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1ª Fase | 37° Exame da OAB

Direito Penal

1ª FASE 37° EXAME

Direito Penal
Prof. Nidal Ahmad

Prof. Arnaldo Quaresma

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

Olá! Boas-Vindas!
Cada material foi preparado com muito carinho para que você
possa absorver da melhor forma possível, conteúdos de qua-
lidade.

Lembre-se: o seu sonho também é o nosso.

Bons estudos! Estamos com você até a sua aprovação!

Com carinho,

Equipe Ceisc. ♥

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Direito Penal

1ª FASE OAB | 37° EXAME

Direito Penal
Prof. Nidal Ahmad
Prof. Arnaldo Quaresma

Sumário

1. Aplicação da Lei Penal............................................................................................................. 4


2. Do crime................................................................................................................................. 10
3. Da Imputabilidade Penal ........................................................................................................ 28
4. Concurso de Pessoas (arts. 29, 30 e 31 do CP) .................................................................... 29
5. Aplicação da Pena ................................................................................................................. 31
6. Da Suspensão Condicional da Pena...................................................................................... 45
7. Do Livramento Condicional .................................................................................................... 48
8. Efeitos da Condenação .......................................................................................................... 52
9. Extinção da Punibilidade ........................................................................................................ 56
10. Crimes contra a vida ............................................................................................................ 67
11. Lesão Corporal (art. 129 do CP) .......................................................................................... 74
12. Crimes contra a honra.......................................................................................................... 77
13. Crimes Contra o Patrimônio ................................................................................................. 79
14. Crimes contra a Dignidade Sexual ....................................................................................... 91
15. Crimes contra a Fé Pública .................................................................................................. 94
16. Crimes contra a Administração Pública ............................................................................... 97
17. Dos crimes contra a Administração da Justiça .................................................................. 105

Olá, aluno(a). Este material de apoio foi organizado com base nas aulas do curso preparatório para
a 1ª Fase OAB e deve ser utilizado como um roteiro para as respectivas aulas. Além disso, reco-
menda-se que o aluno assista as aulas acompanhado da legislação pertinente.

Bons estudos, Equipe Ceisc.


Atualizado em outubro de 2022.

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1. Aplicação da Lei Penal

1.1. Da lei penal no tempo (art. 2o do CP)


Pelo princípio tempus regit actum (“o tempo rege o ato”), a lei penal não alcança os fatos ocorridos
antes ou depois de sua vigência, de forma que, em regra, a lei aplicável a um crime é aquela vigente ao
tempo da execução deste crime.
A regra, pois, é que a atividade da lei penal se dê no período de sua vigência; a extra-atividade,
representada pela retroatividade da lei mais benéfica e pela ultratividade, configura exceção a esta regra.
Ultratividade quer dizer que se a lei antiga for mais favorável, prevalecerá ao tempo da vigência
da lei nova, mesmo estando revogada.
A retroatividade da lei mais benéfica significa que a lei mais benigna prevalece sobre a mais
severa, prolongando-se além do instante de sua revogação ou retroagindo ao tempo em que não tinha
vigência.
1.1.1. Abolitio criminis (art. 2o, caput, do CP)
Ocorre a chamada abolitio criminis quando a lei nova deixa de considerar crime fato que anterior-
mente era considerado ilícito penal. A nova lei, demonstrando não haver mais, por parte do Estado, inte-
resse na punição do autor de determinado fato, retroage para alcançá-lo.
A abolitio criminis, além de conduzir à extinção da punibilidade, apaga todos os efeitos penais
da sentença condenatória, permanecendo, no entanto, íntegros seus efeitos na esfera extrapenal. É o
que se extrai do art. 2o, caput, do CP.
1.1.2. Novatio legis in mellius (art. 2o, par. ún., do CP)
Além da abolitio criminis, a lei nova pode favorecer o agente de várias maneiras. A lei posterior,
que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença
condenatória transitada em julgado (art. 2o, par. ún., do CP).
Assim, se uma lei posterior deixar de prever uma circunstância de aumento de pena em relação a
determinado crime, retroagirá para beneficiar o réu. O mesmo se pode dizer se a lei posterior passar a
prever uma causa de diminuição da pena, por exemplo. Essa lei retroagirá para alcançar fatos praticados
antes da sua vigência.
1.1.3. Novatio legis incriminadora
A novatio legis incriminadora, ao contrário da abolitio criminis, considera crime fato anteriormente
não incriminado, e somente gerará efeitos para fatos praticados após a sua vigência.

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Por conferir tratamento severo, a novatio legis incriminadora, por evidente, não retroage para al-
cançar fatos praticados antes da sua vigência, tendo eficácia, portanto, somente em relação aos fatos pra-
ticados a partir da sua vigência.
1.1.4. Novatio legis in pejus
A quarta hipótese refere-se à nova lei mais severa que a anterior (exemplo: a nova lei de
drogas, Lei n. 11.343/2006, no art. 33, aumentou a pena do crime de tráfico de drogas). Incide, no
caso, o princípio da irretroatividade da lei penal: “a lei penal não retroagirá, salv o para beneficiar o
réu” (art. 5o, XL, da CF/1988).
1.1.5. Crime permanente e crime continuado e a lei penal mais benéfica
Aplica-se a lei nova durante a atividade executória do CRIME PERMANENTE, ainda que seja pre-
judicial ao réu, já que a cada momento da atividade criminosa está presente a vontade do agente.
Da mesma forma, sendo o CRIME CONTINUADO uma ficção, considerando que uma série de
crimes constitui um único delito para a finalidade de aplicação da pena, o agente responde pelo que praticou
em qualquer fase da execução do crime continuado. Portanto, se uma lei penal nova tiver vigência durante
a continuidade delitiva, deverá ser aplicada ao caso, prejudicando ou beneficiando.

Súm. 711 do STF: A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime per-
manente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência.

1.2. Lei temporária e lei excepcional (art. 3 o do CP)


Leis excepcionais: são feitas para durar enquanto um estado anormal ocorrer. Cessa a sua vigên-
cia ao mesmo tempo que a situação excepcional também terminar. Portanto, são aquelas promulgadas em
caso de calamidade pública, guerras, revoluções, cataclismos, epidemias etc.
Leis temporárias: são as editadas com período determinado de duração, portanto, dotadas de
autorrevogação. É feita para vigorar em um período de tempo previamente fixado pelo legislador. Traz em
seu bojo a data do início e da cessação de sua vigência. É uma lei que, desde a sua entrada em vigor, está
marcada para morrer.
Reúnem duas características:
Autorrevogabilidade: em regra, uma lei somente pode ser revogada por outra lei, posterior, que a
revogue expressamente, que seja com ela incompatível ou que regule integralmente a matéria nela tratada.
As leis de vigência temporária e excepcional constituem exceção a esse princípio, visto que perdem sua
vigência automaticamente, sem que outra lei as revogue.
Ultratividade: significa que uma lei revogada continua gerando efeitos. É o caso da lei temporária
e da lei excepcional, que continuarão gerando efeitos em relação aos fatos praticados durante sua vigência,
mesmo após revogadas.

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1.3. Do tempo do crime (art. 4o do CP)


Em relação ao tempo do crime, o Código Penal adotou a teoria da atividade, segundo a qual se
reputa praticado o delito no momento da conduta, não importando o instante do resultado. Assim, se um
adolescente com 17 anos, 11 meses e 29 dias efetuar disparo de arma de fogo contra a vítima, que vem a
falecer cinco dias depois (quando já terá adquirido a maioridade), responderá conforme as normas do ECA,
diante da teoria da atividade que rege o tempo do crime.
*Para todos verem: esquema.

FATO DEIXA DE SER


CRIME
ABOLITIO CRIMINIS

CESSAM TODOS OS
EFEITOS PENAIS

CAUSA DE EXTINÇÃO
DA PUNIBILIDADE

PERMANECEM
EFEITOS CIVIS

1.4. Territorialidade (art. 5o do CP)


Pelo princípio da territorialidade, aplicam-se as leis brasileiras aos delitos cometidos dentro do
território nacional. Esta é uma regra geral, que advém do conceito de soberania, ou seja, a cada Estado
cabe decidir e aplicar as leis pertinentes aos acontecimentos dentro do seu território.
Nos termos do art. 5o, § 1o, do CP, há duas situações de território brasileiro por equiparação:
a) embarcações e aeronaves brasileiras de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro
onde estiverem;
b) embarcações e aeronaves brasileiras, de propriedade privada, que estiverem navegando em
alto-mar ou sobrevoando águas internacionais.
Os navios estrangeiros em águas territoriais brasileiras, desde que públicos, não são considerados
parte do nosso território. Em face disso, os crimes neles cometidos devem ser julgados de acordo com a lei
da bandeira que ostentam. Se, entretanto, são de natureza privada, aplica-se a lei brasileira (art. 5o, § 2o,

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do CP).
1.5. Do lugar do crime (art. 6o do CP)
O Código Penal adotou a teoria da ubiquidade ou mista, segundo a qual é lugar do crime tanto
onde houve a conduta quanto o local onde se deu o resultado.
Assim, na hipótese de o agente, que se encontra na cidade brasileira de Santana do Livra-
mento-RS, efetuar disparos contra a vítima que se encontra na cidade de Rivera, em solo uruguaio,
separada por uma rua do Município brasileiro, vindo este a falecer, aplica-se a lei penal brasileira, já
que os atos executórios do crime foram praticados em território brasileiro, embora o resultado tenha
sido produzido em país estrangeiro.
*Para todos verem: esquema.

TEMPO DO CRIME TEORIA DA ATIVIDADE

1.6. Extraterritorialidade (art. 7o do CP)


Extraterritorialidade: é uma exceção. Mesmo que o crime seja cometido fora do Brasil, os agentes
sujeitam-se à lei brasileira, nas hipóteses mencionadas no art. 7o do CP, quais sejam:

*Para todos verem: quadro.

EXTRATERRITORIALIDADE INCONDICIONADA (INCISO I)


a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da Repú- Nestes casos, o agente é punido segundo a lei brasi-
blica; leira, ainda que absolvido ou condenado no estran-
b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Dis- geiro.
trito Federal, de Estado, de Território, de Município,
de empresa pública, sociedade de economia mista,
autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público;
c) contra a administração pública, por quem está a seu
serviço;
d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou do-
miciliado no Brasil;
EXTRATERRITORIALIDADE CONDICIONADA (INCISO II)
a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a Nestes casos, a aplicação da lei brasileira depende do
reprimir; concurso das seguintes condições (§ 2o):
b) praticados por brasileiro; a) entrar o agente no território nacional;
c) praticados em aeronaves ou embarcações brasilei- b) ser o fato punível também no país em que foi prati-
ras, mercantes ou de propriedade privada, quando cado;
em território estrangeiro e aí não sejam julgados. c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei
brasileira autoriza a extradição;

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d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou


não ter aí cumprido a pena;
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por
outro motivo, não estar extinta a punibilidade, se-
gundo a lei mais favorável.
EXTRATERRITORIALIDADE CONDICIONADA (INCISO II)
Cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Bra- Se reunidas as condições (§ 2o):
sil. a) entrar o agente no território nacional;
b) ser o fato punível também no país em que foi prati-
cado;
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei
brasileira autoriza a extradição;
d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou
não ter aí cumprido a pena;
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou,
por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, se-
gundo a lei mais favorável.
+
a) não foi pedida ou foi negada a extradição; (§ 3o)
b) houve requisição do Ministro da Justiça. (§ 3o)

1.7. Conflito aparente de normas


É o conflito que se estabelece entre duas ou mais normas aparentemente aplicáveis ao mesmo
fato. Há conflito porque mais de uma norma pretende regular o fato, mas é aparente, porque apenas uma
delas acaba sendo aplicada à hipótese.
1.7.1. Princípio da especialidade
Trata-se da aplicação da regra de que a norma especial afasta a aplicação da lei geral, represen-
tado pelo brocardo lex specialis derrogat generali.
A lei especial, ou específica, caracteriza-se por se revestir de sentido diferenciado, individualizado,
que a particulariza em relação às demais normas. Dito de outro modo, a norma penal especial reúne todos
os elementos típicos da lei geral, mas reveste-se de outros elementos que a tornam especial, que a parti-
cularizam, chamados especializantes.
Tomemos como exemplo o caso de uma mãe matar, sob influência do estado puerperal, o próprio
filho, logo após o parto. Há um único fato sobre o qual, aparentemente, pode incidir o crime de homicídio,
previsto no art. 121 do CP, ou infanticídio, previsto no art. 123 do CP. O crime de infanticídio possui núcleo
idêntico ao do crime de homicídio, ou seja, reúne todos os elementos descritos no art. 121 do CP, consis-
tentes em “matar alguém”. Todavia, além dos elementos da norma geral, o art. 123 do CP, que tipifica o
delito de infanticídio, possui elementos que o especializam e diferenciam do crime de homicídio: autora ser
a genitora da vítima, que deve ser seu próprio filho, nascente ou neonato; prática do delito durante ou logo

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após o parto, sob influência do estado puerperal. Note-se que se estabeleceu um conflito entre as normas
do art. 121 e do art. 123 do CP, mas que é aparente, pois será solucionado pelo princípio da especialidade,
prevalecendo, no caso, a norma penal que define o crime de infanticídio, já que as elementares contidas
nesse crime a tornam especial em relação à norma geral que define o homicídio.
1.7.2. Princípio da subsidiariedade
Há relação de subsidiariedade entre normas quando descrevem graus de violação do mesmo bem
jurídico, de forma que a infração definida pela subsidiária, de menor gravidade que a da principal, é absor-
vida por esta. A subsidiariedade pode ser expressa ou tácita.
A subsidiariedade expressa ou explícita ocorre quando a própria lei indica ser a norma sub-
sidiária de outra. Quando a norma, em seu próprio texto, subordina a sua aplicação à não aplicação de
outra, de maior gravidade punitiva. O crime de importunação sexual, previsto no art. 215-A do CP, inclu-
ído pela Lei no 13.718/2018, incidirá “se o ato não constitui crime mais grave”, conforme expressamente
prevê o referido dispositivo legal. Logo, o delito de importunação sexual somente incidirá se a conduta
do agente não caracterizar crime mais grave, por exemplo, estupro (art. 213 do CP) ou estupro de vul-
nerável (art. 217-A do CP).
A subsidiariedade tácita ou implícita ocorre quando a norma penal não ressalva, de modo ex-
presso, a sua incidência na hipótese de outra norma de maior gravidade punitiva não ser aplicável ao caso
concreto. A norma subsidiária poderá incidir ainda que o legislador não tenha expressamente previsto essa
possibilidade. O crime de constrangimento ilegal (art. 146 do CP) é tacitamente subsidiário em relação ao
crime de estupro (art. 213 do CP). Assim, se, no caso concreto, o crime mais grave (art. 213 do CP) não
restar caracterizado, ou seja, não ficar demonstrado que o constrangimento não teve por finalidade violar a
dignidade sexual da vítima, pode-se aventar a incidência do crime de constrangimento ilegal (art. 146 do
CP).
1.7.3. Princípio da consunção
Diversamente do princípio da subsidiariedade, em que a prática de um ato delituoso deve ser en-
quadrada na norma mais grave, o princípio da consunção é aplicado para dirimir conflito aparente de normas
decorrente de uma sequência de fatos delituosos, que, isoladamente, constituem crime, mas que, ao
final, devem ser subsumidos a um único tipo penal. Em outras palavras, os atos delituosos praticados para
alcançar o resultado esperado serão absorvidos pelo crime desejado, resultando, assim, na responsabili-
zação do agente pela prática de um crime.
Tomemos como exemplo o agente que pretende desde o início produzir a morte da vítima. Para
tanto, utiliza-se de uma faca, golpeando a vítima em várias partes do corpo, vindo, ao final, a aplicar o golpe

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fatal, causando-lhe a morte. Há um único elemento subjetivo, sendo a conduta composta por vários atos
praticados de forma progressiva até atingir o resultado mais grave. Surge, assim, o conflito aparente de
normas: o agente responderá pelos delitos de lesão corporal (art. 129 do CP) e homicídio (art. 121 do CP)
ou apenas pelo crime de homicídio? Nesse caso, aplicando-se o princípio da consunção, o agente respon-
derá apenas pelo crime de homicídio (art. 121 do CP), pois as várias lesões corporais produzidas pelos
golpes de faca constituíram meio necessário para a execução do delito pretendido, sendo, por isso, absor-
vidas pelo crime de homicídio.

2. Do crime

Fato típico é o fato humano que se enquadra perfeitamente no modelo legal de conduta proibida.
Assim, o fato humano de desferir disparos de arma de fogo contra uma pessoa, matando-a, será conside-
rado fato típico, porque se amolda perfeitamente ao modelo legal da conduta proibida de “matar alguém”,
adequando-se aos elementos constitutivos do tipo penal que define o crime de homicídio, descritos no art.
121 do CP.
Fato atípico, por sua vez, é o fato humano que não se enquadra ou não se adéqua a um tipo penal.
Para a integração do fato ao tipo penal deve haver um comportamento humano, consistente na
conduta. A ação ou omissão humana (conduta), porém, não é suficiente, sendo necessário um resultado.
Entre a conduta e o resultado se exige uma relação de causalidade. Por último, para integralizar um fato
típico, deve operar-se a subsunção ou adequação de todos os elementos no modelo legal previsto no tipo
penal, revestindo-se, assim, na própria tipicidade.
Portanto, os elementos do fato típico são:
*Para todos verem: esquema.

CONDUTA
FATO TÍPICO

RESULTADO

RELAÇÃO DE
CAUSALIDADE

TIPICIDADE

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2.1. Relação de causalidade ou nexo causal (art. 13 do CP)


Via de regra, a conduta do agente produz o resultado criminoso de forma direta. Trata-se de rela-
ção de causa (conduta) e efeito (resultado): nexo de causalidade.
Todavia, pode ocorrer de, aliada à conduta do agente, outra causa contribuir para o resultado. É a
chamada concausa.
Esta “concausa” pode ser absolutamente independente ou relativamente independente, depen-
dendo se teve ou não origem na conduta do agente.
2.1.1. Causas absolutamente independentes
São aquelas que não têm origem na conduta do agente. A expressão “absolutamente” serve
para designar que a outra causa independente por si só produziu o resultado. São causas que não se
inserem na linha do desdobramento natural da conduta do agente, ou seja, causas inusitadas, desvincula-
das da ação do agente, surgindo de fonte distinta.
Há, na verdade, uma quebra do nexo causal.
São três as espécies de causas absolutamente independentes:
a) Preexistentes
Trata-se de causa que existia antes da conduta do agente e produz o resultado independentemente
da sua atuação. Ou seja, com ou sem a ação do agente o resultado ocorreria do mesmo modo.
Ex.: o agente desfere um disparo de arma de fogo contra a vítima, que, no entanto, vem a falecer
pouco depois, não em consequência dos ferimentos recebidos, mas porque antes ingerira veneno com a
intenção de se suicidar.
b) Concomitantes
São as causas que não têm nenhuma relação com a conduta e produzem o resultado independen-
temente desta, no entanto, por coincidência, atuam exatamente no instante em que a ação é realizada.
Ex.: “A” desfere golpe de faca contra “B” no exato momento em que este vem a falecer exclusiva-
mente por força da queda da marquise de um prédio em sua cabeça.
c) Supervenientes
São causas que atuam após a conduta. Ou seja, que surgem depois da conduta desenvolvida pelo
agente.
Ex.: “A” ministra veneno na alimentação de “B”. Antes de o veneno produzir efeitos, há um desa-
bamento ou incêndio na casa da vítima, que morre exclusivamente por conta dos escombros que caíram
sobre sua cabeça ou queimada pelo fogo.
*Consequência. Quando a causa é absolutamente independente da conduta do sujeito, o

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problema é resolvido pelo caput do art. 13: há exclusão da causalidade decorrente da conduta. Ou seja, o
agente responde somente por aquilo que deu causa. Nos exemplos, a causa da morte não tem ligação
alguma com o comportamento do agente. Em face disso, ele não responde pelo resultado morte, mas, sim,
pelos atos praticados antes de sua produção. Isso porque ocorreu quebra do nexo causal. Assim, se o dolo
era de matar, o agente responderia por tentativa de homicídio.
Cuidado!
Se o enunciado apontar dolo de lesão corporal, por exemplo, o agente responderá por aquilo que
deu causa: lesão corporal (leve, grave ou gravíssima).
2.1.2. Causas relativamente independentes
Como são causas independentes, produzem por si sós o resultado, não se situando dentro
da linha de desdobramento causal da conduta. Por serem, no entanto, apenas relativamente independen-
tes, encontram sua origem na própria conduta praticada pelo agente.
Aqui não há, de regra, uma quebra do nexo causal, mas uma soma entre as causas, que, ao final,
conduzem ao resultado lesivo.
Também são três as espécies de causas relativamente independentes:
a) Preexistentes
A causa que efetivamente gerou o resultado já existia ao tempo da conduta do agente, que con-
correu para a sua produção.
Nesse caso, como há uma soma de causas e não quebra do nexo causal, o agente responde pelo
resultado pretendido. No caso, homicídio consumado, a menos que não tenha concorrido para ele com dolo
ou culpa.
Isso porque, segundo doutrina majoritária, a imputação do resultado ao agente exige que ele tenha
conhecimento do estado de saúde do agente (que denota dolo) ou que, pelo menos, lhe fosse previsível
(indicativo de culpa).
Assim, se, por exemplo, o agente não sabia do estado de saúde da vítima ou não lhe era previsível,
não poderia lhe ser atribuído o resultado morte; responderia, pois, pelo delito de tentativa de homicídio (se
agiu com a intenção de matar). Da mesma forma, se pretendia ferir a vítima, agredindo-a com um soco e
esta, em razão da hemofilia, desconhecida pelo agente, vem a falecer em razão da eclosão de uma hemor-
ragia, o agente somente será responsabilizado pelo delito de lesão corporal.
b) Concomitantes
A causa que efetivamente produziu o resultado surge no exato momento da conduta do agente.
Ex.: considera-se o ataque à vítima, por meio de faca, que, no exato momento da agressão, sofre

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ataque cardíaco, vindo a falecer, apurando-se que a soma desses fatores (causas) produziu a morte, já que
a agressão e o ataque cardíaco, considerados isoladamente, não teriam o condão do produzir o resultado
morte.
Nesse caso, como há uma soma de causas e não quebra do nexo causal, o agente responde pelo
resultado pretendido. No caso, homicídio consumado, a menos que não tenha concorrido para ele com dolo
ou culpa.
c) Supervenientes (art. 13, § 1o, do CP)
A causa que efetivamente produziu o resultado ocorre depois da conduta praticada pelo agente.
Ex.: o agente desfere um golpe de faca contra a vítima, com a intenção de matá-la. Ferida, a vítima
é levada ao hospital e sofre acidente no trajeto, vindo, por este motivo, a falecer. A causa é independente,
porque a morte foi provocada pelo acidente e não pela facada, mas essa independência é relativa, já que,
se não fosse o ataque, a vítima não estaria na ambulância acidentada e não morreria. Tendo atuado pos-
teriormente à conduta, denomina-se causa superveniente.
Na hipótese das causas supervenientes, embora exista nexo físico-naturalístico, a lei, por expressa
disposição do art. 13, § 1o, do CP, que excepcionou a regra geral, exclui a imputação do resultado ao
agente, devendo, no entanto, responder pelos atos anteriores efetivamente praticados. Assim, o agente não
responde pelo resultado ocorrido, mas somente pelos atos anteriores, que, no caso, foi tentativa de homi-
cídio.
Cuidado!
Se o enunciado apontar dolo de lesão corporal, por exemplo, o agente responderá pelos atos an-
teriores praticados, no caso, lesão corporal (leve, grave ou gravíssima).
2.2. Relevância da omissão: crimes omissivos (art. 13, § 2o, do CP)
O crime omissivo configura-se quando o agente deixa de fazer aquilo que poderia e deveria fazer,
que estaria obrigado em virtude de lei.
Os crimes omissivos podem ser próprios ou impróprios (ou comissivos por omissão).
2.2.1. Crimes omissivos próprios
São aqueles em que há um tipo penal específico descrevendo a conduta omissiva. O verbo nuclear
do tipo descreve uma conduta omissiva. Nesse caso, o crime consiste em o sujeito amoldar a sua conduta
ao tipo legal que descreve uma conduta omissiva. Em síntese, o agente será responsabilizado por não
cumprir o dever de agir contido implicitamente na norma incriminadora.
Exemplo: crime de omissão de socorro:

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Art. 135. Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à cri-
ança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em
grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública:
Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.
Parágrafo único. A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de
natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.

2.2.2. Crimes omissivos impróprios ou comissivos por omissão (art. 13, § 2o, do CP)
Têm a finalidade de impedir a ocorrência de determinado evento, desde que, evidentemente, seja
possível agir.
Para que alguém responda por crime comissivo por omissão é preciso que tenha o dever jurídico
de impedir o resultado, previsto no art. 13, § 2o, do CP:
a) Ter por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância
Nesse caso, por expressa imposição da lei, o agente estará obrigado a agir para evitar o resultado.
Assim, se o agente se omitir, ou seja, deixar de agir, quando lhe era possível, responderá pelo resultado
gerado. Ex.: mãe que deixa de alimentar o filho, que, por conta da sua negligência, acaba morrendo por
inanição. Essa mãe deverá responder pelo resultado gerado, qual seja, homicídio culposo. Se, de outro
lado, a mãe desejou a morte do filho ou assumiu o risco de produzi-la, responderá por homicídio doloso.
b) De outra forma, assumir a responsabilidade de impedir o resultado
Aqui a obrigação de agir para evitar o resultado não decorre de lei, mas do fato de o agente ter
assumido a responsabilidade de impedi-lo. Ex.: babá que, por negligência, deixa de cumprir corretamente
sua obrigação de cuidar da criança, que acaba caindo na piscina e, por isso, morre afogada. Nesse caso,
responderá pelo resultado gerado, qual seja, homicídio culposo. Se, de outro lado, desejou a morte da
criança ou assumiu o risco de produzi-la, responderá por homicídio doloso.
c) Com o comportamento anterior, criar o risco da ocorrência do resultado
Nesta hipótese, o sujeito, com o comportamento anterior, cria situação de perigo para bens jurídi-
cos alheios penalmente tutelados, de sorte que, tendo criado o risco, fica obrigado a evitar que ele se de-
genere ou desenvolva para o dano ou lesão. Ex.: aluno veterano, por ocasião de um trote acadêmico,
sabendo que a vítima não sabe nadar, joga o incauto calouro na piscina. Nesse caso, contrai o dever jurídico
de agir para evitar o resultado, sob pena de responder por homicídio.
2.3. Iter criminis e tentativa (art. 14 do CP)
2.3.1. Iter criminis
Iter criminis significa literalmente “caminho do crime”. Trata-se do caminho percorrido pelo agente
para a prática da infração penal, passando pela ideação até chegar à consumação. Em síntese, iter criminis
é o conjunto de fases pelas quais passa o delito.

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O primeiro momento do iter criminis é a cogitação. O agente idealiza, internamente, a atividade


criminosa. Toda essa representação ainda se encontra no plano interno do agente, ou seja, ainda não há
exteriorização de nenhum ato. É exatamente por isso que a fase da cogitação não é punível.
Nos atos preparatórios, o agente passa da cogitação para a exteriorização da sua atividade cri-
minosa, buscando, previamente ao início da execução, os elementos necessários para o desenvolvimento
da conduta delituosa. É a partir dos atos preparatórios que o agente começa a materializar, ou seja, exteri-
orizar sua busca pela consumação da infração penal. A aquisição de uma arma, por exemplo, para a prática
do homicídio constitui ato preparatório. Da mesma forma, o estudo do local do crime, buscando identificar
a melhor hora e forma de ingressar no ambiente, constitui ato preparatório do crime de furto.
Os atos preparatórios, via de regra, não são puníveis, nem na forma tentada, uma vez que, nos
termos do art. 14, II, do CP, afigura-se necessário o início da execução do delito, com a realização da
conduta nuclear descrita no tipo penal.
Todavia, em casos excepcionais, o legislador descreve atos que na sua concepção seriam prepa-
ratórios como delitos autônomos, por exemplo, os crimes de associação criminosa (art. 288 do CP) e pe-
trechos para falsificação de moedas (art. 291 do CP).
Nos atos executórios, o agente passa a desenvolver conduta voltada a realizar o verbo nuclear do
tipo. A partir dos atos executórios, o fato passa a ser punível, ao menos na forma tentada. Isso porque o
próprio art. 14, II, do CP atrelou a tentativa ao início da execução do crime, condicionando, pois, sua puni-
bilidade ao início da prática de atos executórios.
A consumação é o momento de conclusão do delito, reunindo todos os elementos do tipo penal.
O exaurimento não integra o iter criminis, que encerra com a consumação. O crime exaurido, tam-
bém chamado de esgotado, é aquele no qual, após ser alcançada a consumação, continua produzindo
efeitos decorrentes da conduta lesiva do agente.
A consumação do crime de corrupção passiva (art. 317 do CP) ocorre com a solicitação da vanta-
gem indevida. O efetivo proveito ulterior com o recebimento dessa vantagem não integra o iter criminis,
constituindo-se no exaurimento do crime.
2.3.2. Tentativa (art. 14, II, do CP)
Nos termos do art. 14, II, do CP, para caracterizar ao menos crime tentado, deve o agente passar
pelos atos preparatórios e dar início à execução do delito, que, por razões alheias à sua vontade, não
alcance a consumação.
2.3.2.1. Algumas infrações que não admitem a tentativa

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a) Crimes culposos
No crime culposo, o agente não deseja nem assume o risco na produção do resultado. O resultado,
pois, é involuntário. Na tentativa, o agente deseja ou assume o risco na produção do resultado, que, no
entanto, não ocorre por circunstâncias alheias à sua vontade. Logo, verifica-se a absoluta incompatibilidade
entre o crime culposo e a tentativa.
Há, no entanto, uma classe de crimes culposos que admitem a tentativa: culpa imprópria.
b) Crimes preterdolosos
Nos crimes preterdolosos, a conduta é desenvolvida de forma dolosa, mas o resultado agravador
é culposo. Assim, como no crime preterdoloso o resultado agravador não é desejado pelo agente, não há
falar em tentativa, que pressupõe a não consumação do delito por circunstâncias alheias à sua vontade.
c) Contravenções penais
Nos termos do art. 4o do Decreto-lei no 3.688/1941, “não é punível a tentativa de contravenção”.
d) Crimes omissivos próprios
Os crimes omissivos próprios não admitem tentativa, porque não se afigura possível fracionar a
conduta omissiva do agente. Isso porque ou o agente observa o seu dever de agir implícito no tipo penal, e
o crime se consuma; ou pratica a conduta, e não há crime.
Os crimes omissivos impróprios admitem tentativa.
e) Crimes unissubsistentes
Os crimes unissubsistentes ou de ato único não admitem tentativa, diante da impossibilidade de
fracionamento dos atos de execução. Ou seja, não é possível dar início à execução do delito e não atingir
a consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente.
2.4. Desistência voluntária e arrependimento eficaz (art. 15 do CP)
Na desistência voluntária e no arrependimento eficaz, o agente dá início à execução do delito, mas
não consuma por vontade própria, ou porque desistiu de prosseguir nos atos executórios, ou porque se
arrependeu eficazmente.
2.4.1. Desistência voluntária
A desistência voluntária caracteriza-se por um comportamento negativo do agente, que, após dar
início à execução do delito, adota uma postura de abstenção, ou seja, cessa o seu comportamento deli-
tivo, não leva adiante a atividade executória; mesmo podendo prosseguir, desiste da realização típica.
Tomemos como exemplo a conduta do agente que, com a intenção homicida, desfere um disparo
de arma de fogo contra a vítima, acertando-a em região não letal. Podendo prosseguir, já que tinha mais
cinco balas no revólver, o agente resolve, por vontade própria, não efetuar mais disparos, deixando a vítima

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sobreviver.
2.4.2. Arrependimento eficaz
No arrependimento eficaz, o agente, após ter esgotado todos os meios à sua disposição para a
consumação do delito, arrepende-se e, adotando uma postura ativa, impede que o resultado se produza.
Exemplo: agente que, com a intenção homicida, após efetuar disparos de arma de fogo contra a
vítima, utilizando todas as balas do revólver, arrepende-se e, adotando postura ativa, leva a vítima até o
hospital, que, submetida a intervenção cirúrgica exitosa, acaba sobrevivendo.
2.4.3. Consequência
Nos termos da parte final do art. 15 do CP, verificada hipótese de desistência voluntária ou arre-
pendimento eficaz, o agente jamais responderá pelo crime na modalidade tentada, já que, como visto, trata-
se de causa excludente da tipicidade da tentativa, mas pelos atos até então praticados, se típicos.
Assim, o agente que ingressa numa residência e, por ato voluntário, desiste de consumar a sub-
tração, não responderá por tentativa de furto, mas pelos atos até então praticados, quais sejam, violação
de domicílio (art. 150 do CP).
2.5. Arrependimento posterior (art. 16 do CP)
Trata-se de causa obrigatória de diminuição da pena que incide quando o agente, responsável
pelo crime praticado sem violência ou grave ameaça à pessoa, repara o dano provocado ou restitui a coisa,
desde que de forma voluntária, até o recebimento da denúncia ou da queixa.
Assim, se o agente subtraiu uma TV do seu local de trabalho e, ao chegar em casa com a coisa
subtraída, é convencido pela esposa a devolvê-la, o que efetivamente vem a fazer no dia seguinte, mesmo
quando o fato já havia sido registrado na delegacia, haverá arrependimento posterior, com reflexo na dosi-
metria da pena.
2.6. Crime impossível (art. 17 do CP)
O crime impossível por ineficácia absoluta do meio guarda relação com o meio de execução
ou instrumento utilizado pelo agente, que, por sua natureza, será incapaz de produzir qualquer resultado,
ou seja, jamais alcançará a consumação do delito. É o caso do agente que, pretendendo matar a vítima,
usa como meio executório arma completamente defeituosa, que jamais efetuaria qualquer disparo.
O crime impossível pela impropriedade absoluta do objeto guarda relação com o objeto ma-
terial, compreendendo a pessoa ou coisa sobre o qual recai a conduta do agente. Tomemos como exemplo
a conduta do agente que, pretendendo matar a vítima, desfere vários disparos de arma de fogo contra o
seu corpo, verificando-se, após, que, ao receber os disparos, já se encontrava morta, em decorrência de
ter sofrido, momentos antes, fulminante ataque cardíaco. Evidente, neste caso, a impropriedade absoluta

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do objeto, diante da impossibilidade de ceifar a vida de pessoa que já estava morta.


