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Tema 6 - Efeitos das mudanças climáticas em ecossistemas aquáticos

e terrestres.

Introdução
Desde aproximadamente metade do século passado a sociedade vem escutando sobre
as mudanças climáticas e seus efeitos prejudiciais sobre o planeta. Por ser um asunto
de primordial importancia mas bem complexo, é necessário primeiro discriminar os
conceitos relacionados com o termo “mudanças climáticas”. Para começar, o clima é
um padrão geral das condições meteorológicas, isto é, considera a média e a
variabilidade dessas condições para uma área ou região ao longo de meses ou até
miles ou milhões de anos. Para a Organização Meteorológica Mundial, o período
clássico para calcular a média dessas variáveis é de 30 anos. As mudanças no clima
são registradas quando a média e/ou variabilidade das suas propriedades (e.g.,
temperatura, precipitação, velocidade do vento, pressão, etc.) apresentam mudanças
persistentes por períodos longos, como por décadas ou mais. Históricamente, as
mudanças climáticas foram ocasionadas por processos naturais, mas há evidencias
fortes e substanciais de que os padrões observados na atualidade são provocados pelas
atividades humanas.
Tudo o que foi mencionado anteriormente é bem geral, no entanto, os detalhes
mais técnicos ainda precisam ser melhor explorados para atingir à população leiga.
Neste sentido, para entender o que impulsionam as mudanças climáticas é necessário
entender o básico do funcionamento da entrada e circulação de energia no planeta. O
sol é a fonte de energia disponível para conduzir o sistema climático da Terra. Parte
dessa radiação que entra na atmosfera é absorvido pelas nuvens, vapor d’água e gases
atmosféricos; parte chega à superfície terrestre e parte é refletido novamente para o
espaço pelos componentes da atmosfera. A radiação que chega à superfície terrestre é
em parte absorvido por ela, mas outra parte é refletida novamente para a atmosfera,
onde os gases presentes ali a capturam e a re-irradiam para todas as direções e de
volta para a superfície. Esse processo de captura e re-irradiação do calor é conhecido
como efeito estufa, e os gases atmosféricos que cumprem essa função são os gases do
efeito estufa (GEE). O efeito estufa aquece a Terra e permite o funcionamento da
vida. Sem esse efeito, a superfície da Terra seria congelada e nada de vida seria
possível ali. Portanto, o efeito estufa é um processo natural e muito importante para a
vida na Terra.
A crise climática atual é causada por um desequilíbrio no efeito estufa, que é
principalmente baseado no aumento da concentração dos GEE na atmosfera. Existem
vários gases de efeito estufa, mas são o dióxido de carbono (CO 2), o metano (CH4), o
óxido nitroso (N2O) e os clorofluorocarbonos (CFCs, 100% artificiais) os mais
eficientes absorvedores de radiação. O CO2 têm uma correlação direta com a
temperatura da Terra, portanto se aumenta a sua concentração, a Terra irá aquecer
cada vez mais já que mais gases retêm mais radiação, e esse processo se conhece
como aquecimento global. A partir da revolução industrial, ao redor do 1750, as
concentrações dos GEE foram aumentando de forma lineal. Assim, a principal fonte
de CO2 e outros gases na atualidade é a queima de combustíveis fósseis por meio de
processos industriais e transporte. Outra fonte bem importante é o manejo do uso da
terra na forma de agricultura intensiva e sobrepastoreio. É por isso que regular as
emissões de gases de efeito estufa para a atmosfera é prioridade para manter o
equilibrio climático e a supervivência da vida na Terra, e se torna um tema prioritário
nas conversas internacionais sobre o clima.
Aquecimento global e mudanças climáticas
Como dito anteriormente, o aumento da concentração de GEE permite maior retenção
e re-irradiação de calor na atmosfera, o que aquece a superfície terrestre. A medida
que a temperatura aumenta, a evaporação aumenta por consequência e disponibiliza
mais vapor d’água na atmosfera. Desta forma, muitas regiões do planeta já começam
a experimentar secas intensas e prolongadas que afetam a segurança alimentar das
populações e aumentam a ocorrência de incendios florestais e de campos. Por outro
lado, devido à circulação atmosférica global, o vapor d’água presente na atmosfera
pode precipitar em regiões diferentes do planeta, afetando os regimes de chuvas,
aumentando a intensidade e frequência das precipitações. Uma consequência bem
clara do aquecimento global é a perda de áreas polares por derretimento. O polo norte
perdeu cerca de 20% da sua área congelada desde a década do 70 do século passado.
Isto acarreta transtornos no comportamento do tempo na região, contribui ao aumento
do nivel do mar, à perda da fauna polar e à redução do albedo. O albedo é a fração de
radiação solar refletida pela superfície, isto é, a refletividade da superfície, e os polos
possuem valores maiores de albedo comparado com outras regiões do planeta.
Todas essas mudanças no clima podem afetar tanto ecossistemas terrestres
como aquáticos (marinhos e de água doce) e podem ter consequências devastadoras
para a biodiversidade dessas áreas. A seguir, se detalham os efeitos das mudanças
climáticas em ambos ecossistemas, mas é importante entender que tanto os
ecossistemas aquáticos como terrestres estão interconectados e são interdependentes,
pelo que o efeito em um ecossistema pode acarretar efeitos indiretos no outro
ecossistema.

Ecossistemas aquáticos
Oceanos

- Distribuição dos organismos: A medida que as águas dos oceanos aquece, os


organismos aumentam a sua área de distribuição em direção aos polos e áreas mais
profundas, buscando águas mais frescas. Isto pode acarretar aumento de competição
e/ou predação sobre os organismos locais. A distribuição destes também pode
diminuir, e inclusive, muitos deles podem se extinguir por falta de hábitats com
temperatura adequada.

- Incremento da estratificação térmica: O aquecimento da superfície do


oceano é mais rápida que o das águas mais profundas, e a mistura entre essas duas
camadas é mínima. Também, as águas frías são mais pesadas que as águas quentes, o
que profundiza ainda mais a estratificação térmica dos oceanos.

- Aumento do nível do mar: O aumento da temperatura aquece os oceanos e


expande a água, isto aumenta o nível do mar. Além do mais, o derretimento dos polos,
principalmente no Ártico, aumenta o volume de agua no mar e contribui para o
aumento do nível deste.

- Contaminação da água: O aumento das precipitações produz inundações nas


águas continentais que consequentemente recebem fluxos de sedimentos e substâncias
contaminantes chegados do solo circundante. Esses cursos d’água podem desaguar no
mar e contaminar as áreas costeiras, com consequências nas teias alimentares
marinhas.
Água doce

- Distribuição dos organismos: As mudanças nos níveis de água de


ecossistemas de água doce pode favorecer ou prejudicar a migração de organismos.
Quanto maior a quantidade de água, a interconexão dos corpos d’água melhora e
aumenta a migração para outros hábitats. Quanto menor a quantidade de água, os
corpos d’água ficam isolados e a migração é limitada. Isto acarreta risco de predação
e competição maior entre os organismos.

- Qualidade e quantidade de água: As mudanças no regime de precipitação


podem afetar de duas maneiras: Aumento na quantidade de água tanto nos lagos como
nos riachos e ríos, que acarreta inundações e arrastre de sedimentos e contaminantes
do solo. Isto pode afetar a supervivência dos organismos que dependem da entrada de
luz para a sua reprodução e por conseguinte, prejudicar os níveis tróficos superiores
por falta de recursos. Por outro lado, as secas prolongadas podem diminuir a
quantidade de água tanto em lagos como em riachos e ocasionar a desconexão deles,
aumentando o isolamento e reduzindo o intercâmbio de nutrientes. Também, as
mudanças no degelo afetam o fluxo e quantidade de água nos riachos, e pode afetar a
reprodução de várias espécies.

- Decomposição: Por serem turbulentos e relativamente rasos, as correntes


d’água trocam calor e gases fácilmente com a atmosfera, isto faz com que eles se
aqueçam mais rápido. A temperatura maior aumenta as taxas de decomposição de
detritos, assim há menos alimentos para os detritívoros. Isto afeta níveis tróficos
superiores ao diminuir a disponibilidade de recursos.

- Contaminação da água: Maiores inundações e temporais extremos causam


arrastre de sedimentos, contaminantes e detritos para os corpos d’água. Isto contamina
as águas afetando a respiração e reprodução dos organismos, além de diminuir a
entrada de luz, o que acarreta menor produtividade. Além do mais, a entrada
exagerada de nutrientes alóctones na água pode aumentar a reprodução de algas e
causar eutrofização.

Ecossistemas terrestres

O aumento das temperaturas nos ecossistemas terrestres permite uma extensão


do “verão” ou das estações mais quentes, além de aumentar a própria temperatura
dessas estações. Isto por conseguinte prolonga o período de crescimento de várias
espécies de plantas, ocasionando uma mudança na fenologia. O desencontro dos
ciclos de vida de plantas e seus herbívoros aumenta a mortalidade destes e logo, a
mortalidade dos consumidores superiores. Além do mais, a mudança na fenologia
também afeta o período de floração, acarretando um desencontro com polinizadores e
predadores de sementes, aumentando a mortalidade destes e afetando a reprodução
das plantas. A fenologia dos herbívoros também pode ser afetada ao adiantar ou adiar
seu período reprodutivo. Isto ocasiona um desencontro com os predadores fazendo
com que estes morram de fome e as presas não tenham controle top-down.
A mudança nas chuvas e temperatura pode gerar surtos de pragas, tanto para a
agricultura como para as zonas urbanas. Assim, surtos de baratas, ratos, pernilongos e
outros animais nocivos podem aumentar a transmissão de doenças nas zonas urbanas,
mas também em animais domésticos e selvagens. Isto causaria uma alta mortalidade
das espécies, incluídos os humanos.
Outro efeito importante é o aumento das secas prolongadas e as ondas de calor
que afetam a tolerância fisiológica das espécies. Muitas espécies não possuem
plasticidade fenotípica para se adaptarem às novas temperaturas ou condições
climáticas, e tendem à extinção. Por outro lado, as secas provocam a morte do dossel,
cujos galhos e folhas secas, incluso troncos mortos caem e contribuem ao stock de
material inflamável no solo. Desta forma, aumenta a intensidade e frequência dos
incêndios.
Outro efeito prejudicial das mudanças no clima é o desequilibrio no período de
torpor em certos mamíferos. Isto acarreta menor supervivência em inverno por falta
de alimento, assim como um aumento do metabolismo devido ao aumento das
temperaturas, o que novamente leva aos animais a morrer de inanição.

Muitos outros efeitos negativos das mudanças climáticas atuam sobre o


funcionamento dos ecossistemas e a supervivência das espécies. Muitos dos efeitos
citados neste texto, e outros, não precisamente são exclusivos de cada tipo de
ecossistema, mas podem atuar de forma interdependente entre o ecossistema aquático
e terrestre.
O prejuízo que as mudanças climáticas trazem para os ecossistemas naturais e
a própria vida humana é tão grande que é prioritário procurar soluções urgentes e
diplomáticas para reverter essa situação. Muitos autores falam do começo da sexta
extinção em massa, devido ás evidências diretas e indiretas que indicam às mudanças
climáticas como principais causantes da extinção de várias espécies. E é importante
não esquecer que a crise climática atual é efetivamente causado pelas atividades
humanas não sustentáveis.

