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Distinção entre Direito Penal principal e Direito Penal secundário.

A questão está em saber qual é o critério e por onde passa a linha de fronteira que permite
separar o direito penal principal do Direito Penal secundário.

Esta questão só se coloca porque, temos Direito Penal fora do Código Penal. Ou seja,
temos Direito Penal, temos normas incriminadoras, temos comportamentos puníveis com
penas de prisão ou com penas de multa fora do Código Penal.

Atenção: a multa, enquanto sanção jurídica penal é caracterizada por ser susceptível de
ser transformada em dias de prisão.

Assim, a questão é desde logo saber que critério é que preside a esta distinção entre
Direito Penal principal e secundário. Ora, uma das vias é considerar como Direito Penal
principal o que está vertido no Código Penal, e Direito Penal secundário o que se encontra
em legislação Penal avulsa. Este é o critério formal. Ou seja, o critério que tem apenas
por base a fonte da norma Penal. Obviamente, que a este critério formal e estão
subjacentes outras razões. O principal argumento prende-se com a decisão do legislador
baseada na axiologia Penal. O legislador terá auscultado a Comunidade, terá observado a
comunidade, terá e estudado a comunidade, e em função disso concluiu que nesse
momento, para essa comunidade, os bens jurídicos mais importantes foram os que verteu
de forma negativa no Código Penal.
Diz-se de forma negativa, porque o Código Penal representa um repositório dos valores
essenciais da nossa comunidade. Mas, de facto o que se encontra no nosso Código Penal
não são valores. São comportamentos desvaliosos. Não se encontra no nosso Código
Penal uma afirmação de que determinado valor é essencial. Ou, sequer se encontra quais
são os valores da comunidade. Essa identificação Estado e uma forma negativa, na
medida em que o legislador resolveu incriminar determinados comportamentos
violadores de valores. E, assim ficámos apercebera que por trás de cada tipo incriminador
há um bem jurídico.

Portanto, por trás de cada norma proibitiva, ou por trás de cada normas sancionatório,
existir uma norma impositiva (quem não está escrita, mas se que retira) que é norma que
obriga a respeitar o valor. Ou seja, aquilo que temos na parte especial do Código Penal é
uma listagem dos bens jurídicos essenciais da nossa comunidade, apresentado de uma
forma negativa. O legislador penal afirma determinado bem jurídico, incriminando a
conduta que o lesa ou coloca em perigo.

Outros autores dizem que pelo facto de as matérias estarem arrumadas no Código Penal
ou em legislação avulsa não é significativo para se afirmar estar perante Direito Penal
principal ou direito penal secundário. Assim, não deve ser o critério formal a fonte a
determinar se é Direito Penal principal ou secundário. Antes, deve-se atender à natureza
e relativa importância do bem jurídico em causa. Isto porque, o Direito Penal principal
deve ser aquele que protege os bens jurídicos mais importantes da comunidade, enquanto
os outros bens jurídicos menos importantes integrarão o direito penal secundário.

Então, dizem estes autores que o critério da relativa importância do bem jurídico permite
dizer que é Direito Penal principal, não tendo em conta a fonte formal da norma mas a
importância do bem jurídico.
Há uma terceira tese, defendida pelo Dr. Figueiredo Dias, que tem um consenso entre as
duas teses anteriores, aproveitando o que têm de bom e rejeitando o que é mais negativo.

Em relação ao argumento formal não deve ser de todo desprezado, porque é óbvio que
quando o legislador decidiu que esta iria ser a parte especial deste Código Penal, teve por
base um trabalho importantíssimo (axiologia Penal) e, portanto, tem de ter algum relevo
o facto de determinada norma incriminadora se encontrar no Código Penal.

Assim, o Dr. Figueiredo Dias começa por aceitar o critério formal. Mas, também é
verdade que determinados comportamentos incriminadores violam bens jurídicos, alguns
tão importantes, ou mais, do que outros previstos na parte especial do Código Penal.

Em conclusão, todo o Direito Penal que está previsto no Código Penal, parte especial, é
Direito Penal principal formal. Fora do Código Penal há também Direito Penal principal
material.
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Como é que o Código Penal concilia a questão das penas e das medidas de
segurança?

Vimos até agora que o Código Penal prevê penas e medidas de segurança. Isto quer dizer
que, em sentido amplo, o Código Penal é dualista (não tem a ver com a fundamentação
dualista ou monista dos bens jurídicos).

