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O Tempus Delicti
2 Fundamentos:
Princípio da culpa: a consciência da ilicitude do agente tem de se formar no momento em que este atua - que
decide e tem condições para olhar para a lei e decidir pela licitude ou ilicitude.
É por referencia a esse momento que pode aceder à consciência da ilicitude e é nesse momento que se vai dizer
que o facto foi praticado.
É no momento que o agente faz aquilo que controla que pode aceder à lei para ver se tal comportamento é
permitido ou proibido
Princípio da segurança jurídica: Se não fosse assim isto permitiria os maiores abusos por parte do Estado -
se alguém tivesse um comportamento que não é crime mas o seu ato continuasse a produzir efeitos, por ex: lançar
para a natureza um determinado produto que é permitido - continua a produzir efeitos no ambiente - o resultado
há de ser posterior ao meu comportamento - Se, por alguma razão, o Estado tivesse um problema contra a empresa
- poderia vir a criminalizar o ato praticado por esta uma vez que os efeitos ainda se iriam continuar a produzir.
Permitira comportamentos abusivos por parte do comportamento sancionatório que permitiria criminalizar
condutas depois do agente ter praticado o facto.
Para tal, temos de fazer uma distinção entre crime instantâneo e crime duradouro:
- Crime instantâneo:
Ex: Homicídio: aqui é relevante o momento da prática do facto (da conduta) – é irrelevante o resultado - morte
Aplica-se o art 2º/1 + 3º CP
- Crime duradouro:
Deve aplicar-se a lei antiga a não ser que a totalidade dos pressupostos da lei nova se tenham verificado na
vigência desta
Ex: Caso do sequestro qualificado.
Art. 2º/2 CP
Art. 2º/4 CP
- Problema da delimitação da sucessão de leis no tempo;
- Justificação deste regime tendo em conta o princípio da necessidade da pena e o princípio da culpa
Para o cumprimento das exigências éticas jurídico-políticas e de política criminal que determinam e fundamentam
a proibição da retroatividade da lei penal desfavorável está dependente da determinação do “tempus delicti” –
isto é da fixação do momento em que se considere cometido o crime.
A lei penal desfavorável não pode aplicar-se a factos praticados antes da sua entrada em vigor - isto também se
compreende com o princípio da culpa
Os factos previstos e descritos na lei criminal são validades complexas: o preceito primário decompõe-se em vários
elementos de entre os quais se destaca a conduta e o resultado.
Por outro lado, sabe-se que a conduta e o resultado podem ocorrer por vezes em momentos muito distantes entre
si, sendo possível, neste tempo intermédio - entre a conduta e o resultado, que entre uma lei que criminalize o
facto, ou que agrave a responsabilidade penal do agente do facto praticado.
Por exemplo:
A dispara sobre B ao abrigo da L1 (que pune o homicídio de 3 a oito anos), sendo que a morte de B dá-se ao abrigo
do L2 (que agrava a moldura penal - passa para 4 a 17 anos)
O resultado foi a morte, mas a conduta foi o disparo, portanto o que irá ser relevante será o momento do disparo
(conduta) e não o momento da morte (resultado).
O entendimento dominante vai no sentido de o momento da referência ser o da conduta, sendo
irrelevante o momento em que se verifique o resultado.
Concluindo:
Há a proibição da retroatividade da lei criminalizadora ou agravante da responsabilidade penal
Esta lei não pode aplicar-se ao agente de uma conduta praticada antes do seu início de vigência, mesmo que o
resultado dessa conduta (ex. morte) venha a produzir-se quando essa lei já estava em vigor
Razões essenciais:
- Garantia jurídico-política da pessoa humana frente à possível arbitrariedade legislativa ou judicial no exercício
do poder punitivo.
- Princípio da culpa
Enquadramento Prático:
Estabelecido o momento decisivo que é a conduta : não ficam resolvidos todos os problemas:
Há casos em que o crime não é instantâneo, ou seja há casos onde a conduta se mantém por um tempo mais ou
menos longo: dias, meses, até anos.
É o caso dos:
- Crimes Duradouros;
- Crimes Continuados;
- Crimes por Omissão
Exemplo:
Homicídio clássico (A dispara contra B e B morre – aqui a conduta não se mantém no tempo, ele dispara e acabou),
agora imaginemos que o homicídio cometido é através da ministração sucessiva de quatro pequenas doses de
veneno – tendo a morte ocorrido alguns dias após a última dose.