Conclusão
Nesse texto foi visto que as mudanças climáticas atuais são causadas pelo
aquecimento global, decorrente do aumento de gases de efeito estufa na atmosfera
terrestre. Esse aumento é causado principalmente pelas atividades humanas como a
queima de combustíveis fósseis e o uso intensivo da terra. Mudanças climáticas como
o aumento da temperatura média, precipitações intensas e frequentes e secas
prolongadas afetam de forma importante ao funcionamento dos ecossistemas, à
supervivência das espécies e às interações entre elas.
Se torna cada vez mais urgente chegar a acordos internacionais sérios e firmes
na luta contra as mudanças climáticas, caso contrário, em pouco tempo o planeta
Terra chegara a um ponto de não retorno e muitas espécies irão se extinguir, quem
sabe se a espécie humana não esteja entre elas.
Tema 5 - Cascatas tróficas em ecossistemas aquáticos e terrestres

Introdução
A palavra “cascata” é sinônimo de “cachoeira”, “salto”, “catarata”. Se sabe que essas
palavras representam a queda de água desde certa altura por causa de um desnivel no
terreno, isto é, água que cai de cima para baixo. Na ecologia, vários autores
concordam que uma “cascata trófica” é o resultado das interações entre os níveis
tróficos de uma teia alimentar, onde uma modificação na abundância, ocorrência e/ou
comportamento do predador inicia reações em cadeia sobre os níveis tróficos
inferiores. Assim, efeitos indiretos na teia alimentar são evidenciados quando se
elimina um predador, consequentemente diminui a pressão de predação sobre as
presas, herbívoros aumentam, e logo, a vegetação é suprimida. É importante
considerar que este tipo de cascata é evidenciada apenas quando ocorre uma remoção
(ou outro tipo de impedimento) do predador. Quando o sistema é estático (quando não
há mudança no estado do predador), os efeitos indiretos mencionados não são
evidenciados.
As definições mencionadas acima estão corretas, no entanto, as cascatas
tróficas não estão limitadas a efeitos de cima para baixo (ou top-down, em inglês).
Outros ecólogos consideram que as cascatas tróficas funcionan por duas vias: a já
mencionada via top-down, e a via de baixo para cima, ou bottom-up. De forma geral,
a água de uma cascata não vá de baixo para cima e portanto o termo “cascata trófica”
não teria muito sentido de forma textual, mas os mecanismos que governam as duas
vias nas cascatas tróficas são similares, não atuam de forma isolada e portanto são
complementares. A via bottom-up acontece quando os níveis de recursos, que são a
base da teia alimentar, aumentam ou diminuem, acarretando mudanças na abundância,
ocorrência e/ou comportamento dos consumidores desses recursos, e
consequentemente afetando os níveis tróficos superiores. Assim, são evidenciados
efeitos indiretos dos recursos sobre os predadores.
Níveis tróficos intermediários como por exemplo consumidores primários e
secundários ficam no meio de um fluxo de efeitos bidirecional, isto é, são regulados
tanto pelos recursos que eles consomem como pelos seus predadores. Com relação
aos níveis tróficos básico e superior, pode até parecer que eles se encontram nos
extremos desse fluxo bidirecional de efeitos, no entanto, esses níveis também são
afetados dos dois sentidos: os produtores primários, além de sofrer herbivoria (via
top-down) são regulados pela disponibilidade de nutrientes no solo, espaço, entrada de
luz, etc. Os predadores de topo, além de ser regulados pela disponibilidade de presas
(via bottom-up), podem ser afetados na via top-down por parasitas, vírus, e inclusive a
caça por parte dos seres humanos.
Algumas evidências empíricas clássicas de cascatas tróficas são os trabalhos
de Estes e Duggins (1995), e Ripple e Beschta (2003). Na região de Alaska, Estes e
Duggins (1995) estudaram uma comunidade marinha composta principalmente por
lontras marinhas, ouriços herbívoros que são presa das lontras e macro-algas, que são
recursos dos ouriços. Eles observaram que na presença das lontras marinhas, o
ecossistema se caracteriza por ser uma floresta de macro-algas devido a que as lontras
controlam a abundância de ouriços. Por outro lado, quando as lontras marinhas estão
ausentes, os ouriços não têm controle top-down, aumentam excessivamente a sua
abundância e devastam as populações de algas. Desta forma, é evidenciado que a
remoção do predador leva a uma cascata forte nesse ecossistema marinho. Já Ripple e
Beschta (2003) estudaram o ecossistema do parque nacional do Yellowstone nos
Estados Unidos, onde naturalmente sempre houve lobos até o seu desaparecimento
por muitos anos. Ao redor dos anos 1995-1996, os lobos foram reintroduzidos nesse
ecossistema, e após cerca de 10 anos dessa reintrodução, os autores observaram que a
vegetação ripária aumentou em altura e abundância comparado com anos anteriores à
reintrodução. Eles indicaram que a presença dos lobos gerou uma forte pressão de
predação sobre ungulados herbívoros que se alimentavam (e suprimiam) a vegetação
ripária, e o controle desses herbívoros resultou na liberação da vegetação da pressão
de herbivoria. Com esses exemplos clássicos se demonstra o funcionamento das
cascatas tróficas tanto em ecossistemas aquáticos como terrestres.
Existem evidências que as cascatas tróficas em ecossistemas aquáticos podem
ser diferentes que as observadas em ecossistemas terrestres. Isto, em parte, pode ser
devido ao tempo das dinâmicas transitórias em ambos ecossistemas. Assim, em
ecossistemas terrestres é provável que os tempos de reposta dos organismos às
influências dos níveis tróficos adjacentes sejam mais longos que em muitos
ecossistemas aquáticos. Nestes últimos, os produtores basais (fitoplâncton) têm
tempos geracionais curtos e portanto podem responder muito rápido às mudanças em
herbivoria. Além do mais, históricamente os estudos de cascatas tróficas foram
desenvolvidos com maior frequência em ecossistemas aquáticos devido a vários
fatores: tempos geracionais curtos do fitoplânton, já mencionado; a natureza séssil de
muitos organismos, que faz com que sejam mais facilmente observados e
manipulados; os mecanismos de defesa das plantas terrestres, como espinhos, cutícula
grossa, compostos secundários, etc., que faz com que o herbívoro consuma apenas
parte da biomassa vegetal ou não a consuma; a maior probabilidade de generalistas
nos ecossistemas aquáticos, que faz com que toda a comunidade vegetal (algas) seja
consumida e não apenas um subconjunto, como nos ecossistemas terrestres; a maior
concavidade dos sistemas aquáticos, o que permite maior entrada de recursos
alóctones (pela simples gravidade) que subsidia a comunidade aquática; de entre
outros fatores.
Mais particularidades sobre os aspectos gerais das cascatas tróficas em
ecossistemas aquáticos e terrestres são detalhados abaixo:

Cascatas tróficas em ecossistemas aquáticos


Tanto em lagos, sistemas lóticos e oceanos podem ser evidenciadas cascatas tróficas
fortes. A magnitude das cascatas tróficas em ecossistemas aquáticos pode variar de
acordo com o comportamento animal, isto é, escolha de hábitat e migração de peixes e
zooplâncton. Por exemplo, o uso de refúgios por certos organismos diminui a
probabilidade de serem achados pelos predadores. Por outro lado, presas estariam sob
maior pressão de predaçao se peixes predadores migrassem para os habitats que elas
ocupam. As cascatas tróficas também podem ser intensificadas pela entrada de
nutrientes dos riachos para os lagos, e/ou dos recursos alóctones (i.e., detritos ou
organismos terrestres que entram nos corpos d’água pela ação da gravidade) e essa
entrada pode se manifestar em pulsos ou de forma continua. Assim, em períodos com
maior entrada de nutrientes, a produtividade primária pode aumentar e suportar
cadeias alimentares mais longas, mas também o excesso de nutrientes pode eutrofizar
lagos e prejudicar as interações entre níveis tróficos superiores. A entrada de recursos
alóctones geralmente subsidia predadores, por exemplo aumentando a abundância
deles, consequentemente tendo efeitos negativos nas presas. Dependendo da
magnitude dessa entrada, as cascatas tróficas podem ser mais intensas ou podem ser
estabilizadas.
Uma característica importante nos ecossistemas aquáticos é que o fitoplâncton
é muito eficiente na produção de biomassa por indivíduo. Assim, herbívoros
consomem toda a biomassa vegetal (não apenas uma parte, como os terrestres) e os
efeitos negativos sobre os produtores primários são mais fortes. O mesmo acontece
com os efeitos indiretos causados pelos predadores. Desta forma, as cascatas tróficas
são mais imediatas e evidentes comparadas com as terrestres.

Cascatas tróficas em ecossistemas terrestres


Plantas terrestres são menos eficientes na produção de biomassa comestível. Por quê:
elas destinam parte da produtividade primária à construção de troncos, galhos,
espinhos, compostos secundários, etc, que não são comestíveis pelos herbívoros.
Assim apenas uma parte dos indivíduos são prejudicados pela herbivoria e isso
acarreta efeitos negativos mais fracos no mesmo período de tempo comparados com
os ecossistemas aquáticos. Assim também, efeitos indiretos dos predadores sobre as
plantas existem, mas são evidenciados em periodos maiores.
A diversidade nos ecossistemas terrestres é um fator chave na hora de
considerar a magnitude das cascatas tróficas. Ecossistemas pouco diversos ou que
possuem apenas uma cadeia alimentar dominante, apresentam cascatas tróficas mais
evidentes que os ecossistemas super-diversos. Um exemplo clássico é o de espécies
chave, cunhado por Paine (1966). Uma espécie chave é um consumidor que governa
toda a cadeia alimentar abaixo dele. Quando a espécie chave é removida, inicia um
colapso da cadeia alimentar devido ao aumento de competição entre níveis tróficos
inferiores e a consequente perda de diversidade. Paine cunhou esse termo em estudos
em costões rochosos, mas alguns ecossistemas terrestres também são governados
pelas espécies chave. Um exemplo é o dos lobos no Parque Nacional de Yellowstone,
que já foi mencionado acima. Ecossistemas mais diversos, como florestas tropicais,
apresentam cascatas tróficas menos evidentes, já que o efeito da perda de uma espécie
pode ser amortecido por outras espécies que ocupam nichos similares.
Recursos alóctones que entram nos ecossistemas terrestres podem ter efeitos
importantes sobre as teias alimentares. Insetos aquáticos adultos são um dos principais
recursos alóctones que levam nutrientes aquáticos para os ecossistemas terrestres em
forma de presas de aranhas, aves, morcegos, lagartos, etc. Recursos aquáticos
apresentam mais P e N já que não precisam construir material estrutural forte, além do
mais apresentam ácidos graxos de melhor qualidade (omega 3). Tudo isso faz com
que certos predadores terrestres consumam mais recursos aquáticos, o que aumenta a
sua abundância e acarreta efeitos negativos sobre as presas terrestres, por meio da
competição aparente e/ou predação intraguilda.

