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KALEVALA

"Terra de Kalevi" o Épico Finlandês em Prosa.


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Nadou como uma mãe d'água
RUNA I em todas as direções do mar, as-
NASCIMENTO DE VÄINÄMÖINEN. sustada com a luta dos ventos tem-
pestuosos, nadando incessante-

N O passado distante, exis-


tiu uma donzela muito
bela, conhecida como Fi-
lha do Éter, que viveu por muitas
eras nas vastas extensões do céu,
mente antes que seu primogênito
nascesse.
7
A mulher começou a chorar su-
avemente e expressou sua tristeza
sobre pradarias ainda não conheci- com estas palavras pesadas no co-
das. ração:
8
2
Contudo, sua existência se tor- "Sinto-me profundamente infe-
nou cansativa e triste, e ela acabou liz e amaldiçoada pela vida que te-
vivendo sozinha por muitas eras nho.
9
nos espaços infinitos acima da es- Como pude acabar nesta situa-
puma do mar, em uma solidão no ção? Deixei meu lar celestial no
éter. éter e vim habitar no meio do oce-
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Desesperada, ela desceu ao ano, onde sou jogada pelas ondas e
oceano, sinalizando sua carruagem balançada pelos ventos e águas.
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e deitando em seu leito. Só conheço dor e problemas
4
Então, o vento crescente de nesta vastidão salgada.
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uma tempestade violenta soprando Seria muito melhor para mim,
do leste chicoteou o oceano em on- ó Ukkoa, se eu fosse uma donzela
das, jogando-a para lá e para cá, no éter, em vez de me tornar uma
cercada pela tempestade e pelas mãe d'água neste mundo frio e
ondas ondulantes, incapaz de subir triste.
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à superfície. Cada movimento é doloroso e
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Por setecentos anos, ela vagou sinto sofrimento constante en-
pelo oceano, nadando aqui e ali, quanto permaneço nas águas e va-
consciente apenas do seu trabalho, gueio pelo oceano.
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antes que finalmente desse à luz Imploro a ti, ó Deus, gover-
seu primogênito, após nove anos nante dos céus, que venhas até
da existência humana. aqui e me ajudes a me livrar desse
sofrimento e trabalho de parto.

a
O Grande Espírito da mitologia finlandesa; sua morada é em Jumala.
Ukko – nome masculino que significa “velho” em finlandês
14 23
Venha o mais rápido possível, Aproveitando o local de nidifi-
para que possa me libertar dessa si- cação seguro, o pato colocou seis
tuação difícil e ajude esta donzela ovos de ouro e um de ferro, que a
indefesa!" mãe d'água chocou com o calor de
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Quando a donzela celestial pa- seus joelhos e ombros.
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rou de fazer suas súplicas, não de- Após três dias, os ovos eclodi-
morou muito antes que um belo ram, mas a mãe d'água ficou com
pato descesse dos céus e voasse fogo em suas veias, e a donzela
apressadamente em direção à mãe moveu seus ombros, sacudindo o
d'água. ninho e fazendo com que os ovos
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Ele voou para lá e para cá, pro- caíssem no oceano, onde se trans-
curando um lugar seguro para fa- formaram em fragmentos que se
zer seu ninho. uniram para formar a abóbada in-
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Ele procurou por uma colina ferior e superior da Terra e do Céu,
gramada ou por qualquer pedaço respectivamente.
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de vegetação que pudesse encon- Os raios da lua, a luz do sol e
trar, mas não teve sorte. das estrelas, e as nuvens também
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Infelizmente, ele não encon- foram formados a partir dos ovos.
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trou um lugar protegido ou ade- O tempo passou rapidamente,
quado para construir seu ninho em e o brilho do sol e da lua continuou
segurança. a iluminar os dias e as noites.
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Enquanto voava lentamente e E a filha do Éter, como uma
olhava ao redor, o pato começou a mãe d'água, nadou pelo mar com
pensar em voz alta e a debater con- as inundações diante dela e o céu e
sigo mesmo: oceano atrás.
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"Será que devo construir mi- Depois de nove anos, final-
nha morada nos ventos ou em meio mente no verão do décimo ano, ela
às enchentes? Certamente, os ven- ergueu sua cabeça acima da super-
tos iriam destruí-la e as ondas a le- fície, levantando sua testa das
variam para longe". águas para começar seus trabalhos
21
A filha do Éter, também co- de criação nas cristas de águas
nhecida como mãe d'água, levan- azuis e nas poderosas águas em
tou seus ombros e joelhos acima da desperdício diante dela.
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superfície do oceano para permitir Onde ela virou sua mão na
que o pato construísse um ninho água, uma colina fértil surgiu, e
seguro em sua proteção. onde ela descansou seu pé, ela faz
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Voando lentamente, o pato no- um buraco para os peixes.
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tou os ombros e joelhos da mãe Quando ela mergulhava nas
d'água e pensou que eram colinas águas, ela descia nas muitas pro-
gramadas no fundo do oceano. fundezas do oceano.
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Quando ela virou de lado, as Leve-me, tu, ó Sol acima de
margens niveladas subiram, e onde mim.
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sua cabeça apontava para a terra, Leve-me, tu, ó Ursa do céu.
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amplas baías e enseadas surgiram. Liberte-me desta escuridão e
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Quando nadava uma distância prisão triste, destes portais impró-
da costa e descansava de costas, prios, deste lugar estreito de des-
ela criava rochas e moldava recifes canso, desta morada escura e som-
ocultos, onde muitos navios nau- bria.
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fragaram e muitas vidas foram per- Deixe-me vagar pelo oceano,
didas. caminhar sobre as ilhas e na terra
33
Assim as ilhas foram criadas e seca.
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as rochas foram fixadas no vasto Quero caminhar como um an-
oceano. tigo herói, respirar o ar livre e ver
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Os pilares do céu foram plan- a lua ao entardecer, a luz prateada
tados e os campos e florestas fo- do sol e a Ursa Maior, para que eu
ram criados. possa contemplar as estrelas."
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As pedras quadriculadas de Quando a Lua se recusou a li-
muitas cores brilhavam sob o sol bertá-lo, o Sol não quis ajudar e
prateado e todas as rochas perma- nem a Ursa Maior ofereceu assis-
neceram bem estabelecidas. tência, ele sentiu seu fardo e sua
36
Mas Väinämöinena, o cantor vida se tornou apenas um aborreci-
velho e fiel, ainda não havia con- mento.
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templado a luz do sol ou visto o Então, ele decidiu explodir os
luar dourado. portais externos de sua escura e
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Ele demorou trinta verões e sombria fortaleza, usando seu
trinta invernos em sua masmorra, dedo forte, mas sem nome, para
pacífico na imensidão das águas abrir a fechadura resistente.
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no amplo seio do mar. Com os dedos do pé esquerdo
38
Por muito tempo, ele conside- e da mão direita, ele rastejou atra-
rou como não nascer para viver e vés dos portais maleáveis até che-
florescer nos espaços envoltos em gar ao limiar de sua morada.
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escuridão, em limites desconfortá- Ajoelhado na soleira, ele se
veis, onde ele não havia visto o lançou para frente, mergulhando
luar ou o sol prateado. nas profundezas do oceano, gi-
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Então ele clamou: rando com as mãos na água, explo-
40
"Leve-me, ó Lua, eu te rogo, rando seu novo ambiente ao nadar
leve-me. para o norte, sul, leste ou oeste.

a
O herói principal do Kalevala; o herói de Vainola (Vainola), cuja mãe, Ilmatar,
caiu do ar no oceano. Väinämöinen – nome masculino impronunciável em portu-
guês que significa “rio largo e de fluxo lento”.
Väinämöinën nasce. Nikolai Kochergin.

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Assim o nosso herói final- libertado da sua mãe Ilmatara, a fi-
mente chegou à água e descansou lha do Éter.
lá por cinco anos.
51
Depois, passou seis longos RUNA II.
anos e até sete anos no oceano, até SEMEAGEM DE VÄINÄMÖINEN.
o outono do oitavo ano.

E
52
ntão o velho Väinämöinen
Foi quando ele finalmente dei- emergiu com seus pés so-
xou as águas e chegou a uma costa bre uma ilha vasta e des-
desprovida de verdura em um pro- provida de vegetação, banhada
montório. pelo oceano.
53
De joelhos no chão ele plantou 2
Ele permaneceu na ilha por
seu pé direito na terra sólida, mo- muitos verões e invernos, refle-
vendo rapidamente suas mãos so- tindo longamente sobre quem de-
bre ela. veria semear a ilha e espalhar as
54
Em seguida, ele ficou ereto sementes.
para ver o sol, o luar dourado, a 3
Finalmente, ele pensou em Pel-
Grande Ursa e as estrelas. lerwoinenb, o primogênito das pla-
55
Esse nosso herói é Väinämöi-
nen, o maravilhoso mago, que foi

a
Ilmatar – nome feminino que também é derivado do finlandês “ilma”, que signi-
fica “ar”. Ilmatar é uma deusa semi-andrógina(?) dos céus. Ela é a mãe de Ilmari-
nen, Väinämöinen e Lemminkäinen.
b
O semeador das florestas.
8
nícies e pradarias, e um menino es- Este foi o trabalho de Pellervoi-
guio chamado Sampsaa, que deve- nen, o menino esguio Sampsa, em
ria semear a ilha deserta com as se- sua infância.
9
mentes da floresta. Neste momento, o herói cha-
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Pellerwoinen concordou e se- mado Väinämöinen se levanta para
meou diligentemente a ilha, espa- observar ao seu redor.
10
lhando sementes em todos os pân- Ele observa como as sementes
tanos, planícies, montanhas e va- plantadas por Sampsa estão cres-
les. cendo e como a colheita de Peller-
5
Logo, as sementes férteis brota- woinen está prosperando.
11
ram, as árvores da floresta cresce- Väinämöinen vê as árvores jo-
ram, as copas dos abetos aparece- vens se espalhando densamente e a
ram e os pinheiros se espalharam. floresta se tornando mais bonita.
6 12
Os vidoeiros surgiram de todos No entanto, ele percebe que o
os pântanos, os amieiros cresce- carvalho não brotou ainda.
13
ram no solo solto e as tílias no solo A árvore do céu ainda está dor-
maduro. mindo dentro da bolota, desfru-
7
Os zimbros também cresceram, tando de sua própria felicidade.
com bagas agrupadas nos ramos de
espinheiro.
Pellerwoinen semea. Nikolai Kochergin.

a
Um sinônimo de Pellerwoinen.
14
Por isso, Väinämöinen espera rico em cinzas que as donzelas ha-
por mais três noites e outros tantos viam lavado da água.
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dias. O carvalho cresceu com mui-
15
Ele espera até que uma semana tos galhos que se espalharam am-
tenha passado e examina o traba- plamente, elevando-o acima das
lho novamente. nuvens de tempestade.
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Infelizmente, o carvalho ainda Seus galhos se estendiam para
não havia crescido e não havia dei- as nuvens brancas no céu, e suas
xado sua morada de bolota. folhas eram tão densas que bloque-
17
Väinämöinen, um herói an- avam a luz do sol, os raios da lua e
tigo, estava observando quatro até mesmo a luz das estrelas no
donzelas à distância. céu.
18 26
As donzelas eram noivas da Väinämöinen, refletiu por um
água e ele viu uma quinta donzela momento e ponderou cuidadosa-
na praia macia e arenosa, cercada mente sobre como derrubar o po-
por grama orvalhada e flores, perto deroso carvalho que havia sido cri-
das florestas da ilha, estendendo- ado para seu deleite.
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se em direção ao mar. Ele pensou em como cortar os
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Algumas das donzelas esta- cem galhos da majestosa árvore.
28
vam ceifando, enquanto outras Ele refletiu sobre como a vida
juntavam o que havia sido cortado, dos homens e dos heróis seria triste
formando uma leira no prado. e como o lar dos habitantes do oce-
20
Do fundo do oceano, emergiu ano seria triste se o sol não bri-
um imponente gigante chamado lhasse sobre eles e se a luz da lua
Tursasa, que era forte e robusto. não os alegrasse.
21 29
Ele pisoteou e comprimiu toda Ele considerou que nenhum
a grama que as donzelas haviam herói poderoso havia nascido para
recolhido. derrubar o poderoso carvalho e
22
Enquanto isso, um fogo acen- cortar seus cem galhos.
30
deu-se dentro delas, fazendo as Depois de refletir profunda-
chamas subirem até o céu e redu- mente, Väinämöinen disse em voz
zindo as pilhas de grama a cinzas. alta: "Kapéb, filha do Éter, antiga
23
Nesse local, tenro espalhou as mãe do meu ser, Luonnotarc, mi-
sementes dos gigantes, plantando nha enfermeira e ajudante, em-
uma bolota que brotou rapida- prestem-me as forças da água, que
mente e se tornou um majestoso possuem grandes poderes.
carvalho, alimentado pelo solo

a
O mesmo que Iku-Turso. Um gigante maligno do mar.
b
Um sinônimo de Ilmatar, a mãe de Väinämöinen.
c
Uma das donzelas místicas e enfermeira de Väinämöinen
31 39
Conceda-me a força dos ocea- No entanto, é possível que es-
nos para derrubar este poderoso teja já sem vida ou em estado mo-
carvalho e arrancar esta árvore do ribundo, incapaz de fazer algo
mal, para que a luz do sol brilhe além de sucumbir."
40
novamente e a lua possa brilhar O herói pigmeu respondeu ao
mais uma vez." valente Väinämöinen: "Verdadei-
32
Imediatamente uma forma dos ramente sou um deus e um herói
oceanos surgiu, ergueu-se um he- das tribos que governam o oceano.
41
rói das águas. Vim até aqui com o propósito
33
Este herói não pertencia aos de derrubar o carvalho e cortar
maiores nem aos menores, mas ti- seus galhos com a minha machadi-
nha um tamanho longo como o nha."
42
dedo indicador de um homem e Väinämöinen, responde ao he-
mais alto do que a mão de uma mu- rói nascido no mar: "Devo lhe di-
lher. zer que nunca houve em ti a força
34
Ele usava um gorro, botas, lu- necessária, nem mesmo te foi con-
vas, listras e um cinto de cobre, cedida a capacidade para arrancar
além de carregar uma machadinha esse poderoso carvalho, para der-
com cabo do tamanho de uma mão rubar essa coisa maléfica, tam-
de mulher e uma lâmina com a lar- pouco para cortar seus cem ra-
gura de um dedo. mos."
35 43
O fiel Väinämöinen observou Enquanto ele terminava de fa-
o herói com atenção e perguntou: lar, suas pálpebras permaneciam
"És tu, senhor, divino ou humano? imóveis e o pigmeu já se transfor-
Qual destes apenas conheces? mara em um gigante poderoso.
36 44
Diga-me qual é o teu nome e Com apenas um passo, ele dei-
posição. xou o oceano e se estabeleceu
37
Pareces-te muito com um ho- como um herói nos campos da flo-
mem, tens o porte de um herói, resta ao redor.
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embora do comprimento do dedo Com sua cabeça perfurando as
indicador de um homem, tão es- nuvens e sua barba estendendo-se
casso quanto alto como casco de até os joelhos, seus cabelos caíam
rena." até os tornozelos e seus olhos e pés
38
Väinämöinen dirigiu-se nova- estavam a uma grande distância.
46
mente à figura emergente do oce- Seus ombros eram ainda mais
ano e expressou: "Eu acredito que distantes.
47
tu sejas um ser humano, descen- Sem perder tempo, ele come-
dente dos heróis-pigmeus. çou a afiar seu machado com seis
blocos duros de arenito e sete pe-
dras de amolar mais macias.
48 58
Com suas vestes longas e espa- Na Terra do Norte, a bela e es-
çosas batendo nos ventos do céu, belta donzela estava lavando um
ele se posicionou ao lado do carva- cocar na praia.
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lho. Ela batia suas vestes nas ro-
49
Com seu segundo passo, ele chas e enxaguava seu vestido de
chegou à terra escura e com o ter- seda nas águas de Pohyolaa.
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ceiro, alcançou os galhos do carva- Foi nesse momento que ela
lho. avistou as lascas sendo levadas pe-
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Usando seu machado afiado, los ventos e águas.
61
ele golpeou o tronco com um golpe Decidida, ela juntou as lascas
poderoso e o cortou com o se- em um saco e as levou para o an-
gundo golpe. tigo pátio.
51 62
Ao descer com a terceira vez, Lá, ela pretendia fazer flechas
faíscas voaram para cima, incendi- encantadas para o grande mago,
ando o carvalho. transformando as lascas em armas
52
Antes de descer pela quarta para o hábil arqueiro.
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vez, a árvore havia produzido cem Isso porque o poderoso carva-
ramos, sacudindo a terra e o céu ao lho havia caído, perdendo seus
cair. cem galhos, e era importante que o
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Seus galhos se estendiam para Norte pudesse ver o sol e o suave
o leste e as copas das árvores voa- brilho do luar, permitindo que as
vam para o oeste. nuvens mantivessem seus cursos e
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As folhas foram espalhadas a abóbada do céu fosse estendida
para o sul e os cem galhos foram sobre cada lago e rio, bem como
para o norte. sobre as margens de cada ilha.
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Aqueles que tomaram um ga- A beleza variada dos bosques
lho alcançaram o bem-estar eterno, surgiu e as florestas cresceram de
enquanto aqueles que se segura- maneira encantadora.
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ram no topo da árvore obtiveram o Vinhas e flores voltaram a bro-
poder da magia. tar.
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Aqueles que colheram a folha- Os pássaros voltaram a cantar
gem experimentaram um deleite nas copas das árvores, com alegres
que nunca cessou. tordos e cucos nas bétulas.
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Algumas lascas foram espa- Bagas cresceram nas monta-
lhadas e levadas para as terras do nhas, flores douradas apareceram
norte pelos ventos da tempestade e nos prados e diversas ervas de
correntes oceânicas. muitas cores surgiram, juntamente
com diversos tipos de vegetação.

a
A Terra do Norte; Lapônia.
A Àguia parabeniza Väinämoinën por sua sabedoria. Nikolai Kochergin.
68 71
Entretanto, lamentavelmente, Ele escondeu essas sementes
a cevada não está crescendo. em suas bolsas de confiança, feitas
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Väinämöinen, após partir re- de pele de esquilo, algumas delas
flete cuidadosamente. confeccionadas com pele de marta.
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Pelas margens das águas, en- Com pressa, espalhou as se-
controu seis sementes de cevada mentes e plantou rapidamente os
dourada, além de sete grãos ama- grãos de cevada nas margens das
durecidos na costa superior da águas de Kaleva, nas colinas e pla-
Terra do Norte, na beira da areia nícies de Osmab.
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do oceano. ouça! O chapim emite seus gri-
tos desordenados a partir do

a
Frequentemente usado para Kaleva.
b
álamo, dizendo: "A colheita de ce- pássaros, até eu posso descansar
vada em Osma e Vainolaa será im- sobre ela".
82
pedida, caso o terreno não seja de- Väinämöinen, traz consigo
vidamente preparado e a floresta seus grãos mágicos de cevada.
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nivelada, além da queima dos ga- Ele carrega consigo sete se-
lhos até se transformarem em cin- mentes de grãos em suas bolsas
zas." confiáveis, feitas de pele de es-
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Väinämöinen, decidiu cons- quilo e algumas de pele de marta.
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truir para si um machado com o Ele se apressa para semear
objetivo de cortar árvores na flo- suas sementes, espalhando os
resta. grãos de cevada com diligência.
75 85
Ele então começou a executar Enquanto o faz, ele diz para si
sua tarefa, limpando e nivelando as mesmo: "Eu as sementes da vida
árvores. estou semeando, por entre meus
76
Com grande habilidade, ele dedos abertos, com a ajuda do meu
derrubou árvores de todas as espé- Criador, neste solo enriquecido
cies, exceto a bétula, que ele dei- com cinzas, brotem e floresçam
xou como um local de descanso neste solo.
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para os pássaros. Mãe antiga, tu que vives
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Esse espaço especial foi reser- abaixo da terra e do oceano, a mãe
vado para que o cuco pudesse can- dos campos e florestas, traz um
tar com sua voz doce, já que esta é solo rico e faça a cevada florescer.
87
uma ave sagrada e os ramos da Peço-te que traga os grãos da
bétula são considerados sagrados. semente ao broto para que a ce-
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Uma águia desceu dos céus e vada possa crescer.
88
voou pelo ar para poder observar. A terra nunca produzirá ce-
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Então, ela disse: "Por que, an- vada madura e nutritiva sem ajuda.
tigo Väinämöinen, deixaste a Sua força nunca faltará se os doa-
bétula em pé e não a derrubou?" dores derem assistência, agracia-
80
Väinämöinen respondeu: rem a semeadura e agradecerem as
"Deixei a bétula em pé para que os filhas da criação.
89
pássaros pudessem descansar nela, Que a terra se erga do seu
e para que o cuco pudesse cantar sono, despertando da terra ador-
seu canto sagrado". mecida das eras.
81 90
A águia respondeu: "Seu jul- Que os grãos de cevada come-
gamento foi sábio ao deixar a cem a brotar, as folhas cresçam e
bétula em pé, como um lugar de os caules verdejantes se elevem.
91
descanso para os cucos e todos os Que as próprias espigas se de-
senvolvam e produzam cem vezes

a
A casa de Väinämöinen e seu povo; um sinônimo de Kalevala
mais, resultado de meu habilidoso verificar o resultado de seu traba-
e honesto labor em cultivar a la- lho com o arado e a semeadura.
99
voura e semeadura. Ele ficou satisfeito ao encon-
92
Ukko, tu ó Deus acima, tu, ó trar a cevada crescendo forte, com
Pai dos céus, que vives no alto do nós triplos e espigas de seis lados.
100
Éter; que limitas todas a nuvens do Väinämöinen, o idoso e leal,
céu; enviai nuvens de chuva do virou sua face e observou ao redor.
101
leste, nordeste, oeste e noroeste, e E eis que surge um cuco da
do sul uma quente nuvem; para primavera, que observa a graciosa
que do céu caia a chuva, e as nu- bétula e repousa sobre ela, can-
vens derramem seu mel, para que tando docemente: "Por que a
os espigas encham e amadureçam, bétula prateada foi deixada ilesa
e os campos de cevada farfalhem." enquanto toda a floresta foi cor-
93
Ukko, o pai dos céus, manteve tada?", questionou ao antigo
seu conselho no espaço da nuvem Väinämöinen.
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e deu bons conselhos no Éter. Ele respondeu: "Eu deixei a
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Ele enviou nuvens de diferen- bétula intocada para que pudesse
tes direções - do leste, nordeste, crescer sozinha, se tornando um lar
oeste, noroeste e sul - para unir e para ti, ó cuco de voz doce, para
costurar todas as arestas, formando cantar alegremente.
103
uma grande nuvem que foi lançada Cante aqui com sua garganta
para a terra. de veludo, com sua voz de prata,
95
A nuvem de chuva caiu rapida- tocando a flauta dourada do cuco.
104
mente, deixando cair suas gotas Cante pela manhã, à noite, na
como mel, para que as espigas de hora do meio-dia, para que as flo-
cevada pudessem amadurecer ra- restas cresçam melhor, a cevada
pidamente. amadureça, o Norte fique mais rico
96
As sementes de cevada cresce- e Kalevala seja preenchida com
ram, desdobrando-se, e as espigas alegria."
coloridas surgiram, brotando do
rico solo do pousio, do trabalho RUNA III.
habilidoso e honesto de Väinämöi- VÄINÄMÖINEN E YOUKAHAINEN.
nen.

