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1.

Em março de 2006, C, exasperado com os maus resultados do seu clube,


agrediu o filho, D, com bofetadas e socos, deixando-lhe marcas visíveis no rosto
e no corpo. À data dos factos, a conduta de C era punida com pena de prisã o de
1 a 5 anos (artigo 152.º, n.º 1, alínea a) do Có digo Penal). Entretanto, antes da
realizaçã o do julgamento, foi publicada a Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro,
que agravou para 2 anos o limite mínimo da pena aplicá vel a tais crimes
quando cometidos contra menores e, além disso, veio prever a possibilidade de
o agente ser inibido do exercício das responsabilidades parentais por um
período de 1 a 10 anos (artigo 152.º, n.ºs 2 e 6 do Có digo Penal).
Imprimir o art.2º CP
a) Pronuncie-se sobre a aplicabilidade da lei nova ao caso sub judice.
Em matéria de Direito penal, é constitucionalmente proibida a aplicaçã o retroativa da lei
penal menos favorá vel (art.29º n4 CRP e art.2º n1 CP). Em principio aplica-se a lei penal
em vigor à data da prá tica do crime e a isso chamamos “tempus delicti” (art.3º CP). Só
assim nã o será de surgir uma lei nova de conteú do mais favorá vel ao agente, caso em que
esta ú ltima, por imposiçã o constitucional se aplica retroativamente. A isto chamamos de
princípio de retroatividade “in mitius” (art.29º n4 CRP art.2º n4 CP). Neste caso, a lei nova,
na medida em que agrava o limite mínimo da pena aplicada nã o se podia aplicar ao caso
sub judice mesmo que consagrasse a sua retroatividade pois tal seria inconstitucional.
b) Suponha que, no decurso do processo, uma nova lei veio eliminar aquela
circunstâ ncia agravante, punindo a violência doméstica contra menores com a
pena aplicá vel aos casos em que a vítima é um adulto (1 a 5 anos de prisã o). Em
virtude da reaçã o negativa a esta modificaçã o legal, considerada um “retrocesso
civilizacional”, à data do julgamento já o legislador tinha restaurado novamente a
pena agravada (2 a 5 anos de prisã o). Qual a lei aplicá vel ao caso?
No â mbito do Direito Penal o juiz deve considerar todas as leis aplicá veis ate o julgamento
e aplicar aquela que é mais favorá vel ao arguido – retroatividade in mitius. No caso em
apresso, nã o sendo nenhuma das leis intermédias mais favorá vel ao arguido, aplica-se a lei
em vigor à data da prá tica dos factos, ou seja, a lei 1.
c) Suponha que, em 2008, foi aprovada uma alteraçã o ao artigo 2034.º CC, pela qual
se acrescentou à previsã o legal uma nova causa de indignidade sucessó ria: ter o
sucessível sido condenado pelo crime de violência doméstica ou maus-tratos
contra o autor da sucessã o. Entretanto, em 25/11/2010, D foi atropelado
mortalmente quando ia a caminho da escola. Poderá C, condenado pelos factos
descritos, suceder na herança aberta por ó bito do filho?
De acordo com a doutrina do facto passado, a lei nova nã o se aplica a factos ocorridos
antes do seu inicio de vigência sob pena de retroatividade. BM considera esta forma
inexata pelo seguinte motivo: a lei nova pode aplicar-se a factos passados sem que tal
envolva necessariamente a sua retroatividade. Segundo o autor, tendo em conta que o
problema da aplicaçã o da lei no tempo, é no fundo o problema ade determinar a lei
competente importa distinguir entre factos determinantes da competência da lei e factos
abrangidos no campo da aplicaçã o da lei competente. Nã o sã o todos e quaisquer factos que
determinam a competência da lei, mas tao só e apenas os factos constitutivos,
modificativos ou extintivos de situaçõ es jurídicas. Isto posto, a teoria do facto passado
enquanto critério determinativo da competência da lei nova e nã o os factos a que esta se
aplica deverá ser formulada da seguinte forma. A lei nova nã o se aplica a factos
constitutivos, modificativos ou extintivos verificados antes do seu inico de vigência. Será
retroativa sempre que se aplique a factos passados por ela pró pria visados como factos
constitutivos, modificativos ou extintivos de situaçõ es jurídicas. Mas já nada impede que
uma vez determina a competência da lei nova com fundamento na circunstancia de um
facto constitutivo da situaçã o jurídica se passar sobre a sua vigência a mesma lei seja
aplicada a factos passados que ela assume como pressupostos positivos ou negativos
relativamente à questã o da validade ou admissibilidade da constituiçã o da situaçã o
jurídica, questã o essa que é da sua exclusiva competência. Aplicando ao caso concreto, a lei
nova que vem prever a condenaçã o em crime de violência domestica ou de maus tratos
contra o autor da sucessã o como causa de indignidade sucessó ria é a lei competente para
regular a situaçã o em apresso, a sucessã o por morte, pois o facto constitutivo da situaçã o
jurídica que determina a abertura da sucessã o tem lugar já sobre o seu império pois a lei
nova entre em vigor em 2008 e a morte ocorre em 2010. Nada obsta a que a lei nova, uma
vez estabelecida a sua competência, seja aplicada a factos passados que ela assume como
pressupostos da constituiçã o da situaçã o jurídica, nada impede que a lei nova, uma vez
fixada a sua competência, se reporte a factos anteriores que se verificaram antes do seu
inicio de vigência, utilizando como pontos de referencia para definiçã o do regime de
direito material da situaçã o jurídica criada na sua vigência. Fala-se aqui de retro conexã o.
