais ameaças do Ártico), ‘El cambio climatico: el
peor enemigo del Ártico’ (A mudança climática: o pior inimigo do Ártico) ‘Como afecta aquí
o que sucede en el Ártico/evidencias del cambio climático en España’ (Como afeta aqui o
acontece no Ártico/evidências das mudanças climáticas na Espanha); ‘Por qué el Petróleo del
Ártico no es necesario’ (Por que o petróleo do Ártico não é necessário) além dos itens:
‘Demandas de Greenpeace’; ‘Una campaña global para salva el Ártico’ (Um campanha
global para salvar o Ártico) e ‘10 maneras fáciles de vivir con menos petróleo’ (Dez maneiras
fáceis de viver com menos petróleo).
Não vamos entrar no mérito do discurso em um texto tão amplo e pretensamente
técnico, mas devemos ressaltar a preocupação em fornecer dados e o interesse em trazer a
problemática, aparentemente distante do cotidiano, para o contexto local, explicando os
impactos, o porquê de criar uma reserva, as ameaças, quais as alternativas à produção de
petróleo, esclarecendo também o ‘funcionamento’ de um santuário. Na visão geral que
fizemos no documento, notamos expressões tipicamente ambientalistas, certas dramatizações,
exageros na linguagem, fotos realmente impactantes de duas páginas mostrando os ursos
polares, cenários de gelo. Mas identificamos também uma produção intensa de informações e
dados, com respaldo de instituições de pesquisa, estudos e relatórios científicos, além de
fontes governamentais, com duas páginas de referências em um total de 67 citações. Não
localizamos documento similar nem no Greenpeace Internacional, o que pode confirmar a
iniciativa própria do Greenpeace Espanha em oferecer informações para os usuários.
Além disso, uma questão que nos intriga e é determinante para afirmamos que há sim
diferença no ethos e na cenografia da mesma organização na cibercultura, é o fato da petição
197
‘para salvar o Ártico’ permitir na Espanha que o internauta escreva sua própria mensagem de
reinvindicação, enquanto no Brasil não se consegue alterar o texto já pronto. Há no caso
espanhol e identificamos também no Greenpeace Internacional (e pode ocorrer em outros
países, mas nos centramos nestes três ambientes institucionais) um modelo de texto, mas o
usuário tem a liberdade de apagá-lo, reescrevê-lo, alterá-lo, e que pode obviamente passar
pelo crivo do Greenpeace antes de ser encaminhado, mas de qualquer forma evidencia uma
autonomia não verificada no Brasil. E esta estrutura existiu também em outras petições, como
na Detox Zara, que exigia o compromisso ambiental da rede de lojas de roupa em seus
processos produtivos.
Obviamente que como se trata de uma campanha mundial, o texto e o site são
formatados de maneira globalizada, mas as traduções e certas composições, que de imediato,
aparentam meros detalhes, nos revelam diferenciações importantes, como a questão da
quantidade de informações e a preocupação em oferecer dados para os usuários no caso do
conteúdo espanhol. Nesse âmbito temos ainda outro vídeo da campanha, que já descrevemos,
que foi postado no Facebook do Brasil sem legendas, mas foi devidamente traduzido para o
espanhol, o que evidencia uma preocupação em produzir dados e atender ao público local.
São elementos que nos dão pistas sobre o nível de informação oferecido pelo Greenpeace e o
olhar que tem sobre seu auditório – menos exigente e mais pronto a aceitar informações sem
corroborações no caso nacional. Outro indicativo interessante é justamente a construção das
petições no Brasil que não oferece abertura para intervenções em uma clara estrutura
verticalizada que ameaça as propostas colaborativas da web 2.0 e do próprio ciberativismo,
como debatemos no Capítulo III. Mas é certo que a construção discursiva reflete as condições
de produção de cada país e as próprias vinculações culturais, revelando diferentes
ciberculturas da mesma organização.
Logramos, portanto, delinear a existência de um discurso próprio da cibercultura,
construído com um código linguageiro formado por vocábulos de contradição aflorada que
revelam o conflito, a denúncia, instauram um ethos agressivo e inquisidor, como já sinalizava
o próprio ethos pré-discursivo. O autêntico aqui foi identificar que as estratégias discursivas
despertam o ethos da união, da parceria e aliam uma temática séria e grave a elementos
lúdicos, recreativos que beiram a infantilidade e a estética pop. O discurso sério e denuncista
em um cenário de palavras de ordem generalizadas, desenhos animados, animais dançando e
cantando nos apontaram uma cenografia com sérios deslocamentos, que ousamos denominar
como esquizofrênica.
198
CONCLUSÃO
dos vídeos, ações e campanhas multimidiáticas. E ponderamos que ele pode reduzir as
problemáticas ambientais ao mesmo tempo em que contribui para colocar as questões em
evidência.