2.7. Crime doloso e culposo (art. 18 do CP)
2.7.1. Crime doloso
Com o sistema finalista, o dolo passou a integrar a conduta, elemento do fato típico. Trata-se de
um elemento psicológico introduzido no tipo penal, característico do crime doloso.
Dolo direto, também chamado dolo determinado, intencional, imediato ou incondicionado, é
aquele que se caracteriza pela vontade do agente estar dirigida especificamente à produção do resultado
típico, abrangendo os meios utilizados para tanto. No dolo direto, o agente quer o resultado por ele anteri-
ormente representado. Adota-se a teoria da vontade.
No dolo de primeiro grau, o agente desenvolve conduta com vontade e consciência de atingir
determinado resultado. O dolo do agente é voltado a atingir um único bem jurídico, produzindo, pois, único
resultado. Em síntese, no dolo direto de primeiro grau, o resultado obtido era o objetivo principal da conduta.
Ex.: agente que sai ao encalço e mata a vítima pretendida.
No dolo de segundo grau ou de consequências necessárias, o agente desenvolve conduta com
vontade e consciência dirigida a produzir determinado resultado. Todavia, os meios empregados para al-
cançar o resultado desejado inexoravelmente produziram consequências necessárias, de efeitos colaterais
de verificação certa. Imaginemos que o agente toma conhecimento que seu desafeto realizará uma viajem
de carro com mais três amigos. Com a intenção de matar a vítima determinada, instala uma bomba no
veículo, que, dada a potência da explosão, provoca a morte de todos os ocupantes do veículo. No caso,
ainda que o agente pretendesse matar somente o seu desafeto, agiu consciente de que sua conduta pro-
vocaria necessariamente a morte dos demais passageiros do veículo. Tem-se, em relação aos demais
passageiros, o dolo direto de segundo grau ou dolo de consequências necessárias.
Ocorre o dolo eventual quando o sujeito assume o risco de produzir o resultado, isto é, admite e
aceita o risco de produzi-lo. Em relação ao dolo eventual, adota-se a teoria do consentimento ou assen-
timento, inserta na expressão “assumiu o risco de produzi-lo”, encartada no art. 18, I, do CP. Tomemos
como exemplo a conduta do agente que pretende atirar contra o seu desafeto, que se encontra conversando
com outra pessoa. O agente prevê que também pode atingir a outra pessoa, mas segue em diante na sua
conduta, assumindo o risco de errar o disparo contra o seu desafeto e atingir a outra pessoa, sendo-lhe
indiferente quanto ao resultado que possa a vir a ser produzido em relação ao terceiro. Se efetuar disparos
matando o seu desafeto e também a outra pessoa, o agente responderá por dois crimes de homicídio: o
primeiro, a título de dolo direto; o segundo, a título de dolo eventual.

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2.7.2. Teoria do crime culposo


É a conduta humana voluntária desenvolvida sem observar o dever de cuidado objetivo, que, por
imprudência, negligência ou imperícia, produz um resultado involuntário, objetivamente previsível, que po-
deria ter sido evitado.
A inobservância do dever objetivo de cuidado, que é a quebra do dever de cuidado imposto a
todos, é manifestada por meio de três modalidades de culpa, todas previstas no art. 18, II, do CP: impru-
dência, negligência e imperícia.
Imprudência: A conduta imprudente caracteriza-se por um agir positivo, sem a observância do
dever de cuidado objetivo. Ocorre quando o agente pratica fato perigoso, de forma intempestiva e precipi-
tada. Tomemos como exemplo condutor de veículo automotor que, imprimindo excessiva velocidade, atro-
pela e mata um pedestre.
Negligência: Trata-se de modalidade negativa de culpa, em que a inobservância do dever de
cuidado do agente é retratada pela ausência de cautela e precaução. É a culpa na forma de deixar de adotar
as cautelas. Tomemos como exemplo o condutor de veículo que, antes de sair de viagem, deixa de reparar
os pneus e verificar os freios.
Imperícia: A imperícia caracteriza-se pela falta de capacidade, preparo ou de conhecimentos téc-
nicos suficientes de agente autorizado a desempenhar determinada arte, profissão ou ofício. Assim, se um
médico cirurgião, que não domina determinada técnica inerente à certa intervenção cirúrgica, causar a
morte do paciente, responderá por homicídio culposo (art. 121, § 3o, do CP), já que agiu com imperícia no
exercício da sua profissão.
Na culpa consciente há a previsão do resultado, mas o agente realiza a conduta considerando,
sinceramente, que nenhum resultado se produzirá ou, ainda, que reúne habilidade suficiente para evitá-lo.
É a chamada culpa com previsão. Ex.: Leonardo conduz seu veículo por uma avenida. No banco do carona
está sua namorada, Célia. Durante o percurso, Leonardo imprime velocidade excessiva no veículo, gerando
protestos por parte de Célia, que lhe pedia para reduzir a velocidade. Leonardo responde dizendo que nada
aconteceria, até porque era um excelente motorista. Todavia, ao fazer uma curva, Leonardo perde o con-
trole do veículo e atropela uma pessoa, causando-lhe a morte. Diante disso, Leonardo responderá pelo
crime de homicídio culposo na condução de veículo automotor (art. 302 da Lei no 9.503/1997). Note-se que,
no caso, havia por parte do motorista a previsibilidade do resultado, que não era aceito nem esperado e,
ainda, a leviana percepção de que sua habilidade como condutor impediria a produção de qualquer evento
lesivo.

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*Para todos verem: esquema.

Culpa Consciente
• Previsão do resultado;
• Acredita que o resultado não irá ocorrer;
• Considera ter habilidade para evitar o resultado.
Dolo Eventual
• Previsão do resultado;
• Assume o risco de produzir o resultado;
• Aceita o resultado.

2.8. Erro de tipo essencial e erro de proibição


2.8.1. Erro de tipo essencial
O erro de tipo essencial é aquele que repercute na própria tipificação da conduta do agente, pois,
se não tivesse a falsa percepção da realidade, o agente não teria praticado o fato típico, ou, pelo menos,
não nas circunstâncias que envolveram o contexto fático.
O erro de tipo essencial pode ser:
a) Invencível, inevitável, escusável
É aquele erro em que qualquer pessoa, nas mesmas circunstâncias, incorreria. É o erro inevitável,
desculpável ou escusável, que não poderia ser evitado, mesmo por uma pessoa cautelosa e prudente.
Tomemos como exemplo a conduta de uma estudante que deixa seu celular carregando na tomada
da sala de aula e sai para comprar café na cantina do local. Quando retorna, retira um celular da tomada
que, na verdade, não era o seu aparelho, mas de sua colega, que havia colocado um celular idêntico para
carregar em substituição ao da estudante. Nesse caso, há evidente erro de tipo, pois a estudante, por conta
da falsa percepção da realidade (supôs ser seu o celular, já que idêntico), errou em relação ao elemento
“alheio” do tipo que define o crime de furto. E, trata-se de erro de tipo invencível, porque qualquer pessoa,
nas circunstâncias, consideraria que era o seu telefone celular que estava carregando na tomada em que
havia deixado.
O erro de tipo invencível, inevitável ou escusável exclui o dolo e a culpa. Sendo a conduta elemento
do fato típico, a ausência de dolo ou culpa leva à atipicidade da conduta.
b) Vencível, evitável ou inescusável
É aquele erro em que uma pessoa mais cautelosa e prudente, nas mesmas circunstâncias, não
incorreria. É o erro evitável, indesculpável ou inescusável, que uma pessoa cautelosa e prudente teria evi-
tado. Assim, se o fato for punido sob a forma culposa, o agente responderá por crime culposo. Quando o
tipo, entretanto, não admitir essa modalidade, a consequência será inexoravelmente a exclusão do crime,

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já que configurará fato atípico.


No exemplo do caçador que praticava a caça em mata próxima à zona urbana, onde havia circu-
lação de pessoas, o agente responderá pelo crime de homicídio culposo, já que se trata de erro de tipo
vencível.
2.8.2. Do erro de proibição (art. 21 do CP)
O erro de proibição é o erro que incide sobre a ilicitude do fato. Encontra-se disciplinado no art.
21 do CP.
No erro de proibição, o agente tem consciência da conduta praticada, mas lhe falta potencial cons-
ciência da ilicitude do fato.
O erro de proibição escusável, inevitável ou invencível ocorre quando o erro sobre a ilicitude
do fato é impossível de ser evitado, valendo-se o ser humano da sua diligência ordinária. Ex.: um telejornal
de alcance nacional informa, de forma equivocada, a aprovação da lei que autoriza a eutanásia de doentes
em estágio terminal. Não havendo nenhuma razão para duvidar da veracidade da notícia, o agente dirige-
se até o hospital e desliga os aparelhos que mantinham vivo um ente querido, que se encontrava sofrendo
com a doença que o acometia e em estágio terminal, causando-lhe a morte. Praticou fato típico e ilícito,
mas lhe faltou potencial consciência da ilicitude, incidindo o erro de proibição inevitável, cuja consequência
será a exclusão da culpabilidade.
O erro de proibição inescusável ou evitável ocorre quando o erro sobre a ilicitude do fato que
não se justifica, pois, se tivesse havido um mínimo de empenho em se informar, o agente poderia ter tido
conhecimento da realidade. O critério de aferição do erro de proibição inescusável, vencível ou evitável
encontra-se no parágrafo único do art. 21 do CP, segundo o qual “considera-se evitável o erro se o agente
atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas circunstâncias, ter ou
atingir essa consciência”. Tratando-se de erro de proibição evitável, permanece hígida a culpabilidade do
agente, sendo, no entanto, causa de diminuição da pena de um sexto a um terço.
2.9. Erro de tipo acidental
2.9.1. Erro quanto à pessoa (art. 20, § 3o, do CP)
O erro sobre pessoa, previsto no art. 20, § 3o, do CP, incide quando o agente desenvolve conduta
voltada a atingir a pessoa pretendida, mas, confundindo-se em relação à sua identidade, atinge pessoa
diversa.
Consideremos, por exemplo, a hipótese do filho desalmado que, pretendendo matar seu pai, realiza
disparos de arma de fogo contra o homem que estava na varanda da residência do genitor, causando a morte
deste. O filho, então, deixa o local satisfeito, por acreditar ter concluído seu intento delitivo, mas vem a

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
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descobrir que matara um amigo de seu pai, que contava com 65 anos de idade, que, de costas, era com ele
parecido.
Nesse caso, nos termos do art. 20, § 3o, do CP, consideram-se as condições e qualidades da
vítima pretendida. Logo, o filho desalmado responderá pelo crime de homicídio, com a incidência da agra-
vante de ter praticado crime contra ascendente, prevista no art. 61, II, e, 1a parte, do CP.
2.9.2. Erro na execução ou aberratio ictus (art. 73 do CP)
A aberratio ictus pode ocorrer quando, por acidente, o agente, em vez de atingir a pessoa preten-
dida, atinge pessoa diversa. Suponhamos, nesse caso, que o agente pretende matar Wilson, deixando na
sua mesa de trabalho uma xícara de café contendo veneno. Todavia, quem toma o café é Pedro, que acaba
falecendo.
Pode ocorrer também quando, por erro nos meios de execução, o agente, em vez de atingir a
pessoa pretendida, atinge pessoa diversa. Ex.: agente pretendendo matar Wilson, visualiza a vítima, tendo-
a como certa, faz a mira e efetua o disparo, mas, no entanto, erra o alvo pretendido, atingindo pessoa
diversa, que se encontrava próxima ao local.
A consequência jurídica da conduta do agente encontra-se retratada no art. 73, 1a parte, do CP,
que faz expressa remissão ao art. 20, § 3o, do CP. Ou seja, na hipótese de erro na execução, deve-se
observar o disposto no art. 20, § 3o, segundo o qual, embora tenha atingido pessoa diversa, o agente deve
receber tratamento penal considerando-se as condições ou qualidades da pessoa pretendida (vítima vir-
tual), desprezando-se as condições pessoais da vítima efetivamente atingida.
Na aberratio ictus com resultado duplo, o agente, além de atingir a vítima pretendida, atinge tam-
bém pessoa diversa. Nesse caso, com uma única ação, o agente produz mais de um resultado: atinge a
pessoa pretendida e também pessoa diversa. Por essa razão, o art. 73, 2a parte, do CP faz expressa re-
missão ao art. 70 do CP, devendo ser aplicada a regra do concurso formal de crimes.
2.9.3. Resultado diverso do pretendido ou aberratio criminis (art. 74 do CP)
Na aberratio criminis, o agente pretende ofender determinado bem jurídico, mas, por acidente ou
erro na execução, acaba produzindo resultado diverso do pretendido. Na verdade, o agente pretendia pra-
ticar um crime, mas acaba praticando crime diverso do pretendido.
Na aberratio criminis com unidade simples, o agente somente atinge o bem jurídico diverso do
pretendido. Ou seja, o agente quer atingir uma coisa e atinge uma pessoa.
Nesse caso, o agente responde pelo resultado produzido a título de culpa, se o fato é previsto
como crime culposo.
Assim, se o agente, pretendendo atingir o veículo do desafeto, com o intuito de praticar o crime

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dano, por erro na execução, não atingir o objeto, mas somente uma pessoa que se encontrava próxima ao
local, responderá por lesão corporal culposa (art. 129, § 6o, do CP), se resultar lesão corporal; ou por homi-
cídio culposo (art. 121, § 3o, do CP), se resultar morte.
Na aberratio criminis com resultado duplo, o agente, além de praticar o crime pretendido, também
acaba produzindo um resultado diverso do pretendido. Ou seja, com uma ação ou omissão, acaba provo-
cando dois resultados. Nesse caso, como expressamente prevê a parte final do art. 74 do CP, aplica-se a
regra do concurso formal de crimes (art. 70 do CP), considerando-se a pena do crime mais grave aumentada
de um sexto até metade, de acordo com o número de resultados diversos produzidos.
2.10. Descriminante putativa
2.10.1. Conceito
É a causa excludente da ilicitude erroneamente imaginada pelo agente. Ela não existe na reali-
dade, mas o sujeito pensa que sim, porque está errado. Só existe, portanto, na mente, na imaginação do
agente. Por essa razão, é também conhecida como descriminante imaginária ou erroneamente suposta.
Logo, é possível que o sujeito, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias do caso con-
creto, suponha encontrar-se em estado de necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento do dever legal
ou em exercício regular do direito. Quando isso ocorre, aplica-se o disposto no art. 20, § 1o, 1a parte.
2.10.2. Espécies
a) Descriminante putativa por erro de tipo
É um erro de tipo essencial incidente sobre elementares de um tipo permissivo. Os tipos permissi-
vos são aqueles que permitem a realização de condutas inicialmente proibidas. Compreendem os que des-
crevem as causas de exclusão da ilicitude.
Ocorrerá um erro de tipo permissivo quando o agente, erroneamente, imaginar uma situação de
fato totalmente diversa da realidade, em que estão presentes os requisitos de uma causa de justificação.
Assim, por exemplo, se o agente praticar uma conduta supondo estar diante de uma agressão
injusta, mas que, na verdade, não existe. Trata-se de legítima defesa putativa.
O agente pratica uma conduta supondo estar numa situação de perigo, que, na verdade, não
existe. Trata-se de estado de necessidade putativo.
Os efeitos são os mesmos do erro de tipo, já que a descriminante putativa por erro de tipo não é
outra coisa senão erro de tipo essencial incidente sobre tipo permissivo.
Assim, se o erro for vencível, o agente responde por crime culposo, já que o dolo será excluído,
da mesma forma como sucede com o erro de tipo propriamente dito; se o erro for inevitável, excluir-se-ão
o dolo e a culpa e não haverá crime.

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
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Cuidando-se de erro invencível, há exclusão do dolo e culpa.


Tratando-se de erro vencível, responde o sujeito por crime culposo, se prevista a modalidade cul-
posa. Provando-se que o sujeito não foi diligente ao se verificar as circunstâncias do fato, responde por
crime de homicídio culposo (art. 20, § 1o, do CP).
b) Descriminante putativa por erro de proibição
O agente tem perfeita noção de tudo o que está ocorrendo. Não há qualquer engano acerca da
realidade. Não há erro sobre a situação de fato. Ele supõe que está diante da causa que exclui o crime,
porque avalia equivocadamente a norma: pensa que esta permite, quando, na verdade, ela proíbe; imagina
que age certo, quando está errado; supõe que o injusto é justo.
O sujeito imagina estar em legítima defesa, estado de necessidade etc., porque supõe estar auto-
rizado e legitimado pela norma a agir em determinada situação.
Ex.: uma pessoa de idade avançada recebe um violento tapa em seu rosto, desferido por um jovem
atrevido. O idoso tem perfeita noção do que está acontecendo, sabe que seu agressor está desarmado e
que o ataque cessou. Não existe, portanto, qualquer equívoco sobre a realidade concreta. Nessa situação,
no entanto, imagina-se equivocadamente autorizado pelo ordenamento jurídico a matar aquele que o hu-
milhou, atuando, assim, em legítima defesa de sua honra.
Ocorre aqui uma descriminante (a legítima defesa é causa de exclusão da ilicitude) putativa (ima-
ginária, já que não existe no mundo real) por erro de proibição (pensou que a conduta proibida fosse per-
mitida). No exemplo dado, a descriminante, no caso a legítima defesa, foi putativa, pois só existe na mente
do homicida, que imaginou que a lei lhe tivesse permitido matar. Essa equivocada suposição foi provocada
por erro de proibição, isto é, por erro sobre a ilicitude da conduta praticada.
As consequências dessa descriminante putativa encontram-se no art. 21 do CP e são as mesmas
do erro de proibição direto ou propriamente dito.
O dolo não pode ser excluído, porque o engano incide sobre a culpabilidade e não sobre a conduta
(por isso, erro de proibição). Se o erro for inevitável, o agente terá cometido um crime doloso, mas não
responderá por ele; se evitável, responderá pelo crime doloso, com pena diminuída de um sexto a um terço.
2.10.3. Consequências
No contexto das descriminantes putativas, aplica-se a teoria limitada da culpabilidade.
Pela teoria limitada da culpabilidade, quando a descriminante putativa incidir sobre pressupostos
de uma situação de fato (ex.: o agente imaginar que está diante de uma injusta agressão, mas que era
imaginária. Supor que o desafeto sacaria uma arma, quando, na verdade, era um celular), o efeito em
relação à conduta do agente é o mesmo do erro de tipo (art. 20 do CP): se o erro foi invencível, exclui o

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Direito Penal

dolo e a culpa; se vencível, exclui o dolo, mas o agente responde pelo delito culposo, se previsto em lei.
Agora, se a descriminante putativa recair sobre pressupostos dos limites legais das excludentes,
ou seja, apesar de conhecer a situação de fato, ignora a ilicitude do comportamento (supõe ser comporta-
mento lícito), o efeito será o mesmo do erro de proibição: se inevitável, o agente será isento de pena; se
evitável, o agente responde pelo delito, mas terá a pena reduzida (art. 21 do CP). Ex.: um senhor de idade
recebe um soco de um jovem rapaz e acredita estar autorizado a revidar, lesionando-o gravemente por
conta do desaforo. O senhor sabe exatamente o que está fazendo, mas ignora que sua conduta será ilícita
(que, no caso, não se trata de hipótese de legítima defesa). É o caso das descriminantes putativas por erro
de proibição.
2.11. Coação moral irresistível e obediência hierárquica (art. 22 do CP)
2.11.1. Coação moral irresistível
Na coação moral, o agente coator, para alcançar o resultado desejado, emprega grave ameaça
contra o coagido, que, por medo de suportar um mal grave contra si ou contra outrem, acaba realizando a
conduta criminosa exigida. A coação empregada pelo agente vicia a vontade do coagido, retirando-lhe a
exigência de se comportar de modo diferente. Nesse caso, em relação ao coagido, incide a causa de ex-
clusão da culpabilidade decorrente da inexigibilidade de conduta diversa.
Ex.: se o sujeito é coagido a assinar um documento falso, responde pelo crime de falsidade o autor
da coação. O coato não responde pelo crime, uma vez que sobre o fato incide a causa de exclusão da
culpabilidade. Assim, quando o sujeito comete o fato típico e antijurídico sob coação moral irresistível, não
há culpabilidade em face da inexigibilidade de outra conduta (não é reprovável o comportamento). A culpa-
bilidade desloca-se da figura do coato para a do coator.
Convém sinalar que, se o sujeito pratica o fato sob coação física irresistível, não praticará crime
por ausência de conduta. Trata-se de causa excludente da tipicidade.
2.11.2. Obediência hierárquica
Obediência hierárquica decorre da conduta do subordinado que, por força de ordem não manifes-
tamente ilegal emanada por superior hierárquico, pratica fato típico e ilícito.
A ordem não manifestamente ilegal é aquela que revela aparente legalidade, mas que, na reali-
dade, é contrária ao direito. O subordinado, por força da ordem emanada do superior hierárquico, realiza a
conduta que lhe foi ordenada, considerando-a lícita, quando, na realidade, constitui fato típico e ilícito.
Tomemos como exemplo a hipótese de um Delegado de Polícia que determina a um inspetor de
polícia recém-empossado na instituição que conduza um desafeto até a Delegacia, sem nenhuma razão
plausível para isso. Desconhecendo os motivos do superior hierárquico, o subordinado cumpre estritamente

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

a ordem. Nesse caso, o subordinado não será responsabilizado criminalmente, já que incide em seu favor
a causa excludente de culpabilidade. O crime de abuso de autoridade deve ser atribuído exclusivamente
ao autor da ordem.
Se a ordem for manifestamente ilegal, tanto o superior hierárquico quanto o subordinado respon-
derão pelo delito praticado. Nesse caso, para o superior hierárquico incide a agravante genérica descrita
no art. 62, III, 1a parte, do CP. E em relação ao subordinado, aplica-se a atenuante prevista no art. 65, III,
c, do CP.
2.12. Excludentes de ilicitude (art. 23 do CP)
As causas legais de exclusão de ilicitude estão previstas no art. 23 do CP: estado de necessidade,
legítima defesa, estrito cumprimento do dever legal e exercício regular do direito.
2.12.1. Estado de necessidade (art. 24 do CP)
Nos termos do art. 24 do CP, estado de necessidade é a causa de exclusão da ilicitude da conduta
de quem, não tendo o dever legal de enfrentar o perigo atual, o qual não provocou por sua vontade, sacrifica
um bem jurídico ameaçado por esse perigo para salvar outro, próprio ou alheio, cuja perda não era razoável
exigir.
Tem como fundamento um estado de perigo para certo interesse jurídico, que somente pode ser
resguardado mediante a lesão de outro.
Ex.: um pedestre joga-se na frente de um motorista, que, para preservar a vida humana, opta por
desviar e colidir com outro que se encontrava estacionado nas proximidades. Entre sacrificar uma vida e
um bem material, o agente fez a opção claramente mais razoável. Não pratica crime de dano, pois o fato,
apesar de típico, não é ilícito.
2.12.2. Legítima defesa (art. 25 do CP)
A legítima defesa, nos termos em que é proposta pelo nosso Código Penal, exige a presença
simultânea dos seguintes requisitos: a) agressão injusta; b) atual ou iminente; c) contra direito próprio ou
alheio; d) reação com os meios necessários; e) moderação no uso dos meios necessários; f) elemento
subjetivo: consciência de que está reagindo a injusta agressão.
A agressão injusta deve decorrer de ação ou omissão humana. Não há legítima defesa contra ataque
instintivo e espontâneo de um animal, porque ausente consciência e vontade inerente à agressão. Nesse caso,
como vimos, o agente estará diante de uma situação de perigo, ensejando a incidência do estado de necessi-
dade.
Convém registrar, no entanto, que, se o agente atiça um animal, cão feroz, por exemplo, a atacar
a vítima, estaremos diante de uma agressão injusta, não em decorrência do comportamento do animal, mas

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pela conduta do agente instigador, que usou o cão como verdadeira arma ou instrumento de ataque. Nesse
caso, tratando-se de agressão injusta humana (agente que atiçou o animal a atacar), a vítima poderá prati-
car um fato típico, que não será ilícito, porque estará amparada pela legítima defesa.
A Lei no 13.964/2019 introduziu o parágrafo único ao art. 25 do CP, segundo o qual “Observados
os requisitos previstos no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa o agente de segu-
rança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes”.
É o caso, por exemplo, de o agente de segurança efetuar disparos contra o sujeito que, durante a prática
de roubo a banco, mantém vítima refém.
2.12.3. Estrito cumprimento do dever legal
Estará ao abrigo do estrito cumprimento do dever legal o agente que praticar um fato típico em face
do cumprimento de um dever observando rigorosamente os limites impostos pela lei, de natureza penal ou
não. Ex.: policial que prende o agente em flagrante ou mediante cumprimento de mandado de prisão, embora
atinja o seu direito de liberdade, não comete crime algum, porque amparado pelo estrito cumprimento do dever
legal.
2.12.4. Exercício regular de direito
A Constituição Federal dispõe que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa
senão em virtude de lei (art. 5o, II). Logo, se a lei autoriza o agente a praticar determinada conduta, não
poderá, à evidência, considerá-la ilícita.
Qualquer pessoa pode exercitar um direito subjetivo ou uma faculdade prevista em lei (penal ou
extrapenal). Exemplo clássico é do particular que realiza a prisão em flagrante, conforme prevê o art. 301
do CPP. A prática de determinadas atividades esportivas produz, invariavelmente, lesões corporais, tais
como o futebol, o boxe e a luta livre.
2.12.5. Consentimento do ofendido
O consentimento do ofendido, como causa excludente de ilicitude, incide nos crimes em que é o
único titular do bem ou interesse penalmente tutelado, e que pode dele livremente dispor, ou seja, somente
em relação a bens disponíveis.
As infrações penais que geralmente admitem a possibilidade do consentimento do ofendido, por
tutelarem, em regra, bens disponíveis, envolvem: a) crimes contra o patrimônio, praticados sem violência
ou grave ameaça; b) crimes contra a integridade física; c) crimes contra a honra; d) crimes contra a liberdade
individual.
Assim, se o bem jurídico violado, ainda que seja de ação penal pública incondicionada, atingir
interesse prevalentemente individual, poderá ser enquadrado no bloco dos bens jurídicos disponíveis.

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Imaginemos que o agente está praticando a subtração de um celular, momento em que é avistado pela
vítima, que consente com o desapossamento, por considerar que as funções do aparelho já estão supera-
das. O fato é típico, pois se enquadra na descrição do modelo de conduta proibida prevista no art. 155 do
CP; não será, contudo, ilícito, por força do consentimento da vítima, já que se trata de bem disponível.

3. Da Imputabilidade Penal

Segundo a teoria limitada da culpabilidade adotada pelo Código Penal, os elementos da culpabili-
dade são: a) imputabilidade; b) potencial consciência da ilicitude; c) exigibilidade de conduta diversa.
De outro lado, as causas excludentes de culpabilidade consistem na inimputabilidade, falta de po-
tencial consciência de ilicitude e inexigibilidade de conduta diversa.
Nos termos do art. 28, I e II, do CP, não se exclui a imputabilidade se o agente praticou o fato típico
e ilícito movido pela emoção ou paixão, bem como decorrente de embriaguez voluntária ou culposa.
3.1. Inimputabilidade por doença mental, desenvolvimento mental incompleto
ou desenvolvimento mental retardado (art. 26, caput, do CP)
A inimputabilidade pela enfermidade mental é aferida pelo critério biopsicológico. Além da doença
mental, é necessário que, em consequência desse estado biológico, o agente seja, no momento da conduta,
inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendi-
mento.
Logo, se, embora portador de doença mental, o agente, ao tempo da conduta, apresentar lucidez,
isto é, capacidade de compreensão do caráter ilícito do fato e de determinação de acordo com esse enten-
dimento, será considerado imputável.
Nesse contexto, uma vez verificado que o agente praticou um fato típico e ilícito, sendo, ao final,
considerado inimputável por conta da sua enfermidade mental, o juiz deverá proferir sentença absolutória
imprópria, aplicando medida de segurança, consistente em internação em hospital de custódia ou trata-
mento ambulatorial, nos termos do art. 386, par. ún., III, do CPP.
A semi-imputabilidade ou imputabilidade diminuída ou restrita encontra previsão no art. 26, par.
ún., do CP. Trata-se, na verdade, de uma causa de diminuição da pena.
O art. 26, par. ún., do CP traz a expressão “perturbação mental”, que também se caracteriza como
doença mental, mas de menor intensidade, já que não retira completamente a capacidade de compreensão
do caráter ilícito do fato e de determinação de acordo com esse entendimento.

