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PRIMEIRAS APROXIMAÇÕES
1. Introdução
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Pedro Almeida Pereira da Silva é graduando no Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades do
IHAC-UFBA, voluntário no projeto Narrativas da Chapada Diamantina e voluntário no projeto de
extensão Canto do Conto. E-mail: almeida_ps@hotmail.com.
Para inserir o trabalho no campo da cultura da infância, foi lançado mão de um
referencial teórico que aclarou a definição atribuída a cultura “da” e “na” infância.
Aqui a infância é entendida como “construção social” (PROUT e JAMES, 1990), além
de sua dimensão histórica e social, a infância é concebida como categoria estrutural e
geracional. E a constituição da cultura desta categoria geracional dada através de “um
conjunto estável de actividades ou rotinas, artefactos, valores e ideias que as crianças
produzem e partilham em interacção com os seus pares.” (CORSARO e EDER, 1990
apud SARMENTO, 2005, p.11)
A infância, assim entendida, “demanda uma compreensão das crianças a partir delas
próprias, dando ênfase ao que pensam, sentem e a forma que agem sobre a realidade a
qual estão inseridas”(TEÓFILO, 2014, p.1), o que dialoga com o que sugere Proust e
James (1990), ao afirmarem que “as relações sociais das crianças e suas culturas
merecem ser estudadas em si mesmas, de modo independente das perspectivas dos
adultos”. Ou seja, deve-se compreender as crianças como sujeitos “da” e “na” cultura.
A partir dos textos de Sarmento (2003 e 2005) percebe-se quatro pontos fundamentais
para um distanciamento da cultura da infância para a cultura dos adultos: I - A
interatividade, II - A ludicidade, III - A fantasia do real e IV - A reiteração. O autor
destaca que a natureza interativa do brincar, um dos primeiros elementos fundacionais
das culturas da infância e presença constante na vida das crianças, demarca a alteridade
entre elas e os adultos, o que reforça a necessidade de um campo de estudos dedicados a
estes.
É importante ressaltar que aqui não se procura estudar apenas o espaço urbano, mas sim
a cidade e suas relações com as crianças, como também a diferença como doadora de
materiais distintos para a construção dos artefatos da vida cotidiana, bem como teorias e
costumes, fundamentais na construção de imaginários e consequentemente diferentes
culturas da infância. Visto que “os diferentes espaços estruturais diferenciam
profundamente as crianças [...] demarcando a diversidade social” (SARMENTO, 2005,
p. 370), busca-se estudar a infância no espaço urbano, e as diferenças estabelecidas de
acordo com o contexto social.
Por uma questão de impossibilidade metodológica, não se propõe uma observação direta
e minuciosa dos bairros, muito menos fazer uma “descrição densa”, conforme propõe
Geertz (1989). Como o trabalho ainda se encontra em sua primeira etapa, o
levantamento de material teórico e as primeiras visitas aos bairros foram feitas pra
levantar questionamentos e algumas hipóteses.
Nas primeiras visitas, foi observado que as crianças são atingidas por tecnologias, jogos,
brincadeiras, estórias e toda a comunidade que os circunda de formas muito distintas,
além de pertencerem a classes diferentes, também habitam lugares diferentes. É
exatamente a criação de duas cidades dentro de uma só, como proposto por Milton
Santos ao diferenciar os “espaços luminosos” e os “espaços opacos”. Ou na perspectiva
mais antropológica levando em conta as influências do modo cultural normatizado e
padronizado que se manifesta na metrópole do capital, Lefebre propõe diferença de um
espaço urbano entre outros dois conceitos, o de “espaço abstrado” e “espaço
diferencial”.
Também foi observado que além do espaço estrutural, o acesso aos bens simbólicos,
dispositivos e meios de comunicação, jogos, brincadeiras, dispositivos eletrônicos,
instituições educacionais, produtos de consumo lúdico e espaços dedicados ao lazer das
crianças são bem diferentes. O que reforça a distância entre os imaginários das crianças
destes mundos distintos, gerando infâncias diferentes. Neste contexto tornasse relevante
pontuar que "a infância como categoria não se dissolve porque existe uma pluralidade
de infâncias; ao contrário, confirma-se por meio destas" (QVORTRUP, 2010, apud
TEÓFILO).
