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PENAL I
2019/2020
Síntese
O documento em questão reúne os casos práticos dados nas aulas práticas da Dra. Ana Rita
Alfaiate no ano de 2019/2020. As respostas tentam ser sucintas e analíticas tal como os
critérios de correção exigem. As questões de dolo subjetivo estão feitas de acordo com o
estudo para a oral (esta é para ti Provi)
Tomás Cunha
1 – TOMAS CUNHA – DP – 2019/2020 – TU – AULAS PRÁTICAS
CASO PRÁTICO 1
• Após a prática de um facto, que ao tempo não constituía crime, uma lei nova
venha criminalizar esse mesmo facto.
o Ou então
• Sendo o facto já crime ao tempo da sua prática, uma lei nova prever uma pena
mais grave qualitativamente ou quantitativamente.
No caso prático em questão estamos perante a segunda situação. Por isso mesmo,
importa determinar o tempus delicti do crime, isto é, o momento da prática do ato.
Este pressuposto está longe de estar isento de dúvidas por uma série de razões, já o
facto pode ser analisado numa:
• ação
• ou numa omissão
• E porque o próprio facto compreende a conduta e o resultado.
2 – TOMAS CUNHA – DP – 2019/2020 – TU – AULAS PRÁTICAS
• Descriminalização
• De atenuação das consequência jurídicas
• E também relativas às lei temporárias e intermédias.
Contudo, face aos dados fornecidos, podemos afirmar que não se aplica nenhuma das
exceções previstas no artigo 2º do CP. Logo, temos de aplicar a lei que produzia efeitos
a 30 de agosto, em respeito pelo princípio da legalidade e do plano da retroatividade.
Importa focar neste âmbito que o princípio da legalidade não cumpre toda a matéria
penal, mas apenas a que se traduza em fundamental ou agravar a responsabilidade do
agente. Caso contrário, o princípio da legalidade em sentido criminal passaria a
funcionar contra a sua teleologia e própria razão de ser.
No caso prático em questão estamos perante um caso de descriminalização:
CASO PRÁTICO 2
A, gravida de 8 semanas, saudável e por sua opção, procedeu a uma
interrupção da gravidez realizada por um médico de um estabelecimento de
saúde oficial. Cometeu por isso, um crime de aborto, punível com uma pena de
prisão de 2 a 8 anos, nos termos do artigo 140ºCP. Sabendo que na sequencia
de um referendo e da lei nº 16/2007, de 17 de abril, do artigo 142º/1/e) CP
passou a prever que a interrupção da gravidez não é possível se for realizada
pela mulher nas primeiras 10 semanas de gravidez:
A. Diga qual a lei a aplicar, caso o julgamento ocorra em 2008;
B. Aqui também aplicamos o Art.2º/2, mas aqui como já estava a ser condenada, é
cessada a condenação, como previsto no Art.2º/2, 2ª parte. Novamente importa
focar a importância da consagração expressa do princípio da aplicação da lei
mais favorável. Foi a tipificação desta regra no artigo 2º do CP que conduziu a
uma ideia de que a eficácia do princípio da lex mellior é tão forte, que leva à sua
imposição no que toca à imposição e aos seus efeitos penais, mesmo caso a
sentença ter já transitado em julgado.
Esta opção tem por base a ideia de que se o legislador alterou a sua conceção
até ao ponto de deixar de reputar jurídico-penalmente relevante um
comportamento, não tem sentido política criminal manter os efeitos de uma
conceção ultrapassada.
CASO PRATICO 3
Como já vimos anteriormente o princípio da lei mais favorável tem expressão tanto na
lei ordinária (artigo 2º/4 - CP) como na lei constitucional (29, º4 – CRP).
Com a consagração na nossa lei fundamental, o princípio em causa ganhou um relevo
jurídico adequado ao seu significado para a salvaguarda dos Direitos Liberdades e
Garantias, levantando, contudo, alguns problemas.
Um deles refere-se à hipótese de descriminalização.
Importa em primeiro lugar, fixar o momento da prática do facto: 20 de abril de 2000.
Nesta altura, a prática do senhor A era considerada crime, respeitando o rigoroso
princípio da legalidade ao qual o direito penal se encontra submetido e que se traduz na
seguinte fórmula: “Não há crime, nem pena sem lei escrita, prévia, estrita, e certa.
Com a mudança legislativa levada a cabo pela Lei 30/2000, o comportamento do senhor
de A passou a ser considerado como mera contraordenação e não como crime. No caso
prático em questão estamos perante uma descriminalização em termos gerais,
levantando-se a dúvida em relação ao regime a aplicar neste tipo de casos. Verifica-se
a existência de diferentes perspetivas a propósito de resolução deste tipo de casos.
Temos três posições a saber:
1. O professor Taipa de Carvalho afirma que nestes casos o sujeito deve sair em
liberdade. Não se pune, existe descriminalização.
2. Por outro lado, Dr. Figueiredo Dias recusa esta posição. Na opinião do eminente
penalista é necessário a aplicação combinada dos artigos 2ºnº2 e 2nº4.
a. Vamos aplicar retroativamente o comportamento da contraordenação
porque é mais favorável ao agente. Na opinião de Figueiredo Dias, a
censura de mera ordenação social e a censura penal tem uma
continuidade entre si. Significa que não existe uma verdadeira rutura entre
elas.
3. Por último temos a posição do Dr. Faria Costa que defende a opção da
descriminalização, considerando a existência de duas figuras diferentes:
a. despenalização relativa:
i. No fundo verifica-se a atenuação da sanção dentro do próprio direito
penal.
b. despenalização absoluta:
i. situações em que uma determinada conduta deixa de ser crime, mas
passa a ser uma contraordenação.