Não é possível responder com exatidão se as estratégias midiáticas são mais
importantes que as problemáticas, mas uma coisa é certa: a participação massiva e a
consequente preocupação ambiental foram ampliadas sobremaneira com o surgimento das
ferramentas virtuais. Quase a totalidade dos seguidores, ciberativistas e voluntários
entrevistados passou a participar da ONG e das causas ambientais após a proliferação da
Internet, inclusive as pessoas mais velhas. Nesse sentido, ficou bastante nebuloso também
entender quem é o auditório do Greenpeace, um dos fatores cruciais para o estabelecimento
do ethos, justamente pelo cruzamento de olhares que ele pressupõe: o olhar do outro sobre
aquele que fala, olhar daquele que fala sobre a maneira como ele pensa que o outro vê”
(CHARAUDEAU, 2008, p.115). O discurso utilizado aparenta ser voltado para jovens por
conta da assimilação de elementos contemporâneos, mas atinge de forma significativa o
público com idade mais avançada, como pudemos perceber nas sondagens que realizamos
com os seguidores e nas observações que realizamos nas redes sociais digitais, presentes no
Capítulo IV. Inclusive esse público se mostra mais preocupado com o próprio engajamento e
com formas de atuações mais diretas. E o Greenpeace conhece seu amplo e heterogêneo
auditório e ativa um fiador que coloca a natureza como algo que deve ser defendido com
urgência, usando de argumentos universais de garantia da própria sobrevivência e adestrando
a emotividade.
Pudemos reconhecer ainda que o discurso ambiental não possui um único ethos ou
cenografia. Inclusive a mesma organização em países diferentes revela diferenças
significativas. Na comparação que realizamos da campanha Salve o Ártico no Brasil e na
Espanha observamos muitas similaridades, até porque se trata de uma ação internacional, com
as mídias mantendo a mesma estrutura e os textos apontando para uma tradução de conteúdo
definido pelo Greenpeace Internacional. No entanto, avaliamos um ethos mais professoral no
Greenpeace Espanha e mais preocupado com o seu público ao explicar termos específicos,
disponibilizar vídeo traduzido para a língua nativa, e o documento técnico - El Ártico, la
ultima frontera – que traz subsídios informativos sobre a situação do Ártico e explica os
impactos e as consequências das mudanças climáticas na realidade local. Outra diferença
determinante é que na Espanha é permitido que o usuário altere e reescreva os textos das
petições, em alguns momentos isso é até estimulado, enquanto que no Brasil as petições não
206
permitem nenhum tipo de alteração. Observamos, com isso, a maior autonomia aos usuários
no país europeu, que evidencia a diferença no ethos e até mesmo a forma como o Greenpeace
Espanha vê seu público.
Reconhecemos a existência de um código linguageiro, que participa da
autolegitimação do enunciador, que mescla o lúdico, o recreativo, com o agressivo, o
conflituoso, remete ao universo romântico e se vale da própria autoridade ambientalista para
dar verossimilhança e peso às temáticas divulgadas. Essa autoridade é até mesmo confirmada
pelos seguidores que entrevistamos que alegam participar fazendo o que o ‘Greenpeace pede’,
e se engajam por conta do ‘grande nome’ da organização.
Postulamos, enfim, a existência de uma cibercultura ambientalista delineada pelas
formas de comunicação e participação aqui problematizadas que permeiam o mundo físico e
virtual e significam as questões ambientais nas novas formas de sociabilidade: mais
imagética, mais acelerada, mais caótica, mais tecnologizada. O discurso que caracteriza esse
espaço deve ser lido em suas próprias contrariedades e possibilidades. Há o esvaziamento das
questões e uma cenografia deslocada ao trazer o ethos denuncista para o ambiente infantil, ao
tratar assuntos graves com enredos melodramáticos, mas são essas estratégias discursivas que
garantem sucesso e o engajamento nas campanhas.
Poderíamos aqui sugerir diferentes formas de apresentar as informações na
cibercultura ambiental de maneira mais formativa, disponibilizando meios técnicos de
informação, abarcando a complexidade das temáticas ambientais, apontando que as questões
graves deveriam ser tratadas em um quadro de seriedade e formalidade. Mas não existe
fórmula para garantir que um indivíduo se informe ou se envolva mais. O engajamento social
pode precisamente depender de elementos atrativos para se efetivar. Temos que reconhecer
que o Greenpeace conhece as artimanhas do espetáculo midiático e sabe como conseguir
apoio à causa e pautar as questões socioambientais.
Chegamos ao fim do nosso trabalho de pensar a cibercultura ambientalista na
perspectiva da comunicação e do discurso, mas não podemos colocar um ponto final. A
Sociedade em Rede caracterizada pelas TICs (Tecnologias da Informação e Comunicação),
aquela do espaço dos fluxos e tempo intemporal, está em constante mutação. Assim como o
discurso que a todo o momento está em negociação e movimentação. Situamos a dêixis
discursiva no interior de uma cibercultura com tempos e espaços delimitados, que carrega,
obviamente, os elementos sócio históricos de sua cena legitimadora, mas se instaura no aqui e
agora. Esperamos que outros estudos e pesquisas possam avançar nesse caminho de desvendar
207
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ZACARIAS, Diogo. Entrevista concedida a Katarini G. Miguel. [Mensagem pessoal].