V
äinämöinen, o antigo me-
97
Alguns dias passam desperce- nestrel, passou sua vida
bidos, e tantas outras noites voam em plena satisfação nos
rapidamente. prados de Vainola e nas planícies
98
Após a viagem do sétimo dia, de Kalevala.
na manhã do oitavo dia, o sábio e 2
Ele cantava lendas sempre ma-
ancião Väinämöinen foi inspecio- ravilhosas e canções de sabedoria
nar sua plantação de cevada para e sagacidade antigas, cantando um
11
dia, depois um segundo, e até Ele invejou Väinämöinen, fa-
mesmo no crepúsculo da noite, moso por sua habilidade como
cantando até o amanhecer. cantor, cuja doçura superava a sua
3
Ele cantava os contos de heróis própria.
12
dos velhos tempos e contos de eras Ele apressou-se em procurar
há muito esquecidos, bem como as sua mãe, que era sábia, e jurou que
lendas da criação. viajaria para o sul, levando con-
4
Antigamente, essas lendas sigo sua habilidade como bardo.
13
eram familiares às crianças, mas Ele pretendia competir com
agora nossos filhos não as cantam Väinämöinen em uma batalha nas
mais. habitações de Vainola, nas caba-
5
Muitos heróis já cantaram parte nas da Terra do Norte.
14
dessas lendas, especialmente nes- "Não", responde o pai ansioso,
tes tristes dias de maldade em que "não vá para Kalevala."
15
nossa raça se abateu. A mãe, tomada por temor, res-
6
Por toda parte, a história viajou pondeu: "Não, não vá até onde está
e homens distantes espalharam o Väinämöinen, lá para desfiá-lo
conhecimento do canto do herói e para uma batalha.
16
da canção de Väinämöinen. Com seu canto, ele é capaz de
7
Os ecos foram ouvidos ao sul e encantá-lo e enfeitiçá-lo, levando-
toda a Terra do Norte ouviu a his- o de volta com desonra e fazendo-
tória. o afundar na neve Congère.
8 17
Na distante e sombria Terra do Além disso, seus dedos e pés
Norte, habitava o jovem e impru- flexíveis serão transformados em
dente menestrel da Lapônia, cha- gelo."
mado Youkahainena, que, certa 18
Estas são as palavras de You-
vez, durante um banquete com kahainen:"É benéfico receber o
seus amigos e companheiros, ou- julgamento de um pai, mas ainda
viu a história de um cantor mais melhor é receber o conselho de
doce e hábil em cantar lendas do uma mãe.
19
que ele próprio. No entanto, a melhor opção é
9
Esse cantor vivia nos prados de tomar sua própria decisão.
20
Vainola, nas planícies de Kalevala, Eu pretendo enfrentar o me-
e era ainda mais habilidoso do que nestrel e desafiá-lo em uma com-
aquele que ensinara Youkahainen. petição de canto.
10 21
Imediatamente, o bardo sentiu- Irei desafiá-lo como bardo
se enfurecido, e a inveja começou para a batalha, e cantarei para ele
a crescer em seu peito. meus doces compassos, lendas

a
Um célebre menestrel de Pohyola.
mais antigas e sabedoria acumu- fogo e cascos soltavam faíscas,
lada. saindo de seu estábulo.
22 26
Que o famoso bardo de Suomi, Prendeu-o a seu trenó dourado
que é considerado o melhor dos e, impetuoso, montou-o sobre a
cantores, seja derrotado na compe- neve, saltando sobre o último
tição e se torne um infeliz menes- banco cruzado.
27
trel. Com seu chicote de bétula es-
23
Através de minhas canções, maltado de pérola, bateu no corcel,
vou transformá-lo para que seus que imediatamente partiu em sua
pés sejam como pedra de peder- jornada em direção ao norte, galo-
neira e suas vestes inferiores como pando incessantemente durante
carvalho. todo o dia e nos dias seguintes.
24 28
Este famoso cantor, assim en- Após três dias, ao anoitecer,
feitiçado, carregará sempre em seu chegou aos prados de Vainola, nas
coração um fardo de pedra, em seu planícies de Kalevala.
29
arco de ombro de mármore, em sua O correu que Väinämöinen, o
mão uma manopla de pederneira e mágico, cavalgava durante o pôr
em sua testa uma viseira de pedra." do sol ao longo da estrada.
25 30
O feiticeiro Youkahainen não Ele conduzia seu cavalo com
deu ouvidos aos conselhos pater- prazer e silenciosamente percorria
nais e maternos e conduziu seu as pacíficas campinas de Vainola e
corcel, cujas narinas exalavam as planícies de Kalevala.
31 41
O jovem e ardente Youkahai- Em seguida, o arrogante You-
nen, impulsionado por sua monta- kahainen dirigiu-se novamente a
ria espumante, avança com ímpeto Väinämöinen e proferiu as seguin-
contra o cantor, sem desviar o seu tes palavras: "Não importa se é jo-
curso. vem ou velho, a idade não tem
32
O encontro é inevitável e os ei- grande relevância.
42
xos se chocam violentamente, re- O que importa é a sabedoria e
sultando no emaranhamento dos conhecimento de cada um, e
hames, colares, rédeas e tirantes aquele que possui maior sabedoria
dos cavalos. e conhecimento, e é um bom can-
33
A força do impacto faz com tor, será o responsável por liderar
que ambos parem bruscamente e o caminho, enquanto o outro se-
observem a situação. guirá atrás.
34 43
Nesse momento, gotas de água És tu o famoso mago e menes-
escorrem do arreio e do colarinho, trel Väinämöinen? Então vamos
enquanto vapores se elevam das começar a cantar as nossas antigas
narinas dos cavalos. lendas e a sabedoria que acumula-
35
Fala o menestrel, Väinämöi- mos ao longo do tempo, para que
nen: "Quem és tu, e de onde? Pois, possamos ouvir um ao outro e jul-
tu vens como um jovem estupido, gar um ao outro em uma competi-
descuidado e atiraste-te em minha ção de provérbios mágicos."
44
direção. Väinämöinen assim respondeu
36
Destruíste minhas flechas e tri- em tom modesto: "O pouco que sei
lhos, arruinando o colarinho do não é suficiente para ser digno de
meu piloto. ser cantado, e mesmo meu canto
37
Além disso, meu trenó dou- não é grandioso.
45
rado encontra-se em pedaços, com Tenho passado todos os meus
sua caixa e patins quebrados." dias na fria e sombria Terra do
38
Youkahainen então responde, Norte, em uma terra desolada e so-
disse finalmente as palavras que se litária onde moro em minha casa
seguem: "Eu sou o jovem You- de campo.
46
kahainen, mas primeira responda: As canções que reuni são sim-
39
quem és, de onde vens, para ples e repetitivas, muitas delas na
onde vais, e de que tribo humilde medida do cuco, e eu mal consigo
descendes?" me lembrar delas.
40 47
Vainamoinen, sábio e ancião, No entanto, como tu exigiste
respondeu assim ao jovem menes- arrogante um desafio, eu o aceito.
48
trel: "Se tu és apenas Youkahai- Então, diga-me agora, jovem
nen, então és obrigado a me conce- cheio de sabedoria, o que tu sabes
der toda a estrada, já que sou mui- além dos outros, abra agora teu es-
tos anos mais velho que tu." toque de conhecimento."
49 56
A resposta de Youkahainen, o Por exemplo, todos os homens
jovem e impetuoso menestrel da do Norte aram com renas, en-
Lapônia, foi a seguinte:"Eu possuo quanto cavalos-mães aram as ter-
um vasto conhecimento adquirido ras do Sul e a Lapônia Interior ara
ao longo dos anos, e posso afirmar com bois.
57
com clareza absoluta que cada te- Conheço bem todas as árvores
lhado deve ser dotado de uma cha- da montanha de Pisaa, em toda a
miné, bem como cada lareira deve sua grandeza, e na rocha Horna
possuir uma pedra específica para crescem abetos altos e esguios, en-
sua construção. quanto as árvores nas montanhas
50
As vidas das focas são repletas são magras.
58
de liberdade e alegria, enquanto as Há três cachoeiras, três ocea-
morsas desfrutam de uma vida fe- nos interiores e três montanhas al-
liz alimentando-se de salmões des- tas, atirando para a abóbada do
cuidados e banqueteando-se diari- céu.
59
amente com percas e badejos. Hallapyorab está próximo de
51
Os badejos preferem viver em Yaemenc, Katrakoski em Karyalad,
áreas rasas e tranquilas, enquanto e a água caindo de Imatra ruge ao
os salmões encontram seu lar em cair em Wuoksie."
60
fundos planos. Em seguida, disse
52
O lúcio realiza a desova em Väinämöinën: "Contos de mulhe-
climas frios e desafia as tempesta- res e a sabedoria das crianças não
des de inverno. são do agrado de um herói barbudo
53
No outono, os poleiros nadam e maduro o suficiente para o casa-
lentamente, com as costas tortas, mento.
61
caçando em águas profundas. Em vez disso, conte-me a his-
54
Durante o verão, eles desovam tória da criação, descreva o início
em águas rasas e saltam na costa do mundo e as criaturas que nele
do oceano. habitam, e apresente também algu-
55
Caso essa sabedoria seja con- mas reflexões filosóficas."
62
siderada insuficiente, posso com- Então respoudeu: "Conheço
partilhar outros assuntos e dizeres bem sobre as fontes dos chapins,
mágicos. os quais são belos passarinhos.
63
A víbora, por outro lado, é uma
serpente verde.

a
Uma montanha da Finlândia.
b
Um lago na Finlândia.
c
Ja'men (Ya'men). Um rio da Finlândia.
d
Kar-ja'la, (karya'la). A sede da cachoeira, Kaatrakoski.
e
O mesmo que Wuoksen (Vuoksen).
64 75
Os badejos habitam em águas Respondeu Youkahainen:
salobras, enquanto os poleiros po- "Posso te contar uma história an-
dem ser encontrados em todos os tiga sobre os tempos primordiais.
76
rios. Contarei sobre quando eu
65
É sabido que o ferro enferruja arava o mar salgado, varria as ilhas
com o tempo, e esse processo o e cavei grutas de salmões e caver-
torna mais fraco. nas profundas.
66 77
O umber possui um sabor Eu também criei todos os lagos
amargo, e a água fervente pode ser e empilhei as montanhas ao seu re-
perigosa. dor, colocando rochas em cima de-
67
O fogo, por sua vez, é sempre las.
78
uma ameaça constante. Eu estava presente como um
68
Como o primeiro médico é o herói sábio e antigo, o sexto dos
Criador considerado, e o mais an- heróis, e o sétimo dos heróis primi-
tigo remédio sendo a água, uma tivos, quando os céus foram cria-
das substâncias mais antigas utili- dos e os espaços etéreos se forma-
zadas para tal. ram.
69 79
A magia é tida como filha da Eu vi quando o céu tinha pila-
espuma do mar, enquanto Deus é res de cristal e o belo arco-íris se
considerado o primeiro e melhor arqueava.
80
conselheiro. Fui testemunha da colocação
70
As águas brotam de cada mon- da Lua em órbita, do plantio do Sol
tanha, e o fogo desceu do céu pela prateado e da estação firme da
primeira vez. Ursa, com as estrelas sendo asper-
71
O ferro é moldado a partir da gidas pelos céus."
81
ferrugem, enquanto o cobre é cri- Disse o antigo Väinämöinën:
ado a partir das rochas. "Tu és o líder dos mentirosos, o co-
72
Os pântanos são considerados mandante supremo de todos eles.
82
as terras mais antigas, e o salgueiro Nunca exististe e nunca esti-
é a árvore que apareceu pela pri- veste presente durante a criação do
meira vez. mundo.
73 83
Os abetos foram as primeiras Quando o mar salgado foi
casas, e as pedras ocas foram as arado, as ilhas cercadas pelo mar
primeiras chaleiras." foram escavadas, as grutas dos sal-
74
Agora, assim responde mões foram cavadas, as cavernas
Väinämöinën à Youkahainen: "Po- foram escavadas, os lagos foram
des me dar agora um pouco de sa- criados e as montanhas foram
bedoria? Esse absurdo é tudo o que amontoadas ao redor deles, as ro-
conheces?" chas foram empilhadas sobre elas.
84
Nunca foste visto ou ouvido
falar durante a criação da terra, dos
93
espaços etéreos, dos pilares de O medo e a covardia os trans-
cristal no ar, da colocação da Lua formarão em suínos, com corações
em órbita, do plantio do Sol prate- e rostos de porcos.
94
ado e da estação firme da Ursa Mas eu, através do meu canto,
Maior, nem quando os céus foram irei expor esses heróis-covardes,
salpicados com estrelas." lançando-os para cá e para lá, pi-
85
Youkahainen ficou furioso sando neles na lama e no leito, tra-
com a resposta de Väinämöinen e tando-os como o lixo que são."
95
retrucou: "Senhor, uma vez que Väinämöinen ficou irritado e
sou falho em sabedoria, ofereço- cresceu em cólera, ficando carran-
lhe batalha com minha espada. cudo e feroz.
86 96
Convido-o, famoso bardo e Finalmente, ele quebrou o si-
menestrel, o antigo cantor de ma- lêncio e começou a cantar um ma-
ravilhas, para testar nossa força ravilhoso canto.
97
com espadas largas. Ele não cantou histórias infan-
87
Vamos colocar nossas lâminas tis ou sagacidade das mulheres,
à prova e ver quem é o mais habi- mas sim heróis barbudos que eram
lidoso." desconhecidos pelas crianças e
88
Disse o antigo Väinämöinën: donzelas, conhecidos apenas pela
"Eu não temo a tua espada, a tua metade pela noiva e pelo noivo e
sabedoria, a tua prudência ou a tua em parte por muitos heróis.
98
astúcia. Estes eram tempos tristes de
89
Não me impressionas nem um maldade, quando a raça estava so-
pouco com teus desafios, pois és frendo.
99
apenas um fanfarrão insignifi- Väinämöinen cantou grande-
cante, vaidoso e sem importância. mente até as montanhas de cobre e
90
Se eu aceitar o desafio, não as rochas duras e saliências ouvi-
será contigo, mas sim com um ad- rem seus tons mágicos e tremerem.
100
versário verdadeiramente digno." Os penhascos da montanha
91
Então, Youkahainen, com a foram despedaçados, todo o oce-
boca torta e rosto sarcástico, sacu- ano se ergueu e caiu, e as colinas
diu seus cabelos dourados e res- distantes ecoaram.
101
pondeu: "Aquele que evita medir a Youkahainen ficou paralisado
sua própria lâmina teme testar a em silenciosa admiração, en-
sua força em batalhas maiores, en- quanto seu trenó com enfeites de
frentando desafios que exigem co- ouro flutuava como mato nas on-
ragem e habilidade. das.
92 102
É como um javali na floresta, Väinämöinen cantou sobre
com medo de se arriscar e ser der- sua espada com cabo de ouro, sua
rotado. besta alegremente pintada, suas
110
flechas rápidas e emplumadas, seu Pagar-te-ei um resgate de
cachorro com focinho dobrado, ouro."
111
seu boné de sua testa, suas mano- O antigo Väinämöinen inda-
plas em juncos nas águas, sua ves- gou: "Indaga-me agora, qual será o
timenta de cor púrpura em nuvens teu resgate, se eu interromper meu
brancas nos céus, e seu cinto cra- encantamento, se eu renunciar à
vejado de joias em estrelas cinti- minha magia, e te livrar do teu
lantes ao seu redor. pântano aterrorizante, libertando-
103
Infelizmente para Youkahai- te da tua prisão rochosa e aliviando
nen, Väinämöinen cantou sobre o teu tormento mortal?".
112
ele afundando cada vez mais fundo O jovem Youkahainen res-
nas profundezas da areia move- pondeu: "Em minha morada, pos-
diça, em sua tortura, até que seu suo duas bestas mágicas e um par
cinto desapareceu na lama e na de arcos de poder maravilhoso.
113
água. Um dos arcos é tão leve que
104
Foi só então que Youkahainen uma criança pode dobrá-lo, en-
compreendeu com clareza sua lou- quanto o outro só pode ser dobrado
cura e o fim da jornada que havia pela força.
114
se aventurado em vão para a glória Escolha dentre estes, o que
de uma disputa com o grande e ve- melhor lhe agradar."
115
lho Väinämöinen. Assim falou o antigo
105
Quando o triste jovem You- Väinämöinen: "Eu não desejo as
kahainen de Pohyola, tenta mover tuas bestas mágicas, pois já possuo
seu pé direito com todas as suas algumas delas.
116
forças, porém, infelizmente, o pé As tuas bestas são mais do
não obedece. que inúteis para mim. Tenho arcos
106
E quando ele tenta mover seu em grande abundância, em cada
pé esquerdo, eis que o encontra prego e viga.
117
transformado em pedra de peder- Esses arcos são tão poderosos
neira. que superam qualquer outro caça-
107
Youkahainen, profundamente dor, e até mesmo caçam sozinhos."
118
triste e desesperado, fez uma sin- E aconteceu que o antigo
cera súplica a Väinämöinen: "Ó Väinämöinen cantou mergulhando
sábio e digno menestrel, és o único ainda mais na lama e na água,
verdadeiro mago. ainda mais profundamente no pân-
108
Peço-te que cesse teu encanta- tano do tormento o pobre You-
mento e apenas afaste tua magia. kahainen.
109 119
Permita-me deixar este pân- Assim respondeu Youkahai-
tano de horror e liberar-me desta nen: "Em minha morada, possuo
prisão pedregosa e deste tormento duas chalupas encantadas, barcos
mortal. magníficos e admiráveis.
120
Um deles navega graciosa- milho em cada manjedoura e tendo
mente sobre as águas do oceano, costas largas para suportar a água.
130
enquanto o outro foi confeccio- Eles carregam a água em laci-
nado para transportar cargas pesa- nhos em suas garupas".
131
das. Ainda aconteceu que o bardo
121
Assim, escolha entre eles e menestrel de Vainola começou a
aquele que melhor lhe convier." cantar uma vez mais sobre o pobre
122
E disse o antigo Väinämöi- Youkahainen, que estava afun-
nen: "Não desejo possuir as tuas dando cada vez mais fundo em seu
chalupas mágicas, pois já possuo o tormento, submerso até os ombros.
132
suficiente delas. Falou Youkahainen: "Ó tu, o
123
Todas as minhas baías estão antigo Väinämöinen, Tu és o único
cheias de chalupas, e todas as mi- mago verdadeiro.
133
nhas costas estão alinhadas com Rogo-te que ponhas fim ao
elas. teu encantamento.
124 134
Algumas foram construídas Por favor, abandona a tua ma-
antes mesmo de os ventos serem gia.
135
marinheiros, e outras foram feitas Se o fizeres, eu te darei ouro
para navegar contra eles." abundante e incontáveis depósitos
125
Ainda aconteceu que o bardo de prata brilhante.
136
e menestrel de Vainola começou a Meu pai obteve essas riquezas
cantar uma vez mais sobre o pobre através das guerras e das batalhas
Youkahainen, que estava afun- árduas."
137
dando cada vez mais fundo em seu Disse Väinämöinen:"Não al-
tormento, em areia movediça até a mejo teu ouro, tampouco desejo
altura do cinturão. tua prata, pois já possuo o bastante
126
Diante desse sofrimento, o de ambos.
138
bardo da Lapônia expressou sua Meus aposentos estão reple-
angústia e falou novamente para tos de ouro abundante, e sacos de
Väinämöinen: "Em minha casa há prata pendem de cada prego.
139
dois garanhões mágicos, um deles E o ouro cintila sob a luz so-
é um piloto rápido como um raio, lar, enquanto a prata brilha sob o
e o outro foi feito para suportar far- luar."
140
dos pesados. O fanfarrão, Youkahainen, foi
127
Tomai o que te agrada deles". submergido ainda mais profunda-
128
E disse Väinämöinen: "Eu mente em seu pântano de tor-
não desejo teus garanhões, pois já mento, afundando até o queixo em
tenho o suficiente deles. lama e água.
129 141
Meus estábulos estão repletos Apesar disso, ele continuava
de garanhões mágicos, comendo falando e suplicando: “Ó, tu
149
Väinämöinen, antigo e venerável, Nesse estado, o jovem menes-
és considerado o maior dentre to- trel Youkahainen suplica: “Ó an-
dos os magos que já existiram. tigo Väinämöinen, tu que és o mais
142
Imploro-te que me ergas deste sábio dos cantores de sabedoria,
poço de desespero e agonia, desta peço-te que cesse enfim teus en-
prisão de tormento. cantamentos e que afaste tua ma-
143
Ofereço-te todos os meus gia de mim.
150
campos de milho e todo o meu mi- Rogo-te que restaure minha
lho armazenado em celeiros, se as- vida anterior e me liberte deste tor-
sim puderes me resgatar desta vida mento sufocante.
151
infeliz e garantir minha liberdade Que meus olhos sejam liber-
eterna.” tos da areia e água.
144 152
Väinämöinen respondeu: Prometo-te, em troca, minha
"Seja vosso milho transportado a irmã Ainoa, a filha mais bela de
outros mercados e disponibilize minha mãe, para ser tua noiva para
vossos celeiros aos necessitados. sempre e satisfazer teu prazer.
145 153
Pois em verdade, possuo Ela varrerá os quartos dentro
grande abundância de milho e de tua cabana, manterá tua morada
campos em todos os bairros, de em ordem, lavará as travessas de
sorte que o milho floresce em to- ouro para ti, estenderá teu sofá
dos os meus domínios. com lençóis finos e tecerá cobertas
146
Pois a colheita de alguém douradas para tua cama.
154
sempre parecerá mais farta em Além disso, ela assará para ti
seus próprios campos, e seu pró- o pão-de-mel.”
155
prio grão sempre terá um sabor Väinämöinen, o velho sábio e
mais doce." fiel, tendo encontrado enfim o res-
147
O jovem e imprudente menes- gate tão desejado: a jovem e bela
trel da Lapônia, carregado de tris- filha da Lapônia, querida irmã de
teza, encontrava-se profunda- Youkahainen.
156
mente afundado na lama e na água. Feliz ele por tê-la conquis-
148
Acorrentado pelo medo e tado, mesmo em sua idade avan-
cheio de angústia, sua barba estava çada, pois ela será sua noiva para
suja de lama, e sua boca, que ou- sempre e orgulho e alegria de
trora era orgulhosa e cheia de algas Kalevala.
157
marinhas, agora estava enredada Agora, senta-se na Rocha da
na grama. Alegria, Väinämöinen alegre
canta, entoando suas canções em