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3.2. Da inimputabilidade por embriaguez completa proveniente de caso fortuito


ou força maior (art. 28, § 1o, do CP)
Quando a embriaguez acidental, proveniente de caso fortuito ou força maior, for completa, ou seja,
apta a deixar o agente, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito
do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, há exclusão da imputabilidade, nos termos
do que dispõe o art. 28, § 1o, do CP.
Logo, não basta a embriaguez acidental, sendo, ainda, necessário que, em decorrência da subs-
tância alcóolica ou de efeitos análogos, o agente tenha ficado, ao tempo da conduta, inteiramente incapaz
de entender o caráter ilícito da sua conduta ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Quando a embriaguez acidental, proveniente de caso fortuito ou força maior, é incompleta, não
há exclusão da imputabilidade. O sujeito responde pelo crime com a pena atenuada, desde que haja re-
dução de sua capacidade intelectiva ou volitiva. A sentença é condenatória. Aplica-se o disposto no art.
28, § 2o, do CP.

4. Concurso de Pessoas (arts. 29, 30 e 31 do CP)

4.1. Conceito
Trata-se de contribuição entre dois ou mais agentes para o cometimento de uma infração penal.
Ocorre quando duas ou mais pessoas, em conjugação de esforços e comunhão de vontades, reúnem-se
para a prática de um ou mais delitos.
4.2. Requisitos
4.2.1. Pluralidade de condutas
Trata-se de requisito elementar do concurso de pessoas: a concorrência de mais de uma pessoa
na execução de uma infração penal.
Assim, para que haja concurso de pessoas, exige-se que cada um dos agentes tenha realizado ao
menos uma conduta relevante. Pode ser em coautoria, em que há duas condutas principais; ou autoria e
participação, em que há uma conduta principal e outra acessória, praticadas, respectivamente, por autor e
partícipe.
4.2.2. Relevância causal das condutas
Para justificar a punição de duas ou mais pessoas em concurso, afigura-se necessário que a con-
duta do agente tenha efetivamente contribuído, ainda que minimamente, para a produção do resultado.

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Direito Penal

Em outras palavras, se a conduta não tem relevância causal, isto é, se não contribuiu em nada
para a produção do resultado, não pode ser considerada integrante do concurso de pessoas.
4.2.3. Do liame subjetivo e normativo (vínculo subjetivo e normativo entre os participantes)
Exige-se homogeneidade de elemento subjetivo-normativo. Significa que autor e partícipe devem
agir com o mesmo elemento subjetivo (dolo + dolo) ou normativo (culpa + culpa).
Os agentes devem atuar conscientes de que participam de crime comum, ainda que não tenha
havido acordo prévio de vontades. A ausência desse elemento psicológico inviabiliza o concurso de pes-
soas, ensejando condutas isoladas e autônomas.
Ex.: uma empregada doméstica, percebendo a presença de um ladrão, para vingar-se do patrão,
deliberadamente deixa a porta aberta, facilitando a prática do furto. Há participação, e, não obstante, o
ladrão desconhecia a colaboração da empregada. Por consequência, a empregada também responderá
pelo crime de furto.
Vínculo normativo guarda relação com os crimes culposos.
4.2.4. Identidade de infração para todos os participantes
Nos termos do art. 29 do CP, todos que concorrem para o crime respondem pelo mesmo delito.
Ex.: alguém planeja a realização da conduta típica, ao executá-la, enquanto um desvia a atenção
da vítima, outro lhe subtrai os pertences e ainda um terceiro encarrega-se de evadir-se do local com o
produto do furto. É uma exemplar divisão de trabalho constituída de várias atividades, convergentes, con-
tudo, a um mesmo objetivo típico: subtração de coisa alheia móvel. Respondem todos por um único tipo
penal, qual seja, furto.
4.3. Punibilidade do concurso de pessoas
A ressalva “na medida de sua culpabilidade” feita aos limites da culpabilidade no art. 29 diz respeito
somente à graduação da pena para os agentes que praticaram o mesmo crime.
Portanto, todos respondem pelo mesmo crime (teoria monista ou unitária). Todavia, a unidade
criminosa não importa necessariamente a aplicação de pena idêntica a todos os que contribuíram para a
prática do crime, pois cada um deverá responder na medida da sua culpabilidade.
4.3.1. Participação de menor importância (art. 29, § 1o, do CP)
A participação aqui referida diz respeito exclusivamente ao partícipe. Isso porque, ainda que tenha
sido pequena, a contribuição do coautor não pode ser considerada de menor importância, uma vez que
atuou diretamente na execução do crime. O partícipe que houver tido “participação de menor importância”
poderá ter sua pena reduzida de um sexto a um terço, nos termos do art. 29, § 1o.

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4.3.2. Da cooperação dolosamente distinta ou desvio subjetivo entre os participantes (art. 29,
§ 2o, do CP)
O agente que desejava praticar um delito, sem a condição de prever a concretização de crime mais
grave, deve responder pelo que pretendeu fazer, não se podendo a ele imputar outra conduta indesejada,
sob pena de se estar tratando de responsabilidade objetiva.
Ex.: “A” determina a “B” que espanque “C”. “B” mata “C”. Segundo o art. 29, § 2o, “A” responde por
crime de lesão corporal, cuja pena deve ser aumentada até metade se a morte da vítima lhe era previsível.
4.4. Comunicabilidade dos elementares e circunstâncias do crime (art. 30
do CP)
O art. 30 do CP determina que as circunstâncias e as condições de caráter pessoal não se comu-
nicam, salvo quando elementares do crime.
Via de regra, as circunstâncias e condições pessoais relacionadas a um dos agentes não se co-
munica aos outros que contribuíram para a prática delituosa.
Todavia, há determinadas circunstâncias ou condições pessoais que compõem, integram o tipo
penal, figurando, no caso, como verdadeira elementar no tipo penal. Nesse caso, quando também consti-
tuem o tipo penal, ou seja, figuram como elementares do tipo penal, as circunstâncias ou condições pesso-
ais relacionadas a um dos sujeitos se comunicam aos demais coautores ou partícipes.
Ex.: “A”, funcionário público, comete um crime de peculato (art. 312), com a participação de “B”,
não funcionário público. A condição pessoal (funcionário público) é elementar do crime de peculato, comu-
nicando-se, portanto, ao agente que não é funcionário público. Logo, os dois respondem por crime de pe-
culato.
De outro lado, as circunstâncias objetivas alcançam o partícipe ou coautor se, sem haver praticado
o fato que as constitui, integraram o dolo ou culpa.
Ex.: “A” instiga “B” a praticar homicídio contra “C”. “B”, para a execução do crime, emprega asfixia.
O partícipe não responde por homicídio qualificado (art. 121, § 2o, III, 4a figura), a não ser que o meio de
execução empregado pelo autor principal tenha ingressado na esfera de seu conhecimento.

5. Aplicação da Pena

5.1. Regime inicial de cumprimento de pena (art. 33 do CP)


O regime penitenciário é o meio pelo qual é executado ou efetivado o cumprimento da pena

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privativa de liberdade.
O art. 33, § 1o, do CP prevê três regimes:
a) fechado: a pena privativa de liberdade é executada em estabelecimento de segurança máxima
ou média;
b) semiaberto: a pena privativa de liberdade é executada em colônia agrícola, industrial ou esta-
belecimento similar;
c) aberto: a pena privativa de liberdade é executada em casa de albergado ou em estabelecimento
adequado.
Após estabelecer a quantidade da pena imposta da sentença, cumpre ao juiz fixar o regime inicial
de cumprimento da pena privativa de liberdade, levando em conta: a) a quantidade da pena imposta; b) a
reincidência; c) as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP.
Nos termos do art. 33, caput, do CP, nos crimes apenados com reclusão, o juiz poderá fixar o
regime inicial fechado, semiaberto ou aberto. Aos crimes apenados com detenção, o juiz poderá fixar o
regime inicial semiaberto ou aberto.
Logo, nos crimes apenados com detenção, não é possível ao juiz fixar o regime inicial fechado,
podendo, no entanto, haver regressão para o regime fechado, no caso, por exemplo, de falta grave.
O início do cumprimento da pena para os crimes apenados com reclusão dar-se-á da seguinte
forma, nos termos do art. 33, § 2o, do CP:
a) o condenado a pena superior a oito anos deverá começar a cumprir a pena privativa de liberdade
no regime fechado;
b) o primário, cuja pena seja superior a quatro anos e não exceda a oito, poderá, desde o princípio,
cumpri-la em regime semiaberto;
c) o primário, cuja pena seja igual ou inferior a quatro anos, poderá, desde o início, cumpri-la em
regime aberto.
Súm. no 269 do STJ: É admissível a adoção do regime prisional semi-aberto aos reinci-
dentes condenados à pena igual ou inferior a 4 anos se favoráveis as circunstâncias judi-
ciais.

Nos crimes apenados com detenção, os critérios para a definição do regime inicial são os seguin-
tes:
a) se a pena for superior a quatro anos, o juiz fixará o regime inicial semiaberto;
b) se a pena for igual ou inferior a quatro anos, o regime inicial será o aberto;
c) se o condenado for reincidente, o regime inicial será o semiaberto, independentemente da quan-
tidade da pena.

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Além disso, a imposição de regime inicial fechado depende de fundamentação adequada, não se
revestindo a gravidade em abstrato do delito motivação idônea para a fixação do regime de cumprimento
de pena mais severo do que a pena aplicada exigir. É o que se extrai das Súm. nos 718 e 719 do STF, e
Súm. no 440 do STJ.
5.2. Penas restritivas de direitos (art. 44 do CP)
5.2.1. Conceito
São penas alternativas às privativas de liberdade, expressamente previstas em lei, com a finali-
dade de evitar o encarceramento de determinados criminosos, autores de infrações penais consideradas
mais leves, provocando-lhes a recuperação por meio de restrições a certos direitos.
Nos termos do art. 43 do CP, as penas restritivas de direitos são: a) prestação pecuniária; b) perda
de bens e valores; c) prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas; d) interdição temporária
de direitos; e) limitação de fim de semana.
As penas restritivas de direitos são substitutivas, uma vez que o juiz, depois de fixar a pena
privativa de liberdade, verificando a presença dos requisitos, efetua a substituição por uma ou mais penas
restritivas de direitos, conforme o caso. Isso porque não há, no preceito secundário dos tipos penais incri-
minadores, previsão direta de pena restritiva de direitos, mas tão somente pena privativa de liberdade.
5.2.2. Requisitos objetivos
a) Quantidade da pena aplicada
O legislador estabeleceu como parâmetro para a concessão da pena restritiva de direitos a pena
aplicada na sentença, independentemente da pena abstratamente cominada no preceito secundário do tipo
penal.
Nos crimes dolosos, praticados sem violência ou grave ameaça, apenados com reclusão ou de-
tenção, o limite estabelecido pelo legislador é de 4 (quatro) anos.
Tratando-se de concurso de crimes, deve-se levar em conta o total da pena imposta, por conta da
aplicação das regras do cúmulo material ou exasperação da pena. Dessa forma, se aplicadas as regras do
concurso material, concurso formal e crime continuado, e o total da pena privativa de liberdade efetivamente
imposta não exceder a 4 (quatro) anos, será possível a substituição por pena alternativa.
No caso de condenação por crime culposo, a substituição será possível, independentemente da
quantidade da pena imposta, não existindo tal requisito, ainda que resulte violência contra a pessoa, por
exemplo, no homicídio culposo do Código Penal (art. 121, § 3o) e no homicídio culposo na condução de
veículo automotor (art. 302 do CTB).

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Direito Penal

b) Natureza do crime cometido


Em relação aos crimes dolosos, as penas restritivas de direitos são aplicáveis aos crimes cometi-
dos sem violência ou grave ameaça à pessoa.
5.2.3. Requisitos subjetivos
Os requisitos subjetivos levam em conta as características pessoais do sentenciado.
a) Réu não reincidente em crime doloso
Nos termos do art. 44, II, do CP, para concessão do benefício, é necessário que o sujeito não seja
reincidente em crime doloso. O texto não trata de qualquer reincidente. Refere-se ao não reincidente em
crime “doloso”, de modo que não há impedimento à aplicação da pena alternativa quando: a) os dois delitos
são culposos; b) o anterior é culposo e o posterior é doloso; c) o anterior é doloso e o posterior culposo.
Ainda que o réu seja reincidente em crime doloso, o Código Penal, no seu art. 44, § 3o, prevê uma
exceção. Se, em face de condenação anterior, a medida for socialmente recomendável e a reincidência não
se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime, será possível aplicar a substituição da pena pri-
vativa de liberdade por restritiva de direitos.
b) A culpabilidade, os antecedentes, a conduta ou a personalidade ou ainda os motivos e
circunstâncias recomendarem a substituição
Conforme o art. 44, III, do CP, “a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personali-
dade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja sufici-
ente”.
Convém notar que esses requisitos praticamente reproduzem as circunstâncias judiciais previstas
no art. 59, caput, do CP, com exceção de duas: comportamento da vítima e consequências do crime, coin-
cidentemente as únicas de natureza objetiva. Logo, verifica-se que o art. 44, III, do CP somente levou em
conta as circunstâncias subjetivas.
5.2.4. Penas restritivas de direitos e violência doméstica ou familiar contra a mulher
Nos termos do art. 17 da Lei no 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, “É vedada a
aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras
de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa”.
Conforme a Súm. no 588 do STJ, a prática de crime ou contravenção penal contra a mulher com
violência ou grave ameaça no ambiente doméstico impossibilita a substituição de pena privativa de liber-
dade por restritiva de direitos.

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5.3. Da pena de multa (arts. 49, 50, 51 e 60 do CP)


5.3.1. Conceito
Trata-se de uma sanção penal, de natureza patrimonial, consistente no pagamento de determinada
quantia em pecúnia, previamente fixada em lei, em favor do Fundo Penitenciário Nacional.
5.3.2. Critério de fixação da pena de multa
Diversamente da pena privativa de liberdade, cujo sistema é o trifásico, a aplicação da pena de
multa observa um sistema bifásico, comportando, pois, duas fases distintas e sucessivas.
Para o cálculo da pena de multa, o Código Penal adotou o sistema do dia-multa.
Na 1a fase, o juiz deverá estabelecer o número de dias-multa, que varia de, no mínimo, 10 (dez)
dias-multa a, no máximo, 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. É o que se extrai do art. 49 do CP.
Para chegar ao número de dias-multa, o Magistrado considera as circunstâncias judiciais do art. 59,
caput, do CP, bem como eventuais atenuantes e agravantes, além de causas de diminuição e aumento de
pena.
Na 2a fase, o juiz deverá fixar o valor do dia-multa, não podendo ser inferior a um trigésimo do salário
mínimo mensal de referência vigente ao tempo do fato, nem superior a cinco vezes esse salário (art. 49, § 1o, do
CP).
Para aferir o valor do dia-multa, o juiz deverá considerar a situação econômica do réu, podendo
chegar ao triplo, se considerada insuficiente e ineficaz diante da situação financeira do réu, conforme dispõe
o art. 60 do CP.
5.3.3. Execução da pena de multa
Conforme o ordenamento jurídico vigente, a inadimplência no pagamento da multa estatal não
conduz, em nenhuma hipótese, à aplicação da pena de prisão. Ninguém pode ser privado da liberdade em
razão do não pagamento de uma multa estatal.
Nos termos do art. 51 do CP, transitada em julgado a sentença condenatória, o valor da multa deve
ser inscrito como dívida ativa em favor da Fazenda Pública. A multa permanece com sua natureza penal. A
execução é que se procede em termos extrapenais. Em face disso, a obrigação de seu pagamento não se
transmite aos herdeiros do condenado.
A novidade introduzida pela Lei no 13.964/2019 diz respeito à execução da pena de multa. Nos
termos da atual redação do art. 51 do CP, a legitimidade para a execução da pena de multa passa a ser do
Ministério Público, sendo executada perante o juiz da execução penal.

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5.4. Da aplicação da pena e reincidência


5.4.1. Da aplicação da penal (art. 68 do CP)
5.4.1.1. Introdução
Da leitura do art. 68 do CP verifica-se que, em relação à pena privativa de liberdade, a legislação
penal adotou o critério trifásico, segundo o qual se deve encontrar a pena-base atendendo-se ao critério do
art. 59 deste Código; em seguida, serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por úl-
timo, as causas de diminuição e de aumento.
Em relação à pena de multa, convém repetir, o Código Penal adotou o sistema bifásico, conforme
se extrai do art. 49 do CP.
5.4.1.2. Primeira fase da fixação da pena: pena-base e circunstâncias jurídicas
Não há nenhum dispositivo legal norteando o juiz na fixação da pena-base, encarregando-se a
doutrina e a jurisprudência de estabelecer critérios basilares para o montante da pena-base, sempre res-
saltando a discricionariedade do juiz.
Todavia, em que pese o grau de discricionariedade, o juiz, nessa fase, está restrito à cominação
legal da pena, devendo observar o mínimo e o máximo da pena legalmente prevista. Em outras palavras,
ainda que todas as circunstâncias judiciais sejam favoráveis ao réu, a pena-base não poderá ficar abaixo do
mínimo legal. De outro lado, se as circunstâncias judiciais forem desfavoráveis ao réu, não será possível ao
juiz fixar a pena-base além do máximo da pena cominada ao delito. Assim, por exemplo, em relação ao crime
de furto simples (art. 155, caput, do CP), o juiz somente poderá fixar a pena-base dentro do limite de 1 (um)
a 4 (quatro) anos.
De todo modo, se todas as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP forem favoráveis ao réu, a
pena-base, como regra óbvia, deverá ser fixada no mínimo legal. Se alguma circunstância judicial for des-
favorável ao réu, o juiz está autorizado a fixar a pena-base acima do mínimo legal.
5.4.1.3. Segunda fase da fixação da pena: circunstâncias agravantes e atenuantes
Após a fixação da pena-base, adotando como parâmetro as circunstâncias judiciais, cumpre ao
juiz passar para a segunda fase, fixando a pena, ainda provisória, levando em conta as circunstâncias
agravantes e atenuantes.
No caput do art. 61, o Código Penal emprega o advérbio “sempre”, indicando que, via de regra, as
agravantes são de aplicação obrigatória. Em razão disso, o juiz não pode deixar de agravar a pena, ficando
o quantum da pena a seu critério.
Todavia, quando uma das circunstâncias agravantes funciona como elementar ou como circuns-
tância qualificadora, não se aplica a agravante, a fim de evitar o bis in idem.

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Assim, se, por exemplo, o agente praticar homicídio por motivo fútil (art. 121, § 2o, II, do CP), não
incide a agravante do art. 61, II, a, 1a figura (ter sido o crime cometido por motivo fútil), pois a circunstância
genérica funciona como “qualificadora” do homicídio.
A quantidade da pena a ser agravada ou atenuada fica a critério do juiz, uma vez que não há
nenhum dispositivo legal fixando os parâmetros.
As circunstâncias atenuantes são de aplicação em regra obrigatória, pois o caput do art. 65 reza
que: “são circunstâncias que sempre atenuam a pena”.
Entretanto, quando a pena-base for fixada no mínimo legal, a incidência da circunstância atenuante
não pode conduzir à redução da pena abaixo da pena mínima cominada. É o que se extrai da Súm. no 231
do STJ: “A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo
legal”.
É possível que a atenuante do art. 65 funcione na Parte Especial do Código Penal como causa da
diminuição da pena. Nesse caso, não se aplica a atenuante genérica. Ex.: a circunstância consistente em
praticar crime por motivo de relevante valor moral ou social integra o homicídio privilegiado (art. 121, § 1o,
do CP); logo, não poderá ser considerada atenuante genérica.
Ao contrário das circunstâncias agravantes, que somente podem ser aplicadas se expressamente
previstas em lei, pode o Magistrado considerar, na segunda fase de fixação da pena, atenuante não prevista
em lei, levando em conta circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime. É o que se extrai do art. 66
do CP.
Assim, se, por exemplo, restar comprovado que o agente praticou o crime de furto em razão de
desemprego ou moléstia grave na família, poderá o Magistrado considerar essa circunstância para atenuar
a pena, ainda que não expressamente prevista em lei.
5.4.1.4. Terceira fase da aplicação da pena: causas de aumento e de diminuição da pena
Na terceira e última fase de aplicação da pena, o juiz deve considerar as causas de aumento e de
diminuição da pena presentes no caso concreto. Essas causas de aumento e de diminuição da pena podem
estar previstas tanto na Parte Geral do Código Penal quanto na Parte Especial.
O cálculo decorrente da causa de aumento ou diminuição da pena deve incidir sobre a pena pro-
visória, encontrada na segunda fase, de forma cumulada.
É importante salientar que, com o reconhecimento de causa de aumento ou de diminuição de pena,
o juiz pode aplicar pena acima da máxima ou inferior à mínima cominada em abstrato.

37
1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

5.4.2. Da reincidência (art. 63 do CP)


5.4.2.1. Conceito
A reincidência pressupõe uma sentença condenatória transitada em julgado por prática de crime.
Há reincidência somente quando o novo crime for cometido após a sentença condenatória de que não cabe
mais recurso. É o que se extrai do art. 63 do CP.
Ex.: o agente pratica um crime, sendo processado e condenado. Não recorre, vindo a sentença
transitar em julgado. Meses depois, vem a praticar novo crime. É considerado reincidente, uma vez que
cometeu novo delito após o trânsito em julgado de sentença que o condenou por prática de crime.
Se o agente praticar o novo crime exatamente no dia em que transitar em julgado a sentença penal
condenatória pelo crime anterior, não incide a agravante da reincidência, pois a lei é expressa ao mencionar
que o novo crime deve ser praticado “depois” do trânsito em julgado. No dia do trânsito, portanto, não se
encaixa na hipótese legal.
Além disso, complementando os pressupostos da reincidência, o art. 7o da Lei de Contravenções
Penais (Decreto-lei no 3.688/1941) dispõe que: “verifica-se a reincidência quando o agente pratica uma
contravenção depois de passar em julgado a sentença que o tenha condenado, no Brasil ou no estrangeiro,
por qualquer crime, ou, no Brasil, por motivo de contravenção”.
Assim, podem ocorrer várias hipóteses:
a) o agente, condenado irrecorrivelmente pela prática de um crime, vem a cometer outro delito: é
reincidente (art. 63 do CP);
b) o agente pratica um crime; condenado irrecorrivelmente, vem a cometer uma contravenção: é
reincidente (art. 7o da LCP);
c) o sujeito pratica uma contravenção, vindo a ser condenado por sentença transitada em julgado;
comete outra contravenção: é considerado reincidente (art. 7o da LCP);
d) o sujeito comete uma contravenção; é condenado por sentença irrecorrível; pratica um crime:
não é reincidente (art. 63 do CP).

Informativo 636 STF: Condenações anteriores pelo delito do art. 28 da Lei no 11.343/2006
não são aptas a gerar reincidência.

5.4.2.2. Eficácia temporal da condenação anterior para efeito da reincidência


Nos termos do art. 64, I, do CP, não prevalece a condenação anterior se entre a data do cumpri-
mento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos,
computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação.
Logo, o prazo de 5 (cinco) anos começa a correr a partir do cumprimento da pena ou a sua extinção

38
1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

por outro modo, por exemplo, incidência de uma causa extintiva da punibilidade, como a prescrição da
pretensão executória, graça ou indulto.
O período de prova do livramento condicional e da suspensão condicional da pena será computado
para fins de cessar os efeitos da reincidência.
Assim, em tese, ao agente condenado a 6 (seis) anos de reclusão, cumprindo 1/3 (ou seja, 2 anos),
será concedido o livramento condicional (art. 83, I, do CP), restando outros 4 (quatro) anos para o término
da pena, que será o período de prova.
Consideremos a hipótese de o agente ter iniciado o cumprimento da pena no dia 10-8-2010. Após
cumprir 1/3 da pena, dois anos, portanto, obteve o livramento condicional em 10-8-2012, cumprindo inte-
gralmente a pena no dia 10-8-2016.
Em 10-9-2017, o agente pratica novo crime. Nesse caso, não será considerado reincidente, pois
passaram-se mais de 5 (cinco) anos entre a data do cumprimento da pena e a prática do novo crime,
computando-se o período de prova do livramento condicional.
5.4.2.3. Crimes que não induzem reincidência
O art. 64, II, do CP dispõe que, para efeito de reincidência, não se consideram os crimes militares
próprios ou políticos.
Convém ressaltar que, conquanto não gere reincidência, o trânsito em julgado de uma sentença
penal condenatória por crime militar próprio ou crime político gera maus antecedentes, já que o art. 64, II,
do CP limita-se a afastar a reincidência, nada dispondo sobre maus antecedentes.
5.5. Concurso de crimes
5.5.1. Concurso material (art. 69 do CP)
Ocorre o concurso material, também chamado de real, quando o agente, mediante mais de uma
ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não (art. 69, caput, do CP). Há, pois, pluralidade
de condutas e pluralidade de resultados.
Na hipótese de crimes conexos apurados na mesma ação penal, a soma das penas, pelo concurso
material, será realizada na própria sentença, após a adoção do critério trifásico para cada um dos delitos.
Ex.: o agente pratica o crime de estupro (art. 213 do CP) e, para assegurar a sua impunidade, mata, na
sequência, a vítima (art. 121, § 2o, V, do CP). Imaginemos que o juiz fixe, em relação ao delito de estupro,
a pena de 8 (oito) anos; e em relação ao crime de homicídio qualificado, a pena de 20 (vinte) anos. Ao final,
verificando-se tratar de concurso material de crimes, o Magistrado aplicará o sistema do cúmulo material,
somando as penas, alcançando a pena definitiva de 28 anos.
De outro lado, na hipótese de não haver conexão entre os crimes, sendo, por isso, julgados em

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

processos distintos, a soma das penas será realizada perante o juízo da execução criminal, por força do
disposto no art. 66, III, a, da Lei de Execução Penal (Lei no 7.210/1984).
Nos termos do art. 69, caput, do CP, quando o agente realiza o concurso real de crimes, “aplicam-se
cumulativamente as penas em que haja incorrido”. Portanto, no concurso material, as penas são cumuladas,
somadas.
Aplica-se, pois, o sistema do cúmulo material de fixação da pena.
5.5.2. Concurso formal (art. 70 do CP)
5.5.2.1. Conceito
Ocorre o concurso formal (ou ideal) quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica
dois ou mais crimes (art. 70, caput, do CP). Há unidade de conduta e pluralidade de crimes.
A unidade de conduta concretiza-se quando os atos são realizados no mesmo contexto espacial e
temporal, não exigindo, necessariamente, ato único. De fato, pode haver unidade de conduta mesmo
quando fracionada em vários atos, por exemplo, agente que subtrai objetos pertencentes a pessoas distin-
tas, no mesmo contexto fático.
O Superior Tribunal de Justiça tem entendido que, praticado o crime de roubo em um mesmo
contexto fático, mediante uma só ação, contra vítimas diferentes, tem-se configurado o concurso formal de
crimes.
5.5.2.2. Concurso formal perfeito e concurso formal imperfeito
O concurso formal perfeito, ou próprio, está previsto na primeira parte do art. 70 do CP. Ocorre
quando o agente pratica duas ou mais infrações penais por meio de uma única conduta. Resulta de um
único desígnio. O agente, de um só impulso volitivo, dá causa a dois ou mais resultados, sem desígnios
autônomos em relação a cada um dos resultados.
Desígnio autônomo caracteriza-se pelo fato de o agente pretender, mediante uma única conduta,
atingir dois ou mais resultados. Ou seja, o agente, mediante uma ação ou omissão, age com consciência e
vontade em relação a cada um deles, considerados isoladamente.
Assim, se, por exemplo, o agente, na condução de veículo automotor, atropela e causa a morte de
uma pessoa e lesão corporal em outra, pratica crime de homicídio culposo na condução de veículo auto-
motor (art. 302 do CTB), em concurso formal perfeito, já que não tinha desígnios autônomos em relação a
cada um dos resultados.
No concurso formal imperfeito, ou impróprio, o agente, mediante uma ação ou omissão, pre-
tende, de forma consciente e voluntária, o resultado em relação a cada um dos crimes.
Ex.: o agente provoca fogo em uma residência com a intenção de matar todos os moradores. O

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

agente tem desígnios autônomos (intenção de matar) em relação a cada um dos moradores da residência.
A expressão “desígnios autônomos” abrange tanto o dolo direto quanto o dolo eventual. Assim,
haverá concurso formal imperfeito, por exemplo, entre o delito de homicídio doloso com dolo direto e outro
com dolo eventual.
5.5.2.3. Aplicação da pena no concurso formal
Em relação ao concurso formal perfeito, ou próprio, o Código Penal adotou o sistema de exas-
peração da pena. Aplica-se a pena do crime mais grave ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada,
em qualquer caso, de um sexto até metade.
O critério adotado pela jurisprudência para a fixação do aumento da pena em decorrência do con-
curso formal perfeito de crimes tem relação com o número de crimes cometidos pelo agente.

*Para todos verem: quadro.

NÚMERO DE CRIMES AUMENTO DA PENA

2 crimes 1/6 de aumento

3 crimes 1/5 de aumento

4 crimes 1/4 de aumento

5 crimes 1/3 de aumento

5 ou mais crimes 1/2 de aumento

No concurso formal imperfeito, ou impróprio, por conta do maior grau de reprovabilidade da


conduta do agente, visando a não beneficiar agente que agiu com desígnios autônomos em relação a cada
resultado, as penas devem ser somadas, adotando-se o critério do cúmulo material, nos termos do art.
70, caput, 2a parte, do CP.
5.5.3. Concurso material benéfico (art. 70, par. ún., do CP)
Se da aplicação da regra da exasperação da pena, no concurso formal, a pena tornar-se superior
à que resultaria se somadas, deve-se adotar o critério do cúmulo material, porque, nesse caso, será mais
benéfico (art. 70, par. ún., do CP).
Ex.: suponha-se que o agente tenha praticado um homicídio simples (art. 121 do CP – pena de 6
a 20 anos) e uma lesão corporal leve (art. 129, caput, do CP – pena de 3 meses a 1 ano), em concurso
formal. Aplicado o critério da exasperação da pena, considerando-se a pena do crime mais agrave, acres-
cido de 1/6, resultaria na pena de 7 (sete) anos.
Se aplicada a pena considerando-se o critério do cúmulo material, considerando-se a pena

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

aplicada para crime de homicídio simples (6 anos) e lesão corporal leve (3 meses), a pena definitiva ficaria
em 6 (seis) anos e 3 (três) meses. Essa seria a pena a ser aplicada, já que a aplicação do critério do
concurso material é mais benéfico.
Em face disso, a pena a ser aplicada não pode ser superior à que seria cominada se fosse caso
de concurso material, aplicando-se, nesse caso, o disposto no art. 70, par. ún., do CP.
5.5.4. Crime continuado (art. 71 do CP)
5.5.4.1. Conceito
Ocorre o crime continuado quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois
ou mais crimes da mesma espécie, devendo os subsequentes, pelas condições de tempo, lugar, maneira
de execução e outras semelhantes, ser havidos como continuação do primeiro.
5.5.4.2. Requisitos
Para a incidência das regras do crime continuado é preciso verificar a presença de requisitos dis-
postos no art. 71 do CP, consistentes: a) na pluralidade de condutas; b) na pluralidade de crimes da mesma
espécie; c) nas mesmas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes.
a) Pluralidade de condutas
Nos termos do art. 71 do CP, o crime continuado caracteriza-se pelo fato de o agente praticar
crimes mediante mais de uma ação ou omissão, exigindo, pois, pluralidade de condutas.
Distingue-se do concurso material, que também exige pluralidade de condutas, por força da inci-
dência dos demais requisitos, ou seja, a prática de crimes de mesma espécie, nas mesmas condições de
tempo, lugar e maneira de execução.
b) Crimes da mesma espécie
Crimes da mesma espécie são os que estiverem previstos no mesmo tipo penal, considerando-se,
inclusive, as figuras simples ou qualificadas, dolosas ou culposas, tentadas ou consumadas.
De outro lado, a teor da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não há como reconhecer a
continuidade delitiva entre os crimes de roubo e de latrocínio, porquanto são delitos de espécies diversas,
já que tutelam bens jurídicos diferentes.1
c) Condições de tempo
Exige-se, para caracterizar crime continuado, conexão temporal entre as condutas praticadas para
que se configure a continuidade delitiva. Deve existir, em outros termos, certa periodicidade que permita se
observar certo ritmo, certa uniformidade, entre as ações sucessivas, embora não se possam fixar, a

1
STJ – HC 384875/SP – rel. Min. Ribeiro Dantas – 5a Turma – j. 20-3-2018.

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

respeito, indicações precisas.