Conclusão
Existem numerosas evidências de cascatas tróficas em ecossistemas aquáticos e
terrestres, tanto por via top-down como pela via bottom-up. Apesar de que os efeitos
indiretos são mais fortes e evidentes em ecossistemas aquáticos, ainda há lacunas no
estudo de cascatas tróficas nos ecossistemas terrestres. Com mais estudos,
principalmente em florestas tropicais e outros biomas terrestres, poderia ser possível
encontrar cascatas tróficas fortes nesses ecossistemas.
As definições, conceitos e evidências mencionadas foram bem gerais e
explicativas para fim deste texto. Contudo, é importante considerar que os
ecossistemas aquáticos e terrestres são abertos e estão interconectados pelo fluxo de
recursos, portanto as cascatas tróficas que acontecem dentro deles podem ser
influenciados por recursos externos, assim como também as proprias cascatas tróficas
podem acontecer nas fronteiras desses ecossistemas.
Tema 1 - Ciclagem de nutrientes em ecossistemas terrestres e
aquáticos

Introdução
Os nutrientes são uma parte importante no metabolismo dos organismos. Eles são
elementos requeridos para o crescimento, funcionamento e reprodução. Os nutrientes
do solo entram nos ecossistemas tipicamente pela absorção pelas plantas, mas também
há frações que entram nos sistemas vivos pela fixação de gases atmosféricos. A baixa
oferta de nutrientes para os organismos pode afetar a produtividade e o metabolismo,
mas também os organismos afetam a disponibilidade de nutrientes participando da
ciclagem destes.
A ciclagem de nutrientes é um processo que envolve a entrada de nutrientes
nos ecossistemas, o transporte interno nas teias alimentares e processos de
decomposição, e a saída de nutrientes para a atmosfera ou de volta para o solo. Assim,
a entrada de nutrientes pode ser por vía atmosférica, quando bactérias e outros
microorganismos fixam o N2 atmosférico e o transformam em formas utilizáveis para
as plantas. Nutrientes podem entrar também por meteorização de rochas, assim, os
nutrientes da rocha ficam disponíveis no solo para as plantas. Já dentro das teias
alimentares, os nutrientes passam das plantas para os herbívoros, mas também podem
voltar ao solo uma vez que a biomassa vegetal não consumida é morta e cai na forma
de detritos. Os herbívoros podem também entrar na vía de detritos ou podem ser
comidos por níveis tróficos superiores. Uma vez que os organismos morrem, os
micróbios decompositores atuam reciclando esses nutrientes e os devolvendo ao solo
e/ou atmosfera. A saída de nutrientes dos ecossistemas pode ser dar de forma direta
para a atmosfera através das atividades dos microorganismos, fogo e vento; ou via
lixiviação, quando os nutrientes reciclados na decomposição ou disponíveis no solo
são arrastrados por chuvas e erosão para outras regiões do solo ou para o sistema
hidrológico. Esses nutrientes que ficam fora das teias alimentares podem ser
absorvidos novamente pelas plantas e/ou microorganismos e voltam ao ciclo.
A ciclagem de nutrientes dentro e entre os ecossistemas virou um dos temas
primordiais na atualidade. O crescente aquecimento global é resultado principalmente
da emissão de gases de efeito estufa, e a ciclagem de nutrientes joga um papel
importante nessa emissão, principalmente o ciclo do nitrogênio. Antes da atual crise
climática os ciclos de nutrientes eram naturais e se limitavam à descrição mencionada
no parágrafo anterior. Atualmente as atividades humanas contribuem enormemente à
disponibilidade de nutrientes através do uso de fertilizantes, plantações de
leguminosas e mineração de rochas ricas em fósforo para fertilizante ou processos
industriais. Seres vivos precisam do nitrogênio e fósforo para desenvolver suas
funções, mas também são altamente dependentes de outros nutrientes que atuam no
crescimento e metabolismo, como por exemplo enxofre, cálcio, magnésio e potássio.
A seguir se explica resumidamente o ciclo dos principais e mais abundantes nutrientes
que participam de forma geral no funcionamento dos organismos e ecossistemas. No
entanto, há que ter em conta que os outros nutrientes também são indispensáveis para
o funcionamento dos ecossistemas.

Ciclo do nitrogênio
O nitrogênio entra nos ecossistemas através da deposição atmosférica (chuvas,
transporte pelo vento, raios) ou pela fixação biológica por microorganismos. A
disponibilidade de nitrogênio no solo pode ser aproveitado pelas plantas através do
mutualismo com bactérias fixadoras de N, por organismos subterrâneos que
consomem microorganismos de vida livre e pelos planctívoros, no caso dos
ecossistemas aquáticos. Os produtores primários incorporam o N nos seus tecidos e
este entra na teia alimentar. Os tecidos tanto de produtores primários como de
consumidores se decompõe e o N volta ao solo como nitrogênio particulado. Esse N é
liberado para a atmosfera pela volatilização, incêndios ou denitrificação por parte dos
microorganismos. Denitrificação é o processo de redução dos compostos nitrogenados
orgânicos em óxido nitroso (N2O) e nitrogênio atmosférico (N2), que são gases
liberados na atmosfera. A lixiviação também pode arrastrar o nitrogênio do solo para
outras partes da paisagem. Atividades humanas como fertilização e aração dos solos, e
processos industriais também participam no ciclo do N na atualidade.

Ciclo do fósforo
As principais fontes de fósforo são certas rochas e o sedimento marinho. As
rochas ricas em fósforo podem sofrer desagregações pela ação dos agentes
meteorológicos como chuva, vento, gelo, etc., processo que se conhece como
meteorização. O fósforo liberado se acumula na água do solo e pode chegar às
correntes d’água doce, ou pode ser absorvido pelas plantas e ciclar na comunidade
terrestre. Esse fósforo pode voltar à água do solo pela decomposição dos organismos e
chegar às correntes d’água. Aqui o fósforo pode ciclar dentro das comunidades
aquáticas e ser transportado até o oceano aberto, onde também é utilizado pelos
organismos marinhos. O fósforo do mar pode sedimentar nas profundezas e ficar
acumulado ali. Após milhões de anos, rochas são formadas no solo marinho e são
erguidas pela atividade geológica para se tornar solo seco. Novamente, essas rochas
ricas em fósforo podem sofrer meteorização e continuar com o ciclo.

Tanto o nitrogênio como o fósforo e outros nutrientes são ciclados


globalmente e passam por ecossistemas aquáticos e terrestres. Cada um desses
ecossistemas possuem propriedades diferentes e contribuem na ciclagem de nutrientes
através dos seus diferentes compartimentos.

Ecossistemas aquáticos
Nos oceanos, os nutrientes são disponibilizados pelas ressurgências de aguas
profundas ricas em nutrientes, o escoamento dos riachos e a fixação por certos
microorganismos. A estratificação térmica da superfície dos oceanos diminui o fluxo
de nutrientes para a superfície, mas com as ressurgências e a mistura das camadas
ocasionadas pelos ventos, os nutrientes ficam disponíveis para ser utilizados pelo
fitoplâncton. A pastagem e predação cicla os nutrientes na superfície e são devolvidos
para o fundo marinho pela sedimentação das fezes e excretas dos organismos.
Nos lagos, os nutrientes disponíveis na superfície são ativamente absorvidos
pelo fitoplâncton e geralmente não ficam livres na água. Lagos também possuem
estratificação térmica que minimiza o fornecimento de nutrientes das aguas
profundas, mas os eventos de mistura aumentam esse fornecimento. Os nutrientes
ciclam nas comunidades biológicas e são sedimentados para o leito, podendo ficar
presos nas argilas e lodo. Em lagos maiores a ciclagem de nutrientes é governado por
processos internos mais que por processos de entrada-saída, uma vez que quanto
maior o lago, maior a comunidade biológica, a demanda e a utilização de nutrientes.
Em riachos acontece um fluxo horizontal de nutrientes que são ciclados em
diferentes regiões do corpo d’água. Em riachos de primeira ordem a entrada de
nutrientes acontece principalmente por meio da entrada de detritos terrestres (folhas
de árvores ripárias, queda de artrópodes, penas, pelos, arrastre pela chuva, etc.) e isso
vai diminuindo a medida que o riacho aumenta a largura. Em riachos com menor
entrada terrestre ou de maior ordem, a fixação dos nutrientes é frequentemente
realizado por cianobactérias.

Ecossistemas terrestres
A entrada de nutrientes nos ecossistemas terrestres ocorre geralmente pela fixação por
bactérias ou fungos micorrízicos associados às raízes das plantas. Esses
microorganismos precisam de energía para fixar N e P, pelo que as plantas fornecem
os carboidratos necessários para o processo. Os nutrientes também podem entrar por
meio do arrastre pelas chuvas, a sedimentação das partículas da atmosfera, as
inundações de riachos e rios e a meteorização das rochas. Os nutrientes são ciclados
na comunidade terrestre através da teia alimentar. No entanto, os produtores primários
são mais pobres em nutrientes comparados com os herbívoros. Isto limita o
crescimento e a produção de biomassa, fazendo com que níveis tróficos sucesivos
formem menos biomassa. Quando organismos morrem, os nutrientes são devolvidos
ao solo pela decomposição e são reutilizados pelas plantas. Os nutrientes podem sair
do sistema interno por volatilização como subprodutos dos processos de nitrificação e
denitrificação no solo, por parte das bactérias. A lixiviação também leva os nutrientes
de um sistema para outras regiões, podendo ser regiões mais profundas do solo ou
regiões mais distantes, que acontece quando os nutrientes lixiviados chegam aos
corpos d’água e os transportam para outros sistemas. Os incendios também são outra
forma de liberar nutrientes de volta para a atmosfera. Os fogos com chamas ativas
misturam oxigênio e liberam óxidos de nitrogênio à atmosfera. Os fogos latentes,
como por exemplo de troncos grandes que ficam queimando de forma continua e sem
chamas, liberam nitrogênio reduzido.

Até aqui apenas foi vista a ciclagem de nutrientes na sua forma natural. No
entanto, está claro que atualmente as atividades humanas contribuem fortemente à
entrada de nutrientes nos ecossistemas. A queima de combustíveis fósseis libera gases
nocivos como por exemplo CO2 e óxido nitroso (N2O) para a atmosfera. Esses
nutrientes são fixados no ciclo pelos mecanismos já mencionados. Além do mais, o
uso de fertilizantes na agricultura aumenta a entrada de nitratos e fosfatos no solo e
consequentemente na água, uma vez que ocorre a lixiviação. Esse aumento de
nutrientes pode causar contaminação do solo e eutrofização dos corpos d’água, que
trazem consequências desastrosas para as teias alimentares desses habitats.

Conclusão
A ciclagem de nutrientes é um processo global onde participam todos os
compartimentos do planeta: atmosfera, hidrosfera, litosfera e biosfera. Os nutrientes
são essenciais para o funcionamento dos sistemas vivos, e ficam disponíveis para as
plantas por meio de processos e interações realizadas por microorganismos e animais.
Claramente a disponibilidade de nutrientes depende dessas interações assim como da
interação das comunidades biológicas com o seu meio abiótico. Atualmente a
ciclagem de nutrientes esta sendo afetada pelas atividades humanas não sustentáveis,
por isso é muito importante entender o funcionamento dela e os fatores que a
governam para idear soluções a curto prazo para a crise ambiental.
Tema 2 - Fluxo de energia e produtividade primária em ecossistemas
aquáticos e terrestres.