Sendo que o momento da conduta o critério decisivo, questionar-se-á a qual dos momentos, pelos quais se
“repartiu” a conduta se deverá ligar ao “tempos delicti” do art. 3º CP, repara-se que uma resposta tem de ser dada,
no caso de, entre o momento da primeira dose e o momento da última dose , ter entrado em vigor uma lei que
veio agravar a moldura penal estabelecida no art 132º/1/ e 2 f) do CP
O raciocínio é este:
Continua a ser irrelevante o momento do resultado (morte);
Momento decisivo: o “ tempus delicti” é o momento em que foi ministrada a dose de veneno mortal, isto é, a dose
que, juntamente com as anteriores converteu a conduta do agente em conduta adequada a produzir a morte,
É neste momento: que se deve considerar praticada a conduta homicida.
Conclusão:
Se a Lei Nova (LN) mais grave entra em vigor antes do momento da dose mortal – aplicar-se-á esta lei ao agente, se
entrar posteriormente, não poderá ser aplicada, sendo assim aplicável a Lei Antiga (LA).
Não haveria problema se a Lei Nova fosse favorável quer porque despenalizava, quer porque diminuía a
responsabilidade penal: neste caso o art 2º/2 e 2º/4CP referem que há lugar à aplicação da LN porque é mais
favorável.
Sob pena de inconstitucionalidade, a solução defendida tem de respeitar o princípio da culpa e a segurança
jurídica: que fundamentam a proibição de retroatividade da lei penal desfavorável
O legislador pretende transmitir à comunidade que já não é necessário incriminar determinado comportamento.
Passou a ser desnecessário, a partir daquele momento, que mais alguém, fosse incriminado pela prática de
determinado comportamento - violaria o art 18º/2 CRP.
Art 2º/2:
Se não aplicarmos a lei posterior que, neste caso é mais favorável a pessoa em causa será presa por algo que outras
pessoas lá fora estarão a fazer livremente - seria uma violação do princípio da igualdade
Art 2º/4:
Mas o facto praticado ao abrigo da L1 continua a ser crime com a entrada em vigor da L2.
O que se passa aqui é que terá uma pena mais baixa, sendo mais favorável para o arguido.
Aplica-se também aos casos de atenuação de pena - em que o legislador diz à comunidade que jia não será
necessário uma pena de 8 anos mas sim de 4 anos para a punição daquele crime, por exemplo.
A partir desse momento, qualquer pessoa que fosse punida com uma pena de mais de 4 anos estaria a ser punida
desnecessariamente.
1. L1 - 3 anos
2. Facto
3. L2 - 2 anos
4. L3 - 3 anos
5. Julgamento
Justifica-se porque:
- Argumento literal - 2º/4 - fala expressamente no plural - “leis posteriores” - fala também das leis intermédias - se
quisesse apenas dizer respeito à última lei diria-o no singular - é preciso considerar todas as leis que venham a
seguir
- No dia da entrada em vigor da L2, aquilo que o arguido recebeu como informação foi que só iria ser punido com
2 anos - iria ser aplicado o art 2º/4 - ganhou essa posição jurídica
Se agora dissermos que vamos retomar os 3 anos é porque tomamos em consideração uma lei
Mas esta L3 é desfavorável - se a tomarmos em consideração estamos a considerar esta lei posterior desfavorável
Vai sempre ser desfavorável porque no momento da entrada da L2 o arguido tinha ganho uma posição mais
favorável
O tomar em consideração esta L3 para julgar o facto era aplicá-la retroativamente de forma desfavorável porque
eliminávamos esta posição mais favorável já anteriormente adquirida pelo arguido - seria uma retroatividade
desfavorável - está proibida pelo 2º/1 + 2º/2 + 2º/4
As leis posteriores só podem ser aplicadas se forem mais favoráveis
Principio da não retroatividade desfavorável - tem de ser o resultado de uma conjugação de
normas
- Violação do principio da igualdade - poderiam gerar-se situações em que 2 factos exatamente iguais
poderiam vir a conhecer penas distintas
Todos devem, portanto, beneficiar da aplicação da lei intermédia mais favorável
Leis Temporárias:
L1 vigora
L2 - relativa a circunstâncias excecionais - agravando a moldura penal para um determinado período de tempo
Volta a vigorar a L1 - quando termina este período de tempo
Porque é que não é uma violação Principio da Aplicação Retroativa da Lei Penal Mais Favorável?