Pertencem à categoria doa factos pressupostos as causas de indignidade sucessó ria, a
condenaçã o de C é um facto pressuposto. Em síntese, a capacidade sucessó ria, de uma
pessoa suceder a outra por morte desta ultima, avalia-se à data da morte do de cuis á luz
da lei em vigor nesse momento, o que corresponde à lei nova. Assim, C nã o poderá suceder
na herança aberta por ó bito do seu filho D.
4. A emprestou a B a quantia de 10.000€, tendo-se convencionado que o empréstimo teria
o prazo de dez anos e que os juros venceriam anualmente à taxa de 5%. Dois anos depois,
entrou em vigor um diploma legal que fixou em 4% a taxa de juro má xima para o mú tuo
civil, determinando-se que a nova taxa seria aplicá vel aos contratos celebrados
anteriormente à sua entrada em vigor e ainda em execuçã o.
a) B pretende que A lhe restitua aquilo que já pagou a título de juros e que ultrapasse a
taxa de 4%, alegando para o efeito que a nova lei é retroativa. Terá razã o?
Suscita-se um problema de aplicaçã o retroativa da lei. Nos termos do art.12º n1, em regra
a lei apenas dispõ e para o futuro, é o principio geral de nã o retroatividade da lei, apenas
gozando de eficá cia retroatividade nos casos em que esta lhe é atribuída e mesmos nesses
casos presume-se retroatividade de grau mínimo ficando ressalvados os efeitos já
produzidos pelos factos que a lei se destina a regular. Respeitam-se os efeitos de direito já
produzidos pela situaçã o jurídica já produzidos pela lei antiga. No presente caso, a lei nova
é de facto uma lei retroativa dado que determina a sua aplicaçã o a contrato celebrados
antes da sua entrada em vigor. Trata-se de uma disposiçã o transitó ria de caracter formal
ou remissivo. É uma disposiçã o que apenas se limita a determinar qual das leis, a lei antigo
ou a lei nova, é aplicá vel a determinadas situaçõ es. No caso em apresso, o legislador opta
pela lei nova para resolver o problema da sucessã o de leis, porém, contando que sejam
respeitados os limites constitucionais, nada impede o legislador de conferir eficá cia
retroativa à lei nova. Nã o nos situando nó s aqui, em qualquer das á reas em que a CRP
proíbe a retroatividade das leis nada parece obstar à atribuiçã o de retroatividade a este
regime jurídico. Assim, a lei nova, é aplicá vel ao contrato celebrado entre A e B. para
responder à questã o temos de averiguar o grau de retroatividade da lei nova e sendo que
nada é dito em sentido diferente a retroatividade da lei, quando exista, presume-se de grau
minino nos termos do art.12º/1 2º parte, o que significa que a lei nova conta a taxa
má xima de 4% apenas se aplica aos juros que se vença apos a sua entrada em vigor nã o
tendo qualquer efeito sobre os juros vencidos antes. Deste modo a pretensã o de B nã o será
atendida e A nã o terá de devolver aquilo que já recebeu de juro e que ultrapasse a taxa de
4%.
b) Suponha que a nova lei estabelecia que a taxa má xima de 4% seria aplicá vel a
todos os mú tuos civis, ainda que o mutuá rio tenha já sido condenado a pagar juros
a uma taxa superior por decisã o judicial transitada em julgado. Esta soluçã o legal é
admissível do ponto de vista constitucional.
Esta soluçã o legal importa o desrespeito de caso julgado anterior dado que ataca uma
decisã o judicial definitivamente transitada e julgada. O caso julgado consiste na
impugnabilidade de uma decisã o decorrer do seu transito em julgado. Transitado em
julgado, a decisã o deixa de ser suscetível de recorrer ordiná rio de declaraçã o tornando-se
por conseguinte definitiva e passando a ter força obrigató ria dentro e fora do processo. O
caso julgado é assim um meio técnico que permite operar a estabilizaçã o do resultado do
processo e a definitividade da resoluçã o de um litigio. Dentro das finalidades do direito, o
caso julgado prossegue a finalidade da segurança jurídica na sua dimensã o de certeza
jurídica. Esta soluçã o legal nã o é admitida pela CRP. O principio da nã o retroatividade da
lei que afeta o caso julgado embora nã o tenha consagraçã o constitucional expressa, pode
extrai-se dos seguintes preceitos: art.111º CRP – se a lei nova pudesse ser aplicada a
situaçõ es já definitivamente decididas pelos tribunais e transitadas em julgado e se
eventualmente o legislador discordasse de tais decisõ es jurisdicionais, poderia fazer novas
lais, que aplicando-se a casos julgados, traduziriam uma interferência na funçã o legislativa
jurisdicional, violando-se deste modo, o principio da separaçã o de poderes; art.242º/3
CRP- se se considera que os casos julgados como base na lei antiga constitucional nã o
podem ser atacados, por maioria de razã o, também se considerara que os casos decididos
com base numa lei antiga cuja constitucionalidade nã o foi sequer questionada nã o possam
ser postos em causa porque o legislador fazendo uso do seu poder de auto revisibilidade
entendeu revogar a lei antiga e fazer uma lei nova para regular a situaçã o. Em suma, esta
soluçã o legal nã o é admissível do ponto de vista constitucional, a norma da lei nova que
viola o principio da separaçã o de poderes e é contraria à CRP segundo o argumento de
maioria de razã o. Se por força do 242º/3 num caso de inconstitucionalidade e ressalvado o
caso julgado, por maioria de razã o, a mesma soluçã o devera ser aplicada nos casos de
simples alteraçã o legislativa.

