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Cristino Wapichana

• É músico, compositor e escritor do povo


Wapichana. Natural de Roraima, mas mora
atualmente em São Paulo.
• Um dos representantes fundamentais na
organização dos eventos de escritores
indígenas e atuou como coordenador do
NEARIN até 2013, produtor do Encontro de
Escritores e Artistas Indígenas e membro do
Instituto UK’A (Casa dos Saberes Ancestrais)
• 2017 – Terceiro colocado no º Prêmio Jabuti
(categoria Livro infantil – A Boca da Noite)
• 2018 – Estrela de Prata do Prêmio Peter Pan
na Suécia (A Boca da Noite)
• “O que eu mais gosto de fazer é escrever.
Falar das ricas culturas indígenas e do
quanto são importantes desde a formação
do Brasil”.
Cátedra Digital – Qual o maior obstáculo da
literatura indígena alcançar maior circulação?

Cristino Wapichana – Primeiro, essa crise terrível que a gente está passando e
que parece que não vai acabar, já que vai aumentar depois da eleição. É difícil
entrar nesse mercado literário e permanecer nele, já que a distribuição não é
tão abrangente; os estados mais distantes dos grandes centros sofrem um
pouco com a dificuldade de receber e conhecer essa literatura. Então, entra o
papel importante dos autores desses estados, de escrita indígena, para divulgar
seu próprio trabalho, divulgar o trabalho dos outros. Não é fácil estar neste
mercado. Não é fácil ter uma divulgação. Com essas premiações, senti que
melhorou um pouco, mas ainda não está legal. Depois que o livro recebeu esses
prêmios, eu não assinei nenhum contrato. Tem alguns em andamento, em
conversa, mas não aconteceu ainda. Pode ser resultado da crise.
Ainda há uma resistência, principalmente nas universidades, de trabalhar a
literatura indígena, porque não consideram essa literatura, a escrita por
indígenas, como alto padrão, mas as premiações respondem isso.
• A Constituição Brasileira de 1988 oficializou a existência das línguas e das
escolas indígenas no Brasil e garantiu aos povos originários o direito a uma
educação que os assistisse.
• Professores indígenas produziram os materiais didáticos, estes começaram
a circular fora da escola e configurava-se a literatura indígena, através da qual
o indígena-sujeito expressa seus costumes, suas formas de pensar e enxergar
o mundo e a realidade.

A literatura de • A tradição oral destes povos recebeu um aliado: a literatura. Poetas,


escritores e escritoras indígenas estão valendo-se do idioma do colonizador
autoria indígena para criar obras de grande valor que registram histórias ancestrais, criam
novos enredos sob a influência da contação tradicional e levam a luta até o
fronte da palavra escrita, onde o lirismo e a técnica se encontram.
• Para Cristino Wapichana, literatura indígena vai além do simples fato de
ser escrita por indígenas. “Há algo que a diferencia, que é a identidade, ela
tem uma espiritualidade bem definida em qualquer historinha ou texto
tradicional, e trata-se de uma espiritualidade e visão de mundo específica de
cada povo”.
• Temas comuns às narrativas indígenas: a imagem da aldeia
englobando as palavras território, nação, povo, tradição,
comunidade. “Contar o dia-a-dia na aldeia é, para os escritores
indígenas, uma forma básica de se estabelecerem no espaço do
livro”.

• O direito à terra e à autonomia.

• Visão de mundo integradora da realidade, na qual cada indivíduo é


considerado a partir de sua relação com seus semelhantes diretos e
com tudo o que constitui o mundo que o rodeia; o indivíduo só
existe a partir da coletividade. Dessa forma, a relação do homem
com a terra, com a natureza e os seres vegetais e animais é bastante
intensificada.
Literatura Indígena x Literatura
Indigenista x Literatura Indianista
• Literatura Indianista: Corrente literária que idealiza o indígena como o "bom
selvagem", como herói nacional, dócil e aliado à colonização. Mais marcado no
período Romântico da literatura brasileira, no século XIX. Por exemplo, as obras
de José de Alencar: "Iracema", "O Guarani" e "Ubirajara".
• Literatura Indigenista: Fala sobre indígenas e temas relacionados, mas é escrita
por não-indígenas. Pode vir de aliados ou pode vir do campo oposto;
frequentemente possui um olhar ocidental ou ocidentalizado dos universos
indígenas.
• Literatura Indígena: São as literaturas produzidas por Indígenas, literaturas no
plural, porque as produções são muito diversas, tanto na forma quanto no
conteúdo. Os temas das Literaturas Indígenas não precisam ficar restritos às
questões Indígenas e podem abordar qualquer tema: desde questões Indígenas de
cultura, identidade, histórias fundadoras ou sobre quaisquer outros temas não-
indígenas. O que marca as literaturas indígenas é a autoria indígena.
“Mesmo os dicionários têm alguma dificuldade
em definir com precisão o que seria o termo índio.
Quando muito, dizem que é como foram
chamados os primeiros habitantes do Brasil. Isso,
no entanto, não é uma definição, é um apelido, e
apelido que se dá para quem parece ser diferente
de nós [...]. Por este caminho, veremos que não há
conceitos relativos ao termo, apenas preconceito:
Desconstruções selvagem, atrasado, preguiçoso, canibal, estorvo,
bugre são alguns deles. Por outro lado, o termo
indígena significa “original do lugar”, “nativo”.
“Pode-se notar, assim, que é muito mais
interessante reportar-se a alguém que vem de um
povo ancestral pelo termo indígena do que índio.”
Daniel Munduruku.
“Tribo, em geral, descreve povos que, sob o olhar
contemporâneo e ocidental, ficaram no passado. Existe
uma superioridade intrínseca no seu uso, de uma narrativa
com a qual nos acostumamos, e a normalização desse
discurso torna o seu juízo de valor quase imperceptível.
Na mídia, quando se fala de “tribos de índios”, por
exemplo, é para mostrar aqueles que foram dizimados, ou
que são primitivos e pararam no tempo em uma suposta
Desconstruções linha evolutiva. Grupos de pessoas que vivem isoladas e só
podem ser vistas como selvagens ou animais em extinção.
Silenciosamente, o uso dessa palavra reforça a percepção de
que indígenas são um subgrupo de pessoas. Um
pensamento que não se baseia em novidade alguma, e que
apenas pavimentou o caminho, há séculos atrás, de que
havia justificativa para violência e escravização dos
colonizadores que chegaram aqui.” Daniel Munduruku.

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