No caso em concreto temos uma determinada conduta que deixa de ser um crime e
passa a ser uma contraordenação. Não se trata de total descriminalização. Ao nível
prático, a teoria de Faria Costa tem os mesmos efeitos da posição do Dr. Figueiredo
Dias.
Nota, contudo, para a rejeição de Figueiredo Dias das teorias acima apresentadas. Por
isso mesmo, devemos aplicar cumulativamente o nº2 e nº4, ou seja, aplicamos o nº4 e
retroativamente o nº2, sendo o senhor A punido com uma contraordenação.
5 – TOMAS CUNHA – DP – 2019/2020 – TU – AULAS PRÁTICAS
Caso Prático 4
A Lei 1 punia o crime x com uma pena de prisão de 2 a 8 anos. Na vigência dessa
Lei A cumpriu o crime nela tipificado. Pouco tempo depois da prática do crime, entrou
em vigor a Lei 2 que passou a punir esse facto com pena de prisão de 1 a 5 anos.
Acusada de ser demasiado branda, a Lei 2 foi entretanto revogada e substituída pela
Lei 3 que voltou a punir o crime com pena de prisão de 2 a 8 anos.
Supondo que A foi julgado na vigência da Lei 3, diga qual a Lei aplicável e justifique
a sua resposta.
Não podemos nunca esquecer que o princípio do estado de direito conduz a que
proteção dos DLG seja levado não apenas pelo direito penal, mas também perante o
direito penal. De forma a evitar possíveis comportamentos arbitrários e abusivos por
parte do poder estatal, o Estado encontra-se submetido a um rigoroso princípio da
legalidade que se traduz que não pode haver crime, nem pena que não resulte uma lei
prévia, escrita, estrita e certa. O princípio da legalidade assume consequências ou
efeitos em cinco planos diversos.
Plano:
1. Do âmbito de aplicação
2. Da fonte
3. Da determinabilidade
4. Da proibição de analogia
5. E por fim, da retroatividade.
O caso prático em questão insere-se no plano da retroatividade. Tal como acontece na
analogia, a proibição da retroatividade funciona apenas a favor do agente e nunca contra
ele. Por isso mesmo, esta proibição vale para:
Por isso mesmo, devemos aplicar a lei 2, porque de acordo com o artigo 2º/4 é a lei
mais favorável.
Caso Prático 5
Devido a uma grave crise económica, suponha que o Parlamento aprovou uma Lei
que agravava a pena do crime de especulação.
O crime de especulação era punido com pena de prisão até 3 anos, mas por uma
nova Lei, passou a ser punido com pena de prisão de 7 a 10 anos. Esta Lei 2
fixava o seu próprio período de vigência entre 1 de janeiro e 31 de julho de 2017.
Após o dia 31 de julho de 2017, tornou a vigorar o regime anterior ao dia 1 de
janeiro desse ano.
Caso Prático 6
De janeiro a agosto de 2016, praticamente não choveu em Portugal. Para minorar
os efeitos da falta de chuva, logo em março desse ano, o Parlamento votou uma Lei
(a Lei 1), que entrou em vigor a 1 de abril e que punia, com pena de prisão até 2
anos e enquanto durasse a seca, a utilização de água dos serviços públicos em
piscinas particulares.
Como caiu alguma chuva em fins de maio, o legislador, através de uma nova Lei (a
Lei 2) com inicio de vigência a 20 de junho, diminuiu a pena prevista para tais
comportamentos, fixando-a em multa até 120 dias.
Já em dezembro e depois de ter passado a seca, A está a ser julgado por ter
utilizado água dos serviços públicos para encher a sua piscina particular no dia 20
de abril. Qual a lei a aplicar?
As leis temporárias são leis como já vimos, que, a priori, são editadas pelo legislador
para um tempo determinado. Poderemos ter:
Caso Prático 7
Quid Iuris se A, B e C, julgados e condenados respetivamente a 6, 12 e 14 anos de
prisão em 2013 veem hoje o tipo legal de crime no qual foram subsumidas as suas
condutas ser alterado no sentido de prever como pena máxima 6 anos de prisão.
Justifique.
pessoas saiam em liberdade ou viam a sua pena atenuada, desde que não tivesse
havido transito em julgado.
Esta normal levantava problemas de inconstitucionalidade, levantados quer pelo
professor Gomes Canotilho quer pelo professor Vital Moreira. Ora, o legislador com a
reforma de 2007 veio impor algumas alterações no regime:
1. O artigo 371º-A do CPP prevê a abertura do julgamento para a apreciação dos
factos
2. O Art.2º/4 em vigor atualmente, refere a possibilidade de reapreciação “ainda
transitado em julgado.
Contudo, vários penalistas questionam o artigo em causa, considerando que a norma
violava o principio da igualdade e o principio da separação de poderes.
Em termos de justiça relativa, a igualdade não é tratar tudo por igual, mas sim, tratar de
forma diferente o que é diferente. Neste caso, aplicar o mesmo regime para toda os
indivíduos (A,B e C) viola o principio da igualdade. Se no momento da decisão, o juiz
entendeu que A cumpria 6, B cumpria 12 e C cumpria 14, era porque os casos e as
circunstâncias em diferentes.
O professor Costa Andrade refere que existe também um problema formal, através da
violação do principio de separação de poderes. Para atual presidente do Tribunal
Constitucional este princípio basilar do Estado de Direito democrático é colocado em
causa perante a existência de pessoas a serem colocadas em liberdade não pelo poder
judicial, mas sim, pelo poder legislativo. Contudo, este argumento da separação de
poderes não é um argumento tão forte como o argumento do principio da igualdade.
Em suma, no caso prático apesar das dúvidas relativamente à inconstitucionalidade da
norma, em devemos aplicar o artigo 2º, nº4 do CP.