A jurisprudência tem admitido crime continuado quando entre as infrações penais não houver de-
corrido período superior a 30 (trinta) dias.
d) Condições de lugar
Deve existir entre os crimes da mesma espécie uma conexão espacial para caracterizar o crime conti-
nuado.
A prática de crimes da mesma espécie em locais diversos não exclui a continuidade. Assim, crimes
praticados em bairros diversos de uma mesma cidade, ou em cidades próximas, podem ser entendidos
como praticados em condições de lugar semelhantes.
e) Maneira de execução
A lei exige que a forma de execução das infrações continuadas seja semelhante, traduzindo-se no
modo, forma e meios empregados para a prática dos delitos. Ex.: empregado de um estabelecimento co-
mercial que subtrai, diariamente, objetos da empresa.
Todavia, um crime de furto qualificado pela escalada e outro furto qualificado pela destreza, con-
quanto crimes da mesma espécie, inviabilizam a incidência do crime continuado, já que empregaram modos
de execução distintos.
5.5.4.3. Crime continuado específico (art. 71, par. ún., do CP)
O crime continuado específico prevê a necessidade de três requisitos, que devem ocorrer simultanea-
mente:
a) Contra vítimas diferentes
Admite-se nexo de causalidade entre crimes que lesam interesses jurídicos pessoais, ainda que
praticados contra vítimas diversas
De fato, a circunstância de os delitos componentes atingirem bens jurídicos pessoais não impede
a continuação. Entretanto, cumpre observar o disposto no parágrafo único do art. 71: “Nos crimes dolosos,
contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando
a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e
as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o
triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 deste Código”.
Assim, admite o Código Penal nexo de continuidade entre homicídios, lesões corporais ou roubos
contra vítimas diversas, podendo o juiz, de acordo com as circunstâncias judiciais do art. 59, caput, do CP,
aumentar a pena de um dos delitos até o triplo, desde que a pena não seja superior à que seria imposta se
o caso fosse de concurso material.

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

b) Com violência ou grave ameaça à pessoa


Mesmo que o crime seja contra vítimas diferentes, se não houver violência – real ou ficta – contra
a pessoa, não haverá a continuidade específica, mesmo que haja violência contra a coisa.
c) Somente em crimes dolosos
Se a ação criminosa for praticada contra vítimas diferentes, com violência à pessoa, mas não for
produto de uma conduta dolosa, não estará caracterizada a exceção.
5.5.4.4. Aplicação da pena
Tratando-se de crime continuado comum, aplica-se a pena do crime mais grave, aumentada de
1/6 até 2/3.
O parâmetro para o aumento da pena entre 1/6 e 2/3 deve ser proporcional ao número de infrações
praticadas.
*Para todos verem: quadro.

NÚMERO DE CRIMES AUMENTO DE PENA

2 crimes 1/6 de aumento

3 crimes 1/5 de aumento

4 crimes 1/4 de aumento

5 crimes 1/3 de aumento

6 crimes 1/2 de aumento

7 ou mais crimes 2/3 de aumento

Com relação a crime continuado específico, previsto no art. 71, par. ún., do CP, aplica-se a pena
do crime mais grave aumentada até o triplo. Todavia, segundo o entendimento do Supremo Tribunal Fede-
ral, no crime continuado qualificado, a majoração da pena não está adstrita ao número de infrações prati-
cadas, haja vista que o art. 71, par. ún., do CP determina que poderá o juiz, “considerando a culpabilidade,
os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias,
aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo”. Logo, a
fração de aumento de pena no crime continuado qualificado lastreia-se nos vetores em questão, e não
apenas no número de infrações praticadas.2

2
STF – HC 131871/PR – rel. Min. Dias Toffoli – 2a Turma – j. 31-5-2016.

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

6. Da Suspensão Condicional da Pena

6.1. Conceito
Trata-se de um instituto de política criminal, tendo por fim a suspensão da execução da pena pri-
vativa de liberdade, evitando o recolhimento ao cárcere do condenado não reincidente condenado à pena
não superior a 2 (dois) anos (ou a 4 anos, na hipótese de sursis etário ou humanitário), mediante o cumpri-
mento de determinadas condições, fixadas pelo juiz, durante o período de prova.
Os requisitos da suspensão condicional da execução da pena estão previstos no art. 77 do CP.
6.1.1. Requisitos objetivos
a) Pena privativa de liberdade
Quanto à qualidade da pena, somente a pena privativa de liberdade, seja reclusão, seja detenção,
admite a suspensão condicional da execução da pena.
Não cabe sursis em relação à pena restritiva de direitos e à pena de multa. É o que se extrai do
art. 80 do CP, segundo o qual “a suspensão não se estende às penas restritivas de direitos nem à multa”.
Não se aplica o sursis às medidas de segurança, uma vez que o instituto é voltado a suspender a
execução da pena. E medida de segurança não tem natureza jurídica de pena. Além disso, verificada a
inimputabilidade pela enfermidade mental, a sentença será absolutória imprópria, não havendo, pois, exe-
cução da pena a suspender.
b) Quantidade da pena privativa de liberdade
Como regra, a quantidade da pena imposta na sentença não pode ser superior a 2 (dois) anos,
ainda que resulte, no concurso de crimes, de sanções inferiores a ela.
Tratando-se, entretanto, de condenado maior de 70 anos de idade, ao tempo da sentença ou do
acórdão (sursis etário) ou em razão de saúde (sursis humanitário ou profilático), a pena aplicada pode ser
igual ou inferior a 4 (quatro) anos (art. 77, § 2o, do CP).
Em relação a concurso de crimes, em qualquer das suas espécies, a pena aplicada, considerando
os critérios da exasperação da pena ou cúmulo material, não pode ser superior a 2 (dois) anos (ou 4 anos,
na hipótese de sursis etário ou humanitário).
c) Impossibilidade de substituição por pena restritiva de direitos
Somente se aplica o sursis quando incabível ou não recomendável a substituição da pena privativa
de liberdade por restritiva de direitos (art. 77, III, do CP).

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

6.1.2. Requisitos subjetivos


a) Condenado não reincidente em crime doloso
Nem toda reincidência impede a concessão do sursis, mas somente a reincidência em crime do-
loso. Isso quer dizer que a condenação anterior, mesmo definitiva, por crime culposo ou por simples con-
travenção, por si só, não é causa impeditiva da suspensão condicional da pena.
Todavia, a reincidência, ainda que em crime doloso, em decorrência de anterior condenação a
pena de multa, não impede a concessão do sursis (art. 77, § 1o, do CP).
b) Circunstâncias judiciais favoráveis ao agente
Não é indispensável que todas as circunstâncias sejam favoráveis, como ocorre com sursis espe-
cial. Basta que, no geral, não sejam desfavoráveis de modo a criar dúvidas fundadas sobre a possibilidade
de o condenado voltar a delinquir.
6.2. Condições
Durante o período do sursis, o condenado deve cumprir determinadas condições, sob pena de ser
revogada a medida e ter de cumprir a sanção privativa de liberdade. Essas condições são: a) legais: impos-
tas pela lei (arts. 78, § 1o, e 81 do CP); b) judiciais: impostas pelo juiz na sentença (art. 79 do CP).
No sursis simples, a condição legal e obrigatória consiste na prestação de serviços à comunidade
ou limitação de fim de semana, no primeiro ano do período de suspensão (art. 78, § 1o, 1a parte, do CP).
Tratando-se de sursis especial, satisfeitos os seus requisitos, as condições alternativas da presta-
ção de serviços à comunidade e a limitação de fim de semana são substituídas por: proibição de frequentar
determinados lugares; proibição de o condenado ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização
judicial; e comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas ativi-
dades (art. 78, § 2o, a e c, do CP).
As condições legais do sursis especial, previstas no art. 78, § 2o, a, b e c, do CP, devem ser im-
postas cumulativamente.
6.3. Período de prova
É o prazo em que a execução da pena privativa de liberdade imposta fica suspensa, mediante o
cumprimento das condições estabelecidas.
Como regra, o período de prova varia entre 2 (dois) a 4 (quatro) anos (art. 77, caput, do CP). Sendo
o condenado maior de 70 anos de idade ou por razões de saúde, o prazo varia de 4 (quatro) a 6 (seis) anos
(art. 77, § 2o, do CP). Tratando-se da contravenção, o período de prova varia de 1 (um) a 3 (três) anos (art.
11 da LCP).
O período de prova deve ser fixado segundo a natureza do crime, personalidade do agente e

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

intensidade da pena, não podendo o juiz, senão em hipótese excepcional, estabelecê-lo no prazo máximo.
6.3.1. Causas de revogação do sursis
Incidindo uma causa de revogação do sursis, deverá o condenado cumprir integralmente a pena
privativa de liberdade cuja execução se encontrava suspensa, desconsiderando o tempo que permaneceu
no período de prova, ainda que tenha cumprido as condições impostas.
Assim, se, por exemplo, no primeiro ano o agente cumpriu prestação de serviço à comunidade,
sobrevindo causa de revogação do sursis, esse período não será descontando/detraído da pena privativa
de liberdade que deverá ser executada.
a) Revogação obrigatória
A revogação obrigatória decorre de lei, não ficando a critério do Magistrado decretá-la ou não. A
margem de discricionariedade do Magistrado é limitada pela lei, sendo seu dever revogar o benefício.
Nos termos do art. 81 do CP, a suspensão condicional da execução da pena será revogada, no
curso do prazo, ao beneficiário que:
I – é condenado, sem sentença irrecorrível, por crime doloso
A lei não faz ressalva no sentido de que a condenação deva ser por crime praticado no curso da
suspensão condicional da pena. Logo, não se mostra relevante se o crime foi praticado antes ou depois do
início da suspensão condicional da pena. Basta que tenha havido sentença condenatória transitada em
julgado pela prática de crime doloso, independentemente de quando foi praticado.
Todavia, se a nova condenação se referir somente à pena de multa, não haverá revogação do
benefício. Com efeito, se a condenação anterior à pena de multa, mesmo por crime doloso, não impede a
concessão do sursis (art. 77, § 1o, do CP), também não pode ser causa de revogação do benefício.
II – frustra, embora solvente, a execução de pena de multa ou não efetua, sem motivo justi-
ficado, a reparação do dano
Trata-se da hipótese de o condenado solvente criar embaraços para frustrar a execução da pena
de multa que obstem a cobrança da multa, não efetuando o seu pagamento.
Também constitui causa obrigatória de revogação do sursis a ausência injustificada da reparação
do dano. Assim, se justificada a impossibilidade de reparação do dano, por exemplo, a precária situação
financeira do condenado, não incidirá a causa de revogação do benefício.
III – descumpre a condição do § 1o do art. 78 do CP
Como ocorre na hipótese da reparação do dano, somente o descumprimento injustificado da pres-
tação de serviços à comunidade ou da limitação de fim de semana ensejará a revogação do benefício.

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

b) Revogação facultativa
Incidindo uma causa de revogação facultativa do sursis, ficará a critério do juiz revogar ou não o bene-
fício.
As hipóteses de revogação facultativa estão previstas no art. 81, § 1o, do CP. Nesse caso, o juiz
não está obrigado a revogar o benefício, podendo optar por advertir novamente o sentenciado, prorrogar o
período de prova até o máximo ou exacerbar as condições impostas, conforme dispõe o art. 81, § 3o, do
CP.
São duas as hipóteses de revogação facultativa:
I – o condenado deixa de cumprir qualquer outra condição imposta
Na hipótese de revogação facultativa, a decisão fica sujeita à discricionariedade do juiz, que, em
vez de revogar a suspensão, poderá prorrogar o período de prova. Aqui, a lei refere-se às condições legais
previstas para o sursis especial (art. 78, § 2o, do CP) e às condições judiciais que foram determinadas (art.
79 do CP).
II – condenação irrecorrível, por crime culposo ou contravenção, à pena privativa de liber-
dade e restritiva de direitos
Essa hipótese afasta a condenação à pena de multa, já que se refere, especificamente, às outras
duas modalidades de penas.
6.4. Extinção da pena
Se o período de prova termina sem que haja ocorrido motivo para a revogação, não mais se exe-
cuta a pena privativa de liberdade (art. 82 do CP).
Assim, expirado o prazo de suspensão ou de prorrogação sem que tenha havido motivo para a
revogação, o juiz deve declarar extinta a pena privativa de liberdade.
Trata-se de sentença declaratória. Em face disso, considera-se, para fins de extinção da pena, a
data do término do período de prova e não a data em que o juiz profere a decisão, ainda que seja em período
posterior.

7. Do Livramento Condicional

7.1. Conceito
Trata-se de um instituto de política criminal, destinado a antecipar o retorno do condenado ao
convívio social, mediante determinadas condições e de forma precária, desde que preenchidos os requi-
sitos legais.

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

7.2. Requisitos
Os requisitos do livramento condicional, de ordem objetiva e subjetiva, encontram -se no art.
83 do CP.
7.2.1. Requisitos objetivos
Os requisitos objetivos estão previstos no art. 83, I, II, IV e V, do CP, vinculando-se à pena e à
reparação do dano.
a) Natureza e quantidade da pena
Assim como na suspensão condicional do processo, o livramento condicional somente pode ser
concedido em relação à pena privativa de liberdade. Não cabe, pois, à pena restritiva de direitos e multa.
Além disso, o benefício somente poderá ser concedido à pena privativa de liberdade igual ou su-
perior a 2 (dois) anos (art. 83 do CP). A soma das penas é permitida para atingir esse limite mínimo, mesmo
que tenham sido aplicadas em processos distintos, nos termos do art. 84 do CP.
b) Cumprimento de parte da pena
Nos termos do art. 83, I, do CP, se o criminoso não for reincidente em crime doloso e ostentar bons
antecedentes, deverá cumprir mais de 1/3 da pena privativa de liberdade para obter o benefício. É a hipó-
tese de livramento condicional simples.
Se o condenado for reincidente em crime doloso, deverá cumprir mais da metade da pena
privativa de liberdade, conforme dispõe o art. 83, II, do CP. Trata-se do livramento condicional qualifi-
cado. Nesse particular, há uma omissão do legislador na hipótese de o condenado não ser reincidente
em crime doloso, mas portador de maus antecedentes. Isso porque não se enquadra na hipótese do
inciso I (que exige bons antecedentes) nem na do inciso II (que trata da hipótese de reincidente em
crime doloso) do art. 83 do CP.
Nesse caso, prevalece o entendimento de que, por conta da ausência de expressa previsão legal,
deve-se conferir ao condenado o tratamento mais benéfico. Ou seja, o condenado não reincidente em crime
doloso, mas portador de maus antecedentes, deverá cumprir mais de 1/3 da pena para obtenção do livra-
mento condicional. É a posição do Superior Tribunal de Justiça.3
Tratando-se de condenado por prática de tortura, crime hediondo, tráfico ilícito de entorpecentes
e drogas afins, terrorismo e tráfico de pessoas (introduzido pela Lei no 13.344/2016), desde que não seja
reincidente específico em tais delitos, deve cumprir mais de 2/3 da pena (art. 83, V, do CP). Trata-se do

3 HC 102.278/RJ. Superior Tribunal de Justiça. Rel. Min. Jane Silva (Desembargadora Convocada do TJ/MG), 6a Turma, julgado
em 03/04/2008.

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Direito Penal

livramento condicional específico.


Assim, sendo reincidente específico em crime hediondo ou equiparado, não é admissível o livra-
mento condicional. Há reincidência específica, para efeito desse dispositivo, quando o sujeito, já tendo sido
condenado por qualquer dos delitos hediondos por sentença transitada em julgado, vem novamente a co-
meter crime dessa mesma natureza. Ex.: após condenação definitiva por crime de homicídio qualificado, o
agente pratica e é condenado pelo crime de tráfico de drogas. Nesse caso, não terá direito a livramento
condicional, por ser reincidente específico por crime de natureza hedionda e equiparado.
c) Reparação do dano, salvo efetiva impossibilidade
Nos termos do art. 91, I, do CP, a condenação torna certa a obrigação de indenizar o dano resul-
tante do crime. Assim, o condenado não pode obter o livramento condicional enquanto não reparar o dano
causado, salvo quando insolvente.
Na prática, esse requisito tem limitado alcance, uma vez que, via de regra, os condenados são
pessoas pobres, absolutamente insolventes, sem a menor possibilidade de reparar o dano causado.
7.2.2. Requisitos subjetivos
Os requisitos subjetivos referem-se à pessoa do condenado. São analisados para constatar se o
condenado reúne condições pessoais para retornar ao convívio social.
A Lei no 13.964/2019 acrescentou mais requisitos objetivos para a obtenção do livramento condi-
cional, prevendo o art. 83, III, do CP a necessidade da comprovação:
a) Bom comportamento durante a execução da pena
O bom comportamento carcerário, via de regra, é aferido com base no atestado emitido pelo diretor
do estabelecimento carcerário, considerando-se a conduta do condenado ao longo da execução da pena.
Em outras palavras, para a verificação do requisito subjetivo não se leva em conta o crime praticado pelo
condenado, mas seu comportamento durante o cumprimento da pena.
Convém sinalar, por pertinente, que a prática de falta grave não interrompe o prazo para a conces-
são do livramento condicional. É o que se extrai da Súm. no 441 do STJ, segundo a qual “A falta grave não
interrompe o prazo para obtenção de livramento condicional”.
De acordo com a Súm. no 439/STJ, “admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do
caso, desde que em decisão motivada”.
b) Não cometimento de falta grave nos últimos doze meses
A Lei no 13.964/2019 acrescentou mais um requisito para a obtenção do livramento condicional,
consistente no não cometimento de falta grave nos últimos 12 meses de execução da pena.
As hipóteses de falta grave durante a execução da pena estão previstas no art. 50 da Lei no

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Direito Penal

7.210/1984.
Se o condenado praticou falta grave ao longo dos últimos 12 meses, não terá direito à obtenção
do livramento condicional, ainda que preenchidos os demais requisitos.
c) Bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído
Trata-se de uma exigência salutar para o retorno do condenado ao convívio social, mas, infeliz-
mente, de pouca efetividade prática, por conta da carência ou dificuldade de inserção do apenado no mer-
cado de trabalho.
Ao referir-se a “trabalho que lhe foi atribuído”, fica claro que não se trata apenas das atividades
laborais desenvolvidas no interior do cárcere, mas também se refere ao trabalho efetuado fora da prisão,
por exemplo, o serviço externo, tanto na iniciativa privada como na pública.
d) Aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto
A lei não determina que o apenado deve ter emprego assegurado no momento da liberação. O
que a lei exige é a aptidão, isto é, a disposição, a habilidade, a inclinação do condenado para viver às custas
de seu próprio e honesto esforço.
e) Constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a
delinquir na hipótese de condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça
Tratando-se de condenado por crime doloso cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a
concessão do livramento fica subordinada, além dos requisitos do art. 83 do CP, à constatação, mediante
perícia, de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinquir (art. 83, par. ún.,
do CP).
7.3. Livramento condicional vedado
A Lei no 13.964/2019, que altera o art. 112 da Lei no 7.210/1984 (LEP), passou a prever vedação
do livramento condicional a condenados pela prática de determinados crimes.
É vedado o livramento condicional:
• ao condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte (art. 112,
VI, a e c, da LEP);
• ao condenado expressamente em sentença, por integrar organização criminosa ou por crime
praticado por meio de organização criminosa, não será facultada a progressão de regime de
cumprimento de pena ou a obtenção do livramento condicional ou outros benefícios prisionais
se houver elementos probatórios que indiquem a manutenção do vínculo associativo (art. 2 o,
§ 9o, da Lei no 12.850/2013);
• ao reincidente em crime hediondo ou equiparado (art. 83, V, do CP).

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7.4. As causas de revogação do livramento condicional


O livramento condicional, pela própria natureza do benefício, é passível de revogação a qualquer
momento, desde que presente alguma hipótese que a justifique.
As causas de revogação obrigatórias estão previstas no art. 86 do CP, ao passo que as causas de
revogação facultativa estão previstas no art. 87.
7.4.1. Causas de revogação obrigatória
Quando ocorre uma causa obrigatória, não fica a critério do juiz revogar o livramento condicional
ou não, a revogação decorre da própria lei.
A revogação obrigatória incide quando o liberado vem a ser condenado a pena privativa de liber-
dade, em sentença irrecorrível, por crime praticado durante ou antes da concessão do livramento condicio-
nal.
A condenação pela prática de contravenção penal ou por crime a pena que não seja privativa de
liberdade constitui causa de revogação facultativa.
7.4.2. Causas de revogação facultativa
Nas hipóteses de revogação facultativa, cumpre ao juiz deliberar acerca da revogação ou manu-
tenção do livramento condicional. Trata-se, pois, de causas judiciais de revogação do livramento condicio-
nal.
Se mantido o livramento condicional, na hipótese da revogação facultativa, o Juiz deverá advertir
o liberado ou agravar as condições (art. 140, par. ún., da LEP).
Nos termos do art. 87 do CP, duas são as hipóteses de revogação facultativa:
a) se o liberado deixar de cumprir qualquer das obrigações constantes na sentença;
b) se o liberado for irrecorrivelmente condenado, por crime ou contravenção, a pena que não seja
privativa de liberdade.

8. Efeitos da Condenação

8.1. Nota introdutória


Após a prática de um fato típico, ilícito e sendo o agente culpável, em tese, instaura-se uma ação
penal, que pode ser pública ou privada. Observando as garantias constitucionais do contraditório, da ampla
defesa e do devido processo legal, objetiva-se chegar ao final e, se comprovada a materialidade e a autoria,
o Estado, por meio do Poder Judiciário, aplicar uma sentença ou acórdão condenatório, com a fixação de

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Direito Penal

uma pena.
Essa sentença condenatória, ao transitar em julgado, naturalmente gera efeitos que, direta ou in-
diretamente, atingem o condenado. Os efeitos não são apenas na esfera penal, mas também em outras
áreas do direito, como cível, administrativa, eleitoral, por exemplo.
Os efeitos da condenação são divididos em principais e secundários:
8.2. Efeitos principais
Como corolário lógico da sentença penal condenatória, o efeito principal consiste na aplicação de
uma pena privativa de liberdade, restritiva de direitos e/ou multa, além de medida de segurança, no caso
de agente semi-imputável que revela periculosidade.
8.3. Efeitos secundários
Além dos efeitos principais, a sentença condenatória gera efeitos secundários, também denomi-
nados efeitos mediatos, acessórios, reflexos ou indiretos, de natureza penal e extrapenal.
8.3.1. Efeitos secundários de natureza penal
São inúmeros os efeitos secundários da sentença penal condenatória transitada em julgado, entre
os quais podem ser destacados os seguintes:
a) gerar a reincidência (art. 63 do CP);
b) configuração de maus antecedentes, se não utilizada para fins de reincidência;
c) fixação do regime inicial fechado na hipótese de prática de novo crime, ressalvada a hipótese
da Súm. no 269 do STJ;
d) vedação da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos na hipótese de
prática de novo crime, ressalvada a hipótese do art. 44, § 3o, do CP;
e) vedação da concessão da suspensão condicional da pena em relação ao novo crime (art. 77, I,
do CP), e revogação do sursis (art. 81, I, e § 1o, do CP);
f) causa de revogação do livramento condicional (arts. 86 e 87 do CP);
g) aumento e interrupção do prazo da prescrição da pretensão executória, quando reconhecida a
reincidência pela prática de outro crime (arts. 110, caput, e 117, VI, do CP);
h) vedação da concessão da transação penal e da suspensão condicional do processo, em relação
ao novo crime (arts. 76, § 2o, I, e 89, caput, da Lei no 9.099/1995).
8.3.2. Efeitos secundários de natureza extrapenal
Além de gerar efeitos penais, a sentença penal condenatória transitada em julgado gera efeitos
extrapenais, ou seja, em outras áreas do direito, como na esfera cível, administrativa, trabalhista, eleitoral
etc.

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

Esses efeitos se dividem em genéricos e específicos.


Os efeitos genéricos incidem sobre todos os crimes e estão previstos no art. 91 do CP, consistentes
em reparar o dano e confisco. Incidem de forma automática, não sendo necessário, portanto, o juiz declarar
na sentença. É o que se extrai, a contrario sensu, do disposto no art. 92, par. ún., do CP.
Os efeitos específicos são aqueles previstos no art. 92 do CP. Nos termos do parágrafo único do
art. 92, esses efeitos não incidem de forma automática, devendo o juiz declará-los motivadamente na sen-
tença.
8.3.3. Efeitos genéricos
a) Tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime
Nos termos do art. 91, I, do CP, constitui efeito da sentença penal condenatória “tornar certa a
obrigação de indenizar o dano causado pelo crime”. Trata-se de efeito automático decorrente da sentença
penal condenatória, já que meramente declaratória no tocante à indenização civil, não sendo necessário
mandamento expresso no sentido de o réu reparar o dano resultante do crime.
A sentença penal condenatória transitada em julgado permite à vítima promover a ação de execu-
ção ex delicto, nos termos do art. 63 do CPP, já que constitui título executivo judicial, conforme prevê o art.
515, I, do CPC.
Assim, transitada em julgado a sentença penal condenatória, a sua execução no juízo cível visa
tão somente estabelecer o quantum da reparação do dano, não sendo, portanto, objeto de discussão o
mérito da causa.
b) A perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé, dos
instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou de-
tenção constitua fato ilícito
É a hipótese do confisco como efeito da condenação, previsto no art. 91, II, do CP. Trata-se da
perda em favor da União de bens de origem ilícita, decorrente do delito praticado.
Constitui efeito automático da sentença penal condenatória transitada em julgado, não sendo, pois,
necessário que o juiz declare expressamente na sentença.
c) Confisco alargado
A Lei no 13.964/2019 (“Pacote Anticrime”) introduziu mais um efeito da sentença penal condenató-
ria.
Nos termos do art. 91-A do CP, na hipótese de condenação por infrações às quais a lei comine
pena máxima superior a 6 (seis) anos de reclusão, poderá ser decretada a perda, como produto ou proveito
do crime, dos bens correspondentes à diferença entre o valor do patrimônio do condenado e aquele que

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seja compatível com o seu rendimento lícito.


Para efeito da perda prevista no caput do referido artigo, entende-se por patrimônio do condenado
todos os bens:
Art. 91-A. (...)
I – de sua titularidade, ou em relação aos quais ele tenha o domínio e o benefício direto
ou indireto, na data da infração penal ou recebidos posteriormente; e
II – transferidos a terceiros a título gratuito ou mediante contraprestação irrisória, a partir
do início da atividade criminal.
§ 2o O condenado poderá demonstrar a inexistência da incompatibilidade ou a procedên-
cia lícita do patrimônio.
§ 3o A perda prevista neste artigo deverá ser requerida expressamente pelo Ministério Pú-
blico, por ocasião do oferecimento da denúncia, com indicação da diferença apurada.
§ 4o Na sentença condenatória, o juiz deve declarar o valor da diferença apurada e espe-
cificar os bens cuja perda for decretada.
§ 5o Os instrumentos utilizados para a prática de crimes por organizações criminosas e
milícias deverão ser declarados perdidos em favor da União ou do Estado, dependendo
da Justiça onde tramita a ação penal, ainda que não ponham em perigo a segurança das
pessoas, a moral ou a ordem pública, nem ofereçam sério risco de ser utilizados para o
cometimento de novos crimes.

8.3.4. Efeitos específicos


a) Perda de cargo, função pública ou mandato eletivo
O art. 92, I, do CP prevê duas hipóteses de perda de cargo, função ou mandato eletivo como efeito
da sentença penal condenatória:
a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a 1 (um) ano, nos
crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública;
b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos nos demais
casos.
A primeira hipótese, pode incidir quando o funcionário público praticar o delito no exercício das suas
funções ou em razão dela, e a pena privativa de liberdade seja aplicada por tempo igual ou superior a 1 (um)
ano.
Não se tratando de crime funcional, a perda do cargo, função pública ou mandato eletivo poderá
incidir quando a pena aplicada for igual ou superior a 4 (quatro) anos.
Esse efeito, no entanto, não é automático, ou seja, exige para sua incidência que o juiz declare
expressamente em decisão motivada (art. 92, par. ún., do CP).
b) Incapacidade para o exercício do pátrio poder (poder familiar), tutela ou curatela
Além do vínculo entre o autor do fato e a vítima, a incidência do efeito específico consistente na
incapacidade para o exercício do poder familiar, tutela ou curatela, depende de duas condições: a) que o
crime seja doloso; b) que seja cominada pena de reclusão.
Esse efeito não é automático, devendo ser declarado na sentença em decisão motivada, conforme

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

se extrai do art. 92, par. ún., do CP. Assim, cumpre ao Magistrado, no caso concreto, avaliar a necessidade
da imposição da incapacidade para o exercício do poder familiar, tutela ou curatela. Exemplo: pai conde-
nado pela prática do crime estupro de vulnerável (art. 217-A do CP) contra filha de tenra idade.
c) Inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para a prática de crime doloso
A aplicação desse efeito específico depende de dois requisitos: a) que o crime seja doloso; b) que o
veículo tenha sido utilizado “como meio” para a sua prática. Logo, não incide esse efeito no caso de crime
culposo.