Razão dogmática:
Nos casos típicos de 2º/4 - a lei posterior vais ser retroativamente aplicável por causa do princípio da necessidade
No caso do art 2º/3:
Quando o legislador diz que a L3 passa novamente a ser aplicada ele não está a fazer um juízo sobre a necessidade
da pena - está a dizer que a situação de emergência terminou
Não tem nada a ver com um novo juízo de necessidade da pena - não pensou melhor e achou que agora já eram
necessários menos anos para punir determinado crime.
O legislador continua a achar que os anos definidos estavam bem para aquela situação de emergência
O que acontece é que simplesmente deixou de existir a situação de emergência
Não há uma alteração do juízo do legislador sobre a necessidade da pena, mas simplesmente a situação de
emergência deixa de existir
Apesar de aplicarmos a lei do momento do facto que é mais grave não há uma violação do princípio da
necessidade - O que aconteceu é que a situação subjacente desapareceu porque a lei temporária caducou.
No caso de surgir outra lei temporária dentro do período de situação de emergência que é mais favorável para o
agente - aqui, o legislador quis continuar a manter a situação de emergência e percebe que o novo limite aplicado
à situação excecional era exagerado - neste caso iríamos aplicar a lei mais favorável - vamos conjugar o 2º/3 com o
2º/4
- 2º/3 no sentido de dizer que o que se vai aplicar é o regime temporário - não vamos aplicar o regime posterior
mais favorável
O posterior mais favorável não é aplicado
- 2º/4 - porque dentro da lei temporária vamos aplicar a posterior mais favorável - aqui sempre houve uma
alteração do juízo do legislador acerca da medida da pena
Dentro desse período temporário, ninguém mais vai poder ser punido na medida da 1º lei temporária, por isso
aplica-se a L3 retroativamente - mas dentro do regime temporário
Neste caso já estaríamos perante uma alteração do juízo do legislador sobre a necessidade da pena
Quando a norma inconstitucional é desfavorável não suscita qualquer problema - art 282º3 CRP - a pessoa é
libertada imediatamente - a norma é destruída com eficácia retroativa e é represtinada a norma anterior e o caso
julgado destruído.
Suscitam-se problemas quando esta norma inconstitucional é a mais favorável - aí o art 282º/3 não
resolve expressamente a situação.
2 hipóteses:
A primeira diz respeito aos casos em que a norma mais favorável é uma norma descriminalizadora - TC vem declarar
inconstitucional e o facto é praticado ao abrigo da norma descriminalizadora:
Há 2 soluções
Problema:
É que a norma mais favorável pode não ser descriminalizadora, pode ser desagravadora, passou de 3 para 1 ano
Neste caso não se pode aplicar o 16º e 17º - tinha consciência da ilicitude porque a lei naquele momento
criminalizava - pensava que era até um ano e agora tem a possibilidade de vir a passar 3 anos presa.
Para estas situações o prof. Rui Pinto diz que se aplica a norma represtinada mas em conjugação com os 71º e ss do
CP - regulam a determinação concreta da medida da pena
Aplicamos a norma antiga com esses artigos no sentido de calcularmos a medida concreta desta pena de forma a
que nunca ultrapasse o limite da lei inconstitucional mais favorável
Crítica:
Não estaremos da verdade a aplicar a lei inconstitucional?
O facto é praticado ao abrigo da norma criminalizadora e a norma mais favorável é a norma posterior que o
TC declara a inconstitucional:
2 Hipóteses:
Crimes Permanentes:
Pode acontecer que algures durante a permanência do crime entre em vigor uma nova lei
A L1 - 1 ano
L2 - passa a dizer 3 anos
Depois eu sou julgado
Inês Morais FDL Página 10 de 15
Vamos aplicar a lei mais grave - contraria a ideia errada de que se aplica sempre a lei mais favorável - princípio que
não existe
Aqui vamos aplicar a lei mais grave
Ambas as leis são leis do momento da prática do facto
Aqui nem sequer há lei posterior
Faz sentido aplicar a dos 3 anos porque o que é proibido em direito penal é aplicação de leis mais graves de forma
retroativa - aqui nãos passa porque foi preenchida pelo comportamento que o agente teve após a entrada em vigor
da lei
Depois da entrada em vigor da lei mais grave continuou a praticar o crime.
Que razão é que haveria para não lhe ser aplicável a lei mais grave?