Caso Prático 8
A perseguiu B, atriz revelação de uma novela da TVI, de abril de 2010 a fevereiro de
2011, aparecendo-lhe de surpresa nos estúdios de gravação, dando-lhe presentes,
comparecendo em todos os eventos públicos em que B participava, referindo-se-lhe
exaustivamente em publicações de Facebook e no seu Blog do seguinte modo: “B
meu amor para toda a vida”. B profundamente inquieta com toda esta inquietação,
apresentou queixa contra A, em janeiro de 2011. Mas o processo acabou arquivado
na medida em que não foi possível subsumir as condutas de A nem pelos crimes
contra a honra, nem pelos crimes contra a reserva da vida privada. Sabendo que,
pela Lei 83/2015 de 5 de agosto, o Código Penal português passou a prever no seu
Art.154º-A o crime de perseguição, diga se é possível condenar, hoje, A pelos factos
cometidos. Justifique.
Na esteia da conceção defendida por Roxin, a proteção dos DLG num Estado de Direito
é realizada não só através do direito penal, mas também perante este. Ou seja, de forma
a evitar comportamentos abusivos e arbitrários por parte do poder estatal ,o Estado
encontra-se submetido a um rigoroso princípio da legalidade que se traduz no princípio:
11 – TOMAS CUNHA – DP – 2019/2020 – TU – AULAS PRÁTICAS
• Prévia
• Escrita
• Estrita
• E certa
Este princípio encontra a sua fundamentação numa pluralidade de fatores, sejam eles
externos ao direito penal, isto é, relacionados com os princípios fundamentais do Estado
de Direito, sejam internos, estes sim, diretamente relacionados com a natureza jurídico
penal. Por seu turno, o princípio da legalidade tem consequências em diversos planos:
Plano:
1. Do âmbito de aplicação
2. Da fonte
3. Da proibição de analogia
4. Da determinabilidade
5. E por fim, da retroatividade.
Importa perante o caso prático em questão focar o último plano. Relativamente ao plano
da retroatividade, importa perceber que uma das consequência mais importantes do
princípio da legalidade, é a proibição da retroatividade em tudo aquilo que funcione
contra o agente.
É através desta proibição que se satisfaz a exigência constitucional e legal de que seja
só punido o facto descrito e declarado passível de pena por lei anterior ao momento da
prática desse ato.
O pressuposto de toda atuação do princípio da legalidade passa pela determinação do
momento da prática do ato, ou seja, do tempus delicti. O artigo 3º do CP vem resolver
possíveis dificuldades na definição do momento da prática do ato: De acordo com o
artigo supramencionado para a determinação do momento da prática do facto é a
conduta que importa, não o resultado. O facto em questão foi praticado entre 2010 e
2011, período no qual não existia o crime em causa.
Não nos podemos esquecer que por muito nocivo se afigure um comportamento, é
necessário sempre que o legislador considere esse comportamento como crime. Só
dessa forma esse comportamento é passível de punição, logo, possíveis
esquecimentos, lacunas ou deficiências de regulamentação ou redação funcionam a
favor do agente, neste caso de A (ideia de magna charta do criminoso de Liszt). Logo,
este não pode ser condenado, não se colocando sequer a hipótese de aplicar o regime
mais favorável.
12 – TOMAS CUNHA – DP – 2019/2020 – TU – AULAS PRÁTICAS
Caso Prático 9
Durante um período de grande perturbação dos transportes públicos e por essa
circunstância, foi aprovada uma Lei que punia com pena de prisão até 6 meses
quem circulasse naqueles transportes sem bilhete para o efeito. A, individuo
avesso a regras, decidiu fazer uma viagem de Coimbra para Lisboa no
intercidades, sem comprar bilhete, passando toda a viagem a tentar esconder-se
do responsável pela verificação dos bilhetes (o senhor B). Perto de Vila Franca de
Xira, B encontra finalmente A e depois de se envolverem numa grande discussão,
B faz A sair nessa estação. 6 meses depois, quando a situação já está mais calma,
é aprovada uma nova Lei que vem agora punir a titulo contraordenacional quem
circule em transporte público sem bilhete para o efeito. Sabendo que no momento
em que A é levado a julgamento já está em vigor a Lei nova, diga se e como será
punido A. Justifique.
Uma eficaz prevenção do crime só pode ser alcançada com êxito se às intervenções
estatais forem levantados limites escritos. De modo a evitar comportamentos abusivos
e arbitrários por parte do poder estatal, o Estado encontra-se submetido a um rigoroso
princípio da legalidade, cujo conteúdo se traduz em que não pode haver crime nem pena
que não resulte de uma lei prévia, escrita, estrita e certa.
O princípio da legalidade assume consequências em diversos planos, inclusive no plano
da retroatividade, proibindo a retroatividade em tudo quanto funcione contra o agente.
Trata-se de uma proibição que satisfaz a exigência constitucional e legal de que só seja
punido o facto descrito e declarado passível de pena por lei anterior ao momento da
prática do ato.
O pressuposto fundamental do princípio da irretroatividade a determinação do tempus
delicti, ou seja, do momento da prática do ato. No caso prático, o facto ocorre durante
a vigência da lei 1 mas o julgamento ocorre já durante a vigência da lei 2. Ou seja,
estamos perante uma lei temporária, editada para um tempo determinado, definido a
priori pelo legislador.
Ora, de acordo com o artigo 2ºnº3, verifica-se a existência de uma exceção ao princípio
da lex mellior, logo devemos aplicar a lei vigente no momento da prática do ato.
A razão que justifica o afastamento da aplicação da lei mais favorável reside no facto da
modificação legal se ter operado em função de uma alteração de circunstâncias de facto
e não por uma alteração da conceção legislativa. Logo, não há expetativas que
mereçam ser tuteladas, mas sim, razões de prevenção geral positiva.
