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DIREITO PENAL
PROF. NIDAL AHMAD
SUMÁRIO
01.TEORIA DA NORMA ........................................................................................................... 2
02. CRIMES OMISSIVOS, NEXO DE CAUSALIDADE, DOLO E CULPA ................... 18
03. MÉRITO E DIREITO MATERIAL: TIPICIDADE ........................................................ 58
04. MÉRITO E DIREITO MATERIAL: EXCLUDENTE DE ILICITUDE E
CULPABILIDADE ................................................................................................................... 79
5. CONCURSO DE PESSOAS............................................................................................ 106
06. TEORIA DA PENA .......................................................................................................... 111
07. PARTE GERAL - LIVRAMENTO CONDICIONAL, EFEITO DA SENTENÇA
PENAL CONDENATÓRIA, MEDIDA DE SEGURANÇA ............................................. 146
9. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE....................................................................................158
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Deve ser aplicada a lei X, porquanto a lei Y é mais severa, incidindo, no
caso, o princípio da irretroatividade da lei mais severa. Portanto, é possível a
aplicação de uma lei não obstante cessada a sua vigência, desde que mais
benéfica que a lei posterior. Esse fenômeno chama-se ultratividade, que, em
última análise, quer dizer que se a lei antiga for mais favorável, prevalecerá ao
tempo da vigência da lei nova, mesmo estando revogada.
Ex2: “B” realiza uma conduta punível sob a vigência de lei X, que comina
pena de 2 a 4 anos de reclusão. Na ocasião de ser proferida a sentença, passa a
vigorar a lei Y, determinando, para o mesmo comportamento, a pena de reclusão
de 1 a 4 anos. Qual a lei a ser observada, a anterior, mais severa, ou a posterior,
mais benigna?
Aplica-se a lei mais benigna prevalece sobre a mais severa, prolongando-
se além do instante de sua revogação ou retroagindo ao tempo em que não tinha
vigência. É a retroatividade da lei mais benéfica.
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execução, já que a sentença penal condenatória transitada em julgado constitui
título executivo.
Imaginemos que o agente tenha sido definitivamente condenado pelo
crime de sedução (art. 217 do CP) em 2004, que deixou de ser crime pela Lei
11.106/2005. Se esse agente praticar um crime de furto em 2007, por exemplo, não
será considerado reincidente, pois a Lei 11.106/2005 aboliu do ordenamento
jurídico o crime de sedução, apagando todos os efeitos da sentença penal
condenatória.
No entanto, a vítima seduzida poderia buscar a reparação de danos na
esfera cível.
* Para todos verem: esquema
Fato deixa de
ser crime
Cessam todos
os efeitos
penais
Abolitio
Criminis
Permanecem
os efeitos
cíveis
Causa de
extinção da
punibilidade
1.2.2. NOVATIO LEGIS IN MELLIUS
Além da abolitio criminis, a lei nova pode favorecer o agente de várias
maneiras. A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos
fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em
julgado (CP, art. 2, parágrafo único).
Assim, se a lei nova, por exemplo, reduzir a pena mínima de uma
determinada infração penal ou passar a prever benefício até então inexistente,
deverá retroagir para alcançar os fatos praticados antes da sua vigência, ainda
que tenha sido proferida sentença transitada em julgado.
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1.2.3. NOVATIO LEGIS INCRIMINADORA
A lei nova incrimina fatos antes considerados lícitos (novatio legis
incriminadora).
A novatio legis incriminadora, ao contrário da abolitio criminis, considera
crime fato anteriormente não incriminado, e somente irá gerar efeitos para fatos
praticados após à sua vigência, razão pela qual não retroage para alcançar fatos
praticados antes da sua vigência.
A Lei n. 10.224, de 15 de maio de 2001, tornou crime de assédio sexual a
conduta de constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou
favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior
hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função,
o que até então era um indiferente penal, sendo tal situação resolvida,
invariavelmente, em outra área do direito, notadamente na esfera ou trabalhista.
Por conferir tratamento severo, a novatio legis incriminadora, por
evidente, não retroage para alcançar fatos praticados antes da sua vigência,
tendo eficácia, portanto, somente em relação aos fatos praticados a partir da sua
vigência.
1.2.4. NOVATIO LEGIS IN PEJUS
A quarta hipótese refere-se à nova lei mais severa a anterior (a nova lei de
drogas, Lei n. 11.343/06, no art. 33, aumentou a pena do crime de tráfico de
drogas). Incide, no caso, o princípio da irretroatividade da lei penal: "a lei penal
não retroagirá, salvo para beneficiar o réu" (CF/88, art. 5º, XL).
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EM RESUMO
* Para todos verem: mapa mental sobre Lei Penal no tempo
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cativeiro, sobrevém lei nova elevando a pena mínima do crime de extorsão mediante
sequestro, essa lei incidirá sobre o fato, ainda que tenha conferido tratamento mais
severo.
Súmula 711 do STF: “A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou
ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da
continuidade ou da permanência.”
2.4.2. Características
A) São autorrevogáveis
Em regra, uma lei somente pode ser revogada por outra lei, posterior, que a
revogue expressamente, que seja com ela incompatível ou que regule integralmente a
matéria nela tratada.
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As leis de vigência temporária constituem exceção a esse princípio, visto que
perdem sua vigência automaticamente, sem que outra lei as revogue.
B) São ultrativas
A ultratividade significa que uma lei revogada continua gerando efeitos. É o caso
da lei temporária e lei excepcional, que continuarão gerando efeitos em relação aos fatos
praticados durante sua vigência, mesmo após de revogadas.
* Para todos verem: esquema sobre lei temporária e lei excepcional: autorrevogáveis/ultratividade
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2.5. DO TEMPO DO CRIME – Art. 4º
A análise do âmbito temporal da aplicação da lei penal necessita da fixação do
momento em que se considera o delito cometido.
O Código Penal adotou a teoria da atividade, segundo a qual se reputa praticado
o delito no momento da conduta, não importando o instante do resultado.
Diante disso, se, por exemplo, o agente, ao tempo da ação, contava com 17 anos,
11 meses e 25 dias, de idade, efetua disparos de arma de fogo contra a vítima, que vem a
falecer 10 dias depois, devemos indagar se incidirão as normas de direito penal ou as
normas relativas ao Estatuto da Criança e Adolescente.
Nesse caso, considerando-se a teoria da atividade, incidirão as normas do
Estatuto da Criança e Adolescente, Lei n. 8.069/90, uma vez que, ao tempo da ação, o
agente era menor de 18 anos e, portanto, inimputável, não incidindo, assim, normas do
Código Penal. Em outras palavras, ficará afastada a aplicação da lei penal, podendo o
agente ser submetido a medida socioeducativa.
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A expressão “deveria produzir-se o resultado” refere-se às hipóteses de tentativa.
Aplica-se a lei brasileira ao crime tentado cuja conduta tenha sido praticada fora dos
limites territoriais (ou do território por extensão), desde que o impedimento da
consumação se tenha dado no País.
Assim, na hipótese de o agente, que se encontra na cidade brasileira de Santana
do Livramento/RS, efetuar disparos contra a vítima que se encontra na cidade de Rivera,
em solo Uruguaio, separada por uma rua do Município brasileiro, vindo este a falecer,
aplica-se a lei penal brasileira, já que os atos executórios do crime foram praticados em
território brasileiro, embora o resultado tenha sido produzido em país estrangeiro.
Da mesma forma, se um Americano, residente na Argentina, envia uma carta-
bomba a um brasileiro, que se encontra no Rio de Janeiro, vindo o engenho a explodir
no momento em que a vítima abriu o pacote que a continha, resultando na sua morte,
também aplica-se a lei penal brasileira, já que os atos executórios foram praticados no
estrangeiro e o resultado se produziu em território brasileiro.
* Para todos verem: esquema sobre tempo e lugar do crime. Tempo do crime: teoria da
atividade. Lugar o crime: teoria da ubiquidade.
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Territorialidade: é a regra. Ao crime cometido no território nacional, aplica-se a
lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional,
conforme art.5º e seus parágrafos.
3.7.2. TERRITÓRIO BRASILEIRO POR EQUIPARAÇÃO (EMBARCAÇÕES E
AERONAVES)
Nos termos do artigo 5º, § 1º, do CP, duas situações de território brasileiro por
equiparação:
A) embarcações e aeronaves brasileiras de natureza pública ou a serviço do
governo brasileiro onde estiverem.
B) embarcações e aeronaves brasileiras, de propriedade privada, que
estiverem navegando em alto-mar ou sobrevoando águas internacionais.
Nesse contexto, se, por exemplo, um Oficial da Marinha do Brasil é assassinado
por um marinheiro dentro da embarcação pública brasileira, que se encontrava atracada
num Porto dos Estados Unidos, aplica-se a lei brasileira, uma vez que, para efeitos penais,
consideram-se como extensão do território brasileiro as embarcações de natureza
pública, onde quer que se encontrem.
De outro lado, se durante um cruzeiro marítimo em embarcação privada
brasileira, cruzando alto-mar, um turista resolve provocar lesão corporal em outro turista,
incidirá a lei penal brasileira, uma vez que, para efeitos penais, consideram-se como
extensão do território brasileiro as embarcações de natureza privada que estiverem
navegando em alto-mar.
Os navios estrangeiros em águas territoriais brasileiras, desde que públicos, não
são considerados parte do nosso território. Em face disso, os crimes neles cometidos
devem ser julgados de acordo com a lei da bandeira que ostentam. Se, entretanto, são
de natureza privada, aplica-se a lei brasileira (art. 5º, § 2º).
* Para todos verem: esquema
Pública ou serviço
Onde quer que
de governo
estejam
brasileiro
Território nacional Embarcação ou
extensão aeronave
Privado Alto-mar
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* Para todos verem: mapa mental sobre Aplicação da Lei Penal
3.8. EXTRATERRITORIALIDADE
Extraterritorialidade: é uma exceção. Mesmo que o crime seja cometido fora do
Brasil, os agentes se sujeitam à lei brasileira, nas hipóteses mencionadas no art. 7º, do
CP, quais sejam:
* Para todos verem: quadro
EXTRATERRITORIALIDADE INCONDICIONADA
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autarquia ou fundação instituída
pelo Poder Público;
c) contra a administração pública,
por quem está a seu serviço;
d) de genocídio, quando o agente
for
brasileiro ou domiciliado no Brasil;
EXTRATERRITORIALIDADE CONDICIONADA
a) que, por tratado ou convenção, o Nestes casos, a aplicação da lei brasileira depende
Brasil se obrigou a reprimir; do concurso das seguintes condições:
a) entrar o agente no território nacional;
b) praticados por brasileiro;
b) ser o fato punível também no país em que
c) praticados em aeronaves ou foi praticado;
embarcações brasileiras, mercantes c) estar o crime incluído entre aqueles pelos
quais a lei brasileira autoriza a extradição;
ou de propriedade privada, quando
d) não ter sido o agente absolvido no
em território estrangeiro e aí não estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena;
sejam julgados. e) não ter sido o agente perdoado no
estrangeiro ou, por outro motivo, não estar
extinta a punibilidade,
segundo a lei mais favorável.
Cometido por estrangeiro contra se, reunidas as condições:
a) entrar o agente no território nacional;
brasileiro fora do Brasil.
b) ser o fato punível também no país em que foi
praticado;
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos
quais a lei brasileira autoriza a extradição;
d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro
ou não ter aí cumprido a pena;
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro
ou, por outro motivo, não estar extinta a
punibilidade, segundo a lei mais favorável.
+
a) não foi pedida ou foi negada a extradição;
b) houve requisição do Ministro da
Justiça.
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* Para todos verem: mapa mental sobre Extraterritorialidade da Lei Penal
Contra a vida ou a
liberdade do Presidente da
República
Contra patrimonio ou a fé
pública da Administração
Pública
Incondicionada
Art. 7º, I, do CP
Contra a Administração
Pública, por quem está a
seu serviço
De genocídio, quando o
agente for brasileiro ou
Extraterritorialidade domiciliado no Brasil
Condicionada
Praticados por brasileiro
Art. 7º, II, CP
Praticados em aeronaves ou
embarcações brasileiras, mercantes
ou de propriedade privada, quando
em território estrangeiro e aí não
sejam julgados
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4. Conflito aparente de normas
4.9.1. CONCEITO
É o conflito que se estabelece entre duas ou mais normas aparentemente
aplicáveis ao mesmo fato. Há conflito porque mais de uma norma pretende regular o
fato, mas é aparente, porque apenas uma delas acaba sendo aplicada à hipótese.
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B) PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE
B.1) Conceito de norma subsidiária
Uma norma é considerada subsidiária à outra, quando a conduta nela prevista
integra o tipo da principal, significando que a lei principal afasta a aplicação da lei
secundária.
Há relação de subsidiariedade entre normas quando descrevem graus de violação
do mesmo bem jurídico, de forma que a infração definida pela subsidiária, de menor
gravidade que a da principal é absorvida por esta.
O crime de ameaça (CP, art. 147) cabe no de constrangimento ilegal mediante
ameaça (CP, art. 146), o qual, por sua vez, cabe dentro da extorsão (art. 158). O sequestro
(art. 148) no de extorsão mediante sequestro (CP, art. 159). O disparo de arma de fogo (Lei
10.826/2003, art. 15) cabe no de homicídio cometido mediante disparos de arma de fogo
(CP, art. 121). Há um único fato, o qual pode ser maior do que a norma subsidiária, só se
pode encaixar na primária.
B.2) Espécies
a) Subsidiariedade Expressa ou explícita
Ocorre quando a própria lei indica ser a norma subsidiária de outra. Quando a
norma, em seu próprio texto, subordina a sua aplicação à não-aplicação de outra, de
maior gravidade punitiva.
A própria norma reconhece expressamente seu caráter subsidiário, admitindo
incidir somente se não ficar caracterizado fato de maior gravidade.
Ex. Art. 132 - Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente:
Pena - detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais
grave.
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ao crime de estupro (art. 213 do Código Penal). Assim, se no caso concreto, o crime mais
grave (art. 213 do Código Penal) não restar caracterizado, ou seja, não ficar demonstrado
que o constrangimento não teve por finalidade violar a dignidade sexual da vítima, pode-
se aventar a incidência do crime de constrangimento ilegal (art. 146 do Código Penal).
C) PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO
Conforme o princípio da consunção, ou da absorção, o fato mais abrangente e
grave consome, absorve, o fato menos abrangente e grave que figuram como meio
necessário ou normal fase de preparação ou execução de outro crime, bem como
quando constitui conduta anterior ou posterior do agente, cometida com a mesma
finalidade prática atinente àquele crime. Nesse caso, a norma consuntiva prevalece
sobre a norma consumida. Trata-se da hipótese de o crime meio ser absorvido pelo
crime fim.
O conflito aparente de normas se reflete na relação de continente e conteúdo,
entre a norma mais abrangente e grave e a norma que prevê conduta que serve de meio
necessário ou fase de execução de outro crime. Ou, ainda, após consumar o crime visado,
praticou nova conduta prevista em tipo penal específico e menos abrangente, mas que
constitui mero exaurimento do crime.
Prevalece, nessa hipótese, a norma penal que define o crime mais abrangente,
que absorverá a norma que prevê conduta de menor amplitude, evitando-se a
incidência do bis in idem. Assim, se o agente, para matar a vítima, porta ilegalmente
arma de fogo, o conflito aparente entre as normas que definem os crimes de homicídio
(art. 121 do Código Penal) e porte ilegal de arma de fogo (art. 14 da Lei 10.826/2003) é
solucionado pelo princípio da consunção, na medida em que o crime de homicídio
absorve o crime de porte ilegal de arma de fogo, que serviu como mero meio necessário
para consumação do crime mais grave.
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* Para todos verem: mapa mental sobre Conflito aparente de normas
1.1 Conduta
1.1.1. Introdução
Para a caracterização da conduta, sob qualquer aspecto, é indispensável a
existência do binômio vontade e consciência.
Se o agente age sem vontade dirigida a uma finalidade ou sem consciência, não
haverá conduta punível. Não havendo conduta punível, não há fato típico e, por
conseguinte, não haverá crime.
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1.1.2. Ausência de conduta
A doutrina costuma apontar algumas causas de exclusão da conduta, dentre
elas destacam-se as seguintes:
a) Coação física irresistível (“vis absoluta”)
Ocorre quando o sujeito pratica o movimento em consequência de força
corporal exercida sobre ele. Quem atua obrigado por uma força irresistível não age
voluntariamente. Neste caso, o agente é mero instrumento realizador da vontade do
coator.
A força física que recai sobre o agente pode partir da ação de uma terceira
pessoa, que seria a figura do coator. Imaginemos que uma pessoa empurra outra contra
objetos ou até mesmo contra outras pessoas. Nessa hipótese, a pessoa empurrada
fisicamente danificar objetos ou lesionar pessoas não será responsabilizada por eventual
crime de dano (CP, art. 163) ou lesão corporal (CP, art. 129), pois agiu sem vontade e,
portanto, sem dolo ou culpa.
Em síntese, na coação física irresistível, não há vontade; não havendo vontade,
não há conduta. Não havendo conduta, não há fato típico. Não havendo fato típico, não
há crime. Logo, o fato praticado pelo fisicamente coagido é atípico. Não responderá por
nenhum crime.
Diversa é a situação, contudo, quando se tratar de coação moral.