Num sentido amplo o Código Penal é dualista, porque além das penas prevê medidas de
segurança. Ou seja, prevê duas formas de reacção criminal. Mas, há ainda outro aspecto
do qual podemos falar em monismo e dualismo, que é bastante mais complexo. Essa
questão tem a ver com a relativa autonomia que existe, ou não, entre penas e medidas de
segurança.

Neste aspecto, será monista o sistema que permita apenas penas para os imputáveis e
medidas de segurança para os inimputáveis. Será dualista o sistema que admita penas e
medidas de segurança para os imputáveis, embora admita, ou não, medidas de segurança
e penas para os inimputáveis.

Enquanto, no sentido amplo, o Código Penal é dualista Porq prevê penas e medidas de
segurança. Em sentido restrito, será dualista ou monista?

Será monistas se as penas se aplicarem exclusivamente a imputáveis e as medidas de


segurança exclusivamente a inimputáveis.

Será dualista se aos imputáveis, além das penas, aplicar-se também medidas de segurança.

No nosso Código Penal há duas figuras que merecem a atenção para responder a esta
problemática. De a solução que dermos para estas figuras, irá resultar a conclusão final
sobre o monismo ou dualismo..

Essas duas figuras são:

- internamento de imputáveis portadores de anomalia psíquica (art.º 104). Isto é


uma pena, ou uma medida de segurança?
Ele é imputável.
Se for uma pena, partimos da consagração do monismo.
Se for uma medida da segurança, concluímos que a um imputável foi aplicada uma
medida de segurança.

É óbvio que é uma pena cumprida de forma diversa das outras penas. É uma pena.
porque a pessoa foi considerada imputável. É uma pena porque sairá da situação de
internado quando se esgotar o tempo de pena a que foi condenado, e não quando
cessar a sua perigosidade (conforme resulta da parte final do número um do art.º
104.º). Ou seja, o tempo de internamento está calculado em função da sua
imputabilidade. Não em razão de a sua perigosidade.

Assim, é uma verdadeira pena. A única diferença é que não vai cumprir a pena no
estabelecimento prisional normal. Vai cumprir a pena num estabelecimento que o
protege do regime prisional, ou que protege o regime prisional dele.

Assim, não é por esta figura que o Código Penal passa a ser dualista.

- pena relativamente indeterminada (art.º 83 e seguintes).


Quando as pessoas são condenadas a uma pena devem saber exactamente o tempo de
prisão a que são condenadas. E isso é uma exigência do princípio da legalidade. Não
sendo assim significaria uma denegação de Justiça por parte do juiz.

Para os pressupostos definidos na parte final do número ou do art.º 83, difícil se torna
perceber se estarmos face a uma pena ou a uma medida de Segurança.

Aqui temos elementos que respeita às penas e elementos que respeita às medidas de
segurança. Ou seja para que o juiz aplique uma pena relativamente indeterminada, tem
que entrar em linha de conta com a avaliação conjunto dos factos praticados (isto refere-
se às penas), e da personalidade do agente (isto refere-se às medidas de segurança. Já que
"revela uma acentuada inclinação para o crime..." - isto é a perigosidade).

Se for uma pena, há de estar sujeita ao critério da culpa.

Se for o uma medida da segurança, há de e escapar ao critério da culpa.

A questão é saber qual o critério da culpa que se deve estabelecer para fazer a passagem
do art.º 83.
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A questão que estamos a discutir é a de saber se, em sentido restrito, o nosso sistema é
um sistema monista ou dualista. Ou seja, se prevê uma dupla via de reacção para o
imputável, ou se prevê apenas uma forma de reacção. O mesmo é dizer se as medidas de
segurança se podem a aplicar ao imputável, ou se para o imputável só há penas, e as
medidas de segurança são para os inimputáveis.

Vimos que havia duas figuras que iriam decidir da nossa resposta em relação a esta
questão:
- a primeira que era relativamente ao artigo 104º e seguintes (do internamento de
imputável em estabelecimento de inimputáveis)

- a segunda era precisamente a pena relativamente indeterminada.

Em relação ao internamento de imputável em estabelecimento de inimputáveis vimos que


se trata, aí, de verdadeiras penas. Unicamente são cumpridas fora do espaço
tradicionalmente reservado a esses. Aliás, se virem o art.º 108 de do Código Penal, as
alterações ao regime normal de execução da pena no que dispõem os preceitos anteriores
deste capítulo, condenam logo que a anomalia psíquica do agente foi simulada.