a
A irmã de Youkahainen. Aino – Nome feminino que significa "A único" em fin-
landês.
167
três repetições para quebrar o en- E aconteceu que Youkahai-
canto da magia e diminuir seu po- nen, que estava com o boné torto
der, a fim de dissipá-lo completa- na testa, caiu em pranto e seu cora-
mente. ção se partiu.
158 168
Quando o feitiço é quebrado, Sua cabeça ficou deprimida e
Youkahainen, embora triste, fica sua mente abatida, e seus olhos e
mais sábio. lábios expressavam tristeza.
159 169
Ele sai arrastando os pés da Ele não respondeu ao seu pai
areia movediça, levantando sua ansioso. Ai, pobre Youkahainen!
170
barba da água. Então, a mãe o indagou pron-
160
Conduz seu corcel das rochas, tamente, em busca de compreen-
traz seu trenó de volta dos juncos, der a razão por trás de sua tristeza:
chama seu chicote de volta do oce- "Por favor, diga-me, meu primo-
ano e coloca seu trenó dourado em genito, por que choras? Por que teu
ordem. coração está tão abatido e tua
161
Em seguida, ele se joga no mente tão desanimada? Por que
banco cruzado, estala seu chicote e teus olhos expressam tanta tris-
o leva de volta para casa, apres- teza?"
171
sando-se com o coração pesado. Youkahainen respondeu: "Ó
162
Ao chegar em casa, ele encon- mãe dourada, sempre fiel, há uma
tra sua mãe, a mãe de Aino, grisa- causa suficiente para minha tris-
lha e idosa, e fica ainda mais triste. teza e lágrimas amargas.
163 172
Desatento, ele se aproxima de Todos os meus dias passarão
sua casa fazendo barulho e alvo- infelizes, pois prometi a bela Aino,
roço, e acaba dirigindo impruden- tua amada filha e minha devotada
temente contra a cobertura, que- irmã, ao decrépito Väinämöinen
brando as hastes contra os portais como noiva para ele para sempre;
173
e destruindo em pedaços seu belo será seu teto acima dele, su-
trenó. porte abaixo dele e bela compa-
164
Então a mãe, percebendo ra- nheira ao lado da lareira.
174
pidamente o ocorrido, repreendeu- Esta causa é amarga para mim
lo-ia por sua imprudência. e traz grande sofrimento."
165 175
No entanto, o pai interrompe: Então, a mãe se levantou ale-
"Por que destruíste teu trenó de gremente e bateu palmas de felici-
neve? Por que destruíste tuas coli- dade.
176
nas? Por que retornaste para casa Ela se dirigiu a Youkahainen,
de forma tão estranha? seu amado filho, e disse: "Não
166
Qual é a razão por trás de teu chores mais, meu filho.
177
comportamento rude e selvagem?" Não há motivo para tuas lágri-
mas, nem razão para tua tristeza.
178 185
Eu já alimentei essa esperança Tudo isso deve ser escondido
muitas vezes e tenho orado por sob o chapéu de linho que uma es-
muitos anos para que o poderoso posa deve usar para sempre.
186
bardo e herói, sábio e valente Choro pela manhã, choro pela
Väinämöinen, se torne o esposo da noite, e choro pela minha beleza
bela Aino e o genro para mim, sua que agora está desaparecendo.
187
mãe". A minha infância se foi e a
179
Mas a bela e adorável don- minha juventude também.
188
zela, irmã querida de Youkahai- O sol prateado e o luar dou-
nen, que ao chegar ao limiar ime- rado, que eram a esperança e o pra-
diatamente caiu em um choro zer da minha infância, foram tira-
amargo e prolongado. dos de mim agora para sempre, e
180
Chorou durante todo o dia e tão cedo serão esquecidos na ban-
toda a noite, continuando a chorar cada de ferramentas do meu irmão,
no segundo e terceiro dia, porque na janela da minha irmã ou na casa
uma grande tristeza havia se apos- do meu pai."
189
sado de seu jovem coração. Disse novamente a mãe de ca-
181
Então, a mãe de cabelos grisa- belos grisalhos: "Cessa tua tris-
lhos indagou a sua filha, Aino, de teza, donzela tola, pois tu és in-
maneira solene: "Por que estás a grata por chorar.
190
chorar, adorável filha? Encon- Não há motivo para tua la-
traste um nobre pretendente. mentação, nem o menor motivo
182
Tu governarás tua espaçosa para derramar lágrimas.
191
morada, sentar-te-ás em sua janela Em toda parte, o sol prateado
para descansar, enxaguarás suas brilha tão intensamente sobre ou-
travessas de ouro e caminharás tras famílias.
192
dentro de teu lar como uma rai- O luar brilha não apenas atra-
nha." vés das janelas abertas de teu pai e
183
Chorosa respondeu Aino: "Ó na bancada de trabalho de teu ir-
minha querida e misericordiosa mão.
193
mãe, há uma causa suficiente para Flores desabrocham em cada
a minha tristeza e um motivo sufi- prado e bagas crescem em cada
ciente para o meu amargo choro. montanha.
184 194
Devo soltar as minhas tranças Tu podes ir sozinha e encon-
ensolaradas, as minhas tranças be- trá-las, ir e encontrá-las todo o dia.
195
las e douradas, pois não posso Não só os prados de teu ir-
mais adornar o meu cabelo com mão, mas também outras áreas têm
jóias ou amarrar a minha cabeça belas videiras e flores.
196
com fitas. As montanhas de teu pai não
são as únicas que produzem bagas
maduras e nutritivas.
197
Flores florescem em outros penduro em meu pescoço a cruz,
prados e bagas crescem em outras ou que adorno meus cabelos com
montanhas. fitas de seda.
198 9
Assim como aqui, minha ado- Não necessito mais das diversas
rável Aino." bugigangas que me foram trazidas
por navio ou chalupa.
RUNA IV. 10
Antes, prefiro vestir-me com
O DESTINO DE AINO. roupas simples, alimentar-me da
casca do pão de cevada e habitar

