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Eficácia das leis penais temporárias e excepcionais.

 
Lembram-se das leis temporárias e das leis excepcionais?

As primeiras podem ser conceituadas como aquelas leis com vigência


previamente estipulada pelo legislador, enquanto as segundas, por sua vez,
são aquelas promulgadas em casos de calamidade pública, guerras,
revoluções, epidemias etc.
  
Ultra-atividade das leis temporárias e excepcionais.
  Não podemos dizer que essas leis violam o princípio de reserva legal,
pois não se aplicam a fatos ocorridos antes de sua vigência.
 
Por outro lado, podemos afirmar que essas leis são retroativas, uma vez
que continuam a ser aplicadas aos fatos praticados durante a sua vigência,
mesmo depois de sua auto revogação.
 
O artigo 3° do nosso Código Penal, referindo-se a essas leis, deixa claro
que:
"A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua
duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato
praticado durante a sua vigência."
 
Sabemos, já, que a lei excepcional é revogada pela cessação das
circunstâncias que a determinaram, e as temporárias, pelo decurso do tempo
de sua duração, ocorrendo, nas duas hipóteses, a auto revogação da lei.
 
Embora auto revogadas, aplicam-se aos fatos ocorridos durante sua
vigência.
 
Imagine, por exemplo, que, durante uma revolução, o legislador coloque
como crime "passar em determinada ponte". Índio realiza a conduta punível e,
no transcorrer do processo, termina a revolução, ocorrendo, assim, a auto
revogação da lei penal excepcional.
 
Pode o sujeito ser condenado? Sim, uma vez que a lei excepcional,
embora cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato
praticado durante sua vigência. É ultra ativa.
Fundamento.

 A Exposição de Motivos do Código Penal de 1940 traz a razão da ultra


atividade das leis temporárias e excepcionais. Determina que:
 
"Visa a impedir que, tratando-se de leis previamente limitadas no tempo,
possam ser frustradas as suas sanções por expedientes astuciosos no sentido
de retardamento dos processos penais."
 
Não seria o artigo 3° do CP inconstitucional em razão do princípio da
retroatividade da lei mais benéfica?
 
O princípio da retroatividade da lei mais favorável, embora seja
mandamento constitucional, não é aplicável às leis temporárias e excepcionais,
quer incriminem um fato novo, quer aumentem a punibilidade de fatos já
definidos pela norma ordinária.
 
A razão é evidente. Se o criminoso soubesse que aquelas leis,
destinadas a desaparecer após certo tempo, perderiam sua eficácia, utilizaria
todos os meios para iludir a sanção, principalmente quando o término de sua
vigência pelo decurso de seu período de duração ou de suas circunstâncias
determinadoras estivesse prestes a acontecer.
 
Se a lei temporária não tivesse eficácia após o decurso do lapso
temporal pré-fixado, todos aqueles que tivessem desobedecido à sua norma
nos últimos dias de vigência ficariam impunes, pois não haveria tempo hábil
para a processamento da ação e aplicação da sanção.
 
Isso traria graves injustiças, pois alguns seriam condenados, outros,
não, restando prejudicada a função intimidativa da lei.
 
Flávio Augusto de Barros diz que o problema, em verdade, é de
atipicidade, e não de direito intertemporal.
 
Vejam! No crime de furto, a pena é aumentada de um terço, se o crime é
praticado durante o repouso noturno. Não é porque o sol desponta que poderá
ser excluída essa qualificadora. Afinal, o crime foi cometido diante de uma
circunstância temporal.
 
O mesmo ocorre nas leis temporais e excepcionais. Nelas, temos que
analisar o tempo como fator de punibilidade. A referência temporal acaba
sendo elementar da norma ou condição de maior punibilidade. O preceito
secundário (sanção) há de se aliar ao preceito primário, porque a conduta por
este descrita foi cometida durante certo período, ou durante certa situação.
Passado esse período ou essa situação, verifica-se a ausência de elementos
do tipo temporais exigidos pela lei intermitente.
 
 Normas penais em branco e direito intertemporal.
 
 Como já estudamos, as normas penais em branco são aquelas que
devem ser complementadas por uma outra norma.
 
Imaginem que a norma que complementa a norma penal em branco
venha a ser modificada, favorecendo o sujeito. Deverá ou não retroagir?
 
Um exemplo: Lucimar vende mercadoria por preço superior ao tabelado,
praticando crime contra a economia popular. No transcorrer do processo, surge
uma nova tabela, aumentando o preço da mercadoria, além do cobrado pelo
sujeito.
 