Mesmo diante de tantas diferenças há um elemento comum à estas crianças que vivem e
criam os ambientes de formas diferentes: A possibilidade da “experiência das situação
mais extremas através do jogo e da construção imaginária de contexto de vida”
(SARMENTO, 2003, p.2). O que de acordo com Freud se manifesta através de um jogo
simbólico para além da censura imposta a elas, onde o desejo se sobrepõe à realidade.
Este jogo simbólico ao contrário do que pode-se imaginar, não se refere a uma
imaturidade inerente a criança e que não atinge o adulto. “O que existe é uma
transposição imaginária do real, que é comum a todas as gerações [...] mas é
radicalizada pela criança” (SARMENTO, 2003, p.2). O que corresponde à capacidade
inventiva do homem, independentemente de sua geração, classe social, ou posição
geográfica. Mas é importante pontuar que a capacidade das crianças em construírem de
forma sistematizada modos de significação do mundo e de ação intencional, são
distintos dos modos adultos de significação e ação, demarcando a alteridade infantil.
O que posiciona a cultura da infância entre fluxos que interagem através de diálogos
intrageracionais e intergeracionais. As culturas da infância “constituem-se no mútuo
reflexo das produções culturais dos adultos para as crianças e das produções culturais
geradas pelas crianças nas suas interacções.”(SARMENTO, 2005 p. 373)
Nas primeiras observações dos bairros de Portão e Villas do Atlântico, ficou evidente
este controle e direcionamento dado pelos adultos, com relação a interação das crianças
com o ambiente urbano (rua, praça, calçada, parque e etc.), que está diretamente
relacionado com o relacionamento de seus pais com o mesmo. O bairro de classe média
e alta, onde as pessoas dispõe de equipamentos urbanos para o lazer mais variados e em
maior quantidade, as crianças usufruem bem menos da rua que aqueles do bairro de
classe mais baixa, que quase não dispõem destes.
Nas hipóteses levantas isto ocorre dado ao medo de usufruto da rua instituído, que é
fortemente alimentado pela mídia. Mesmo que este uso da cidade se dê em seu próprio
bairro, cercado de câmeras e guaritas de segurança. Por outro lado, em Portão, a falta de
ambientes para o lazer infantil dentro da própria casa, que em grande parte se compõe
de residências com espaço útil menor e dividido por uma população proporcionalmente
maior, emerge como um ponto para as crianças recorrerem a rua e seus pais serem
coniventes.
As atividades extra escolares são muito mais comuns em Villas do Atlântico, que em
Portão. Apenas nas primeiras visitas investigativas (que não formulam os dados finais
deste trabalho) foram constatadas no bairro de Vilas, 9 escolas de língua estrangeira, 3
escolas de Ballet, 4 escolas de artes marciais, 4 escolas de natação, 1 escola de Tênis, 4
instituições fixas de reforço escolar, 1 escola de equitação e 1 escola de artes plásticas, e
em Portão, apenas 1 escola de língua estrangeira e 2 instituições fixas de reforço
escolar.
Neste contexto, sabe-se que não pode-se deixar de considerar o aumento da assimetria
do poder de compra e desigualdades sociais impostas pela sociedade global, que altera
os jogos, brinquedos e o uso do espaço-tempo lúdico das crianças. E que também
apenas o espaço físico não responderá os questionamentos que emergem. Mas aqui
apresenta-se apenas hipóteses e primeiras aproximações da pesquisa. Seguir o
cronograma de pesquisa, além de mais tempo, mais visitas investigativas aos bairros, e
entrevistas para inserir a voz das crianças e compreende-las será imprescindível pra
melhor entender suas relações com o espaço urbano e como de fato os adultos e classes
sociais interferem nesse processo.
4. Considerações Finais
O campo de estudos sobre cultura da infância, mesmo que de estrema importância para
entendimento das relações sociais que se constroem hoje, é um campo em construção e
mostra-se limitado diante da sua importância social. Poucos são os estudiosos que se
dedicam a esse campo, como os envolvidos nos estudos de sociologia da infância, ou no
campo da psicologia.