13 – TOMAS CUNHA – DP – 2019/2020 – TU – AULAS PRÁTICAS
Caso Prático 10
A, português, viajava numa aeronave portuguesa com destino a Espanha. Após aterrar em
Madrid, A ainda a bordo agride B, espanhol, causando-lhe ofensas à integridade física
graves. Podem os tribunais portugueses julgar este facto?
A conformação do sistema de aplicação da lei penal no espaço tem por base diversos
princípios e um determinado modelo de combinação. Esses princípios não assumem,
contudo, igual hierarquia, existindo um princípio base e múltiplos princípios acessórios
ou complementares.
O princípio base deste sistema é o da territorialidade. Este princípio estipula que o
Estado aplica o seu direito penal a todos factos penalmente relevantes que tenham
ocorrido no seu território com indiferença por quem ou contra tais factos foram
cometidos.
Este princípio assume-se então como princípio basilar da aplicação da lei penal no
espaço, em detrimento do princípio da nacionalidade, verificando-se várias razões para
tal, algumas delas de diferente índole. Para a determinar da sede do delito rege o artigo
7º do CP.
O legislador consagrou neste campo uma solução mista ou plurilateral, através da
cumulação do critério da conduta e do critério do resultado. Nota, contudo, para a
revisão do CP em 1998, onde se verificou uma adição de duas conexões ao artigo
supramencionado.
Olhando aos dados conhecidos, podemos concluir que o facto foi praticado em solo
português, com recurso ao critério do pavilhão. Podemos concluir que o princípio da
territorialidade sofre um alargamento parificando os factos cometidos em território
português e os que tenham lugar a bordo de navios ou aeronaves portuguesas (artigo
4ºb – CP). Estamos perante o critério do pavilhão, critério esse, que é justificado pela
consideração tradicional de que esses navios e aeronaves são ainda para efeitos
normativos, território português.
14 – TOMAS CUNHA – DP – 2019/2020 – TU – AULAS PRÁTICAS
Neste caso, a aeronave aterra em Madrid, ou seja, num aeroporto diferente do pavilhão,
não retirando competência às autoridades espanholas para proceder à intervenção
imediata das autoridades policiais e judiciárias. Quando tal suceder, dar-se à, no
máximo, a um conflito positivo de competências.
Caso Prático 11
A, francês, cometeu três homicídios qualificados em França. A polícia francesa
andava à sua procura, mas A conseguiu fugir para Portugal. Sabe-se que as vitimas
são todas portuguesas e que em França A seria punido com pena de prisão
perpétua. Uma vez em Portugal, A pode ser julgado pelos tribunais portugueses?
• Personalidade:
o Ativa:
▪ Porque o agente é português
o Passiva:
▪ Porque há uma aplicação da lei penal portuguesa a factos
cometidos no estrangeiro, por estrangeiros contra portugueses.
O fundamento deste princípio passa pela necessidade do Estado em proteger os
cidadãos nacionais. Este princípio encontra-se previsto no artigo 5º1-e do CP, sendo a
lei penal portuguesa aplicável a factos cometidos fora do território nacional por
estrangeiros contra portugueses, caso se verifique a reunião de três pressupostos:
• O facto que constitui crime admite extradição e esta não pode ser concedida.
o O artigo 5º 1-e, estabelece enquanto última condição de aplicação do
princípio da personalidade passiva, que o facto constitua crime que
admita extradição esta não possa ser concedida.
o O artigo 33º, nº4 da CRP, estabelece uma série de requisitos de modo a
permitir a extradição:
▪ Impedimento de extradição por motivos políticos. Não é o caso.
▪ Vedação da extradição por crimes que correspondam a certas
reações criminais como a pena de morte ou a pena perpétua.
• Nesses casos, a extradição só não estará vedada, caso o
Estado requerente (Estado Francês) dê garantias que tal
pena ou medida de segurança não será aplicada.
Em suma, se for garantido ao Estado Português que o Estado Francês não aplique o
regime previsto (pena perpetua), Portugal deverá extraditar o senhor A. Caso contrário,
por respeito ao artigo 33º, nº4, este deverá ser julgado à luz do direito português.
Caso prático 12
Na sequência de uma mega investigação encontrou-se uma maquina de reprodução de
notas de euro português, bem assim como já algumas notas impressas na casa de A,
português, residente em Marrocos. Supondo que em Marrocos só é punível a contrafação
de moeda marroquina, poderá A ser punido pela lei penal portuguesa? A contrafação de
moeda está prevista no Art.262º CP. Justifique a sua resposta.
Caso Prático 13
A, realizador francês, residente em Portugal, viajou para França com o intuito de
concluir uma nova curta metragem. Nesta usou B, uma jovem francesa de 14 anos.
A voltou para Portugal. Sabendo que a curta metragem em causa era de conteúdo
pornográfico e que a jovem B foi usada como protagonista, diga em que termos
poderão os tribunais portugueses julgar A pelo crime previsto e punível nos termos
do Art.176º/1/b CP. Justifique a sua resposta.
Neste sentido aponta o 5º1-c, que ordena a aplicação da lei penal portuguesa a crimes
que tutelam bens jurídicos carecidos de proteção internacional, como é o caso da
pornografia infantil. Contudo, não podemos esquecer que a aplicação da lei portuguesa
fora do território nacional só tem lugar quando o agente não tiver sido julgado no país
da prática do facto, algo que não aconteceu. Como o caso em questão não se inscreve
no âmbito dos crimes previstos no nº3 do artigo supramencionado, o realizador francês
pode ser julgado em Portugal à luz do direito português.