Mensagem recebida por Facebook em 11 nov.2013.
219
APÊNDICE 1
220
APÊNDICE I
Temos diversos canais de comunicação com esse público, um deles é o e-mail, mas
também estamos presentes nas redes sociais Twitter, Facebook, Google plus, Orkut, Flickr,
Youtube, Foursquare e no nosso website. Não existe uma frequência específica, por e-mail
72
Os contatos foram realizados por telefone e, posteriormente, os questionários enviados por correio
eletrônico e devolvidos sem possibilidade de questionamentos ou aprofundamento em pontos que
consideramos insuficiente, apesar das tentativas. O responsável pelo Greenpeace Brasil encaminhou o
questionário respondido em 10 de julho de 2012. E na Espanha os contatos foram realizados durante o
Programa de Doutorado Sanduíche Exterior, em Madri, entre fevereiro e julho de 2013, e as respostas obtidas
em 2 de julho de 2013.
221
tentamos falar com as pessoas toda semana, mas se for preciso vamos falar mais de uma vez
por semana.
Qual o espaço virtual mais utilizado? E qual tem mais resultado em termos qualitativo e
quantitativos (blog, Facebook, Twitter...). Existem profissionais específicos que fazem as
atualizações?
Na nossa visão não existe um canal sem existência do outro, por exemplo, o Twitter é
um suporte a outros canais como website e blog. No blog e website temos um conteúdo mais
consistente e precisamos que as pessoas conheçam nosso trabalho mais profundamente. O que
vale ressaltar é que a Internet muda muito e precisamos ficar ligados nessas mudanças. No
Brasil, por exemplo, o Orkut já foi nosso principal canal nas redes sociais, depois tivemos o
Twitter, hoje em dia é o Facebook, mas o e-mail continua sendo um dos meios mais efetivos.
Quais as campanhas que surtem mais efeito na Internet? A que você atribuiria o sucesso
de algumas em detrimento de outras?
Não acredito que algumas campanhas surtem mais efeito na Internet e outras não, tudo
é intrinsecamente ligado, se você faz um bom trabalho nas ruas isso irá refletir na Internet. Na
mesma direção, o que você faz na Internet reflete na campanha nas ruas.
É tudo conectado, o que pode mudar é o tipo de abordagem que você irá fazer com cada tipo
de público. Cada meio tem seu próprio modo de operar, você deve conhecer primeiro cada
meio e como funciona e adequar sua mensagem.
sociedade civil no seu dia-a-dia, não é possível gerar transformação apenas no âmbito virtual,
ele é apenas como uma extensão do mundo real.
Notei que o Greenpeace não interfere (ou bem pouco) em comentários e posts do
Facebook e do blog, não há mesmo intervenção? É uma política da organização não
realizar intervenções em debates, opiniões contrárias? Existem filtros nos comentários?
Como você avalia a comunicação virtual, qual a relevância que ela tem hoje para a
atuação do Greenpeace?
Pues, 1984.
La pauta de las comunicaciones con los socios es, aproximadamente, de dos emails al
mes y una revista trimestral, pero esta pauta puede verse alterada cuando hay acciones,
convocatorias, etc.
¿Qué tipo de campaña, por ejemplo, consiguen más éxito en Internet, y por qué, de
acuerdo con sus impresiones algunas logran más resultados y otras menos?
Todas las campañas pueden ser exitosas pero estamos teniendo mucho éxito en redes
sociales este año con la campaña de Ártico.
¿Cuál el espacio virtual más utilizado por Greenpeace España y con resultados mejores
– Twitter, Facebook, site o blog? Hay profesionales específicos que hacen las
actualizaciones?
El blog es el medio que tiene más visitas en nuestra web, nuestro Fb es la principal
fuente de tráfico y twitter es el mejor en expansión de contenidos. Nuestra
web www.greenpeace.es recopila todo esto y es el espacio virtual con más visitas.Tenemos
tres personas en la Unidad Digital dentro de comunicación que se dedican a mimar los canales
online: web, blog, redes sociales, marketing online. Y los contenidos los generamos desde el
departamento de comunicación y campañas
Hola, se responde y se comenta todo lo que nos preguntan en todas las redes sociales.
En twitter se dan una media de 20 respuestas diarias, en días pico, hemos llegado hasta 500
respuestas diarias. En lo blogs se responde a todos los comentarios y en FB se responde a
mensajes privados y tb a preguntas que se generan en los fotos de debate de todas las subidas.
Não informado.
Como vosotros evaluáis la comunicación virtual ¿Cuál su importancia para los trabajos
de Greenpeace actualmente?
2. Como você definiria sua contribuição? (O que você faz enquanto ciberativista, e ou
voluntário? Colabora financeiramente?)