A o romper da aurora, a don-


zela, irmã justa de You-
kahainen, dirigiu-se pron-
tamente à floresta para colher bro-
para sempre com minha mãe em
nossa modesta cabana, junto a meu
pai".
11
Então ela jogou fora a cruz de
tos de bétula, a fim de confeccio-
nar vassouras. ouro que trazia consigo e arrancou
2
Ela colheu borlas de bétula e, as joias de seus dedos.
12
em seguida, preparou um pacote Rapidamente soltou seu colar
para seu pai, amarrou uma vas- brilhante e desamarrou suas fitas
soura de bétula para sua mãe e bor- de seda.
13
las de seda para sua irmã. Com indignação, lançou todas
3
Imediatamente, a jovem Aino essas peças nas samambaias e flo-
correu para casa, deixando a flo- res da floresta.
14
resta por uma trilha. Em seguida, a donzela cha-
4
Quando ela se aproximou da mada Aino, apressou-se para a ca-
borda da floresta, vê! o antigo bana de sua mãe.
15
Väinämöinen, que a espiava furti- Seu pai estava sentado na ja-
vamente. nela, dedicado a talhar um ma-
5
Aino estava vestida com es- chado de carvalho.
16
mero em roupas caras. Então, ele dirigiu-se à sua fi-
6
Então, o menestrel dirigiu-se a lha: "Por que choras, minha bela
ela e disse: "Aino, beleza das Ter- Aino, minha amada filha?"
17
ras do Norte, não use a cruz dou- A donzela respondeu: "Meu
rada em teu peito, as pérolas bri- pai, tenho motivos justos para cho-
lhantes em teus ombros e as tran- rar e razões válidas para o meu
ças ruivas e douradas para os ou- luto.
18
tros. A razão pela qual choro e sofro
7
Use-as apenas para mim, doce é porque retirei a cruz de meu
donzela". peito, o broche de cobre de meu
8
Eis que a donzela prontamente cinto e o cinto de prata da minha
respondeu, dizendo: "Não é para ti, cintura.
nem tampouco para outrem, que eu
19 31
A minha cruz era bela e dou- Próximo à entrada da leiteria,
rada." encontrava-se sentada a mãe de
20
Próximo à porta encontrava-se Aino, enquanto fazia creme desna-
sentado o irmão de Aino, escul- tado.
32
pindo um jugo de boi feito de ma- Então, perguntou para sua
deira de bétula. amada filha Aino, com ternura e
21
Ele perguntou: "Por que estás afeto: "Por que choras, minha que-
chorando, minha querida Aino, rida Aino, filha devotada?"
33
minha irmã devota?" A jovem, soluçando, respon-
22
Ela respondeu: "Irmão, tenho deu: "Minha mãe amorosa e mise-
motivos suficientes para chorar e ricordiosa, choro por uma causa
lamentar. suficiente e boas razões para mi-
23
São bons motivos que me le- nha tristeza.
34
vam ao luto. Fui à floresta para amarrar vas-
24
Por isso, venho diante de ti souras e colher brotos, especifica-
sem os anéis que antes adornavam mente para obter algumas bétulas
meus dedos e sem o colar bonito borlas.
35
que enfeitava meu pescoço. Amarrei um feixe para meu
25
Eram anéis dourados que tu pai, um segundo para minha mãe,
me deste, e o colar, pérolas e um terceiro para meu irmão e as
prata!" borlas de seda para minha irmã.
26 36
No limiar da porta encontrava- Depois, voltei para casa pela
se a irmã de Aino, que habilmente trilha que saía da floresta.
37
tecia um cinto de ouro. No entanto, quando cheguei à
27
Observando o choro de Aino, fronteira da floresta, Osmoinen, o
sua irmã perguntou: "Por que cho- antigo Väinämöinen do milharal,
ras, minha amada irmã Aino?" falou comigo.
28 38
Ela respondeu: "Tenho moti- Dizendo: 'Bela donzela, não
vos suficientes para chorar, minha uses isso para os outros, mas ape-
irmã, e bons motivos para minha nas para mim. Doce donzela, usa
tristeza. uma cruz dourada em teu peito, pé-
29
É por isso que venho até ti rolas brilhantes sobre teus ombros,
como podes ver. amarra para mim tuas tranças rui-
30
Não há nenhum filete escarlate vas e tece para mim tuas tranças de
em minha cabeça, nenhuma trança prata'.
39
de prata em meu cabelo, nenhuma Então, joguei a cruz de ouro e
fita roxa em meus braços, nenhum as joias de meus dedos, rapida-
colar brilhante em volta do meu mente soltei meu colar brilhante e
pescoço, nenhuma cruz de ouro em desatei minhas fitas de seda. Indig-
meu peito, e nenhum brinco de nada, lancei todas essas coisas nas
ouro em minhas orelhas." samambaias e flores da floresta.
40 50
Depois, eu disse ao cantor: Por acaso, ouvi as filhas da
'Não para ti e nem para os outros, Lua tecendo e as filhas do Sol gi-
pendurarei a cruz em meu pescoço rando, sobre a borda azul da flo-
e enfeitarei meu cabelo com fitas resta, em uma montanha alta e dis-
de seda. Não preciso mais de mui- tante.
51
tas bugigangas trazidas por navio e Fiquei escondida enquanto su-
chalupa. Prefiro vestir a roupa plicava às belas filhas da Lua por
mais simples, alimentar-me da sua prata e às doces virgens do Sol
casca do pão de cevada e morar por seu ouro.
52
para sempre com minha mãe na ca- Elas me deram generosamente
bana com meu pai'." seus tesouros para enfeitar minhas
41
mãe, com cabelos grisalhos, têmporas e cabelo.
53
falou para sua amada filha, Aino, Quando voltei para casa, usei-
usando palavras reconfortantes: os por três dias e os guardei com
"Não chore mais, minha adorável cuidado em suas caixas, onde per-
donzela. maneceram por muitas estações.
42 54
Não desperdice mais sua doce Agora, enfeite sua testa com
juventude. fita de seda, apare as têmporas
43
Durante um ano, coma minha com ouro e use um colar de pérolas
doce manteiga para se fortalecer e em seu pescoço.
55
ficar corada. Vista-se em puro linho branco
44
No segundo ano, coma bacon e use o mais rico vestido curto,
fresco para ficar alta e majestosa. prendendo-o com um cinto de
45
No terceiro ano, apenas gulo- ouro.
56
seimas, para ficar bela e adorável. Use meias de seda e sapatos de
46
Agora, suba até o topo da co- couro fino.
57
lina e vá para o depósito na monta- Enfeite seu cabelo com tranças
nha. douradas e prenda-o com fios de
47
Abra o grande compartimento prata.
58
e encontrará caixas, baús e caixo- Use anéis em seus dedos e ba-
tes. bados delicados em suas mãos.
48 59
Abra a caixa maior e levante a Então, venha enfeitada para
cobertura berrante para encontrar seu quarto e volte para esta casa,
seis cintos de ouro e sete vestidos para ser saudada pelos seus paren-
multicoloridos, tecidos pelas belas tes e amigos, corada como bagas
filhas da Lua e moldados pelas do- vermelhas e tão radiante quanto o
ces virgens do Sol. raio de sol de seu pai.
49 60
Quando eu era jovem, vagava Ande com beleza e majestade,
pelas montanhas como uma don- mais linda que o luar."
zela, caçando bagas no bosque.
61
E assim se expressou a mãe à dias de pecado e tristeza, debaixo
sua filha Aino, que chorava. de uma estrela tão infeliz.
62 69
No entanto, a jovem donzela Teria sido melhor para mim se
não cedeu aos desejos de sua mãe. eu tivesse morrido no oitavo dia,
63
Em vez disso, correu imediata- depois de sete noites ter desapare-
mente para o pátio, lá para chorar cido; precisaria de um pouco de li-
em amarga tristeza, sozinha e an- nho, um pequeno caixão e uma se-
gustiada. pultura menor.
64 70
Após esperar por muito tempo, Minha mãe teria lamentado um
Aino, cheia de lamentações, final- pouco, meu pai também talvez,
mente expressou seus pensamen- minha irmã teria chorado o dia in-
tos em um solilóquio: "Com o que teiro e meu irmão poderia ter der-
posso comparar agora a felicidade ramado uma lágrima.
71
de um lar e a alegria da fortuna? Assim terminaria todo o luto."
72
Seria como as águas do rio, como Eassim aconteceu que Aino, a
as ondas do lago e como as águas pobre donzela, derramou muitas
cristalinas fluindo. lágrimas e suspirou profunda-
65
E quanto à dor cortante que mente.
73
sinto por causa do filho do frio in- Seu pranto foi incessante, du-
fortúnio? Seria como o espírito do rando não apenas um dia, mas
pato marinho, como o gelo no in- dois, e ainda um terceiro desde a
verno e a água aprisionada no manhã até a noite.
74
poço. Quando sua mãe a questionou
66
Esses pensamentos frequente- novamente: "Por que choras, mi-
mente vagam pela minha mente, nha amada filha? Por que trazes a
na infância quando eu era uma dor contigo?”
75
donzela livre e alegre, brincando A donzela respondeu chorosa:
nos prados com cordeiros, sem co- "Eu choro e sofro porque me tor-
nhecer dor ou problemas. narei uma donzela miserável por
67
Agora, minha mente está cheia toda a minha vida.
76
de tristeza, eu ando cansada pelo Isso ocorre desde o momento
pântano, pelo restolho, pelas amo- em que tu deste a pobre Aino e
reiras e pela floresta sombria, até prometeste tua filha ao velho
que minha vida esteja cheia de es- Väinämöinen para confortá-lo em
curidão e meu espírito, branco de seus anos decadentes.
77
angústia. Ele terá um telhado sobre sua
68
Para mim, seria melhor se eu cabeça durante as tempestades e
nunca tivesse visto a luz do sol, ou um manto para aquecê-lo em sua
se tivesse nascido e morrido casa.
quando criança, em vez de ter vi-
vido como uma donzela nestes
78 85
Seria muito melhor se tu tives- Ela vagueia por campos e pra-
ses me enviado para baixo das on- dos, por campos de pedra devasta-
das do mar salgado para me tornar dos e estéreis, pântanos e florestas,
irmã do badejo e amiga da perca e pela vasta e triste floresta, indo de
do salmão. um lado para outro, cantando des-
79
É melhor cavalgar nas ondas, cuidadamente enquanto ela va-
nadar na espuma do mar como gueia.
86
uma sereia e ser amiga dos peixes Sua canção triste e ecoante diz:
ágeis do que ser o consolo de um "Ai de mim, minha vida malfa-
velho. dada! Ai de Aino, de coração par-
80
Preferiria ser a irmã do badejo tido! Que a dor e a angústia não se-
e amiga da perca e do salmão do jam ainda mais profundas, nem
que a escrava e querida de um ve- meu sofrimento ainda maior.
87
lho, sendo seu suporte para segurá- Se eu tiver que suportar esse
lo quando ele cambaleia, mão para peso de tristeza e viver em desâ-
ajudá-lo quando ele treme, braço nimo com um coração entriste-
para guiá-lo quando ele vacila e cido, prefiro entregar minha vida
força para dar a ele quando ele en- para sempre e morrer infeliz.
88
fraquece." Agora é hora de Aino partir
81
Terminando de falar, ela dei- deste mundo cruel para o reino de
xou sua mãe e foi imediatamente Tuoni, o reino dos que partiram, a
correndo em direção à montanha. ilha do além.
82 89
Chegando ao topo, ela abriu a Não chorem por mim, ó Pai;
maior caixa guardada lá e removeu querida Mãe, retire sua censura;
seis tampas, revelando seis cintos amável irmã, enxugue suas lágri-
de ouro e sete vestidos de seda. mas; querido irmão, não chore por
83
Ela escolheu o que mais lhe mim.
90
agradou e se vestiu para parecer a Quando eu afundar sob a es-
mais bela, adornando-se com ouro puma do mar, farei minha casa em
em suas têmporas, prata em seu ca- grutas de salmão e meu leito em
belo, fitas roxas em seus ombros, águas cristalinas, usando samam-
uma faixa azul em volta de sua baias aquáticas como meu sofá e
testa, uma cruz dourada, anéis e travesseiro."
91
joias adequados para realçar sua Durante todo o dia, Aino, a po-
beleza. bre, caminhou.
84 92
Ela abandona seus muitos te- No dia seguinte, triste e exa-
souros e deixa o depósito na mon- usta, continuou vagando até o ter-
tanha, cheio de objetos valiosos de ceiro dia, desde a manhã até a
ouro e prata. noite, quando a noite cruel a envol-
veu.
93
Foi então que ela alcançou a cores do arco-íris, brilhando na luz
margem arenosa, chegando final- prateada do sol.
101
mente à fria e sombria praia do Em direção a ela veio a infeliz
mar. donzela, Aino, nadando em sua di-
94
Sentou-se na rocha da tristeza, reção.
102
sozinha no frio e na escuridão, ou- Ela subiu na pedra erguida,
vindo apenas a música dos ventos desejando ali descansar por um
e das ondas ondulantes, que canta- momento e repousar sobre a rocha
vam todo o canto fúnebre de Aino. de beleza.
95 103
Durante toda aquela noite, a De repente, balançando para
donzela cansada chorou e vagueou lá e para cá entre as ondas, a pedra
na fronteira, entre a areia e os sei- de muitas cores caiu com um es-
xos lavados pelo mar. trondo e rugido das águas no fundo
96
Ao romper da aurora, a perso- do profundo e ilimitado mar azul.
nagem vislumbra três ninfas mari- Aino, agarrando-se às bordas es-
nhas sobre um promontório que se carpadas da rocha, afundou bem
projeta para o mar. abaixo da superfície, perecendo no
97
Há ainda outras quatro donze- fundo do mar.
104
las da água, que se encontram sen- Cantando enquanto a pedra
tadas nas bordas que são constan- descia, Aino lamentou a sua morte:
temente atingidas pelas ondas, al- "Uma vez eu vim nadar à beira-
ternando entre nadar e repousar so- mar para me divertir entre as on-
bre as rochas. das; com a pedra de muitas cores,
98
Apressadamente, a donzela a pobre Aino afundou no fundo do
triste e chorosa, conhecida como profundo e ilimitado mar azul,
Aino, se dirige ao encontro das se- como um filhote de pássaro bonito
reias, que são fadas das águas. En- pereceu.
105
quanto chora, Aino remove suas Nunca venha pescar, pai, nas
vestimentas com cuidado, pendu- margens dessas águas, nunca du-
rando suas roupas de seda nos ga- rante toda a sua vida, se tu amas a
lhos dos amieiros, deixando cair tua filha Aino."
sua cruz de ouro na praia. 106
“minha terna mãe, dirigi-me à
99
Ela também pendura suas fitas costa marítima, buscando deleite
no álamo, suas meias de seda nas entre as ondas.
107
rochas, seus sapatos de pele de ve- Com uma pedra de múltiplas
ado na grama, e deixa seu colar cores, submergi a pobre Aino nas
brilhante na areia junto com seus profundezas do vasto e insondável
anéis e outras joias. mar azul, e assim, como um meló-
100
No mar, a uma distância con- dico pássaro, ela pereceu.
siderável, havia uma rocha com as
108 120
Jamais misture teu pão, ó pre- Todas as águas do mar azul
zada mãe, com a espuma e as serão o sangue do corpo de Aino.
águas do oceano cerúleo. Todos os peixes que nadam nessas
109
Nunca, em todos os dias de águas serão a carne de Aino para
tua vida, se tu amas a tua filha sempre.
121
Aino. Os salgueiros à beira-mar se-
110
Querido irmão, adentrei às rão as costelas de Aino no porvir.
122
margens do mar, na busca de di- E todas as ervas marinhas da
versão entre as ondas. margem terão crescido a partir das
111
Com a pedra de muitas cores, tranças de Aino.”
123
afundei a pobre Aino nas profun- Assim, a donzela desapare-
dezas do insondável e vasto mar ceu, e assim pereceu a adorável
azul. Aino.
112 124
Ela pereceu como um meló- Quem se encarregará de nar-
dico e gracioso pássaro. rar essa história cruel? Quem le-
113
Jamais conduzas teu corcel vará as más notícias até a morada
guerreiro com altivez, tampouco de sua mãe, que outrora foi o lar da
tragas teu corredor real. adorável Aino? Será o urso que re-
114
Não permitas que teus corcéis petirá essa história e transmitirá as
adentrem as águas que delineiam tristes novidades à sua progeni-
as fronteiras do mar azul. tora? Não, pois o urso não pode ser
115
Nunca, em todos os dias de o mensageiro, pois ela destruiria os
tua vida, se tu amas a tua irmã rebanhos de gado.
125
Aino.” Quem, então, terá a responsa-
116
“minha amada irmã, dirigi-me bilidade de contar essa história
à costa marítima em busca de re- cruel? Quem levará as más notí-
creação entre as ondas. cias até a cabana de seu pai, que
117
Utilizando uma pedra de múl- outrora foi o lar da adorável Aino?
tiplas tonalidades, afundei a pobre Será o lobo que repetirá essa histó-
Aino nas profundezas do insondá- ria e trará a triste notícia a seu ge-
vel e vasto mar azul. nitor? Não, pois o lobo não pode
118
Como um majestoso pássaro ser o mensageiro, pois ele se ali-
melodioso, ela pereceu. Jamais ve- mentaria dos cordeiros mansos e
nhas para lavar tuas pálpebras nes- gentis.
126
tas ondas ondulantes e na espuma Quem, então, terá o encargo
do mar. de relatar a história cruel? Quem
119
Nunca, em todos os dias de ousará trazer as más notícias à casa
tua vida, se tu amas a tua irmã de sua irmã? Acaso a raposa repe-
Aino. tirá a narrativa? Ela se tornará
mensageira das novidades? Não,
pois não convém que a raposa as- a palavra: “Escuta-me, Ó Pernas-
suma tal papel, visto que ela se de- compridas, pois consideramos as-
leitaria com os patos e as galinhas. sar-te; Ó Olho-grande, cogitamos
127
Quem, então, terá a responsa- ensopar-te.
133
bilidade de narrar a história repleta Serás assado para o desjejum
de sofrimento? Quem se disporá a de nossa senhora e ensopado para
levar as tristes notícias até a mo- o jantar de nosso mestre.
134
rada de seu irmão, o local que ou- Faremos de ti um banquete
trora abrigava a amada Aino? Será para Aino, assim como para o seu
que a lebre será incumbida de re- irmão, Youkahainen! É preferível,
petir a história e transmitir a dolo- portanto, que galopes velozmente
rosa mensagem a seu irmão? Sim, de volta à tua toca nas montanhas,
é a lebre que se tornará o mensa- do que te tornares o prato principal
geiro, proclamando a todos a his- de nossos jantares.”
135
tória cruel que se desenrolou. E assim, a lebre altiva profe-
128
E assim, a lebre inofensiva riu sua resposta, relatando o des-
respondeu, dizendo: "Eu serei o tino de Aino com palavras solenes:
mensageiro que levará as más no- "Que não se pense que venho a
tícias à antiga morada de Aino, a este lugar para ser assado em uma
fim de relatar essa história aos seus frigideira ou cozido em uma cha-
familiares." leira.
129 136
Com presteza avançou o men- Deixem que Lempoa encha
sageiro de orelhas alongadas, ágil suas mesas! Trouxe notícias som-
como os ventos que o precedem. brias, vim para contar a cruel his-
130
Velozmente galopou, tal qual tória do desaparecimento e morte
o voo das águias, seu pescoço con- de Aino, a amada irmã de You-
torcido impulsionando-o para a kahainen.
137
frente, até alcançar o ansiado Com a pedra adornada por
abrigo, outrora lar da encantadora múltiplas cores, Aino foi submer-
Aino. gida nas profundezas das águas
131
A morada encontrava-se vastas e insondáveis, como um
imersa em silêncio e desabitada; belo pássaro cantor que pereceu.
então, ele adentrou a casa de ba- Seus laços foram pendurados nos
nho, onde deparou-se com um choupos, sua cruzeta de ouro dei-
grupo de donzelas, cada uma em- xado na praia, mantos de seda
penhada em varrer com vassouras adornaram os amieiros, suas meias
de bétula. de seda repousaram sobre as ro-
132
A lebre assentou-se na soleira chas, seus sapatos de pele de cervo
e, assim, as donzelas dirigiram-lhe descansaram na grama, seu colar

a
O Princípio do Mal; mesmo que Hisi, Piru e Jutas.
brilhante se perdeu na areia, assim direção à terra como sua possessão
como seus anéis e joias. e à água como sua parte destinada.
138 147
Nas ondas repousa a adorável Enquanto as lágrimas caem e
Aino, adormecida no profundo e se misturam, formando três ria-
ilimitado mar azul, nas cavernas chos em sua origem, das pálpebras
dos salmões, sendo a companheira da mãe surgem correntes de lágri-
do badejo e amiga dos peixes mas peroladas.
148
ágeis." Fluiam como pequenos rios, e
139
A tristeza se abate sobre a cada riacho crescia, transfor-
mãe idosa, e de seus olhos azuis mando-se em uma torrente impetu-
brotam lágrimas amargas. osa.
140 149
Ela expressa seu pesar em pa- E em cada torrente impetuosa
lavras lamentosas, com o coração e ruidosa, uma catarata se forma,
partido, respondendo da seguinte espumando sob a luz prateada do
forma: "Escutai, ó todas as mães, e sol.
150
ouçam atentamente, aprendam co- A partir da agitação da cata-
migo uma história de sabedoria. rata, três rochas erguem-se majes-
141
Nunca forcem suas filhas a tosas, sustentando pilares grandio-
deixarem o lar paterno contra sua sos.
151
vontade, para unir-se a noivos que De cada rocha, no seu topo,
não amam. brotam três colinas cobertas de
142
Eu, como mãe cruel e insen- verdejantes vegetações.
152
sata, expulsei minha adorável E de cada colina, bétulas sal-
Aino, a mais bela filha das Terras picadas surgem em trio, erguendo-
do Norte." se em direção aos céus.
143 153
Com tristeza, a mãe de cabe- No topo de cada bétula, re-
los grisalhos derrama lágrimas pousa um cuco dourado, procla-
amargas, que escorrem por seu mando seu chamado.
154
rosto enrugado. E os três cantam, todos em
144
Essas lágrimas descem até al- harmonia: "Amor! Ó Amor!" res-
cançar o seio, e dali fluem até a soa o primeiro chamado.
155
borda de sua vestimenta. O segundo canta, clamando:
145
Elas prosseguem, descendo "Pretendente! Pretendente!"
156
pelas meias de seda, até tocar os E o terceiro chama e ecoa, tra-
sapatos feitos de pele de veado. zendo consolação: "Consolação!
146
E então, sob seus pés calçados Consolação!"
157
com sapatos de pele de veado, as Aquele chamado de "Amor!
lágrimas fluem incessantemente, Ó Amor!" ecoa, convocando três
como uma corrente que segue em luas e continuando incessante-
mente, dirigindo-se à donzela que
rejeita o amor, adormecida nos RUNA V.
castelos das profundezas maríti- LAMENTAÇÃO DE VÄINÄMÖINEN.
mas.

A S notícias se espalharam
158
O pretendente canta, procla-
mando "Pretendente! Preten- longe e extensamente, al-
dente!" por seis luas, persistindo cançando os ouvidos de ho-
incansavelmente, para o preten- mens distantes, que ficaram cien-
dente que canta e corteja sem ser tes da história da fuga e morte de
ouvido. Aino.
2
159
Aquele que tristemente canta Ela era a amada irmã de You-
e ecoa: "Consolação! Consola- kahainen, considerada a mais bela
ção!" continua a entoar incessante- dentre todas as filhas da criação.
3
mente por toda a sua vida, para a Väinämöinen, o valoroso e ve-
mãe de coração partido, que deve raz, prontamente mergulhou em
lamentar e chorar eternamente. um pranto amargo.
4
160
Quando a mãe solitária e de- Chorou durante a aurora, cho-
safortunada foi agraciada com o rou ao anoitecer, sem descanso, la-
cântico sagrado do cuco, uma tris- mentou a longa noite de tristeza.
5
teza profunda invadiu seu coração. Sua Aino havia partido, a don-
161
Em meio a lágrimas doloro- zela havia desaparecido, afundado
sas, ela expressou seu pesar: "Ao no abismo do mar azul, vasto e ili-
escutar o canto do cuco, minha mitado.
6
alma se enche de melancolia. Repleto de aflição, o antigo
162
Lágrimas escorrem dos meus cantor, Väinämöinen das Terras do
olhos cansados, percorrendo meu Norte, com um coração sobrecar-
rosto marcado pelo tempo. regado e lágrimas amargas, apres-
163
São lágrimas imponentes, se- sou-se em direção às agitadas
melhantes a pérolas marinhas de águas.
7
prata. Eis a oração e a indagação do
164
Meus cotovelos, que testemu- suplicante:
8
nharam o passar dos anos, enve- "Dize-me, Untamo, ó sonhador,
9
lhecem junto comigo. Revela-me, Ó Indolência, as vi-
165
Meus dedos enrugados se cur- sões que te acometem,
10
vam, cansados em todos os seus Onde podem os deuses das
membros. águas encontrar refúgio,
11
166
Meu corpo estremece em uma Onde as donzelas de Wellamo
paralisia exaustiva. podem descansar?"
12
167
Ao escutar o canto do cuco, o Então Untamo, em resposta,
cântico sagrado do cuco." contou seus sonhos preguiçosa-
mente, eis as suas palavras: "Lá re-
sidem as sereias, habitação das
22
donzelas de Wellamo, no promon- Com perícia, ele lançou sua
tório adornado com exuberante ve- rede em ângulos longos e mais lon-
getação, na ilha coberta por densas gos, dedicando-se a essa tarefa por
florestas, nas águas profundas e dias e noites, desde o amanhecer
translúcidas, nas costas purpúreas. até o anoitecer, até mesmo ao
13
Ali repousam as donzelas do meio-dia.
23
mar, as donzelas de Wellamo, em Inúmeras vezes ele lançou sua
seus aposentos à beira-mar, des- rede, perseverando em sua pesca-
cansam em suas cavernas aquáti- ria.
24
cas, nas rochas com as cores do E eis que, finalmente, numa
arco-íris, nas saliências das falé- manhã ensolarada, sua persistên-
sias." cia foi recompensada.
14 25
Imediatamente, Väinämöinen Ele se deparou com um peixe
apressa-se em direção a uma casa dotado de poderes mágicos, que
de barcos situada à beira-mar. brincava em sua linha de pesca,
15
Ele observa com diligência os saltando e agitando as águas com
anzóis e as linhas que considera ímpeto.
26
adequados. Porém, o peixe, exausto após a
16
Prepara varas de pesca, redes árdua luta, finalmente sucumbiu às
secas e as coloca em um barco habilidades do pescador.
27
feito de cobre. Com habilidade e destreza, o
17
Então, ele começa a remar ra- pescador o capturou e o acomodou
pidamente em direção à ilha co- seguro no fundo de sua embarca-
berta de floresta, até o ponto ador- ção de cobre, digna de um herói.
28
nado de vegetação exuberante e o Väinämöinen, erguendo-se
promontório tingido de púrpura, com altivez, proferiu as seguintes
onde habitam as ninfas do mar. palavras em um espanto reverente,
18
Mal chega à ilha, o menestrel em forma de enigma: "Este, dentre
prontamente inicia sua pescaria. todos os peixes do mar, é o mais
19
Com destreza, ele lança o an- formoso que já meus olhos con-
zol para longe e o recupera ágil- templaram.
29
mente das águas, girando-o em um Não há igual a ele, por certo.
30
elo giratório de cobre preso a uma É indubitavelmente mais su-
linha prateada de pesca. ave que o salmão, suas manchas
20
O anzol que ele usa é dourado. brilham com maior intensidade
21
Eis que ele lançou sua rede de que as da truta, sua coloração é
pesca, tecida com fios de seda, mais acinzentada que a do lúcio de
buscando capturar suas presas. Suomi.
31 40
Possui menos nadadeiras que Sua cabeça emerge majestosa-
qualquer fêmea, superando em nú- mente acima das águas, além do
mero as nadadeiras de todo peixe alcance dos apetrechos de pesca.
41
macho. Assim, dirige-se a Väinämöi-
32
Não se assemelha às listras das nen, repreendendo com veemência
donzelas nascidas no seio do mar, o antigo herói, em tais palavras: "Ó
tampouco ao cinturão das sereias, Väinämöinen, honrado menestrel
nem mesmo às asas de qualquer do passado, não ouse presumir que
pássaro melodioso. vim a este lugar como um salmão
33
Sua aparência é, de certa pronto a ser capturado, apenas para
forma, similar à do nosso salmão ser retalhado em pedaços, vestido
do norte, proveniente das grutas e degustado como um simples ba-
mais profundas do mar azul." dejo.
34 42
No cinto do antigo herói, re- Não serei para ti uma refinada
pousava uma faca adornada com refeição matinal, tampouco um de-
prata, cuidadosamente embai- leite ao meio-dia, nem sequer uma
nhada. saborosa ceia.
35 43
Retirando-a de seu estojo, ele Pois não passarei a ser a quarta
utilizá-la-ia para cortar o peixe em refeição na Terra do Norte."
44
pedaços, visando prepará-lo para o Disse o antigo Väinämöinen:
assado. "Por que então vieste para cá, se
36
Com maestria, transformá-lo- não for para o meu jantar?"
45
ia em um desjejum requintado, Assim respondeu o peixe sem
uma refeição ao meio-dia, um ban- nome, dizendo: "Eu vim a ti, ó me-
quete saboroso e um jantar no- nestrel, para encontrar repouso e
turno. demorar em teus braços.
37 46
Com destreza, assim como um Desejo amar-te e confortar-te,
peixe, ele avança, tocando habil- tornando-me tua esposa e compa-
mente com sua reluzente lâmina de nheira de vida eternamente.
47
prata. Embelezarei tua cama com
38
Com velocidade surpreen- lençóis brancos, acariciarei tua ca-
dente, o peixe salta sobre as águas beça enquanto repousas no traves-
e mergulha abaixo da superfície seiro.
48
serena do mar, partindo do barco Limparei teus aposentos e os
de fundo de cobre, do esquife per- preencherei de alegria.
49
tencente a Väinämöinen. Manterei tua moradia em or-
39
Nas vastas extensões das on- dem, acenderei o fogo quando ne-
das, a uma considerável distância, cessário, assarei para ti biscoito de
eis que se ergue rapidamente do mel e encherei teu copo com água
mar, no sexto e sétimo vagalhão. de cevada.
50
Farei tudo o que desejares.
51 62
Eu não sou um peixe escamoso "Oh, tu que és a irmã de You-
que habita as vastas águas salgadas kahainen, a formosa Aino de
do mar, nem uma truta que nada Pohyola, peço-te que voltes para
nos rios das terras ao norte. mim mais uma vez!"
52 63
Também não sou um badejo A sereia, sabiamente, respon-
que vive nas profundezas das deu: "O espírito de Aino nunca
águas, nem um salmão que per- mais virá a ti e sofrerá maus tra-
corre as correntezas dos mares do tos."
64
norte. A jovem donzela desceu rapi-
53
Eu sou uma jovem donzela damente das águas, proveniente da
cheia de alegria, uma amiga e irmã superfície das ondas, em direção
dos peixes. aos seixos repletos de cores diver-
54
Sou a irmã mais nova de You- sas.
65
kahainen, sou eu, Aino, a quem tu Ela se dirigiu às cavernas pi-
pescas e a quem tu amas. torescas do arco-íris, onde as se-
55
Em tempos passados, eras re- reias residem e permanecem.
66
conhecido como um herói elo- Väinämöinen, não desani-
quente, um homem de sabedoria mado, ponderou profundamente e
em suas palavras. considerou com sabedoria como
56
Agora, porém, tu, Väinämöi- poderia viver, trabalhar e conquis-
nen, te tornaste um tolo, carente de tar sua amada.
67
discernimento e juízo. Com cuidado, ele lançou sua
57
Não possuis conhecimento su- rede de pesca de seda, movendo-a
ficiente para me preservar. habilmente através da espuma e
58
Teu coração é cruel, tuas mãos das ondas, pelas baías e canais si-
estão manchadas de sangue. nuosos.
59 68
Tentaste tirar minha vida com Ele a arrastou pelas águas se-
uma faca destinada aos peixes, pla- renas, pelos domínios dos salmões
nejando me cozinhar para a tua re- e pelas moradias das donzelas da
feição. água, navegando pelas águas de
60
Eu, uma sereia de Wellamo, Vainola, atravessando o profundo
antes conhecida como a bela e en- azul do oceano, os lagos distantes
cantadora Aino, querida irmã de da Lapônia, os rios de Youkolaa e
Youkahainen." os mares de Kalevala.
61 69
E assim falou o velho Ele esperava encontrar assim
Väinämöinen, com pesar e pro- sua amada Aino.
70
fundo arrependimento em seu co- Muitos foram os peixes que ele
ração: capturou, todas as formas de cria-
turas semelhantes a peixes, mas ele
a
Jouko'la (Youko'la). A terra natal ou habitação de Youkahainen.
não conseguiu encontrar a donzela aquáticas, para o reino de Wel-
do mar, a donzela da água de Wel- lamo."
79
lamo, a filha mais formosa das ter- Väinämöinen partiu, carre-
ras do norte. gando consigo apenas o vazio das
71
E assim, o antigo menestrel, mãos e o peso no coração.
80
cuja mente estava abatida e o cora- Sem demora, ele dirigiu-se à
ção desanimado, disse em pro- sua terra, à sua morada em Kale-
funda tristeza: "Eu sou tolo e mi- vala.
81
nha insensatez é grande, pois não Durante sua jornada, proferiu
possuo nem inteligência nem dis- estas palavras: "O que terá aconte-
cernimento. cido com o cuco, outrora portador
72
Houve um tempo em que eu de alegria, que costumava alegrar
possuía algum conhecimento, al- as manhãs e as noites, frequente-
guma percepção da sabedoria e até mente entoando sua canção ao
mesmo um pouco de instinto. meio-dia? O que terá silenciado
73
No entanto, todas as minhas seu canto? Que força terá mudado
virtudes me abandonaram nestes sua melodia? A tristeza deve ter
dias tristes de perversidade. calado seu canto e a compaixão al-
74
Minha juventude e vigor des- terado seu chamado.
82
vaneceram, minha percepção se Não mais ouço seu canto, que
foi e meu entendimento se dissi- costumava encher minha manhã de
pou. Toda minha prudência foi prazer e minha noite de felicidade.
83
destinada aos outros! Jamais descobrirei o segredo,
75
Aino, a quem amo e estimo, a como viver e prosperar, como des-
quem tenho procurado honrar por cansar na terra e vagar pelos ma-
todos esses anos, agora é uma don- res! Somente minha idosa mãe,
zela de Wellamo, outrora uma que habita na face da Terra do
amiga prometida quando necessá- Norte, certamente me aconselharia
rio, e minha noiva prometida para a respeito de meus pensamentos e
sempre. ações.
76 84
Houve um tempo em que a ti- Que este cálice de dor possa
nha ao meu alcance, quando a en- passar por mim, que esta tristeza
contrei nas grutas de Wellamo e a possa abandonar-me e que esta nu-
levei em meu barco de cobre, com vem sombria se dissipe."
85
minha linha de pesca feita de prata. Nas profundezas, a mãe des-
77
No entanto, ai de mim! Não pertou do seu sono eterno e disse:
pude mantê-la e não percebi que a "Eu estava apenas descansando,
tinha conquistado tarde demais mas agora despertei para respon-
para cortejá-la e conquistá-la. der-te.
78 86
Deixei-a escapar entre meus Conta-me qual é o teu pensa-
dedos, para a morada das donzelas mento e qual é a tua ação, para que
eu possa te ajudar a passar por essede ouro, coloca a sela em suas cos-
cálice de aflição e para que essa tas, com fivela de prata e estribos
tristeza possa se dissipar e essa es-
de cobre.
3
curidão se dissolver. Sentado em seu corcel, inicia
87
Parte imediatamente em dire- sua jornada para o norte.
4
ção à Terra do Norte e visita as fi- Ele avança vigorosamente, ga-
lhas de Suomi. lopando pela estrada, sentado em
88
Tu as encontrarás sábias e en- sua sela habilmente trabalhada,
cantadoras, superiores em beleza a montado em seu cavalo manchado
Aino e mais dignas de se tornarem de magia, atravessando os prados
tuas esposas. de Vainola e as planícies de Kale-
89
Elas não são tão volúveis e to-vala.
5
las como as inconstantes donzelas Ele galopa rapidamente e dis-
da Lapônia. tante, muito além de Vainola, con-
90
Toma para ti uma companheira tornando o deserto das águas até
para a tua vida dentre as honestas chegar às margens do mar azul,
casas de Suomi, uma das filhas vir- sem permitir que seus cascos se
tuosas da Terra do Norte. molhem durante a corrida.
91 6
Ela irá encantar-te com sua No entanto, o perverso You-
amabilidade, trazer-te felicidade kahainen nutria rancor em seu co-
com sua bondade. ração, alimentando o verme da in-
92
Sua forma é perfeita e sua con-veja por Väinämöinen, o magní-
duta é fácil, seus passos são graci-fico encantador.
7
osos e cada movimento é cheio de Ele construiu uma besta cruel
sagacidade e bom comportamento. usando aço e outros metais, pin-
93
Ela honrará o teu lar e a tua fa-
tando o arco em diversas cores e
mília." moldando a parte superior com co-
bre.
RUNA VI. 8
Ele adornou o arco com prata
JORNADA INFELIZ DE VÄINÄMÖINEN. nevada e utilizou ouro para de-
ÄINÄMÖINEN, idoso e corá-lo.

