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LEI PENAL

NO TEMPO
Noção
A lei começa a vigorar em todo o país 45 dias depois de oficialmente
publicada (art. 1º, LINDB).
O período entre o dia da publicação da lei e sua entrada em vigor é chamado
“vacatio legis”.
Após ingressar no ordenamento jurídico, vigora até que seja revogada por
outra lei (princípio da continuidade das leis – art. 2º, LINDB).

Regra penal
Praticado um delito, aplica-se a lei penal que estava em vigor no exato
instante do cometimento da infração penal (princípio “tempus regit
actum”).

# E quando se considera praticado um crime?


Teorias – Lei penal no tempo

Atividade Resultado Ubiquidade

Considera-se praticado Considera-se praticado Considera-se praticado


o crime no momento da o crime no momento do o crime no momento da
conduta. resultado. conduta ou do
resultado.
Tempo do crime
Art. 4º - Considera-se praticado o crime no momento da ação ou
omissão, ainda que outro seja o momento do resultado.

Regra
O CP acolheu a teoria da atividade.
Se a infração considera-se praticada no momento da conduta, ainda
que outro seja o resultado, a lei aplicável será a vigente à época
da ação ou da omissão (“tempus regit actum”).
Exceção
Em razão do surgimento de várias leis penais entre a data do crime e
o término do cumprimento da pena (sucessão de leis penais no tempo),
é possível aplicar uma lei a um fato praticado sob a égide de outra
lei.

Trata-se do fenômeno da extratividade, ou seja, uma lei é aplicada a


fatos cometidos antes de sua entrada em vigor (retroatividade) ou
depois de cessada sua vigência (ultra-atividade).

Obs1. A extratividade pressupõe sucessão de leis penais.


Obs2. É admitida apenas para favorecer o agente.
Obs3. Não tem aplicação na lei excepcional e temporária
Extratividade da lei penal benéfica:

• Retroatividade:
Aplica-se a fatos anteriores a sua chegada no ordenamento jurídico.

• Ultra-atividade:
Ocorre quando a lei é revogada e continua a regular fatos que
ocorreram enquanto estava vigente.
Constituição Federal
Art. 5º, XL: A lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu.

Obs1. A lei penal benéfica é dotada de extratividade, podendo ser


aplicada a fatos ocorridos fora da sua época de vigência, seja antes
ou depois.

Obs2. Essa previsão constitucional está em sintonia com a Convenção


Americana de Direitos Humanos (art. 9º).
Ninguém pode ser condenado por ações ou omissões que, no momento em
que forem cometidas, não sejam delituosas, de acordo com o direito
aplicável. Tampouco se pode impor pena mais grave que a aplicável no
momento da perpetração do delito. Se depois da perpetração do delito
a lei dispuser a imposição de pena mais leve, o delinquente será por
isso beneficiado.
Conflito de leis penais no tempo

1) Nova lei incriminadora (novatio legis incriminadora)

Surge uma nova lei criando uma infração penal (neocriminalização).


É o que está previsto no art. 9º da CADH e no art. 1º, CP.

Anterioridade da lei penal


Art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem
prévia cominação legal

Consequência: Jamais retroage, pois é prejudicial (mais gravosa).


Ex. A Lei 13.869/19, em seu art. art. 33, parágrafo único, tipificou
como abuso de autoridade a “carteirada”. Antes da inovação
legislativa tal comportamento constituía infração administrativa.
Nessa ótica, o art. 33, parágrafo único, não pode retroagir para
atingir fatos ocorridos antes da sua entrada em vigor.
2) Lei penal mais grave (lex gravior ou novatio legis in pejus)
Nova lei que, de qualquer modo, prejudica o agente.
Ex. Prevê pena maior ou amplia o prazo de prescrição etc.

Consequência: Jamais retroage (art. 5º, XL, CF).


Ex1. Roubo com emprego de arma branca
Ex2. Roubo com emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido.
ROUBO MEDIANTE EMPREGO DE
ARMA BRANCA


Antes do Pacote Atualmente
Anticrime (desde 23/01/2020)

Não era causa de Aumenta a pena (1/3 a ½)


aumento de pena Art. 157, § 2º, VII, CP
ROUBO MEDIANTE EMPREGO DE
ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO OU PROIBIDO

Antes do Pacote Atualmente



Anticrime (desde 23/01/2020)

Aumento da pena em 2/3 Aumenta a pena em dobro

(art. 157, § 2º-A, (art. 157, § 2º-B, CP)


inciso I)
Juiz de Direito – PR - 2021
João subtraiu o celular de Maria, no dia 24/12/2019, mediante grave
ameaça consistente na promessa de ofender sua integridade corporal,
exercida com o emprego de uma faca de 22 cm de lâmina. A ação foi
percebida por guardas municipais, em patrulhamento, que detiveram João de
imediato, ainda com a faca na mão e com o celular subtraído.
A tipicidade adequada dessa conduta é:
a) roubo simples tentado;
b) roubo simples consumado;
c) roubo qualificado pelo emprego de arma;
d) roubo qualificado pelo emprego de arma branca, tentado;
e) roubo qualificado pelo emprego de arma branca, consumado.