Coordeno grupo de voluntários do Estado de Minas Gerais, participo de ações
presenciais, coleto assinaturas presenciais para as petições. Também replico e divulgo
mensagens, campanhas e petições na Internet.
73
As entrevistas com os designados voluntários foram realizadas presencialmente durante o evento Rio+20, em
junho de 2012. Os demais depoimentos foram concedidos por meio da Internet, com contatos realizados pelo
Facebook e listas de discussões. As perguntas foram as mesmas para os diferentes participantes.
226
2. Como você definiria sua contribuição? (O que você faz enquanto ciberativista e
ou voluntário? Colabora financeiramente?)
Sou voluntária em atividades do Greenpeace, ativista, participo de mobilizações e
ações presenciais. Também acompanho as ações pela Internet e replico mensagens, mas em
menor intensidade.
2. Como você definiria sua contribuição? (O que você faz enquanto ciberativista e ou
voluntário? Contribui financeiramente?)
Primeiramente eu era ciberativista e seguia pelo Facebook, compartilhava mensagens,
assinava petições. Continuo com essas ações, mas atualmente sou contratado da instituição.
Profissão: psicóloga
2. Como você definiria sua contribuição? (O que você faz enquanto ciberativista ou
voluntária? Colabora financeiramente?)
Como voluntária participo das atividades em São Paulo, dos Pontos Verdes
especialmente. Como ciberativista replico as notícias do site, Facebook, assino petições e
colaboro na divulgação. Também participo de grupo de e-mails entre os voluntários para
discussão dos temas ambientais.
228
2. Como você definiria sua contribuição? (O que você faz enquanto ativista,
colaborador?)
Não participo tão ativamente, estou cadastrada como ciberativista, mas só replico
notícias no Facebook e Twitter, procuro assinar as petições, recebo e-mail sobre ações
ciberativistas, mas não costumo mandar e-mails diretos aos amigos, por exemplo, ou pedir
que participem.
Profissão: Jornalista
Há quanto tempo participa da ONG? Não lembra, mas é apenas pela Internet
Há quanto tempo participa da ONG? Não lembra, mas é apenas pela Internet
1. Sigo o Greenpeace apenas pelo Facebook, para me informar sobre questões globais e
tirar ideias para ações locais.
2. Nunca efetuei o cadastro como ciberativista, mas compartilho as ações do Greenpeace
com amigos e desenvolvo matérias com a temática ambiental para o jornal da minha
cidade.
3. Procuro entrar no site do Greenpeace toda semana.
230
Há quanto tempo participa da ONG? Não lembra, mas é apenas pela Internet
1. Sigo o Greenpeace porque admiro o trabalho dele. Também sou da área ambiental e
gosto de acompanha-los.
2. Estou cadastrada como ciberativista, eu navego pelas redes do Greenpeace... assino e
compartilho o que eles pedem, mas de forma virtual.
3. Toda semana recebo alguma informação.
4. Participo sempre de eventos virtuais, o último que participei foi para libertar a Ana
Paula, bióloga (presa na Rússia por conta do protesto realizado no ártico).
Cargo/função: aposentada
1. Participo porque acho o Greenpeace uma das mais sérias defensoras do meio
ambiente, o fato de aceitarem contribuições financeiras apenas de pessoas físicas
231
confirma seu compromisso com a fidelidade aos seus propósitos e até aos seus credos.
2. Por vários motivos contribuo muito menos do que gostaria, recebo correspondência e
e-mails, mas financeiramente contribuo muito pouco porque estou aposentada e isto
no Brasil se você não tem fortuna particular, significa viver modestamente, também
tive um problema no joelho o que deixa a minha mobilidade comprometida, a isto
soma-se o fato de realmente não ter mais disposição para fazer tudo o que gostaria.
Assim, faço muita divulgação, online, Facebook, e-mail.
3. Semanalmente
4. Já participei de algumas manifestações que ocorreram aqui perto de casa, no vão do
MASP, solicitando assinaturas em projetos como Desmatamento Zero, ou solicitando
que as pessoas conheçam o importantíssimo trabalho do Greenpeace e sejam
associados/ativistas, pretendo continuar participando sempre que ocorrerem em
lugares que sejam acessíveis para mim. E participo pela Internet.
Cargo/função: publicitária
1. Sigo o Greenpeace há muitos anos (uns 20, acho) por acreditar na organização. Pela
Internet há uns 2 ou 3 anos acompanho pelo Facebook.
2. Faço contribuições financeiras esporádicas, comprando produtos e não atuo como
ciberativista, pelo menos não me lembro de ter efetuado cadastro para isso. Minha
contribuição é mínima (infinitamente inferior ao que gostaria: tomo conhecimento das
ações, compartilho mensagens).
3. Acompanho as informações da ONG sempre que são publicadas ou compartilhadas
por amigos.