Na coação moral, não há aplicação da força física, mas de ameaça ou
intimidação, feita através da promessa de um mal, para que se determine o coato à
realização do fato criminoso. O coagido poderá optar.
No caso da coação moral, o fato é revestido de tipicidade, mas não é culpável,
em face da inexigibilidade de conduta diversa.
Portanto, existe o fato típico, pois a ação é juridicamente relevante, mas não há
falar em culpabilidade, aplicando-se a regra do art. 22, 1ª parte, do Código Penal (causa
de exclusão da culpabilidade).
Em síntese:
➢ Coação física irresistível: causa de exclusão da tipicidade
➢ Coação moral irresistível: causa de exclusão da culpabilidade
➢ Coação moral resistível: atenuante (art. 65, III, “c”, CP)
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* Para todos verem: esquema
Sujeito é
Sujeito é
Sujeito é forçado ameaçado ou
ameaçado ou
fisicamente a intimidado a
intimidado a
praticar o fato praticar o fato
praticar o fato
típico típico, mas poderia
típico
resistir
CAUSA DE CAUSA DE
ATENUANTE (ART.
EXCLUSÃO DA EXCLUSÃO DA
65, III, "C", CP)
TIPICIDADE CULPABILIDADE
b) Movimentos reflexos
Os atos reflexos não dependem da vontade, uma vez que são reações motoras,
secretórias ou fisiológicas, produzidas pela excitação de órgãos do corpo humano.
Nestes casos, o estímulo exterior é recebido pelos centros sensores, que o
transmitem diretamente aos centros motores, sem intervenção da vontade, como
ocorre, por exemplo, em um ataque epilético, tosse ou espirro. De fato, os atos reflexos
não dependem da vontade, uma vez que são reações motoras. Não havendo vontade,
não há conduta punível, sendo, portanto, o fato atípico.
Imaginemos a hipótese do condutor de veículo automotor que não conseguiu
controlar um espirro e, por frações de segundos, desviou a direção, chocando-se em
outro veículo, causando lesão corporal culposa no seu ocupante. Assim, se demonstrado
que perdeu o controle do seu veículo exclusivamente porque não conseguiu controlar o
espirro e, por ato reflexo, desviou a direção, provocando a colisão e as lesões corporais no
outro condutor, o agente não será responsabilizado pelo crime de lesão corporal culposa
na condução de veículo automotor (Lei 9503/97, art. 303), uma vez que agiu sem vontade,
não havendo conduta punível, sendo, portanto, o fato atípico.
c) Estados de inconsciência
Consciência “é o resultado da atividade das funções mentais. Não se trata de
uma faculdade do psiquismo humano, mas do resultado do funcionamento de todas
elas”.
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Quando essas funções mentais não funcionam adequadamente se diz que há
estado de inconsciência, que é incompatível com a vontade, e sem vontade não há ação.
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Há um tipo penal específico descrevendo a conduta omissiva. O verbo nuclear
do tipo descreve uma conduta omissiva. Nesse caso, o crime consiste em o sujeito
amoldar a sua conduta ao tipo legal que descreve uma conduta omissiva. Em síntese, o
agente será responsabilizado por não cumprir o dever de agir contido implicitamente
na norma incriminadora.
Nos crimes omissivos próprios basta a abstenção, é suficiente a desobediência
ao dever de agir para que o delito se consume. A obrigação do agente é de agir e não de
evitar o resultado. O resultado que eventualmente surgir dessa omissão será irrelevante
para a consumação do crime, podendo apenas configurar uma majorante ou uma
qualificadora.
DEVER DE AGIR
CRIMES OMISSIVOS
PODE CONFIGURAR
NÃO TEM O DEVER DE NÃO RESPONDE PELO EX: ART. 135,
MAJORANTE ou
IMPEDIR O RESULTADO RESULTADO QUALIFICADORA PARÁGRAFO ÚNICO, CP
PRÓPRIOS
NÃO ADMITE
TENTATIVA
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1.2.3. Crimes omissivos impróprios ou comissivos por omissão
Nos crimes omissivos impróprios, o agente não tem simplesmente a obrigação
de agir, mas a obrigação de agir para evitar um resultado, isto é, deve agir com a
finalidade de impedir a ocorrência de determinado evento. Nos crimes comissivos por
omissão há, na verdade, um crime material, isto é, um crime de resultado.
O poder agir é um pressuposto básico de todo comportamento humano.
Também na omissão, evidentemente, é necessário que o sujeito tenha a possibilidade
física de agir, para que se possa afirmar que não agiu voluntariamente.
Trata-se de uma possibilidade real e concreta do agente, no contexto da situação
fática, considerando-se como padrão do homem médio, evitar o resultado penalmente
relevante. Exemplo: um médico plantonista tem o dever de agir para impedir que
determinado enfermo venha a óbito. Todavia, se um médico plantonista deixar de
atender um paciente que falece, porque estava atendendo a outro enfermo em situação
de emergência, à evidência, não poderá ser responsabilizado pela morte do paciente
que aguardava atendimento.
O Código Penal regulou expressamente as hipóteses em que o agente assume
a condição de garantidor.
De fato, para que alguém responda por crime comissivo por omissão é preciso
que tenha o dever jurídico de impedir o resultado, previsto no artigo 13, § 2º, do Código
Penal:
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homicídio culposo. Se, de outro lado, a mãe desejou a morte do filho ou assumiu o risco
de produzi-la, responderá por homicídio doloso.
Aluno veterano, por ocasião de um trote acadêmico, sabendo que a vítima não sabe
nadar, joga o incauto calouro na piscina. Nesse caso, contrai o dever jurídico de agir para
evitar o resultado, sob pena de responder por homicídio.
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Em resumo:
* Para todos verem: esquema sobre as formas de ação e omissão
2. NEXO DE CAUSALIDADE
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Nos crimes formais (que não exigem a produção do resultado para sua
consumação) e de mera conduta (crimes sem resultado) não se mostra necessário o
estudo da relação de causalidade, pois tais crimes se consumam com a realização da
conduta do agente.
a) Preexistentes
Trata-se de causa que existia antes da conduta do agente e produzem o
resultado independentemente da sua atuação. Ou seja, com ou sem a ação do agente o
resultado ocorreria do mesmo modo.
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Ex: O agente desfere um disparo de arma de fogo contra a vítima, que, no
entanto, vem a falecer pouco depois, não em consequência dos ferimentos recebidos,
mas porque antes ingerira veneno com a intenção de suicidar.
b) Concomitantes
São as causas que não têm nenhuma relação com a conduta e produzem o
resultado independentemente desta, no entanto, por coincidência, atuam exatamente
no instante em que a ação é realizada.
Ex: “A” desfere golpe de faca contra “B” no exato momento em que este vem a
falecer exclusivamente por força de um ataque cardíaco.
Nesse caso, há a conduta do agente (desferir o golpe de faca), mas o que gerou
o resultado morte foi outra causa (o ataque cardíaco). O ataque cardíaco se trata de
causa independente da conduta do agente (porque por si só produziu o resultado). É
absolutamente independente (porque não teve origem na conduta do agente, pois
tendo ou não efetuado desferido o golpe o resultado ainda assim se produziria). É
concomitante porque essa outra causa (ataque cardíaco) ocorreu exatamente no
momento da ação do agente.
c) Supervenientes
São causas que atuam após a conduta. Ou seja, que surgem depois da conduta
desenvolvida pelo agente.
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Ex: “A” ministra veneno na alimentação de “B”. Antes do veneno produzir efeitos,
há um desabamento ou incêndio na casa da vítima, que morre exclusivamente por
conta dos escombros que caíram sobre sua cabeça ou queimada pelo fogo.
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Aqui não há, de regra, uma quebra do nexo causal, mas uma soma entre as
causas, que, ao final, conduzem ao resultado lesivo.
Também são três as espécies de causas relativamente independentes.
a) Preexistentes
A causa que efetivamente gerou o resultado já existia ao tempo da conduta do
agente, que concorreu para a sua produção.
Ex: “A”, com a intenção de matar, desfere um golpe de faca na vítima, que é
hemofílica e vem a morrer em face da conduta, somada à contribuição de seu peculiar
estado fisiológico. No caso, o golpe isoladamente seria insuficiente para produzir o
resultado fatal, de modo que a hemofilia atuou de forma independente, produzindo por
si só o resultado.
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b) Concomitantes
A causa que efetivamente produziu o resultado surge no exato momento da
conduta do agente.
Ex: considera-se o ataque à vítima, por meio de faca, que, no exato momento da
agressão, sofre ataque cardíaco, vindo a falecer, apurando-se que a soma desses fatores
(causas) produziu a morte, já que a agressão e o ataque cardíaco, considerados
isoladamente, não teriam o condão do produzir o resultado morte.
c) Supervenientes
A causa que efetivamente produziu o resultado ocorre depois da conduta
praticada pelo agente.
Ex. O agente desfere um golpe de faca contra a vítima, com a intenção de matá-
la. Ferida, a vítima é levada ao hospital e sofre acidente no trajeto, vindo, por esse motivo,
a falecer. A causa é independente, porque a morte foi provocada pelo acidente e não
pela facada, mas essa independência é relativa, já que, se não fosse o ataque, a vítima
não estaria na ambulância acidentada e não morreria. Tendo atuado posteriormente à
conduta, denomina-se causa superveniente.
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Essa outra causa é independente da conduta do agente (porque por si só produziu o
resultado). É relativamente independente (porque teve origem na conduta do agente,
pois, se não tivesse desferido a facada, a vítima não estaria na ambulância e, portanto,
não teria falecido por conta do acidente). É superveniente porque essa outra causa
(traumatismo pelo acidente) surgiu depois da conduta do agente.
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EM RESUMO
* Para todos verem: esquema sobre Fato típico: espécies de causa
3. Dolo e culpa
b) Teoria da vontade
O dolo é a vontade de realizar a conduta e produzir o resultado. Para essa teoria,
além da representação do resultado, deve o agente agir com vontade na sua produção.
Assim, o agente deve prever o resultado (consciência) e querer produzi-lo (vontade).
É a teoria adotada no dolo direto, nos termos do artigo 18, inciso I (1ª parte), do
Código Penal.
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É a teoria que retrata o dolo eventual, nos termos do artigo 18, inciso I (2ª parte),
do Código Penal.
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Tomemos como exemplo a conduta do agente que pretende atirar contra o seu
desafeto, que se encontra conversando com outra pessoa. O agente prevê que também
pode atingir a outra pessoa, mas segue em diante na sua conduta, assumindo o risco de
errar o disparo contra o seu desafeto e atingir a outra pessoa, sendo-lhe indiferente
quanto ao resultado que possa a vir ser produzido em relação ao terceiro. Se efetuar
disparos matando o seu desafeto e também a outra pessoa, o agente responderá por
dois crimes de homicídio: o primeiro, a título de dolo direto; o segundo, a título de dolo
eventual.
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Assim, se há única conduta composta por vários atos, basta que o dolo exista no
momento da realização da conduta, não sendo necessário que persista até o último ato.
Logo, no nosso exemplo, o genro deverá ser responsabilizado por homicídio
doloso consumado, desprezando-se o erro incidente sobre o nexo causal, uma vez que
a conduta desenvolvida pelo agente, ainda que dividida em dois atos, está abrangida
pelo dolo geral, que acompanhava sua ação durante todo ato executório até alcançar o
resultado desejado.
c) Dolo de primeiro grau e dolo de segundo grau
A primeira parte do artigo 18, inciso I, do Código Penal, em que o agente quis o
resultado abrange o dolo direto de primeiro grau e de segundo grau.
No dolo de primeiro grau, o agente desenvolve conduta com vontade e
consciência de atingir determinado resultado. O dolo do agente é voltado a atingir um
único bem jurídico, produzindo, pois, único resultado. Em síntese, no dolo direto de 1º
grau, o resultado obtido era o objetivo principal da conduta. Exemplo: agente que sai ao
encalço e mata a vítima pretendida.
No dolo de segundo grau ou de consequências necessárias, o agente
desenvolve conduta com vontade e consciência dirigida a produzir determinada
resultado. Todavia, os meios empregados para alcançar o resultado desejado
inexoravelmente produziram consequências necessárias, de efeitos colaterais de
verificação certa. Em outras palavras, o dolo do agente, num primeiro momento, não
está relacionado aos efeitos colaterais decorrentes da sua conduta, mas age consciente
de que ocorreram, caso se produza o resultado originariamente pretendido.
Imaginemos que o agente toma conhecimento que seu desafeto irá realizar
uma viajem de carro com mais três amigos. Com a intenção de matar a vítima
determinada, instala uma bomba no veículo, que, dada a potência da explosão, provoca
a morte de todos os ocupantes do veículo. No caso, ainda que o agente pretendesse
matar somente o seu desafeto, agiu consciente que sua conduta provocaria
necessariamente a morte dos demais passageiros do veículo. Tem-se, em relação aos
demais passageiros, o dolo direto de 2º grau ou dolo de consequências necessárias.
36
EM RESUMO
* Para todos verem: mapa mental sobre Fato Típico: dolo
37
A culpa, portanto, não está descrita, nem especificada, mas apenas prevista
genericamente no tipo, dada a absoluta impossibilidade de o legislador prever e
descrever todas as formas de realização da conduta culposa. Com efeito, no homicídio
culposo, por exemplo, são inúmeras as formas que a culpa pode se revelar: atropelar uma
pessoa por excesso de velocidade ou ultrapassar sinal vermelho, ou, ainda, invadir pista
contrária; causar a morte de alguém em razão de disparo acidental de arma de fogo;
deixar veneno ao alcance de uma criança; esquecer criança de tenra idade no veículo
fechado por várias horas, etc.
b) Resultado involuntário
Nos crimes culposos, o resultado não é desejado ou tolerado pelo agente.
Como nos crimes culposos a conduta voluntária é dotada de finalidade lícita,
afigura-se imprescindível a produção de um resultado naturalístico. Isso porque, se é
voltada a uma finalidade lícita, a conduta do agente constitui um indiferente penal, razão
pela qual se mostra necessário a produção de um resultado involuntário para
caracterizar o crime culposo.
38
c) Inobservância do dever de cuidado objetivo
As pessoas, durante as relações de convívio social, devem observar as regras
básicas de cuidado e cautela. Essas regras gerais de cuidado decorrem da vedação de
condutas capazes de gerar riscos a bem jurídico alheio além do que se reputa razoável
tolerar.
De fato, as regras de convívio social impõem às pessoas o dever de cautela para
não atingir bem jurídico alheio. Por isso, quem se arriscar a realizar, por exemplo,
conduta imprudente, sobrevindo um resultado típico, praticará um crime culposo.
Por isso, a observância do dever objetivo de cuidado, isto é, a diligência devida,
constitui o elemento fundamental do tipo culposo, cuja análise constitui uma questão
preliminar no exame da culpa.
* Imprudência
A conduta imprudente se caracteriza por agir um positivo, sem a observância do
dever de cuidado objetivo. Ocorre quando o agente pratica fato perigoso, de forma
intempestiva e precipitada.
É a culpa decorrente de um comportamento positivo descuidado. Trata-se de
modalidade de culpa que incide paralelamente à ação do agente.
Tomemos como exemplo condutor de veículo automotor, que, imprimindo
excessiva velocidade, atropela e mata um pedestre.
Da mesma forma, age com imprudência o agente que limpa arma de fogo
carregada e, de forma descuidada, aciona o gatilho, matando pessoa que estava ao seu
lado.
* Negligência
Trata-se de modalidade negativa de culpa, em que a inobservância do dever de
cuidado do agente é retratada pela ausência de cautela e precaução. É a culpa na forma
de deixar de adotar as cautelas
39
Ao contrário da imprudência, que ocorre durante a ação, a negligência dá-se
sempre antes do início da conduta. O negligente deixa de tomar, antes de agir, as
cautelas que deveria.
Tomemos como exemplo o condutor de veículo que, antes de sair de viagem,
deixa de reparar os pneus e verificar os freios.
* Imperícia
A imperícia se caracteriza pela falta de capacidade, preparo ou de
conhecimentos técnicos suficientes de agente autorizado a desempenhar determinada
arte, profissão ou ofício.
É a chamada culpa profissional, pois decorrente da falta de aptidão para o
exercício de arte, ofício ou profissão. Ocorre quando o agente não tem o adequado
conhecimento acerca das técnicas e regras que todos que se dedicam à determinada
deveriam dominar.
Assim, se um médico cirurgião, que não domina determinada técnica inerente
à determinada intervenção cirúrgica, causar a morte do paciente, responderá por
homicídio culposo (CP, art. 121, § 3º), já que agiu com imperícia no exercício da sua
profissão.
d) Nexo de causalidade
O crime culposo depende de um resultado naturalístico, já que se trata de crime
material. E, em se tratando de crime material, exige-se, para a adequada tipificação, o
nexo causal entre a conduta voluntária descuidada e o resultado involuntário.
Adota-se também nos crimes culposos a teoria da conditio sine qua non,
prevista no artigo 13 do Código Penal, razão pela qual deve ser demonstrado que o
resultado involuntário foi produzido pela conduta descuidada do agente.
Assim, se realizado o juízo hipotético de eliminação da conduta imprudente,
negligente ou imperita do agente, o resultado ainda assim se produziria, não haverá
nexo de causalidade e, portanto, não será possível imputar ao agente qualquer
resultado, não podendo, pois, ser responsabilizado criminalmente.