Portanto, o próprio código entenda que se trata de alterações ao regime normal da


execução da pena. Há aqui verdadeiramente uma pena, que resulta da parte final do
número um do art.º 104º, e ou mesmo no art.º 105º, o que consubstanciam verdadeiras
penas. Ou seja, e está aqui em causa a culpa do agente, e não a sua perigosidade.

Embora, uma perigosidade posterior, que não se reflectirá, de forma alguma, na sanção
(porque as sanção é uma pena). Perigosidade essa, não é em relação ao bem jurídico, mas
em relação ao sistema, a aconselham o internamento e as medidas previstas no art.º 104
e seguintes relativamente ao cumprimento da pena.

Outra questão que começarmos a analisar é a da pena relativamente indeterminada.


Conforme se viu, este regime de pena relativamente indeterminada vem já do projecto do
Dr. Eduardo Correia elaborado em 1967. É aí que pela primeira vez aparece no nosso
sistema jurídico a ideia da pena relativamente indeterminado. Hoje nós temos a pena
relativamente indeterminada prevista para duas situações:

- os delinquentes por tendência (art.º 83 e 84)

- os alcoólicos ou equiparados (art.º 86 e seguintes)

No projecto de 1967 previa-se ainda, a pena relativamente indeterminada para outras


situações que tinham a ver com a vadiagem, mendicidade, actos contra a natureza, a
prostituição e ainda os alcoólicos e equiparados.

A questão que vamos discutir, a propósito da pena indeterminada, é a de saber se há aqui


uma pena, se há uma medida de segurança, ou afinal o que existe. O ponto de partida da
nossa exposição será de mais fácil assimilação se tratarmos de uma situação concreta:
o que é que se passa na pena relativamente indeterminada?
Dado que no momento da prática do facto (e isso resulta claramente do art.º 83 e
seguintes) a pessoa não era inimputável (ou seja, era imputável), então pela prática
daquele facto vai-lhe ser aplicada uma pena. Antes de aplicar a pena relativamente que
indeterminada o juiz vai ter que fixar a pena que, concretamente, aplicaria em função da
culpa do agente, em função das necessidades de prevenção e de ressocialização do
indivíduo.

Exemplo: António será acusado pelo crime de homicidio. Foi julgado e condenado pelo
crime de homicidio.
Chegou ou momento de determinar a pena concretamente aplicável.
O homicidio é punível, nos termos do art.º 131 do Código Penal, em pena de oito a 16
anos de prisão. Ou seja, o juiz quando em função da culpa do agente, em função das
necessidades de prevenção, em função das necessidades de ressocialização, quando fixar
a pena terá de a fixar entre os 8 e os 16 anos. Isto é o que diz o legislador. Fixar o limite
mínimo e o limite máximo compete ao legislador. Fixar a pena concreta compete ao
julgador em função dos critérios político criminais adoptados no nosso Código Penal.
Imaginemos que o juiz (se não houvessem pena indeterminada) fixa a pena em 12 anos
de prisão. Se não houvessem pena relativamente indeterminada, o juiz a aplicaria 12 anos
de prisão pelo crime de ao homicidio simples.

Como é que se tal como a pena relativamente indeterminada?

De acordo com as regras do art.º 83/2: "a pena relativamente indeterminada tem ou
mínimo correspondente a dois terços da pena de prisão que concretamente que haveria ao
crime cometido".

Portanto, a pena de prisão que concretamente que haveria ao crime cometido são 12 anos.
Se a pena relativamente indeterminada tem um mínimo equivalente a dois terços de 12
anos - seria de 8 anos. E tem um limite máximo correspondente a 12 anos a acrescida de
seis anos, sem no entanto exceder os 25 anos. Logo, aqui uma limite máximo seria 18
anos (12 anos mais seis anos).

É suposto que achemos, em primeiro lugar, a pena que concretamente o juiz aplicaria ao
agente (neste exemplo - 12 anos).

Como se vai aplicar uma pena relativamente indeterminada, então ele tem uma pena de
prisão entre os 8 e os 18 anos. Portanto, a pessoa não vai ser condenada a uma pena
concreta, exacta. Vai ser condenado a uma pena de prisão que vai dos oito aos 18 anos.