Introdução
O sol é a fonte de energía que governa os fluxos na Terra. Do total da energía que
entra na forma de radiação solar, cerca do 30% é devolvida para o espaço pela re-
irradiação das nuvens, partículas atmosféricas, e superfície terrestre, outros 23% da
radiação é absorvida pela atmosfera, especialmente pelo ozônio, nuvens e vapor
d’água, e o restante 47% chega à superfície terrestre e é absorvido ali. O espectro de
energia que entra no planeta esta composto por longitudes de onda da radiação
ultravioleta (8%), luz visível (39%) e infravermelho próximo (53%). É o espectro de
luz visível que é utilizado pelos sistemas vivos para a obtenção de energia.
A principal via de fixação da energia solar pelos seres vivos é a fotossíntese,
que é um processo realizado pelas plantas e outros organismos fotossintetizantes,
como as algas e algumas bactérias. Como as plantas e algas são os organismos
encarregados de absorver energia básica que ira fluir entre os seres vivos, elas são
chamadas de produtoras primárias ou organismos autotróficos. A energia do sol é
absorvida então pelas plantas e transformada em energia química, que é uma energia
capaz de ser assimilada pelos outros seres vivos. O total de energia que as plantas
produzem após o processo de fotossíntese, e que é a base do fluxo de energia nas
comunidades biológicas é conhecido como produtividade primária.

Fotossíntese
É o processo que transforma energia solar em energia química e acontece dentro das
plantas e algas. Possui duas fases:

Reações luminosas, que ocorrem dentro de umas organelas da célula vegetal


chamadas cloroplastos e possuem o pigmento verde clorofila. É esse
pigmento que captura a luz solar que é usada para decompor a água que
fornece elétrons. Esses elétrons reduzem dois compostos de alta energia, o
ATP e o NADPH. O produto de descarte desse conjunto de reações é o
oxigênio, que é liberado na atmosfera.

Reações de carboxilação/fixação do carbono, que ocorrem em um ciclo


chamado ciclo de Calvin, também nos cloroplastos. Nesta fase, moléculas de
CO2 são difundidas para dentro das células vegetais e entram no ciclo
reagindo com uma enzima específica. O ATP e NADPH transferem sua
energia para formar compostos de carbono ao longo do ciclo, resultando em
uma molécula de glicose (carboidrato) e agua.

Desta forma a fotossíntese gera moléculas de carboidratos armazenados nos


tecidos das plantas, a partir da energia solar capturada pela célula vegetal.

Os carboidratos produzidos servem para construir biomassa vegetal que por


sua vez serve de alimento para os consumidores. O total de energia produzida pelas
plantas se conhece como produtividade primária bruta (PPB). No entanto, as plantas
também gastam parte dessa energia no processo de respiração, pelo que uma
percentagem é perdida. À diferença de produtividade entre PPB e a energia perdida na
respiração se conhece como produtividade primária líquida (PPL), que é a energia
disponível para o uso dos consumidores.
Os consumidores são geralmente animais, fungos e certos microorganismos
que em conjunto são chamados de organismos heterotróficos. Organismos
heterotróficos são os que obtêm sua energia consumindo compostos orgânicos
produzidos pelos produtores primários. Correspondem aos herbívoros (consomem
matéria vegetal), detritívoros (consomem matéria orgânica morta), onívoros
(consomem mais de um nível trófico), carnívoros (consomem animais) e os
decompositores (consomem detritos e reciclam os nutrientes do sistema).

Fluxo de energia entre os níveis tróficos


O fluxo de energia apenas é a transferência da energia fixada pelos produtores
primários ao longo da teia alimentar. A energia que flui pelo sistema não é reciclada e
uma percentagem dela é perdida a medida que pasa de um nível trófico ao seguinte.
Isto é explicado pela segunda lei da termodinâmica, que afirma que durante qualquer
transferência de energia, alguma energia é dissipada como calor devido ao aumento
da desordem do sistema (entropia). A imagem a seguir pode representar claramente o
fluxo de energia no sistema:

Devido à diferente natureza dos principais produtores primários em ecossistemas


aquáticos (algas) e terrestres (plantas), pode existir diferenças características tanto na
produtividade primária como no fluxo de energia dentro desses ecossistemas, de
acordo com os processos e condições presentes.

Ecossistemas aquáticos
A disponibilidade de luz é um fator importante que define a produtividade primária
em certos ecossistemas aquáticos. A entrada de radiação solar está intimamente
relacionada com a temperatura da superfície da água, e é difícil separar esses dois
fatores. Contudo, na maioria dos ecossistemas aquáticos, tanto nos ambientes
marinhos como nos de água doce, o principal fator limitante da produtividade
primária é a disponibilidade de nutrientes. No oceano, os principais nutrientes
limitantes são nitrogênio e fósforo, já que participam na formação da clorofila.
Comparados com ecossistemas terrestres, os oceanos são muito improdutivos. Esses
ecossistemas apresentam altas taxas de produtividade apenas nas regiões de
ressurgência e não apresentam padrões latitudinais de produtividade.
Nos ecossistemas de agua doce, a produtividade esta limitada igualmente pela
entrada de luz e a disponibilidade de fósforo. Existe uma concentração ótima de
fósforo na qual o fitoplâncton pode crescer e produzir. Uma entrada excessiva de
fósforo nos sistemas aquáticos pode produzir um crescimento acelerado de
fitoplâncton e mudar a composição deste, processo conhecido como eutrofização.
O mecanismo da fotossíntese é similar em ecossistemas aquáticos e terrestres.
No entanto, as algas não investem parte da energia fixada na construção de tecido
estrutural, funcional ou de defesa, como é o caso dos troncos, raízes, flor, fruto,
compostos secundários, espinhos, cutícula grossa, etc. na vegetação terrestre. O tecido
da alga é consumido 100% pelos herbívoros, o que faz que eles sejam muito eficientes
na aquisição de energia e na formação de produtividade secundária (biomassa do
consumidor). Assim, os herbívoros aquáticos consomem uma proporção alta de
biomassa autotrófica, e nenhuma parte dessa biomassa consumida termina como
detritos. A biomassa de fitoplâncton que não é consumida entra sim na vía dos
detritos. Adicionalmente, a composição química do fitoplâncton é muito nutritiva e
atinge a demanda nutricional dos herbívoros, uma vez que sua razão C:N é próxima à
dos herbívoros.
A porção do fitoplâncton que entra na via dos detritos possui alta qualidade,
portanto os detritívoros e decompositores aquáticos consomem alimento de alto valor
nutricional e possuem uma alta taxa metabólica e de crescimento. Isto permite que
haja taxas mais rápidas de ciclagem de nutrientes e disponibilidade desses nutrientes
nos ecossistemas aquáticos.

Ecossistemas terrestres
A produtividade primária nos sistemas terrestres é maior em florestas úmidas tropicais
e decai à medida que aumenta as latitudes. A produtividade primária depende
diretamente da quantidade de radiação solar e da temperatura, e elas são maiores nos
trópicos. Por outro lado, florestas tropicais são das mais diversas do planeta, pelo que
possuem muitos grupos funcionais que capturam a energía de forma diferente
dependendo da via metabólica, aproveitando assim maior proporção de luz disponível.
No entanto, florestas são menos eficientes para produzir energia disponível para os
consumidores, comparado com comunidades herbáceas. Florestas tropicais têm maior
quantidade de troncos grandes, galhos, raízes maiores, e outras estruturas não
fotossintéticas que as ervas não possuem. Portanto a proporção de energia perdida por
respiração é quase a metade da produtividade primária bruta nas florestas.
Os herbívoros consomem uma proporção baixa de biomassa autotrófica,
justamente porque as plantas possuem estruturas pobres em nutrientes como cutícula
grossa, compostos secundários e partes lenhosas que são não comestíveis. Também, a
proporção C:N das plantas é diferente à dos herbívoros, pelo que elas não fornecem
precisamente um alimento de qualidade. Apenas uma parte da biomassa vegetal
consumida é usada para construção de nova biomassa heterotrófica. Entretanto, o
resto é usada para a respiração celular. Igualmente, a proporção de produtividade
primária não consumida é grande e se torna detritos. As folhas moribundas, antes de
cair, transferem os nutrientes para o resto da planta e vira detrito ainda mais pobre en
nutrientes que os tecidos vivos. Eles são consumidos pelos detritívoros. A
produtividade secundária resultante (biomassa nova formada a partir da assimilação
da produtividade primária) em herbívoros e detritívoros passa para os predadores que
assimilam eficientemente os nutrientes daqueles. Porém, os predadores ainda
precissam buscar as presas, encontrá-las, capturá-las e predá-las. Esse processo prévio
ao consumo da presa faz com que a proporção de energia do segundo nível trófico não
seja 100% transferida para o nível dos consumidores secundários. Além do mais,
parte da energia assimilada pelos predadores é perdida na respiração.

Conclussão
A produtividade primária é a base do funcionamento da vida na Terra. A partir da
energia solar, os produtores primários produzem energia química na forma de
carboidratos. Eles utilizam os carboidratos como uma forma de energia química para
criar biomassa, e parte dessa biomassa serve como alimento para os consumidores,
que adquirem parte dessa energia. Os consumidores por sua vez são comidos pelos
predadores, adquirindo uma proporção menor da energia da produtividade primária.
Nesse texto foi visto que a cada passo na teia alimentar, uma parte da energia vai se
perdendo na forma de calor, até chegar ao último nível onde a energia é dissipada
totalmente. É por isso que é extremamente importante o processo de captura e
transformação de energia pelos produtores primários.
Tema 3 - Padrões globais de produtividade primária: consequências
para o funcionamento de ecossistemas

Introdução
Produtores dos ecossistemas aquáticos e terrestres são os responsáveis da
produtividade primária do planeta. Tanto um como o outro possuem níveis altos de
produtividade primária. Certos biomas terrestres produzem mais biomassa que outros.
Já nos oceanos, a produtividade primária é bem baixa comparado com os continentes,
mas como a superfície do oceano é maior que o da terra, a produtividade primária
aquática total praticamente iguala os níveis dos ecossistemas terrestres. Contudo, a
produtividade nos oceanos não apresenta padrões latitudinais como os da terra. Ao
longo dos oceanos, o nível de produtividade é similar, exceptuando as áreas de
ressurgência e as areas costeiras, onde a produtividade é extremamente alta. Este texto
irá focar apenas nos ecossistemas terrestres e os padrões que apresentam enquanto sua
produtividade primária.
Básicamente, a energia necessária para iniciar o processo de fotossíntese por
parte das plantas vem do sol. Parte da energia solar, chamada luz visível, chega à
superfície terrestre em níveis diferenciados nas regiões do planeta. Assim, regiões
comprendidas entre os trópicos de Cáncer e Capricornio recebem muita mais radiação
solar por unidade de área comparadas com regiões de latitudes maiores. Isto se deve a
que o ângulo de incidência dos raios de sol é aproximadamente perpendicular nos
trópicos. Esse ângulo não é exatamente perpendicular devido ao eixo de rotação da
Terra, que é levemente inclinado e faz com que ele não coincida com os eixos de um
plano cartesiano imaginário no espaço. O ângulo de incidência dos raios de sol pode
ser melhor visualizado no esquema a seguir:

Desta forma, a mesma quantidade de radiação solar atinge áreas menores nos trópicos
e áreas maiores nas latitudes maiores. Assim, a temperatura é maior e relativamente
constante nas regiões tropicais. Nas regiões temperadas, a distribuição da mesma
quantidade de calor em áreas maiores faz com que a temperatura seja menor e mais
variável.
A rotação da Terra sobre seu eixo permite que a radiação solar atinja toda a
superfície terrestre em diferentes épocas do ano. Isso pode ser visto claramente ao
imaginar a Terra da figura acima rotando. Nas latitudes altas, a incidência solar varia
ao longo do ano, no entanto, nos trópicos, a incidência solar é praticamente a mesma
ao longo do ano, variando gradualmente a medida que as latitudes aumentam. Isto faz
com que os processos biológicos dependentes da temperatura e umidade funcionem
mais tempo durante o ano comparado com latitudes maiores.