Havendo a modificação do complemento da norma penal em branco, a
favorecer o vendedor processado, a norma deve retroagir nos termos da
"abolitio criminis"? A nova tabela não estaria deixando de considerar crime o
fato praticado pelo agente?
 
Em verdade, a variação da norma complementar da norma penal em
branco só tem influência quando importe em real modificação da figura abstrata
do Direito Penal, e não nas hipóteses em que há mera modificação de
circunstância que, na realidade, deixa subsistente a norma.
 
No caso do tabelamento de preços, modificado esse, a norma penal
continua invariável, porque não ocorre alteração do objeto abstrato de sua
proteção legal.
 
A sujeito não responde pelo delito porque vendeu a mercadoria pelo
preço "A" ou "B", mas porque vendeu por preço superior ao tabelado.
 
Ao analisarmos a norma penal em branco, concluímos que ela é
constituída de duas partes:
 
1. Em parte é uma lei com vigência comum (disposição a ser
complementada).
 
  2. Na outra, deve ser atendida a excepcionalidade ou temporariedade
(complemento).
 
A primeira parte não possui excepcionalidade ou temporariedade. Já a
segunda pode ter aqueles caracteres que lhe dão ultra-atividade.
 
Imagine que seja revogado o próprio art. 269 do CP (norma penal em
branco). Nesse caso, não podemos falar em ultra-atividade em relação aos
fatos praticados durante sua vigência. Afinal, a conduta deixa de ser ilícita, não
tendo a norma em branco (primeira parte) nada de temporária ou excepcional.
 
O mesmo não podemos afirmar se a doença não comunicada pelo
médico for retirada da listagem de notificação temporária.
 
Nesse caso, duas situações podem ocorrer:
 
1.. Se a doença constava do elenco por motivo de temporariedade ou
excepcionalidade, haverá ultra-atividade.
 
  2.. Se, no entanto, a doença fazia parte do elenco complementar por
motivo não excepcional, o caso é de retroatividade.
 
Do tempo do crime.
 
 Conceito.
  Quando se considera um delito cometido? Em que momento podemos
dizer que a infração foi praticada?
 
Responder a tais indagações mostra-se essencial, na medida em que a
determinação do tempo em que se considera praticado o delito não serve
somente para que possamos afirmar qual a lei que irá reger aquele fato, mas
também, para fixar a imputabilidade do sujeito.
 
Imagine que tenha realizado a atividade executiva do delito e, antes que
se produza o resultado, surge nova lei, alterando a legislação referente à
conduta punível.
Por exemplo: um sujeito pratica uma conduta descrita no artigo 121 do
CP, ou seja, dá um tiro na cabeça de seu desafeto, sob a vigência da lei "A".
No entanto, a vítima é levada ao hospital, vindo a falecer somente dez dias
depois, já na vigência da lei "B".
 
Qual a lei a ser aplicada? A lei do tempo da atividade ou a em vigor por
ocasião da produção do resultado?
 
Também, é necessário fixar o momento da prática do crime para efeitos
de apreciação de seus elementos subjetivos, circunstâncias, prescrição, anistia
etc.
 
 Teorias.
  Há três teorias a estipular qual o tempo do crime.
 
A primeira é denominada de teoria da atividade, que fixa o tempo do
crime no momento em que o agente executa a conduta criminosa (ação ou
omissão). É, justamente, o momento da prática da ação ou omissão.
 
Como exemplo, podemos mencionar o caso do estelionato. Em princípio,
aplica-se a lei vigente ao tempo em que o agente induz alguém em erro,
mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento (momento da ação),
sendo desnecessária a análise da norma em vigor quando, de fato, obtém a
vantagem ilícita em prejuízo alheio.
 
Temos, também, a teoria do resultado (do evento, ou do efeito), que
acredita que o tempo do delito é, justamente, o momento da produção do
resultado. Para essa teoria, o que importa é o momento da produção do
resultado (morte, no caso de homicídio) e não o momento da prática dos atos
executórios (ação).
 
Por último, ainda, temos a teoria mista (ou da ubiquidade), sendo o
tempo do crime tanto o momento da ação quanto do resultado. No crime de
homicídio, portanto, o tempo do crime seria tanto o momento da prática da
ação quanto o momento da produção do resultado.
 
Mas qual a teoria adotada pelo nosso Código Penal?
 