4. Já participei de mobilização virtual.
232
Há quanto tempo participa da ONG? Não lembra, mas é apenas pela Internet
1. Não sei exatamente, me identifico com a luta deles, acho super importante o que eles
fazem. Vejo às vezes o site, mas é sim pelo Facebook que acompanho sempre, curto e
compartilho sempre. Comento também muitas vezes. Nunca contribui
financeiramente, mas penso nisso sim.
2. Não sou ciberativista e gostaria de atuar mais. Só realizo ações pela Internet,
mandando e-mails, compartilhando no Facebook e assinando as petições que chegam
até mim, eu concordando, é claro.
3. Tomo conhecimento sempre que recebo os e-mails deles e divulgo quase sempre.
4. Sim, a última ação que participei foi a tentativa de libertação dos ativistas presos na
Rússia é a que eu estou mais atenta, preocupada, revoltada e tudo mais. Tenho feito o
que eles sugerem, liguei para a embaixada (desligaram na minha cara), mando e-mails
e todos os dias compartilho algo sobre a prisão deles. Acho que pelas outras respostas
você já viu que faço muito pouco, nada contundente, efetivo e que dê margem para
resolver qualquer que seja o problema. É só uma pequena contribuição, falo e reclamo
das coisas que me incomodam e incomodam as pessoas de bem que têm consciência
de que algo tem que ser feito pelo Planeta, ou para começar pelo nosso bairro, nossa
cidade e aí por diante. Mas, você sabe, fico muito decepcionada, pois vejo que meus
amigos não dão muita importância, pois eles não compartilham estas questões que
acho tão importantes, agora quando é uma piada, compartilham logo. São poucos os
que sinto que estão preocupados com a política, com a natureza, os animais, o lixo
espalhado pelas ruas e muito mais.
233
Cargo/função: aposentada
Cargo/função: massoterapeuta
Há quanto tempo participa da ONG: Não lembra, mas é apenas pela Internet
1. MOTIVOS: Paixão pelo Ambientalismo; admiração à ONG pela projeção mundial que
alcançou. Sou seguidor principalmente pelo Facebook e eventualmente pelo site.
Nunca contribui financeiramente.
2. Tenho cadastro de ciberativista. Atuação: Apenas compartilho mensagens, participo de
campanhas de assinaturas, envio mensagens para amigos e procuro divulgar matérias
que julgo de interesse relacionada ao meio ambiente. Acredito que é bem limitada.
Além de tomar conhecimento replico algumas mensagens.
3. Frequência de matéria: média de 2 vezes na semana.
4. Mobilização: Somente ações virtuais: Ativista do ártico; Desmatamento Zero; Código
Florestal; mudanças climáticas; Belo Monte; aquecimento global; Dia Mundial sem
carro, etc.
Cargo/função: bióloga
Há quanto tempo participa da ONG? Não sabe, mas é apenas pela Internet
1. Gosto de estar por dentro das ações que o Greenpeace promove pois são pessoas sem
medo de defender o meio que agem neste órgão, saindo daquela monotonia que muito
se fala e pouco realmente se faz. Infelizmente só acompanho eles pelo Facebook.
236
Cargo/função: locutor
1. Resolvi seguir o Greenpeace para ficar por dentro de suas ações e conhecer melhor o
grupo.
2. Não sou ativista, apenas um cidadão interessado num mundo melhor e preocupado
com o futuro do planeta. Minha contribuição ao Greenpeace se resume apenas em
replicar mensagens e discutir assuntos relacionados com amigos. Durante a juventude
participei de diversas manifestações em favor do meio ambiente, fase do período
escolar, mas depois de adulto não tenho participado.
3. Tomo conhecimento das ações do Greenpeace principalmente pelas mídias sociais e
depois por telejornais.
4. Ainda não participei de nenhuma ação do Greenpeace, mas gostaria de participar.
Cargo/função: bióloga
Cargo/função: vendedora
Cargo/função: jornalista
Cargo/função: jornalista
Cargo/função: advogada
1. Participo pelo Facebook porque trabalho com o meio ambiente e recebo e leio e-mails.
2. Fiz cadastro como ciberativista e assino petições e divulgo informações que entendo
favoráveis a causa ambiental.
3. Acompanho semanalmente pelas redes sociais e e-mails.
4. Sim, já participei e continuo participando mais diretamente da campanha contra o
242
desmatamento no Facebook.
Observação: ultimamente tomei conhecimento q os ativistas não são veganos, o que
me decepcionou tendo em vista as informações sobre a relação existente entre a
produção de animais como destruidora do meio ambiente, além da crueldade contra os
animais e achei incoerente tal postura.
Cargo/função: professora
produtos, mas sempre me questionei. Prefiro contribuir em outras causas que mostram
um “retorno” no sentido de representar e apresentar eficácia. Meu último comentário,
e as repercussões, me faz repensar a política da Greenpeace e já não sei se me sinto
representada por eles. Sua atividade permanece “igual” nestes 20 anos. Só posso
desejar estar mal informada e que muitas das ações tenham produzido resultados e
bem estar humano e não-humano.