9. Extinção da Punibilidade

9.1. Conceito
Com a prática da infração penal, surge para o Estado o direito de punir o responsável, incidindo a
possibilidade jurídica de o Estado impor uma sanção penal ao responsável pela prática do crime ou contra-
venção penal.
9.2. Efeitos da extinção da punibilidade
Em regra, as causas extintivas da punibilidade só alcançam o direito de punir do Estado, subsis-
tindo o crime em todos os seus requisitos e a sentença condenatória irrecorrível.
Excepcionalmente, a causa extintiva de punibilidade apaga o fato praticado pelo agente e rescinde
a sentença condenatória irrecorrível. É o que ocorre com a abolitio criminis e a anistia.
9.3. Causas de extinção de punibilidade (art. 107 do CP)
9.3.1. Morte do agente
A morte do agente constitui causa de extinção da punibilidade, por conta do princípio da personali-
dade da pena, segundo a qual a pena não pode passar da pessoa do condenado (art. 5o, XLV, 1a parte, da
CF/1988).
Essa extinção da punibilidade incide sobre todas as espécies de penas, inclusive a pena de multa.
Assim, se, no curso da execução da pena de multa convertida em dívida ativa, o réu vier a falecer, deve ser
declarada extinta a punibilidade do agente pela sua morte, não sendo possível, assim, direcionar a execu-
ção da pena de multa aos seus sucessores.
9.3.2. Da anistia, graça e indulto
A anistia, graça e indulto constituem espécies de indulgência, ensejando a renúncia do Estado ao
direito de punir.

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

São benefícios concedidos por órgãos diversos do Poder Judiciário, mas que somente ensejam a
extinção da punibilidade após decisão judicial.
9.3.2.1. Anistia
Trata-se de uma espécie de exclusão da incidência do Direito Penal sobre uma ou mais infrações
penais. Não exclui o crime, mas apenas a possibilidade de o Estado punir o agente que o praticou, razão
pela qual tem efeito retroativo.
A competência para a concessão de anistia é exclusiva da União e privativa do Congresso Nacio-
nal (art. 48, VIII, da CF/1988), com a sanção do Presidente da República, só podendo ser concedida por
meio de lei federal.
Não se aplica aos delitos referentes à prática de tortura, ao tráfico ilícito de entorpecentes e drogas
afins, ao terrorismo e aos definidos como crimes hediondos (art. 5o, XLIII, da CF/1988; art. 2o, I, da Lei no
8.072/1990).
9.3.2.2. Graça
A graça, ao contrário do indulto, é um benefício concedido a pessoa determinada, condenada de-
finitivamente pela prática de crime comum, consistente na extinção ou comutação da pena.
Nos termos do art. 5o, XLIII, da CF/1988, a graça não pode ser aplicada em relação a delitos
referentes à prática de tortura, ao tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, ao terrorismo e aos definidos
como crimes hediondos.
A competência para conceder a graça é do Presidente da República, nos termos do art. 84, XII, da
CF/1988, podendo, nos termos do parágrafo único desse artigo, delegar a atribuição “aos Ministros de Es-
tado, ao Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União”.
9.3.2.3. Indulto
O indulto coletivo constitui modalidade de clemência concedida a todo condenado que preencher
os requisitos previstos no Decreto presidencial publicado geralmente no final de cada ano. Como se vê, o
indulto, ao contrário da graça, tem caráter coletivo e é concedido espontaneamente.
Assim como a graça, a competência para conceder o indulto é do Presidente da República, nos
termos do art. 84, XII, da CF/1988, podendo, nos termos do parágrafo único desse artigo, delegar a atribui-
ção “aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União”.
Os requisitos para a concessão do indulto variam de acordo com cada decreto publicado, consi-
derando, invariavelmente, requisitos subjetivos (primariedade e bom comportamento carcerário, sem regis-
tro de falta grave ao longo do ano) e objetivos (tempo de cumprimento de pena).
Nos termos do art. 2o, I, da Lei no 8.072/1990, o indulto não pode ser aplicado em relação a delitos

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Direito Penal

referentes à prática de tortura, ao tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, ao terrorismo e aos definidos
como crimes hediondos. O art. 44 da Lei no 11.343/2006 também veda a concessão do indulto aos conde-
nados pelo crime de tráfico de drogas.
O indulto também extingue somente a punibilidade, subsistindo o crime, a condenação irrecorrível
e seus efeitos secundários. Assim, se o agente beneficiado com o indulto praticar novo crime, será consi-
derado reincidente.
9.3.3. Lei posterior que deixa de considerar o fato criminoso (abolitio criminis)
A lei penal retroage, atingindo fatos ocorridos antes de sua entrada em vigor, sempre que benefi-
ciar o agente de qualquer modo (art. 5o, XL, da CF/1988).
Se a lei posterior deixar de considerar o fato como criminoso, excluir da seara penal a conduta
como sendo delituosa, retroagirá para alcançar os fatos praticados antes da sua vigência, com a conse-
quente extinção da punibilidade dos responsáveis.
Nos termos do art. 2o do CP, a abolitio criminis gera o efeito de fazer cessar a execução e os efeitos
penais da sentença condenatória, por exemplo, a reincidência, maus antecedentes, lançamento do nome
do réu no rol dos culpados.
Todavia, não apaga os efeitos civis da prática delituosa, já que a lei fala em cessação dos efeitos
“penais” da sentença.
9.3.4. Prescrição, decadência e perempção
O art. 107, IV, do CP prevê como causas de extinção da punibilidade a prescrição, a decadência
e a perempção.
A prescrição será analisada em capítulo próprio, diante da abrangência do tema.
9.3.4.1. Decadência
A decadência é a perda do direito do ofendido e dos demais legitimados de oferecer representação,
no caso de ação penal pública condicionada à representação, e de ajuizar a queixa-crime, na hipótese de
ação penal privada, em face do decurso do tempo.
Os legitimados para apresentar representação ou queixa-crime têm o prazo de 6 (seis) meses, a
contar da inequívoca ciência da autoria do fato, para exercer esse direito. Escoado esse prazo sem iniciativa
do ofendido ou do seu representante legal, incide a decadência, e a consequente extinção da punibilidade
do agente ofensor.
Com efeito, nos termos do art. 103 do CP e do art. 38 do CPP, o ofendido ou seu representante
legal decai do direito de queixa ou de representação se não o exerce dentro do prazo de 6 (seis) meses,
contados a partir do dia em que veio a saber quem é o autor do crime, ou, no caso da ação penal privada

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

subsidiária da pública, do dia em que se esgotou o prazo para o oferecimento da denúncia.


Como se trata de prazo penal, a contagem segue as regras do art. 10 do CP, incluindo-se o dia do
começo, excluindo-se o último dia, considerando o calendário comum. Assim, se, por exemplo, o ofendido
tomou ciência da autoria do fato no dia 3-3-2018, terá até o dia 2-9-2018 para oferecer a representação ou
ajuizar a queixa-crime. A partir do dia 3-9-2018 já incidirá a decadência e a causa de extinção da punibili-
dade.
9.3.4.2. Perempção
A perempção é uma causa de extinção da punibilidade que incide por conta da inércia processual
do querelante.
A perempção só é possível na ação penal exclusivamente privada, não sendo aplicável à ação
penal privada subsidiária da pública, já que, diante da negligência do querelante, o Ministério Público retoma
a ação penal (art. 29, parte final, do CPP).
As hipóteses de perempção estão elencadas no art. 60 do CPP. E, segundo se extrai desse dis-
positivo, a perempção somente é possível após o ajuizamento da ação penal privada.
9.3.5. Da renúncia ao direito de queixa ou perdão aceito nos crimes de ação penal privada
Renúncia ao direito de queixa
É a abdicação do ofendido ou de seu representante legal do direito de promover a ação penal
privada. Trata-se de ato unilateral pelo qual o ofendido delibera por não ajuizar a queixa-crime contra o
suposto ofensor.
Nos termos do art. 104, caput, do CP: “o direito de queixa não pode ser exercido quando renunci-
ado expressa ou tacitamente”.
A renúncia ao direito de queixa somente pode ser exercida na ação penal exclusivamente privada,
não sendo possível na ação penal privada subsidiária da pública, uma vez que, se o ofendido não oferecer
a queixa-crime, o Ministério Público poderá oferecer a denúncia enquanto não incidir causa de extinção da
punibilidade do agente, por exemplo, pela prescrição.
Perdão do ofendido
O perdão do ofendido ou do seu representante legal consiste na manifestação, expressa ou tácita,
de desistir do prosseguimento da ação penal privada. É a desistência manifestada após o oferecimento da
queixa, que obsta o prosseguimento da ação penal privada, conforme prevê o art. 105 do CP.
O perdão aceito do ofendido é causa extintiva de punibilidade que incide somente na ação penal
exclusivamente privada.
Tratando-se de ação penal privada subsidiária da pública (art. 100, § 3o, do CP), a desistência do

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Direito Penal

ofendido de prosseguir com o processo não determina a extinção da punibilidade, mesmo que o réu aceite
o perdão, pois se trata de ação penal pública, devendo o Ministério Público assumi-la como parte principal
(art. 29 do CPP).
Depois de iniciada a ação penal privada, o perdão do ofendido pode ser manifestado até o trânsito
em julgado da sentença penal condenatória (art. 106, § 2o, do CPP).
9.3.6. Da retratação do agente
A retratação significa desdizer-se, retirar o que foi dito, confessar que errou.
Em regra, a retratação do agente não tem relevância jurídica, funcionando somente como circuns-
tância judicial na aplicação da pena. Excepcionalmente, o estatuto penal empresta-lhe força extintiva da
punibilidade (art. 107, VI, do CP).
A retratação, como causa de extinção da punibilidade, somente incide nos casos expressamente
previstos em lei, por exemplo, nos crimes contra a honra, conforme prevê o art. 143 do CP.
Nos crimes contra a honra, a retratação só é cabível na calúnia e na difamação, sendo inadmissível
na injúria. Nos dois primeiros casos, importa à vítima que o ofensor se retrate negando que ela praticou o
fato imputado. Na injúria, porém, não há imputação de fato, mas atribuição ao ofendido de qualidade nega-
tiva, não importando a esta a retratação.
Também incide na hipótese prevista no art. 342, § 2o, do CP, que trata do crime de falso testemu-
nho ou falsa perícia, segundo o qual o fato deixa de ser punível, se, antes da sentença, o agente se retrata
ou declara a verdade. Essa retratação só é possível até a sentença final do procedimento em que foi prati-
cado o falso testemunho.
9.3.7. Perdão judicial
Perdão judicial é o instituto pelo qual o juiz, não obstante a incidência da infração penal praticada
por agente culpável, deixa de aplicar a pena nos casos expressamente previstos em lei.
O perdão judicial constitui causa extintiva da punibilidade de aplicação restrita. Significa que não
é aplicável a todas as infrações penais, mas somente àquelas especialmente indicadas pelo legislador.
A sentença que concede o perdão judicial é meramente declaratória da extinção da punibilidade,
não surtindo nenhum efeito penal ou extrapenal. É o que se extrai da Súm. no 18 do STJ, segundo a qual
“A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qual-
quer efeito condenatório”.
9.4. Prescrição
9.4.1. Introdução
Quando um indivíduo pratica, em tese, um fato típico e ilícito, surge para o Estado o poder e o

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

dever de buscar a punição do responsável. E essa punição é concretizada com a sentença penal condena-
tória transitada em julgado, com a imposição de uma pena, surgindo, a partir de então, a pretensão do
Estado de executar essa pena.
Todavia, a pretensão punitiva e executória do Estado é limitada, não perdurando, via de regra, por
tempo indeterminado. Com efeito, o direito de punir e de executar a pena imposta ao apenado encontra
limites temporais, que, se não observados, podem levar à extinção da punibilidade do agente pela incidência
de prescrição da pretensão punitiva ou prescrição da pretensão executória.
A prescrição penal, pois, é a perda da pretensão punitiva ou executória do Estado pelo decurso do
tempo sem o seu exercício.
9.4.2. Imprescritibilidade
Em regra, a prescrição alcança todas as infrações penais, inclusive os crimes hediondos e equi-
parados.
Todavia, nos termos da Constituição Federal, alguns crimes são imprescritíveis, viabilizando, as-
sim, o exercício da pretensão punitiva e executória a qualquer tempo.
São imprescritíveis os crimes de racismo (art. 5o, XLII, da CF/1988; Lei no 7.716/1989) e os refe-
rentes à ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático
(art. 5o, XLIV, da CF/1988). Os Tribunais Superiores passaram a considerar imprescritível também o crime
de injúria racial (art. 140, § 3o, do CP).
9.4.3. Prazos para o cálculo da prescrição (art. 109 do CP)
A prescrição é regulada pelos prazos previstos no art. 109 do CP. Ou seja, os prazos previstos
nesse artigo servem de parâmetro para o cálculo da prescrição da pretensão punitiva e executória:

I – em vinte anos, se o máximo da pena é superior a doze;


II – em dezesseis anos, se o máximo da pena é superior a oito anos e não excede a doze;
III – em doze anos, se o máximo da pena é superior a quatro anos e não excede a oito;
IV – em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro;
V – em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede
a dois;
VI – em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.

Convém destacar que as penas restritivas de direitos, que substituem a pena privativa de liberdade,
prescrevem no mesmo prazo das penas substituídas, nos termos do art. 109, par. ún., do CP.
Ex.: suponha-se que o agente tenha sido condenado a 1 (um) ano pela prática do crime de furto,
sendo a pena privativa de liberdade substituída por uma de prestação de serviços à comunidade. Essa pena
prescreverá em 4 (quatro) anos.

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

9.4.4. Redução dos prazos de prescrição em face da idade do sujeito (art. 115 do CP)
O art. 115 determina que SÃO REDUZIDOS DE METADE os prazos da prescrição quando o cri-
minoso era, AO TEMPO DO CRIME, MENOR DE 21 ANOS ou MAIOR DE 70 ANOS na DATA DA SEN-
TENÇA.
9.4.5. Prescrição da pretensão punitiva
9.4.5.1. Prescrição da pretensão punitiva em abstrato (art. 109, caput, do CP)
a) Contagem do prazo da prescrição da pretensão punitiva em abstrato
Na PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA, o decurso do tempo faz com que o Estado perca
o direito de punir no tocante à pretensão de o Poder Judiciário julgar a lide e aplicar a sanção penal.
A prescrição da pretensão punitiva ocorre antes de a sentença final transitar em julgado.
Para saber qual o prazo de prescrição da pretensão abstrata punitiva devemos verificar o limite
máximo da pena imposta em abstrato no preceito sancionador e enquadrá-lo em um dos incisos do art. 109
do CP.
Ex.: suponha-se que um sujeito cometa um crime de lesão corporal leve (pena de 3 meses a 1
ano), não se descobrindo a autoria. Se o Estado, dentro de 4 (quatro) anos, não exercer o direito de punir,
opera-se a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva. Aplica-se o disposto no art. 109.
No concurso de crimes (concurso material, formal e continuado), a prescrição atinge a pretensão
punitiva em relação a cada infração considerada isoladamente (art. 119 do CP).
b) Termos iniciais da prescrição da pretensão punitiva (art. 111 do CP)
O primeiro termo inicial é a data da consumação do delito (I). Constitui exceção à teoria da ativi-
dade, pois, na prescrição, adota-se a teoria do resultado.
No caso da tentativa (II), o termo a quo da prescrição da pretensão punitiva é o dia da cessação
da atividade criminosa.
No crime permanente (III), a prescrição começa a correr do dia em que cessou a permanência (art.
111, III, 1a figura, do CP). Ex.: suponha-se que a vítima de sequestro permaneça presa durante 30 dias. A
prescrição começa a correr a partir do dia em que conseguiu a liberdade.
No crime continuado, a prescrição deve ser considerada em relação a cada crime, isoladamente
(art. 119).
Nos crimes de bigamia e de falsificação ou alteração de assentamento de registro civil (arts. 235
e 299, par. ún.), a prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido de qualquer
autoridade pública (art. 111, IV).
Com o advento da Lei no 14.344, de 24-5-2022, o legislador alterou a redação do art. 111, V, do

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Direito Penal

CP. Agora, além de crimes contra a dignidade sexual contra crianças e adolescentes, o termo inicial do
prazo prescricional a partir do momento em que a vítima completar 18 anos também contempla qualquer
crime que envolva violência contra crianças e adolescentes. Eis a nova redação do inciso V do art. 111 do
CP: “V – nos crimes contra a dignidade sexual ou que envolvam violência contra a criança e adolescente,
previstos neste Código ou em legislação especial, da data em que a vítima completar 18 (dezoito) anos,
salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal”.
Nesse sentido, se uma criança de 10 anos for vítima de crime de estupro de vulnerável, por exem-
plo, ou qualquer outro crime praticado com violência, e a ação ainda não tiver sido instaurada, o prazo
prescricional passará a correr a partir da data em que ela completar 18 anos.
9.4.5.2. Prescrição da pretensão punitiva retroativa (art. 110, § 1o, parte final, do CP)
A prescrição retroativa tem por pressuposto o trânsito em julgado da sentença penal condenatória
para a acusação. Com o trânsito em julgado da sentença penal condenatória para a acusação, a base para
calcular a prescrição se altera, passando a ser considerada a pena aplicada na sentença. Nesse caso,
deve-se considerar a pena aplicada na sentença e enquadrá-la num dos incisos do art. 109 do CP para
verificar o prazo prescricional.
Verificado o prazo prescricional com base na pena aplicada na sentença, a prescrição retroativa
deve ser considerada a partir da publicação da sentença ou acórdão condenatório para trás. Por isso o
nome retroativa, porque sua incidência é verificada entre os marcos interruptivos existentes antes da sen-
tença condenatória.
Nos crimes em geral, a prescrição da pretensão retroativa pode ocorrer entre a publicação da
sentença ou acórdão condenatório e o recebimento da denúncia ou queixa.
No contexto dos crimes de competência do Tribunal do Júri, a prescrição retroativa pode incidir: a)
entre a data da publicação da sentença condenatória e decisão confirmatória da pronúncia; b) entre a de-
cisão confirmatória da pronúncia até a decisão de pronúncia; c) entre a pronúncia e o recebimento da de-
núncia.
9.4.5.3. Prescrição da pretensão punitiva intercorrente ou superveniente à sentença condenatória
(art. 110, § 1o, do CP)
Sendo espécie de prescrição da pretensão punitiva, a prescrição da pretensão punitiva intercor-
rente incide somente antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória para todos.
Como visto, nos termos do que dispõe o art. 109, caput, do CP, a prescrição da pretensão punitiva,
salvo a exceção do § 1o do art. 110, é regulada pelo máximo da sanção privativa de liberdade.
Há, porém, no art. 110, § 1o, uma primeira exceção: caso em que, não obstante SE TRATAR DE

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Direito Penal

PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA, TRANSITANDO EM JULGADO a sentença condenatória para


a ACUSAÇÃO, ou SENDO IMPROVIDO o seu recurso, a partir da sua publicação começa a correr o prazo
prescricional regulado pela PENA CONCRETA.
Ex.: suponha-se que o réu venha a ser condenado a 2 (dois) anos de detenção, tendo transitado
em julgado a sentença para a acusação. Sendo a pena aplicada de 2 (dois) anos, o prazo prescricional é
de 4 (quatro) anos (art. 109, V, do CP). O réu interpôs recurso de apelação, que, passados quatro anos,
ainda não havia sido julgado pelo Tribunal. No caso, passados quatro anos da data da publicação da sen-
tença sem que o recurso interposto pela defesa tenha sido apreciado, ocorrerá a prescrição da pretensão
punitiva superveniente ou intercorrente, prevista no art. 110, § 1o, do CP.
9.4.6. Prescrição da pretensão executória (art. 110, caput, do CP)
9.4.6.1. Conceito
Na prescrição da pretensão executória, o decurso do tempo sem o seu exercício faz com que o
Estado perca o direito de executar a sanção imposta na sentença condenatória.
A prescrição da pretensão executória incide após o trânsito em julgado da sentença condena-
tória.
Nos termos do caput do art. 110, a prescrição, depois de transitar em julgado a sentença conde-
natória, regula-se pela pena imposta na sentença e verifica-se nos prazos fixados no art. 109, os quais
aumentam de 1/3 se o condenado é reincidente.
Ex.: suponha-se que o agente tenha sido condenado irrecorrivelmente a 4 (quatro) anos de reclu-
são pela prática do delito de roubo simples (art. 157 do CP). O prazo prescricional, considerando a pena
aplicada, será de 8 (oito) anos (art. 109, IV, do CP). Nesse caso, se o Estado não iniciar a execução da
pena dentro de 8 (oito) anos, opera-se a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão executória.
Aplica-se o disposto no art. 110 do CP.
Ex.: réu condenado a 1 (um) ano de reclusão: prazo da prescrição executória: 4 (quatro) anos (art.
109, V).
Tratando-se de reincidente, o prazo da prescrição da pretensão executória da pena privativa
de liberdade é aumentado de 1/3 (art. 110, caput, in fine). Para tanto, é necessário que a sentença
condenatória tenha reconhecido a reincidência.
No concurso material e formal, cada delito tem seu prazo prescricional ISOLADO, ainda que as
penas tenham sido impostas na mesma sentença (art. 119 do CP).
9.4.6.2. Termos iniciais da prescrição da pretensão executória (art. 112 do CP)
a) do dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a acusação, ou a que

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Direito Penal

revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional


Cumpre observar: a prescrição da pretensão executória depende de uma condição: O TRÂNSITO
EM JULGADO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA PARA A ACUSAÇÃO E DEFESA. Satisfeita a condição,
entretanto, na contagem do prazo, leva-se em conta a data em que transitou em julgado para a acu-
sação.
b) do dia em que se interrompe a execução, salvo quando o tempo da interrupção deva
computar-se na pena
INTERROMPIDA A EXECUÇÃO DA PENA PELA FUGA DO CONDENADO, inicia-se a contagem
do prazo prescricional da prescrição executória (art. 112, II, 1a parte, do CP).
Nos casos dos arts. 41 e 42 do CP (superveniência de doença mental ou internação em hospital),
em que se aplica o princípio da detração penal, embora interrompida a efetiva execução da pena, não corre
a prescrição (art. 112, II, 2a parte).
9.4.6.3. Prescrição no caso de evasão do condenado ou de revogação do livramento condicional
(art. 113 do CP)
Ex.: suponha-se que o detento fuja faltando 2 (dois) anos para o cumprimento da pena. A partir da
data da fuga começa a correr a prescrição da pretensão executória (art. 112, II, 1a parte), ocorrendo em 4
(quatro) anos (art. 109, V, do CP). Ou seja, se nesse período de quatro anos o apenado não for localizado
para dar continuidade ao cumprimento da pena, ocorrerá a prescrição da pretensão executória.
9.4.7. Causas suspensivas da prescrição
O Código Penal prevê causas impeditivas ou suspensivas da prescrição (art. 116), distintas das
causas interruptivas (art. 117). Na suspensão da prescrição, o tempo decorrido antes da causa é computado
no prazo; na interrupção, o tempo decorrido antes da causa não é computado no prazo, que recomeça a
correr por inteiro.
9.4.7.1. Causas suspensivas da prescrição punitiva
a) Enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que dependa o reconhecimento
da existência do crime
Nos termos do art. 116, I, do CP, a prescrição não corre enquanto não resolvida, EM OUTRO
PROCESSO, questão de que depende o reconhecimento da existência do crime (questão prejudicial, tra-
tada nos arts. 92 a 94 do CPP).
b) Enquanto o agente cumpre pena no exterior
A SEGUNDA CAUSA suspensiva é prevista no art. 116, II, do CP: antes de passar em julgado a
sentença final, a prescrição não corre enquanto o agente cumprir pena no estrangeiro. Não impede o

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

decurso do prazo prescricional, entretanto, estar o sujeito cumprindo pena, em razão de outro processo, no
Brasil.
c) Na pendência de embargos de declaração ou de recursos aos Tribunais Superiores,
quando inadmissíveis
A Lei no 13.964/2019 introduziu mais uma causa suspensiva da prescrição, visando a dificultar a
incidência da prescrição da pretensão punitiva na pendência de recursos interpostos perante os Tribunais
Superiores.
Assim, enquanto tramitam os embargos de declaração ou recursos aos Tribunais Superiores, o
prazo prescricional ficará suspenso, aguardando julgamento inadmissível, sendo considerado o período de
suspensão do prazo prescricional, se inadmissíveis os recursos.
d) Enquanto não cumprido ou não rescindido o acordo de não persecução penal
Trata-se de outra causa suspensiva da prescrição introduzida pela Lei no 13.964/2019.
Durante o período relativo ao acordo de não persecução penal, o prazo prescricional ficará sus-
penso.
9.4.7.2. Causas suspensivas da prescrição da pretensão executória (art. 116, par. ún., do CP)
Depois de passada em julgado a sentença condenatória, a prescrição não corre durante o tempo
em que o condenado está preso por outro motivo.
Ex.: suponha-se que o sujeito seja condenado em duas comarcas, iniciando o cumprimento da
pena imposta na ação penal de uma delas. Enquanto está cumprindo a pena, não corre a prescrição da
pretensão executória em relação à outra condenação.
9.4.8. Causas interruptivas da prescrição (art. 117 do CP)
Ocorrendo uma causa interruptiva, o curso da prescrição interrompe-se, desaparecendo o lapso
temporal já decorrido, recomeçando sua contagem desde o início.
A incidência das causas do art. 117, salvo a do inciso V, faz com que seja extinto o prazo decorrido
antes da interrupção, recomeçando a correr a prescrição por inteiro (§ 2o).
9.4.8.1. Pelo recebimento da denúncia ou da queixa
O recebimento da denúncia interrompe o prazo prescricional, recomeçando a correr a prescrição
da pretensão punitiva por inteiro, não se levando em conta o tempo já decorrido antes da interrupção.
9.4.8.2. Pela pronúncia
A pronúncia também interrompe a prescrição (art. 117, II). A decisão do juiz tem força de interrom-
per a prescrição, ainda que o réu venha a ser absolvido no Júri.

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

9.4.8.3. Pela decisão confirmatória da pronúncia


Se o RÉU RECORRE DA PRONÚNCIA e o Tribunal confirma, o Acórdão também interrompe a
prescrição (art. 117, III, do CP), o mesmo ocorrendo quando é impronunciado (art. 409, caput, do CPP) ou
absolvido sumariamente (art. 411 do CPP) e o tribunal o pronuncia.
9.4.8.4. Pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis
O art. 117, IV, do CP determina que a prescrição se interrompe pela sentença condenatória recor-
rível. A interrupção ocorre na data da publicação da sentença, i.e., no dia em que o escrivão recebe a
sentença do juiz e a junta aos autos, independentemente do registro e de outras diligências.
O acórdão condenatório, ainda que não unânime, e por isso sujeito a embargos infringentes, tam-
bém interrompe o prazo prescricional da pretensão punitiva. Isso ocorre quando, tendo sido absolvido em
primeiro grau, o réu vem a ser condenado pelo acórdão do tribunal. Trata-se de acórdão recorrível.
9.4.8.5. Pelo início ou continuação do cumprimento da pena
Iniciando-se o prazo da prescrição da pretensão executória com o trânsito em julgado da sentença
condenatória, interrompe-se pelo começo do cumprimento da pena. Fugindo o condenado, a prescrição
começa a correr da data da fuga (art. 112, II, 1a parte), regulando-se pelo tempo que resta da pena (art.
113). Recapturado, interrompe-se a prescrição.
9.4.8.6. Pela reincidência
A REINCIDÊNCIA SOMENTE INTERROMPE O PRAZO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO
EXECUTÓRIA, SENDO INAPLICÁVEL À PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA (art. 109). Nesse
sentido, a Súm. no 220 do STJ: “A reincidência não influi no prazo da prescrição da pretensão punitiva”.