V verdadeiro, está agora se


preparando para uma jor-
nada em direção à aldeia das Ter-
ras do Norte, à terra dos invernos
rigorosos, à terra com pouco sol e
às terras habitadas por mulheres
dignas.
2
Ele monta seu ágil cavalo real,
ajusta cuidadosamente o freio feito
9
Em seguida, procurou os ten- pontas foram feitas do metal mais
dões mais fortes, encontrando-os afiado.
16
no veado de Hisi, e entrelaçou li- Quando as hastes e as pontas
nho de Lempo. estavam prontas, ele emplumou
10
A cruel besta estava completa, cuidadosamente suas flechas com
com corda e haste, e suas pontas penas de andorinha e espinhos das
afiadas. O arco era belo e pode- asas do pardal.
17
roso, certamente não havia sido Ele endureceu as flechas em-
feito de maneira desprezível. plumadas de forma adequada e in-
11
Nas costas, havia um corcel fundiu novas virtudes em cada
pintado, com belos potros em cada uma delas.
18
extremidade. Ele as mergulhou no sangue de
12
Próximo à curva do arco, havia serpentes e no veneno de víboras.
19
uma pintura de uma donzela dor- Agora todas as suas flechas es-
mindo, enquanto perto do entalhe tão prontas, e sua besta cruel está
havia uma lebre saltitante. pronta e amarrada.
13 20
Assim, o arco formou-se de Aguarda-se a chegada do sábio
maneira maravilhosa. Väinämöinen.
14 21
Ele cortou algumas flechas Youkahainen, o menestrel da
para sua aljava, cobrindo-as com Lapônia, espera há muito tempo,
as melhores penas. sem se cansar.
15 22
As hastes das flechas foram Ele aguarda com vigilância o
moldadas a partir do carvalho, e as antigo cantor, observando-o ao
Youkahainen vigia Väinämoinën. Nikolai Kochergin.
amanhecer, ao entardecer e inces- dia? Não são nuvens que se apro-
santemente ao meio-dia. ximam no horizonte, nem o raiar
23
Fica à espreita do mágico, es- do novo dia.
33
perando e observando com uma É o antigo Väinämöinen, o re-
espécie de inveja. nomado e sábio encantador, que
24
Ele senta-se junto à janela cavalga em direção à Terra do
aberta e fica atrás da cerca viva, Norte.
34
observando. Montado em seu corcel, ele ca-
25
Fica no caminho, ouvindo e vi- valga no cavalo mágico de Vai-
giando ao longo dos balcões de nola."
35
prados. Num instante, o jovem You-
26
Sua aljava está pendurada em kahainen, o orgulhoso e perverso
suas costas, com flechas empluma- trovador da Lapônia, tomou sua
das. besta com pressa, e preparou seu
27
Ele carrega consigo uma pode- arco e flechas com a intenção de
rosa besta, como se estivesse mer- matar Väinämöinen.
36
gulhado no veneno de uma víbora. A velha mãe perguntou rapida-
28
Ele espera, observa e não se mente ao seu filho, Youkahainen,
cansa, escutando da janela da casa e disse-lhe estas palavras: "Quem
de barcos. é o alvo da tua besta? Em cujo co-
29
Ele permanece no final do ração estão destinadas as tuas fle-
ponto de nevoeiro, próximo ao rio chas envenenadas?"
37
que flui em direção ao mar, perto Respondeu Youkahainen: "Eu
da corrente sagrada e do redemoi- criei essa poderosa besta, um arco
nho, próximo à queda de fogo do moldado e flechas envenenadas,
rio sagrado. com o propósito de acabar com a
30
No alvorecer, quando a aurora vida de Väinämöinen, o amigo das
pintava o céu, o menestrel da La- águas.
38
pônia, Youkahainen de Pohyola, Planejo atirar no velho mago,
direcionou seu olhar para o Nor- o bardo e herói eterno, visando seu
deste. coração, fígado, cabeça e ombros.
31 39
Seus olhos se voltaram ao nas- Com este arco e flechas em-
cer do sol, onde avistou uma nu- plumadas, pretendo destruir meu
vem negra pairando sobre o oce- rival poeta."
40
ano e algo azul sobre as águas. Então, a mãe idosa respondeu
32
Em um solilóquio, ele ponde- com reprovação e proibição, di-
rou:"Seriam aquelas nuvens no ho- zendo: "Não deves matar o bom
rizonte ou talvez o amanhecer do Väinämöinen, o antigo herói das
Terras do Norte, pertencente a uma
47
nobre linhagem, pois ele é filho da Com cuidado meticuloso,
minha irmã, meu sobrinho. ajusta a corda do arco e coloca a
41
Se tu o matares, Ai! toda a ale- flecha emplumada com precisão.
48
gria desaparecerá e nossos maravi- Coloca-a sobre a corda de li-
lhosos cantos perecerão. nho, segurando a arma em seu om-
42
É melhor que a alegria esteja bro.
49
presente na terra, assim como a Com precisão, aponta na dire-
música mágica, do que nos reinos ção da margem, mirando direta-
inferiores, no domínio de Tuonia, mente no coração de Väinämöi-
onde residem aqueles que parti- nen, esperando pacientemente que
ram, na terra além." ele se aproxime galopando.
43 50
Então o jovem Youkahainen, Enquanto aguarda, nas som-
após ponderar profundamente, er- bras de um arbusto, pronuncia as
gueu a besta com uma mão, en- seguintes palavras: "Corda de li-
quanto a outra parecia enfraquecer nho, sê tensa e elástica; voa rapi-
ao puxar a cruel corda do arco. Por damente, flecha de freixo emplu-
fim, ele proferiu estas palavras mada; acelera velozmente, projétil
com o peito inflado de inveja: mortal; ágil como a luz, flecha en-
"Que toda alegria desapareça eter- venenada, adentra o coração de
namente, que os prazeres terrenos Väinämöinen.
51
pereçam rapidamente, que se ex- Se porventura segurar-te baixo
tinga a música mais doce da terra, demais, que os deuses te elevem;
que a felicidade se vá para sempre; se meus olhos te mirarem com ex-
lançarei minha flecha contra este cessiva altitude, que os deuses te
rival menestrel, sem me importar façam descer."
52
com o que é o fim." Com firmeza, ele agora aciona
44
Com destreza e agilidade, ele o gatilho, como um relâmpago, a
prepara seu arco incandescente, flecha voa sobre a cabeça de
enquanto descansa a arma em seu Väinämöinen.
53
joelho esquerdo. Direcionando-se ao céu mais
45
Seu pé direito permanece fir- elevado, ela se lança em veloci-
memente plantado no chão, pro- dade e atravessa as mais altas nu-
porcionando estabilidade. vens, dispersando todo o rebanho
46
Assim, ele encorda o arco com das nuvens de lã, em sua jornada
invejável habilidade. Seleciona rápida em direção ao céu.
54
três flechas de sua aljava, esco- Não desanimado, com uma se-
lhendo criteriosamente a melhor leção rápida e um ajuste ágil, You-
delas. kahainen aponta seu arco e dispara
rapidamente uma segunda flecha.

a
55
A flecha acelera veloz como com teus olhos os prados de Vai-
um raio, mirando bem baixo o pro- nola, as planícies de Kalevala.
64
jétil. Deves nadar por seis anos in-
56
Ela mergulha na terra, perfu- teiros nos vastos oceanos, enfren-
rando as regiões mais baixas e di- tar as ondas por sete verões, caval-
vidindo a antiga Montanha de gar as ondas espumantes por oito
Areia em duas partes. anos, na vastidão das águas.
57 65
Youkahainen, sem sentir medo Passarás por seis longos outo-
algum, prontamente lança um ter- nos como um abeto, sete invernos
ceiro disparo. como uma pedra e oito longos ve-
58
Veloz como a luz, ele acelera rões como um álamo."
66
em sua jornada e atinge o corcel de E logo o menestrel da Lapônia
Väinämöinen, o ágil nadador oceâ- acorreu ao seu aposento encan-
nico. tado, ao que sua mãe dirigiu-se a
59
Seu golpe acerta próximo ao ele:"Acaso tu, filho meu, ceifaste a
cinto dourado, perfurando o ombro vida do bom Väinämöinen, o filho
do corredor. de Kalevala?"
60 67
E aconteceu que o sábio Eis que Youkahainen respon-
Väinämöinen, em seguida, caiu-se deu, dizendo: "Eis que eu matei o
precipitadamente sobre as águas, velho Väinämöinen e derrubei o fi-
mergulhando sob as ondas que se lho de Kalevala.
68
moviam como ondulações, saindo Para que ele agora possa arar
da sela de seu corcel, cuja arma- as vastas águas do oceano e varrer
dura era manchada de magia. as ondas.
61 69
E eis que um vento poderoso e Ele encontrará repouso nas ro-
tempestuoso se levantou, rugindo chas que se erguem e se deitará.
70
furiosamente sobre as águas, car- Ele mergulhou de cabeça nas
regando o velho Väinämöinen para águas salgadas, afundou o mágico
longe da terra, sobre as ondas, nas em suas profundezas.
71
altas e ondulantes ondas, pelas Ele se voltou para a praia, vi-
vastas extensões do mar. rando as costas para a rocha, esta-
62
Vangloriou-se, o jovem You- belecendo assim seu eterno des-
kahainen, acreditando que Waino tino.
72
estava morto e sepultado. Portanto, ele tem para viajar os
63
Com palavras jactanciosas, ele mares sem limites, cavalgando as
disse: "Nunca mais, velho ondas que se erguem majestosas."
73
Väinämöinen, nunca mais em to- Esta é a resposta da mãe: "Ai
dos os dias da tua existência, en- da terra por causa da tua ação! A
quanto a luz dourada da lua bri- alegria e o canto desapareceram
lhar, nunca mais contemplarás para sempre.
74 7
A sagacidade das eras se per- Aqui estou, sob o céu estrelado,
deu! Tu mataste o bom Väinämöi- em meio a essa cruel imensidão de
nen, o antigo cantor da sabedoria. água, nadando e vagando dia e
75
Mataste o orgulho de Suwan- noite, lutando contra os ventos das
a
tala , o herói de Vainola, a alegria tempestades, sendo lançado por
de Kalevala." ondas crescentes, perdido nas vas-
tas extensões deste imenso mar,
RUNA VII. neste oceano sem fim.
O RESGATE DE VÄINÄMÖINEN 8
Minha vida é fria, triste e me-
lancólica, uma dor insuportável

E IS que Väinämöinën, o ve-


lho e verdadeiro, atraves-
sou as profundezas do mar,
navegando como um ramo trêmulo
para que eu possa permanecer
sempre nestas águas, lutando pela
minha existência.
9
Não consigo compreender
de álamo, como um galho mur-
chado de salgueiro. como posso prosperar, encontrar
2
Durante seis dias de verão e seis comida e abrigo nessas águas frias
noites sob o brilho dourado da lua, e desprovidas de vida, nesses dias
ele nadou incansavelmente. de terrível infortúnio.
10
3
Contudo, as ondas se erguiam Acaso construirei minha mo-
diante dele, e o céu e o oceano se rada com o vento? Certamente ela
estendiam atrás dele. não encontraria um fundamento
4
Com valentia, ele persistiu por seguro.
11
mais dois dias e enfrentou duas E se eu construísse minha casa
longas noites em batalha avante. sobre as ondas? Sem dúvida, as
5
Mas na noite do oitavo dia, o ondas a destruiriam.”
12
coração de Väinämöinën foi to- Da longínqua Pohyola surge
mado pela desolação, pois suas uma ave, do ocidente vem uma
unhas se perderam e seus dedos ja- águia.
13
ziam mortos e agonizantes. Não se classifica entre as mai-
6
Väinämöinën, triste e exausto, ores, tampouco entre as menores.
14
falou: "Oh, como estou desafortu- Uma de suas asas toca as
nado, minha vida velha! Ai de águas, enquanto a outra percorre
mim, filho do infortúnio! Fui um os céus.
15
tolo quando a sorte me sorriu, ao Sobre as ondas ela desliza seu
abandonar minha casa e minha fa- corpo e com seu bico toca as falé-
mília por uma donzela bela e en- sias.
cantadora.

a
O mesmo que Vainola(?)
16 21
Voa incansavelmente, para en- Assim, parti rapidamente em
tão pousar com segurança. uma jornada, cavalgando na vasti-
17
Observa à frente, observa dão do oceano.
22
atrás, e eis que avista o valente E ao chegar, numa manhã ao
Väinämöinën, no dorso azul do despontar da aurora, encontrei-me
oceano. na baía de Luotolaa, próxima ao rio
18
A águia, então, se aproxima impetuoso de Youkola.
23
dele e indaga: "Por que, ó antigo Contudo, nesse lugar, o mal-
herói, estás navegando nas profun- vado Youkahainen, com seu arco e
dezas do mar?" flecha, ceifou a vida do meu corcel
19
"Eis que eu sou o antigo e tentou me ferir com suas armas
Väinämöinën, amigo e compa- mortais.
24
nheiro das águas, um renomado Em seguida, precipitei-me nas
cantor de sabedoria. águas, mergulhando sob a superfí-
20
Decidi aproximar-me de uma cie do mar salgado, deixando para
donzela das Terras do Norte e cor- trás a sela do meu corcel mágico,
teja-la, uma donzela que reside na um corcel cuja pelagem era ador-
sombria Terra das Trevas. nada de poderes encantados.