3. Estou recebendo apenas informações da Greenpeace pelo Facebook e pelo e-mail. No
caso recente, fiquei indignada, não pelo fato da ativista Ana Paula comer carne, mas
pelo fato de que a Greenpeace deve sim dar satisfações coerentes. Me perguntei o que
seriam deles sem o apoio dos vegans ou vegetarianos, então, veio à minha mente a
questão financeira: quem realmente financia esta Organização? Parece que há uma
grande incoerência em muitos aspectos: vi ambientalistas criticando vegetarianos e
disso para pior. As pessoas parecem gostar do espetáculo oferecido. Das “grandes”
causas. Coisas como “eles estão ali por nós”, acho um equívoco “idealista”, isso seria
interessante se a ideia fosse macro e micro geograficamente e sem diferenciação de
espécies ou biomas.
4. Nunca participei de atividades presenciais na Greenpeace. Como disse, eles não
parecem atuar em ações “menos” visíveis. Já participei de outras atividades locais
voltadas ao bem-estar animal.
244
APÊNDICE 2
245
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http://zip.net/btmJ46
http://zip.net/bmmJXn
http://zip.net/bnmJVG
11. Urso polar Salve o Ártico BLOG. Texto e 1 tweet 1 post relacionado Sim/ Sim
busca nova vídeo. Hiperlinks específico com com 4079 curtir, petição
casa para notícias 34 retweets 126 comentários, Ártico
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campanha Salve o compartilhamen-
Ártico. 1 tos
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13. Assine pelo Desmatamento HOTSITE LIGA 58 tweets Não Sim/ Sim
desmatamen Zero DAS mobilização petição
to zero FLORESTAS online pelas Desmata-
mento
247
14. Faça parte Ajude o PÁGINA PARA Sim Não Não Não
da mudança Greenpeace DOAÇÃO
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mundo mais
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se a nós
15. Um milhão Salve o ártico BLOG. Foto, 1 tweet Não Sim/ Não
em ação/ texto. Hiperlinks específico, com petição
Um milhão para notícias 21 retweets Ártico
pelo ártico
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campanha Salve o
Ártico. 3
comentários
http://zip.net/btmJ5f
16. Venha para Ajude o PÁGINA PARA Sim Não Não Não
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preservação
com a gente. http://zip.net/bbmJ3p
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17. Eles Desmatamento NOTÍCIA. Texto, 5 tweets Não Sim/ Sim
ouviram/ Zero fotos, vídeos. específico com acordo
Indústria de Hiperlinks para 16, 18, 27, 26,
Gusa do MA Denúncia notícias e 11
apoia
desmatamen campanha
to zero Desmatamento
Zero. 1
comentário.
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18. Sinal verde Denúncia NOTÍCIA. Foto e 1 tweet Não Sim/nota Sim
para porto textos. Hiperlinks específico em de
da Cargill para notícias e outra data, com repúdio
nota de repúdio. 3 20 retweets
comentários
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19. Com você, Ajude o PÁGINA PARA Sim Não Não Não
um futuro Greenpeace DOAÇÃO
mais verde e
sustentável é http://zip.net/bbmJ3p
possível.
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20. Salve a Salve o ártico HOTSITE Sim Sim Sim/ Sim
minha casa / SALVE O petição
Sim! Vamos ÁRTICO Ártico
criar um
santuário http://zip.net/bkmJ4B
ecológico no
Ártico
248
21. Em defesa Salve o ártico NOTICIA. Fotos, 6 tweets 1 post específico Sim/ Sim
do Ártico galerias de específicos, com com 3035 curtir, petição
Kumi imagem, vídeo e 15, 20, 27, 33, 87 comentários, Ártico
Naidoo
texto. Hiperlink 20, 30 retweets. 1601
ocupa
plataforma para a campanha 2 retweets do compartilhamen-
russa/ Pelo Salve o Ártico, 2 Kumi Naidoo tos
ártico Kumi comentários
Naiddo
ocupa http://zip.net/blmJr3
plataforma
russa
22. Sua doação Ajude o PÁGINA PARA Sim Não Não Não
é muito Greenpeace DOAÇÃO
importante
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o Ártico,
minha casa.
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nós.
23. Após ocupar Salve o ártico BLOG. Foto, 1 tweet Não Sim/ Sim
plataforma e vídeo, texto. específico com petição
bloquear Hiperlinks para 55 retweets Ártico
embarcação
notícias
da Gazprom,
protesto é relacionadas e
encerrado / campanha Salve o
Fim do Ártico. 2
protesto no comentários
Ártico
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25. Sua doação Ajude o PÁGINA PARA Sim Não Não Não
é muito Greenpeace DOAÇÃO
importante
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a Amazônia,
minha casa.