Gabarito:
3) Lei penal mais benéfica (lex mitior ou novatio legis in mellius)

A nova lei diminui a pena, reduz o prazo de prescrição ou retira


uma causa de aumento, por exemplo.

Previsão legal: art. 2º, parágrafo único, CP.

Consequência: Sempre retroage (art. 5º, XL, CF).


4. Abolitio criminis
É a descriminalização da conduta.
É a retirada do crime do ordenamento jurídico.
Ex. crime de adultério (art. 240 do CP)

Previsão legal: art. 2º, caput, CP.


Consequência: Sempre retroage.
Abolitio criminis
Código Penal
Art. 2º. Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa
de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os
efeitos penais da sentença condenatória.
Obs1. A abolitio criminis é causa extintiva da punibilidade (art.
107, III, CP) e apaga os efeitos penais da sentença condenatória.
Obs2. Como os efeitos penais desaparecem, se o agente praticar novo
crime não será considerado reincidente.
Obs3. A obrigação de indenizar o dano causado pelo crime permanece,
pois os efeitos extrapenais não desaparecem.
Nova lei mais benéfica
Art. 2º (...)
Parágrafo único: A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o
agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por
sentença transitada em julgado.

Obs. Por serem mais benéficas, não respeitam a coisa julgada.


O que vem a ser a abolitio criminis temporária?

Súmula 513 do STJ


A abolitio criminis temporária prevista na Lei n.
10.826/2003 aplica-se ao crime de posse de arma de
fogo de uso permitido com numeração, marca ou
qualquer outro sinal de identificação raspado,
suprimido ou adulterado, praticado somente até
23/10/2005.
Durante o prazo estipulado (de 23.12.2003 até
23.10.2005), verificou-se a abolitio criminis
temporária em relação aos crimes previstos nos arts.
12 e 16 da Lei 10.826/03 (posse de arma de fogo de
uso permitido e restrito).
Fique atento!
A “abolitio criminis” temporária também é chamada
de “descriminalização temporária” ou “vacatio
Questão: Qual a diferença entre a abolitio criminis e o princípio
da continuidade normativa?
Abolitio criminis Princípio da continuidade
normativa

Descriminalização da conduta Supressão formal, porém, com a manutenção


(supressão formal e material do crime) do crime no ordenamento jurídico.

O fato deixa de ser punível A conduta criminosa migra para outro tipo
penal

A i n t e n ç ã o d o l e g i s l a d o r é n ã o m a i s O legislador visa manter o fato como


considerar o fato como infração penal infração penal.

Ex. Revogação do crime de adultério (art. Ex. Com o advento da Lei 12.015/09, o
240, CP) pela Lei 11.106/2005. crime de atentado violento ao pudor (art.
214, CP) passou a ser tipificado no art.
213, CP, ampliando o conceito de estupro.
Atenção!
O princípio da lei penal mais benigna também se estende ao que a
doutrina chama de “lei intermediária”.

Lei intermediária
É aquela que não estava vigendo ao tempo do fato, tampouco no
momento do julgamento, ou seja, é aquela que “nasce e morre”
entre a conduta e a decisão judicial.

Se ela for benigna, será dotada de duplo efeito:


a) retroatividade em relação ao tempo da conduta;
b) ultra-atividade em relação ao tempo do julgamento.
É possível a combinação/conjugação de leis penais
(lex tertia), em benefício do réu?

Súmula 501, STJ


É cabível a aplicação retroativa da Lei n.
11.343/2006, desde que o resultado da incidência
da s su as di s posi ç ões , na ínt e g r a , s e j a m a i s
favorável ao réu do que o advindo da aplicação da
Lei n. 6.368/1976, sendo vedada a combinação de
leis.

Obs. O Código Penal Militar proíbe expressamente a


combinação de leis (art. 2º, § 2º).
Como proceder se houver dúvida sobre qual a lei
mais benéfica?
R - Deve-se consultar o réu para que indique, por
meio do seu defensor, qual a norma que efetivamente
o beneficia.
Quem aplica a lei penal mais benéfica?

• 1ª instância:

• Grau de recurso ou competência originária no


Tribunal:

• Condenação transitou em julgado:
STF, Súmula 611
Transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao juízo das
execuções a aplicação de lei mais benigna.