A questão que agora se coloca é esta:


se a pena é calculada ser em função da culpa, e se vigora o princípio (sem excepção) de
que a pena nunca pode ir para além da culpa (embora possa ficar aquem da culpa). Então,
significa que, no nosso exemplo, destes oito aos 16 anos o único espaço da pena que está
coberto pela culpa é o que vai dos oito aos 12 anos.
Assim, dos oito aos 12 anos podemos falar de pena, Porto que se a culpa do agente, pela
prática daquele facto, dita 12 anos de prisão, então a terra aos 12 anos de prisão há uma
pena, porque está suportada por uma culpa.
Agora, a partir dos 12 anos de prisão já não há culpa que acompanhe esta "pena". Como
a culpa é a medida da pena, a partir do os 12 anos já não se pode falar em pena.

Assim, a pena relativamente indeterminada tem uma natureza jurídica mista de pena e de
medida de segurança. Ou seja, na pena relativamente indeterminada o nosso sistema
jurídico e está a aplicar, simultaneamente, a uma pessoa uma pena e o uma medida de
segurança. Daí que se diga que o nosso sistema, em sentido restrito, é tendencialmente
monista. É de base monista, embora tínhamos aqui uma expressão do dualismo.

Por que é que entendemos que é um misto de pena e medidas de segurança?

Já vimos que não pode ser tudo pena, porque a culpa é o limite da pena.
Também não se pode defender que tudo é uma medida de segurança, porque, desde logo,
a pessoa foi considerada imputável no momento da prática do facto. Se é imputável
merece uma pena e não uma medida de segurança.
Por outro lado, há a definição de uma pena concreta. Ora, e isso só é possível em relação
a imputáveis. Nunca é possível em relação a inimputáveis. Além disso, esta pena
relativamente indeterminada não cessa com a perigosidade do agente.

Portanto: pena, no todo, não é; medida de segurança, no todo, não é.

Então, entende-se que o período que vai desde o limite mínimo da pena relativamente
indeterminada até à pena que concretamente seria aplicada é uma pena no verdadeiro
sentido do conceito. Aquilo que vai da pena que concretamente seria aplicada até ao limite
máximo da pena relativamente indeterminada é medida de segurança.

Por isso se diz que o art.º 83/1, na parte final, visa a sancionar duas coisas:
- a culpa do agente no momento da prática do facto
- a perigosidade do agente.

Isto é o que a doutrina, maioritariamente, refere em relação à pena relativamente


indeterminada.
No entanto, não foi este entendimento que inicialmente foi dado, e à autores que
defendem não ser isto que se passa ao nível da pena relativamente indeterminada.
Defendem que é uma pena. O que significa que defendem que o nosso sistema é o sistema
a absolutamente monista. Estes autores baseiam se no os elementos históricos.
Essencialmente nas posições do Dr. Eduardo Correia e no projecto de 1967, na sua nota
explicativa de 66 páginas. Ora, destas 66 páginas para nota explicativa, 40 falam da culpa
na formação da personalidade. Ou seja, o Dr. Eduardo Correia quis adoptar, quis
introduzir, esta questão da pena relativamente indeterminada como uma materialização
da ideia, por ele defendida, de culpa na formação da personalidade.
Para o Dr. Eduardo Correia as pessoas eram punidas essencialmente de acordo com a sua
personalidade.

O Dr. Eduardo Correia diz que as pessoas são obrigadas a moldar a sua personalidade de
acordo com aquilo que são os valores de a Comunidade. Quando as pessoas são punidas,
são no não tanto pelo facto que praticaram mas pela personalidade que não construíram
de acordo com os valores da Sociedade, e que acabaram por se manifestar na prática
daquele facto.

Na culpa no facto, o facto que é o princípio e o fim da responsabilidade criminal. Para o


Dr. Eduardo Correia o facto era apenas o trampolim que permitia punir o agente pela
personalidade. Ou seja, a prática do facto típico e ilícito era apenas o motivo que o
julgador precisava para chegar à personalidade do agente e o punir. Isto significa que a
culpa tinha uma dupla fundamentação. Ou seja, a pena baseava se numa culpa duplamente
suportada. Para o Dr. Eduardo Correia a culpa avaliava:
- a culpa no facto. Por que sem facto concreto não se chegaria à punibilidade
- a culpa na personalidade.

Nestes termos a pena relativamente indeterminada era uma verdadeira pena, já que (no
nosso exemplo) dos oito aos 12 anos punia a culpa no facto e dos 12 aos 18 anos punia
a culpa na personalidade.

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