Padrões de produtividade primária


A produtividade primária nos ecossistemas terrestres é limitada principalmente pela
temperatura e umidade, seguido da presença de solo e a disponibilidade de nutrientes.
A produtividade primária nos oceanos é principalmente limitada pela disponibilidade
de nutrientes, pelo que os padrões de radiação solar não afetam significativamente as
taxas fotossintéticas das algas. Nos trópicos, a estação úmida é geralmente
acompanhada de muita precipitação e temperaturas altas, o que é ideal para o
crescimento das plantas. No entanto, este tipo de condições é menos comum nas
zonas temperadas, onde o verão é geralmente quente, seco e curto. Na estação de
crescimento, as plantas realizam fotossíntese ativamente e a energia produzida é
incorporada nos tecidos para aumentar a biomassa. A estação de crescimento mais
longa nos trópicos faz com que a produtividade primária nestas regiões seja
extremamente alta comparado com outras regiões do planeta. Ao redor de um terço de
toda a produtividade primária terrestre é produzida nos trópicos. No entanto, é
importante saber que não todos os ecossistemas tropicais têm a mesma taxa de
produtividade. A produtividade pode variar de acordo com a quantidade de folhas
verdes, o seu tamanho, competição entre plantas, a interação com consumidores, etc.
Ao redor do 30% da produtividade primária líquida (PPL) da vegetação
terrestre é produzida nas florestas tropicais úmidas. Segue as florestas temperadas
(23%), as savannas tropicais (21%), pastagens temperadas (5%), a tundra (4%) e o
deserto (3%). Embora seja uma fonte artificial (manipulada pela humanidade), os
campos cultivados contribuem amplamente com a PPL nos ecossistemas terrestres,
atingindo cerca do 14% da PPL. Claramente existe um padrão latitudinal de PPL nos
ecossistemas terrestres, tendo valores altos nos trópicos, e diminuindo gradualmente
com a latitude.

Consequências dos padrões globais de produtividade primária para o


funcionamento dos ecossistemas
A biomassa vegetal produzida na fotossíntese pode ser consumida pelos herbívoros e
fluir nas teias alimentares, ou pode ser degradada diretamente como detritos. A via
detritivora também participa nas teias alimentares uma vez que predadores consomem
organismos detritívoros, principalmente artrópodes, fungos, e certos vertebrados. A
medida que a energia flui nos ecossistemas, ela vai diminuindo em cada nível trófico
pela respiração celular. Assim, dependendo da taxa de produtividade primária e a
eficiência dos consumidores, as cadeias alimentares podem ser longas ou terminar em
poucos níveis.
O padrão global da produtividade primária se observa na abundância, riqueza
e tipo de vegetação nos diferentes biomas. Como já explicado anteriormente, quanto
maior a temperatura e umidade (entre outros fatores), maior a produtividade. Vários
estudos mostraram a relação positiva entre produtividade primária e secundária (a
formação de biomassa dos consumidores derivado da PPL). Nos trópicos a
diversidade de espécies é maior comparado com outras regiões, fazendo com que os
ecossistemas sejam bem complexos e relativamente estáveis. Maior diversidade faz
com que várias espécies diferentes possam cumprir uma função similar nos
ecossistemas, como por exemplo, várias espécies de insetos são detritívoras e
fragmentam a matéria orgânica morta da mesma forma. A perda de uma dessas
espécies de detritívoros não iria afetar significativamente a decomposição dos
detritos, uma vez que as outras espécies ainda podem cumprir essa função. Desta
forma, uma maior diversidade traz maior redundância e resiliência ao sistema.
A fase negativa da alta diversidade de espécies é o aumento da competição
interespecífica. Várias espécies exploram os mesmos recursos e podem ser excluídos
ou limitados fortemente por competidores superiores. No entanto, uma solução para
essa exclusão é a diferenciação de nichos que permite a coexistência de espécies com
requerimentos similares. Nos trópicos, as espécies possuem nichos mais estreitos que
nos ecossistemas temperados, já que devem lidar com mais espécies.
As cascatas tróficas nos trópicos aparentam mais fracas que nas regiões
temperadas devido à redundância do sistema. Devido à disponibilidade de recursos
alternativos para predadores, as cascatas tróficas geralmente se manifestam em
cadeias alimentares lineares e não afetam toda a teia alimentar. Já nas regiões
temperadas, a perda de uma espécie pode acarretar efeitos drásticos no resto do
ecossistema, como é o exemplo clássico dos lobos no parque nacional de
Yellowstone, nos Estados Unidos. Os lobos cinzas, espécie chave desse hábitat, foram
reintroduzidos na década dos 90 no século passado, após anos de ausência devido à
caza indiscriminada. A reintrodução dos lobos aumentou significativamente o risco de
predação sobre ungulados o que causou uma diminuição na herbivoria e na
regeneração da vegetação em áreas devastadas. Em ecossistemas tropicais é raro
observar esse tipo de efeitos drásticos, mas isso não significa que não existam. Vários
autores indicam que nos trópicos as espécies chave são igual de importantes, mas que
a perda de uma pode ser atenuada pela presença de outra espécie chave.

Conclussão
Os padrões globais de produtividade primária são manifestados nos biomas terrestres,
uma vez que oceanos não possuem padrões latitudinais de produtividade. Maiores
níveis de produtividade primária líquida (PPL) são encontrados em florestas tropicais.
Isto se deve à maior radiação solar por unidade de área que afeta a temperatura e
umidade. Além do mais, a maior área e quantidade de folhas verdes e a ciclagem
rápida de nutrientes nas florestas faz com que elas sejam as principais produtoras de
biomassa, tanto nos trópicos como nas florestas temperadas. As savanas tropicais são
medianamente produtivas, uma vez que possuem menos superfície fotossintética e
menor umidade.
A PPL pode ter diversas consequências nos ecossistemas terrestres
dependendo dos biomas estudados. Quanto maior a PPL, maior a diversidade de
espécies, o que explica as florestas mega-diversas dos trópicos. É amplamente sabido
que a diversidade esta relacionada com o funcionamento dos ecossistemas. Mais
espécies significa maior estabilidade dos ecossistemas, fazendo com que certos níveis
de distúrbios afetem fracamente as comunidades.
Para finalizar, o entendimento do fluxo da produtividade primária líquida nas
comunidades se torna extremamente importante já que governa a estabilidade e o
funcionamento dos ecossistemas terrestres.
Tema 4 - Recuperação de ecossistemas aquáticos e terrestres
continentais

Introdução
A forma como as atividades humanas são desenvolvidas no mundo todo traz
consequências negativas para o meio ambiente. A sociedade humana ocupa
praticamente todos os espaços do planeta, explorando-os de forma intensiva a medida
que a sua população cresce. Desde o final da última era glacial, o ser humano vem
deixando a sua pegada exploradora nos ecossistemas. A caça indiscriminada (e
consequente extinção) da mega-fauna, o uso do fogo para manipular a vegetação em
grande escala, a exploração de peixes e mariscos, o desmatamento, a irrigação
extensiva, e a drenagem vêm sendo praticados já desde os inícios das sociedades
humanas. Além do mais, seleções artificiais de variedades de plantas e animais e
domesticação são praticados há séculos. Tendo em conta todas essas atividades, não é
imprudente sugerir que uma extremamente alta proporção do meio natural tem sido
modificada apenas por uma espécie: a humana.
Já faz décadas dos primeiros relatórios sobre a mudança que esta sendo
observada no sistema climático global. A pesar de que as mudanças climáticas no
tempo geológico foram causadas por eventos naturais (sem intervenção da
humanidade), há evidências robustas que indicam que a crise climática atual é
provocada pelas atividades humanas, principalmente pela emissão excessiva de gases
de efeito estufa. A queima de combustíveis fósseis, incendios florestais para o manejo
dos campos de cultivo, desmatamento, criação intensiva de gado, e fertilização do
solo para cultivo intensivo são as principais fontes antropogênicas desses gases. Tudo
isso traz a destruição de ecossistemas aquáticos e terrestres, junto com a eliminação
da sua biodiversidade.
Numerosos projetos foram desenvolvidos e estão sendo desenvolvidos
atualmente para recuperar alguns ecossistemas que sofreram distúrbios em diferentes
escalas e magnitudes. O processo desenvolvido pelas pessoas para ajudar na
recuperação desses ecossistemas se conhece como restauração. A restauração de
ecossistemas busca recuperar ecossistemas destruidos utilizando diferentes
abordagens, principalmente baseadas em estudios ecológicos e evidências científicas
pontuais para cada área a ser restaurada. No entanto, as condições prístinas foco dos
projetos podem ser ilusórias dependendo dos objetivos do projeto, uma vez que é
difícil saber o estado original do ecossistema antes da pegada humana. Os principais
objetivos de muitos projetos de restauração são a recuperação da maior parte da
biodiversidade, o sequestro de carbono da atmosfera que contribui à mitigação do
aquecimento global, recuperação de interações ecológicas e serviços ecossistêmicos.
No entanto, estudos encontraram que os ecossistemas não são totalmente recuperados
de distúrbios de longa-escala. Mesmo assim, os esforços na restauração nunca são em
vão, já que pior do que estão não vão ser após terminada a restauração.

Abordagens principais na restauração de ecossistemas


Existem duas abordagens básicas:
a) Restauração ativa: É uma recuperação assistida, isto é, quando o processo de
recuperação recebe ajuda de técnicas estruturadas e sistemáticas que visam à
recuperação relativamente rápida do ecossistema. Por exemplo, se utilizam técnicas
de enriquecimento do solo, plantação de sementes e mudas de plantas nativas,
reintrodução de predadores de topo de cadeia, cultivo de plantas pioneiras na
sucessão, etc.
b) Restauração passiva: Se deixa ao ecossistema se recuperando sem nenhuma
assistência adicional. Para o funcionamento dessa abordagem é necessário que os
ecossistemas degradados possuam banco de sementes e propágulos no solo e/ou que
não fiquem isolados de ambientes fornecedores desses propágulos. Esse tipo de
abordagem é menos costoso mas pode demorar mais tempo em atingir as condições
esperadas.

É importante ter em conta que para que ambas abordagens funcionem, a fonte
causante do distúrbio debe ser eliminada ou pelo menos reduzida até o mínimo
possível.

A restauração depende muito do grau de degradação, do tipo de ecossistema,


os requerimentos das espécies e as interações chave para o seu funcionamento. Assim,
as técnicas de restauração que devem ser aplicadas irão variar de acordo com esses
fatores. Em ecossistemas aquáticos e terrestres o tipo de restauração que ira ser
aplicado irá variar enormemente, mas sempre há que ter em conta que ambos
ecossistemas são interligados e o funcionamento normal de um vai afetar o
funcionamento do outro.