O artigo 4° determina que: "Considera-se praticado o crime no momento
da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado".
 
Assim, verifica-se que o nosso Código adotou, justamente, a teoria da
atividade. O mesmo também foi adotado pela lei dos Juizados Especiais
Criminais, em seu artigo 63.
 
De fato, é no momento da conduta que o agente manifesta sua vontade
de agir de maneira contrária ao ordenamento jurídico. É nesse momento que o
sujeito demonstra a vontade de concretizar os elementos do tipo, sobre que
recai o juízo de reprovabilidade.
 
 Questão.
  Imagine que um moço, uma hora antes de completar 18 anos,
esfaqueie seu desafeto, vindo esse a falecer um dia depois dele completar a
maioridade penal (18 anos).
 
De acordo com a teoria da atividade, o homicídio foi cometido antes do
agente alcançar a maioridade penal, quando, ainda, era inimputável (a gente
não podia entender o caráter ilícito do fato, nem determinar-se de acordo com
esse entendimento). Assim, não incidirá sobre ele, o juízo de reprovabilidade,
ou seja, ele não será considerado culpável.
 
 Efeitos.
  Coerentes com a teoria da atividade, temos as seguintes aplicações:
 
Deve-se aplicar a lei vigente ao tempo da conduta, salvo se a do tempo
do resultado for mais benéfica.
 
A imputabilidade é verificada ao tempo da conduta. Não podemos punir
o adolescente que, horas antes de completar 18 anos, atira em seu desafeto,
que somente vem a falecer depois de atingir a maioridade penal.
 
No crime permanente, em que a conduta tenha se iniciado sob a
vigência de uma lei, prosseguindo sob o império de outra, aplica-se a lei nova,
mesmo que mais severa.
 
Isso ocorre porque, no crime permanente, há uma ofensa contínua ao
bem jurídico protegido, pois a conduta, em verdade, continua sendo executada
após a entrada em vigor da nova lei.
Como exemplo, podemos mencionar o sequestro. Imagine que Fred
Morte tire a liberdade da vítima com o fim de obter certa quantia em dinheiro,
como preço do resgate. Enquanto Morte mantém a vítima no cativeiro, vem
nova lei, aumentando a pena do crime descrito no artigo 159 do CP. Vejam! Ele
continua praticando a conduta de privar a vítima de sua liberdade, não é
mesmo? Então, ele está praticando a conduta, também, quando da vigência da
nova lei.
 
Assim, deverá responder pela pena mais grave.
 
No crime continuado, se surge lei mais severa, agravando a pena para
aqueles crimes que estão sendo cometidos em continuidade, e o sujeito
continua praticando aquelas mesmas condutas, aplica-se a lei nova a toda
série delitiva. Afinal, o sujeito já sabe que será maior a reprimenda. Assim,
praticando novas condutas, está aceitando a agravação da pena.
 
O exemplo mencionado em aula foi, justamente, o caso do zelador que,
de 15 em 15 dias, subtraía parte da aposentadoria de um velhinho, morador do
prédio.
 
No crime habitual, aplica-se também a nova lei, mesmo que mais
severa, caso o agente continue reiterando a conduta criminosa. Como exemplo
podemos mencionar os crimes de casa de prostituição e o charlatanismo.
 
A medida de segurança, por sua vez, é regida pelo princípio da
anterioridade. Surgindo, assim, após a prática do crime, medida de segurança
que venha a prejudicar o réu, ela não poderá ser aplicada.
 
Eficácia da lei penal no espaço.
 
Direito Penal Internacional.

Princípios.
 
A lei penal é feita justamente para viger dentro dos limites em que o
Estado exerce sua soberania. Assim, se cada Estado possui sua própria
soberania, deverá haver a delimitação espacial de seu âmbito de eficácia, para
que um Estado não invada a soberania do outro.
 
O direito penal internacional é o conjunto de princípios e normas que
disciplinam os conflitos de lei no espaço. Embora seja denominado direito
internacional, em verdade, trata-se de direito público interno, disciplinado no
próprio Código Penal, dos artigos 5° ao 9°.
 
Já o direito internacional penal é o ramo do direito que visa a cominar
penas aos Estados infratores da lei penal. Podemos dizer que, nesse conceito,
ingressariam os crimes de guerra, contra a paz, contra a humanidade, de
discriminação racial etc.
O direito penal internacional existe na legislação interna de cada um dos
Estados. Existe, justamente, para regular os conflitos de leis penais no espaço,
ou seja, para as hipóteses em que um crime lesionar bens jurídicos de dois ou
mais países.
 