40
No entanto, se realizado o juízo hipotético de eliminação da conduta
imprudente, negligente ou imperita do agente, o resultado não se produziria, haverá
nexo de causalidade, surgindo a possibilidade de responsabilizar criminalmente o
agente por sua conduta culposa.
e) Tipicidade
A tipicidade também constitui elemento do fato típico culposo.
Para caracterizar o crime culposo, o fato praticado pelo agente deve encontrar
correspondência num tipo penal que prevê a modalidade culposa da conduta.
E, nos crimes culposos, há a peculiaridade de somente incidirem se
expressamente previstos em lei. É o que se extrai do artigo 18, parágrafo único, do Código
Penal, segundo o qual “salvo os casos expressos em lei, ninguém poderá ser punido por
fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente”.
De fato, quando o tipo penal descreve um modelo legal de conduta proibida,
silenciando a respeito da modalidade culposa, significa que o crime existe somente na
forma dolosa.
Tomemos como exemplo o crime de furto (CP, art. 155). O tipo penal descreve a
conduta proibida (Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel), silenciando
quanto à modalidade culposa dessa conduta. Logo, forçoso concluir que não existe furto
culposo, incidindo, pois, somente na modalidade dolosa.
Assim, para se aferir a tipicidade, deve-se verificar se o fato praticado pelo agente
encontra correspondência numa norma penal incriminadora que prevê a modalidade
culposa. Imaginemos que um motorista, imprimindo velocidade excessiva no seu
veículo, dirigindo, pois, de forma imprudente, perde o controle da direção e atropela uma
pessoa, causando-lhe a morte. Essa conduta imprudente encontra correspondência no
tipo penal que define o crime de homicídio culposo na condução de veículo automotor
(Lei 9.503/97, art. 302), havendo, pois, tipicidade.
f) Previsibilidade objetiva
É a possibilidade de uma pessoa comum, com diligência e prudência inerente à
média da população, prever a incidência de determinado resultado. Trata-se da
previsibilidade daquilo que se convencionou chamar de homem médio, considerando-
se o grau de atenção e cuidado exigido das pessoas de mediana inteligência.
41
A previsibilidade do resultado é aferida a partir de um juízo de valor, comparando
a conduta desenvolvida pelo agente com a de um homem médio.
Assim, se o agente realizar uma conduta sem prever o resultado, mas uma
pessoa comum, com prudência e inteligência mediana, inerente à generalidade dos
indivíduos, teria a possibilidade de prever, terá agido, se presentes os demais elementos,
com culpa, uma vez que, nas circunstâncias, desenvolveu uma conduta sem prever o
resultado que era previsível.
g) Ausência de previsão
Para caracterizar o fato típico culposo, é necessário, ainda, que o agente não
tenha previsto o resultado. Se o previu, não há culpa, mas, via de regra, dolo.
Se o agente, dentro da concepção do homem médio, não tinha condições de
prever o resultado, embora previsível, afastada estará a culpa. Se há previsão do
resultado, mas ainda assim o agente desenvolve a conduta, sendo indiferente quando à
produção do evento, há dolo, e não culpa.
Todavia, de forma excepcional, pode haver previsão do resultado na culpa,
quando se tratar de culpa consciente.
42
Na culpa consciente há a previsão do resultado, mas o agente realiza a conduta
considerando, sinceramente, que nenhum resultado se produzirá ou, ainda, que reúne
habilidade suficiente para evitá-lo. É a chamada culpa com previsão.
Em outras palavras, na culpa consciente, o agente prevê o resultado, mas não
aceita sua produção. Embora previsível, confia sinceramente que o resultado não
ocorrerá ou que, por conta da sua habilidade, conseguirá impedir que o evento se
produza.
Exemplo: Leonardo conduz seu veículo por uma avenida. No banco do carona
está sua namorada, Célia. Durante o percurso, Leonardo imprime velocidade excessiva
no veículo, gerando protestos por parte de Célia, que lhe pedia para reduzir a velocidade.
Leonardo responde dizendo que nada iria acontecer, até porque era um excelente
motorista. Todavia, ao fazer uma curva, Leonardo perde o controle do veículo e atropela
uma pessoa, causando-lhe a morte. Diante disso, Leonardo responderá pelo crime de
homicídio culposo na condução de veículo automotor (Lei 9.503/97, art. 302). Note-se
que, no caso, havia por parte do motorista a previsibilidade do resultado, que não era
aceito e nem esperado e, ainda, a leviana percepção de que sua habilidade como
condutor impediria a produção de qualquer evento lesivo.
EM RESUMO:
* Para todos verem: mapa mental sobre Fato Típico: culpa
44
04. Consumação e tentativa
4.1. ITER CRIMINIS
4.1.1. Introdução
a) Cogitação
b) Atos preparatórios
c) Execução
d) Consumação
4.1.2. Cogitação
É exatamente por isso que a fase da cogitação não é punível. De fato, como ainda
está no plano interno do agente, não há ainda qualquer violação a bem jurídico, razão
pela qual não incidem as normas de Direito Penal.
45
4.1.3. Atos preparatórios
A aquisição de uma arma, por exemplo, para a prática do homicídio, constitui ato
preparatório. Da mesma forma, o estudo do local do crime, buscando identificar a
melhor hora e forma de ingressar no ambiente, constituem atos preparatórios do crime
de furto.
Os atos preparatórios, via de regra, não são puníveis, nem na forma tentada, uma
vez que, nos termos do artigo 14, inciso II, do Código Penal, afigura-se necessário o início
da execução do delito, com a realização da conduta nuclear descrita no tipo penal.
46
4.1.4. Execução
4.1.5. Consumação
47
É o caso, por exemplo, do funcionário público que, após atingir a consumação
mediante a solicitação de vantagem indevida, vem a efetivamente recebê-la. A
consumação do crime de corrupção passiva (CP, art. 317) ocorre com a solicitação da
vantagem indevida. O efetivo proveito ulterior com o recebimento dessa vantagem
não integra o iter criminis, constituindo-se no exaurimento do crime.
EM RESUMO
* Para todos verem: mapa mental sobre Iter criminis
48
4.2. TENTATIVA
4.2.1. Introdução
Nos termos do artigo 14, inciso II, do Código Penal, tentativa se caracteriza pelo
início da execução de um crime, que não se consuma por circunstâncias alheias à
vontade do agente.
Como se vê, para caracterizar ao menos crime tentado, deve o agente passar pelos
atos preparatórios e dar início à execução do delito, que, por razões alheias à sua vontade,
não alcance a consumação.
a) Elemento subjetivo
O próprio artigo 14, inciso II, do Código penal faz expressa referência à vontade
do agente, permitindo a conclusão de que o agente agiu com consciência e vontade de
alcançar o resultado, mas, por circunstâncias alheias à sua vontade, não conseguiu.
49
b) Início da execução do crime
Quando a conduta do agente não atinge a consumação por sua própria vontade,
estar-se-á diante da desistência voluntária ou arrependimento eficaz, previstos no artigo
15 do Código Penal.
a) Crimes culposos
Há, no entanto, uma classe de crimes culposos que admitem a tentativa: culpa
imprópria.
b) Crimes preterdolosos
c) Contravenções Penais
51
Trata-se de hipótese de atipicidade, diante da impossibilidade de realizar a
adequação típica entre a conduta do agente e o tipo penal correspondente, já que, na
contravenção penal não há norma de extensão prevendo a tentativa.
Tomemos como exemplo o crime de omissão de socorro (CP, art. 135). Se, ao se
deparar com um acidente, com pessoa gravemente ferindo, deixar de prestar
assistência, o crime estará consumado. De outro lado, nesse mesmo caso, se o agente
agir para socorrer a vítima, não haverá crime.
e) Crimes unissubsistentes
Crimes unissubsistentes são aqueles que se perfazem com um único ato, não
sendo possível fracionar o iter criminis. Divergem dos crimes plurissubsistentes, porque
nestes há uma conduta formada por vários atos.
52
Tomemos como exemplo a injúria verbal (CP, art. 140). Nesse caso, ou o agente
profere a expressão ofensiva à dignidade ou decoro da vítima, ainda que ela não se sinta
ofendida, e o crime estará consumado, ou permanece silente, e não haverá crime. Note-
se que não é possível fracionar a conduta de alguém que chama a vítima, por exemplo,
de idiota.
EM RESUMO
* Para todos verem: mapa mental sobre Tentativa
53
4.3.1. DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA
Indubitável que o agente deu início à execução do delito, mas não consumou o
homicídio por vontade própria, já que adotou uma postura de abstenção, cessando a
atividade executória antes de esgotar todos os meios que tinha à sua disposição. Trata-
se, pois, de desistência voluntária.
O agente esgota sua potencialidade lesiva, faz tudo que está ao seu alcance para
consumar o delito, mas antes de alcançar o resultado inicialmente desejado, arrepende-
se e adota um comportamento ativo para evitar a sua consumação.
54
Diversamente do que ocorre na desistência voluntária, o arrependimento eficaz
se caracteriza pelo fato de o agente, após esgotar os meios executórios, desenvolver uma
nova atividade, a fim de evitar a consumação do delito.
Exemplo: agente que, com a intenção homicida, após efetuar disparos de arma
de fogo contra a vítima, utilizando todas as balas do revólver, arrepende-se e, adotando
postura ativa, leva a vítima até o hospital, que, submetida a intervenção cirúrgica exitosa,
acaba sobrevivendo.
4.3.3. REQUISITOS
55
De acordo com a lição de Frank, a desistência é voluntária quando o agente pode
dizer: “não quero prosseguir, embora pudesse fazê-lo”, e é involuntária quando tem de
dizer: “não posso prosseguir, ainda que o quisesse”.
Além disso, mostra-se necessário que a atuação do agente seja apta a evitar a
produção do resultado, sendo, portanto, eficaz. Se, conquanto tenha buscado evitar a
produção do resultado, o crime alcançou a consumação, o agente responderá pelo
delito, incidindo, todavia, a atenuante genérica prevista no artigo 65, inciso III, alínea “b”,
1ª parte, do Código Penal.
4.3.4. CONSEQUÊNCIA
Assim, o agente que ingressa numa residência e, por ato voluntário, desiste de
consumar a subtração, não responderá por tentativa de furto, mas pelos atos até então
praticados, quais sejam, violação de domicílio (CP, art. 150).
56
* Para todos verem: três esquemas
Início da execução
Não consumação
por vontade
Desistência própria
voluntária e
arrependimento
eficaz
Responde pelos
atos praticados
Jamais tentativa
Não esgota
os meios
executórios
Desistência Desiste de
voluntária prosseguir
Agente para
Esgota os meios
executórios
Arrependimento
eficaz
Antes da
consumação age
para evitar o
resultado
57
EM RESUMO
* Para todos verem: mapa mental sobre Desistência voluntária e arrependimento eficaz
1.1.2. Requisitos
Extrai-se do artigo 16 do Código Penal os requisitos para a incidência do
arrependimento posterior:
59
Diante disso, entende-se possível o arrependimento posterior por terceira
pessoa, representando o acusado do crime, quando, por exemplo, o agente se encontrar
preso ou internado em hospital, impossibilitado, portanto, de realizar a reparação do
dano ou restituir a coisa.
Assim, se a mãe do autor de um furto resolve, por sua conta, sem a anuência do
filho, devolver a coisa subtraída, não há falar em redução da pena pelo arrependimento
posterior, já que ausente a voluntariedade do agente. Se o filho, entretanto, estiver
hospitalizado, por alguma razão, poderá valer-se de terceiro para proceder à reparação
do dano ou restituição da coisa.
60
* Para todos verem: esquema
Depois da
consumação
Violência
Crimes sem
Grave ameaça
Arrependimento
posterior
Denúncia
Reparação do dano
ou restituição da Até recebimento
coisa
Queixa
Causa de
diminuição da
pena
EM RESUMO
* Para todos verem: mapa mental sobre Arrependimento posterior
61
1.2. CRIME IMPOSSÍVEL
1.2.1. Introdução
O instituto do crime impossível está previsto no artigo 17 do Código Penal. Trata-
se de hipótese de tentativa não punível, verificando-se quando o agente, por ineficácia
absoluta do meio ou impropriedade absoluta do objeto sobre o que recaiu sua conduta,
jamais alcançará a consumação do delito.
62
O crime impossível pela impropriedade absoluta do objeto guarda relação com
o objeto material, compreendendo a pessoa ou coisa sobre o qual recai a conduta do
agente.
O objeto será absolutamente impróprio quando inexistente ao tempo da
conduta do agente ou, ainda, pelas circunstâncias em que se encontra, afigura-se
impossível a produção do resultado visado pelo agente.
Tomemos como exemplo a conduta do agente, que pretendendo matar a vítima,
desfere vários disparos de arma de fogo contra o seu corpo, verificando-se, após, que, ao
receber os disparos, já se encontrava morta, em decorrência de ter sofrido, momentos
antes, fulminante ataque cardíaco. Evidente, nesse caso, a impropriedade absoluta do
objeto, diante da impossibilidade de ceifar a vida de pessoa que já estava morta.
Da mesma forma, caracteriza crime impossível pela impropriedade absoluta do
objeto a conduta da mulher que ingere substância abortiva, demonstrando-se, após,
que jamais estivera grávida. Trata-se de fato atípico, pois não há objeto material a ser
atingido (feto com vida intrauterina), não sendo possível, pois, punir a mulher nem
mesmo a título de tentativa de aborto.
* Para todos verem: esquema
Ineficácia
absoluta do
meio FATO
Crime ATÍPICO
impossível
Impropriedade
absoluta do
objeto
63
EM RESUMO
* Para todos verem: mapa mental sobre Crime impossível
64
Exemplo: Durante uma caçada, o agente percebe que há movimentação atrás
de arbustos. Supondo ser um animal, atira em direção ao alvo, e, quando vai se certificar
do produto da caça, verifica que, na realidade, atingiu uma pessoa, que estava escondido
atrás dos arbustos. A realidade do caçador era a de que estava atirando contra um
animal. Todavia, trata-se de uma falsa percepção da realidade, já que acabou atingindo
uma pessoa humana. O agente errou sobre o elemento constitutivo “alguém”.
Desenvolveu uma conduta sem saber, por conta do erro, que estava praticando um fato
típico.
O erro de tipo pode ser essencial ou acidental.
O erro de tipo essencial é aquele que repercute na própria tipificação da conduta
do agente, pois, se não tivesse a falsa percepção da realidade, o agente não teria
praticado o fato típico, ou, pelo menos, não nas circunstâncias que envolveram o
contexto fático.
O erro de tipo acidental recai sobre elementos secundários, irrelevantes, para a
caracterização da conduta típica. Não impede o sujeito de compreender o caráter ilícito
de seu comportamento. Ainda que não tivesse incorrido em erro, a conduta típica estaria
caracterizada.
O erro de tipo essencial se subdivide em: invencível ou vencível.
65
Outro exemplo: Agente que se embrenha em mata fechada, distante de
qualquer centro urbano, com rara circulação de pessoas. Em dado momento, visualiza
algo se movimentando atrás da intensa vegetação. Supondo ser um animal, efetua um
disparo. Ao verificar o produto da caça, verifica, para sua surpresa, que não matou um
animal, mas uma pessoa, que, por infeliz coincidência, também caçava no local. Trata-se
de erro de tipo, pois o caçador, por conta da falsa percepção da realidade (supôs ser um
animal), errou em relação ao elemento “alguém” do tipo que define o crime de
homicídio. E, trata-se de erro de tipo invencível, porque qualquer pessoa, nas
circunstâncias, consideraria que a movimentação atrás da vegetação seria a de um
animal, não sendo possível supor, nem mesmo para uma pessoa mais cautelosa e
diligente, que, na verdade, tratava-se de uma pessoa.
O erro de tipo essencial invencível exclui o dolo e a culpa, pois o sujeito não age
dolosa ou culposamente.
66
da realidade (supôs ser um animal), errou em relação ao elemento “alguém” do tipo que
define o crime de homicídio. E, nesse caso, trata-se de erro de tipo vencível, porque
qualquer pessoa, nas circunstâncias, uma pessoa mais cautelosa e prudente se
certificaria para ter certeza de que a movimentação atrás da vegetação seria a de um
animal, e não de uma pessoa.
O erro de tipo essencial vencível exclui o dolo, mas não a culpa, desde que
previsto em lei o crime culposo.
67
Dolo
Invencível Exclusão
Culpa
Erro de tipo
essencial
Exclusão do dolo
Vencível
Responde por
crime culposo, se
previsto em lei
3.7.2. Consequência
Conforme se extrai do artigo 20, § 3º, do Código Penal, no contexto de erro
quanto à pessoa, o agente não será isento de pena, respondendo pelo delito
considerando-se as condições ou qualidades da vítima pretendida.
Incide, no caso, a teoria da equivalência do bem jurídico atingido, em que o
agente responderá pelo crime praticado, porém, no momento da aplicação da pena,
serão consideradas as condições da vítima virtual.
Consideremos, por exemplo, a hipótese do filho desalmado, que, pretendendo
matar seu pai, realiza disparos de arma de fogo contra o homem que estava na varanda
da residência do genitor, causando a morte deste. O filho desamado, então, deixa o local
satisfeito, por acreditar ter concluído seu intento delitivo, mas vem a descobrir que
matara um amigo de seu pai, que contava com 65 anos de idade, que, de costas, era com
ele parecido.