Caso Prático 13
Sergey, cidadão russo, violou Bouchard, cidadã canadiana durante uma competição
de surf que ambos realizavam na Jamaica. Sabendo que Sergey reside atualmente
em Portugal, diga se e em que condições serão os tribunais portugueses
competentes para proceder ao seu julgamento uma vez que Sergey nunca chegou a
ser encontrado pela polícia jamaicana.
A aplicação da lei penal no espaço está organizada de acordo com uma multiplicidade
de princípios. Porém, nem todos os princípios gozam de igual hierarquia, verificando-se
a existência de um princípio base (territorialidade) e de diversos princípios assessórios.
O princípio basilar de todo o sistema de aplicação da lei penal no espaço é o princípio
da territorialidade. De acordo com este princípio, o Estado pode aplicar o direito penal
nacional perante qualquer facto penalmente relevante praticado no seu território, com
indiferença perante a nacionalidade dos agentes envolvido.
O artigo 7º do CP rege as regras para determinação do locus delicti. O legislador
consagrou neste campo uma mista ou plurilateral, acumulando os critérios da conduta
e do resultado. De acordo com o artigo em causa, o delito foi praticado fora do território
nacional (na Jamaica), logo devemos perceber se o Estado Português é competente
para aplicar o seu direito penal perante um facto praticado fora do território nacional. No
caso prático em questão devemos mobilizar o princípio complementar da administração
supletiva da justiça penal consagrado no artigo 5º1f do CP. Este artigo veio colmatar
uma lacuna no sistema de aplicação da lei penal no espaço, evitando a possibilidade de
um cidadão estrangeiro (como Sergey), procurar refúgio em Portugal depois de praticar
um crime no estrangeiro. Caso esta norma não existisse, Sergey não poderia ser julgado
nem por outro, alvo de extradição. Desta maneira, segundo este princípio, a lei penal
portuguesa é aplicável a factos cometidos por estrangeiros no estrangeiro quando:
Caso 14 -
A bordo de uma aeronave espanhola, e na sequência de um desentendimento,
durante o voo, Totti, cidadão italiano, matou Figo, cidadão português. Assim que a
aeronave aterrou, A foi detido pela autoridade, julgado e condenado em Espanha.
A começou a cumprir 10 anos de prisão em março de 2012. No passado mês de
setembro, A conseguiu fugir da prisão refugiando-se num monte alentejano
propriedade de C, um amigo alemão. Serão os tribunais portugueses
competentes para julgar A? Poderá ser aplicada a lei penal portuguesa a esta
caso.
• Personalidade:
o Ativa:
▪ Porque o agente é português
o Passiva:
▪ Porque há uma aplicação da lei penal portuguesa a factos
cometidos no estrangeiro, por estrangeiros contra portugueses.
No caso prático em questão um sujeito estrangeiro matou um agente português. Este
princípio da personalidade passiva é explicado pela necessidade sentida do Estado
Português de proteger os cidadãos nacionais perante factos contra eles cometidos por
estrangeiros no estrangeiro.
O artigo 5-1e do CP estabelece um conjunto de requisitos para a aplicação da lei
portuguesa nestes casos:
a) Os agentes têm de ser encontrados em Portugal tal como acontece no caso
prático
b) O facto em questão também é alvo de punição no local onde se produziu o
resultado, algo que também acontece, já que o senhor italiano foi preso e
condenado em Espanha.
c) O artigo 5º 1e) estabelece como último requisito a necessidade do crime admitir
extradição e esta não poder ser concedida.
19 – TOMAS CUNHA – DP – 2019/2020 – TU – AULAS PRÁTICAS
Caso 15
Durante o mês de agosto, Heinz casado com Angela e durante um cruzeiro pelo
Atlântico, envenenou a sua mulher na expectativa de que esta em agonia acabava-
se por falecer quando finalmente chegassem à ilha da Madeira. Ao chegar ao
Funchal, B, porém, queixando-se de um grande mau estar é imediatamente
internada, acabando por sobreviver. Detido imediatamente pelas autoridades
portuguesas, Heinz foi acusado de um crime de homicídio qualificado na forma
tentada. Sabendo que quer Heinz quer Angela são alemães, diga se Heinz pode
ser julgado pelos tribunais portugueses e qual aplicável nesse caso. Justifique.
NOTA: Nos casos de imputação devemos procurar provar que não existe imputação,
descendo teoria a teoria caso se verifique imputação. Se perante os diferentes degraus
a imputação for justa e legítima devemos considerar a existência de imputação e
terminar o caso.
Caso 16
A deu um empurrão a B. Na sequência deste empurrão, B teve um enfarte do
miocárdio e morreu. Em tribunal, provou-se que A desconhecia a doença cardíaca
de B. Preencheu A com a sua conduta o tipo de ilícito por crime de homicídio?
Justifique.
Caso 17
A circula de automóvel a 80 km/hora num local em que a velocidade máxima
permitida é de 50 km/h. Entretanto, devido ao rebentamento de um pneu, que nada
fazia prever, A perde o controlo do carro e, galgando o passeio, atropela B, que
vem a morrer em virtude do acidente. Poderá A ver este resultado de morte de B
sendo imputado à sua conduta? Justifique.
• PREVISÍVEL
o Não há interrupção do nexo de casualidade.
o LOGO, HÁ IMPUTAÇÃO
• Se for IMPREVISÍVEL:
o Há interrupção do nexo de causalidade.
o LOGO, NÃO HÁ IMPUTAÇÃO.
No caso prático a interrupção é imprevisível, logo não há imputação.
Caso 18
• Esta tenha:
o Criado
o Ou aumentado
▪ Um risco PROIBIDO para um bem jurídico protegido pelo tipo
ilícito
o E esse risco se tenha MATERIALIZADO no resultado típico.