A Águia resgata Väinämoinën. Nikolai Kochergin.

a
Uma baía da Finlândia, com o nome de Joukola.
25 35
E eis que sobreveio um vento Assim respondeu o pássaro do
impetuoso, uma tempestade pode- Éter: "Não te desanimes, pois, co-
rosa, que se levantou do leste e do loca-te entre meus ombros, sobre
oeste, como um redemoinho arre- minhas costas, e assenta-te firme-
batador. mente, que eu te erguerei das
26
Fui levado em direção ao vasto águas e conduzindo-te o levarei
mar, sobre as ondas que se er- com minhas asas para cima, levar-
guiam diante de mim. te-ei para onde desejares.
27 36
Por muitos dias vagueei pelas Lembro-me bem do dia em
águas, nadando e me balançando que tu prestaste serviço à águia,
enquanto era levado cada vez mais quando favoreceste os pássaros.
37
longe. Tu deixaste a bétula erguida,
28
Durante incontáveis noites, lu- quando as florestas de Osmo fo-
tei contra as ondas impetuosas e o ram devastadas nas terras de Kale-
rugir do mar, enfrentando os ven- vala, tornando-se um lar para os
tos furiosos e as águas tumultuosas pássaros canoros fatigados e um
que me cercavam. lugar de repouso para as águias."
29 38
Ai de mim, desafortunado é o Então, Väinämöinën surge e
meu destino! Minha existência é eleva sua cabeça acima das águas
um fardo insuportável, pois não com ousadia, erguendo-se das on-
encontro solução para este pro- das do mar.
39
blema que me oprime. Ele se assenta sobre a águia,
30
Desconheço os caminhos da nos ombros emplumados da
vida e da morte diante das águas mesma.
40
amargas deste impiedoso mar. O imenso pássaro o transporta
31
Devo erguer minha morada so- rapidamente pelos céus, levando o
bre os ventos? Oh, que tolice! Pois antigo Väinämöinën pelo caminho
não encontrará alicerces seguros. dos ventos favoráveis, flutuando
32
E se eu edificar minha casa so- nas brisas primaveris.
41
bre as águas? Certamente, as ondas Ele é levado até a costa dis-
implacáveis a demolirão. tante das Terras do Norte, em dire-
33
Será, então, que devo deslizar ção à sombria Sariola, onde a
perpetuamente por entre as ondas? águia deixa sua carga e voa para se
Devo escolher entre a vida e a reunir aos seus companheiros.
42
morte? Na solidão e no cansaço,
34
E o que me sucederá se eu me Väinämöinën se prostrou imedia-
entregar à morte, se sucumbir sob tamente em profundo pranto.
43
as águas, perecendo neste lugar Com voz angustiada, ele derra-
com frio e fome?" mou lágrimas copiosas e gemeu
em tom pesaroso, à margem do
mar azul.
44 54
No alto de um promontório Com esses fios, ela produziu
triste, suas feridas numerosas, in- vestes extremamente suaves e fi-
fligidas pelos ventos impiedosos e nas, tudo isso antes do amanhecer
pelas águas agitadas, causavam- e antes mesmo que o adormecido
lhe tormento. Sol tivesse nascido.
45 55
Seus cabelos e barba se encon- Após concluir essa tarefa, a
travam desgrenhados, agitados criada procedeu a limpar as mesas
pelo bramido das ondas. feitas de madeira de bétula, em se-
46
Por três longos dias, ele derra- guida, varreu o chão do andar tér-
mou lágrimas desalentadas, la- reo do estábulo utilizando uma
mentando nas noites de aflição. vassoura feita de folhas e galhos
47
Perdido e sem encontrar dire- provenientes das bétulas da Terra
ção, ele vagava pela floresta sem do Norte.
56
uma pegada que o guiasse no ca- Ela cuidadosamente recolheu a
minho. sujeira com uma pá feita de cobre
48
Não havia indicação de retorno e a levou para fora do estábulo,
à sua morada em Kalevala, à sua atravessando a porta em direção ao
amada casa e aos seus parentes prado, na fronteira distante, pró-
queridos. ximo às ondas do vasto mar.
49 57
Uma jovem e graciosa donzela Enquanto ela estava lá, ouviu
da Terra do Norte, dotada de be- um lamento vindo das águas, um
leza encantadora e amável aparên- choro vindo da praia e uma voz de
cia, desafiou o Sol em uma aposta. um herói lamentando.
50 58
Ela também desafiou a Lua, Então a jovem rapidamente di-
afirmando que surgiria antes deles rige-se à sua morada, apressando-
na manhã seguinte. se ao lar de sua mãe. E assim diz:
51
E assim, a donzela, radiante "Eis que percebi um som de angús-
em sua beleza, levantou-se muito tia vindo do vasto oceano, ouvi um
antes do nascer do Sol e do desper- lamento ressoando da beira do
tar da Lua de suas camas sob o mar, na praia alguém está tomado
oceano. de pesar."
52 59
Antes que o galo cantasse ao Louhi, a anfitriã de Pohyola,
raiar do dia, antes que o Sol rom- uma dama anciã e desdentada das
pesse o sono, ela já havia tosqui- Terras do Norte, apressou-se em
ado seis cordeiros delicados e co- sair de sua residência, atravessou o
lhido seis lãs brancas deles. pátio e dirigiu-se ao prado, che-
53
Essas lãs foram utilizadas para gando à praia.
60
criar rolos de fiação, que por sua Ela prestou atenção aos sons
vez foram transformados em fios de choro que ouviu, o lamento de
para tecer. alguém imerso na tristeza.
61 70
Ela escuta a voz de alguém en- Fui conduzido a esta terra ha-
frentando dificuldades e captou bitada por estranhos, a essas terras
um grito heróico repleto de angús- desconhecidas e inadequadas.
71
tia. Eu era feliz ao lado de meus
62
Diante disso, a antiga Louhi parentes, em meu lar distante e em
responde: "Este não é um lamento minha terra natal, onde meu nome
de crianças, tampouco são as lágri- era honrado e reverenciado."
72
mas de mulheres. Louhi, a anfitriã de Pohyola,
63
É assim que choram os bravos respondeu a Väinämöinën:"Eis
heróis barbudos; trata-se de um que desejo obter tal conhecimento,
grito heróico de angústia." então permito-me indagar-te,
64
Com rapidez, impulsiona seu quem és tu dentre os heróis anti-
barco em direção à água, para en- gos, entre toda a hoste de heróis?"
73
frentar as enchentes. Esta é a resposta de
65
Seu navio, de beleza admirá- Väinämöinën:“Antigamente, meu
vel, avançava remando com uma nome era mencionado com fre-
velocidade comparável à de um quência, e eu era ouvido e honrado
raio, em direção ao entristecido como um menestrel e mágico du-
Väinämöinën. rante os longos e sombrios inver-
66
Ela oferece consolo ao herói, nos.
74
confortando-o enquanto ele cho- Eu era chamado de Cantor das
rava em meio a um bosque de sal- Terras do Norte, cuja fama ecoava
gueiros, em uma situação lamentá- pelos vales de Wainola e pelas vas-
vel, cercado por amieiros e ála- tas planícies de Kalevala.
75
mos, próximo ao mar salgado. Ninguém poderia conceber
67
Seu rosto tremia, com cabelos que uma tla infortúnio pudesse re-
em desalinho, expressando tristeza cair sobre o sábio Väinämöinën.”
76
por meio de seus ouvidos, olhos e Louhi, a anfitriã de Pohyola,
lábios. respondeu com vivacidade: “Le-
68
A anfitriã de Pohyola, Louhi, vante-se, ó herói, do desconforto
diz ao Väinämöinën: "Revela-me a de seu leito entre os salgueiros.
77
tua insensatez, qual foi a causa que É hora de seguir por um novo
te trouxe a esse estado lamentá- caminho.
78
vel." Vem comigo para aquela mo-
69
E o sábio e venerável rada e conte suas estranhas aventu-
Väinämöinën ergueu a cabeça e fa- ras, relate a história de seus infor-
lou, dizendo: "Verdadeiramente, túnios."
79
reconheço que é uma tolice que Agora, ela toma o infeliz herói
trouxe-me tantos problemas para e o levanta do seu leito de tristeza.
minha vida.
80 91
Com cuidado, ela o coloca em Meus companheiros, ventos e
seu barco, garantindo sua segu- águas, só o Sol parece amigável,
rança. neste país frio e cruel, perto destes
81
Em seguida, começa a remar portais desconhecidos."
92
com determinação e força, direcio- Louhi respondeu: "Por favor,
nando-se para sua casa na praia, não derrames mais lágrimas,
rumo às moradas de Pohyola. Väinämöinën, e não te aflijas mais,
82
Chegando lá, ela dá de comer ó querido amigo das águas. T
93
ao herói faminto, proporciona des- u és bem-vindo entre nós e te-
canso ao antigo Väinämöinën e lhe rás o privilégio de compartilhar
oferece calor, comida e abrigo. nosso convívio.
83 94
E logo o herói se recupera ra- Sentar-te-ás à mesa conosco,
pidamente. desfrutando dos manjares servi-
84
A anfitriã de Pohyola dirigiu- dos, como o saboroso salmão e o
se ao antigo cantor com a seguinte delicioso toucinho.
95
pergunta: "Por que, Väinämöinën, Também terás a oportunidade
amigo e companheiro das águas, de saborear o saboroso badejo pes-
choraste em tons tristes e amargos cado em nossas águas cristalinas."
96
na margem do oceano, entre os Assim respondeu o velho
álamos e salgueiros?" Väinämöinën, em gratidão: “Eu
85
Respondeu Väinämöinën: "Ti- nunca frequento mesas desconhe-
nha boas razões para o meu choro, cidas, mesmo que a comida nelas
uma causa suficiente para toda a seja rara e saborosa.
97
minha tristeza. Meu país de origem é o mais
86
Por muito tempo eu nadei, ba- querido para mim, minha própria
tendo nas ondas, nas águas que se mesa é a mais doce e minha pró-
estendem. pria casa é a mais atraente.
87 98
Essa é a razão do meu choro. Peço, bondoso Ukko, Deus
88
Tenho vivido em labuta e tor- acima de mim, que tu, Criador
tura desde que deixei minha casa e cheio de misericórdia, me permitas
meu país, deixei minha terra natal visitar novamente o meu amado lar
e parentes, e cheguei a esta terra de e país.
99
estranhos, a estes portais desco- É preferível viver em meu pró-
nhecidos. prio país, onde posso beber de suas
89
Todas as tuas árvores têm es- águas saudáveis em simples cáli-
pinhos para me ferir, todos os teus ces de madeira de bétula, do que
galhos, espinhos para me perfurar. vaguear por terras estrangeiras,
90
Até as bétulas me dão proble- onde teria acesso aos licores mais
mas, e os amieiros trazem descon- raros em tigelas de ouro pertencen-
forto. tes a estranhos."
100
Louhi, a anfitriã de Pohyola, cevada e a lã mais fina das ove-
respondeu ao mago: "Qual será a lhas?"
107
recompensa que me concederás se Esta é a resposta de Louhi:
eu te levar para qualquer lugar que "Eu também te concederei minha
desejares? Poderás retornar à tua filha como esposa. A
108
terra natal e encontrar teus paren- lém disso, te recompensarei
tes, estar no aconchego do teu através da donzela e te levarei de
amado lar e lareira, caminhar pelos volta à tua amada terra natal, às
prados de Wainola e pelas planí- fronteiras de Wainola, onde pode-
cies de Kalevala." rás desfrutar do som do canto do
101
Estas são as palavras de cuco, ouvir o sagrado canto do
Väinämöinën: "Qual seria uma re- cuco."
109
compensa adequada? Tu deverias Väinämöinën, profundamente
conduzir-me de volta ao meu arrependido, respondeu:"La-
povo, à minha casa e à minha terra mento, mas não tenho a capaci-
distante, às fronteiras da Terra do dade de criar o Sampo para ti, tam-
Norte, onde eu possa ouvir o canto pouco posso realizar a tarefa de
do cuco, ouvir o sagrado canto do confeccionar uma tampa colorida.
110
cuco. No entanto, leva-me de volta
102
Devo oferecer-te tesouros de à minha terra distante e, lá, envia-
ouro e encher as tuas taças com a rei Ilmarinenb para atender ao teu
mais refinada prata?" pedido.
103 111
Esta é a resposta simples de Ele é um habilidoso ferreiro
Louhi:"Ó tu, antigo Väinämöinën, capaz de forjar o Sampo desejado
és o único mágico verdadeiro e sá- e dar forma à tampa com cores vi-
bio. E brantes.
104 112
u nunca pedirei riquezas, nem Além disso, ele também é ca-
ouro, nem prata. paz de conquistar a tua adorável
105
O ouro destina-se às flores donzela.
113
das crianças e a prata às joias do Ilmarinen é um ferreiro digno,
garanhão. considerado o primeiro e mestre
106
Serias capaz de forjar o nessa arte.
Sampoa para mim e martelar uma 114
Ele é conhecido por ter for-
tampa colorida? Usando as pontas jado os próprios céus e ter criado
das penas de cisne branco, o leite uma capa oca no ar.
da maior virtude, um único grão de

a
Sampo. A joia que Ilmarinen forjou com os metais mágicos; um talismã de su-
cesso para o possuidor; uma fonte contínua de conflito entre as tribos do Norte.
b
Ilmarinen – Nome masculino derivado do finlandês “ilma”, que significa “ar”.
115 125
Em nenhum lugar encontrare- Ele se apressou alegremente
mos vestígios do seu martelo, nem em direção à sua casa e acelerou
uma única marca de suas tenazes." com um coração feliz.
116 126
A anfitriã Louhi respon- Ele partiu da sempre sombria
deu:"Eu concederei minha filha Terra do Norte, da sombria Sari-
somente a ele. ola.
117
Faço a promessa de entregar
minha criança em casamento RUNA VIII.
àquele que forjará o Sampo para A DONZELA DO ARCO-ÍRIS.
mim.
118
Ele martelará a tampa com co-
res, usando as pontas das penas de
cisne branco e o leite da maior vir-
tude.
A bela e encantadora filha de
Pohyola, honra da terra e
da água, assentou-se no
arco celestial, no seu ponto mais
119
elevado e resplandecente.
Também usará um único grão 2
Vestia um traje feito do tecido
de cevada e a mais fina lã de ove- mais luxuoso, ornamentado com
lhas." ouro e prata, enquanto tecia teias
120
Em seguida, a anfitriã Louhi, de uma textura dourada, entrela-
de forma rápida, engatou um cor- çando fios de prata.
cel de pelagem malhada ao seu 3
Empunhava uma lançadeira
trenó feito de madeira de bétula. feita de ouro e um pente de tecela-
121
Ela colocou Väinämöinën no gem feito de prata.
assento cruzado e o preparou para 4
Com destreza, a lançadeira de
a sua jornada. ouro voava alegremente entre os
122
Então ela se dirigiu ao antigo dedos ágeis da donzela, enquanto
menestrel: “Não ergas os olhos o torno girava rapidamente, te-
para o céu, não olhes para cima du- cendo as fibras com velocidade.
rante a tua jornada, enquanto o teu 5
O pente de prata também voava
corcel estiver fresco e brincalhão, velozmente entre os dedos da don-
enquanto a estrela do dia iluminar zela, nascida do céu, enquanto ela
o teu caminho antes que a estrela tecia teias de uma beleza maravi-
da tarde se eleve. lhosa.
123
Se os teus olhos estiverem 6
O antigo Väinämöinën vinha,
voltados para cima enquanto a es- conduzindo o seu trenó, retor-
trela do dia ilumina o teu caminho, nando para casa pela estrada.
um terrível infortúnio te atingirá, 7
Ele vinha da Terra do Norte,
algum triste destino te alcançará." sempre sem sol, da sombria Sari-
124
Em seguida, o antigo ola.
Väinämöinën empreendeu sua jor- 8
Ele havia percorrido apenas
nada com diligência. uma curta distância, quando ouviu
o som do tear celestial, enquanto a de mim, devo acompanhá-lo no
donzela habilmente manobrava a trenó de neve(?)”.
13
lançadeira. Fala o velho Väinämöinën e
9
Rapidamente, o impensado responde assim à Donzela da Be-
Väinämöinën ergueu seus olhos leza: "Esta é a razão da tua vinda:
maravilhados e contemplou a abó- tu irás assar biscoitos de mel para
bada do céu, onde avistou o arco mim, irás preparar água de cevada,
da beleza. encherás meus copos com cerveja
10
Sentada no arco, estava a bela espumante, cantarás ao lado da mi-
Donzela do Arco-Íris, a glória da nha mesa, alegrar-te-ás dentro dos
terra e do oceano, tecendo ali um meus portais, caminhará uma rai-
tecido dourado e trabalhando com nha dentro da minha morada, nos
a prata sussurrante. salões e câmaras de Wainola, nas
11
Väinämöinën, o antigo menes- cortes de Kalevala."
14
trel, interrompe velozmente o seu A Donzela da Beleza, sentada
corredor e fixa os olhos na encan- em seu trono nos céus, respondeu:
tadora donzela. Em seguida, ele se "Ontem, durante o crepúsculo, eu
dirige a ela: "Por favor, venha, fui aos prados floridos.
15
bela donzela, e sente-se ao meu Lá, eu caminhei entre a natu-
lado no meu trenó de neve." reza comum, onde o Sol se põe
12
Assim, a Donzela da Beleza para descansar.
respondeu:“Diga-me o que desejas

Väinämoinën convida a Donzela do Arco-Íris. Nikolai Kochergin.