Nesse caso, nos termos do artigo 20, § 3º, do Código Penal, consideram-se as
condições e qualidades da vítima pretendida. Logo, o filho desalmado responderá pelo
crime de homicídio, com a incidência da agravante de ter praticado crime contra
ascendente, prevista no artigo 61, II, “e”, 1ª parte, do Código Penal. Despreza-se, pois, as
condições e características da pessoa atingida, ou seja, o agente não responderá pelo
crime de homicídio doloso, com a causa de aumento de pena em razão da idade da
vítima efetivamente atingida.
De outro lado, consideremos que Wilson, pretendendo matar Tobias, de 70 anos
de idade, amigo do seu pai, realiza disparos de arma de fogo contra o homem que estava
na varanda da sua residência, causando a morte deste. Wilson, então, deixa o local
satisfeito, por acreditar ter concluído seu intento delitivo, mas, logo depois, descobre
que, na verdade, matara o seu próprio pai, que estava visitando o amigo, e, de costas, era
69
com ele parecido. Nesse caso, o agente não responderá pelo crime de homicídio doloso,
com a agravante por ter praticado crime contra o próprio pai, pois devem ser
consideradas as condições e qualidades da vítima pretendida. E, como a vítima
pretendida era Tobias, senhor de 70 anos de idade, Wilson responderá pelo crime de
homicídio, com a causa de aumento de pena em razão da idade da vítima (CP, art. 121, §
4º, 2ª parte).
Da mesma forma, se uma mãe, sob o efeito do estado puerperal, logo após o
parto, durante a madrugada, vai até o berçário de um hospital e, supondo ser o seu filho
recém-nascido, sufoca um bebê até a morte. Após, verifica-se que, na verdade, a criança
morta não era o seu filho, que se encontrava no berçário ao lado, mas um bebê diverso,
tendo ela se equivocado, portanto, quanto à vítima desejada. Nesse caso, como desejava,
sob influência do estado puerperal, matar o seu filho recém-nascido, despreza-se as
condições e qualidades do bebê efetivamente morto, devendo ser consideradas às do
próprio filho. Assim, a mãe deverá responder pelo crime de infanticídio (CP, art. 123), pois,
embora tenha atingido bebê diverso, a responsabilização penal deve ser como se tivesse
matado a vítima pretendida, ou seja, seu filho.
* Para todos verem: esquema
70
O agente não erra quanto à identidade da pessoa, mas quanto aos meios no uso
dos meios de execução do delito. Com efeito, visualiza como certa a vítima pretendida,
mas, por erro na pontaria, por exemplo, acaba atingindo pessoa diversa.
A aberratio ictus pode ocorrer quando, por acidente, o agente, ao invés de
atingir a pessoa pretendida, atinge pessoa diversa. Suponhamos, nesse caso, que o
agente pretende matar Wilson, deixando na sua mesa de trabalho uma xícara de café
contendo veneno. Todavia, quem toma o café é Pedro, que acaba falecendo.
Pode ocorrer também quando, por erro nos meios de execução, o agente, ao
invés de atingir a pessoa pretendida, atinge pessoa diversa. Exemplo: Agente
pretendendo matar Wilson, visualiza a vítima, tendo-a como certa, faz a mira e efetua o
disparo, mas, no entanto, erra o alvo pretendido, atingindo pessoa diversa, que se
encontrava próxima ao local.
2.2.2. Espécies
Há duas espécies de aberratio ictus: a) aberratio ictus com unidade simples; b)
aberratio ictus com resultado duplo.
71
É também o caso do agente que, pretendendo matar o seu pai, efetua disparo
de arma de fogo, mas, por erro na pontaria, acaba atingindo pessoa diversa, que se
encontrava próximo ao seu genitor. Nesse caso, teríamos, em tese, tentativa de
homicídio em relação ao pai, e homicídio culposo em relação à pessoa diversa.
Todavia, nos termos do artigo 20, § 3º, do Código Penal, deve-se considerar as
condições ou qualidades da vítima pretendida. Assim, no caso, embora tenha atingido
de forma letal pessoa diversa, o agente responde como se tivesse atingido a pessoa
pretendida, ou seja, como se tivesse matado o próprio pai. Logo, responderá pelo crime
de homicídio doloso consumado, com a incidência da agravante de ter praticado crime
contra ascendente, prevista no artigo 61, II, “e”, 1ª figura, do Código Penal.
b) Aberratio ictus com unidade complexa ou com resultado duplo
A aberratio ictus com resultado duplo ocorre quando o agente, além de atingir
a vítima pretendida, atinge também pessoa diversa.
Nesse caso, com uma única ação, o agente produz mais de um resultado: atinge
a pessoa pretendida, e também pessoa diversa. Por essa razão, o artigo 73, 2ª parte, do
Código Penal faz expressa remissão ao artigo 70 do Código Penal, devendo ser aplicada
a regra do concurso formal de crimes.
Exemplo: Pretendendo matar Wilson, o agente efetua um disparo, que, além de
atingir Wilson, atinge também Pedro, que se encontrava atrás da vítima pretendida. Por
conta da potência da arma utilizada, o disparo efetuado causou a morte da pessoa
pretendida e também da pessoa diversa. Em tese, teríamos homicídio doloso em relação
à vítima pretendida e homicídio culposo em relação à pessoa diversa.
Nesse caso, nos termos do que dispõe o artigo 73, 2ª parte, do Código Penal,
deve-se aplicar a regra do artigo 70 do Código Penal, segundo o qual, se o agente com
uma única ação praticar dois ou mais crimes, deve-se considerar a pena do crime mais
grave, aumentando-a de 1/6 (um sexto) até a ½ (metade).
Convém mencionar que, se houver dolo eventual em relação à vítima efetiva e
dolo direto em relação à vítima visada, não há falar propriamente em erro na execução,
incidindo, no caso, inclusive, hipótese de concurso formal imperfeito, aplicando-se o
sistema do cúmulo material (soma das penas).
Assim, se o agente mira em direção à vítima visada (A), visualizando a
possibilidade de também atingir pessoa diversa (vítima B), assumindo o risco e
aceitando o resultado, atingindo-a e causando-lhe a morte, teremos tentativa de
72
homicídio, na modalidade dolo direto em relação à vítima A, e homicídio doloso, na
odalidade dolo eventual, em relação à vítima B, em concurso formal imperfeito (as penas
serão somadas).
Erro na execução
Pessoa
Efeito
pretendida
Acidente ou erro
Com resultado Com resultado
no uso dos meios
único duplo
de execução
Condições ou
Art. 70 do CP
qualidades
Pessoa
pretendida
2.3.2. Espécies
Há duas espécies de aberratio criminis: a) aberratio criminis com unidade
simples; b) aberratio criminis com resultado duplo.
74
Imaginemos que certo dia, o agente, com raiva do vizinho, resolva quebrar a
janela da residência deste. Para tanto, espera chegar a hora adequada e, supondo não
haver ninguém na residência, o agente arremessa com força, na direção da casa do
vizinho, um enorme tijolo, que, além de quebrar a vidraça, atinge também sua nuca. O
vizinho falece instantaneamente. Nesse caso, o agente deverá responder por homicídio
culposo em concurso formal com o crime de dano (art. 121, § 3º, e art. 163, na forma do art.
70, todos do Código Penal), considerando-se a pena aplicada para o crime de homicídio
culposo, já que mais grave, aumentada de 1/6.
Cumpre ressaltar, por pertinente, que, se o resultado previsto como crime
culposo for menos grave ou se o crime não prever modalidade culposa, não aplica o
disposto no artigo 74 do Código Penal. Assim, se o agente efetua disparos de arma para
matar a vítima, mas não o acerta e quebra a vidraça de uma casa ou acerta um carro,
deve-se desprezar a hipótese do artigo 74 do Código Penal, responderá por tentativa de
homicídio. Primeiro, porque o crime de tentativa de homicídio é mais grave do que o
delito de dano; segundo, porque não há previsão legal de dano culposo.
* Para todos verem: esquema
Resultado diverso
do pretendido
Resultado
Efeito
pretendido
Acidente ou erro
Com resultado Com resultado
no uso dos meios
único duplo
de execução
Responde por
Resultado diverso
culpa, se previsto Concurso formal
do pretendido
em lei
Art. 70 do CP
75
Em resumo
76
3.2. Espécies
a) Descriminante putativa por erro de tipo
É um erro de tipo essencial incidente sobre elementares de
um tipo permissivo. Os tipos permissivos são aqueles que permitem a realização de
condutas inicialmente proibidas. Compreendem os que descrevem as causas de
exclusão da ilicitude.
Ocorrerá um erro de tipo permissivo quando o agente, erroneamente, imaginar
uma situação de fato totalmente diversa da realidade, em que estão presentes os
requisitos de uma causa de justificação.
Assim, por exemplo, se o agente praticar uma conduta supondo estar diante de
uma agressão injusta, mas, que na verdade, não existe. Trata-se de legítima defesa
putativa.
O agente pratica uma conduta supondo estar numa situação de perigo, que, na
verdade, não existe. Trata-se de estado de necessidade putativo.
Os efeitos são os mesmos do erro de tipo, já que a descriminante putativa por
erro de tipo não é outra coisa senão erro de tipo essencial incidente sobre tipo
permissivo.
Assim, se o erro for vencível, o agente responde por crime culposo, já que o dolo
será excluído, da mesma forma como sucede com o erro de tipo propriamente dito; se o
erro for inevitável, excluir-se-ão o dolo e a culpa e não haverá crime.
Cuidando-se de erro invencível, há exclusão do dolo e culpa.
Tratando-se de erro vencível, responde o sujeito por crime culposo, se prevista a
modalidade culposa. Provando-se que o sujeito não foi diligente no verificar as
circunstâncias do fato, responde por crime de homicídio culposo (art. 20, § 1º, CP).
77
Ex: uma pessoa de idade avançada recebe um violento tapa em seu rosto, desferido por
um jovem atrevido. O idoso tem perfeita noção do que está acontecendo, sabe que seu
agressor está desarmado e que o ataque cessou. Não existe, portanto, qualquer equívoco
sobre a realidade concreta. Nessa situação, no entanto, imagina-se equivocadamente
autorizado pelo ordenamento jurídico a matar aquele que o humilhou, atuando, assim,
em legítima defesa de sua honra.
3.3. Consequências
No contexto das descriminantes putativas, aplica-se a teoria limitada da
culpabilidade.
Pela teoria limitada da culpabilidade, quando a descriminante putativa incidir
sobre pressupostos de uma situação de fato (Ex: o agente imaginar que está diante de
uma injusta agressão, mas que era imaginária. Supor que o desafeto iria sacar uma arma,
quando, na verdade, era um celular), o efeito em relação à conduta do agente é o mesmo
do erro de tipo (art. 20 CP): Se o erro foi invencível, exclui o dolo e a culpa; se vencível,
exclui o dolo, mas o agente responde pelo delito culposo, se previsto em lei. Para Cleber
Masson, “acarreta a atipicidade do fato, pois no finalismo o dolo e a culpa compõem a
estrutura da conduta. Sem eles não há conduta, e sem conduta o fato é atípico”.
Agora, se a descriminante putativa recair sobre pressupostos os limites legais
das excludentes, ou seja, apesar de conhecer a situação de fato, ignora a ilicitude do
78
comportamento (supõe ser comportamento lícito), o efeito será o mesmo do erro de
proibição: se inevitável, o agente será isento de pena; se evitável, o agente responde pelo
delito, mas terá a pena reduzida (art. 21 CP). Ex: um senhor de idade recebe um soco de
um jovem rapaz e acredita estar autorizado a revidar, lesionando-o gravemente por
conta do desaforo. O senhor sabe exatamente o que está fazendo, mas ignora que sua
conduta será ilícita (que, no caso, não se trata de hipótese de legítima defesa). É o caso
das descriminantes putativas por erro de proibição.
Em que pese o fato praticado pelo agente seja típico, por, em determinadas
circunstâncias, incidir causas que excluem a ilicitude desse fato. Em outras palavras, o
fato será típico, mas não será ilícito.
79
* Para todos verem: esquema
Estado de Necessidade
Legítima Defesa
EXCLUDENTES DE
ILICITUDE
1.1.1.1. Conceito
Tem como fundamento um estado de perigo para certo interesse jurídico, que
somente pode ser resguardado mediante a lesão de outro.
80
1.1.1.2. Requisitos
O artigo 24, “caput”, e seu § 1º, do Código Penal, prevê os requisitos para a incidência
do estado de necessidade. Tais requisitos são cumulativos, devendo todos estarem
presentes para configurar a causa excludente de ilicitude.
Perigo atual
Essa situação de perigo pode decorrer de ação humana (lesionar uma pessoa
durante fuga para se salvar de um incêndio provocado por alguém); por um fato da
natureza (subtrair um barco para se salvar de uma inundação); por comportamento de
um animal (danificar um patrimônio para se salvar de ataque de um cão bravio).
81
Em relação ao terceiro, não se exige qualquer relação jurídica entre o agente que
age em estado de necessidade e o terceiro, sendo, pois, dispensável qualquer relação de
parentesco, amizade ou subordinação entre o agente e o terceiro necessitado. Assim,
perfeitamente possível arguir estado de necessidade para defesa de bem jurídico de
pessoa desconhecida.
Ex: Tício mora no 3º andar de prédio de sua propriedade. Com ele reside colega
de escritório. Com a intenção de receber seguro, Tício ateia fogo no edifício. O incêndio,
porém, assume rapidamente proporções inesperadas e bloqueia praticamente todas as
saídas. Tício, neste momento, percebendo que o colega usa uma corda para descer pela
janela mata o companheiro para pegar a corda e salvar-se. O homicídio do companheiro
de escritório não encontra no estado de necessidade causa de justificação, uma vez que
Tício criara o perigo que ensejou a situação aflitiva.
Nos termos do artigo 24, § 1º, do Código Penal, “Não pode alegar estado de
necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo”. Assim, por força desse
dispositivo, quando a lei impuser ao agente o dever de enfrentar o perigo, deve ele
buscar salvar o bem ameaçado sem sacrificar outro qualquer, ainda que tenha de correr
os riscos inerentes à sua função.
Ao tratar do estado de necessidade, o Código Penal, no seu artigo 24, exige, como
pressuposto, a inexistência de um outro meio de evitar o perigo, isto é, quando o dano
produzido pelo agente for inevitável.
82
Assim, o agente estará autorizado a praticar um fato típico quando for
absolutamente imprescindível para evitar a lesão ao bem jurídico.
Se possível afastar o perigo por qualquer outro meio, deve o agente se abster de
sacrificar bem jurídico alheio. Isso porque o estado de necessidade apresenta um caráter
de subsidiariedade, ou seja, entre sacrificar o bem jurídico e se afastar da situação de
risco, deverá por essa solução optar o agente.
Se o perigo pode ser afastado por uma conduta menos lesiva, a prática do
comportamento mais lesivo não configura a excludente.
83
02. Causas excludentes de ilicitude: Legítima defesa, Estrito
cumprimento do dever legal, Exercício regular do direito e
Consentimento do ofendido
2.1. LEGÍTIMA DEFESA
2.1.1. Conceito
2.1.2. Requisitos
A legítima defesa, nos termos em que é proposta pelo nosso Código Penal, exige
a presença simultânea dos seguintes requisitos: agressão injusta, atual ou iminente;
direito próprio ou alheio; meios necessários usados moderadamente; elemento
subjetivo; animus
84
a) Agressão injusta, atual ou iminente
Iminente é a que está prestes a ocorrer. Nesse caso, a agressão ainda não teve
início, mas poderá ocorrer em momento imediato. Exemplo do agressor que anuncia o
ataque, e parte, munido de uma faca, em direção à vítima para matá-la, que reage
desferindo um disparo de arma de fogo contra o agressor, fazendo cessar a agressão.
85
c) Uso moderado dos meios necessários
Após eleger o meio necessário, o agredido deverá fazer uso moderado desses
meios, suficiente para fazer cessar a agressão injusta.
Assim, se a vítima está sendo atacada pelo agente munido de uma faca, poderá
se utilizar de uma arma de fogo para repelir a injusta agressão (eis o meio necessário),
mas deverá agir com moderação. Nesse caso, se um disparo foi um suficiente para fazer
cessar a agressão, o ofendido não poderá efetuar o segundo disparo, sob pena de
incorrer em excesso e responder pelo resultado produzido pela desproporção da defesa
em relação ao ataque.
Com efeito, o agente que age em legítima defesa deve ter ciência de que está
diante de uma agressão injusta, sob pena de não incidir a excludente.
Imaginemos agente que desfere disparos de arma de fogo contra desafeto, sem
saber que estava na iminência de ser por ele agredido. Verificado que o desafeto
também estava armado e pronto para agredir o agente, não poderá este alegar legítima
defesa, por ausência do elemento subjetivo da legítima defesa.
Ao contrário do estado de necessidade (CP, art. 24) e da legítima defesa (CP, art. 25),
o Código Penal não dispôs sobre o conceito e requisitos do estrito cumprimento do
dever legal, relegando à doutrina e jurisprudência estabelecer as características dessa
causa excludente de ilicitude.
86
Estará ao abrigo do estrito cumprimento do dever legal, o agente que praticar um
fato típico em face do cumprimento de um dever observando rigorosamente os limites
impostos pela lei, de natureza penal ou não.
Da mesma maneira, inexiste violação de domicílio criminosa (CP, art. 150) se policial
invade residência alheia para realizar prisão em flagrante pela prática de crime que está
sendo praticado no local.