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26. O fim da Energia nuclear NOTÍCIA. Foto e 1 tweet Não Não Não
energia texto. Hiperlink específico em
nuclear no para estudo. Sem outra data com
Japão
comentários 59 retweets
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27. Sua doação Ajude o PÁGINA PARA Sim Não Não Não
pode salvar Greenpeace DOAÇÃO
o Ártico e
minha http://zip.net/bbmJ3p
família.
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249
nós
28. 21/09 Dia de Dia da árvore BLOG. Foto e No dia 21/09, 1 post específico Sim/ Sim
mobilização texto. Sem twitaço sobre com 1390 curtir, mobiliza
pelas Desmatamento comentários dia da árvore – 36 comentários e ção
Árvores/ As zero 85 tweets 1740
árvores http://zip.net/bcmJJj
somos nós! compartilhamen-
tos
29. O maior Salve o ártico NOTÍCIA. Foto, 2 tweets 1 post específico Sim/ Sim
degelo da vídeo e texto. específicos com com 16.955 curtir, petição
história Sem comentários 82 e 80 retweets 1283 comentários, Ártico
10.140
http://zip.net/bxmKVc
compartilhamen-
tos
32. Use seu Desmatamento HOTSITE LIGA 6 tweets 2 posts Sim/ Não
titulo para zero DAS específicos, 29, específicos com petição
salvar as FLORESTAS 39, 27, 37, 32, 1167 curtir, 51 Desmata
florestas
24 retweets comentários, 790 mento
http://zip.net/btmJ49
compartilhamen- Zero
tos; 1246 curtir,
45 comentários,
850
compartilhamen-
tos
33. Dois Salve o ártico BLOG. Foto e Não 2 posts Sim/ Não
milhões pelo texto. Hiperlink relacionados com petição
Ártico para campanha 3153 curtir, 82 Ártico
Salve o Ártico. 2 comentários, 2685
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tos; 3914 curtir,
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136 comentários,
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compartilhamen-
tos
34. Eu, urso Ajude o PÁGINA PARA Sim Não Não Não
polar,
preciso de
250
36. Verde até Denúncia NOTICIA. Foto, 4 tweets Não Sim/ Não
quando? vídeo e texto. 6 específico, 31, petição
Desmatamento comentários 41, 51, 44, Desmata
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Zero
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40. Pare! Você Ajude o PÁGINA PARA Sim Não Não Não
sabia que Greenpeace DOAÇÃO
sua ajuda
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minha casa?
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41. Mais legal Denúncia NOTÍCIA. Foto, 1 tweet Não Sim/ Sim
que isso infográfico, texto. específico com denúncia
impossível Desmatamento Hiperlink notícias 44 retweets ao MP
zero relacionadas e
campanha
Desmatamento
251
Zero. 6
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http://zip.net/bdmKgy
47. Zara proíbe Detox/Vítimas NOTICIA. Foto e 2 tweets 1 post com 4897 Sim/ Sim
moda tóxica da moda texto. Hiperlink específicos, 292 curtir, 262 petição
/ Zara aceita com estudo. 5 e 57 retweets comentários, 2152 Detox
lavar roupa
comentários compartilha-
suja
mentos
http://zip.net/bsmKkb
48. Levis agora Detox/Vítimas HOTSITE 2 tweets 1 post específico Sim/ Não
é a sua vez CAMPANHA específicos na com 4897 curtir, petição
de
252
49. Agora é a Detox/Vítimas NOTICIA. Foto e 1 tweet 1 post com 1106 Sim/ Não
vez deles/ da moda texto. Hiperlinks específico, 63 curtir, 58 petição
Levi’s adere para notícias retweets comentários, 558 Detox
à moda
relacionadas e compartilha-
limpa
estudo. Sem mentos
comentários
http://zip.net/blmJsn
especial dos
20 anos do
Greenpeace.
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nós
53. Greenpeace Denúncia NOTÍCIA. Foto e Não Não Sim Sim
e JBS texto. Hiperlink /acordo
retomam Desmatamento para notícia e com
compromiss zero a nota do acordo.
o pelo fim
do 4 comentários
desmatamen
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to na
Amazônia
54. Brasileiros Energia/Clima NOTICIA. Foto e 4 tweets Não Não Sim
vão pagar texto. Hiperlink relacionados,
mais caro para notícia com 67, 59, 24,
para gerar
relacionada. 2 82 retweets
uma energia
fóssil e comentários
poluente/
http://zip.net/bcmJJF
Brasileiros
pagam mais
por energia
poluente
55. O pré-sal e Energia/Clima NOTICIA. Foto, 2 tweets Não Não Sim
os vilões do galeria de foto, específicos com
clima infográfico, texto. 39 e 37 retweets
Hiperlink com
estudo. 1
comentário
http://zip.net/bsmKkf
http://zip.net/bkmJ43
58. O duelo da Detox/Vítimas BLOG. Foto, 2 tweets 1 post com vídeo Sim/ Sim
moda/Verde da moda texto e vídeo. relacionados sobre o assunto, petição
é tendência Hiperlinks para com 24 e 77 362 curtir, 7 Detox
na semana
notícias retweets* comentários, 137
de moda de
254
http://zip.net/bpmKv0
59. Shell Salve o Ártico BLOG. Foto e 2 tweets 1 post relacionado Sim/ Sim.
suspende texto. Hiperlinks específicos com com 667 curtir, 24 petição
perfuração para notícias 44 e 29 comentários e 381 Ártico
no ártico.