Vamos é ter de aplicar o juízo mais atual do legislador sobre a necessidade punitiva porque não o estamos a atuar
retroativamente - conseguimos preencher com o seu comportamento essa mesma lei
O desconhecimento da lei aproveita a ninguém - excepto nos caos do art 17º mas só esse - falta de consciência de
ilicitude - é mesmo muito muito raro
A regra é que tinha de saber
Nos crimes permanentes só há um crime
O critério é:
Aplica-se a lei anterior salvo se após a entrada em vigor da lei nova o comportamento do agente preencher todos os
pressupostos da lei nova.
Tomando sempre em consideração o comportamento que ocorreu após a entrada de lei nova.
Exemplo:
Condução sobre efeito álcool - crime abstrato
Há 1 facto
Depois a norma é transformada num crime de perigo concreto - conduzir sobre o efeito do álcool e causar perigo
par a vida de alguém
Pessoa que é julgada depois, sendo certo que conduziu sobre o efeito do álcool e causou perigo para uma pessoa -
preenchia as duas leis
Posições Doutrinárias:
MV - acha que o perigo concreto é verdadeiramente novo e não está contido na potencialidade de crime
O perigo abstrato é uma característica do comportamento - é perigoso - característica do comportamento
O perigo concreto não é uma característica, é um resultado do meu comportamento - evento externo que resulta do
meu comportamento
Comportamento foi conduzir sobre efeito do álcool o perigo para a velhota é um resultado do comportamento de
perigo
Elemento verdadeiramente novo e que por isso não se aplica retroativamente.
Inês Morais FDL Página 12 de 15
Discussão:
Perigo concreto elemento verdadeiramente novo nao se aplica retroativamente
MV - só considera a descriminalização porque o perigo concreto é verdadeiramente novo - é especializador
So faz sentido porque considera que foi indordunzido ex novo - só pode valer para o futuro em sentido
despenalizador
Só quando o elemento é verdadeiramente novo - especializador - é que não pode ser aplicado retroactivamente
MFP - vem dizer que já estava contido antes - é meramente especificador
MFP - vigora a lei da pratica do facto a não ser que haja uma posterior mais favorável
Exemplo:
L1 - crime furto de valor significativo
L2 - crime furto de pelo menso 5 000 euros
O elemento que foi apresentado já não é um elemento verdadeiramente novo - não é especializador mas sim
meramente especificador - vem concretizar qualquer coisa que já existia antes
Aqui, para o Prof. MV já não é descriminalizador - aplica-se a lei geral
Lógica e ideia de que não há uma diferença qualitativa entre o crime e a contraordenação - existe
qualitativamente uma aproximação entre os dois ilícitos - têm mesma natureza sancionatória
Por razões de oportunidade e eficácia nuns casos, o Estado entende que deve criminalizar, noutros deve aplicar
apenas uma contraordenação
Parte da ideia de continuidade normativa entre o crime e a contraordenação podemos dizer que não é um
ilícito verdadeiramente novo, é qualquer coisa que já vinha de trás e já continuava
O que o legislador fez foi apenas reduzir a sua intensidade
Ideia de que continua o ilícito e é simplesmente desagravado- é a lógica do art 2º/4 - aplicar retroativamente a lei
penal posterior mais favorável
Crimes de Prescrição:
Tribunal Constitucional que sendo uma lei desfavorável não se pode aplicar retroactivamente
A prescrição tem a ver com o momento relativo ao qual o Estado pode intervir para punir - não tem nenhuma
expectativa tutelada
Em Portugal, o TC aplica as regras gerais.
1º Passo - Ver o que é que essa alteração faz ao tipo de crime em abstrato
Pode fazer uma de 3 coisas:
1. Pode estar a alargar o âmbito típico - Normalmente através de:
- Supressão de elemento de verificação cumulativa
- Acrescentando-se um de verificação alternativa
2. Pode estar a restringir o âmbito típico (agora abrange menos crimes) - Normalmente isto faz-se:
- Acrescentando um elemento de verificação cumulativa.
- Eliminando/suprindo um elemento de verificação alternativa.
3. Pode estar a substituí-lo por outro
2º Passo - Ver o que é que a alteração fez ao tipo de comportamento do agente (o que é que acontece ao tipo de
comportamento que o agente tem com esta LN?)
3º Passo - O que é que a lei faz ao comportamento concreto do agente, já não é ao tipo de comportamento que
adotou: é o que fez mesmo no caso concreto.