5. No domínio de vigência do Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de outubro, que aprovou o


Regime do Arrendamento Urbano (RAU), os arrendamentos para o comércio, indú stria ou
o exercício de profissã o liberal estavam sujeitos a escritura pú blica. Em 15/12/2005, A
decidiu tomar de arrendamento um andar para nele instalar o seu consultó rio médico.
Porém, apesar da norma que obrigava à celebraçã o de escritura pú blica, limitou-se a
outorgar um documento particular com reconhecimento de assinaturas, de modo a evitar
os pesados encargos notariais que impendiam sobre tais atos. Entretanto, a matéria do
arrendamento urbano sofreu profundas modificaçõ es, resultantes da aprovaçã o do Novo
Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro. Por
força deste diploma, passou a ser dispensada a celebraçã o por escritura pú blica, bastando
que o contrato de arrendamento fosse celebrado por escrito (artigo 1069.º CC), soluçã o
que foi mantida pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto.
a) Diga, justificando, se o contrato de arrendamento celebrado por A é vá lido.
Nã o, a lei nova dispondo sobre os requisitos de validade formal do ato, só se aplica a
contratos celebrados apó s a sua entrada em vigor nos termos do art.12º n2 1º parte,
estando em causa uma condiçã o de variá vel formal entende-se em caso de duvida que a lei
nova apenas visa os factos novos. A lei que regula a validade ou invalidade de quaisquer
factos é a lei vigente ao tempo da prá tica dos mesmos factos. Assim, ao contrato celebrado
por A aplica-se a lei antiga em vigor ao tempo da sua celebraçã o que exigia para a
conclusã o vá lida de contrato de arrendamento celebrado através de escritura pú blica. A
falta de observâ ncia desta forma determina a nulidade do contrato por vicio de forma nos
termos do art.220º. No entanto, poderia suscitar-se no caso, a hipó tese de estarmos
perante uma lei confirmativa tá cita. As leis confirmativas sã o as leis novas que, aligeirando
formalidade havidas por demasiado pesadas exigidas pela lei antiga vêm, confirmar os
atos praticados ao abrigo da lei antiga que nã o respeitavam essas mesmas formalidades
afastando a determinaçã o de nulidade ou anualidade dos mesmos. Quando a lei nova
expressamente confirma a validade dos atos anteriores, entã o a lei é retroatividade e
aplica-se aos atos anteriores e ficam assim convalidados. Porém, quando a lei nova nada
diz, quando nã o contem uma disposiçã o confirmativa de atos anteriores, parece que nã o
deverá admitir-se em mais que exista sempre uma confirmaçã o tácita dos atos praticados
só abrigo da lei antiga que nã o respeitarem as formalidades exigidas por esta ainda que
respeitem as formalidades exigidas pela lei nova. A regra devera ser a de que á s condiçõ es
de validade normal se aplica a lei em vigor à data do facto. BM defende ser de aplicar aqui
o principio da retroatividade in mitius, característica do Direito penal, isto é, sempre que a
lei nova seja mais favorá vel aos interesses dos particulares, sem prejuízo de uma
contraparte ou de terceiros, aplica-se uma lei nova.

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