16 24
Foi lá que ouvi um pássaro As donzelas são tratadas como
cantando, o tordo, entoando melo- bebês, enquanto as esposas são
dias simples e suaves, expressando consideradas rainhas e altamente
os pensamentos doces das donze- honradas.
25
las e as preocupações das mães. Venha, doce donzela, para o
17
Então, eu fiz uma pergunta ao meu trenó de neve.
26
encantador cantor, dirigi-me ao Eu não sou desprezado como
tordo com uma simples indagação: herói, nem mesmo o mais cruel
'Cante para mim, adorável pássaro dos mágicos.
27
melódico, cante de forma que eu Venha comigo e eu farei de ti
possa compreender. esposa e rainha em Kalevala."
18 28
Cante para mim com um ge- A resposta da Donzela da Be-
nuíno sotaque, sobre como viver leza foi: "Eu te consideraria um
com a maior alegria e a mais doce herói, um poderoso herói, eu te
felicidade, como uma donzela em chamaria assim, quando tu quebra-
companhia de seu pai ou como res um cabelo dourado usando fa-
uma esposa ao lado de seu marido'. cas que não possuem fio, quando
19
"O pássaro canoro me deu a tu me prenderes um ovo de pássaro
resposta, o tordo cantou esta infor- com uma armadilha que eu não
mação: Os dias de verão são claros possa ver."
29
e quentes, mas a liberdade da don- Väinämöinën, um habilidoso e
zela é ainda mais calorosa. antigo, conseguiu partir um fio de
20
O inverno é frio como ferro, cabelo dourado de maneira pre-
assim como a vida das mulheres cisa, utilizando facas que não pos-
casadas. suíam fio.
21 30
As donzelas que vivem com Em seguida, ele conseguiu
suas mães são como frutas madu- prender um ovo de forma segura,
ras e avermelhadas. usando uma armadilha que a don-
22
As mulheres casadas, por ou- zela não viu.
tro lado, são como cachorros acor- 31
“Venha, doce donzela, para o
rentados no canil, raramente pe- meu trenó de neve, eu fiz o que de-
dem favores, pois às esposas os fa- sejas.”
32
vores não são dados." A resposta da donzela foi a se-
23
Väinämöinën, velho sábio e guinte: "Não irei entrar no teu
verdadeiro, respondeu à Donzela trenó de neve sob nenhuma cir-
da Beleza: "É tolo o tordo que cunstância, a menos que tu sejas
canta dessa maneira, e é uma bo- capaz de descascar um arenito.
bagem o gorjeio do pássaro ca- Além disso, exijo que me faças um
noro. chicote com gelo, cuidadosamente
41
cortado de forma a não gerar lascas Com grande zelo, ele manejou
ou fragmentos." o martelo e a machadinha, sem se
33
Väinämöinën, o verdadeiro deixar intimidar.
42
mágico, não se deixou intimidar Sem hesitar, construiu o navio,
nem desencorajar. trabalhando com afinco durante o
34
Com habilidade, ele descascou primeiro dia e também no se-
o arenito arredondado e cortou ha- gundo.
43
bilmente um chicote do gelo, sem No terceiro dia, trabalhou com
perder nem a menor lasca, nem o mãos firmes.
44
menor fragmento. Contudo, na noite desse ter-
35
Em seguida, ele chamou a don- ceiro dia, o malvado Hisi agarrou
zela novamente para se sentar em a machadinha, Lempo segurava o
seu trenó de neve. cabo torto, fazendo com que o ma-
36
A resposta da Donzela ao chado se desviasse ao cair, batendo
grande mago foi a seguinte: "Eu nas pedras e se quebrando em vá-
irei somente com aquele que for rios pedaços.
45
capaz de construir um navio ou Os fragmentos ricochetearam
uma chalupa utilizando as lascas das rochas, perfurando a carne do
do meu fuso e os fragmentos da mágico e cortando o joelho de
minha roca, e lançar essa embarca- Väinämöinën.
46
ção nas águas para que flutue. Lempo guiou o machado afi-
37
O barquinho não poderá ser ado, Hisi separou as veias.
47
empurrado com o joelho, movido Rapidamente, jorrou uma cor-
com o braço, tocado com a mão, rente de sangue, que tinha uma co-
girado com o pé, nem impulsio- loração carmesim.
48
nado por qualquer outro meio." Väinämöinën, um homem
38
O hábil Väinämöinën disse: idoso e verdadeiro, conhecido
"Não há pessoa alguma na Terra como um feiticeiro sábio, diz: "Ó,
do Norte, nem sob a abóbada ce- machado afiado e cruel, feito de
leste, que possua a habilidade que metal afiado, a tua finalidade é
possuo em construir uma embarca- cortar as árvores em pequenos pe-
ção a partir dos pedaços de rochas daços, cortar o pinheiro e o sal-
e lascas de fuso". gueiro, cortar o amieiro e a bétula,
39
Então, ele recolheu os frag- cortar o zimbro e o álamo.
49
mentos da roca e as lascas do fuso No entanto, não deves cortar o
com diligência. meu joelho em pedaços, nem ras-
40
Apressou-se a partir do barco gar as minhas veias."
50
em direção a uma montanha de Então, o antigo Väinämöinën
ferro, onde se dedicou a reunir os começa seus encantamentos e seu
muitos fragmentos. canto mágico a respeito da origem
do mal.
51
Cada palavra é dita em perfeita bétula e sobe com desconforto no
ordem, sem qualquer esforço para banco cruzado.
61
lembrar. Golpeia seu corcel em uma su-
52
Ele entoa sobre a origem do cessão veloz, estalando seu chicote
ferro, com o propósito de moldar acima do condutor, e o corcel
um parafuso e assim preparar uma avança rapidamente.
62
fechadura segura, para proteger as Como os ventos, ele varre a es-
feridas causadas pelo machado e trada até se aproximar de uma al-
pelas pequenas machadinhas. deia na Terra do Norte, onde o ca-
53
No entanto, o riacho flui, cor- minho se divide em três partes.
63
rendo desenfreado como uma tor- Väinämöinën, idoso e fiel, se-
rente. gue o caminho mais baixo e se
54
Ele mancha as ervas nos pra- aproxima rapidamente de uma ca-
dos, cobrindo praticamente toda a bana espaçosa.
64
vegetação, não deixando sequer Diante da porta, faz sua per-
um pouco de verde à vista. gunta rápida:"Há alguém habi-
55
Enquanto flui e avança, ele tando este lugar, que possa com-
emerge do joelho do mágico, das preender a dor que carrego e curar
veias de Väinämöinën. esta ferida causada por um ma-
56
Agora o sábio e antigo menes- chado? Pode alguém verificar este
trel empreende a tarefa de coletar riacho de cor carmesim?"
65
líquens do arenito, bem como dos Um menino posicionou-se em
troncos das bétulas, e também de um canto, num banco adjacente a
colher musgo dos pântanos, en- um bebê, e respondeu ao herói:
quanto retira a grama dos prados. "Não existe ninguém nesta resi-
57
Seu intento é deter o curso do dência capaz de compreender a dor
riacho de coloração carmesim e que sentes, de curar as feridas cau-
buscar o fechamento das feridas sadas pelo pequeno machado, de
expostas. conter o fluxo escarlate; alguém
58
Contudo, seus esforços revela- habita aquela casa de campo, quem
ram-se infrutíferos, e a corrente sabe possa ser de auxílio para ti."
66
carmesim continua a fluir inces- Väinämöinën, chicoteia seu
santemente. corcel para fazê-lo galopar en-
59
Väinämöinën, sentindo dor e quanto corre ao longo da estrada.
67
temendo a fraqueza, entrega-se ao Ele dirige-se apenas por uma
choro, com o coração carregado de curta distância, no meio das estra-
tristeza. das, em direção a uma cabana lo-
60
Com rapidez, ele agora prende calizada à beira da estrada.
68
seu corcel ao trenó de madeira de Ao chegar lá, ele pergunta a al-
guém que está na soleira da porta e
faz suas perguntas pelas janelas causada pelo machado e conter
abertas. esse fluxo carmesim?"
69 76
Assim ele pergunta:"Existe Próximo à lareira estava sen-
alguém nesta cabana que possa tado um idoso.
77
compreender a dor que estou so- No lugar aquecido pelo fogo,
frendo? Existe alguém que possa estava sentado o homem de barba
curar essa ferida causada pelo ma- grisalha.
78
chado? Existe alguém que possa Ele então respondeu a
conter esse riacho de cor carme- Väinämöinën: "Feitos grandiosos
sim?" foram realizados, coisas extrema-
70
No chão jazia uma bruxa, perto mente maravilhosas foram efetua-
da lareira repousava a velha se- das, apenas através de três palavras
nhora. do mestre.
71 79
Foi então que ela dirigiu suas Ao narrar as causas, rios e oce-
palavras a Väinämöinën, respon- anos foram acalmados, as quedas
dendo-lhe com dificuldade entre d'água dos rios foram reduzidas,
os dentes: "Nesta humilde cabana, enseadas foram formadas a partir
não há ninguém capaz de compre- de promontórios, ilhas foram er-
ender a intensidade de sua dor, guidas do fundo do mar."
tampouco de curar as feridas pro-
vocadas pelos machados, ou con-
ter o fluxo do sangue vermelho RUNA IX.
como carmesim. ORIGEM DO FERRO.
72
No entanto, naquela casa vizi-

V
äinämöinën, encorajado
nha, talvez haja alguém disposto a dessa forma, levanta-se
lhe prestar auxílio." prontamente do seu trenó
73
Väinämöinën, sem se sentir in- de neve sem solicitar auxílio a nin-
timidado, chicoteia seu piloto para guém.
que o cavalo acelere e corre ao 2
Ele se dirige imediatamente à
longo da estrada. cabana e adentra a casa, onde se
74
Ele dirige apenas uma curta senta.
distância nas altas estradas e ga- 3
Em seguida, duas donzelas che-
lopa até uma cabana modesta. gam trazendo cântaros de prata e
75
Em seguida, ele se dirige a al- cálices de ouro.
guém que está próximo da cober- 4
Elas mergulham os objetos um
tura, sentado no batente da porta, e pouco, mas apenas com a menor
pergunta: "Existe alguém nesta ca- quantidade possível do sangue das
bana que possa ter conhecimento feridas do mágico Väinämöinën.
da dor que estou sofrendo? Al- 5
Da lareira, o velho chama, o ho-
guém que possa curar essa ferida mem idoso com barba grisalha faz-
15
lhe a pergunta: "Por favor, diga- Tremulando, elas caminharam
me quem és entre os heróis, quem pelos céus, atravessaram as nuvens
és entre todos os grandes mágicos? adornadas com prata, com seus
Observa! O teu sangue enche sete seios transbordando do leite que
barcos e oito das maiores embarca- seria usado para criar o futuro
ções de bétula, fluindo das veias de ferro.
16
algum herói, das feridas de algum Esse leite fluía incessante-
mágico. mente das bordas cintilantes das
6
Tenho outras questões que gos- nuvens para a terra, preenchendo
taria de te perguntar. os vales e acalmando as águas em
7
Diga-me a causa deste pro- seu chamado ao sono.
17
blema que enfrentas. A mais velha das filhas de
8
Narra-me a fonte dos metais, Ukko derramou leite preto nos ca-
descreve a origem do ferro e como nais dos rios.
18
ele foi inicialmente criado." A segunda filha derramou leite
9
Então, o antigo Väinämöinën branco sobre as colinas e monta-
respondeu ao homem de barba gri- nhas, enquanto a filha mais nova
salha: "Possuo um conhecimento espalhou leite vermelho pelos ma-
profundo sobre a origem dos me- res e oceanos.
19
tais, incluindo o ferro. Onde o leite preto foi derra-
10
Posso afirmar que o arco feito mado, cresceu o ferro dúctil e es-
de aço é considerado antiquado. curo.
11 20
A mais antiga mãe é o ar, se- Onde o leite branco foi derra-
guida pela água como o irmão mado, cresceu o ferro de cor mais
mais velho, o fogo como o se- clara.
21
gundo irmão e o ferro como o ir- E onde o leite vermelho foi
mão mais novo. derramado, cresceu o ferro verme-
12
O primeiro criador é Ukko, o lho e quebradiço.
22
criador dos céus. Após a passagem do tempo, o
13
Foi ele quem separou o ar e a Ferro se apressou em visitar o
água antes que o metal, o ferro, Fogo, seu amado irmão mais ve-
existisse. lho, para melhor conhecer o pró-
14
Ukko, o criador dos céus, es- prio irmão.
23
fregou vigorosamente suas mãos e Imediatamente, o Fogo come-
pressionou-as firmemente em seus çou a rugir e trabalhou para consu-
joelhos, resultando no surgimento mir seu irmão mais novo, o amado
de três belas donzelas, três filhas irmão.
24
magníficas. Estas foram as mães Nesse momento, o Ferro per-
do ferro e do aço de cor azul bri- cebeu o perigo iminente e salvou-
lhante.
34
se fugindo rapidamente dos avan- O ferreiro nasceu durante a
ços da chama ardente. noite e, pela manhã, construiu sua
25
Ele fugiu para cá e para lá, de forja.
35
maneira silenciosa, buscando Com cuidado, buscou uma co-
abrigo nos pântanos, nos vales, nas lina favorável onde os ventos pu-
fontes ruidosas e junto aos rios que dessem encher seu fole.
36
serpenteiam em direção ao mar, Descobriu uma colina nas ter-
nas amplas margens dos pântanos ras pantanosas, onde o ferro estava
onde os cisnes construíram seus abundantemente escondido.
37
ninhos e onde os gansos selvagens Foi ali que ele ergueu sua for-
chocam seus filhotes. nalha de fundição e colocou seu
26
O ferro se encontra nas terras fole de couro.
38
pantanosas, estendendo-se ao Seguiu os rastros deixados pe-
longo dos cursos de água, oculto los lobos e trilhou o caminho dos
por muitas eras nas florestas de ursos.
39
bétulas. Encontrou as formações jo-
27
No entanto, não pode perma- vens do ferro nos rastros deixados
necer oculto para sempre diante pelos lobos dos pântanos e pelo
das buscas de seu irmão. urso cinzento.
28 40
Aqui e ali, o fogo o alcançou e Em seguida, o ferreiro, Ilmari-
o levou para a fornalha, onde lan- nen, dirigiu-se ao ferro adorme-
ças, espadas e machados podem cido nestes termos: 'Tu és o metal
ser forjados e adequadamente mar- mais útil, está adormecido nos
telados. pântanos, escondido em condições
29
Nas águas enegrecidas dos humildes, onde o lobo caminha pe-
pântanos, os ursos vinham cami- los pântanos e o urso dorme nas
nhando da charneca e os lobos cor- matas.
41
riam. Pensaste e considerastes cui-
30
Foi lá que o ferro apareceu, dadosamente qual seria sua posi-
onde as patas dos lobos pisaram e ção no futuro.
42
onde os ursos deixaram suas pega- Devo colocá-lo na fornalha
das. para torná-lo livre e útil?'
31 43
Então, o ferreiro, Ilmarinen, Ferro, por sua vez, ficou to-
veio à terra para exercer sua habi- mado pelo medo, angústia e horror
lidade com o metal. ao ouvir menções ao Fogo, a força
32
Ele nasceu no Monte do Car- que pode destruí-lo.
44
vão e foi criado com destreza nos Ilmarinen, o ferreiro, volta a
campos onde se produz carvão. falar novamente e se dirige ao
33
Em uma mão, segurava um Ferro, desta forma: 'Não se preo-
martelo de cobre, enquanto na ou- cupe, metal útil.
tra tinha uma pinça de ferro.
45 54
Com certeza, o Fogo não te Imediatamente, Ferro fez uma
consumirá, não queimará seu ir- promessa solene, jurando diante da
mão mais novo, não causará danos fornalha, da bigorna, das tenazes e
ao seu parente mais próximo. do martelo.
46 55
Venha ao meu aposento e for- Eis as palavras que ele proferiu
nalha, onde o fogo arde livre- com veemência: 'Comprometo-me
mente. a derrubar muitas árvores e a devo-
47
Tu viverás, crescerás e prospe- rar os corações das montanhas.
56
rarás, tornando-se as espadas dos No entanto, não matarei meu
heróis, fivelas para os cintos das parente mais próximo, não elimi-
mulheres' narei o mais valente dos heróis e
48
Antes que a estrela da noite nem ferirei meu irmão mais que-
aparecesse, o minério de ferro ti- rido.
57
nha sido retirado dos pântanos e Prefiro viver em liberdade ci-
elevado dos leitos de água. vil, pois minha vida seria mais fe-
49
Foi levado até a fornalha e o liz se eu pudesse servir meus se-
ferreiro o colocou no fogo, inse- melhantes como ferramentas para
rindo-o na sua fornalha de fundi- sua comodidade, ao invés de ser
ção. um instrumento de guerra, cau-
50
Ilmarinen operou o fole, dando sando a morte de meus amigos e
três movimentos com o cabo, e o parentes próximos, e ferindo os fi-
ferro fluía em correntes provenien- lhos da minha mãe.'
58
tes da forja do mágico. Agora, Ilmarinen, o mestre, re-
51
Logo, transformou-se em algo nomado e habilidoso ferreiro, re-
semelhante a fermento de padeiro, tira o ferro do fogo e o coloca so-
suave como a massa de pão de ce- bre a bigorna.
59
vada. Ele o martela com destreza até
52
Nesse momento, o metal, o que fique maleável, forjando uma
Ferro, exclamou: 'Maravilhoso variedade de utensílios refinados,
ferreiro, Ilmarinen, ó tira-me, tira- como lanças, espadas, machados,
me de tua fornalha, deste fogo e facas e garfos, além de uma ampla
desta tortura cruel.' gama de ferramentas de martelos.
53 60
Ilmarinen, assim respondeu: Muitas coisas que o ferreiro
eu replico a ti: 'Eu te retirarei de precisava, muitas coisas ele não
minha fornalha, estás apenas poderia moldar, como a pinça de
pouco assustado. Tu te tornarás um ferro, o martelar o aço do ferro e a
grande poder, capaz de perecer o capacidade de tornar o ferro endu-
melhor dos heróis e ferir o teu ir- recido.
mão mais querido.'
61 70
Ilmarinen, após uma cuidadosa Ela voou rapidamente para a
e profunda ponderação, refletiu casca de bétulas, enquanto as bar-
longamente. ras de ferro estavam esquentando e
62
Ele decidiu reunir cinzas de o aço era temperado.
71
bétula e mergulhá-las na água para A vespa picou com veloci-
criar uma lixívia que endurecesse dade, espalhando todos os horrores
o ferro, permitindo a formação do de Hisi.
72
aço necessário. Ela trouxe a bênção da ser-
63
Ele provou a mistura com a pente, o veneno da víbora, o ve-
língua, avaliando cuidadosamente neno da aranha e as picadas de to-
o resultado. dos os insetos, tudo misturado com
64
O ferreiro então disse: 'Todo minério e água, enquanto o aço es-
esse trabalho é em vão, não será tava sendo temperado.
73
capaz de moldar o aço do ferro, Ilmarinen, hábil ferreiro, o pri-
nem fazer com que o minério ma- meiro entre todos os ferreiros, pen-
cio endureça'. sou que a abelha, sem dúvida, lhe
65
Neste momento, uma abelha trouxera mel dos prados perfuma-
sobrevoa o prado, uma Asa-azul dos, dos pequenos cálices de flo-
que vem das flores. res, das pontas de sete pétalas.
66 74
Ela voa pelo ar e finalmente E ele proferiu as seguintes pa-
pousa em segurança próximo à lavras: 'Bem-vinda, bem-vinda, é a
fornalha da forja. tua vinda,portadora do doce néctar
67
Assim como o ferreiro se di- das flores, que trazes para auxiliar
rige à abelha, estas são as palavras na forja do aço do ferro!'
75
de Ilmarinen: 'Pequena abelhinha, Ilmarinen, o antigo ferreiro,
gracioso passarinho, traga-me mel imergiu o ferro na água, uma água
em suas asas. misturada com diversos venenos,
68
Peço-lhe que traga a doçura pensando que era apenas o mel de
dos prados perfumados, proveni- uma abelha selvagem.
76
ente dos delicados cálices das flo- Dessa forma, ele moldou o aço
res, das pontas de sete pétalas, para a partir do ferro.
77
que, dessa forma, possamos auxi- Quando ele o mergulhou na
liar a água na produção do aço do água, uma água misturada com
ferro'. muitos venenos, e o colocou na
69
O pássaro maligno do Hisi, co- fornalha, o ferro endurecido cres-
nhecido como vespa, ouviu as pa- ceu com ira, quebrando o jura-
lavras de Ilmarinen enquanto es- mento que havia feito.
78
tava empoleirado na empena da Ele consumiu suas próprias pa-
cabana. lavras como cães e demônios, e
impiedosamente feriu seu próprio
88
irmão, enfurecendo-se loucamente E assim eras, apenas matéria
contra seus parentes. sem forma, mera partícula de po-
79
O sangue jorrou como riachos eira com tonalidade enferrujada.
89
das feridas do homem e do herói. Sem dúvida, em tempos passa-
80
Essa é a origem do ferro e do dos, tu eras destituído de grandio-
aço de cor azul claro." sidade, sem possuir nem força nem
81
Diante da lareira, ergueu-se beleza.
90
um homem de barba grisalha. Com Quando o alce te pisoteava,
um gesto, sacudiu suas pesadas quando o corço te pisava, quando
madeixas e respondeu:"Agora, co- as pegadas dos lobos se encontra-
nheço a origem do ferro e a fonte vam em ti e as patas dos ursos ar-
do aço, assim como os males que ranhavam teu corpo, certamente te
eles trazem consigo. mostravas de pouco valor.
82 91
Maldito seja tu, ferro cruel, e Na verdade, eras insignificante
maldito seja o aço que provém de quando o habilidoso Ilmarinen, o
ti. primeiro entre todos os ferreiros, te
83
Lanço minha maldição sobre trouxe das terras pantanosas ene-
ti, língua do mal, e que tua vida grecidas e te levou para sua antiga
seja amaldiçoada para sempre! No forja, onde te colocou na ardente
passado, eras de pouco valor, sem fornalha.
92
forma, beleza, força ou grande im- Com efeito, tu possuías pouca
portância. vitalidade, pouca força e represen-
84
Descansavas na forma de leite tavas pouco perigo quando estavas
e por eras permaneceste escondido no fogo sibilando, rolando como
nos arfantes seios das três filhas de água fervente proveniente da for-
Deus, nos confins das nuvens e na nalha da forja.
93
abóbada azul dos céus. Naquele momento, tu fizeste o
85
No passado, tu eras insignifi- juramento mais vigoroso, pela for-
cante e desprovido de atributos va- nalha, pela bigorna, pela tenaz e
lorosos. pelo martelo, pela morada do fer-
86
Não possuías forma atraente reiro, pelo fogo dentro da fornalha.
94
nem beleza cativante, tampouco Agora, sem dúvida, te tornaste
exibias força ou relevância signifi- poderoso e capaz de se enfurecer
cativa. na mais selvagem fúria.
87 95
Estavas na condição de água Tu quebraste todas as tuas pro-
estagnada, repousando tranquila- messas e desrespeitaste os teus vo-
mente nas vastas extensões dos tos solenes.
96
pântanos e nas encostas íngremes Como um cão, envergonhaste
das montanhas. a honra e desonraste a ti mesmo e
à tua família.
97 108
Manchaste tudo com o sopro Permaneça imóvel como os
do mal. pilares de cristal no céu, posicio-
98
Diga-me, quem te conduziu a nando-se como colunas firmes no
essa maldade? Quem te ensinou oceano, como bétulas majestosas
toda a tua malícia? Quem te pro- na floresta, altos juncos nos pânta-
porcionou tamanha depravação? nos e rochas elevadas na costa do
Será que foi teu pai ou tua mãe? mar.
109
Talvez o mais velho dos teus ir- Que assim seja pelo poder da
mãos, ou a mais nova das tuas ir- poderosa magia!
110
mãs? Ou até mesmo o pior dentre Certamente, tua vontade deve
todos os teus parentes? Será que te impelir de forma inevitável a
foi algum deles que te transmitiu a fluir em teu ciclo infinito.
111
tua natureza maligna? Percorres as veias de
99
Mas não foi teu pai, nem tua Väinämöinën, atravessas ossos e
mãe. músculos, pulmões, coração e fí-
100
Não foi o mais velho dos teus gado do poderoso sábio e cantor.
112
irmãos, nem o mais novo das tuas É melhor ser o alimento dos
irmãs. heróis do que desperdiçar tua força
101
Nem tampouco o pior dentre e virtude nos prados e florestas,
todos os teus parentes. sendo perdido em pó e cinzas.
102 113
Foste tu mesmo quem causou Flua eternamente em teu cír-
todo este mal. culo; deves cessar este fluxo de
103
Tu és a causa de todos os nos- sangue vermelho carmesim.
114
sos problemas. Não manche mais a grama e
104
Vem e contempla as tuas más as flores, nem macule estas colinas
ações. douradas, orgulho e beleza de nos-
105
Corrige essa inundação de da- sos heróis.
115
nos antes que eu revele aos teus ca- Tuas moradas e depósitos le-
belos grisalhos da mãe e ao teu ve- gítimos encontram-se nas veias do
lho pai. mágico, no coração de
106
Imensa é a angústia de uma Väinämöinën.
116
mãe, profunda é a tristeza de um Retira agora tuas forças para
pai, quando um filho comete ações lá, apressando-te em teu fluxo rá-
malignas, quando uma criança pido.
117
corre descontrolada e sem lei. Não fluas mais como corren-
107
Ó riacho carmesim, cesse o tes carmesim, não enchas mais la-
fluir incessante das feridas de gos com tua cor vermelha, não de-
Väinämöinën; interrompa o curso ves correr como riachos durante a
do sangue das eras que corre pelas maré alta, nem sinuosamente
veias do mágico. como rios.
118
Interrompas o teu fluir, por com cuidado, utilizando suaves fo-
meio de uma palavra mágica, tal lhetos e misturando-os com flores
como as quedas de Tyrya ou os medicinais.
126
rios de Tuoni que se aquietam Dessa forma, poderemos de-
quando o céu retém suas gotas de ter o fluxo vermelho carmesim e,
chuva e o mar desiste de suas assim, salvar a vida deste grande
águas durante a escassez das esta- mago.
127
ções ou nos anos de fogo e tortura. Peço-lhe, salve a vida de
119
Se não atenderes a este pe- Väinämöinën."
128
dido, tomarei outras medidas, pois No momento em que as pala-
possuo o conhecimento de outras vras mágicas eram pronunciadas, o
forças. fluxo de sangue cessou.
120 129
Invocarei os ferros de Hisi e O homem de barba grisalha,
neles te submeterei a fervura e as- regozijando, instruiu seu jovem fi-
samento, com o objetivo de conter lho a ir à forja e preparar um bál-
o teu fluxo carmesim e, dessa samo curativo.
130
forma, salvar o herói ferido. O bálsamo seria feito a partir
121
Caso essas medidas se reve- de uma mistura cuidadosa de ervas
lem ineficientes e as ações toma- de fibras tenras, plantas medici-
das se mostrem inúteis, invocarei nais, caules que secretam mel, raí-
Ukko, o ser Onisciente, reconhe- zes e flores.
131
cido como o mais poderoso dos No caminho, ele se depara
criadores, superando em força to- com um carvalho e, dirigindo-se a
dos os heróis antigos e sendo mais ele, o filho pergunta: "Possuis mel
sábio do que os mágicos do em teus ramos? Corre em ti uma
mundo. seiva repleta de doçura?".
122 132
Ele examinará atentamente o O carvalho, com sua sabedo-
fluxo carmesim da ferida e a curará ria, responde: "Certamente, con-
com sua sabedoria, curará o feri- tudo, na noite anterior, o mel es-
mento causado por um machado. correu sobre meus galhos disper-
123
Ukko, Deus de amor e miseri- sos, enquanto as nuvens espalha-
córdia, Deus e Mestre dos céus, ram sua fragrância.
133
peço que venha até aqui, pois sua Elas peineiraram o mel entre
presença é necessária e urgente. as minhas folhas, provindo de sua
124
Rogo-te que estenda sua mão morada celestial."
134
para auxiliar seus filhos, tocando Em seguida, o filho recolhe
esta ferida com dedos que pos- lascas de madeira de carvalho e os
suem o poder de cura. galhos mais jovens dessa árvore.
125 135
Interrompa o fluxo desse vital Ele colhe uma variedade de
sangue heróico e enfaixe a ferida ervas curativas, incluindo flores e
149
ervas mais raras encontradas das Finalmente, ele descobriu que
Terras do Norte. estava pronta e concluiu que o bál-
136
Essas plantas são colocadas samo mágico estava acabado.
150
dentro de uma chaleira de cobre e Próximo dali encontrava-se
inseridas na fornalha. uma bétula com múltiplos ramos,
137
O filho deixa as ervas macera- localizada à margem do prado.
151
rem e fervem juntas, juntamente Infelizmente, ela tinha sido
com os pedaços de casca do carva- maliciosamente quebrada pelo vil
lho. Hisi.
138 152
São utilizadas muitas ervas Com presteza, ele toma seu
com virtudes curativas. bálsamo curativo e aplica-o nos
139
Ele as deixa embebidas por galhos fraturados.
153
um dia, depois por mais um, e em Esfrega cuidadosamente o
seguida, por três longos dias du- bálsamo nas áreas lesionadas e, as-
rante o clima de verão, tanto du- sim, dirige-se à bétula: "Por meio
rante o dia quanto à noite. deste bálsamo, eu te unjo, co-
140
Após esse período, ele testa brindo tuas feridas com este un-
seu bálsamo mágico, verificando guento.
154
se está pronta e se seu remédio está Que os teus locais lesionados
completo. sejam adequadamente protegidos.
141 155
No entanto, o bálsamo se Agora, a bétula deve se recu-
mostra ineficaz e indigno. perar, tornando-se ainda mais bela
142
Ele acrescentou outras ervas do que antes."
156
às já existentes, ervas conhecidas É verdade que a bétula rapida-
por suas virtudes curativas. mente se restabeleceu, adquirindo
143
Essas ervas foram trazidas de uma beleza ainda maior do que an-
nações distantes, localizadas a tes.
157
centenas de léguas ao norte. Seus galhos se tornaram mais
144
Elas foram colhidas pelos uniformes e seu tronco mais ro-
mais sábios menestréis e trazidas busto e majestoso.
158
por nove encantadores. Essa transformação se deu
145
Após três dias, o bálsamo foi graças ao poder curativo do bál-
embebido novamente. samo e do unguento mágico.
146 159
Durante três noites, o fogo foi Aplicou-os sobre o arenito
cuidadosamente controlado. lascado, os blocos quebrados de
147
Por nove dias e noites, ele foi granito e as fissuras nas monta-
observado constantemente. nhas.
148 160
Em seguida, o curandeiro ex- Como resultado, as partes da-
perimentou novamente o un- nificadas se reuniram e todos os
guento, examinando-o com cau- fragmentos cresceram juntos.
tela e fazendo testes.
161
Então, o jovem retornou pron- guento mágico as tocou, imediata-
tamente com o bálsamo que havia mente o antigo Väinämöinën so-
finalizado. freu uma terrível dor e angústia.
162 172
Ele entregou o unguento ao Ele afundou no chão em tor-
homem idoso de barba grisalha, e mento, virando-se de um lado para
o menino proferiu as seguintes pa- o outro, procurando descanso em
lavras: "Aqui trago o bálsamo da vão.
173
cura, trago-te um unguento mara- Sua dor persistia até que o
vilhoso. barba grisalha a dissipou, banindo-
163
Ele une as partes quebradas a pela ajuda da magia.
174
do granito, faz com que os frag- Ele afastou seu tormento mor-
mentos se unam, aquece as racha- tal para o tribunal de todos os nos-
duras nas montanhas e restaura a sos problemas, para a mais alta co-
bétula ferida." lina de tortura, para as rochas e sa-
164
O velho testou o bálsamo má- liências distantes, para as monta-
gico com a língua e descobriu que nhas que carregam o mal, para o
era um remédio eficaz, possuindo reino do perverso Hisi.
175
virtudes mágicas. Então ele tomou um tecido de
165
Em seguida, ungiu o menes- seda e rapidamente o rasgou em
trel e utilizou o bálsamo mágico pedaços, fazendo tiras iguais para
para curar as feridas de fazer uma bandagem.
176
Väinämöinën. Amarrou as pontas com fitas
166
Enquanto fazia isso, proferiu de seda, criando assim uma banda-
palavras de sabedoria antiga, di- gem de cura.
177
zendo: "Não confie apenas em sua Em seguida, habilmente en-
própria virtude e não dependa ape- volveu o joelho e o tornozelo de
nas de seu próprio poder. Väinämöinën, envolvendo as feri-
167
Coloque sua confiança na das do mágico.
178
força do seu Criador. E o de barba grisalha proferiu
168
Não se orgulhe de sua própria esta oração: "O tecido de Ukko é a
sabedoria, mas fale com a língua bandagem, a ciência de Ukko é o
do poderoso Ukko. cirurgião.
169 179
Se há doçura em minha boca, Estes serviram ao herói fe-
ela vem do meu Criador. rido, envolvendo as feridas do Má-
170
Se minhas mãos estão cheias gico.
180
de beleza, toda a beleza vem de Ó Deus misericordioso, olha
Ukko." para nós, vem e guarda-nos, bon-
171
Quando as feridas foram tra- doso Criador, e protege-nos de
tadas com unguento, quando o un- todo o mal! Guia nossos pés para
que não tropecem, guarda nossas
vidas de todos os perigos, dos bos- mente Deus pode realizar a con-
ques perversos de Hisi." clusão e dar causa ao seu final per-
181
Väinämöinën, um homem feito.
191
idoso e digno, experimentou a po- Nunca a mão do homem pode
derosa assistência da magia. encontrá-la, nunca o herói pode al-
182
Ele sentiu a ajuda graciosa de cançá-la.
192
Ukko e imediatamente seu corpo Ukko é o único Mestre."
se fortaleceu.
183
Suas feridas se curaram ins- RUNA X.
tantaneamente, e a terrível dor de- ILMARINEN FORJA O SAMPO.
sapareceu rapidamente.