Ecossistemas aquáticos
Em escala global, as principais pressões dos ecossistemas de agua doce são:
industrialização e crescimento populacional, mudanças climáticas, sobre-exploração
pesqueira, invasão de espécies exóticas, eutrofização e/ou poluição. Em escala local,
as principais pressões são: povoados e intensificação do uso da terra, mudanças no
regime do fluxo de água, uso da energia hidroelétrica, sedimentação fina e
colmatagem do leito, fragmentação e uso recreativo dos corpos d’água.
Os ecossistemas de água doce tendem a ser naturalmente fragmentados, mas
alguns possuem regiões de desembocadura entre corpos d’água, por exemplo entre
lagos e riachos, e conexões entre riachos. As espécies aquáticas são muito diversas,
muitas delas têm a capacidade de migrar longas distâncias, mas outras são sésseis ou
com limitada capacidade migratória. Corpos d’água fragmentados afetados pelas
atividades humanas, sofrem severas consequências na sua estrutura e funcionamento.
Os projetos focados na restauração desses corpos devem priorizar o estabelecimento
da conectividade. Por outro lado, a conectividade não deve ser estabelecida em
sistemas isolados de forma natural, sob o risco de homogeneização das comunidades e
perda de espécies inferiormente competitivas.
A restauração dos ecossistemas de água doce depende do tipo de ecossistema
(lêntico ou lótico), da localização (próximo à zonas urbanas e campos agrícolas ou
relativamente isolados destes centros) e da natureza do distúrbio. Porém, básicamente
inicia com a recuperação das condições físicas, por exemplo colocando substratos
para o crescimento do perifíton ou controle da erosão das margens para evitar entrada
de sedimentos finos. Seguidamente, é necessário o ajuste químico do solo e da água
nas condições prévias (ou desejáveis) ao distúrbio. Frequentemente são usadas
macrófitas que absorvem os contaminantes da água, e uma vez limpa esta, são
retiradas as macrófitas. E para terminar, se aplica a manipulação biológica, incluindo
as reintroduções de espécies de flora e fauna nativas ou a extirpação de espécies
invasoras através da sobre-pesca, introdução de predadores, etc.
Para que um projeto de restauração de corpos d’água tenha sucesso, é
estritamente necessário eliminar a fonte do distúrbio. É por isso que os objetivos
devem ser bem pensados, uma vez que distúrbios como a entrada de coliformes fecais
e contaminantes químicos dependem totalmente dos ecossistemas terrestres
adjacentes. Os projetos devem abranger os dois tipos de ecossistemas, ter objetivos
atingíveis e possuir uma equipe multidisciplinar.

Ecossistemas terrestres
Ecossistemas terrestres estão entre os mais degradados do planeta, principalmente
porque são as regiões onde as populações humanas estão estabelecidas. São
incontáveis as pressões que sofrem esses habitats, mas os mais intensos são o
desmatamento, agricultura intensiva e incêndios. A taxa de recuperação desses
ecossistemas é muito menor que os ecossistemas aquáticos, isto porque o grau de
destruição é quase total.
Como com qualquer outro ecossistema, para conseguir aplicar um projeto de
restauração nos ecossistemas terrestres deve-se eliminar o distúrbio que o provoca. O
projeto será melhor sucedido se são considerados sítios de referência intactos e sem
distúrbio, que são usados como modelo de ação e controle do que se julga como
sucesso. Florestas exploradas para madeira geralmente ficam sem todas as funções
ecossistêmicas que fornecem as árvores maduras, mas os projetos de restauração
podem ter maior sucesso nestes ambientes. Por outro lado, o desmatamento total,
seguido de incêndio geralmente é feito para estabelecer campos agrícolas, portanto a
perda de funções é praticamente total. Em campos, o distúrbio tem objetivo de
estabelecer plantações e/ou criação de gado em grande escala. Além do mais, muitos
campos aparentemente não degradados apresentam gramíneas e outras ervas com
crescimento livre, o que ocasiona incêndios frequentes uma vez que a biomassa seca
se acumula na área. Pelo geral, em periodos anteriores, esses campos costumavam ter
megafauna de herbívoros que controlavam o crescimento exagerado de grama.
Devido às atividades das sociedades de caçadores-recoletores desses periodos, a
megafauna foi extinta e o controle top-down foi eliminado. Esse exemplo ilustra como
a restauração total de ecossistemas pode não ser possível, e os projetos devem ter
objetivos focados apenas na recuperação de parte das funções e serviços
ecossistêmicos perdidos.
Algumas técnicas que usam os projetos de restauração em ecossistemas
terrestres são:

Sistemas agroflorestais: que renovam o solo e servem para suprir alimento às


comunidades tradicionais. São de pequena escala e desempenham um papel
importante na segurança alimentar das populações.

Plantio de mudas e sementes: necessárias na recuperação de áreas muito


degradadas pelo uso intensivo da agropecuária, mineração e projetos de
infraestrutura.

Regeneração natural: geralmente usada pelo baixo custo e pela utilidade a


grande escala. Para que a restauração seja bem-sucedida, o solo deve conter
banco de sementes ou ficar próximo de fontes de propágulos.

Semeadura direta: as sementes são colocadas diretamente no solo que deve


ser recuperado, sem preparação prévia. Se usa principalmente para árvores,
arbustos e gramíneas que devem ser plantadas em altas densidades.
A vantagem da recuperação de florestas é que uma proporção alta de carbono
pode ser sequestrado da atmosfera a medida que as plantas crescem. Além do mais, as
raíces das plantas contribuem para diminuir a erosão do solo e conservar os cursos
hídricos.

Conclusão
Foi visto que a exploração dos ecossistemas pelo ser humano iniciou já no
final da última era glacial. Espécies da megafauna foram extintos, florestas foram
exploradas para madeira e campos foram manipulados para agricultura. Com o passar
do tempo esse uso foi só aumentando e as técnicas de exploração foram melhoradas
cada vez mais, até chegar a pontos onde as funções e serviços dos ecosistemas
naturais serem totalmente eliminados. A restauração desses ecossistemas é desafiador,
uma vez que atingir condições pré-distúrbio se torna difícil. No entanto ainda há
capacidade de recuperar parte das funções, serviços e diversidade geral dos
ecossistemas degradados, se os projetos têm objetivos atingíveis e são bem
executados.
Distúrbios em ecossistemas aquáticos e terrestres levam a resultados
diferentes, por essas áreas terem condições físicas e requerimentos biológicos
diferentes. Portanto é importante primeiro entender como o ecossistema foco
funciona, qual é a fonte do distúrbio, eliminar a fonte e desenhar um projeto
adequado. Ambos tipos de ecossistemas possuem técnicas diferentes de restauração,
mas sempre é importante ter em conta que ecossistemas aquáticos e terrestres são
interdependentes e o distúrbio que ocorre em um deles pode afetar significativamente
o outro.
Tema 7 - Dinâmicas espaciais em metaecossistemas

Introdução
Metaecossistema é um conjunto de ecossistemas conectados por fluxo espacial de
energia, materiais e organismos através das fronteiras dos ecossistemas. Esse fluxo
pode ser de componentes abióticos, por exemplo o arrastre de nutrientes inorgânicos e
elementos químicos por lixiviação, cursos d’água e absorção do solo; ou de
componentes bióticos, como migração de consumidores ou presas, dispersão de
sementes e transporte de biomassa vegetal.
As dinâmicas espaciais entre os ecossistemas não são um conceito novo. Já na
teoria de metapopulações foi descrita a conexão de populações espaciais discretas
pelo movimento de indivíduos. Da mesma forma, a teoria de metacomunidades prediz
a assembleia de espécies a partir de uma serie de processos competitivos locais por
meio do filtro ecológico, dispersão de espécies e interações tróficas que podem levar a
padrões espaciais de diversidade. Por último, a ecologia de paisagem analisa a
estrutura de paisagens heterogéneas como as posições relativas de machas habitáveis
em uma matriz inabitável. As análises na teoria de paisagem são geralmente
descritivas.
Todos esses conceitos já conhecidos e estudados são extremamente
importantes na hora de entender o funcionamento das dinâmicas espaciais entre
subconjuntos na biosfera. No entanto, focam apenas no interesse pontual de cada tipo
de grupo foco, seja populações, comunidades ou conjunto de hábitats no espaço. A
teoria de metaecossistemas integra todos esses conceitos e abrange todos os tipos de
fluxos espaciais entre sistemas. Por exemplo, a entrada de um recurso alóctone em um
riacho, podendo ser folhas das árvores circundantes, incrementa a produtividade
aquática e sustenta as teias alimentares desses riachos. Porém, o foco desse análise foi
apenas o ecossistema aquático, que foi o receptor do recurso. Na teoria de
metaecossistemas são considerados tanto os fluxos em uma direção, que contribui
com o ecossistema receptor, e os fluxos na direção contrária, referente ao ecossistema
doador que perdeu esse recurso e pode experimentar consequências.

Dinâmicas espaciais: Consequências do fluxo de recursos nos ecossistemas


O funcionamento dos ecossistemas locais é governado por fatores como, por exemplo,
a disponibilidade de nutrientes e energia. Os recursos que sustentam as teias
alimentares possuem energia armazenada nos carboidratos, seja produzido pelas
plantas ou assimilado por heterótrofos. Os recursos também têm nutrientes essenciais
adquiridos diretamente do solo ou assimilados, que passam pelos diferentes níveis da
teia alimentar. Esses recursos sustentam o requerimento básico de todo ser vivo, que é
se alimentar. Desta forma os organismos podem desenvolver suas atividades e
contribuir com o funcionamento ecossistêmico, por exemplo liberando oxigênio,
decompondo detritos e controlando as comunidade de presas e predadores. As
interações entre organismos e a disponibilidade de recursos podem gerar limitações
nos ecossistemas locais, por exemplo, mantendo uma abundância baixa de um grupo
de predadores. Com essas limitações o ecossistema local funciona.
Além dos recursos autóctones, grande proporção dos recursos de um
ecossistema vem de ecossistemas adjacentes ou relativamente não conectados, e esses
recursos na forma de compostos inorgânicos ou organismos subsidiam ás
comunidades receptoras. A entrada dos recursos alóctones pode ser de forma passiva,
trazida pelo vento ou gravidade, ou de forma ativa, através de vetores e migração.
Sendo assim, as limitações dos ecossistemas receptores podem desaparecer ou
diminuir fortemente, fazendo com que as interações locais mudem e se criem novas
vias de fluxo de energia e nutrientes. Essas mudanças podem fortalecer também a
estabilidade dos ecossistemas receptores. Quando as limitações dos ecossistemas são
atendidas pelo fluxo alóctone, os ecossistemas locais não podem ser mais governados
pelas interações locais e se tornam dependentes de ecossistemas externos.