Obs. Apesar dessa súmula, a doutrina ensina que o juiz das


execuções só terá competência para aplicar a lei mais benéfica
quando a aplicação da norma depender de mera operação matemática.
Se for necessário juízo de valor para aplicação da lei mais benigna,
ou seja, uma nova avaliação do mérito, o interessado deverá ajuizar
revisão criminal (art. 621, CPP) para desconstituir o trânsito em
julgado, cabendo ao Tribunal Competente aplicar a lei nova.
Aplica-se a lei penal mais benéfica se ela ainda
está em período de vacatio legis?
1C) Sim, porque esse período existe para que a lei
se torne conhecida. Portanto, não faz sentido que
aqueles que já se inteiraram da nova lei não sejam
alcançados pelos seus preceitos mais benignos. O
período de “vacatio” se revela indispensável
apenas para as normas prejudiciais (Alberto Silva
Franco).
2C) Não, porque ainda não há lei com eficácia
jurídica ou social, mas mera expectativa de lei
(majoritária).
Suponha que um roubo tenha sido praticado com
emprego de arma de brinquedo em setembro de 2001.
Nessa ocasião, o STJ possuía entendimento sumulado
no sentido de que esse roubo seria majorado (STJ,
174). Ocorre que a Corte cancelou a referida súmula.
Questiona-se: Os fatos pretéritos, julgados com o
aumento, poderiam ser beneficiados com a alteração
desse entendimento jurisprudencial?
Em outras palavras, admite-se a retroatividade da
jurisprudência?
1C) Não, pois a CF se refere apenas à retroatividade da lei. A regra da
extratividade da norma mais benéfica, portanto, aplica-se somente à lei e
não à jurisprudência.
Nesse sentido, orienta-se o STF e o STJ.
Não há se falar em irretroatividade de interpretação jurisprudencial, uma
vez que o ordenamento jurídico proíbe apenas a retroatividade da lei
penal mais gravosa. Os preceitos constitucionais relativos à aplicação
retroativa da norma penal benéfica, bem como à irretroatividade da norma
mais grave ao acusado (art. 5º, XL, da Constituição Federal), são
inaplicáveis aos precedentes jurisprudenciais.
STF. 1ª Turma. HC 161452 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 6/3/2020;
STJ. 5ª Turma. AgRg nos EDcl no AREsp 1361814/RJ, Rel. Min. Reynaldo
Soares da Fonseca, julgado em 19/05/2020).
STJ: “A mudança de entendimento jurisprudencial posterior ao trânsito em
julgado, da condenação não autoriza o ajuizamento da Revisão criminal
visando sua aplicação retroativa” (AgRg no Resp 1816088/RS, Rel.
Min.Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª T, j. 06/08/2019).
2C) Sim, pois a modificação de jurisprudência também deve retroagir
para beneficiar o réu, desde que represente um entendimento
consolidado (Paulo César Busato, Juarez Tavarez; Luiz Flávio Gomes
e Antonio Molina).

Ex. Súmula 554 do STF


“O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos, após o
recebimento da denúncia, não obsta ao prosseguimento da ação
penal”.
Interpretada a contrário senso, o STF está dizendo que o pagamento
de cheque sem fundos antes da denúncia acarreta a extinta da
punibilidade. Note que essa súmula está criando uma causa extintiva
da punibilidade não prevista em lei. Logo, deve retroagir para
alcançar fatos anteriores.

Obs. Essa posição confirma nosso entendimento de que a


Questão: A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou
crime permanente?

STF, Súmula 711


A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime
permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade
ou da permanência.
Aprofundando o tema: Reflexos do crime permanente

1. Cabe prisão em flagrante a qualquer tempo;

2. A prescrição começa a correr da data em que a permanência cessa


(art. 111, inc. III, CP);

3. Se surgir uma lei mais grave durante a ação que está se


prolongando no tempo ela será aplicável.
Tema
Lei excepcional ou temporária
(art. 3º, CP)
• Lei excepcional:
Criada para vigorar apenas durante alguns períodos anormais (Ex.
guerra, calamidade pública etc).

• Lei temporária:
Criada para durar um período fixo de tempo.
Lei 12.663/2012
Art. 36. Os tipos penais previstos neste Capítulo terão vigência
até o dia 31 de dezembro de 2014.

Lei 13.285/16
Art. 23. Os tipos penais previstos neste Capítulo terão vigência
até o dia 31 de dezembro de 2016.
Características:

• Autorrevogáveis: não precisam aguardar a revogação por outra lei.

• Ultrativas: aplicam-se aos fatos praticados durante a sua vigência


mesmo após revogadas, ainda que sejam prejudiciais ao réu.
Código Penal
Art. 3º. A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o
período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a
determinaram, aplica-se ao fato praticado durante a sua vigência.

Obs. As leis excepcionais e temporárias também são conhecidas como


“leis intermitentes”.
Insista, persista e nunca desista.

Obrigado e até a próxima, futuro(a) colega!

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