De acordo com esta perspetiva não há lugar à imputação, porque o agente com a sua
ação não criou nem aumento um risco proibido. Pelo contrário, diminuiu o risco de A ser
atropelado, o que seria um perigo maior.
Nos crimes de resultado suscita-se o problema da imputação do resultado à conduta do
agente, exigindo-se para o preenchimento integral de um tipo de ilícito a produção do
resultado e a consequente imputação do resultado à ação.
23 – TOMAS CUNHA – DP – 2019/2020 – TU – AULAS PRÁTICAS
Caso 19
Numa estrada em que se podia conduzir a 100km/h, A conduzia a não mais de 80
e cumpriu todas as regras de segurança. O peão B atravessou-se
inesperadamente à frente de A e, batendo no automóvel deste, B acaba por morrer.
Pode a morte de B ser imputada a A?
Esta problemática da imputação é uma das questão mais discutidas de toda a dogmática
penal, verificando-se a existência de várias teorias que tentam responder a esta
questão.
A primeira perspetiva de relação entre ação e causa do resultado é a pura causalidade.
A premissa base desta teoria nascida no século XIX com Glaser e Buri, passa pela ideia
de que a causa de um resultado é toda a condição sem a qual o resultado não teria
lugar. Estamos perante uma autêntica condicio sine qua non.
Esta teoria evoluiu ao longo tempo, primeiro com a substituição da supressão mental
pelo critério da condição conforme as leis naturais, e mais tarde, com o recurso às leis
da experiência e da base estatística.
Esta teoria apresenta como defeito principal a extensão exagerada conferida ao objeto
da valoração jurídica. Por isso mesmo, embora a relação de causalidade seja sempre
necessária, não é suficiente para responder a esta problemática. É preciso subir do
primeiro degrau para o segundo.
Surge então, a teoria da causalidade adequada. De acordo com esta teoria criada por
Kries, para a valoração jurídica da ilicitude só são relevantes as condições que segundo
as regras de experiência comum são idóneas a produzir o resultado. É neste sentido
que deve ser entendido o artigo 10º do CP.
São, contudo, várias as dificuldades com que se depara a teoria da adequação. O nexo
de adequação tem de ser aferido de acordo com um juízo ex ante e não ex post, de
forma a apurar se a ação praticada por A teria como consequência a produção do
resultado em condições normais e previsíveis. Ora, podemos concluir que a imputação
de acordo com esta teoria deverá ter lugar, o que pode figurar numa situação de injustiça
para A já que este vinha a conduzir a 80km por hora apenas (abaixo do limite imposto
por lei naquele troço). Estamos perante uma das limitações dessas soluções, na medida
que, na generalidade destes casos, a ação se revela adequada à produção do resultado
típico, enquanto, por outro lado, não é possível proibir tais condutas, o que conduziria a
um retrocesso social.
Importa por isso mesmo avançar para a chamada conexão do risco. Para esta teoria o
resultado só deve ser imputável quando:
Caso 20
No âmbito de uma cirurgia, A, o anestesista de serviço, engana-se na dosagem do
produto anestésico vindo o paciente B a morrer. Analisado o relatório da autopsia,
prova-se que a morte de B ocorreria igualmente caso a anestesia tivesse sido
corretamente efetuada. Na verdade, em virtude de uma raríssima enfermidade
congénita, desconhecida até pelo próprio B, a mais ínfima quantidade de anestésico
era absolutamente incompatível com B. Deve ou não se imputar o resultado de morte
de B à conduta de A?
Caso 21
A provoca um acidente de viação em que B condutor do outro veículo fratura uma
perna. Transportado para o hospital, B é submetido a uma intervenção cirúrgica. Por
lapso de C anestesista ocorre uma troca na anestesia e acaba por provocar a morte
de B. Logo a seguir aquela operação deflagrou um incendio na enfermaria para onde
B seria levado se a intervenção cirúrgica tivesse sido bem-sucedido. Desse incendio
resultou a morte de todos os pacientes daquela enfermaria.
Quid iuris, quanto à possibilidade de impugnação do resultado morte à conduta de A
e à conduta de C?
mental, sendo este substituído pelo critério da condição conforme às leis naturais. No
entanto, este argumento mostrou-se pouco fiável, tendo-se verificado o recurso às leis
da experiência e da base estatística. Esta doutrina tem como principal problema a
extensão exagerada que confere ao objeto da valoração jurídica. Por isso mesmo, e
apesar da relação de causalidade ser sempre necessária, não é suficiente, sendo
necessário subir de nível até ao segundo degrau da teoria da causalidade adequada.
Caso contrário segundo as regras desta teoria, o crime de homicídio deve ser imputado
a A, o que pode conduzir a uma situação injusta.
O critério geral desta teoria criada por Kries, tem por base a ideia que a valoração
jurídica da ilicitude não tem por base qualquer condição, mas sim, as condições que
de acordo com as máximas da experiência comum se mostram idóneas para produzir o
resultado. É neste sentido que deve ser entendido o artigo 10º do CP. A esta teoria
surgem uma multiplicidade de problemas e desafios. Um deles é relacionado com a
intervenção de terceiros. A atuação de C integra-se no processo causal desencadeado
por A, o que vai excluir a sua imputação, salvo quando ela for previsível e provável. Não
é o caso.
Poderemos imputar o resultado da morte de A quem? Neste caso a C. Isto quer à luz
da primeira teoria quer da segunda conceção. Todavia, não podemos esquecer a
situação causada pelo incêndio. Importa perceber que C teria morrido à mesma graças
ao incêndio. Não podemos esquecer o conceito de causalidade virtual, onde apesar do
agente ter criado um perigo não permitido e este ter-se materializado no resultado típico,
temos razões para duvidar se a sua ação (anestesiar de forma errada B) deva ser
objetivamente imputada ao resultado (a sua morte).