Dinâmicas espaciais: influência do fluxo de recursos em hábitats não ocupados


Tudo o que foi descrito neste texto explica parcialmente as dinâmicas dos
metaecossistemas no espaço. Porém, o fluxo de recursos é bem mais complexo, e não
apenas atinge ecossistemas bem formados e com comunidades funcionais. O fluxo no
nível de metaecossistemas pode ser descrito como a saída de recursos (organismos,
energia ou nutrientes) de um ecossistema doador, o transporte dos recursos em escalas
espaciais pasando por vários terrenos, e a chegada deles ou parte deles no ecossistema
receptor. Assim, no apartado anterior apenas foi descrita a influência desse elemento
no ecossistema receptor.
Embora os ecossistemas possam ser relativamente estáveis e governados por
processos locais em conjunto com recursos alóctones, eles não sempre são o alvo
desses recursos. Os recursos alóctones que chegam em um ecossistema tiveram que
ter saído de outro, e esse outro perdeu o benefício de explorar esse recurso de forma
local. Por exemplo, detritos terrestres que caem por ação da gravidade em corpos
d’água possuem nutrientes que poderiam ser aproveitados na terra por detritívoros, e
circular pela teia alimentar terrestre. Da mesma forma, insetos que caem na água de
forma acidental e subsidiam peixes, poderiam ter servido de presas nutritivas para os
predadores terrestres como aranhas, aves, morcegos e lagartos. Assim, o fluxo de
recursos sempre possui duas pontas, a do doador e a do receptor, porém, esse fluxo é
recíproco e a saída de um recurso no ecossistema doador não afeta a entrada de
recursos nele.
Uma vez que um recurso sai de um ecossistema, ele viaja ao longo do
metaecossistema até chegar no local onde sera aproveitado. Durante o percurso
existem hábitats que não cumprem os requerimentos para o estabelecimento de
comunidades biológicas, ou as comunidades neles são bem pobres. A migração de
organismos tem por objetivo justamente encontrar habitats adequados para se
estabelecer, já que dependendo dos requerimentos, os organismos não podem apenas
ficar em um hábitat qualquer. É neste caso que o fluxo de recursos joga um papel
fundamental na adequação dos hábitats. Recursos que por azar ou acidente chegam a
hábitats não ocupados, podem se decompor, liberar nutrientes, e preparar o terreno
para a colonização gradual de organismos pioneiros. Com o passo do tempo os
hábitats colonizados podem ser enriquecidos e habitados por mais organismos de
níveis superiores, que começam a interagir e formar a identidade do novo
ecossistema.

Conclusão
O conceito de metaecossistemas integra conhecimentos baseados nas teorias de
metapopulações, metacomunidades e ecologia de paisagem fornecendo uma
ferramenta para entender as limitações e as propriedades emergentes que surgem do
acoplamento espacial de ecossistemas locais. O principio desse conceito é o fluxo
espacial que conecta todos os ecossistemas independientemente das suas
propriedades. Assim, os ecossistemas não precisam ser similares nem adequados para
receber os recursos.
Estudos empíricos são necessários para entender como os modelos de
metaecossistemas se aplicam nos diferentes ecossistemas conectados da Terra.
Tema 8 - Serviços ecossistêmicos: integrando ecossistemas, funções
ecossistêmicas e serviços ambientais

Introdução
Desde a origem da espécie humana, os seres humanos tem explorado a natureza de
acordo com as suas necessidades. Assim, caçadores-recoletores procuravam suas
presas para alimentação, e aproveitavam as peles para vestimenta e os ossos para
armas. Frutos, raízes e outras partes comestíveis das plantas eram utilizados também
como alimentos e fibras. Com o tempo, a estabilização das sociedades humanas
permitiu a manipulação do solo para plantar o alimento. Em épocas mais modernas, o
crescimento da agricultura para alimentação e vestimenta, a queima de carvão e
outros combustíveis naturais para aquecer os lares e para o transporte, a manipulação
de grandes corpos d’água para gerar energia e fornecer água potável, e outros usos da
natureza vêm sendo cada vez mais importantes no funcionamento das sociedades e no
aumento do conforto. Atualmente é bem sabido que o uso descontrolado de recursos
naturais esta causando crises ambientais fortes que ameaçam a sobrevivência da nossa
e de outras espécies. Portanto, estrategias políticas e educacionais em grande escala se
tornam de extrema importancia para mitigar essa ameaça.
Uma das muitas formas de sensibilizar sobre a importancia do uso sustentável
dos recursos naturais é o conceito de serviços ecossistêmicos. Serviços ecossistêmicos
são as utilidades que o ser humano obtém da natureza, derivadas direta ou
indiretamente do funcionamento dos ecossistemas. Muitos autores definem serviços
ecossistêmicos como os benefícios que fornece a natureza, no entanto, existe a
tendência de utilizar o conceito como algo mais abrangente, incluindo também as
contribuições negativas da natureza, como por exemplo, doenças. As utilidades
derivadas de forma indireta do funcionamento dos ecossistemas são o que alguns
autores chamam de serviços ambientais. Serviços ambientais nada mais são do que os
benefícios ambientais resultantes das intervenções da sociedade na dinâmica dos
ecossistemas. Assim, esses serviços abrangem tudo o que tenha a ver com
conservação, como o manejo sustentável do solo que fornece um solo natural para
plantações agroecológicas, manejo da água, restauração florestal, dentre outros.

Classificação dos serviços ecossistêmicos


A Avaliação Ecossistêmica do Milênio do ano 2005 propôs uma classificação dos
serviços ecossistêmicos como segue:

Serviços de provisão: são os que fornecem produtos obtidos diretamente dos


ecossistemas naturais ou seminaturais (agroecossistemas), como por exemplo
alimentos e fibras, água, madeira, bioquímicos, medicinas, recursos genéticos,
ornamentos, etc.

Serviços de regulação: se relacionam com os aspectos funcionais e estruturais


dos ecossistemas que modificam as condições ambientais e sustentam a geração
de benefícios. Manutenção da qualidade do ar, da água, regulação climática,
controle da erosão, regulação de pragas, polinização e mitigação de danos
naturais são alguns exemplos.
Serviços culturais: emergem da interação intima da sociedade com o meio
ambiente, como por exemplo ecoturismo e recreação, valores religiosos e
espirituais, geração de conhecimento, valores educacionais, estéticos e
inspiracionais, etc.

Serviços de suporte: são nos que se baseiam os demais serviços ecossistêmicos,


como por exemplo a produção de O2, formação do solo, ciclagem de nutrientes
e da água, produtividade primária, oferta de hábitat, etc.

A integração desses tipos de serviços pode se descrever no exemplo simples a seguir:


a ciclagem de nutrientes (suporte) fornece os nutrientes que as plantas precisam para o
crescimento e funções como fotossíntese (regulação). Pela fotossíntese as plantas
produzem biomassa usada na formação de tecidos estruturais e de armazenamento,
como por exemplo tubérculos e frutos. Esses produtos são utilizados pelos
heterótrofos como alimento (provisão).

A importancia do bom funcionamento dos ecossistemas


Os ecossistemas representam o nível da hierarquía ecológica onde processos como
ciclagem de nutrientes, carbono, agua, e a produtividade ocorrem e podem ser
medidos. Esses processos determinam o funcionamento do sistema biológico e são a
base dos serviços ecossistêmicos. Por outro lado, a interação entre organismos define
os processos ecossistêmicos. Assim, herbívoros consomem plantas e levam os
nutrientes e a energia do nível básico para níveis superiores. Tanto os proprios
herbívoros como os predadores produzem fezes e urina que terminam no solo,
fertilizando-o. Também, quando esses heterótrofos não são comidos, seus restos
mortais ficam se decompondo no solo e os nutrientes são liberados e disponibilizados
para as plantas. E assim o ciclo continua. Devido a que os processos estão ligados
com as interações dos organismos, os serviços ecossistêmicos também estão ligados.
O esquema a seguir detalha claramente a relação los distintos níveis dentro dos
ecossistemas, os processos que acontecem ali e a sua relação com o ambiente
abiótico.
Em ecossistemas com alta diversidade de espécies, é esperado que os serviços
ecossistêmicos sejam mais robustos, uma vez que várias espécies podem ser
agrupadas em grupos funcionais similares. Assim, há menor probabilidade de perder o
grupo funcional todo, mas sim apenas umas poucas espécies dentro deles. As espécies
restantes irão suprir a oferta do serviço ecossistêmico determinado.

Valoração dos serviços ecossistêmicos


Como é bem sabido, os ecossistemas estão sendo degradados a uma
velocidade mais alta do que são capazes de se recuperar. Com a degradação dos
ecossistemas vem a eliminação dos serviços ecossistêmicos, o que acarretaria um caos
global se não se tomam medidas urgentes de mitigação da destruição. Discussões e
acordos internacionais em prol da proteção da natureza vêm sendo discutidos já faz
décadas, mas está mais que demonstrado que a única linguagem que os grandes donos
de terra entendem é do dinheiro. Porém, os serviços ambientais obtidos da natureza,
como produção de alimento através da agricultura intensiva e a criação de gado, são
os que mantêm as populações humanas, e eles não podem ser subestimados. Essa
relação complexa entre exploração não sustentável da natureza e conservação dos
serviços ecossistêmicos requer de estratégias inteligentes para chegar a um meio
termo. Sendo assim, foi criado um sistema para traduzir os benefícios que a natureza
proporciona em valores económicos que seja compreensível para a maioria dos
tomadores de decisão.
O termo “capital natural” foi gerado para descrever a totalidade dos recursos
oferecidos pelo ecossistema que suportam o sistema econômico e que contribuem
direta e indiretamente para o bem-estar humano. A partir dessa definição pode se dar
um valor monetário aos serviços ecossistêmicos que contribuem na economia
humana. Assim, o valor monetário corresponde ao valor que seria gasto se esse
serviço ecossistêmico fosse eliminado, por exemplo, quanto que se deveria investir
para polinizar manual ou mecanicamente cada planta de uma plantação se as abelhas
fossem extintas. A valorização dos serviços ecossistêmicos tira o valor intrínseco dos
ecossistemas, que é o direito deles de existirem simplesmente pelo fato de formar
parte do planeta. No entanto, é uma estratégia muito útil na hora de estabelecer
políticas socioambientais dependentes desses serviços.
Mais recentemente, o termo “serviços ecossistêmicos” está sendo substituido
por “Contribuições da natureza para as pessoas”, que confere um sentido mais
integrado dos aspectos culturais e materiais e tira a visão mercantilista asociada com
os serviços ecossistêmicos.

Conclusão
O conceito de serviços ecossistêmicos é uma construção humana usada para entender
a importância do funcionamento dos ecossistemas e sua conservação. Eles estão
intimamente ligados e são resultado da interação entre os organismos, seu médio
abiótico e os processos subjacentes que funcionam em conjunto nos ecossistemas. A
ameaça atual aos ecossistemas implica uma ameaça igual de preocupante dos serviços
que a sociedade humana necessita para sobreviver. O uso sustentável dos recursos
naturais se ve afetada pela alta demanda populacional e os métodos intensivos de uso
da natureza. Portanto, idear estratégias inteligentes e consiliativas para mitigar a
destruição dos ecossistemas se torna válido. No entanto, atualmente a ideia de
serviços ecossistêmicos como utilidades mercantilistas vem sendo discutida, e o termo
“Contribuições da natureza para as pessoas” passou a ser um meio termo entre os
direitos intrínsecos da natureza e o uso por parte das sociedades humanas.
Tema 9 - Emissão de gases de efeito estufa em ecossistemas naturais e
alterados