O dever pode ser imposto por qualquer lei, seja penal ou extrapenal, podendo se
originar de decreto, regulamento ou qualquer ato administrativo de caráter geral. Da
mesma forma, o dever pode emanar de decisões judiciais, já que, ao fim e ao cabo, nada
mais são que a aplicação da lei ao caso concreto.
87
2.2.4. Cumprimento nos estritos limites da lei
2.3.2. Alcance
88
antijurídicos em face do direito penal, porque longo e reiterado costume consagra o
“trote” como instituição legítima.
Nesses casos, o fato típico praticado não será ilícito, desde que a conduta
desenvolvida pelo agente observe os estritos limites das regras do esporte praticado.
EM RESUMO
89
* Para todos verem: mapa mental sobre causas excludentes de ilicitude
2.4.2. Requisitos
a) Bem disponível
91
Assim, se o bem jurídico violado, ainda que seja de ação penal pública
incondicionada, atingir interesse prevalentemente individual, poderá ser enquadrado no
bloco dos bens jurídicos disponíveis. Imaginemos que o agente está praticando a
subtração de um celular, momento em que é avistado pela vítima, que consente com o
desapossamento, por considerar que as funções do aparelho já estão superadas. O fato
é típico, pois se enquadra na descrição do modelo de conduta proibida prevista no artigo
155 do Código Penal; não será, contudo, ilícito, por força do consentimento da vítima, já
que se trata de bem disponível.
c) Consentimento válido
92
Dessarte, o consentimento do ofendido deve ser livre e voluntário, destituído de
qualquer mácula capaz de invalidá-lo.
e) Consentimento expresso
93
A inimputabilidade do sujeito
Excludentes de
culpabilidade
Falta de potencial
consciência da Inexigibilidade de
Inimputabilidade
ilicitude - Art. 21 conduta diversa
do CP
Coação moral
Doneça mental -
Erro de proibição irresistível - Art. 22
art. 26 CP
CP
Embriaguez
Obediência
completa e
hierárquica - Art.
acidental - ART.
22 CP
28, §1º cp
94
de acordo com esse entendimento. Ou seja, em decorrência da doença mental, o agente
desenvolve conduta sem a capacidade de compreender o caráter ilícito do fato.
Em relação aos silvícolas, a inimputabilidade deve ser aferida por meio de exame
pericial, a fim de ser verificado o grau de adaptação social do índio. Assim, a depender
da conclusão do laudo pericial, o indígena pode ser: a) imputável, se constatado sua
integração à vida em sociedade; b) semi-imputável, na hipótese de não estar integrado
plenamente à vida em sociedade, já que ainda enraizado na cultura da tribo; c)
inimputável, quando verificada sua plena inadequação à vida em sociedade, por conta
do desconhecimento das regras de convívio social.
95
A inimputabilidade pela enfermidade mental é aferida pelo sistema
biopsicológico. Além da doença mental, é necessário que, em consequência desse
estado biológico, o agente seja, no momento da conduta, inteiramente incapaz de
entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Incompleto
Inteiramente
Enfermidade incapaz:
mental
Inimputabilidade Compreensão
por enfermidade Retardado
mental Determinação
Biopsicológico
Nesse contexto, uma vez verificado que o agente praticou um fato típico e ilícito,
sendo, ao final, considerado inimputável por conta da sua enfermidade mental, o juiz
deverá proferir sentença absolutória imprópria, aplicando medida de segurança,
consistente em internação em hospital de custódia ou tratamento ambulatorial, nos
termos do artigo 386, parágrafo único, inciso III, do Código de Processo Penal.
96
* Para todos verem: esquema
Sentença
Medida de
Inimputabilidade absolutória
segurança
imprópria
97
3.1.2.2. Espécies de embriaguez
Nos termos do artigo 28, inciso II, do Código Penal, a embriaguez voluntária ou
culposa não exclui a imputabilidade penal, e, por consequência, não fica excluída a
culpabilidade. Ele responde pelo crime.
98
Na força maior, o agente é obrigado a ingerir bebida alcoólica. Tomemos como
exemplo trote acadêmico de mau gosto, em que os veteranos obrigam um calouro a
ingerir bebida alcóolica.
A consciência da ilicitude que era real, com o sistema finalista passou a ser
potencial. Não se exige do agente o efetivo conhecimento do caráter ilícito do fato típico,
sendo suficiente a possibilidade de compreender o caráter ilícito do fato.
99
A falta do potencial consciência acerca da ilicitude do fato gera a exclusão da
culpabilidade pelo erro de proibição escusável ou inevitável, nos termos do artigo 21 do
Código Penal.
No erro de proibição, o agente desenvolve uma conduta movido por uma falsa
percepção acerca do caráter ilícito do fato típico praticado. Ou seja, o agente tem
consciência da conduta praticada, mas lhe falta potencial consciência da ilicitude do
fato.
100
havendo nenhuma razão para duvidar da veracidade da notícia, o agente se dirige até o
hospital e desliga os aparelhos que mantinham vivo um ente querido, que se encontrava
sofrendo com a doença que o acometia e em estágio terminal, causando-lhe a morte.
Praticou fato típico e ilícito, mas lhe faltou potencial consciência da ilicitude, incidindo o
erro de proibição inevitável, cuja consequência será a exclusão da culpabilidade.
Isento de
Inevitável
pena
Erro de
Efeitos
proibição
Causa de
Evitável diminuição
de pena
De outro lado, quando não lhe era exigível comportamento diverso, não incide o
juízo de reprovação, excluindo a culpabilidade.
101
E, nesse particular, as causas legais de exclusão da culpabilidade pela
inexigibilidade de conduta diversa estão previstas no artigo 22 do Código Penal,
consistentes na coação moral irresistível e a obediência hierárquica.
Convém sinalar que, se o sujeito pratica o fato sob coação física irresistível, não
praticará crime por ausência de conduta. Trata-se de causa excludente da tipicidade.
4.1.4.1.1. Requisitos
A ameaça deve ser endereçada à pessoa do coagido ou a ainda a pessoa das suas
relações íntimas.
Além disso, a ameaça deve ser séria e grave, suficiente para causar temor ao
coagido, bem como passível de ser realizada.
102
b) Inevitabilidade do perigo por outro modo
Se for possível evitar o perigo decorrente da ameaça por outro modo, seja
por atuação do coagido, seja pela força policial, não incide a causa de exclusão de
culpabilidade.
c) Irresistibilidade da ameaça
103
4.1.4.1.2. Efeitos
Embora tenha praticado fato típico e ilícito, a coação moral irresistível configura
causa de exclusão da culpabilidade do coagido. No caso, somente o coator será punido
pela conduta desenvolvida pelo coagido, conforme expressamente prevê o artigo 22 do
Código Penal.
Convém sinalar, por pertinente, que o coator responde, além do crime praticado
pelo coagido, também pela tortura ou constrangimento ilegal empregado contra o
coagido.
4.1.4.2.1. Conceito
4.1.4.2.2. Requisitos
104
A ordem não manifestamente ilegal é aquela que revela aparente legalidade,
mas que, na realidade, é contrária ao direito. O subordinado, por força da ordem
emanada pelo superior hierárquico, realiza a conduta que lhe foi ordenada,
considerando-a lícita, quando, na realidade, constitui fato típico e ilícito.
A ordem deve ser emanada por autoridade competente para emiti-la. Eventual
cumprimento de ordem determinada por autoridade sem competência para tanto pode
ensejar erro de proibição.
O executor deve pautar sua conduta nos estritos limites da ordem emanada pelo
superior hierárquico, sob pena de não incidir a excludente.
105
4.1.4.2.3. Efeitos
5. Concurso de pessoas
1.2. Requisitos
106
a) pluralidade de condutas
Assim, para que haja concurso de pessoas, exige-se que cada um dos agentes
tenha realizado ao menos uma conduta relevante. Pode ser em coautoria, onde há duas
condutas principais; ou autoria e participação, onde há uma conduta principal e outra
acessória, praticadas, respectivamente, por autor e partícipe.
Assim, se Tereza Cristina simplesmente diz que vai concorrer no homicídio a ser
cometido por Ferdinand não há participação. Agora, se Tereza Cristina instiga Ferdinand
a matar, ocorrendo pelo menos tentativa de homicídio, existe participação.
107
Os agentes devem atuar conscientes de que participam de crime comum, ainda
que não tenha havido acordo prévio de vontades. A ausência desse elemento
psicológico inviabiliza o concurso de pessoas, ensejando condutas isoladas e autônomas.
Nos termos do artigo 29 do CP, todos que concorrem para o crime respondem
pelo mesmo delito.
O partícipe que houver tido “participação de menor importância” poderá ter sua
pena reduzida de um sexto a um terço, nos termos do art. 29, § 1º.
Esse dispositivo cuida da hipótese de o autor principal cometer delito mais grave
que o pretendido pelo partícipe ou coautor.
Ex. “A” determina “B” a espancar “C”. “B” mata “C”. Segundo o art. 29, § 2º, “A”
responde por crime de lesão corporal, cuja pena deve ser aumentada até metade se a
morte da vítima lhe era previsível.
De fato, a solução dada pelo CP leva à punição de “A” pelo delito de lesões
corporais, que foi o crime desejado, cuja pena será elevada até a metade se o homicídio
for previsível.
109
1.4. Comunicabilidade das elementares e circunstâncias do crime
110
Ex: “A”, funcionário público, comete um crime de peculato (art. 312), com a
participação de “B”, não funcionário público. A condição pessoal (funcionário público) é
elementar do crime de peculato, comunicando-se, portanto, ao agente que não é
funcionário público. Logo, os dois respondem por crime de peculato.
Ex: “A” instiga “B” a praticar homicídio contra “C”. “B”, para a execução do crime,
emprega asfixia. O partícipe não responde por homicídio qualificado (art. 121, § 2º, III, 4ª
figura), a não ser que o meio de execução empregado pelo autor principal tenha
ingressado na esfera de seu conhecimento.
111
1.1.3. Fixação do regime inicial de cumprimento de pena
Após estabelecer a quantidade da pena imposta da sentença, cumpre ao
juiz fixar o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade, levando
em conta: a) a quantidade da pena imposta; b) a reincidência; c) as circunstâncias
judiciais do art. 59 do Código Penal.
Nos termos do artigo 33, “caput”, do Código Penal, nos crimes apenados
com reclusão, o juiz poderá fixar o regime inicial fechado, semiaberto ou aberto.
Aos crimes apenados com detenção, o juiz poderá fixar o regime inicial
semiaberto ou aberto. Logo, nos crimes apenados com detenção não é possível
ao juiz fixar o regime inicial fechado, podendo, no entanto, haver regressão para
o regime fechado, no caso, por exemplo, de falta grave.
O início do cumprimento da pena para os crimes apenados com reclusão
se dará da seguinte forma, nos termos do art. 33, § 2º, do Código Penal.
a) o condenado a pena superior a 08 anos deverá começar a cumprir a
pena privativa de liberdade no regime fechado;
b) o primário, cuja pena seja superior a 04 anos e não exceda a 08, poderá,
desde o princípio, cumpri-la em regime semiaberto;
c) o primário, cuja pena seja igual ou inferior a 04 anos, poderá, desde o
início, cumpri-la em regime aberto.
Em que pese parte da doutrina entender que o reincidente deverá iniciar
a cumprir a pena no regime fechado, o Superior Tribunal de Justiça abrandou
esse rigor ao editar a Súmula 269, segundo a qual “É admissível a adoção do
regime prisional semi-aberto aos reincidentes condenados à pena igual ou
inferior a 04 anos se favoráveis as circunstâncias judiciais”.
Nos crimes apenados com detenção, os critérios para a definição do
regime inicial são os seguintes:
a) Se a pena for superior a 04 anos, o juiz fixará o regime inicial semiaberto;
b) Se a pena for igual ou inferior a 04 anos, o regime inicial será o aberto.
c) Se o condenado for reincidente, o regime inicial será o semiaberto,
independentemente da quantidade da pena.
112
O regime inicial não depende, pois, exclusivamente, da quantidade da
pena fixada, mas também das circunstâncias judiciais da fixação da pena-base,
previstas no art. 59 do CP. Desde que haja fundamentação expressa na sentença,
o condenado que tenha péssimos antecedentes, alta periculosidade, desvio de
comportamento moral, insensibilidade e perversão, ainda que primário e
condenado a pena inferior a 04 anos, deve ficar sujeito ao regime fechado.
Além disso, a imposição de regime inicial fechado depende de
fundamentação adequada, não se revestindo a gravidade em abstrato do delito
motivação idônea para a fixação de do regime de cumprimento de pena mais
severo do que a pena aplicada exigir. É o que se extrai das Súmulas 718 e 719,
ambos do Supremo Tribunal Federal, e Súmula 440 do Superior Tribunal de
Justiça.
113
autores de infrações penais consideradas mais leves, provocando-lhes a
recuperação através de restrições a certos direitos.
Nos termos do artigo 43 do Código Penal, as penas restritivas de direitos
são: a) prestação pecuniária; b) perda de bens e valores; c) prestação de serviço à
comunidade ou a entidades públicas; d) interdição temporária de direitos; e)
limitação de fim de semana.
Trata-se de rol taxativo, não sendo possível o magistrado, no momento da
sentença, criar pena alternativa diversa da prevista em lei.
114
2.2.3. Requisitos das penas restritivas de direitos
A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos não
se aplica para qualquer crime. Devem ser observados requisitos objetivos e
subjetivos, previstos no artigo 44 do Código Penal.
Se, no caso concreto, todos os requisitos estiverem presentes, constitui
direito subjetivo do réu a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva
de direitos.
115
b) Natureza do crime cometido
As penas restritivas de direitos são aplicáveis aos crimes cometidos sem
violência ou grave ameaça à pessoa.
116
Convém notar que esses requisitos praticamente reproduzem as
circunstâncias judiciais previstas no artigo 59, “caput”, do Código Penal, com
exceção de duas: comportamento da vítima e consequências do crime,
coincidentemente as únicas de natureza objetiva. Logo, verifica-se que o art. 44,
III, do Código Penal somente levou em conta as circunstâncias subjetivas.
117
2.3. DA PENA DE MULTA
2.3.1. Conceito
Trata-se de uma sanção penal, de natureza patrimonial, consistente no
pagamento de uma determinada quantia em pecúnia, previamente fixada em
lei, em favor do Fundo Penitenciário Nacional.
118
O juiz, tendo em vista a situação econômica do condenado, pode dividir o
valor total da multa em quantas parcelas necessárias.
Efetuado o pagamento da multa, de uma ou outra forma, julga-se extinta
a pena.
É possível a cobrança da multa mediante o desconto nos vencimentos do
condenado ou no seu salário, quando: aplicada isoladamente, aplicada
cumulativamente com pena restritiva de direitos ou quando concedido o sursis.
119
estabeleceu critérios para o juiz fixar a pena em decorrência de uma sentença
penal condenatória.
Nesse sentido, compete ao juiz proceder à fixação da pena, observando as
seguintes fases, conforme a suficiência para prevenção e reprovação da infração
penal. Assim, conforme o artigo 59 do Código Penal, o Magistrado deverá:
a) escolher a pena a ser aplicada dentre as previstas;
b) determinar a quantidade de pena aplicada, dentro dos limites legais;
c) fixar o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade;
d) verificar a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade
aplicada por outra espécie de pena, se cabível.
Da leitura do artigo 68 do Código Penal, verifica-se que, em relação à pena
privativa de liberdade, a legislação penal adotou o critério trifásico,
preconizado por Nelson Hungria: “A pena-base será fixada atendendo-se ao
critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias
atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento”.
Em relação à pena de multa, convém repetir, o Código Penal adotou o
sistema bifásico, conforme se extrai do artigo 49 do Código Penal.
120
legal. De outro lado, se as circunstâncias judiciais forem desfavoráveis ao réu, não
será possível ao juiz fixar a pena-base além do máximo da pena cominada ao
delito. Assim, por exemplo, em relação ao crime de furto simples (CP, art. 155,
“caput”), o juiz somente poderá fixar a pena-base dentro do limite de 01 (um) a
04 (quatro) anos.
Não há nenhum dispositivo legal norteando o juiz na fixação da pena-
base, encarregando-se a doutrina e a jurisprudência estabelecer critérios
basilares para o montante da pena-base, sempre ressaltando a
discricionariedade do juiz.
De todo modo, se todas as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código
Penal forem favoráveis ao réu, a pena-base, como regra óbvia, deverá ser fixada
no mínimo legal. Se alguma circunstância judicial for desfavorável ao réu, o juiz
está autorizado a fixar a pena-base acima do mínimo legal.
121
Da mesma forma, no crime de aborto (CP, arts. 124 a 127) não incide a
agravante consistente em praticar crime contra mulher grávida (CP, art. 61, II, “h”,
4ª figura), já que tal circunstância constitui, integra, tal delito.
O rol das agravantes é taxativo, não admitindo ampliação.
Após a fixação da pena-base, adotando como parâmetro as circunstâncias
judiciais, cumpre ao juiz passar para a segunda fase, fixando a pena, ainda
provisória, levando em conta as circunstâncias agravantes e atenuantes.
A quantidade da pena a ser agravada ou atenuada fica a critério do juiz,
uma vez que não há nenhum dispositivo legal fixando os parâmetros.