CRIMES EM ESPÉCIE

10. Crimes contra a vida

10.1. Homicídio
O homicídio consiste na eliminação da vida humana extrauterina provocada por outra pessoa. A
eliminação da vida intrauterina (feto) caracteriza o delito de aborto.
10.1.1. Homicídio privilegiado (art. 121, § 1o, do CP)
O art. 121, § 1o, do CP descreve o homicídio privilegiado como o fato de o sujeito cometer o delito
impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

seguida a injusta provocação da vítima. Neste caso, o juiz pode reduzir a pena de 1/6 a 1/3.
Motivo de relevante valor social: ocorre quando a causa do delito diz respeito a um interesse
coletivo. A conduta, então, é ditada em face de um interesse que diz respeito a todos os cidadãos de uma
coletividade. Ex.: pai desesperado pelo vício que impregna seu filho e vários outros alunos, mata um trafi-
cante que distribui drogas num colégio, sem qualquer ação eficaz da polícia para contê-lo.
Motivo de relevante valor moral: diz respeito a um interesse particular, de ordem pessoal. Será
motivo de relevante valor moral aquele que, em si mesmo, é aprovado pela ordem moral, pela moral prática,
por exemplo, a compaixão ou piedade diante do irremediável sofrimento da vítima.
Sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima: o texto
legal exige, ainda, que o impulso emocional e o ato dele resultante se sigam imediatamente à provocação
da vítima, ou seja, tem de haver a imediatidade entre a provocação injusta e a conduta do sujeito.
10.1.2. Homicídio qualificado (art. 121, § 2o, do CP)
O art. 121, § 2o, do CP prevê circunstâncias que qualificam o crime de homicídio, quando é come-
tido: a) mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe; b) motivo fútil; c) com em-
prego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar
perigo comum; d) à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou
torne impossível a defesa do ofendido; e) para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vanta-
gem de outro crime; f) feminicídio; g) contra agente de segurança pública; h) com emprego de arma de fogo
de uso restrito ou proibido.
Merece especial destaque a qualificadora do feminicídio. Não basta a vítima ser mulher para incidir
a qualificadora do feminicídio, é preciso que o crime tenha sido praticado no contexto de violência doméstica
e familiar ou por menosprezo ou discriminação à condição de mulher. Assim, se, por exemplo, o agente
matar uma mulher apenas porque é torcedora do Sport Clube Internacional, não incide a qualificadora do
feminicídio, já que o crime não foi praticado em razão de a vítima ser do sexo feminino, podendo incidir
outra qualificadora, como a do motivo fútil. Trata-se, nesse caso, de femicídio e não de feminicídio.
Também merece destaque a qualificadora do homicídio funcional (art. 121, § 2o, VII, do CP). A
qualificadora alcança integrantes dos órgãos de segurança pública, bem como seus parentes consanguí-
neos até terceiro grau, desde que o homicídio tenha sido praticado no exercício da função ou em decorrên-
cia dela. Ou seja, para incidir a qualificadora, o homicídio deve estar necessariamente vinculado à função
desempenhada pelo agente de segurança pública.
A Lei no 14.344/2022 introduziu mais uma qualificadora ao crime de homicídio, quando se tratar de
vítima menor de 14 anos de idade (art. 121, § 2o, IX). Com isso, encontra-se tacitamente revogada a

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

segunda parte do art. 121, § 4o, do CP, no que se refere à majorante em face de a vítima ser menor de 14
anos de idade. Além disso, passou a prever novas causas de aumento de pena. Nos termos do art. 121,
§ 2o-B, do CP, a pena do homicídio contra menor de 14 anos é aumentada de: “I – 1/3 (um terço) até a
metade se a vítima é pessoa com deficiência ou com doença que implique o aumento de sua vulnerabili-
dade; II – 2/3 (dois terços) se o autor é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro,
tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tiver autoridade sobre ela”.
10.1.3. Homicídio privilegiado-qualificado
Perfeitamente possível a coexistência do homicídio privilegiado e as qualificadoras de natureza
objetiva, já que relacionadas ao fato praticado, por exemplo, o meio e o modo de execução.
As qualificadoras relacionadas ao motivo torpe (inciso I) ou fútil (inciso II), bem como à conexão
com outro crime (inciso V) ou ao fato de a vítima integrar órgão de segurança pública (VII), são consideradas
de natureza subjetiva. Isso porque não estão vinculadas diretamente ao fato praticado, mas a condições ou
características subjetivas ou pessoais, como a motivação, ou em relação à pessoa da vítima. Até mesmo o
crime de homicídio por conexão é de natureza subjetiva, pois guarda relação com o motivo do crime, ou
seja, o agente desenvolve a conduta homicida para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou
vantagem de outro crime.
As qualificadoras relacionadas aos meios (inciso III) ou modos (IV) de execução, bem como a do
feminicídio (VII), são consideradas de natureza objetiva. As duas primeiras, porque relacionadas direta-
mente ao fato praticado, não havendo qualquer vinculação com características ou condições pessoais da
vítima.
10.1.4. Homicídio culposo (art. 121, § 3o, do CP)
É um tipo penal aberto, que depende, pois, da interpretação do juiz para poder ser aplicado. A
culpa, conforme o art. 18, II, do CP, é constituída de “imprudência, negligência ou imperícia”. Portanto,
matar alguém por imprudência, negligência ou imperícia concretiza o tipo penal incriminador do homicídio
culposo. Ex.: ao manejar arma carregada para limpá-la, o agente aciona, imprudentemente, o gatilho e mata
uma pessoa que está ao seu lado.
10.1.5. Perdão judicial (art. 121, § 5o, do CP)
É a clemência do Estado, que deixa de aplicar a pena prevista para determinados delitos, em
hipóteses expressamente previstas em lei.
Somente ao autor do homicídio culposo pode-se aplicar a clemência, desde que ele tenha sofrido
com o crime praticado uma consequência tão séria e grave que a sanção penal se torne desnecessária.
Ex.: o pai que provoca a morte do próprio filho, num acidente fruto de sua imprudência, já teve

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

punição mais do que severa. A dor por ele experimentada é mais forte do que qualquer pena que se lhe
pudesse aplicar. Por isso, surge a hipótese do perdão. O crime existiu, mas a punibilidade é afastada.
10.2. Induzimento, instigação ou auxílio a suicídio ou a automutilação
10.2.1. Conceito de suicídio e automutilação
O suicídio decorre da conduta voluntária e consciente da própria vítima, que, por ato positivo ou
negativo, busca eliminar a sua vida. É o chamado autocídio ou autoquíria.
A automutilação decorre da conduta voluntária e consciente da própria vítima, que, por ato positivo
ou negativo, busca provocar lesão em si própria. Nesse caso, a vítima não tem a intenção de eliminar a sua
própria vida, mas de provocar autolesão, por exemplo, produzir cortes na pele, amputar alguma parte do
corpo, bater com a cabeça na parede, utilizar fogo para queimar parte da pele.
Portanto, o crime consiste no fato de o agente induzir, instigar ou prestar auxílio a suicídio ou
automutilação. Em outras palavras, constitui crime a conduta voltada a fazer com que a vítima pratique atos
executórios para eliminar sua própria vida ou provocar lesões em si mesma. Trata-se, em síntese, do crime
de participação em suicídio ou automutilação.
10.2.2. Consumação
Com as alterações introduzidas pela Lei no 13.968/2019, o delito de participação em suicídio ou
automutilação passou a ser crime formal, não mais exigindo para a sua consumação a produção do resul-
tado naturalístico morte ou lesão corporal de natureza grave.
Agora, para a consumação do delito, basta a conduta de induzir, instigar ou prestar auxílio ao
suicídio ou à automutilação, ainda que resulte lesão corporal de natureza leve ou não resulte qualquer lesão.
Nesse caso, o agente responderá pelo crime de participação em suicídio ou automutilação na sua modali-
dade simples, nos termos do art. 122, caput, do CP.
A participação em suicídio ou automutilação com resultado lesão grave ou gravíssima, bem como
com resultado morte configuram o crime na modalidade qualificada (art. 122, §§ 1o e 2o, do CP).
10.2.3. Figuras qualificadoras
A Lei no 13.968/2019 introduziu no ordenamento jurídico duas qualificadoras do crime de partici-
pação em suicídio ou automutilação: a) se resultar lesão corporal de natureza grave ou gravíssima; b) se
resultar morte.
Nos termos do art. 122, § 1o, do CP, se da automutilação ou da tentativa de suicídio resulta lesão
corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena será de 1 (um) a 3 (três) anos.
Se da indução, instigação ou auxílio ao suicídio ou automutilação resultar qualquer um dos resul-
tados previstos no art. 129, §§ 1o e 2o, do CP, incidirá a qualificadora do crime de participação em suicídio

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ou automutilação (art. 122, § 1o, do CP); ausente qualquer circunstância que qualifica a lesão corporal, o
crime será de participação em suicídio ou automutilação, na sua modalidade simples (art. 122, caput).
Nos termos do art. 122, § 2o, do CP, se o suicídio se consuma ou se da automutilação resulta
morte, a pena será de 2 (dois) a 6 (seis) anos.
Se o agente, de forma dolosa, induzir, instigar ou auxiliar a vítima a eliminar a sua própria vida, o
que efetivamente vem a ocorrer, responderá pelo crime de participação em suicídio na sua forma qualifi-
cada.
O crime de participação em automutilação com resultado morte necessariamente é preterdoloso.
Isso porque estará presente o dolo na conduta de induzir, instigar ou auxiliar a automutilação, ao passo que
o resultado morte decorre de culpa. Se o agente desejasse ou assumisse o risco em relação ao resultado
morte, o crime seria de participação em suicídio e não em automutilação.
10.2.4. Causas de aumento de pena
O art. 122, §§§ 3o, 4o e 5o, do CP prevê circunstâncias que elevam a pena do crime de participação
em suicídio. A pena será duplicada se o crime é praticado por motivo egoístico, torpe ou fútil, ou se a vítima
é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência (art. 122, § 3o, I e II). A pena é
aumentada até o dobro se a conduta é realizada por meio da rede de computadores, de rede social ou
transmitida em tempo real (art. 122, § 4o). Aumenta-se a pena em metade se o agente é líder ou coordena-
dor de grupo ou de rede virtual (art. 122, § 5o).
10.2.5. Vítima menor de 14 anos ou contra quem não tem discernimento para a prática do ato
Nos termos do art. 122, § 6o, do CP: “Se o crime de que trata o § 1o deste artigo resulta em lesão
corporal de natureza gravíssima e é cometido contra menor de 14 (quatorze) anos ou contra quem, por
enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por
qualquer outra causa, não pode oferecer resistência, responde o agente pelo crime descrito no § 2o do art.
129 deste Código”.
Logo, se a vítima for menor de 14 anos de idade, e se resultar lesão corporal gravíssima, o agente
responderá pelo crime descrito no art. 129, § 2o, do CP (art. 122, § 6o, in fine, do CP).
Também responderá pelo crime de lesão corporal gravíssima se a vítima for acometida de enfer-
midade ou deficiência mental, e, por essa razão, não tem o necessário discernimento para a prática do ato.
Não basta, pois, que a vítima seja portadora de enfermidade ou deficiência mental, sendo necessário que,
em razão disso, não tenha qualquer discernimento para o ato.
Se a enfermidade ou deficiência mental não tem a potencialidade de retirar a plena capacidade de
discernimento da vítima, o agente responderá pelo crime de participação em automutilação, se resultar

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lesão grave ou gravíssima, nos termos do art. 122, § 1o, do CP.


O art. 122, § 6o, faz expressa remissão somente ao art. 129, § 2o, do CP. Nesse contexto, se da
tentativa de suicídio ou da automutilação resultar lesão corporal grave em vítima menor de 14 anos de
idade, portadora de enfermidade ou deficiência mental sem o necessário discernimento ou sem qualquer
capacidade de resistência, forçoso concluir que o agente responderá pelo crime de induzimento, instigação
ou auxílio ao suicídio ou automutilação qualificado, com a pena aumentada em dobro (art. 122, §§ 1o e 3o,
II, do CP).
Conforme o art. 122, § 7o, do CP, se o suicídio se consuma ou se da automutilação resulta morte,
e o crime tiver sido praticado contra vítima menor de 14 anos ou contra quem não tem o necessário discer-
nimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência, responde
o agente pelo crime de homicídio, nos termos do art. 121 do CP.
10.3. Infanticídio (art. 123 do CP)
10.3.1. Conceito
Trata-se de homicídio cometido pela mãe contra seu filho, nascente ou recém-nascido, sob a in-
fluência do estado puerperal.
Estado puerperal é o estado que envolve a mulher durante o parto. Há profundas alterações psí-
quicas e físicas, que chegam a transtornar a mãe, deixando-a sem plenas condições de entender o que
está fazendo.
10.3.2. Sujeitos do delito
A autora do infanticídio só pode ser a mãe. Cuida-se de crime próprio, uma vez que não pode ser
cometido por qualquer autor.
O tipo penal exige qualidade especial do sujeito ativo. Entretanto, isso não impede que terceiro
responda por infanticídio diante do concurso de agentes.
Sujeito passivo é o neonato ou nascente, de acordo com a ocasião da prática do fato: durante o
parto ou logo após.
Antes do parto, o sujeito passivo será o feto, caracterizando, portanto, o delito de aborto.
Segundo boa parte da doutrina, estando a mulher sob influência do estado puerperal, responde
ela por infanticídio, delito que também será atribuído aos eventuais concorrentes do fato, uma vez que se
trata de circunstância de caráter pessoal que constitui elementar do crime. Logo, comunica-se aos coauto-
res ou partícipes, nos termos do art. 30 do CP.

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10.4. Aborto (arts. 124 a 128 do CP)


10.4.1. Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento (art. 124)
Trata-se de crime de mão própria, pois somente a gestante pode realizá-lo; contudo, isso não
afasta a possibilidade de participação no crime em questão.
Na primeira figura, é a própria mulher quem executa a ação material do crime, ou seja, ela própria
emprega os meios ou manobras abortivas em si mesma. Se um terceiro executar ato de provocação do
aborto, não será partícipe do crime do art. 124 do CP, mas, sim, autor do fato descrito no art. 126 (provo-
cação do aborto com consentimento da gestante).
Na segunda figura, a mulher apenas consente na prática abortiva, mas a execução material do
crime é realizada por terceira pessoa. Em tese, a gestante e o terceiro deveriam responder pelo delito do
art. 124. Contudo, o Código Penal prevê uma modalidade especial de crime para aquele que provoca o
aborto com o consentimento da gestante (art. 126).
10.4.2. Aborto provocado por terceiro sem o consentimento da gestante (art. 125 do CP)
Trata-se de forma mais gravosa do delito de aborto.
Ao contrário da figura típica do art. 126, não há o consentimento da gestante no emprego dos
meios ou manobras abortivas por terceiro. Aliás, a ausência de consentimento constitui elementar do tipo
penal.
As formas de dissentimento estão retratadas no parágrafo único do art. 126:
a) dissentimento presumido: é necessário que a gestante tenha capacidade para consentir, não se
tratando de capacidade civil. Para o Código Penal, quando a vítima não é maior de 14 anos ou é alienada
mental, não possui consentimento válido, levando à consideração de que o aborto se deu contra a sua
vontade;
b) dissentimento real: quando o agente emprega violência, grave ameaça ou mesmo fraude, é
natural supor que extraiu o consentimento da vítima à força, de modo que o aborto necessita se encaixar
na figura do art. 125.
10.4.3. Aborto consensual (art. 126)
Para que se caracterize a figura do aborto consentido (art. 126), é necessário que o consentimento
da gestante seja válido, isto é, que ela tenha capacidade para consentir. Ausente essa capacidade, o delito
poderá ser outro (art. 125).
Trata-se de uma exceção à teoria monista. O legislador, para punir mais severamente o terceiro
que provoca o aborto, criou o art. 126, aplicando a teoria pluralista do concurso de pessoas.

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10.4.4. Aborto legal (art. 128)


a) Aborto necessário ou terapêutico
É a interrupção da gravidez realizada pelo médico quando a gestante estiver correndo perigo de
vida e inexistir outro meio para salvá-lo.
A excludente da ilicitude em estudo do crime de aborto somente abrange a conduta do médico.
Não obstante isso, a enfermeira, ou parteira, não responderá pelo delito em questão se praticar o aborto
por força do art. 24 do CP (estado de necessidade, no caso, de terceiro).
b) Aborto humanitário, sentimental ou piedoso
O aborto humanitário, também denominado ético ou sentimental, é autorizado quando a gravidez
é consequência do crime de estupro e a gestante consente na sua realização. A lei não exige autorização
judicial, processo judicial ou sentença condenatória contra o autor do crime de estupro para a prática do
aborto sentimental. Basta prova idônea do atentado sexual.

11. Lesão Corporal (art. 129 do CP)

11.1. Lesão corporal leve ou simples (art. 129, caput)


A definição de lesão corporal leve é formulada por exclusão, ou seja, configura-se quando não
ocorre nenhum dos resultados previstos nos §§ 1o, 2o e 3o do art. 129.
11.2. Lesão corporal grave (art. 129, § 1o)
A lesão corporal de natureza grave (ou mesmo a gravíssima) é uma ofensa à integridade física ou
à saúde da pessoa humana, considerada muito mais séria e importante do que a lesão simples ou leve.
a) Incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias
Deve-se compreender como tal toda e qualquer atividade regularmente desempenhada pela ví-
tima, e não apenas a sua ocupação laborativa, enquadrando-se, inclusive, as atividades de lazer.
b) Perigo de vida
É a concreta possibilidade de a vítima morrer em face das lesões sofridas.
A doutrina e a jurisprudência majoritária consideram que, neste caso, somente pode haver dolo na
conduta antecedente (lesão corporal) e culpa no tocante ao resultado mais grave (perigo de vida), pois,
havendo dolo em ambas as fases, haverá tentativa de homicídio.
Portanto, o tipo só admite o preterdolo, uma vez que, se houver dolo quanto ao perigo de vida, o
agente responderá por tentativa de homicídio.

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c) Debilidade permanente de membro, sentido ou função


Não se exige que seja uma debilidade perpétua, bastando que tenha longa duração.
Ex.: perda de um dos dedos (membro); perda da visão de um dos olhos (sentido); perda de um
dos rins é debilidade permanente e não perda de função, pois se trata de órgão duplo.
d) Aceleração de parto
Significa antecipar o nascimento da criança antes do prazo normal previsto pela medicina. Nesse
caso, é indispensável o conhecimento da gravidez pelo agente.
Se, em virtude da lesão corporal praticada contra a mãe, a criança nascer morta, terá havido lesão
corporal gravíssima (art. 129, § 2o, V, do CP).
11.3. Lesão corporal gravíssima (art. 129, § 2o)
Todas as circunstâncias qualificadoras elencadas neste parágrafo são tanto dolosas quanto pre-
terdolosas, com exceção da circunstância contida no inciso V (aborto), que é necessariamente preterdolosa.
a) Incapacidade permanente para o trabalho
Trata-se de inaptidão duradoura para exercer qualquer atividade laborativa lícita. A permanência
não significa perpetuidade.
Nesse contexto, diferentemente da incapacidade para as ocupações habituais, exige-se atividade
remunerada, que implique sustento, portanto, acarrete prejuízo financeiro para o ofendido.
b) Enfermidade incurável
É a doença irremediável, de acordo com os recursos da medicina na época do resultado, causada
na vítima.
c) Perda ou inutilização do membro, sentido ou função
Perda implica destruição ou privação de algum membro (ex.: corte de um braço), sentido (ex.:
aniquilamento dos olhos) ou função (ex.: ablação da bolsa escrotal, impedindo a função reprodutora).
No tocante a órgãos duplos, ter-se-á a perda quando houver a supressão de ambos, por exemplo,
cegueira ou surdez total. Nessa hipótese, há a perda total da visão ou audição. Quando se der a supressão
de apenas um órgão, estaremos diante da hipótese de debilidade (art. 129, § 1o, III, do CP), pois a função
não foi totalmente abolida, por exemplo, surdez em apenas um dos ouvidos.
d) Deformidade permanente
Deformidade é o dano estético de certa monta. Permanente é a deformidade indelével, irreparável.
Entende-se por irreparável a deformidade que não é passível de ser corrigida pelo transcurso do tempo.
Ex.: perda de orelhas, mutilação grave do nariz, entre outros.

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e) Aborto
Nesta hipótese, o agente, ao lesionar a vítima, não quer nem mesmo assumir o risco do advento
do resultado agravador aborto.
Portanto, para que possa se caracterizar a qualificadora da lesão corporal gravíssima, não pode
ter sido objeto de dolo do agente, pois, nesse caso, terá de responder pelos dois crimes, lesão corporal e
aborto, em concurso formal impróprio, ou, ainda, por aborto qualificado, se a lesão em si mesma for grave.
11.4. Lesão corporal seguida de morte (art. 129, § 3o)
O evento morte não deve ser desejado, nem ter o agente assumido o risco de causá-lo, sob pena
de responder pelo crime de homicídio. Em outras palavras, trata-se de típico crime preterdoloso, em que o
agente desenvolve conduta com dolo em relação a determinado resultado, mas, por culpa, acaba produ-
zindo resultado mais grave.
No caso, o agente age com dolo em relação à lesão corporal, mas acaba produzindo, involuntari-
amente, a morte da vítima.
A tentativa é inadmissível, pois o crime preterdoloso envolve a forma culposa e esta é totalmente
incompatível com a figura da tentativa.
11.5. Violência doméstica (art. 129, § 9o)
Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com
quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabi-
tação ou de hospitalidade, a pena será de 3 (três) meses a 3 (três) anos.
Diversamente do que possa parecer, a qualificadora prevista no art. 129, § 9o, do CP não se limita
a alcançar apenas vítima mulher, incidindo ainda que a vítima seja homem, por exemplo, a agressão prati-
cada pelo agente contra o irmão.
O art. 129, § 9o, do CP incide se a lesão corporal for de natureza leve. Se for grave, gravíssima ou
seguida de morte, incidirá, ainda, causa de aumento de pena em 1/3, nos termos do art. 129, § 10.
11.6. Lesão corporal contra a agente de segurança pública (art. 129, § 12, do
CP)
Se a lesão for praticada contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da CF/1988, in-
tegrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em
decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão
dessa condição, a pena é aumentada de um a dois terços.
Trata-se de crime hediondo, conforme se extrai do art. 1o, I-A, da Lei no 8.072/1990.

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11.7. Lesão corporal no contexto de violência doméstica e familiar contra a


mulher (art. 129, § 13, do CP)
Se a lesão for praticada contra a mulher, por razões da condição do sexo feminino, nos termos do
§ 2o-A do art. 121 do CP, a pena será de 1 (um) a 4 (quatro) anos.

12. Crimes contra a honra

12.1. Calúnia (art. 138 do CP)


Calúnia é o fato de atribuir a outrem, falsamente, a prática de fato definido como crime. O Código
Penal tutela a honra objetiva (reputação).
A lei exige, expressamente, que o fato atribuído seja definido como crime. O fato criminoso deve
ser determinado, ou seja, um caso concreto. É fundamental, para a existência de calúnia, que a imputação
de fato definido como crime seja falsa. Se o fato for verdadeiro, não há que se falar em crime de calúnia.
O momento consumativo da calúnia ocorre no instante em que a imputação chega ao conheci-
mento de um terceiro que não a vítima.
A calúnia verbal não admite a figura da tentativa. Ou o sujeito diz a imputação, e o fato está con-
sumado, ou não diz, e não há conduta relevante para o Direito Penal.
Já a calúnia escrita admite a tentativa. Ex.: o sujeito remete uma carta caluniosa e ela se extravia.
O crime não atinge a consumação, por intermédio do conhecimento do destinatário, por circunstâncias
alheias à vontade do sujeito.
12.2. Difamação (art. 139 do CP)
Difamar significa desacreditar publicamente uma pessoa, ofendendo sua reputação.
O legislador protege a honra objetiva (reputação). A exemplo do crime de calúnia, o bem jurídico
protegido é a honra, isto é, a reputação do indivíduo, a sua boa fama, o conceito que a sociedade lhe atribui.
Dizer que uma pessoa é caloteira configura uma injúria, ao passo que espalhar o fato de que ela
não pagou aos credores “A”, “B” e “C”, quando as dívidas X, Y e Z venceram, configura a difamação.
Considerando que não se enquadra no tipo penal que define a calúnia, já que exige imputação
falsa de fato definido como crime, se o agente imputar falsamente fato definido como contravenção, res-
ponderá pelo crime de difamação.
A difamação atinge o momento consumativo quando um terceiro, que não o ofendido, toma conhe-
cimento da imputação ofensiva à reputação.

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Quanto à tentativa, é inadmissível, quando se trata de fato cometido por intermédio da palavra oral.
Tratando-se, entretanto, de difamação praticada por meio escrito, é admissível.
12.3. Injúria (art. 140 do CP)
Injúria é a ofensa à dignidade ou ao decoro de outrem.
Ao contrário dos delitos de calúnia e difamação, que tutelam a honra objetiva, o bem protegido por
essa norma penal é a honra subjetiva, que é constituída pelo sentimento próprio de cada pessoa acerca de
seus atributos morais (chamados de honra-dignidade), intelectuais e físicos (chamados de honra-decoro).
Trata-se de crime formal. O crime consuma-se quando o sujeito passivo toma ciência da imputação
ofensiva, independentemente de o ofendido sentir-se ou não atingido em sua honra subjetiva, sendo sufici-
ente, tão só, que o ato seja revestido de idoneidade ofensiva.
A injúria, quando cometida por escrito, admite a tentativa; quando por meio verbal, não.
Quando o agente se dirige a uma pessoa de determinada raça, insultando-a com argumentos ou
palavras de conteúdo pejorativo, responderá por injúria racial, não podendo alegar que houve uma injúria
simples, tampouco uma mera exposição do pensamento (como dizer que todo “judeu é corrupto” ou que
“negros são desonestos”), uma vez que não há limite para tal liberdade.
Assim, quem simplesmente dirigir a terceiro palavras referentes à “raça”, “cor”, “etnia”, “religião” ou
“origem”, com o intuito de ofender, responderá por injúria racial.
12.4. Ação penal
Conforme se extrai do art. 145 do CP, nos crimes contra a honra, a regra é a de ação penal privada
da vítima ou do seu representante legal. Todavia, resultando lesão física na vítima (injúria real com lesão
corporal), apura-se o crime mediante ação penal pública incondicionada. No entanto, com o advento da Lei
no 9.099/1995, alguns autores entendem que se trata de ação penal pública condicionada à representação,
já que é a prevista para os crimes de lesão corporal leve.
Será penal pública condicionada à representação no caso de o delito ser cometido contra funcio-
nário público, no exercício das funções (art. 141, II), e condicionada à requisição do Ministro da Justiça no
caso do inciso I do art. 141 (contra o Presidente da República ou Chefe de Governo Estrangeiro).
Convém ressaltar a Súm. no 714 do STF:

É concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do Ministério Público, con-


dicionada à representação do ofendido, para a ação penal por crime contra a honra de
servidor público em razão do exercício de suas funções.

Além das causas de aumento de pena já previstas no art. 141 do CP, o legislador acrescentou, por
meio da Lei no 14.344/2022, mais uma majorante, aumentando-se de um terço, se qualquer dos crimes

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Direito Penal

contra a honra forem praticados contra criança, adolescente, pessoa maior de 60 anos ou pessoa com
deficiência (inciso IV), exceto na hipótese prevista no § 3o do art. 140 deste Código.

13. Crimes Contra o Patrimônio

13.1. Furto (art. 155 do CP)


13.1.1. Conceito
O crime de furto consubstancia-se no verbo subtrair, que significa tirar, retirar de outrem bem mó-
vel, sem a sua permissão, com o fim de assenhoramento definitivo. A subtração implica sempre a retirada
do bem sem o consentimento do possuidor ou proprietário.
É indispensável que o agente tenha a intenção de possuir a coisa alheia móvel, submetendo-a ao
seu poder, isto é, de não devolver o bem, de forma alguma. Assim, se ele o subtrai apenas para uso tran-
sitório e depois o devolve no mesmo estado, não haverá a configuração do tipo penal. Cuida-se, na hipó-
tese, de mero furto de uso, que não constitui crime, pela ausência do ânimo de assenhoramento definitivo
do bem.
13.1.2. Consumação e tentativa
O furto atinge a consumação no momento em que o objeto material é retirado da esfera de posse
e disponibilidade do sujeito passivo, ingressando na livre disponibilidade do autor, ainda que este não ob-
tenha a posse tranquila. A subtração opera-se no exato instante em que o possuidor perde o poder e o
controle sobre a coisa, tendo de retomá-la porque já não está mais consigo.
Pode-se usar, por analogia, o teor da Súm. no 582 do STJ, relativa ao roubo: consuma-se o crime
de roubo com a inversão da posse do bem mediante emprego de violência ou grave ameaça, ainda que por
breve tempo e em seguida à perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo pres-
cindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada.
A tentativa é admissível. Ocorre sempre que o sujeito ativo não consegue, por circunstâncias
alheias à sua vontade, retirar o objeto material da esfera de proteção e vigilância da vítima, submetendo-a
à sua própria disponibilidade.
13.1.3. Furto noturno (art. 155, § 1o, do CP)
A causa de aumento de pena do repouso noturno só é aplicável ao furto simples, previsto no caput
do art. 155, tendo em vista a sua posição sistemática na construção do tipo penal. Não se aplica, portanto,
ao furto qualificado do § 4o.

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13.1.4. Furto privilegiado (art. 155, § 2o, do CP)


A corrente majoritária sustenta ser de pequeno valor a coisa que não ultrapassa quantia equiva-
lente a um salário mínimo vigente à época do fato.
13.1.5. Furto qualificado (art. 155, § 4o, do CP)
13.1.5.1. Com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa
É necessário que o sujeito pratique violência contra “obstáculo” à subtração do objeto material. A
violência contra a coisa subtraída não qualifica o furto.
13.1.5.2. Com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza
a) Abuso de confiança
É a confiança que decorre de certas relações (que pode ser a empregatícia, a decorrente de amizade
ou parentesco) estabelecidas entre o agente e o proprietário do objeto. O agente, dessa forma, aproveita-se
da confiança nele depositada para praticar o furto, pois há menor vigilância do proprietário sobre os seus
bens.
b) Mediante fraude
É o ardil, artifício, meio enganoso empregado pelo agente para diminuir, iludir a vigilância da vítima
e realizar a subtração. São exemplos de fraude: agente que se disfarça de empregado de empresa telefô-
nica e logra entrar em residência alheia para furtar, ou agente que, a pretexto de realizar compras em uma
loja, distrai a vendedora, de modo a lograr apoderar-se dos objetos.
c) Mediante escalada
Escalada, que em direito penal tem sentido próprio, é a penetração no local do furto por meio
anormal, artificial ou impróprio, que demanda esforço incomum. Escalada não implica, necessariamente,
subida, pois tanto é escalada galgar alturas quanto saltar fossos, rampas ou mesmo subterrâneos, desde
que o faça para vencer obstáculos.
d) Mediante destreza
Consiste na habilidade física ou manual do agente que lhe permite o apoderamento do bem sem
que a vítima perceba. É a chamada punga. Tal ocorre com a subtração de objetos que se encontrem junto
à vítima, por exemplo, carteira, dinheiro no bolso ou na bolsa, colar etc., que são retirados sem que ela
note.
Importa dizer que se a vítima perceber a subtração no momento em que ela se realiza, considera-
se o furto tentado na forma simples, pois não há que se falar no caso em destreza do agente (ex.: a vítima
sente a mão do agente em seu bolso).

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13.1.5.3. Com emprego de chave falsa


Chave falsa é qualquer instrumento de que se sirva o agente para abrir fechaduras, tendo ou não
formato de chave. Ex.: grampo, alfinete, prego, fenda, gazua etc.
13.1.5.4. Mediante concurso de duas ou mais pessoas
13.1.5.5. Furto de veículo automotor (art. 155, § 5o, do CP)
Esta qualificadora diz respeito, especificamente, à subtração de veículo automotor. Consideram-
se como tal os automóveis, ônibus, caminhões, motocicletas, aeronaves, lanchas, jet-skis. Para caracterizar
essa qualificadora, afigura-se necessário que o veículo seja efetivamente transportado para outro Estado
ou exterior. Se não ultrapassar a fronteira do Estado ou do País, essa qualificadora não incide, sendo o
crime de furto simples, salvo se presente outra qualificadora.
13.1.5.6. Emprego de explosivo que cause perigo comum
A Lei no 13.654/2018 acrescentou o § 4o-A do art. 155 do CP prevendo outra QUALIFICADORA
para o crime de furto, quando praticado com emprego de explosivo ou de artefato análogo que causa perigo
comum.
A partir da edição do Pacote Anticrime (Lei no 13.964/2019), o crime de furto com emprego de
explosivo ou de artefato análogo que causa perigo comum passou a ser considerado hediondo (art. 1o, IX,
da Lei no 8.072/1990).
13.1.5.7. Utilização de substâncias explosivas
A Lei no 13.654/2018 acrescentou também o § 7o do art. 155 do CP prevendo outra QUALIFICA-
DORA para o crime de furto, segundo o qual a pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa se
a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem
sua fabricação, montagem ou emprego.
13.1.5.8. Alterações promovidas pela Lei no 14.155/2021
Cumpre ressaltar que a Lei no 14.155/2021, que entrou em vigor em 27-5-2021, acrescentou os
§§ 4o-B e 4o-C ao art. 155 do CP:

§ 4o-B. A pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa, se o furto mediante


fraude é cometido por meio de dispositivo eletrônico ou informático, conectado ou não à
rede de computadores, com ou sem a violação de mecanismo de segurança ou a utilização
de programa malicioso, ou por qualquer outro meio fraudulento análogo. (Incluído pela Lei
no 14.155/2021)
§ 4o-C. A pena prevista no § 4o-B deste artigo, considerada a relevância do resultado gra-
voso: (Incluído pela Lei no 14.155/2021)
I – aumenta-se de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado mediante a
utilização de servidor mantido fora do território nacional; (Incluído pela Lei no 14.155/2021)
II – aumenta-se de 1/3 (um terço) ao dobro, se o crime é praticado contra idoso ou vulne-
rável. (Incluído pela Lei no 14.155/2021)

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Direito Penal

13.2. Roubo (art. 157 do CP)


13.2.1. Conduta típica
A ação nuclear do tipo consubstancia-se no verbo subtrair, que significa tirar, retirar, de outrem, no
caso bem móvel. Agora, contudo, estamos diante de um crime mais grave que o furto, na medida em que
a subtração é realizada mediante o emprego de grave ameaça ou violência contra a pessoa, ou por qualquer
outro meio que reduza a capacidade de resistência da vítima. Esta última hipótese constitui violência im-
própria, consistente em outro meio que não constitua violência física ou grave ameaça, por exemplo, fazer
a vítima ingerir bebida alcoólica, narcóticos, soníferos ou hipnotizá-la.
13.2.2. Roubo próprio e roubo impróprio
No roubo próprio, a violência ou a grave ameaça (ou a redução da impossibilidade de defesa) são
praticadas contra a pessoa para a subtração da coisa. Os meios violentos são empregados antes ou durante
a execução da subtração.
O roubo impróprio ocorre quando o sujeito, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência
contra a pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para
ele ou para terceiro (art. 157, § 1o, do CP).
São exemplos típicos de roubo impróprio aquele em que o sujeito ativo, já se retirando do portão
com a res furtiva, alcançado pela vítima, abate-a (assegurando a detenção), ou, então, já na rua, constata
que deixou um documento no local, que o identificará, e, retornando para apanhá-lo, agride o morador que
o estava apanhando (garantindo a impunidade).
13.2.3. Consumação e tentativa
Nos termos da Súm. no 582 do STJ, “Consuma-se o crime de roubo com a inversão da posse do
bem mediante emprego de violência ou grave ameaça, ainda que por breve tempo e em seguida à persegui-
ção imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou
desvigiada”.
13.2.4. Causas especiais de aumento de pena: roubo majorado (circunstanciado) (art. 157, § 2o)
a) Se há o concurso de duas ou mais pessoas
Pode haver concurso material entre roubo majorado e quadrilha armada, pois os bens jurídicos
são diversos. Enquanto o tipo penal de roubo protege o patrimônio, o tipo da quadrilha ou bando guarnece
a paz pública.
b) Se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância
A pena é agravada se a vítima, por dever de ofício (caixeiro viajante, empresa de segurança es-
pecialmente contratada para o transporte de valores), realiza serviço de transporte de valores (dinheiro, joia

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

etc.).
c) Se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro estado
ou para o exterior
Assim como no furto, esta majorante diz respeito, especificamente, à subtração de veículo auto-
motor. Consideram-se como tal os automóveis, ônibus, caminhões, motocicletas, aeronaves, lanchas, jet-
skis.
d) Se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade
Ocorre quando o agente restringe a liberdade da vítima por tempo superior ao necessário ou va-
lendo-se de forma anormal para garantir a subtração planejada. Ex.: subjugando a vítima, o agente, preten-
dendo levar-lhe o veículo, manda que entre no porta-malas, rodando algum tempo pela cidade, até permitir
que seja libertada ou o carro seja abandonado.
Trata-se de crime hediondo (art. 1o, II, a, da Lei no 8.072/1990, com a redação dada pela Lei no
13.964/2019).
e) Se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma branca
Essa qualificadora foi introduzida pela Lei no 13.964/2019, e só terá incidência para fatos pratica-
dos a partir da sua vigência, ou seja, fatos praticados a partir do dia 23-1-2020.
Arma branca é aquela em que o instrumento ou objeto é dotado de ponta ou gume, apto a matar
ou ferir uma pessoa, por exemplo, punhal e espada.
f) Se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isolada-
mente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego
13.2.5 Roubo com emprego de arma de fogo (art. 157, § 2o-A, do CP)
Importante alteração trazida pela Lei no 13.654/2018, na qual o roubo “com emprego de arma”
deixou de ser uma hipótese de roubo circunstanciado no art. 157, § 2o. Já o roubo com emprego de arma
de fogo continua sendo punido como roubo circunstanciado no art. 157, § 2o-A, I, do CP.
Ou seja, o emprego de arma branca majora o crime de roubo de 1/3 até a metade, ao passo que
o emprego de arma de fogo majora o crime de roubo em 2/3.
A arma de brinquedo não serve para majorar a pena, uma vez que não causa à vítima maior po-
tencialidade lesiva. Pode, no entanto, gerar grave ameaça e, justamente por isso, servir para configurar o
tipo penal do roubo, na figura simples.
Trata-se de crime hediondo (art. 1o, II, b, da Lei no 8.072/1990, com a redação dada pela Lei no
13.964/2019).