Como não podemos abandonar o bem jurídico à agressão do agente só porque B não
pode ser salvo, devemos imputar a ação C. Na causalidade virtual o resultado produz-
se devido a uma causa alternativa ao agente, mas a própria ação deste, causaria o
mesmo resultado. Desta forma distinguimos a causalidade virtual dos comportamentos
lícitos alternativos, onde não se verifica a imputação do resultado à conduta.
Caso 25
O tipo de ilícito incriminador tem um tipo objetivo de ilícito e um tipo subjetivo de ilícito,
sob a forma dolosa ou negligente. O CP não define o dolo do tipo, dispondo apenas no
artigo 14º do CP, cada uma das formas em que ele se analisa. O artigo 13º por seu
turno, esclarece que só é punível o facto praticado com dolo ou nos casos
especialmente previstos na lei, com negligência. Podemos concluir então, que a
classificação de crime mais grave é a dolosa, sendo o elemento da culpa é o elo
diferenciador entre delitos dolosos e negligentes.
O dolo do tipo traduz-se no CONHECIMENTO e na VONTADE de realização do tipo
objetivo de ilícito. Por outras palavras, o conceito em termos concetuais é preenchido
27 – TOMAS CUNHA – DP – 2019/2020 – TU – AULAS PRÁTICAS
O agente representou como possível o resultado ocorrido, mas confiou, não devendo confiar, que ele não se verificaria, na negligência
inconsciente o agente infringe o dever de cuidado imposto pelas circunstâncias, não pensando sequer na possibilidade do preenchimento
do tipo pela sua conduta. Exemplo: A violação do dever de cuidado por parte do arguido, ao confiar que não estava embriagado, quando
possuía uma T.A.S. mais de 12 vezes superior á permitida por lei para poder conduzir um veículo automóvel pesado de mercadorias, é
muito elevada, roçando a negligência grosseira.
É o elemento volitivo, quando ligado ao elemento intelectual requerido, que serve para
indiciar uma posição ou uma atitude do AGENTE contrária à norma do comportamento,
ou seja, uma CULPA DOLOSA.
Mas olhemos em primeiro lugar, ao momento intelectual do dolo:
Este momento trata da necessidade, para que o dolo do tipo se afirme que o agente:
CONHEÇA, SAIBA E REPRESENTE CORRETAMENTE
AS CIRCUSTÂNCIAS DO FACTO QUE PREENCHE UM TIPO DE ILÍCITO
OBJETIVO.
O que está em causa é o agente, conhecer tudo quanto seja necessário para uma
correta orientação ética para o desvalor jurídico em que a ação consiste e para o seu
caráter ilícito. Ou seja, caso exista identidade típica entre:
• O Crime projetado
• E o crime efetivamente consumado
Não há exclusão do dolo. Por seu turno, se não existir identidade típica entre o objeto
do crime projetado e o objeto do crime objetivamente consumado, exclui-se o dolo e fica
ressalvada a negligência.
No caso em análise, A disparou sobre a vítima pensado que C era na verdade B. Ou
seja, não estamos perante um erro na trajetória, mas sim perante um erro sobre a
pessoa. O decurso real do acontecimento correspondeu inteiramente ao intentado. O
senhor A disparou com intenção de matar quem entrava na associação e conseguiu
concretizar a ação com sucesso. No entanto, houve um erro na formação da própria
vontade e não na execução. Ou seja, o objeto atingido é COINCIDENTE ao projetado.
Logo, o erro sobre a pessoa é irrelevante, havendo dolo. A explicação para isto é
simples: A lei proíbe a lesão não de um determinado objeto ou indivíduo, mas de todo e
qualquer objeto ou pessoa compreendidos no tipo de ilícito. Nunca podemos esquecer,
que o DP é um DP do FACTO e não do agente. Atualmente, é totalmente rejeitada a
conceção do direito penal do agente que tinha ganho força nos anos 30 nos regimes
alemães e italianos.
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C) Por último, quid iuris se a bala pouco certeira de A matou apenas o cão de
estimação de B que estava ao seu lado porque o acompanha sempre.
Matar um animal de companhia temos de ver, de acordo com o art. 387º e ss CP,
acrescentado em 2014.
Caso 26 -
A conduzia a sua bicicleta a motor. Quando numa operação stop da GNR, se verifica
que apresenta uma taxa de alcoolemia de 1.8 g/l. Acusado e julgado por crime de
condução em estado de embriaguez, previsto e punível pelo art. 398º CP. A vem
dizer que não sabia que a sua conduta era crime, uma vez que sempre pensou que
só era proibido conduzir alcoolizado automóveis. Nunca lhe tinha passado pela
cabeça que o mesmo se aplicava a outros veículos. Quid iuris?
Este conceito da Sociedade de Risco está ligado de forma intima ao chamado direito
penal do Risco. Em função da crise do «direito penal do bem jurídico», consequência
das fortes alterações na sociedade, surge esta nova perspetiva, adaptada às
exigências.
Esta conceção implica
• uma alteração do modo próprio de produção legislativa em matéria penal;
• uma antecipação da tutela penal para estados prévios da lesão de interesses
socialmente relevantes
Importa destacar este segundo ponto referente à antecipação da tutela penal para
estados prévios da lesão de interesses socialmente relevantes. Porquê? Porque
apesar da necessidade de respeitar os princípios de direito penal clássico, dirigidos à
proteção subsidiária de bens jurídicos individuais, é necessário dar lugar a conceitos
que assentem na proteção antecipada de interesses coletivos mais ao menos
indeterminados, sem ESPAÇO nem TEMPO, sem AUTORES e sem VÍTIMAS
definidos ou definíveis.