Invariavelmente, na segunda fase de aplicação da pena, é possível se
deparar com a presença, no mesmo contexto fático e processual, de duas ou
mais agravantes e atenuantes. Nessas hipóteses, poder-se-ia ter a falsa
impressão que bastaria estabelecer uma compensação entre as agravantes e
atuantes: havendo mais agravantes, a pena será elevada (3 agravantes – 2
atenuantes = 1 agravante); havendo mais atenuantes, a pena será diminuída (3
atenuantes – 2 agravantes = 1 atenuante). Trata-se de entendimento equivocado,
sobretudo diante da regra prevista no artigo 67 do Código Penal.
Conforme dispõe o artigo 67 do Código Penal, havendo concurso entre
agravantes e atenuantes, ou seja, estando presentes no processo
simultaneamente agravantes e atenuantes, preponderam as circunstâncias
subjetivas (personalidade, motivos e reincidência).
Exemplo: Réu reincidente (CP, art. 61, I) que reparou os danos (CP, art. 65,
III, “b”). Nesse caso, deve preponderar a circunstância subjetiva (reincidência). Ou
seja, o juiz, na segunda fase, deverá agravar mais a pena do que atenuar, na
medida em que a reincidência é circunstância preponderante em relação à
atenuante de reparar o dano.
Do mesmo modo, fará sobrepor a atenuante do relevante valor moral
(motivo) à agravante do crime praticado contra enfermo. Assim, deverá o juiz, na
segunda fase, atenuar mais a pena do que agravar, já que a circunstância
122
atenuante do motivo de relevante valor moral (art. 65, III, “a”) prepondera em
relação à agravante de praticar crime contra enfermo (art. 61, II, “h”).
Em que pese não constar expressamente no artigo 67 Código Penal, a
jurisprudência tem entendido que o fato de o agente ser menor de 21 anos na
data do crime deve preponderar sobre todas as demais.
123
3.2.2. Primeira fase da fixação da pena: pena-base e circunstâncias judiciais
As circunstâncias judiciais são as que envolvem o crime, nos aspectos
objetivo e subjetivo, extraídas da livre apreciação do juiz, desde que respeitados
os parâmetros fixados pelo legislador no art. 59 do Código Penal, constituindo
efeito residual das circunstâncias legais.
A fixação da pena-base leva em conta a análise das circunstâncias judiciais
previstas no artigo 59 do Código Penal. São chamadas de circunstâncias judiciais
porque, na fixação da pena-base, o juiz detém amplo grau de discricionariedade.
Todavia, em que pese o grau de discricionariedade, o juiz, nessa fase, está
restrito à cominação legal da pena, devendo observar o mínimo e o máximo da
pena legalmente prevista. Em outras palavras, ainda que todas as circunstâncias
judiciais sejam favoráveis ao réu, a pena-base não poderá ficar abaixo do mínimo
legal. De outro lado, se as circunstâncias judiciais forem desfavoráveis ao réu, não
será possível ao juiz fixar a pena-base além do máximo da pena cominada ao
delito. Assim, por exemplo, em relação ao crime de furto simples (CP, art. 155,
“caput”), o juiz somente poderá fixar a pena-base dentro do limite de 01 (um) a
04 (quatro) anos.
Não há nenhum dispositivo legal norteando o juiz na fixação da pena-
base, encarregando-se a doutrina e a jurisprudência estabelecer critérios
basilares para o montante da pena-base, sempre ressaltando a
discricionariedade do juiz.
De todo modo, se todas as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código
Penal forem favoráveis ao réu, a pena-base, como regra óbvia, deverá ser fixada
no mínimo legal. Se alguma circunstância judicial for desfavorável ao réu, o juiz
está autorizado a fixar a pena-base acima do mínimo legal.
124
3.2.3. Segunda fase da fixação da pena: Circunstâncias agravantes e
atenuantes
3.2.3.1. Agravantes genéricas
No art. 61, “caput”, o Código Penal emprega o advérbio “sempre”,
indicando que, via de regra, as agravantes são de aplicação obrigatória. Em razão
disso, o juiz não pode deixar de agravar a pena, ficando o quantum da pena ao
seu critério.
Todavia, quando uma das circunstâncias agravantes funciona como
elementar ou como circunstância qualificadora não se aplica a agravante, a fim
de evitar o “bis in idem”.
Assim, se, por exemplo, o agente praticar homicídio por motivo fútil (CP,
art. 121, § 2º, II), não incide a agravante do art. 61, II, “a”, 1ª figura (ter sido o crime
cometido por motivo fútil), pois a circunstância genérica funciona como
“qualificadora” do homicídio.
Da mesma forma, no crime de aborto (CP, arts. 124 a 127) não incide a
agravante consistente em praticar crime contra mulher grávida (CP, art. 61, II, “h”,
4ª figura), já que tal circunstância constitui, integra, tal delito.
O rol das agravantes é taxativo, não admitindo ampliação.
Após a fixação da pena-base, adotando como parâmetro as circunstâncias
judiciais, cumpre ao juiz passar para a segunda fase, fixando a pena, ainda
provisória, levando em conta as circunstâncias agravantes e atenuantes.
A quantidade da pena a ser agravada ou atenuada fica a critério do juiz,
uma vez que não há nenhum dispositivo legal fixando os parâmetros.
Invariavelmente, na segunda fase de aplicação da pena, é possível se
deparar com a presença, no mesmo contexto fático e processual, de duas ou
mais agravantes e atenuantes. Nessas hipóteses, poder-se-ia ter a falsa
impressão que bastaria estabelecer uma compensação entre as agravantes e
atuantes: havendo mais agravantes, a pena será elevada (3 agravantes – 2
atenuantes = 1 agravante); havendo mais atenuantes, a pena será diminuída (3
125
atenuantes – 2 agravantes = 1 atenuante). Trata-se de entendimento equivocado,
sobretudo diante da regra prevista no artigo 67 do Código Penal.
Conforme dispõe o artigo 67 do Código Penal, havendo concurso entre
agravantes e atenuantes, ou seja, estando presentes no processo
simultaneamente agravantes e atenuantes, preponderam as circunstâncias
subjetivas (personalidade, motivos e reincidência).
Exemplo: Réu reincidente (CP, art. 61, I) que reparou os danos (CP, art. 65,
III, “b”). Nesse caso, deve preponderar a circunstância subjetiva (reincidência). Ou
seja, o juiz, na segunda fase, deverá agravar mais a pena do que atenuar, na
medida em que a reincidência é circunstância preponderante em relação à
atenuante de reparar o dano.
Do mesmo modo, fará sobrepor a atenuante do relevante valor moral
(motivo) à agravante do crime praticado contra enfermo. Assim, deverá o juiz, na
segunda fase, atenuar mais a pena do que agravar, já que a circunstância
atenuante do motivo de relevante valor moral (art. 65, III, “a”) prepondera em
relação à agravante de praticar crime contra enfermo (art. 61, II, “h”).
Em que pese não constar expressamente no artigo 67 Código
Penal, a jurisprudência tem entendido que o fato de o agente ser menor de 21
anos na data do crime deve preponderar sobre todas as demais.
3.3. DA REINCIDÊNCIA
3.1.1. Introdução
A reincidência pressupõe uma sentença condenatória transitada em
julgado por prática de crime. Há reincidência somente quando o novo crime for
cometido após a sentença condenatória de que não cabe mais recurso.
Exemplo: o agente pratica um crime, sendo processado e condenado. Não
recorre, vindo a sentença transitar em julgado. Meses depois, vem a praticar novo
crime. É considerado reincidente uma vez que cometeu novo delito após o
trânsito em julgado de sentença que o condenou por prática de crime.
126
Se o agente praticar o novo crime exatamente no dia em que transitar em
julgado a sentença penal condenatória pelo crime anterior, não incide a
agravante da reincidência, pois a lei é expressa ao mencionar que o novo crime
deve ser praticado “depois” do trânsito em julgado. No dia do trânsito, portanto,
não se encaixa na hipótese legal.
Além disso, complementando os pressupostos da reincidência, o artigo 7º
da Lei de Contravenções Penais dispõe que: “verifica-se a reincidência quando o
agente pratica uma contravenção depois de passar em julgado a sentença que
o tenha condenado, no Brasil, ou no estrangeiro, por qualquer crime, ou, no Brasil,
por motivo de contravenção”.
Assim, podem ocorrer várias hipóteses:
a) o agente, condenado irrecorrivelmente pela prática de um crime, vem
a cometer outro delito: é reincidente (CP, art. 63).
b) o agente pratica um crime; condenado irrecorrivelmente, vem a
cometer uma contravenção: é reincidente (CP, art. 7º LCP).
c) o sujeito pratica uma contravenção, vindo a ser condenado por
sentença transitada em julgado; comete outra contravenção: é considerado
reincidente (LCP, art. 7º).
d) O sujeito comete uma contravenção; é condenado por sentença
irrecorrível; pratica um crime: não é reincidente (CP, art. 63).
O crime anterior pode ter sido cometido no Brasil ou no estrangeiro. Na
última hipótese, a sentença estrangeira não precisa ser homologada. Pode-se
encontrar descrito no Código Penal ou em lei extravagante.
Se o juiz aplicou o perdão judicial em relação ao delito anterior, vindo o
sujeito a cometer novo crime não será considerado reincidente, nos termos do
art. 120 do Código Penal.
127
Informativo 636 STF: Condenações anteriores pelo delito do art. 28 da Lei n.
128
Consideremos a hipótese de o agente ter iniciado a cumprir a pena no dia
10/08/2010. Após cumprir 1/3 da pena, dois anos, portanto, obteve o livramento
condicional em 10/08/2012, cumprindo integralmente a pena no dia 10/08/2016.
Em 10/09/2017, o agente pratica novo crime. Nesse caso, não será
considerado reincidente, pois se passaram mais de 05 (cinco) anos entre a data
do cumprimento da pena e a prática do novo crime, computando-se o período
de prova do livramento condicional.
129
3.4. CIRCUNSTÂNCIAS ATENUANTES (ARTS. 65 E 66 DO CP)
As circunstâncias atenuantes são de aplicação em regra obrigatória, pois
o caput do art. 65 reza: “são circunstâncias que sempre atenuam a pena”.
Entretanto, quando a pena-base for fixada no mínimo legal, a incidência
da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo da pena
mínima cominada. É o que se extrai da Súmula 231 do STJ: “A incidência da
circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo
legal”.
É possível que a atenuante do artigo 65 funcione na Parte Especial do
Código Penal como causa da diminuição da pena. Nesse caso, não se aplica a
atenuante genérica. Exemplo: A circunstância consistente em praticar crime por
motivo de relevante valor moral ou social integra o homicídio privilegiado (CP,
art. 121, § 1º); logo, não poderá ser considerada como atenuante genérica.
Ao contrário das circunstâncias agravantes, que somente podem ser
aplicadas se expressamente previstas em lei, pode o Magistrado considerar, na
segunda fase de fixação da pena, atenuante não prevista em lei, levando em
conta circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime. É o que se extrai do
artigo 66 do Código Penal.
Assim, se, por exemplo, restar comprovado que o agente praticou o crime
de furto em razão de desemprego ou moléstia grave na família, poderá o
Magistrado considerar essa circunstância para atenuar a pena, ainda que não
expressamente prevista em lei.
3.5 TERCEIRA FASE DA APLICAÇÃO DA PENA: CAUSAS DE AUMENTO E DE
DIMINUIÇÃO DA PENA
Na terceira e última fase de aplicação da pena, o juiz deve considerar as
causas de aumento e de diminuição da pena presentes no caso concreto. Essas
causas de aumento e de diminuição da pena podem estar previstas tanto na
Parte Geral do Código Penal quanto na Parte Especial.
São causas de facultativo ou obrigatório aumento ou diminuição da
sanção penal em quantidade fixada pelo legislador, geralmente em frações.
130
As causas de aumento ou de diminuição da pena dividem-se em
genéricas, quando previstas na Parte Geral do Código Penal, e específicas, se
previstas na Parte Especial do Código Penal ou em legislação especial.
Na parte geral do Código Penal, encontram-se, por exemplo, as seguintes
causas de aumento e de diminuição da pena: art. 14, parágrafo único; art. 24, § 2º;
art. 26, parágrafo único; art. 28, § 2º; art. 29, §1º; art. 60, § 1º; art. 70, “caput”; art. 71,
“caput”; 73, 2ª parte, e 74, parte final.
Na parte especial do Código Penal, podem ser citados como exemplos as
circunstâncias do art.. 121, §§1º e 4º; art. 122, parágrafo único; art. 157, § 2º.
Causa de aumento de pena não se confunde com qualificadora. Nesta, o
legislador eleva a pena no seu mínimo e no máximo, enquanto na causa de
aumento de pena o legislador eleva a pena em frações.
Nos termos do artigo 68 do Código Penal, após analisar as circunstâncias
judiciais encontrando a pena-base e verificar a presença de agravantes e
atenuantes, obtendo a pena provisória, o Magistrado deverá, por último,
considerar as causas de aumento e de diminuição da pena, se presentes no caso
concreto.
O cálculo decorrente da causa de aumento ou diminuição da pena deve
incidir sobre a pena provisória, encontrada na segunda fase, de forma cumulada.
É importante salientar que, com o reconhecimento de causa de aumento
ou de diminuição de pena, o juiz pode aplicar pena acima da máxima ou inferior
à mínima cominada em abstrato.
131
E o fundamento dessa limitação diz respeito à vedação constitucional da
pena de caráter perpétuo (CF, art. 5º, XLVII, “b”).
Com efeito, de nada adiantaria a vedação constante na Constituição
Federal ao agente condenado a penas privativas de liberdade no montante de
60, 70, 80 anos, por exemplo.
Além disso, a limitação do tempo de cumprimento de pena também
encontra fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no
artigo 1º, III, da Constituição Federal.
Assim, nos termos do artigo 75, § 1º, do Código Penal, quando o agente for
condenado a penas privativas de liberdade cuja soma seja superior a 40
(quarenta) anos, devem elas ser unificadas para atender ao limite máximo de 40
(quarenta) anos.
Todavia, esse limite só se refere ao tempo de cumprimento de pena, não
podendo servir de base para o cálculo de outros benefícios, como o livramento
condicional e progressão de regime.
Nesse sentido é o teor da súmula 715 do STF: “A pena unificada para
atender ao limite de trinta anos de cumprimento, determinado pelo art. 75 do
Código Penal, não é considerada para a concessão de outros benefícios, como o
livramento condicional ou regime mais favorável de execução”.
Logo, se o agente ostentar condenação no montante, por exemplo, de 50
(cinquenta) anos, o limite de cumprimento da pena será 40 (trinta) anos, mas o
requisito objetivo para obtenção dos benefícios externos, tais como progressão
de regime e livramento condicional, por exemplo, levará em conta o total da
pena, ou seja, 50 (cinquenta) anos.
132
04. CONCURSO DE CRIMES
133
Ocorre o concurso formal (ou ideal) quando o agente, mediante uma só ação ou
omissão, pratica dois ou mais crimes (CP, art. 70, “caput”). Há unidade de conduta e
pluralidade de crimes.
A unidade de conduta se concretiza quando os atos são realizados no mesmo
contexto espacial e temporal, não exigindo, necessariamente, ato único. De fato, pode
haver unidade de conduta mesmo quando fracionada em vários atos, como, por
exemplo, agente que subtrai objetos pertencentes a pessoas distintas, no mesmo
contexto fático.
O Superior Tribunal de Justiça tem entendido que praticado o crime de roubo
em um mesmo contexto fático, mediante uma só ação, contra vítimas diferentes, tem-
se configurado o concurso formal de crimes.
134
A expressão “desígnios autônomos” abrange tanto o dolo direto quanto o dolo
eventual. Assim, haverá concurso formal imperfeito, por exemplo, entre o delito de
homicídio doloso com dolo direto e outro com dolo eventual.
4.3.2. Requisitos
Para a incidência das regras do crime continuado é preciso verificar a presença
de requisitos dispostos no artigo 71 do Código Penal, consistentes: a) pluralidade de
condutas; b) pluralidade de crimes da mesma espécie; c) mesmas condições de tempo,
lugar, maneira de execução e outras semelhantes.
a) Pluralidade de condutas
Nos termos do artigo 71 do Código Penal, o crime continuado se caracteriza pelo
fato de o agente praticar crimes mediante mais de uma ação ou omissão, exigindo, pois,
pluralidade de condutas.
Distingue-se do concurso material, que também exige pluralidade de condutas,
por força da incidência dos demais requisitos, ou seja, a prática de crimes de mesma
espécie, nas mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução.
136
b) Crimes da mesma espécie
Crimes da mesma espécie são os que estiverem previstos no mesmo tipo penal,
considerando-se, inclusive, as figuras simples ou qualificadas, dolosas ou culposas,
tentadas ou consumadas.
De outro lado, a teor da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não há
como reconhecer a continuidade delitiva entre os crimes de roubo e o de latrocínio
porquanto são delitos de espécies diversas, já que tutelam bens jurídicos diferentes.1
c) Condições de tempo
Exige-se, para caracterizar crime continuado, conexão temporal entre as
condutas praticadas para que se configure a continuidade delitiva. Deve existir, em
outros termos, uma certa periodicidade que permita observar-se um certo ritmo, uma
certa uniformidade, entre as ações sucessivas, embora não se possam fixar, a respeito,
indicações precisas.
A jurisprudência tem admitido crime continuado quando entre as infrações
penais não houver decorrido período superior a 30 (trinta) dias.
d) Condições de lugar
Deve existir entre os crimes da mesma espécie uma conexão espacial para
caracterizar o crime continuado.