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Direito Penal

13.2.6 Roubo com emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum
Para caracterizar essa qualificadora, deve restar demonstrada a capacidade de o artefato causar
perigo comum, apto a causar risco a um número indeterminado de pessoas.
Curiosamente, o legislador considerou hediondo o crime de furto qualificado pelo emprego de ex-
plosivo ou artefato análogo, mas não considera hediondo o crime de roubo com emprego de explosivo ou
de artefato análogo que cause perigo comum. Como, à evidência, não existe analogia in malam partem no
Direito Penal, essa omissão do legislador significa que não será possível considerar esse tipo de roubo
como hediondo.
13.2.7 Roubo qualificado pelo resultado (art. 157, § 3o, do CP)
Prevalece o entendimento doutrinário, que passou a admitir a possibilidade, indistintamente, de o
resultado agravador poder decorrer tanto de culpa quanto de dolo, direto ou eventual.
a) Crime qualificado pelo resultado lesões graves
É uma das hipóteses de delito qualificado pelo resultado, que se configura pela presença de dolo
na conduta antecedente (roubo) e dolo ou culpa na conduta subsequente (lesões corporais graves).
Trata-se de crime hediondo (art. 1o, II, c, da Lei no 8.072/1990, com a redação dada pela Lei no
13.964/2019).
b) Crime qualificado pelo resultado morte: LATROCÍNIO
O crime de latrocínio ocorre quando do emprego da violência física contra a pessoa com o fim de
subtrair o bem, ou para assegurar a sua posse ou a impunidade do crime, decorre a morte da vítima. Tra-
tando-se de crime qualificado pelo resultado, a morte da vítima ou de terceiro tanto pode resultar de dolo (o
assaltante atira na cabeça da vítima e a mata) quanto de culpa (o agente desfere um golpe contra o rosto
do ofendido para feri-lo, vindo, no entanto, a matá-lo).
Trata-se de crime hediondo (art. 1o, II, c, da Lei no 8.072/1990, com a redação dada pela Lei no
13.964/2019).
Súm. no 610 do STF: Há crime de latrocínio, quando o homicídio se consuma, ainda que
não realize o agente a subtração de bens da vítima.
Súm. no 603 do STF: A competência para o processo e julgamento de latrocínio é do juiz
singular e não do Tribunal do Júri.

13.3. Extorsão (art. 158 do CP)


13.3.1. Conduta típica
Extorsão é o fato de o sujeito constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o
intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar
de fazer alguma coisa.

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A diferença em relação ao roubo concentra-se no fato de a extorsão exigir a participação ativa da


vítima fazendo alguma coisa, tolerando que se faça ou deixando de fazer algo em virtude da ameaça ou da
violência sofrida.
A ação nuclear do tipo consubstancia-se no verbo constranger, que significa coagir, compelir, for-
çar, obrigar alguém a fazer (ex.: quitar uma dívida não paga), tolerar que se faça (ex.: permitir que rasgue
um contrato) ou deixar de fazer alguma coisa (ex.: obrigar a vítima a não propor ação judicial contra o
agente).
O constrangimento pode ser exercido mediante o emprego de violência ou grave ameaça, os quais
podem atingir tanto o titular do patrimônio quanto pessoa ligada a ele (filhos, pai, mãe etc.).
13.3.2. Consumação e tentativa
A extorsão atinge a consumação com a conduta típica imediatamente anterior à produção do re-
sultado visado pelo sujeito.
Para a consumação, portanto, o agente deve atingir o segundo estágio, isto é, a consumação
ocorre quando a vítima cede ao constrangimento imposto e faz ou deixa de fazer algo. Esse é o entendi-
mento que prevalece na doutrina. Nesse sentido, a Súm. no 96 do STJ: “O crime de extorsão consuma-se
independentemente da obtenção da vantagem indevida”.
A tentativa é admissível. Ocorre quando o sujeito passivo, não obstante constrangido pelo autor
por meio da violência física ou moral, não realiza a conduta positiva ou negativa pretendida, por circunstân-
cias alheias à sua vontade.
13.3.3. Extorsão qualificada (art. 158, §§ 2o e 3o)
As duas hipóteses (lesão corporal grave ou morte) elencadas, como no roubo, caracterizam con-
dições de exasperação da punibilidade em razão da maior gravidade do resultado.
Inusitadamente, o legislador deixou de considerar hediondo o crime de extorsão qualificada pelo
resultado morte, ao dar nova redação ao art. 1o, III, da Lei no 8.072/1990, que passou a prever como crime
hediondo somente a extorsão qualificada pela restrição da liberdade da vítima, ocorrência de lesão corporal
ou morte (art. 158, § 3o).
13.3.4. Extorsão qualificada pela privação da liberdade (art. 158, § 3o)
Trata-se da hipótese em que a privação da liberdade da vítima é condição indispensável para
obtenção da vantagem indevida. É o chamado sequestro-relâmpago.
Ex.: ladrão constrange a vítima a entregar-lhe o cartão magnético e a fornecer-lhe a senha, acom-
panhando-a até caixas eletrônicos de bancos para sacar dinheiro. Nesse caso, ocorre o crime de extorsão
qualificada, uma vez que é imprescindível a atuação do sujeito passivo do ataque patrimonial para a

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obtenção da vantagem indevida por parte do autor. Difere do roubo majorado pela restrição da liberdade da
vítima, porque, neste caso, a restrição da liberdade é irrelevante para obtenção da vantagem indevida.
Imaginemos o agente subtrair objetos da vítima, prendendo-a no banheiro. Trata-se de roubo majorado pela
restrição da liberdade da vítima, pois trancá-la no banheiro não é condição indispensável para a subtração.
A extorsão qualificada pela privação da liberdade da vítima com resultado lesão grave ou morte
passou a ser considerada crime hediondo (art. 1o, III, da Lei no 8.072/1990).
13.4. Extorsão mediante sequestro (art. 159 do CP)
13.4.1. Conduta típica
O crime consubstancia-se no verbo sequestrar, que significa privar a vítima de sua liberdade de
locomoção, ainda que por breve espaço de tempo.
Exige a presença de um elemento subjetivo específico, consistente na finalidade de obtenção, para
si ou para outrem, de qualquer vantagem como condição ou preço de resgate.
É crime hediondo.
13.4.2. Consumação
A consumação ocorre com a privação de liberdade de locomoção da vítima, exigindo-se tempo
juridicamente relevante.
Trata-se de crime permanente, cuja consumação se prolonga no tempo. Assim, enquanto a vítima
estiver submetida à privação de sua liberdade de locomoção, o crime estará em fase de consumação.
Tratando-se de crime formal, pune-se a mera atividade de sequestrar pessoa, tendo a finalidade
de obter vantagem. Assim, embora o agente não consiga a vantagem almejada, o delito está consumado
quando a liberdade da vítima é cerceada.
13.4.3. Formas qualificadas (art. 159, § 1o, do CP)
São formas qualificadas:
a) sequestro por mais de 24 horas;
b) sequestro de menor de 18 ou maior de 60 anos;
c) sequestro praticado por bando ou quadrilha.
É possível responsabilizar-se o agente pelo crime autônomo de associação criminosa (art. 288) em
concurso material com a forma qualificada em estudo. Não há falar em bis in idem, uma vez que os momentos
consumativos e a objetividade jurídica entre tais crimes são totalmente diversos, além do que a figura prevista
no art. 288 do CP existe independentemente de algum crime vir a ser praticado pela quadrilha ou bando.

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13.4.4. Extorsão mediante sequestro qualificada pelo resultado: lesão grave ou morte (art. 159,
§§ 2o e 3o, do CP)
A regra, repetindo, é que, nesses crimes, o resultado agravador seja sempre produto de culpa.
Contudo, na hipótese em apreço, a extrema gravidade das sanções cominadas uniu o entendimento dou-
trinário que passou a admitir a possibilidade, indistintamente, de o resultado agravador poder decorrer tanto
de culpa quanto de dolo, direto ou eventual:
a) se resulta em lesão corporal grave;
b) se resulta em morte.
13.4.5. Delação premiada (art. 159, § 4o, do CP)
A Lei no 8.072/1990, que instituiu os crimes hediondos, houve por bem criar, no Brasil, a delação
premiada, que significa a possibilidade de se reduzir a pena do criminoso que entregar o(s) comparsa(s) a
qualquer autoridade capaz de levar o caso à solução almejada, causando a liberação da vítima (delegado,
juiz, promotor, entre outros).
13.5. Dano (art. 163 do CP)
13.5.1. Conduta típica
Destruir quer dizer arruinar, extinguir ou eliminar. Inutilizar significa tornar inútil ou imprestável al-
guma coisa aos fins para os quais se destina. Deteriorar é a conduta de quem estraga ou corrompe alguma
coisa parcialmente.
É o dolo. Não há a forma culposa, nem se exige qualquer elemento subjetivo do tipo específico
(dolo específico).
Basta a vontade de destruir, não sendo exigível o fim especial de causar prejuízo ao ofendido, pois
a figura penal não faz referência expressa a nenhum elemento subjetivo do tipo.
13.5.2. Dano qualificado (art. 163, par. ún., do CP)
Há o dano qualificado se o crime for cometido:

I – com violência à pessoa ou grave ameaça;


II – com emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato não constitui crime mais
grave;
III – contra o patrimônio da União, de Estado, do Distrito Federal, de Município ou de au-
tarquia, fundação pública, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa
concessionária de serviços públicos;
IV – por motivo egoístico ou com prejuízo considerável para a vítima.

13.5.3. Ação penal (art. 167 do CP)


De acordo com o art. 167, a ação penal privada é cabível no crime de dano simples (art. 163, caput,
do CP) e dano qualificado pelo motivo egoístico ou prejuízo considerável.

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A ação penal pública incondicionada é cabível nas demais hipóteses.


13.6. Apropriação indébita (art. 168 do CP)
13.6.1. Conduta típica
O núcleo do tipo é o verbo “apropriar-se”, que significa fazer sua a coisa alheia. Tendo o sujeito a
posse ou a detenção do objeto material, em dado momento faz mudar o título da posse ou da detenção,
comportando-se como se dono fosse. O pressuposto do crime de apropriação indébita é a anterior posse
lícita da coisa alheia, da qual o agente se apropria indevidamente. A posse, que deve preexistir ao crime,
deve ser exercida pelo agente em nome alheio, isto é, em nome de outrem.
A apropriação indébita propriamente dita ocorre quando o sujeito realiza ato demonstrativo de que
inverteu o título da posse, como a venda, doação, consumo, penhor, ocultação etc. Na negativa de restitui-
ção, o sujeito afirma claramente ao ofendido que não devolverá o objeto material.
O art. 168, § 1o, do CP prevê causas de aumento de pena, consistentes em ter recebido a coisa:
a) em depósito necessário; b) na qualidade de tutor, curador, síndico, liquidatário, inventariante, testamen-
teiro ou depositário judicial; c) em razão de ofício, emprego ou profissão.
13.7. Estelionato (art. 171 do CP)
13.7.1. Conduta típica
Consiste em induzir ou manter alguém em erro, mediante o emprego de artifício, ardil, ou qualquer
meio fraudulento, a fim de obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita em prejuízo alheio.
A característica primordial do estelionato é a fraude: engodo empregado pelo sujeito para induzir
ou manter a vítima em erro, com o fim de obter um indevido proveito patrimonial.
O meio de execução deve ser apto a enganar a vítima. Tratando-se de meio grotesco, que facil-
mente demonstra a intenção fraudulenta, não há nem tentativa, por atipicidade do fato.
13.7.2. Consumação e tentativa
Trata-se de crime material. Consuma-se com a obtenção da vantagem ilícita indevida, em prejuízo
alheio, ou seja, quando o agente aufere o proveito econômico, causando dano à vítima. Via de regra, esses
resultados ocorrem simultaneamente. Há, assim, ao mesmo tempo, a obtenção de proveito pelo esteliona-
tário e o prejuízo da vítima.
13.7.3. Fraude no pagamento por meio de cheque (art. 171, § 2o, VI, do CP)
Se o indivíduo emite um cheque na certeza de que tem fundos disponíveis para o devido paga-
mento pelo banco, quando na realidade não há qualquer numerário depositado na agência bancária, não
se pode falar em ilícito criminal, diante da ausência de má-fé.
O que a lei penal pune é o pagamento fraudulento. Nesse sentido é o teor da Súm. no 246 do STF:

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Direito Penal

“Comprovado não ter havido fraude, não se configura o crime de emissão de cheque sem fundos”.
Emitir cheque significa pôr em circulação o título de crédito; frustrar o pagamento quer dizer iludir
ou enganar o credor, evitando a sua remuneração.
a) Emitir cheque sem provisão de fundos
O agente preenche, assina e coloca o cheque em circulação sem ter numerário suficiente na ins-
tituição bancária (banco sacado) para cobrir o valor quando da apresentação do título pelo tomador. No
momento da emissão do cheque – que não significa simplesmente o seu preenchimento, mas a entrega a
terceiro –, é preciso que o estabelecimento bancário, encarregado da compensação, já não possua fundo
suficiente para cobrir o pagamento.
b) Frustrar o pagamento de cheque
Neste caso, o agente possui fundos suficientes na instituição bancária quando da emissão do che-
que, contudo, antes de o beneficiário apresentar o título ao banco, aquele retira todo o numerário depositado
ou apresenta uma contraordem de pagamento.
c) Competência
Conforme o art. 70, § 4o, do CPP, incluído pela Lei no 14.155/2021, nos crimes previstos no art.
171 do CP, quando praticados mediante depósito, mediante emissão de cheques sem suficiente provisão
de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado ou mediante transferência de valores, a
competência será definida pelo local do domicílio da vítima, e, em caso de pluralidade de vítimas, a com-
petência firmar-se-á pela prevenção.
d) Reparação do dano
Arrependendo-se o agente antes da apresentação do título pelo beneficiário no banco sacado, e
depositando o numerário necessário para cobrir a quantia constante do cheque, haverá arrependimento
eficaz, não respondendo ele por crime algum.
Se, por outro lado, o agente arrepender-se somente após a consumação do crime, ou seja, após
a recusa do pagamento pelo banco sacado, incidirá a Súm. no 554 do STF: “O pagamento de cheque emitido
sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta ao prosseguimento da ação penal”.
Assim, o pagamento do cheque antes do recebimento da denúncia extingue a punibilidade do
agente.
13.7.4. Ação penal (art. 171, § 5o, do CP)
A Lei no 13.964/2019, ao incluir o § 5o ao art. 171 do CP, passou a considerar que o crime de
estelionato será, via de regra, de ação penal pública condicionada à representação. Logo, a vítima terá o
prazo de 6 (seis) meses a contar da ciência da autoria do fato para manifestar sua vontade acerca da

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persecução penal, sob pena de, extrapolado esse prazo, ocorrer a extinção da punibilidade, com base no
art. 107, IV, do CP.
Excepcionalmente, será, no entanto, de ação penal pública incondicionada se o crime de estelio-
nato for praticado contra: a) a Administração Pública, direta ou indireta; b) criança ou adolescente; c) pessoa
com deficiência mental; d) maior de 70 anos de idade ou incapaz.
13.7.5. Alterações promovidas pela Lei no 14.155/2021
Cumpre ressaltar que a Lei no 14.155/2021, que entrou em vigor em 27-5-2021, acrescentou os
§§ 2o-A e 2o-B ao art. 171:

§ 2o-A. A pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa, se a fraude é cometida


com a utilização de informações fornecidas pela vítima ou por terceiro induzido a erro por
meio de redes sociais, contatos telefônicos ou envio de correio eletrônico fraudulento, ou
por qualquer outro meio fraudulento análogo. (Incluído pela Lei no 14.155/2021)
§ 2o-B. A pena prevista no § 2o-A deste artigo, considerada a relevância do resultado gra-
voso, aumenta-se de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado mediante a
utilização de servidor mantido fora do território nacional. (Incluído pela Lei no 14.155/2021)

13.8. Receptação (art. 180 do CP)


13.8.1. Conduta típica
Nos termos do art. 180, caput, do CP, a receptação é o fato de adquirir, receber, transportar, con-
duzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que
terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte.
É pressuposto do crime de receptação a existência de crime anterior. Trata-se de delito acessório,
em que o objeto material deve ser produto de crime antecedente, chamado de delito pressuposto.
A receptação culposa constitui o fato de o sujeito adquirir ou receber coisa que, por sua natureza
ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou pela condição de quem a oferece, deve presumir-se obtida
por meio criminoso (art. 180, § 3o).
13.8.2. Receptação qualificada (art. 180, § 1o, do CP)
Forma qualificada: tem como elemento subjetivo o dolo, seja direto ou eventual.
13.8.3. Receptação punível autonomamente (art. 180, § 4o, do CP)
Para a concretização do crime de receptação não importa se houve a condenação do autor do
crime anterior. Porém, é necessário evidenciar-se a existência do crime anterior.
13.8.4. Perdão judicial (art. 180, § 5o, do CP)
Nos termos do art. 180, § 5o, 1a parte, do CP, na hipótese da receptação culposa, se o criminoso
é primário, deve o juiz, tendo em consideração determinadas circunstâncias, deixar de aplicar a pena. No
caso, fixaram a doutrina e a jurisprudência que, além da primariedade, deve-se exigir o seguinte: a) diminuto

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valor da coisa objeto da receptação; b) bons antecedentes; c) ter o agente atuado com culpa levíssima.
13.8.5. Tipo qualificado (art. 180, § 6o, do CP)
Outra forma qualificada: quando o produto de crime pertencer à União, Estado, Município, empresa
de serviços públicos ou sociedade de economia mista. Exige-se que o agente tenha conhecimento disso.
13.9. Escusas absolutórias (arts. 181 a 183 do CP)
13.9.1. Imunidade absoluta (art. 181)
Trata-se da chamada imunidade penal absoluta, também conhecida como escusa absolutória, in-
cidente sobre os crimes contra o patrimônio, nas seguintes hipóteses:

I – do cônjuge, na constância da sociedade conjugal;


II – de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou
natural.

13.9.2. Imunidade relativa (art. 182, I, II e III, do CP)


Consubstancia-se em imunidade penal relativa ou processual, que não extingue a punibilidade,
mas tão somente impõe uma condição objetiva de procedibilidade.
Neste caso, ao contrário da imunidade absoluta, o autor do crime não é isento de pena, mas os
crimes de ação penal pública incondicionada passam a ser condicionados à representação do ofendido.
13.9.3. Exclusão de imunidade ou privilégio (art. 183 do CP)
Dá-se nas seguintes hipóteses:

I – se o crime é de roubo ou de extorsão, ou, em geral, quando haja emprego de grave


ameaça ou violência à pessoa;
II – ao estranho que participa do crime;
III – se o crime é praticado contra pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta)
anos.

14. Crimes contra a Dignidade Sexual

14.1. Estupro (art. 213 do CP)


14.1.1. Conduta típica
Constranger significa tolher a liberdade, forçar ou coagir. Nesse caso, o cerceamento destina-se a
obter a conjunção carnal. Ato libidinoso é aquele destinado a satisfazer a lascívia, o apetite sexual do
agente. Considerando que a conjunção carnal é a cópula vagínica, todos os demais atos que servem à
satisfação do prazer sexual são considerados libidinosos, tais como o sexo oral ou anal, o toque em partes
íntimas, a masturbação, o beijo lascivo, a introdução dos dedos na vagina.

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14.1.2. Sujeito ativo e passivo


Antes da alteração introduzida no art. 213 do CP, o sujeito passivo do crime de estupro era apenas
a mulher. Atualmente, o estupro poderá ter como sujeito passivo homens ou mulheres, quando constrangi-
dos à prática de atos libidinosos de qualquer natureza.
Atinente ao sujeito ativo, por sua vez, este pode ser homem ou mulher, indistintamente.
14.1.3. Consumação e tentativa
O delito consuma-se com a prática do ato de libidinagem (gênero que abrange conjunção carnal e
vasta enumeração de atos libidinosos ofensivos à dignidade sexual da vítima), sendo perfeitamente possível
a tentativa, quando, iniciada a execução, o ato sexual visado não se consuma por circunstâncias alheias à
vontade do agente.
Antes da Lei nova, se ocorresse conjunção carnal e atos libidinosos substanciais contra a mesma
mulher, tínhamos estupro e atentado violento ao pudor. Discutia-se, apenas, se deveria incidir a continui-
dade delitiva ou se se tratava de concurso material de crimes.
Agora, tendo o legislador unificado os tipos penais do estupro e do atentado violento ao pudor,
passando a existir apenas o estupro e o estupro contra vulnerável, haverá crime único, se praticado no
mesmo contexto fático.
14.1.4. Formas qualificadas (art. 213, §§ 1o e 2o, do CP)
Duas são as hipóteses: 1a) ocorrência de lesões graves (que abrangem as lesões gravíssimas)
decorrentes da conduta do agente; 2a) vítima maior de 14 anos e menor de 18 anos na data do fato.
Quanto às lesões graves (ou gravíssimas), devem ocorrer da conduta. Com isso, deixou claro o
legislador que tais resultados devem decorrer da conduta, portanto, da violência ou grave ameaça empre-
gadas contra a vítima.
O § 2o do art. 213, por sua vez, prevê o resultado qualificador morte, também decorrente da con-
duta. Neste particular, houve redução da pena máxima, que anteriormente era de 25 anos, passando para
20 anos de reclusão.
Em ambos os casos, os resultados lesões graves (ou gravíssimas) e morte devem ocorrer a título
de culpa do agente.
14.2. Violação sexual mediante fraude (art. 215 do CP)
14.2.1. Conduta típica
O crime do art. 215 do CP abarca a prática de conjunção carnal ou a prática de ato libidinoso
diverso contra homens ou mulheres, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifes-
tação de vontade da vítima.

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Direito Penal

Exemplo que se tem visto é a prática de simulações por médico no sentido de sugestionar estar
examinando o(a) paciente para obter aludidos atos libidinosos, ou mesmo rituais de cura fraudulentamente
praticados com o mesmo fim.
Atentar para que não se configure a hipótese prevista no novel § 1o do art. 217-A, que prevê o
tipo penal de estupro contra vulnerável, isto é, quando a vítima, além das demais hipóteses lá elencadas
(vítima menor de 14 anos, pessoa que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiver o necessário
discernimento para a prática do ato), por qualquer outra causa, não possa oferecer resistência. Se a
vítima, por exemplo, estiver absolutamente embriagada, absolutamente narcotizada, dormindo, em esta-
dos de inconsciência, elevada senilidade, deficiência física que a incapacite de resistir etc., teremos es-
tupro contra vulnerável.
O sujeito ativo e passivo da aludida infração penal pode ser homem e mulher, indistintamente.
Trata-se, pois, de crime comum. No entanto, no caso de menor de 14 anos, o crime será o do art. 217-A do
CP (estupro de vulnerável).
14.2.2. Consumação e tentativa
Tal como ocorre no estupro, consuma-se o delito com a prática do ato de libidinagem, sendo per-
feitamente possível a tentativa quando, iniciada a execução, o ato sexual visado não se consuma por cir-
cunstâncias alheias à vontade do agente.
14.3. Importunação sexual (art. 215-A do CP)
14.3.1. Conduta típica
A conduta do agente consiste em praticar ato libidinoso, com o propósito de satisfazer sua lascívia
ou a de terceiro. A partir da introdução do art. 215-A do CP, o art. 61 do Decreto-lei no 3.688/1941 está
revogado. Deve o ato libidinoso ser praticado contra alguém, ou seja, contra pessoa determinada. Assim,
pratica o crime de importunação sexual o agente que se masturba diante de uma pessoa para satisfazer a
sua lascívia. Agora, se o agente se masturbar em praça pública, sem visar a uma pessoa determinada,
estará praticando o crime de ato obsceno (art. 233 do CP).
Trata-se de crime que contém subsidiariedade expressa, ou seja, aplicam-se as penas da impor-
tunação sexual se a conduta não caracteriza crime mais grave. Assim, se, por exemplo, o agente empregar
violência na prática do ato libidinoso, incidirá o crime de estupro (art. 213 do CP).
É tipificado também como crime comum, não se exigindo, portanto, qualidade especial da vítima.
Pode, assim, ser praticado por qualquer pessoa. Da mesma forma, qualquer pessoa pode figurar como
vítima.
O agente desenvolve conduta com a consciência de praticar o ato libidinoso contra alguém. Eis o

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Direito Penal

dolo. Além disso, o tipo prevê um elemento subjetivo específico, consistente no agente atuar com a finali-
dade de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro.
14.3.2. Consumação e tentativa
A consumação ocorre com a prática do ato libidinoso. Embora seja de difícil incidência, já que, se
o agente inicia o ato libidinoso, estará consumado o crime, é possível a tentativa.
14.4. Estupro de vulnerável (art. 217-A do CP)
14.4.1. Conduta típica
O crime de estupro de vulnerável consiste na conduta de ter conjunção carnal ou praticar outro ato
libidinoso com menor de 14 anos, bem como com pessoa portadora de enfermidade ou deficiência mental
ou incapaz de discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não apresenta condi-
ções de oferecer resistência (§ 1o).
O crime é punido a título de dolo, devendo o agente ter ciência de que age em face de pessoa
vulnerável. Se o agente não sabia que a vítima era menor de 14 anos de idade, pode incidir o erro de tipo
(art. 20, caput, do CP).
Nos termos do art. 217-A, § 5o, do CP, incide o crime de estupro de vulnerável independentemente
do consentimento da vítima ou do fato de ela ter mantido relações sexuais anteriormente ao crime.
14.4.2. Consumação ou tentativa
Tratando-se de crime material, a consumação ocorrerá com o resultado naturalístico, ou seja, com
a conjunção carnal ou ato libidinoso diverso da conjunção carnal.
14.4.3. Formas qualificadas (Art. 217-A, §§ 3o e 4o, do CP)
Os §§ 3o e 4o qualificam o delito de estupro contra vulnerável se da conduta ocorrer o resultado
lesão grave (por consequência, gravíssima também) ou morte da vítima.
14.4.5. Ação penal (art. 225 do CP)
Em relação aos crimes contra a dignidade sexual, a ação penal será sempre pública incondicio-
nada.

15. Crimes contra a Fé Pública

15.1. Moeda falsa (art. 289 do CP)


15.1.1. Conduta típica
O tipo básico (caput) pune aquele que falsificar, fabricando ou alterando, moeda metálica ou papel-

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moeda de curso legal no País ou no estrangeiro.


Falsificar significa conferir aparência enganadora, recaindo a conduta sobre moeda metálica ou
papel-moeda (nacional ou estrangeira).
É essencial que a falsificação seja convincente, isto é, capaz de iludir os destinatários da moeda.
15.1.2. Consumação e tentativa
O crime consuma-se no momento da fabricação ou da alteração da moeda, desde que idônea a
iludir. A tentativa é perfeitamente possível.
15.1.3. Formas equiparadas (art. 289, § 1o, do CP)
Nas mesmas penas incorre quem, por conta própria ou alheia, importa ou exporta, adquire, vende,
troca, cede, empresta, guarda ou introduz na circulação moeda falsa.
15.1.4. Privilégio (art. 289, § 2o, do CP)
Quem, tendo recebido de boa-fé, como verdadeira, moeda falsa ou alterada, a restitui à circulação,
depois de conhecer a falsidade, é punido com detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
15.1.5. Falsificação funcional (art. 289, § 3o, do CP)
É punido com reclusão, de 3 (três) a 15 (quinze) anos, e multa, o funcionário público ou diretor,
gerente, ou fiscal de banco de emissão que fabrica, emite ou autoriza a fabricação ou emissão:

I – de moeda com título ou peso inferior ao determinado em lei;


II – de papel-moeda em quantidade superior à autorizada.