Defendendo uma posição intermédia face aos autores que defendem que estamos a
entrar numa era dominada pela “crise do bem jurídico” e pelo aparecimento de um
direito penal do risco, devemos focar a ideia de crime de perigo. Ou seja, crimes onde
a realização do tipo não pressupõe a lesão, bastando apenas e “só” a colocação em
perigo do bem jurídico.
30 – TOMAS CUNHA – DP – 2019/2020 – TU – AULAS PRÁTICAS
A pequena relevância axiológica ação faz com que o facto, no conjunto dos seus
elementos, não suscite imediatamente um problema de desvalor ligado ao dever-ser
jurídico. Desta forma, o substrato da valoração da ilicitude passa a ser constituído:
• Pela conduta
• E pela proibição legal.
Nota: Oral – Dar o exemplo do condutor de automóvel que atropela um bêbado que
se encontra deitado na estada por estar distraído. Este não atua com dolo, logo não
pode ser acusado de homicídio qualificado por exemplo (132º do CP), porém, o seu
desconhecimento é reconduzível à não prestação do cuidado devido. Logo, o seu
comportamento integra o tipo de ilícito de homicídio negligente previsto no artigo 137º
do CP. Não podemos esquecer a regra previsto no artigo 16º, nº3 do CP, onde o
legislador ressalvou a punibilidade da negligência nos termos gerais: Ou seja:
Caso 27
Suponha que A decidiu encenar um acidente a propósito da morte de B. Aliciando-o
para perto de uma ravina e atirando-o daí com o intuito de o matar com os
traumatismos provocados pela queda fazer crer que B, um amante de fotografia
possa ter caído durante uma das suas caminhadas para fotografar. Encontrado o
corpo de B resultada da autopsia que a sua morte ficou a dever-se a um enfarte no
miocárdio, certamente desencadeado por uma situação extrema de tensão. Quid
iuris?
Para analisar corretamente o caso prático em questão importa olhar para o próprio
conceito de dolo e o seu enquadramento jurídico-penal. O CP não define o dolo do tipo,
dispondo apenas no artigo 14º, cada uma das formas em que o dolo se analisa. Não
obstante, nós sabemos que o dolo do tipo se traduz no CONHECIMENTO e na
VONTADE DE REALIZAÇÃO DO TIPO OBJETIVO DE ILÍCITO.
Por outro, o artigo 13º do CP determina (ler artigo) que só é punível o facto praticado
com DOLO ou, nos casos especificamente previstos na lei, com negligência. Importa
desde logo, focar que a criminalidade dolosa é a mais grave, sendo o elemento da culpa
o principal fator diferenciador entre estes dois tipos de delito. Por isso mesmo, e apesar
dos crimes negligentes terem aumentado na sociedade atual, que podemos classificar
como “Sociedade de Risco” utilizando o conceito de Ulrich Beck, a verdade que os
crimes negligentes representam uma pequena parte dos crimes tipificados na parte
Especial do CP, tendo molduras penas mais baixas, o que é explicado pelo desvalor
jurídico superior dos delitos dolosos em relação aos restantes.
Ora, o dolo é constituído por dois momentos: O momento intelectual, que se traduz no
conhecimento e no momento volitivo, que se traduz na vontade de realização do facto.
Apesar do elemento intelectual do dolo do tipo não ser o elemento decisivo na distinção
entre crimes dolosos e negligentes, uma vez que os delitos negligentes podem contar a
representação de um facto que preenche um tipo de ilícito, como acontece na
negligência consciente, que se encontra consagrada no artigo 15º do CP (condução sob
influência de álcool).
32 – TOMAS CUNHA – DP – 2019/2020 – TU – AULAS PRÁTICAS
• Agravam
o Agente furta coisa móvel alheia sem consciência de que a subtração em
causa deixa a vítima em difícil situação económica. Nesse caso, o agente
não é acusado de furto qualificado, mas sim, de furto simples nos termos
do artigo 203º, nº1.
• Ou aceitação errada de circunstâncias:
o Quem toma erradamente por sério o pedido de um doente grave e o
mata, atua com dolo do tipo de homicídio a pedido, nos termos do artigo
134º do CP.
Em ambos os casos, o erro sobre a factualidade típica conduz a que pena aplicar seja
a menos grave.
No caso prático em questão estamos perante um erro sobre o processo causal. Nestes
casos importa saber como podemos imputar o resultado à ação perante a existência de
uma divergência entre o RISCO conscientemente criado pelo agente e aquele que
efetivamente deriva do resultado. Levanta-se a questão se a ação do agente pode ser
imputada a título doloso ou apenas a título de tentativa.
Temos duas respostas a esta questão:
1. Por um lado, podemos considerar que o dolo é EXCLUÍDO e o agente responde
apenas a título de negligência. De acordo com esta perspetiva (minoritária) o
resultado teve lugar por concretização de um risco não previsto, não existindo
congruência entre o tipo objetivo e o tipo subjetivo do ilícito.
2. Por outro, devemos optar pela solução maioritária na doutrina, que segue pela
distinção entre:
a. CRIME DE EXECUÇÃO:
i. LIVRE – por via de regra, o equívoco não exclui o dolo.
ii. VINCULADA : Se o agente equivocar quanto ao processo causal,
exclui-se o dolo. Como exemplo temos a burla.
Olhemos às diferenças: Nos crimes de execução livre o CRIME e o MODO DE
EXECUÇÃO não têm qualquer tipo de relevância perante um erro sobre o processo
causal. Por via de regra, o erro não vai excluir o erro por isso mesmo.
Oral:
A dispara sobre B. B, chega ao hospital e falece de septicemia.
A dispara sobre B. B cai para debaixo da ponte devido ao tiro e sobrevive quer ao tiro quer à queda. Mas ao sair do rio, liberta uma
pedra que lhe esmaga a cabeça.
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