A prática de crimes da mesma espécie em locais diversos não exclui a
continuidade. Assim, crimes praticados em bairros diversos de uma mesma cidade, ou
em cidades próximas, podem ser entendidos como praticados em condições de lugar
semelhantes.
e) Maneira de execução
A lei exige que a forma de execução das infrações continuadas seja semelhante,
traduzindo-se no modo, forma e os meios empregados para a prática dos delitos.
Exemplo: empregado de um estabelecimento comercial que subtrai, diariamente,
objetos da empresa.
1 HC 384875/SP, Superior Tribunal de Justiça, Rel. Min. Ribeiro Dantas, 5ª Turma, j. 20/03/2018.
137
Todavia, um crime de furto qualificado pela escalada e outro furto qualificado
pela destreza, conquanto crimes da mesma espécie, inviabilizam a incidência do crime
continuado, já que empregaram modos de execução distintos.
138
c) somente em crimes dolosos
Se a ação criminosa for praticada contra vítimas diferentes, com violência à
pessoa, mas não for produto de uma conduta dolosa, não estará caracterizada a exceção.
2 HC 131871/ PR, Supremo Tribunal Federal, Rel. Min. Dias Toffoli, 2ª Turma, j. 31/05/2016.
139
05. DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DA EXECUÇÃO DA PENA
(SURSIS)
5.1. CONCEITO
Trata-se de um instituto de política criminal, tendo por fim a suspensão da
execução da pena privativa de liberdade, evitando o recolhimento ao cárcere do
condenado não reincidente condenado à pena não superior a 02 anos (ou a 04 anos, na
hipótese de sursis etário ou humanitário), mediante o cumprimento de determinadas
condições, fixadas pelo juiz, durante o período de prova.
Em outras palavras, o réu é condenado a uma pena privativa de liberdade, e, se
preenchidos os requisitos do artigo 77 do Código Penal, a execução da pena ficará
suspensa, mediante o cumprimento das condições impostas pelo juiz.
Esgotado o período de prova sem revogação do “sursis”, o Magistrado declarará
extinta a pena imposta ao réu.
4.2. REQUISITOS
Os requisitos da suspensão condicional da execução da pena estão previstos no
artigo 77 do Código Penal.
140
b) Quantidade da pena privativa de liberdade
Como regra geral, a quantidade da pena imposta na sentença não pode ser
superior a 02 (dois) anos, ainda que resulte, no concurso de crimes, de sanções inferiores
a ela.
Tratando-se, entretanto, de condenado maior de setenta anos de idade, ao
tempo da sentença ou do acórdão (sursis etário) ou em razão de saúde (sursis
humanitário ou profilático), a pena aplicada pode ser igual ou inferior a quatro anos (CP,
art. 77, § 2º).
Em se tratando de concurso de crimes, em qualquer das suas espécies, a pena
aplicada, considerando os critérios da exasperação da pena ou cúmulo material, não
pode ser superior a 02 anos (ou 04 anos, na hipótese de sursis etário ou humanitário).
Assim, em relação ao crime continuado, descabe a aplicação analógica da
Súmula 497 do Supremo Tribunal Federal.
Portanto, é perfeitamente possível aplicar a suspensão condicional da pena ao
concurso de crimes, bastando que a pena aplicada não ultrapasse o limite imposto pela
lei. Dessa forma, se, em virtude de concurso material, o sentenciado obtiver uma pena
de 1 ano e 6 meses, fruto de três penas de 6 meses cada uma, seria possível aplicar o
benefício.
141
5.2.2. Requisitos subjetivos
a) Condenado não reincidente em crime doloso
Nem toda reincidência impede a concessão do sursis, mas somente a
reincidência em crime doloso. Isso quer dizer que a condenação anterior, mesmo
definitiva, por crime culposo ou por simples contravenção, por si só, não é causa
impeditiva da suspensão condicional da pena.
Todavia, a reincidência, ainda que em crime doloso, em decorrência de anterior
condenação a pena de multa, não impede a concessão do “sursis’ (CP, art. 77, § 1º).
5.3. CONDIÇÕES
Durante o período do sursis, o condenado deve cumprir determinadas
condições, sob pena de ser revogada a medida e ter de cumprir a sanção privativa de
liberdade. Essas condições são: a) legais: impostas pela lei (CP, arts. 78, § 1º, e 81); b)
judiciais: impostas pelo juiz na sentença (CP, art. 79).
No sursis simples, a condição legal e obrigatória consiste na prestação de
serviços à comunidade ou limitação de fim de semana, no primeiro ano do período de
suspensão ( CP, art. 78, § 1º, 1ª parte).
Tratando-se de sursis especial, satisfeitos os seus requisitos, as condições
alternativas da prestação de serviços à comunidade e a limitação de fim de semana são
substituídas por: proibição de frequentar determinados lugares; proibição de ausentar-
se o condenado da comarca onde reside, sem autorização judicial; e comparecimento
pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades (CP,
art. 78, § 2º, alíneas “a” e “c”).
As condições legais do sursis especial, previstas no art. 78, § 2º, alíneas “a”, “b” e
“c”, do Código Penal, devem ser impostas cumulativamente.
142
5.4. PERÍODO DE PROVA
É o prazo em que a execução da pena privativa de liberdade imposta fica
suspensa, mediante o cumprimento das condições estabelecidas.
Como regra geral, o período de prova varia entre dois a quatro anos (CP, art. 77,
“caput”). Sendo o condenado maior de setenta anos de idade ou por razões de saúde, o
prazo varia de quatro a seis anos (CP, art. 77, § 2º). Tratando-se da contravenção, o período
de prova varia de um a três anos (LCP, art. 11).
O período de prova deve ser fixado segundo a natureza do crime, personalidade
do agente e intensidade da pena, não podendo o juiz, senão em hipótese excepcional,
estabelecê-lo no prazo máximo.
a) Revogação obrigatória
A revogação obrigatória decorre de lei, não ficando ao critério do Magistrado
decretá-la ou não. A margem de discricionariedade do Magistrado é limitada pela lei,
sendo seu dever revogar o benefício.
Nos termos do artigo 81 do Código Penal, a suspensão condicional da execução
da pena será revogada, no curso do prazo, o beneficiário:
143
Todavia, se a nova condenação se referir somente à pena de multa, não haverá
revogação do benefício. Com efeito, se a condenação anterior à pena de multa, mesmo
por crime doloso, não impede a concessão do sursis (CP, art. 77, § 1º), também não pode
ser causa de revogação do benefício.
II. frustra, embora solvente, a execução de pena de multa ou não efetua, sem motivo
justificado, a reparação do dano
Trata-se da hipótese de o condenado solvente criar embaraços para frustrar a
execução da pena de multa que obstem a cobrança da multa, não efetuando o seu
pagamento.
Nesse particular, há duas posições acerca dessa causa de revogação do “sursis”.
A primeira posição adota o entendimento no sentido de que, com a redação do
art. 51 do Código Penal, não incide mais essa hipótese de revogação. Para essa corrente,
se o inadimplemento da pena de multa não mais acarreta a sua conversão em detenção,
já que será considerada como dívida de valor, também não poderá, como efeito da
revogação do benefício, acarretar a privação da liberdade, já que o condenado terá de
cumprir a pena privativa de liberdade suspensa.
A segunda posição considera possível a revogação do “sursis” pela frustração do
pagamento da pena de multa. Isso porque o “sursis” não se confunde com a pena de
multa, já que decorre de benefício conferido somente à pena privativa de liberdade.
Além disso, o artigo 51 do Código Penal tem incidência somente em relação ao
inadimplemento da pena de multa, nada dispondo, portanto, acerca da causa de
revogação do “sursis” pela frustração da execução da pena de multa.
De todo modo, prevalece o entendimento no sentido de que, uma vez revogado
o “sursis”, se o condenado efetuar o pagamento da pena de multa, o benefício poderá
ser restabelecido.
Também constitui causa obrigatória de revogação do “sursis” a ausência
injustificada da reparação do dano. Assim, se justificada a impossibilidade de reparação
do dano, como, por exemplo, a precária situação financeira do condenado, não incidirá
a causa de revogação do benefício.
144
III. descumpre a condição do § 1º do art. 78 deste Código
Como ocorre na hipótese da reparação do dano, somente o descumprimento
injustificado a prestação de serviços à comunidade ou da limitação de fim de semana
ensejará a revogação do benefício.
b) Revogação facultativa
Incidindo uma causa de revogação facultativa do “sursis” ficará a critério do juiz
revogar ou não o benefício.
As hipóteses de revogação facultativa estão previstas no art. 81, § 1º, do Código
Penal. Nesse caso, o juiz não está obrigado a revogar o benefício, podendo optar por
advertir novamente o sentenciado, prorrogar o período de prova até o máximo ou
exacerbar as condições impostas, conforme dispõe o artigo 81, § 3º, do Código Penal.
São duas as hipóteses de revogação facultativa:
145
07. Parte geral - Livramento condicional, Efeito da sentença
penal condenatória, Medida de segurança
1.1.2. REQUISITOS
Os requisitos do livramento condicional, de ordem objetiva e subjetiva,
encontram-se no art. 83 do Código Penal.
3 HC 102.278/RJ. Superior Tribunal de Justiça. Rel. Min. Jane Silva (Desembargadora Convocada do
TJ/MG), 6ª Turma, julgado em 03/04/2008.
147
III. Reparação do dano, salvo efetiva impossibilidade
Nos termos do art. 91, I, do Código Penal, a condenação torna certa a obrigação
de indenizar o dano resultante do crime. Assim, o condenado não pode obter o
livramento condicional enquanto não repara o dano causado, salvo quando insolvente.
Na prática, esse requisito tem limitado alcance, uma vez que, via de regra, os
condenados são pessoas pobres, absolutamente insolventes, sem a menor possibilidade
de reparar o dano causado.
148
b) Não cometimento de falta grave nos últimos 12 meses
A Lei 13.964/2019 acrescentou mais um requisito para obtenção do livramento
condicional, consistente no não cometimento de falta grave nos últimos 12 meses de
execução da pena.
As hipóteses de falta grave durante a execução da pena estão previstas no artigo
50 da Lei 7210/84.
Se o condenado praticou falta grave ao longo dos últimos 12 meses, não terá
direito à obtenção do livramento condicional, ainda que preenchidos os demais
requisitos.
149
É vedado o livramento condicional:
ao pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte (LEP, art.
112, VI, “a” e “c”);
O condenado expressamente em sentença por integrar organização criminosa
ou por crime praticado por meio de organização criminosa não poderá progredir de
regime de cumprimento de pena ou obter livramento condicional ou outros benefícios
prisionais se houver elementos probatórios que indiquem a manutenção do vínculo
associativo (Lei 12850/2013, art. 2º, § 9º);
Reincidente em crime hediondo ou equiparado (CP, art. 83, V).
150
As condições judiciais podem ser modificadas no transcorrer do livramento,
visando sempre atender aos fins da pena e à situação do condenado (Lei 7.210/84, art.
144).
151
02. EFEITOS DA SENTENÇA CONDENATÓRIA
4 Súmula 269 STJ: “É admissível a adoção do regime prisional semi-aberto aos reincidentes
condenados a pena igual ou inferior a quatro anos se favoráveis as circunstâncias judiciais.”
152
d) vedação da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de
direitos na hipótese de prática de novo crime, ressalvada a hipótese do artigo 44, § 3º, do
Código Penal;
e) vedação da concessão da suspensão condicional da pena em relação ao novo
crime (CP, art. 77, I), e revogação do “sursis” (CP, art. 81, I, e § 1º);
f) causa de revogação do livramento condicional (CP, arts. 86 e 87);
g) aumento e interrupção do prazo da prescrição da pretensão executória,
quando reconhecida a reincidência pela prática de outro crime (CP, arts. 110, “caput”, e
117, VI);
h) vedação da concessão da transação penal e da suspensão
condicional do processo, em relação ao novo crime (Lei 9.099/95, arts. 76, § 2º, I, e 89,
“caput”).
153
A sentença penal condenatória transitada em julgado permite à vítima
promover a ação de execução ex delicto, nos termos do artigo 63 do Código de Processo
Penal, já que constitui título executivo judicial, conforme prevê o artigo 515, I, do Código
de Processo Civil de 2015.
Assim, transitada em julgado a sentença penal condenatória a sua execução no
juízo cível visa tão somente estabelecer o quantum da reparação do dano, não sendo,
portanto, objeto de discussão o mérito da causa.
c) Confisco alargado
A Lei 13.964/2019 introduziu mais um efeito da sentença penal condenatória.
Nos termos do artigo 91-A do Código Penal, na hipótese de condenação por
infrações às quais a lei comine pena máxima superior a 6 (seis) anos de reclusão, poderá
ser decretada a perda, como produto ou proveito do crime, dos bens correspondentes à
diferença entre o valor do patrimônio do condenado e aquele que seja compatível com
o seu rendimento lícito.
Para efeito da perda prevista no caput do referido artigo, entende-se por
patrimônio do condenado todos os bens:
I - de sua titularidade, ou em relação aos quais ele tenha o domínio e o benefício
direto ou indireto, na data da infração penal ou recebidos posteriormente; e
II - transferidos a terceiros a título gratuito ou mediante contraprestação irrisória,
a partir do início da atividade criminal.
O condenado poderá demonstrar a inexistência da incompatibilidade ou a
procedência lícita do patrimônio.
154
A perda prevista neste artigo deverá ser requerida expressamente pelo
Ministério Público, por ocasião do oferecimento da denúncia, com indicação da
diferença apurada.
Na sentença condenatória, o juiz deve declarar o valor da diferença apurada e
especificar os bens cuja perda for decretada.
Os instrumentos utilizados para a prática de crimes por organizações criminosas
e milícias deverão ser declarados perdidos em favor da União ou do Estado, dependendo
da Justiça onde tramita a ação penal, ainda que não ponham em perigo a segurança das
pessoas, a moral ou a ordem pública, nem ofereçam sério risco de ser utilizados para o
cometimento de novos crimes.
155
depende de duas condições: a) que o crime seja doloso; b) que seja cominada pena de
reclusão.
Esse efeito não é automático, devendo ser declarada na sentença em decisão
motivada, conforme se extrai do artigo 92, parágrafo único, do Código Penal. Assim,
cumpre ao Magistrado, no caso concreto, avaliar a necessidade da imposição da
incapacidade para o exercício do poder familiar, tutela ou curatela. Exemplo: pai
condenado pela prática do crime estupro de vulnerável (CP, art. 217-A) contra filha de
tenra idade.
c) A inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para a prática de
crime doloso.
A aplicação desse efeito específico depende de dois requisitos: a) que o crime
seja doloso; b) que o veículo tenha sido utilizado “como meio” para a sua prática. Logo,
não incide esse efeito no caso de crime culposo.
3.2. ESPÉCIES
Conforme o artigo 96 do Código Penal, as medidas de segurança são de duas
espécies: detentiva e restritiva.
A medida de segurança detentiva, prevista no artigo 96, I, do Código Penal,
consiste na internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou, à falta, em
outro estabelecimento adequado.
A medida de segurança restritiva, prevista no artigo 96, II, do Código Penal,
consiste na sujeição do sentenciado a tratamento ambulatorial.
A medida de segurança detentiva é obrigatória quando for cominada pena de
reclusão ao delito imputado ao agente. Todavia, se o fato é punido com detenção, o juiz
156
poderá, considerando o grau de periculosidade do agente, submetê-lo a internação ou
a tratamento ambulatorial;
5 HC 107432/RS, Supremo Tribunal Federal, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, julgado em
24/05/2011.
157
É o que se extrai da Súmula 527 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual
“O tempo de duração da medida de segurança não deve ultrapassar o limite máximo da
pena abstratamente cominada ao delito praticado”.
158
A morte do agente constitui causa de extinção da punibilidade, por conta do
princípio da personalidade da pena, segundo a qual a pena não pode passar da pessoa
do condenado (CF/88, art. 5º, XLV, 1ª parte).
Essa extinção da punibilidade incide sobre todas as espécies de penas, inclusive
a pena de multa. Assim, se, no curso da execução da pena de multa convertida em dívida
ativa, o réu vier a falecer, deve ser declarada extinta a punibilidade do agente pela sua
morte, não sendo possível, assim, direcionar a execução da pena de multa aos seus
sucessores.
Anistia
Trata-se de uma espécie de exclusão da incidência do Direito Penal sobre uma
ou mais infrações penais. Não exclui o crime, mas apenas a possibilidade de o Estado
punir o agente que o praticou, razão pela qual tem efeito retroativo.
A competência para concessão de anistia é exclusiva da União e privativa do
Congresso Nacional (CF/88, art. 48, VIII), com a sanção do Presidente da República, só
podendo ser concedida por meio de lei federal.
Não se aplica aos delitos referentes a “prática de tortura, o tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos”
(CF/88, art. 5º, XLIII; Lei 8.072/90, art. 2º, I).
Aplica-se, em regra, a crimes políticos (anistia especial), nada obstante que incida
sobre delitos comuns (anistia comum).
A anistia tem caráter da generalidade, abrangendo fatos e não pessoas, sendo
possível impor condições específicas ao beneficiado, caracterizando a anistia
condicionada.