Introdução
Os gases de efeito estufa são gases radioativamente ativos presentes naturalmente na
atmosfera. A importancia desses gases radica no seu papel fundamental no controle da
energia que entra e sai da atmosfera e que mantém a temperatura adequada para a
vida. O sol é a fonte de energia disponível que governa a Terra. Ele emite radiação
que entra na atmosfera na forma de luz visível, ultravioleta, e próximo ao
infravermelho. Parte da energia é re-irradiada de volta para o espaço por partículas
atmosféricas e nuvens, outra parte é absorvida pelos gases atmosféricos, e outra parte
chega à superfície terrestre que é aquecida. A superfície terrestre, por sua vez, re-
irradia parte do calor de volta para o espaço, mas no caminho uma parte é absorvida
pelos gases de efeito estufa. Esses gases re-irradiam o calor para todas as direções e
de volta para a superfície. Todo esse processo é conhecido como efeito estufa e é o
que governa o sistema climático terrestre mantendo uma temperatura que permite o
desenvolvimento da vida.
Os principais gases de efeito estufa presentes naturalmente na atmosfera são o
vapor d’água, o dióxido de carbono (CO 2), o metano (CH4) e o óxido nitroso (N2O).
Eles são emitidos por fontes naturais, como por exemplo, a respiração dos
organismos, a decomposição da matéria orgânica, erupções vulcânicas, excretas, e a
fermentação de compostos. Não obstante, os registros de longa data de gases da
atmosfera e das bolhas de ar presas no gelo glacial, têm mostrado que as emissões
aumentaram significativamente desde o início da revolução industrial (~1750).
Existem evidências robustas sobre a responsabilidade das atividades humanas nesse
aumento. A queima de combustíveis fósseis, como o petróleo e derivados, gás natural
e carvão, é a principal fonte antropogênica da emissão dos gases. Essa queima ocorre
principalmente pelo uso industrial e o transporte aéreo e urbano. A criação animal é
outra fonte importante de gases de efeito estufa. Existem bilhões de cabeças de gado
criados para alimentação, e cada indivíduo produz flatulências compostas
principalmente por CH4, excretas e urina ricas em nitrogênio. Além do mais, a
agricultura intensiva, seja para produzir alimento para o gado ou para as pessoas, é
outra fonte importante de gases, principalmente pela adição de fertilizantes
nitrogenados e o manejo do solo. Como se não bastasse, gases de origem
completamente artificial, chamados clorofluorocarbonos (CFCs), são fortes
contribuintes do efeito estufa e da quebra do ozônio estratosférico que protege a
superfície terrestre da radiação UV prejudicial.
A concentração de gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera apresenta uma
proporção muito baixa comparada com outros compostos. O nitrogênio (N2) e o
oxigênio (O2) são os gases atmosféricos mais abundantes, representando o 99% da
composição total da atmosfera. Juntos, o CO2, o CH4 e o N2O formam pouco mais do
0,04% da composição atmosférica. No entanto, são esses gases os que têm a função
de aquecer a atmosfera para manter o ambiente adequado para as funções vitais.
Logo, um aumento nos níveis dos GEE leva a um aumento da temperatura terrestre.
As emissões dos GEE podem variar grandemente entre ecossistemas
dependendo do tipo de manejo e nível de exploração. Assim, torna-se importante
entender a forma em que esses gases são liberados a partir de ecossistemas naturais
como de alterados, a fim de entender a contribuição diferencial resultante dos tipos de
exploração da natureza.

Emissão de GEE em ecossistemas naturais


Os ecossistemas naturais são ecossistemas relativamente intactos que mantêm seu
funcionamento e produção não perturbada por ação antropogênica. Desta forma, as
emissões de GEE nesses ecossistemas atingem números normais. Existem inúmeras
fontes naturais de gases de efeito estufa, mas talvez a mais conhecida é a produzida
pela atividade biológica.
Na base do funcionamento ecossistêmico, a fotossíntese realizada pelas
plantas permite a absorção do CO2 atmosférico para transformá-lo em carboidratos
para o crescimento das plantas. Complementarmente, elas precisam de nutrientes
como o nitrogênio para se desenvolver. Como as plantas não são capazes de fixar N
diretamente da atmosfera, muitas delas se associam com bactérias fixadoras de N. O
processo de fixação do N acarreta uma fase de denitrificação de compostos
nitrogenados cujo produto intermediário é o N2O. Além de usar nutrientes e energia
para seus tecidos estruturais, as plantas acumulam carboidratos em tecidos de
armazenamento. Esse carbono fixado entra na teia alimentar pelo consumo dos
herbívoros, e os subsequentes predadores destes. O carbono é utilizado como moeda
de energia para o crescimento e funcionalidade dos organismos, que desempenham
suas funções metabólicas com o gasto de energia. As plantas utilizam a energia por
elas fixadas para crescer e se desenvolver, e os resíduos do gasto energético é liberado
de volta como CO2 na atmosfera, pelo processo de respiração. Os organismos
heterotróficos também liberam CO2 pela respiração, mas as flatulências, excretas e
tecidos mortos que produzem também liberam CO2 e CH4 no processo de
decomposição. Desta forma, todos os seres vivos, desde produtores primários até
predadores e microorganismos, liberam gases na atmosfera como resultado do seu
metabolismo.
Diferentes ecossistemas, como florestas, campos, tundras e ecossistemas
aquáticos, liberam gases para a atmosfera dependendo das taxas de respiração. Assim,
os oceanos têm taxas muito menores de produtividade, e portanto a produção de CO 2
também será menor proporcionalmente. No entanto, se a água do oceano é mais
quente que o ar circundante, ela vai transferir calor à atmosfera e com ele transfere
CO2, virando uma fonte de GEE. As tundras podem apresentar vegetação em estações
quentes, como primavera ou verão. Quando as temperatura nessas regiões aumentam,
o permafrost é descongelado e libera CH4 na atmosfera devido à fermentação dos
compostos subterráneos. As florestas podem liberar mais ou menos GEE dependendo
da idade delas. Por exemplo, quando uma floresta esta em crescimento, ela absorve
CO2 a taxas maiores que a respiração e se torna sumidouro de carbono. Quando a
floresta é madura, a emissão de CO2 e outros gases depende do equilibrio dos seus
processos.
Com respeito às fontes físicas, a erupção de vulções contribui com as emissões
globais de CO2, CH4 e aerossóis. Fontes hidrotermais, fumarolas e gêiseres também
são ecossistemas relativamente simples mas não perturbados que emitem grandes
quantidades de GEE.
A emissão de GEE por ecossistemas naturais é refletida pelo funcionamento
normal destes, especialmente da ciclagem de nutrientes e energia que ocorrem em
escalas espaciais e contribuem ao equilíbrio dos processos biogeoquímicos.

Emissão de GEE em ecossistemas alterados


Pode-se considerar ecossistema alterado como qualquer ecossistema que foi
manipulado pelas atividades humanas. Campos agrícolas, terrenos para criação de
gado, florestas degradadas, e zonas urbanas são alguns exemplos.
A emissão de GEE por esses ecossistemas é a principal responsável pelo
aquecimento global que acarreta as mudanças climáticas observadas atualmente. Em
zonas urbanas, o principal gás emitido é o CO2, uma vez que é produto direto da
queima de combustíveis fósseis. Os combustíveis fósseis são produtos da
decomposição e fossilização de restos orgânicos com altas concentrações de carbono.
A exploração artificial extrai petróleo, gás natural e carvão que são usados nos meios
de transporte, cozinhas e industria. A demanda por produtos de primeira necessidade e
produtos de lazer aumenta cada vez mais entre as populações humanas e o uso desses
combustíveis é cada vez maior. A queima de combustíveis fósseis nas cidades
também libera altas proporções de CH4 e N2O. Por outro lado, os aterros (terrenos de
deposição de lixo) emitem altas concentrações de CH4 por meio da decomposição do
lixo de diversas fontes. O consumismo extremo gera uma quantidade muito alta de
lixo que fica acumulado e contribui grandemente à emissão de GEE. Por último, a
produção industrial de espuma, propulsores de aerossol, unidades de ar condicionado
e líquidos refrigerantes, todos usados em centros urbanos ou para veículos, emite
gases artificias chamados clorofluorocarbonos (CFCs), que atuam como GEE e
afetam a camada de ozônio.
Uma das preocupações ambientais fortes é a alta demanda de alimento, o que
leva ao uso cada vez maior de campos naturais ou florestas para o estabelecimento de
campos agrícolas e criação de gado. Assim, as florestas são desmatadas e os resíduos
orgânicos remanescentes são decompostos por microorganismos que liberam GEE
para a atmosfera. Quando há queimada que acompanha o desmatamento, além da
liberação de CO2, são liberados monóxido de carbono (CO), CH 4 e N2O. Se os troncos
derrubados são grandes, a queima é mais lenta e as brasas latentes liberam GEE por
muito mais tempo. A exploração madeireira também é uma fonte de GEE, mas o
efeito dela pode ser não tão intenso comparado com o desmatamento total para
agricultura ou pastoreio. Os madeireiros geralmente extraem árvores maturas, de
diâmetro maior, deixando as árvores menores. Se essas florestas exploradas são
queimadas seguidamente, a remoção de árvores maiores aumentará a eficiência da
queimada e a taxa de decomposição, uma vez que a vegetação restante representa uma
biomassa menor. Assim, os galhos de diâmetro pequeno queimam melhor e se
decompõem mais rapidamente do que os troncos grandes.
Uma vez liberado o terreno para plantío, a aração, a fertilização do solo e as
queimas sucessivas dos campos podem emitir grandes concentrações de GEE por
meio de vários mecanismos: (i) Fracionamento dos agregados do solo que protegem a
materia orgânica (MO) dos microorganismos, (ii) aumenta a aeração que estimula a
atividade microbiana, o que libera GEE por meio da decomposição de MO, (iii)
Incorporação de resíduos da cultura que facilita a atividade dos microorganismos, (iv)
a cobertura do solo é reduzida, aumenta a radiação solar e diminui a umidade do solo.
Além do mais, a adição de fertilizantes aumenta a fixação de N pelas bactérias que
liberam N2O, e também geram resíduos nitrogenados que são lixiviados para solos
profundos ou arrastrados até cursos d’água. Por outro lado, solos inundados são
usados para certos cultivos, principalmente o de arroz. A fermentação é um dos
principais processos bioquímicos responsável pela decomposição da matéria orgânica
de solos saturados de água, e entre os principais produtos do processo fermentativo
estão o N2, CH4 e o CO2.
Todas as emissões de GEE em ecossistemas alterados pelo ser humano são
responsáveis pelo aumento dos GEE na atmosfera e o consequente aquecimento
global. O último relatório sobre GEE da Organização Meteorológica Mundial (2022)
mostra que a concentração dos três principais GEE atingiram valores máximos no
2021. O CO2 aumentou 149% desde a era pré-industrial, indo de ~280 ppm até os
atuais 415,7 ppm. O CH4 aumento 262%, indo de ~760 ppm até 1908 ppm; e o N2O
aumentou 124%, indo de ~130 ppm até 334,5 ppm.

Conclusão
Embora o efeito estufa seja um processo natural que governa o sistema climático da
Terra, atualmente esta tendo consequências graves no funcionamento dos
ecossistemas. Os gases responsáveis por esse efeito se encontram em concentrações
extremamente altas na atmosfera devido às atividades humanas não sustentáveis,
como a queima de combustíveis fósseis, agricultura intensiva, criação de gado e
produção industrial. Em periodos prévios à revolução industrial, a emissão dos GEE
mantinham concentrações constantes e eram causados pelo funcionamento normal dos
ecossistemas. Apesar de que esses ecossistemas naturais ainda contribuem com a
emissão, a maior quantidade de GEE é emitida por ecossistemas alterados pelo ser
humano. Assim, a manipulação do solo, desmatamento, construção e expansão de
cidades e incêndios são apenas algumas das causas da degradação de ecossistemas e
da emissão excessiva de gases de efeito estufa.
É extremamente importante entender os mecanismos de liberação de GEE em
ecossistemas naturais e degradados para continuar com os estudos ambientais e
conseguir chegar o mais rápido possível a uma solução adequada para todos os atores
da sociedade humana.

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