15.2. Falsificação de documento público (art. 297 do CP)


15.2.1. Conduta típica
O art. 297 do CP trata da falsidade material, ou seja, aquela que diz respeito à forma do documento.
As ações nucleares consubstanciam-se nos verbos falsificar, que significa formar, criar um docu-
mento; e alterar, que significa modificar o documento. Na hipótese, o documento é verdadeiro, e o agente
substitui seu conteúdo, isto é, frases, palavras que alterem sua essência, incidindo, portanto, sobre aspec-
tos relevantes do documento.
15.2.2. Consumação e tentativa
O crime consuma-se com a falsificação ou alteração do documento, sendo prescindível o uso efe-
tivo deste.
A tentativa é possível, pois há um iter criminis que pode ser fracionado. A tentativa ocorrerá se,
por exemplo, o agente, estando no início do processo de formação da escritura pública falsa, tendo preen-
chido apenas algumas linhas, é surpreendido por terceiro. Nessa hipótese, não ocorreu ainda a contrafação

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total do documento, portanto, o crime reputa-se tentado.


Aplica-se a Súm. no 17 do STJ: “Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade
lesiva, é por este absorvido”. Trata-se da aplicação da regra de que o crime-fim absorve o crime-meio.
15.3. Falsificação de documento particular (art. 298 do CP)
15.3.1. Conduta típica
Também se trata de falsidade material, ou seja, aquela que diz respeito à forma do documento.
Falsificar: significa formar, criar um documento. Ex.: o agente aproveitou-se do espaço em branco
existente entre o conteúdo da carta e a assinatura do missivista para inserir aí uma confissão de dívida,
cortando a parte do conteúdo da carta, e criando, dessarte, parcialmente o documento.
Alterar: significa modificar o documento. Na hipótese, o documento é verdadeiro, e o agente subs-
titui seu conteúdo, isto é, frases, palavras que alterem sua essência, incidindo, portanto, sobre aspectos
relevantes do documento.
15.3.2. Consumação e tentativa
O crime consuma-se com a falsificação ou alteração do documento, sendo prescindível o uso efe-
tivo deste.
A tentativa é possível, pois há um iter criminis que pode ser fracionado. A tentativa ocorrerá
quando, por exemplo, o agente, estando no início do processo de forjamento de um instrumento de cessão
de direitos, em que ele figura como beneficiário, é interrompido por terceiros antes de sua finalização.
15.4. Falsidade ideológica (art. 299 do CP)
15.4.1. Conduta típica
Na falsidade ideológica, o documento é formalmente perfeito, sendo, no entanto, falsa a ideia nele
contida.
O sujeito tem legitimidade para emitir o documento, mas acaba por lhe inserir um conteúdo sem
correspondência com a realidade dos fatos.
Ex.: assim, uma escritura lavrada pelo funcionário do Cartório de Registro de Imóveis é formal-
mente perfeita, pois a ele incumbe formar o instrumento público. Entretanto, se essa escrita encerrar decla-
rações falsas prestadas pelo particular, haverá o crime de falsidade ideológica.
Trata-se de crime de ação múltipla. Diversas são as ações nucleares típicas previstas:

OMITIR – deixar de inserir ou não mencionar.


INSERIR – colocar ou introduzir.
FAZER INSERIR – proporcionar que se introduza.

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15.4.2. Consumação e tentativa


Consuma-se com a omissão ou a inserção da declaração falsa ou diversa da que deveria constar.
Trata-se de crime formal; prescinde-se, portanto, da ocorrência efetiva do dano, bastando a capa-
cidade de lesar terceiro. Assim, o prejuízo a direito, a criação da obrigação ou a alteração da verdade sobre
fato juridicamente relevante não são necessários à consumação do crime.

16. Crimes contra a Administração Pública

16.1. Dos crimes praticados por funcionário público contra a Administração


em geral
16.1.1. Peculato (art. 312 do CP)
16.1.1.1. Conduta típica
O peculato próprio, na realidade, constitui uma apropriação indébita, só que praticada por funcio-
nário público com violação do dever funcional. Antes de ser uma ação lesiva aos interesses patrimoniais da
Administração Pública, é principalmente uma ação que fere a moralidade administrativa, em virtude de
quebra do dever funcional.
O peculato próprio é formado pelo peculato-apropriação e peculato-desvio.
No peculato-apropriação, a ação nuclear típica consubstancia-se no verbo apropriar. Assim como
no crime de apropriação indébita, o agente tem a posse (ou detenção) lícita do bem móvel, público ou
particular, e inverte esse título, pois passa a comportar-se como se dono fosse, isto é, alienando, doando,
consumindo com o bem.
O peculato-desvio está previsto na segunda parte do caput do art. 312: “ou desviá-lo, em proveito
próprio ou alheio”.
O agente tem a posse da coisa e lhe dá destinação diversa da exigida por lei, agindo em proveito
próprio ou de terceiro.
Por exemplo, o funcionário empresta o dinheiro público para perceber os juros.
O peculato-furto é o denominado peculato impróprio, e está previsto no art. 312, § 1o, do CP. Trata-
se de um crime de furto, só que praticado por funcionário público, o qual se vale dessa qualidade para
cometê-lo. Aqui o agente não tem a posse ou detenção do bem como no peculato-apropriação ou desvio,
mas se vale da facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário público para realizar a subtração.

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16.1.1.2. Sujeitos do delito


Trata-se de crime próprio. Somente o funcionário público (art. 327, caput) e as pessoas a ele equi-
paradas legalmente (art. 327, §§ 1o e 2o) podem praticar o delito de peculato.
A condição especial funcionário público, como elementar do crime de peculato, comunica-se ao
particular que eventualmente concorra, na condição de coautor ou partícipe, para a prática do crime, nos
termos do art. 30 do CP. Portanto, é perfeitamente possível o concurso de pessoas, dada a comunicabili-
dade da elementar do crime (art. 30).
16.1.1.3. Peculato culposo (art. 312, § 2o, do CP)
Pune-se aqui o funcionário público que, por negligência, imprudência ou imperícia, concorre para
a prática de crime de outrem.
O funcionário, para ser punido, insere-se na figura do garante, prevista no art. 13, § 2o. Assim, tem
ele o dever de agir, impedindo o resultado de ação delituosa de outrem. Não o fazendo, responde por
peculato culposo.
Ex.: se um vigia de prédio público se desvia de sua função de guarda, por negligência, permitindo,
pois, que terceiros invadam o lugar e de lá subtraiam bens, responde por peculato culposo.
Nos termos do art. 312, § 3o, do CP, a reparação do dano, para dar causa à extinção da punibili-
dade, deve ser anterior ao trânsito em julgado da sentença criminal.
Deve ser completa e não exclui eventual sanção administrativa contra o funcionário. A extinção da
punibilidade somente aproveita o funcionário, autor do peculato culposo.
Consoante a segunda parte do § 3o, no crime culposo, se a reparação do dano é posterior à sen-
tença irrecorrível, isto é, transitada em julgado, haverá a redução de metade da pena imposta.
16.1.2. Concussão (art. 316 do CP)
16.1.2.1. Conduta típica
A ação nuclear consubstancia-se no verbo exigir, isto é, ordenar, reivindicar, impor como obriga-
ção.
A vítima cede às exigências formuladas pelo agente diante do temor de represálias relacionadas
ao exercício da função pública por ele exercida.
Assim, não é necessária a promessa da causação de um mal determinado; basta o temor que a
autoridade inspira.
Ex.: carcereiro que exige dinheiro dos presos sob sua custódia. Na hipótese, o simples fato de os
presos encontrarem-se sob a guarda daquele gera neles o temor de eventuais represálias.
Contudo, não pratica esse delito, mas o de extorsão ou roubo, por exemplo, o policial militar que

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exige vantagem indevida da vítima utilizando-se de violência, ou ameaçando-a gravemente de sequestrar


seu filho.
16.1.2.2. Consumação e tentativa
Trata-se de crime formal. A consumação ocorre com a mera exigência da vantagem indevida, in-
dependentemente de sua efetiva obtenção. Se esta sobrevém, há mero exaurimento do crime.
É possível a tentativa, na hipótese em que o crime é plurissubsistente.
16.1.3. Excesso de exação (art. 316, § 1o, do CP)
16.1.3.1. Conduta típica
Há duas formas de incidir o crime de excesso de exação: a primeira, quando se trata de exigência
de tributo ou contribuição social indevido; a segunda, o tributo ou contribuição social é devido, mas o agente
emprega meio gravoso ou vexatório para o devedor, o qual não é autorizado por lei.
16.1.3.2. Consumação e tentativa
a) Exigência indevida: aqui o delito se consuma no momento em que é feita a exigência do tributo
ou contribuição social.
Trata-se de crime formal, portanto, a consumação independe do efetivo pagamento do tributo ou
contribuição social pela vítima.
A tentativa é possível. Ex.: carta contendo a exigência de vantagem, a qual é interceptada antes
de chegar ao conhecimento da vítima.
b) Cobrança vexatória ou gravosa: consuma-se com o emprego do meio vexatório ou gravoso
na cobrança do tributo ou contribuição social, independentemente de seu efetivo recebimento.
A tentativa é possível.
Ex.: com o devido aparato já se acha na casa ou estabelecimento do ofendido, mas é obstado
antes que inicie a cobrança.
16.1.3.3. Excesso de exação qualificado (art. 316, § 2o, do CP)
Nessa modalidade mais gravosa do crime de excesso de exação, pune-se o funcionário público
que, em vez de recolher o tributo ou contribuição social, indevidamente exigido (§ 1o), para os cofres públi-
cos, desvia-o em proveito próprio ou alheio.
16.1.4. Corrupção passiva (art. 317 do CP)
16.1.4.1. Conduta típica
Trata-se de crime de ação múltipla. Três são as condutas típicas previstas:
a) solicitar: pedir, manifestar que deseja algo. Não há o emprego de qualquer ameaça explícita
ou implícita. O funcionário solicita vantagem, e a vítima cede por deliberada vontade.

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b) receber: aceitar, entrar na posse. Significa obter, direta ou indiretamente, para si ou para ou-
trem, vantagem indevida.
Aqui a proposta parte de terceiros e a ela adere o funcionário, ou seja, o agente não só aceita a
proposta como recebe a vantagem indevida.
Ao contrário da primeira modalidade, é condição essencial para sua existência que haja a anterior
configuração do crime de corrupção ativa, isto é, o oferecimento de vantagem indevida (art. 333). Sem essa
oferta pelo particular, não há como falar em recebimento de vantagem.
c) aceitar a promessa de recebê-la: nessa modalidade típica, basta que o funcionário concorde
com o recebimento da vantagem. Não há o efetivo recebimento dela. Deve haver, necessariamente, uma
proposta formulada por terceiros, à qual adere o funcionário, mediante a aceitação de receber a vantagem.
Na corrupção passiva, o funcionário, em troca de alguma vantagem, pratica ou deixa de praticar
ato de ofício para beneficiar alguém. O ato a ser praticado pode ser ilegítimo, ilícito ou injusto. É a chamada
corrupção própria.
Ex.: o funcionário do cartório criminal solicita indevida vantagem econômica para suprimir docu-
mentos do processo judicial.
Também configura o crime a prática de ato legítimo, lícito, justo. É a chamada corrupção passiva
imprópria.
Ex.: oficial de justiça solicita vantagem econômica ao advogado, a fim de dar prioridade ao cum-
primento do mandado judicial expedido em processo em que aquele atua.
16.1.4.2. Consumação e tentativa
Trata-se de crime formal. Portanto, a consumação ocorre com o ato de solicitar, receber ou aceitar
a promessa de vantagem indevida.
A corrupção passiva consuma-se instantaneamente, isto é, com a simples solicitação da vantagem
indevida, o recebimento desta ou com a aceitação da mera promessa daquela.
O tipo penal não exige que o funcionário pratique ou se abstenha da prática do ato funcional. Se
isso suceder, haverá mero exaurimento do crime, o qual constitui condição de maior punibilidade (causa de
aumento de pena prevista no § 1o do art. 317).
A tentativa é de difícil ocorrência, mas não é impossível. Basta que haja um iter criminis a ser
cindido. Ex.: solicitação feita por carta, a qual é interceptada pelo chefe de repartição.
16.1.4.3. Causa de aumento de pena (art. 317, § 1o)
Eleva-se em 1/3 a pena do agente que, em razão da vantagem recebida ou prometida, efetiva-
mente retarda (atrasa ou procrastina) ou deixa de praticar (não leva a efeito) ato de ofício que lhe competia

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Direito Penal

desempenhar ou termina praticando o ato, mas desrespeitando o dever funcional. É o que a doutrina clas-
sifica de corrupção exaurida.
16.1.4.4. Figura privilegiada (art. 317, § 2o)
Trata-se de conduta de menor gravidade, na medida em que o agente pratica, deixa de praticar ou
retarda o ato de ofício, não em virtude do recebimento de vantagem indevida, mas cedendo a pedido ou
influência de outrem, isto é, para satisfazer interesse de terceiros ou para agradar ou bajular pessoas influ-
entes.
16.1.5. Prevaricação (art. 319 do CP)
16.1.5.1. Conduta típica
O crime de prevaricação caracteriza-se pela conduta do funcionário público em retardar ou deixar
de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer
interesse ou sentimento pessoal.
a) Retardar: é atrasar, adiar, protelar, procrastinar, não praticar o ato de ofício dentro do prazo
estabelecido (crime omissivo).
Ex.: atendente de cartório judicial que, devendo expedir alvará de soltura, por não simpatizar com
o advogado, deixa de fazê-lo com a brevidade que a medida exige.
b) Deixar de praticar: trata-se de mais uma modalidade omissiva do crime em estudo. Aqui, no
entanto, ao contrário da conduta precedente, há o ânimo definitivo de não praticar o ato de ofício.
c) Praticar (contra disposição expressa de lei): cuida-se aqui de conduta comissiva, em que o
agente efetivamente executa o ato, só que de forma contrária à lei.
O interesse pessoal é qualquer proveito, vantagem, podendo ser patrimonial ou moral.
Quanto ao interesse patrimonial, importa distinguir algumas situações:
a) se o ato praticado, retardado ou omitido tiver sido objeto de acordo anterior entre o funcionário
e o particular, visando aquele indevida vantagem, o crime passará a ser outro: corrupção passiva;
b) se houver, anteriormente à prática ou omissão do ato, a exigência de vantagem indevida pelo
funcionário público, haverá o crime de concussão.
Sentimento pessoal
Sentimento pessoal reflete um estado afetivo ou emocional do próprio agente, que pode manifes-
tar-se em suas mais variadas formas, tais como amor, paixão, emoção, ódio.

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16.2. Dos crimes praticados por particular contra a Administração em geral


16.2.1. Resistência (art. 329 do CP)
16.2.1.1. Conduta típica
A conduta típica consiste em opor-se o particular à execução de ato legal mediante o emprego de
violência ou ameaça.
Para grande parte da doutrina, a violência e a ameaça devem ser dirigidas à pessoa do funcionário,
e não contra coisas, por exemplo, quebrar os vidros da viatura policial. Poderá o agente, nesse caso, res-
ponder pelo crime de dano qualificado.
A oposição pode também se dar mediante o emprego de ameaça, a qual pode ser real, por exem-
plo, apontar uma faca para o funcionário público ou uma arma de fogo, ainda que desmuniciada; ou verbal,
por exemplo, indivíduo que promete ao policial, que, se ele for preso, mandará seus comparsas eliminá-lo.
16.2.1.2. Consumação e tentativa
Consuma-se com o emprego da violência ou ameaça contra o funcionário.
Tratando-se de crime formal, não se exige que o agente efetivamente impeça a execução do ato
legal.
É perfeitamente possível a tentativa. Por exemplo: agente é impedido por terceiros de desferir uma
paulada no funcionário público. Ressalve-se que, no caso de ameaça, somente haverá a tentativa se ela
for realizada por escrito.
16.2.2. Desobediência (art. 330 do CP)
16.2.2.1. Conduta típica
O delito de desobediência em muito se parece com o de resistência, uma vez que em ambos o
sujeito ativo pretende subtrair-se à execução de ato legal; contudo, no crime de desobediência, não ocorre
o emprego de violência ou ameaça contra funcionário público.
O núcleo do tipo está consubstanciado no verbo desobedecer, desatender, não aceitar, não se
submeter, no caso, à ordem legal de funcionário público.
Para que exista o crime de desobediência é necessário que haja ordem legal emanada de funcio-
nário público competente. Não se cuida aqui de pedido ou solicitação, por exemplo, de promotor de justiça
que, mediante ofício, solicita documentos.
16.2.2.2. Consumação e tentativa
Trata-se de delito formal (aquele que não exige resultado naturalístico, consistente na ocorrência
de algum prejuízo efetivo para a administração por conta do não cumprimento da ordem).
A tentativa somente é possível na forma comissiva do descumprimento da ordem legal.

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Direito Penal

16.2.3. Desacato (art. 331 do CP)


16.2.3.1. Conduta típica
O desacato consiste na prática de qualquer ato ou emprego de palavras que causem vexame,
humilhação, falta de respeito ao funcionário público.
Pode implicar qualquer tipo de palavra grosseira ou ato ofensivo contra a pessoa que exerce fun-
ção pública, incluindo ameaças e agressões físicas.
Ex.: cuspir no rosto do oficial de justiça, atirar papéis no promotor de justiça, rogar praga contra o
funcionário.
No exercício da função: diz com a ofensa praticada contra funcionário público que esteja no
desempenho de sua função, isto é, praticando atos de ofício.
Em razão do exercício da função: nessa hipótese, o funcionário está fora do exercício de sua
função, mas a ofensa contra ele irrogada diz respeito a ela.
16.2.3.2. Consumação e tentativa
Trata-se de crime formal (delito que não exige o resultado naturalístico, consistente no efetivo
desprestígio da função pública). Consuma-se, portanto, no momento em que os atos ofensivos são pratica-
dos (vias de fato, lesão corporal, gestos, gritos etc.) ou as palavras ultrajantes irrogadas (calúnia, difamação,
injúria) são proferidas contra o funcionário público.
Como se trata de crime formal, não se exige que o funcionário público se sinta ofendido com os
atos praticados.
16.2.4. Corrupção ativa (art. 333 do CP)
16.2.4.1. Conduta típica
As ações nucleares do tipo estão consubstanciadas nos verbos:
OFERECER vantagem indevida, ou seja, propor ou apresentar para que seja aceita.
PROMETER vantagem indevida, isto é, comprometer-se, fazer promessa, garantir a entrega de
algo ao funcionário.
Por não se tratar de crime bilateral, prescinde-se da aceitação da vantagem pelo funcionário pú-
blico. Caso aceite, o funcionário deverá responder pelo delito de corrupção passiva.
16.2.4.2. Consumação e tentativa
Trata-se de crime formal, uma vez que a consumação se dá com a simples oferta ou promessa de
vantagem indevida por parte do agente ao funcionário público, isto é, independentemente de ele aceitá-la
ou recusá-la. Também não é necessário que o funcionário pratique, retarde ou omita o ato de ofício de sua
competência.

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1ª Fase | 37° Exame da OAB
Direito Penal

A tentativa é possível. Ex.: suponha-se a hipótese de que a correspondência contendo a oferta de


dinheiro não chegue às mãos do funcionário destinatário por ter sido apreendida pela polícia.
16.2.4.3. Causa de aumento de pena (art. 333, par. ún.)
Eleva-se a pena em 1/3 quando, em razão da promessa ou da vantagem, o funcionário público
efetivamente atrasa ou não faz o que deveria, ou mesmo pratica o ato, infringindo dever funcional. Nessa
hipótese, o crime é material, isto é, exige resultado naturalístico.
16.2.5. Descaminho (art. 334 do CP)
16.2.5.1. Conduta típica
Descaminho é a fraude voltada a frustrar, total ou parcialmente, o pagamento de direitos de impor-
tação ou exportação ou do imposto de consumo sobre mercadorias.
Em síntese, no descaminho, o agente busca iludir, mediante o emprego de fraude, o pagamento
de direito ou imposto devido em face de entrada e saída de mercadoria não proibida.
Princípio da insignificância
O STF, baseado no art. 20 da Lei no 10.522/2002 e na Portaria MF no 75/2012, estabeleceu que o
valor que dispensa a cobrança fiscal em juízo é de R$ 20.000,00, incidindo, em relação a esse valor, o
princípio da insignificância.
16.2.5.2. Consumação e tentativa
O descaminho consuma-se com a liberação pela alfândega, sem o pagamento dos impostos ine-
rentes. Consuma-se, ainda, com a entrada e saída da mercadoria do território nacional.
A tentativa é possível. No caso de exportação, o crime é tentado se a mercadoria não chega a sair
do País. No caso de importação, se o agente entrar com a mercadoria no País, mas for preso na alfândega,
o crime já estará consumado.
16.2.5.3. Figuras equiparadas (art. 334, § 1o)
Incorre na pena do caput do art. 334 (reclusão, de 1 a 4 anos) quem:

I – pratica navegação de cabotagem, fora dos casos permitidos em lei;


II – pratica fato assimilado, em lei especial, a descaminho;
III – vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito
próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria de proce-
dência estrangeira que introduziu clandestinamente no País ou importou fraudulentamente
ou que sabe ser produto de introdução clandestina no território nacional ou de importação
fraudulenta por parte de outrem;
IV – adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade
comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira, desacompanhada de do-
cumentação legal ou acompanhada de documentos que sabe serem falsos.

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Direito Penal

16.2.5.4. Causa de aumento de pena (art. 334, § 3o)


A pena aplica-se em dobro se o crime de descaminho é praticado em transporte aéreo, marítimo
ou fluvial.
16.2.6. Contrabando (art. 334-A do CP)
16.2.6.1. Conduta típica
Contrabando é a clandestina importação ou exportação de mercadorias cuja entrada no País, ou
saída dele, é absoluta ou relativamente proibida.
16.2.6.2. Consumação e tentativa
Na importação ou exportação de mercadorias proibidas com passagem pelos órgãos alfandegá-
rios, o crime consuma-se quando transposta a barreira fiscal, mesmo que a mercadoria não chegue ao seu
destino.
A tentativa é possível. No caso de exportação, o crime é tentado se a mercadoria não chega a sair
do País. No caso de importação, se o agente entrar com a mercadoria no País, mas for preso na alfândega,
o crime já estará consumado.
16.2.6.3. Figuras equiparadas (art. 334-A, § 1o)
§ 1o Incorre na mesma pena quem:

I – pratica fato assimilado, em lei especial, a contrabando;


II – importa ou exporta clandestinamente mercadoria que dependa de registro, análise ou
autorização de órgão público competente;
III – reinsere no território nacional mercadoria brasileira destinada à exportação;
IV – vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito
próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria proibida
pela lei brasileira;
V – adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade
comercial ou industrial, mercadoria proibida pela lei brasileira.

16.2.6.4. Causa de aumento de pena (art. 334-A, § 3o)


A pena aplica-se em dobro se o crime de descaminho é praticado em transporte aéreo, marítimo
ou fluvial.

17. Dos crimes contra a Administração da Justiça

17.1. Denunciação caluniosa (art. 339 do CP)


17.1.1. Conduta típica
Trata-se da conduta do agente que dá causa à instauração de inquérito policial, de procedimento

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investigatório criminal, de processo judicial, de processo administrativo disciplinar, de inquérito civil ou de


ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime, infração ético-disciplinar ou ato
ímprobo de que o sabe inocente.
O elemento do tipo “alguém” indica, nitidamente, tratar-se de pessoa certa, não se podendo come-
ter o delito ao indicar para a autoridade policial apenas a materialidade do crime e as várias possibilidades
de suspeitos.
17.1.2. Elemento subjetivo
É o dolo, consistente na vontade livre e consciente de dar causa à instauração de investigação
policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa contra alguém, imputando-lhe
crime.
É imprescindível que o denunciante saiba (dolo direto) que o denunciado é inocente, conforme
expressa exigência legal contida na expressão “de que o sabe inocente”. Sem ele, não há crime. A dúvida
(dolo eventual) afasta a tipicidade do delito.
17.1.3. Consumação
Trata-se de crime formal, ou seja, delito que não exige, para sua consumação, resultado natura-
lístico, consistente no efetivo prejuízo para a administração da justiça.
Consuma-se, portanto, com a instauração de investigação policial, de processo judicial, de inves-
tigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém.
Não se exige que a autoridade policial, formalmente, instaure o inquérito policial para que se con-
sume o crime. Basta que inicie investigação policial no sentido de coletar dados que apurem a veracidade
da denúncia.
17.2. Comunicação falsa de crime ou de contravenção (art. 340 do CP)
17.2.1. Conduta típica
Consubstancia-se no verbo provocar, isto é, dar causa à ação da autoridade pública (delegado de
polícia, juiz, promotor de justiça, bem como todas as autoridades administrativas que tenham atribuição
legal para iniciar investigações).
Na hipótese, o agente comunica à autoridade a prática de crime ou contravenção penal que não
se verificou.
Ao contrário do que ocorre no crime de denunciação caluniosa, não há no delito em estudo a
imputação a uma pessoa determinada da prática de crime. Se assim suceder, estará caracterizado o crime
de denunciação caluniosa.

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Direito Penal

17.2.2. Consumação e tentativa


É crime formal, que não exige, para sua consumação, resultado naturalístico.
Consuma-se, portanto, o crime no momento em que a autoridade pratica alguma ação no sentido
de elucidar o fato criminoso. Semelhantemente ao crime de denunciação caluniosa, não se exige a efetiva
instauração de inquérito policial.
É possível a tentativa. Desse modo, se o agente fizer a comunicação falsa à autoridade, e esta
não iniciar as investigações por circunstâncias alheias à vontade dele, haverá tentativa.
17.3. Falso testemunho ou falsa perícia (art. 342 do CP)
17.3.1. Conduta típica
Trata-se de crime de ação múltipla, pois três são as ações típicas:
a) “Fazer afirmação falsa”. Segundo a doutrina, cuida-se aqui da falsidade positiva, pois o agente
declara a ocorrência de fato inverídico.
Ex.: testemunha que, para forjar um álibi em favor do acusado, afirma falsamente que, no momento
do crime, ele estava em sua companhia.
b) “negar a verdade”. Essa modalidade constitui a chamada falsidade negativa, pois o agente tem
ciência da verdade, mas nega o que sabe.
Ex.: testemunha de acusação que nega falsamente que a vítima de homicídio tenha anteriormente
tentado estuprar a filha do acusado.
c) “calar a verdade”. É, segundo a doutrina, a chamada reticência. Aqui há o silêncio a respeito do
que se sabe ou se recusa em manifestar a ciência que se tem dos fatos. Há, assim, resistência por parte
do agente em declarar a verdade. Não há, ao contrário das demais modalidades, qualquer afirmação falsa
ou negativa.
Ex.: perito que omite dados relevantes ao elaborar o laudo pericial, de forma a criar prova benéfica
ao acusado.
17.3.2. Sujeitos do delito
Trata-se de crime de mão própria (de atuação pessoal ou de conduta infungível). Nesse passo,
somente pode ser cometido pelo sujeito em pessoa.
São sujeitos ativos desse delito a testemunha, o perito, o tradutor ou o intérprete. A Lei n o
10.268/2001 acrescentou um novo sujeito ativo, não previsto na antiga redação do dispositivo, qual seja, o
contador que atue em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial ou em juízo arbitral.
Se a testemunha não assina o compromisso de dizer a verdade, não pode praticar o delito em tela.
Portanto, é indispensável que seja reconhecida como testemunha, e não como simples declarante ou

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informante, pessoas estas que não narram seu entendimento sobre algo sem o compromisso de dizer a
verdade.
17.3.3. Consumação e tentativa
É crime formal, não exigindo, portanto, para a sua consumação, resultado naturalístico.
Consuma-se o falso testemunho com o encerramento do depoimento. Em tese, o crime consuma-
se no momento em que é proferido o falso; contudo, como o depoente pode retificar o que foi declarado até
o encerramento do depoimento, entende-se consumado o crime nesse exato instante.
17.3.4. Retratação (art. 342, § 2o)
No caso, o agente, antes da sentença no processo em que ocorreu o falso testemunho, declara a
verdade.
Na realidade, o crime já se consumou no momento em que o depoimento foi encerrado, contudo,
a lei faculta ao agente o direito de arrepender-se antes da prolação da sentença de primeiro grau, possibi-
litando com isso o esclarecimento da verdade dos fatos e, consequentemente, a extinção da punibilidade.
Trata-se, portanto, de condição resolutiva da punibilidade. Embora já consumado o crime, a puni-
ção depende, ainda, de o agente não se retratar ou declarar a verdade, oportunamente.
17.4. Favorecimento pessoal (art. 348 do CP)
17.4.1. Conduta típica
Comete este delito o agente que presta auxílio, de qualquer natureza, a quem acaba de cometer
um crime, com a finalidade de subtraí-lo à ação da autoridade, prejudicando a ação de autoridade pública
(policiais civis ou militares, membros do Judiciário).
O favorecimento pessoal é delito acessório, ficando sua tipificação na dependência da existência
de um crime antecedente, que pode ser de qualquer natureza (doloso, culposo, tentado ou consumado
etc.).
Não incidirá o crime de favorecimento pessoal quando em relação ao fato anterior: a) houver causa
excludente de ilicitude; b) já estiver extinta a punibilidade; c) houver escusa absolutória.
Se o agente autor do crime antecedente vier a ser absolvido por qualquer motivo (salvo na hipótese
de absolvição imprópria, em que é aplicada medida de segurança), o sujeito que o auxiliou não poderá ser
condenado pelo crime de favorecimento pessoal.
17.4.2. Consumação e tentativa
O crime consuma-se no momento em que, prestado o efetivo auxílio, o agente favorecido obtém
êxito em sua ocultação, ainda que momentaneamente. Trata-se, pois, de crime material.
É possível a tentativa, por exemplo, quando o auxílio chega a ser prestado, mas o agente

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beneficiário não se livra da autoridade.


17.4.3. Escusa absolutória (art. 348, § 2o)
Se quem presta o auxílio é ascendente, descendente, cônjuge ou irmão do criminoso, fica isento
de pena.
17.5. Favorecimento real (art. 349 do CP)
17.5.1. Conduta típica
O presente dispositivo visa a tutelar a administração da justiça, no sentido de punir o comporta-
mento daquele que auxilia o criminoso a tornar seguro o proveito do crime.
Comete este delito o agente que prestar a criminoso, fora dos casos de coautoria ou de receptação,
auxílio destinado a tornar seguro o proveito do crime.
Assim como o delito anterior, o favorecimento real também é delito acessório, ficando sua tipifica-
ção na dependência da existência de um crime antecedente, que pode ser de qualquer natureza (doloso,
culposo, tentado ou consumado etc.).
Para a incidência deste delito, o auxílio deve ser destinado a tornar seguro o proveito do crime,
referindo-se a qualquer vantagem alcançada com a prática do delito principal, podendo abranger:
a) o objeto material do crime, como o próprio bem subtraído;
b) o preço do crime, por exemplo, dinheiro que o homicida ganhou para matar alguém.
Não incide o delito se o agente desconhece a procedência criminosa do bem.
Se autor do crime antecedente for menor de idade ou já estiver extinta a sua punibilidade, pela
prescrição, por exemplo, continua sendo possível o favorecimento real, pois o objeto continua sendo pro-
duto de crime. A menoridade e a extinção da punibilidade apenas impedem a aplicação de sanção penal
ao autor do crime antecedente.

Somente haverá o crime de favorecimento real se o agente não estava previamente ajustado com
os autores do delito antecedente. Se houve prévio ajuste, o agente responderá pelo mesmo delito, em
concurso de pessoas.
17.5.2. Consumação e tentativa
O crime consuma-se no momento em que o agente presta auxílio, independentemente de saber se
o agente conseguiu ou não tornar seguro o proveito do crime anterior. Trata-se, pois, de crime formal.
É possível a tentativa.

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