Pode-se citar como exemplo a anistia concedida a todos quantos, no período
compreendido entre 02 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, cometeram crimes
políticos ou conexo com estes, crimes eleitorais, aos que tiveram seus direitos políticos
159
suspensos e aos servidores da Administração Direta e Indireta, de fundações vinculadas
ao poder público, aos Servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário, aos Militares e aos
dirigentes e representantes sindicais, punidos com fundamento em Atos Institucionais
e Complementares (Lei 6.683/79, art. 1º).
Graça
A graça, ao contrário do indulto, é um benefício concedido a pessoa
determinada, condenada definitivamente pela prática de crime comum, consistente na
extinção ou comutação da pena.
Nos termos do art. 5º, XLIII, da Constituição Federal/88, a graça não pode ser
aplicada em relação a delitos referentes à prática de tortura, tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, terrorismo e aos definidos como crimes hediondos.
A competência para conceder a graça é do presidente da república, nos termos
do art. 84, XII, da Constituição Federal/88, podendo, nos termos do parágrafo único desse
artigo, delegar a atribuição “aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República
ou ao Advogado-Geral da União”.
Indulto
O indulto coletivo constitui modalidade de clemência concedida a todo
condenado que preencher os requisitos previstos no Decreto Presidencial publicado
geralmente no final de cada ano. Como se vê, o indulto, ao contrário da graça, tem
caráter coletivo e é concedido espontaneamente.
Assim como a graça, a competência para conceder o indulto é do presidente da
república, nos termos do art. 84, XII, da Constituição Federal/88, podendo, nos termos do
parágrafo único desse artigo, delegar a atribuição “aos Ministros de Estado, ao
Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União”.
Os requisitos para a concessão do indulto variam de acordo com cada decreto
publicado, considerando, invariavelmente, requisitos subjetivos (primariedade e bom
comportamento carcerário, sem registro de falta grave ao longo do ano) e objetivos
(tempo de cumprimento de pena).
Nos termos do art. 2º, I, da Lei 8072/90, o indulto não pode ser aplicado em
relação a delitos referentes à prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas
160
afins, terrorismo e aos definidos como crimes hediondos. O artigo 44 da Lei 11343/2006
também veda a concessão do indulto aos condenados pelo crime de tráfico de drogas.
O indulto também somente extingue a punibilidade, subsistindo o crime, a
condenação irrecorrível e seus efeitos secundários. Assim, se o agente beneficiado com
o indulto praticar novo crime, será considerado reincidente.
Decadência
A decadência é a perda do direito do ofendido e dos demais legitimados de
oferecer representação, no caso de ação penal pública condicionada à representação, e
de ajuizar a queixa-crime, na hipótese de ação penal privada, em face do decurso do
tempo.
Os legitimados para apresentar representação ou queixa-crime têm o prazo de
06 (seis) meses, a contar da inequívoca ciência da autoria do fato, para exercer esse
161
direito. Escoado esse prazo sem iniciativa do ofendido ou do seu representante legal
incide a decadência, e a consequente extinção da punibilidade do agente ofensor.
Com efeito, nos termos do artigo 103 do Código Penal e 38 do Código de
Processo Penal, o ofendido ou seu representante legal decai do direito de queixa ou de
representação se não o exerce dentro do prazo de seis meses, contados a partir do dia
em que veio a saber quem é o autor do crime, ou, no caso da ação penal privada
subsidiária da pública, do dia em que se esgotou o prazo para o oferecimento da
denúncia.
Como se trata de prazo penal, a contagem segue as regras do artigo 10 do Código
Penal, incluindo-se o dia do começo, excluindo-se o último dia, considerando o
calendário comum. Assim, se, por exemplo, o ofendido tomou ciência da autoria do fato
no dia 03/03/2018, terá até o dia 02/09/2018 para oferecer a representação ou ajuizar a
queixa-crime. A partir do dia 03/09/2018 já incidirá a decadência e a causa de extinção
da punibilidade.
Perempção
A perempção é uma causa de extinção da punibilidade que incide por conta da
inércia processual do querelante.
A perempção só é possível na ação penal exclusivamente privada, não sendo
aplicável à ação penal privada subsidiária da pública, já que, diante da negligência do
querelante, o Ministério Público retoma a ação penal (CPP, art. 29, parte final).
As hipóteses de perempção estão elencadas no artigo 60 do Código de Processo
Penal. E, segundo se extrai desse dispositivo, a perempção somente é possível após o
ajuizamento da ação penal privada.
162
A renúncia ao direito de queixa somente pode ser exercida na ação penal
exclusivamente privada, não sendo possível na ação penal privada subsidiária da pública,
uma vez que, se o ofendido não oferecer a queixa-crime, o Ministério Público poderá
oferecer a denúncia enquanto não incidir causa de extinção da punibilidade do agente,
como, por exemplo, pela prescrição.
Perdão do ofendido
O perdão do ofendido ou do seu representante legal consiste na manifestação,
expressa ou tácita, de desistir do prosseguimento da ação penal privada. É a desistência
manifestada após o oferecimento da queixa, que obsta o prosseguimento da ação penal
privada, conforme prevê o artigo 105 do Código Penal.
O perdão aceito do ofendido é causa extintiva de punibilidade que incide
somente na ação penal exclusivamente privada.
Tratando-se de ação penal privada subsidiária da pública (CP, art. 100, § 3º), a
desistência do ofendido de prosseguir com o processo não determina a extinção da
punibilidade, mesmo que o réu aceite o perdão, pois se trata de ação penal pública,
devendo o Ministério Público assumi-la como parte principal (CPP, art. 29).
Depois de iniciada a ação penal privada, o perdão do ofendido pode ser
manifestado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória (CPP, art. 106, §
2º).
f) Da retratação do agente
A retratação significa desdizer-se, retirar o que foi dito, confessar que errou.
Em regra, a retratação do agente não tem relevância jurídica, funcionando
somente como circunstância judicial na aplicação da pena. Excepcionalmente, o
estatuto penal lhe empresta força extintiva da punibilidade (CP, art. 107, VI).
A retratação, como causa de extinção da punibilidade, somente incide nos casos
expressamente previstos em lei, como, por exemplo, nos crimes contra a honra,
conforme prevê o artigo 143 do Código Penal.
Nos crimes contra a honra, a retratação só é cabível na calúnia e na difamação,
sendo inadmissível na injúria. Nos dois primeiros casos, importa à vítima que o ofensor
se retrate negando que ela praticou o fato imputado. Na injúria, porém, não há
163
imputação de fato, mas atribuição ao ofendido de qualidade negativa, não importando
a esta a retratação.
Também incide na hipótese prevista no art. 342, § 2º, do Código Penal, que trata
do crime de falso testemunho ou falsa perícia, segundo o qual o fato deixa de ser punível,
se, antes da sentença o agente se retrata ou declara a verdade. Essa retratação só é
possível até a sentença final do procedimento em que foi praticado o falso testemunho.
g) Perdão judicial
Perdão judicial é o instituto pelo qual o juiz, não obstante a incidência da infração
penal praticada por agente culpável, deixa de aplicar a pena nos casos expressamente
previstos em lei.
O perdão judicial constitui causa extintiva da punibilidade de aplicação restrita.
Significa que não é aplicável a todas as infrações penais, mas somente àquelas
especialmente indicadas pelo legislador.
A sentença que concede o perdão judicial é meramente declaratória da extinção
da punibilidade, não surtindo nenhum efeito penal ou extrapenal. É o que se extrai da
Súmula 18 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual “A sentença concessiva do
perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer
efeito condenatório”.
02. DA PRESCRIÇÃO
2.1. INTRODUÇÃO
Quando um indivíduo pratica, em tese, um fato típico e ilícito, surge para O
Estado o poder e o dever de buscar a punição do responsável. E essa punição é
concretizada com a sentença penal condenatória transitada em julgado, com a
imposição de uma pena, surgindo, a partir de então, a pretensão do Estado executar essa
pena.
Todavia, a pretensão punitiva e executória do Estado é limitada, não perdurando,
via de regra, por tempo indeterminado. Com efeito, a direito de punir e de executar a
pena imposta ao apenado encontra limites temporais, que, se não observados, podem
levar à extinção da punibilidade do agente pela incidência prescrição da pretensão
punitiva ou prescrição da pretensão executória.
164
A prescrição penal, pois, é a perda da pretensão punitiva ou executória do Estado
pelo decurso do tempo sem o seu exercício.
2.2. IMPRESCRITIBILIDADE
Em regra, a prescrição alcança todas as infrações penais, inclusive os crimes
hediondos e equiparados.
Todavia, nos termos da Constituição Federal, alguns crimes são imprescritíveis,
viabilizando, assim, o exercício da pretensão punitiva e executória a qualquer tempo.
São imprescritíveis os crimes de racismo (CF, art. 5º, XLII; Lei n. 7.716/89) e os
referentes à ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e
o estado democrático (CF, art. 5º, XLIV).
165
Exemplo: Supõe-se que o agente tenha sido condenado a 01 ano pela prática do
crime de furto, sendo a pena privativa de liberdade substituída por uma prestação de
serviços à comunidade. Essa pena prescreverá em 04 anos.
166
B) TERMOS INICIAIS DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA – Art. 111
O primeiro termo inicial é a data da consumação do delito (I). Constitui exceção
à teoria da atividade, pois, na prescrição, adota-se a teoria do resultado.
No caso da tentativa (II), o termo a quo da prescrição da pretensão punitiva é o
dia da cessação da atividade criminosa.
No crime permanente (III) a prescrição começa a correr do dia em que cessou a
permanência (CP, art. 111, III, 1ª figura). Suponha-se que a vítima de sequestro permaneça
presa durante 30 dias. A prescrição começa a correr a partir do dia em que conseguiu a
liberdade.
No crime continuado, a prescrição deve ser considerada em relação a cada
crime, isoladamente (art. 119).
Nos crimes de bigamia e de falsificação ou alteração de assentamento de
registro civil (arts. 235 e 299, § único), a prescrição começa a correr da data em que o fato
se tornou conhecido de qualquer autoridade pública (art. 111, IV).
Nos crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes, previstos no
Código Penal ou em legislação especial, o termo inicial da prescrição ocorre da data em
que a vítima completar dezoito anos, salvo se a esse tempo já houver sido proposta a
ação penal (art. 111, V). Esse inciso foi introduzido no Código Penal pela Lei nº 12.650/2012.
Nesse sentido, se uma criança de 10 anos for vítima de crime de estupro de
vulnerável, por exemplo, e a ação ainda não tiver sido instaurada, o prazo prescricional
passará a correr a partir da data em que ela completar 18 anos.
167
* Para todos verem: esquema sobre prescrição da pretensão punitiva em abstrato
+ de 08 anos
05 05
PPPA
04 05
2000 2008
+ de 08 anos
05 06 PPPA 08
04 03 05
2000 2002 2010
RECOMEÇA
CONTAGEM
168
05 06 05
04 03 04
2000 2002 RECOMEÇA
2006
CONTAGEM
+ de 08 anos
PPPA
2.5.2. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA RETROATIVA – Art. 110, § 1º, parte final,
do Código Penal
A prescrição retroativa tem por pressuposto o trânsito em julgado da sentença
penal condenatória para a acusação. Com o trânsito em julgado da sentença penal
condenatória para a acusação, tem-se que, a partir de eventual recurso da defesa, o
Tribunal não poderá agravar a situação do réu, sob pende incidir na reformatio in pejus
direta, o que é vedado conforme prevê o artigo 617 do Código Penal.
Assim, a base para calcular a prescrição se altera, passando a ser considerada a
pena aplicada na sentença. Nesse caso, deve-se considerar a pena aplicada na sentença
e enquadrá-la num dos incisos do artigo 109 do Código Penal para verificar o prazo
prescricional.
Verificado o prazo prescricional com base na pena aplicada na sentença, a
prescrição retroativa deve ser considerada a partir da publicação da sentença ou
acórdão condenatório para trás. Por isso, o nome retroativa, porque sua incidência é
verificada entre os marcos interruptivos existentes antes da sentença condenatória.
Nos crimes em geral, a prescrição da pretensão retroativa pode ocorrer entre a
publicação da sentença ou acórdão condenatório e o recebimento da denúncia ou
queixa.
No contexto dos crimes de competência do Tribunal do Júri, a prescrição
retroativa pode incidir: a) entre a data da publicação da sentença condenatória e decisão
169
confirmatória da pronúncia; b) entre a decisão confirmatória da pronúncia até a decisão
de pronúncia; c) entre a pronúncia e o recebimento da denúncia.
* Para todos verem: esquema sobre prescrição da pretensão punitiva em concreto retroativa
a) Sentença condenatória
b) Não PPPA
c) Transitou em julgado MP (Não pode reformatio in pejus)
d) Pena aplicada (DADO CONCRETO) Novo parâmetro para calcular
prescrição.
170
05 06 07 TJMP
(MP não recorreu)
04 05 08
2000 + de 04 anos
2004 2006
PPPR
05
06 07 TJMP
04 (MP não recorreu)
05 08
2000
2002 + de 04 anos 2006
PPPR
171
partir da sua publicação começa a correr prazo prescricional regulado pela PENA
CONCRETA.
Ex: Suponha-se que o réu venha a ser condenado a 02 anos de detenção, tendo
transitado em julgado a sentença para a acusação. Sendo a pena aplicada de 02 anos, o
prazo prescricional é de 04 anos (art. 109, inciso V, do CP). O réu interpôs recurso de
apelação, que, passados 04 anos, ainda não havia sido julgado pelo Tribunal. No caso,
passados quatro anos entre a data da publicação da sentença sem que o recurso
interposto pela defesa tenha sido apreciado, ocorrerá a prescrição da pretensão punitiva
superveniente ou intercorrente, prevista no artigo 110, § 1º, do CP.
172
* Para todos verem: esquema sobre Prescrição da Pretensão Punitiva em concreto
SUPERVENIENTE
DELITO art. 155 – Pena 1 a 4 anos
a) Sentença condenatória
b) Não PPPA
c) Transitou em julgado MP (Não pode reformatio in pejus)
d) Pena aplicada (DADO CONCRETO) Novo parâmetro para calcular
prescrição.
e) Não PPPR
05 06 07 TJMP 07
(MP não recorreu)
04 05 08 08
+ de 04 anos
2000 2002 2004 2008
PPPS
173
03. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA
Ex. Réu condenado a 01 ano de reclusão: prazo da prescrição executória: 04 anos (art.
109, V);
174
3.2. TERMOS INICIAIS DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA – Art. 112
a) DO DIA EM QUE TRANSITA EM JULGADO A SENTENÇA CONDENATÓRIA, PARA A
ACUSAÇÃO, OU A QUE REVOGA A SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA OU O
LIVRAMENTO CONDICIONAL
Cumpre observar: a prescrição da pretensão executória depende de uma
condição: O TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA PARA A
ACUSAÇÃO E DEFESA. Satisfeita a condição, entretanto, na contagem do prazo leva-se
em conta a data em que transitou em julgado para a acusação.
Ex. suponha-se que o detento fuja faltando 02 anos para o cumprimento da pena. A
partir da data da fuga começa a correr a prescrição da pretensão executória (art. 112, II, 1ª
parte), ocorrendo em 04 anos (art. 109, V, CP). Ou seja, se nesse período de 04 anos o
apenado não for localizado para dar continuidade ao cumprimento da pena, ocorrerá a
prescrição da pretensão executória.
175
* Para todos verem: esquema sobre prescrição da pretensão executória
2000 TJMP
TJSPC
05 06 07 15
04 05 08 08
15 10
2000 2002 2004 2008
08 09
+ de 04 anos
2004 2006
PPE
176
3.6. CAUSAS SUSPENSIVAS DA PRESCRIÇÃO
O Código Penal prevê causas impeditivas ou suspensivas da prescrição (art. 116),
distintas das causas interruptivas (art. 117). Na suspensão da prescrição o tempo
decorrido antes da causa é computado no prazo; na interrupção, o tempo decorrido
antes da causa não é computado no prazo, que recomeça a correr por inteiro.
177
Durante o período relativo ao acordo de não persecução penal, o prazo
prescricional ficará suspenso.
178
O art. 117, IV, CP determina que a prescrição se interrompe pela sentença
condenatória recorrível. A interrupção ocorre na data da publicação da sentença, i.e., no
dia em que o escrivão recebe a sentença do juiz e a junta aos autos, independentemente
do registro e de outras diligências.
O acórdão condenatório, ainda que não unânime, e por isso sujeito a embargos
infringentes, também interrompe o prazo prescricional da pretensão punitiva. isso
ocorre quando, tendo sido absolvido em primeiro grau, o réu vem a ser condenado pelo
acórdão do tribunal. trata-se de acórdão recorrível.
V - PELO INÍCIO OU CONTINUAÇÃO DO CUMPRIMENTO DA PENA;
Iniciando-se o prazo da prescrição da pretensão executória com o trânsito em
julgado da sentença condenatória, interrompe-se pelo começo do cumprimento da
pena. Fugindo o condenado, a prescrição começa a correr da data da fuga (art. 112, II, 1ª
parte), regulando-se pelo tempo que resta da pena (art. 113). Recapturado, interrompe-
se a prescrição.
VI - PELA REINCIDÊNCIA.
A REINCIDÊNCIA SOMENTE INTERROMPE O PRAZO DA PRESCRIÇÃO DA
PRETENSÃO EXECUTÓRIA, SENDO INAPLICÁVEL À PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO
PUNITIVA (ART. 109). Nesse sentido, a Súmula 220 do STJ: “A reincidência não influi no
prazo da prescrição da pretensão punitiva”.
179
180