Existem cinco princípios, previstos no Código, para tentar solucionar os
conflitos penais no espaço. São eles:
 
1.. Princípio da territorialidade.
 
  2.. Princípio da nacionalidade.
 
  3.. Princípio da defesa.
 
  4.. Princípio da Justiça Penal Universal.
  
5.. Princípio da representação.
 
Estudemos cada um deles.
 
a.. Princípio da territorialidade.
 
  Segundo esse princípio, a lei penal somente tem aplicação no
território do Estado que a criou.
 
Também é conhecido como princípio territorial exclusivo ou absoluto,
uma vez que exclui a aplicação da lei penal de um país fora de seu território.
 
Tem por fundamento os aspectos processual, repressivo e
internacional.
 
Processualmente, seria muito difícil processar-se um cidadão em país
diverso daquele em que o delito foi praticado.
 
Pelo aspecto repressivo, a aplicação da sanção penal em outro local
que não o da prática da infração excluiria a função intimidativa da pena.
 
Sob o aspecto internacional, o monopólio do direito de punir, que
pertence ao Estado, em seus limites territoriais, exclui a interferência de outro,
tutelando-se, assim, o princípio da soberania.
 
Geralmente, as legislações penais adotam a territorialidade como
princípio fundamental. No entanto, temperam o seu rigor permitindo a aplicação
de outros princípios.
 
  b.. Princípio da nacionalidade.
 
  Segundo tal princípio, a lei penal do Estado é aplicável a seus
cidadãos, não importando onde eles se encontrem. O que importa é a
nacionalidade do sujeito.
 
Tal princípio também é denominado de princípio da personalidade,
porque o Estado entende pessoal a norma punitiva e a aplica ao nacional.
 
Seu fundamento é que o cidadão, mesmo que se encontre no
estrangeiro, deve sempre obediência às leis de seu país.
 
O princípio da nacionalidade, ainda, divide-se em:

Princípio da nacionalidade ativa e passiva.


 
No caso da nacionalidade ativa, a lei nacional se aplica ao cidadão
que comete crime no estrangeiro, independentemente da nacionalidade da
vítima.
 
Por sua vez, o princípio da nacionalidade passiva exige que o fato
praticado pelo nacional no estrangeiro atinja um bem jurídico de seu próprio
Estado ou de um outro cidadão desse mesmo Estado.
 
Por esse último princípio, um crime praticado por um brasileiro, na
Argentina, somente seria punido pela nossa lei se houvesse lesão a um bem
jurídico do Brasil ou de outro brasileiro.
 
  c. Princípio da defesa (real ou da proteção).

 
Tal princípio leva em conta a nacionalidade do bem jurídico lesado pelo
crime, sem se importar com o local de sua prática ou com a nacionalidade do
agente.
 
Esse princípio, ultimamente, tem sido prestigiado, uma vez que os
Estados sentem necessidade de proteger seus interesses que, muitas vezes,
acabam sendo lesados pelos estrangeiros.
 
 
d. Princípio da justiça penal universal (princípio universal, da
universalidade da justiça cosmopolita, da jurisdição mundial, da
repressão universal e da universalidade do direito de punir)
 
 
Determina o poder de cada Estado punir qualquer crime, pouco
importando a nacionalidade do delinquente e da vítima, ou onde foi ele
praticado. Para que ao sujeito seja imposta uma pena, basta encontrar-se
dentro do território de um país.
 
 e.. Princípio da representação
 
 Em razão desse princípio, a lei penal de determinado Estado também é
aplicada aos delitos cometidos em aeronaves e embarcações privadas, quando
realizados no estrangeiro e aí não venham a ser julgados.
 
 Princípios adotados pelo CP.
 
 Quais os princípios adotados pelo Código Penal?
 
Como regra, adotou-se o princípio da territorialidade, sendo os demais
exceções.
 
O artigo 5° do CP traz, justamente, a regra, ou seja, o princípio da
territorialidade. O artigo 7°, inciso I, e parágrafo 3° do CP, adotou o princípio da
proteção (real). Já o art.7°, inciso II, alínea "a", o princípio da justiça universal.
 
Por sua vez, o inciso II, "b", desse mesmo artigo 7°, adotou o princípio
da nacionalidade ativa, e a alínea "c", o da representação.

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