relacionadas, para retweets. compartilha-
Por quanto
tempo? campanha Salve o mentos
Ártico e petição. 1
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62. Protesto Mobilidade NOTICIA. Foto e 1 tweet com 8 2 posts Sim/ Sim
contra urbana texto, 4 retweets específicos em plano de
mudanças na comentários datas distintas mobili-
inspeção
com 300 curtir, 20 dade
veicular em http://zip.net/bgmKdj
SP/ Robin comentários, 180 urbana
Haddad compartilha-
interrompe mentos
audiência
pública em
SP
63. Ativistas Salve o Ártico BLOG. Texto e 6 tweets em Não Sim/ Não
suspensos vídeo. Hiperlinks datas diferentes, petição
no cartão para campanha com 12, 31, 31, para
postal
Salve o Ártico e 16, 26, 25 Obama
israelense
mandam para participar da retweets
mensagem petição para o
255
66. ‘Nós Dia do Índio BLOG. Foto, 3 tweets 1 post específico Não Não
existimos’ galeria de foto, específicos com com 2759 curtir,
vídeo, texto, 60, 14 e 51 51 comentários,
hiperlink com retweets. 2269 compartilha-
notícia mentos. Post
relacionada. relacionado com
385 curtir, 10
http://zip.net/bcmJJH
comentários, 327
compartilha-
mentos
67. Amor pelo Salve o ártico NOTICIA. Foto, 2 tweets 3 posts Sim/ Não
Ártico galeria de foto, específicos com relacionados com petição
vídeo, texto, 20 e 23 retweets 1788 curtir, 37 Ártico
hiperlink para comentários 546
Campanha Salve compartilha-
o Ártico. 1 mentos; 2147
comentário curtir, 38
comentários, 542
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mentos;458 curtir,
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200 compartilha-
mentos
68. 21 anos de Aniversário BLOG. Foto, 5 tweets 1 post específico Não Não
Greenpeace Greenpeace vídeo e texto, específicos com com 855 curtir, 44
Brasil / No hiperlink para 37, 18, 37, 21, comentários, 215
nosso
notícia e 35 retweets compartilha-
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69. Você pode Ajude o PÁGINA PARA Sim Não Não Não
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curtir, 10
comentários, 102
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mentos, 383
curtir, 14
comentários e 139
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mentos
73. Quer marcar Desmatamento HOTSITE LIGA Sim Sim Sim/ Sim
a história do zero DAS petição
país? Assine FLORESTAS Desmata
a petição.
mento
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Zero
257
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energia, com foto, retweets vídeos com 518 Juventud
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compartilhamento
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comentários, 194
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mentos; 196
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comentários, 44
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comentários, 104
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mentos.
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77. Um dia que Dia do meio NOTICIA. Foto e 11 tweets com 1 post relacionado Sim/ Não
não existiu ambiente texto, hiperlink 42, 23, 27, 41, com 1273 curtir, petição
campanha 25, 31, 26, 168, 30 comentários, Desmata
desmatamento 71, 46, 91 743 compartilha- mento
zero. Sem retweets. mentos Zero
comentários
http://zip.net/bgmKdr
258
78. Onde o sol Energia/ Projeto BLOG. Vídeo, Sim, tweets Posts Sim/ Sim
brilha mais Juventude Solar texto, hiperlink relacionados, relacionados, projeto
forte para o projeto. 3 identificados identificados item Juventu-
comentários item 74. 74. de Solar
http://zip.net/bsmKkl
82. O espaço Protestos no BLOG. Foto, 6 tweets 1 post específico Sim/ Sim
público é Brasil vídeo e texto, específicos com com 1059 curtir, plano de
onde o povo hiperlinks para 36, 112, 61, 88, 83 comentários, mobilida
decide seu
notícias 80, 64 retweets 378 compartilha- de
destino/
Baixou! E relacionadas e mentos urbana
agora? projeto de
mobilidade
urbana. 1
comentário
http://zip.net/bvmKrx
259
http://zip.net/bdmKgQ
85. Sol no morro Energia/ Projeto Foto, vídeo, texto 3 tweets 3 posts Sim/ Sim
Juventude Solar e hiperlink para o específicos com relacionados com projeto
projeto. 4 7, 13 e 8 13 curtir, 2 Juventu-
comentários retweets comentários, 4 de Solar
compartilha-
http://zip.net/btmJ5W
mentos; 206
curtir, 4
comentários, 35
compartilha-
mentos e 343
curtir, 20
comentários e 109
compartilha-
mentos
http://zip.net/bhmKg7
ANEXOS
261