V
184 äinämöinën, o mágico,
O herói cresceu em força e re- monta em seu corcel de
sistência, e pôde caminhar em total cor de cobre, engatando
liberdade. rapidamente seu corcel de pés ve-
185
Ele movimentou seus joelhos lozes e colocando-o no trenó de
em todas as direções, sem conhe- neve.
cer nem dor nem problemas. 2
Ele salta imediatamente sobre o
186
Então, o antigo Väinämöinën assento cruzado e estala seu chi-
ergueu seus olhos para o alto Ju- cote adornado com joias.
mala e olhou com gratidão para o 3
O corcel voa adiante como os
céu. ventos, enquanto o piloto acelera
187
Ele sentiu alegria e contenta- como um relâmpago, fazendo o
mento enquanto se dirigia ao onis- trenó de neve ranger e chocalhar, e
ciente Ukko. a estrada desaparecer rapidamente.
188
Esta foi a oração que o menes- 4
Ele atravessa pântanos e flores-
trel proferiu: "Ó seja louvado, tu tas, sobre colinas e vales, sobre
Deus de misericórdia, permita-me pântanos, montanhas, férteis planí-
louvar-te, meu Criador, pois me cies e prados.
deste assistência e concedeste tua 5
Assim, ele viaja por um dia, de-
proteção. pois outro, e então um terceiro,
189
Curaste minhas feridas e acal- desde a manhã até a noite.
maste minha angústia, baniste toda 6
chegar à noite do terceiro dia,
minha dor e problemas causados ele alcança a ponte infinita de
pelo Ferro e por Hisi. Osmo, os campos e pastagens de
190
Ó, vós, povo de Wainola, Osmo, e as planícies de Kalevala.
povo desta geração e o povo das 7
Foi então que o herói falou o se-
eras futuras, não vos orgulheis em guinte: "Que os lobos devorem o
emulação de barcos fluviais ou sonhador, que o Lapônio seja co-
chalupas oceânicas, vangloriando- mido no jantar, que a doença des-
se de sua bela aparência; pois so- trua o fanfarrão, aquele que disse
16
que eu nunca mais veria minha Ele havia prometido a Ilmari-
amada pátria, minha parentela, nen, o artista mágico, que retorna-
nunca mais durante toda a minha ria como resgate para salvá-lo da
vida, nunca enquanto o sol bri- tortura nos distantes campos das
lhasse, nunca enquanto o luar bri- Terras do Norte, na triste Sariola.
17
lhasse nos prados de Wainola, nas Quando o garanhão de
planícies de Kalevala." Väinämöinën parou no campo de
8
Então, o venerável Osmo e no prado, ele subiu rapida-
Väinämöinën, um antigo bardo e mente em seu trenó de neve.
18
renomado cantor, deu início ao seu O mágico então ouviu alguém
ato de revitalizar seus encantamen- batendo, quebrando carvão dentro
tos. da forja, utilizando um martelo pe-
9
Ele entoou com maestria as pa- sado.
19
lavras diante de um imponente pi- Väinämöinën, renomado me-
nheiro, cuja grandiosidade era de nestrel, adentrou a forja direta-
tirar o fôlego. mente e lá encontrou Ilmarinen, o
10
Sua melodia ecoou tão alto que ferreiro, martelando com seu mar-
ultrapassou as nuvens em cons- telo de cobre.
20
tante crescimento, alcançando Ilmarinen dirigiu-se com as se-
com seu topo e galhos dourados os guintes palavras: "Sê bem-vindo,
próprios céus. meu irmão Väinämöinën, o respei-
11
O pinheiro espalhou seus ga- tável e venerável Väinämöinën!
lhos pelo éter, em meio à lumino- Por qual razão estiveste ausente
sidade radiante do sol. por um longo período? Onde te
12
Agora, ele entoa novamente de ocultaste por tanto tempo?"
21
maneira encantadora, cantando Väinämöinën, em resposta,
para que a lua brilhe eternamente proferiu as seguintes palavras: "De
sobre os galhos verdejantes do fato, vivi durante um longo perí-
abeto. odo, em que inúmeros dias som-
13
No topo, ele entoa à constela- brios se arrastaram e muitas noites
ção da Ursa Maior. tristes perduraram.
14 22
Em seguida, ele retorna rapi- Flutuei em meio ao oceano im-
damente ao seu lar, apressando-se placável, chorei nos pântanos e nas
em direção aos imponentes portões florestas da Terra do Norte, um lu-
dourados. gar sempre desagradável e obscuro
15
Sua cabeça está inclinada e seu conhecido como Sariola.
23
rosto enrugado, com o chapéu le- Percorri essas terras junto aos
vemente torto em sua testa. lapões, um povo envolto em feiti-
çaria."
24 36
Imediatamente, Ilmarinen res- Como recompensa, receberás a
pondeu com prontidão:"Ó tu, ve- virgem e conquistarás essa noiva
lho Väinämöinën, reconhecido e de beleza.
37
eterno cantor, conte-me sobre tua Parta e traga a adorável don-
jornada em direção ao norte, tuas zela para a sua casa em Kalevala."
38
andanças pela Lapônia e sua dolo- O irmão Ilmarinen dirigiu-se a
rosa jornada de retorno ao lar." Väinämöinën: "Ó tu, astuto
25
Disse o menestrel, Väinämöinën, que já me prome-
Väinämöinën:"Tenho uma história teste resgatar-te da sempre som-
maravilhosa para te contar, meu ir- bria Terra do Norte, ao oferecer
mão. tua devotada cabeça em troca.
26 39
Nas terras do Norte, habita No entanto, eu nunca irei visi-
uma virgem em uma aldeia, uma tar as Terras do Norte, tampouco
donzela que não aceitará um ver a tua donzela, e não nutrirei
amante, rejeita a mão de um herói amor pela Noiva da Beleza.
40
e desdenha o coração de um mago. Jamais sob o luar brilhante, irei
27
Toda a Terra do Norte canta à sombria Pohya ou às planícies de
seus louvores, elogiando seu valor Sariola, onde as pessoas se devo-
e beleza mágica. ram e afundam seus heróis no oce-
28
Ela é a mais bela donzela de ano, nem mesmo em troca de todas
Pohyola, filha da terra e do oceano. as donzelas da Lapônia."
29 41
De suas têmporas emite o bri- O irmão Väinämöinën profe-
lho do luar, e seu peito, o esplen- riu: "É-me possível relatar-lhe pro-
dor do sol. dígios ainda mais grandiosos.
30
Sua testa resplandece o arco- Ouça a minha narrativa extraordi-
íris, e em seu pescoço, as sete es- nária: Testemunhei o abeto em
trelinhas, além da Grande Ursa que plena floração, com flores adorna-
repousa em seu ombro. das por ramos de coloração esme-
31
Ilmarinen, digno irmão, és o ralda.
42
único habilidoso ferreiro. Essa cena deslumbrante ocor-
32
Vá e contemple sua beleza ma- ria nos campos e bosques de
ravilhosa. Osmo.
33 43
Observe-a usando roupas de No topo da árvore, o luar res-
ouro e prata, vestindo-se com as plandecia, enquanto a Ursa Maior
melhores vestimentas. habitava seus galhos."
34 44
Veja-a sentada no arco-íris, ca- Ilmarinen respondeu de forma
minhando sobre as nuvens de púr- cética: "Não consigo crer em tua-
pura. história, nem confiar em teus con-
35
Forje o Sampo mágico para ela tos de maravilhas, a menos que eu
e crie uma tampa com várias cores. mesmo testemunhe o abeto em
flor, com seus numerosos ramos
54
verde-esmeralda, acompanhado da Após isso, o abeto em flor di-
Ursa e de um brilhante luar." rigiu-se a Ilmarinen com as se-
45
Esta é a resposta de guintes palavras: "Ó tu, herói in-
Väinämöinën:“Não acreditarás na sensato e imprudente, careces de
minha história? Vem comigo e eu inteligência e discernimento.
55
te mostrarei, se meus lábios falam Tu sobes pelos meus galhos
fato ou ficção." dourados sem nenhum julga-
46
Rapidamente, eles partem em mento, buscando tomar meus raios
uma viagem de descoberta, ansio- de luar e tirar minha luz prateada
sos por testemunhar o magnífico das estrelas, roubando meu Urso e
abeto. galhos floridos."
47 56
Väinämöinën assume a lide- Com rapidez comparável ao
rança na jornada, enquanto Ilmari- pensamento, o venerável
nen o acompanha de perto. Väinämöinën entoou uma vez
48
Conforme se aproximam das mais em tons mágicos.
57
fronteiras de Osmo, Ilmarinen se Ele entoou sobre um vendaval
apressa para poder contemplar que varria os céus, sobre ventos
essa maravilha. selvagens enfurecidos.
49 58
Ele espreita a Urso no topo do O cantor proferiu as seguintes
abeto, que está sentado em galhos palavras: "Ó tempestade, toma o
de esmeralda. ferreiro, leve-o em seu navio.
50 59
E, enquanto observa, também Faça isso rapidamente e colo-
vislumbra o brilho do luar dou- que o herói na eternamente som-
rado. bria Terra do Norte, na sombria
51
O antigo Väinämöinën falou Sariola".
60
assim: "Querido Ilmarinen, suba Eis que o vento da tempestade,
nesta árvore e traga para baixo os com rapidez, cobre o céu de escu-
raios dourados da lua. ridão.
52 61
Traga a Lua contigo quando Agita-se o ar com vigor, trans-
descer dos galhos altos do abeto." formando-se em veleiro.
53 62
Ilmarinen, consentindo com- É nele que embarca o ferreiro
pletamente, prontamente escalou o Ilmarinen, fugando dos galhos do
abeto dourado, alcançando o topo abeto, rumo à desolada Terra do
do céu, com o propósito de trazer Norte, à sombria Sariola.
63
os raios dourados da lua e trazer Navegou Ilmarinen pelos ares,
também a constelação da Ursa avançando incansavelmente para o
Maior do céu, retirando-a dos ra- norte, seguindo a trilha dos ventos
mos mais altos do abeto. impetuosos.
64
Sob a lua e a luz solar, caval-
gou ele nas costas amplas da
72
Grande Ursa, até que finalmente se Louhi, a anfitriã das Terras do
aproximou das densas florestas de Norte, uma dama desdentada de
Pohyola e das moradas de Sariola. Sariola, corre imediatamente para
65
Desceu ele sem ser notado, sua morada.
73
passou despercebido pelos caçado- Eis as palavras que Louhi pro-
res e não foi farejado pelos cães de fere: "Venha, tu, a mais nova de
guarda. minhas filhas, venha, tu, a mais
66
Louhi, a anfitriã de Pohyola, bela de minhas donzelas.
74
uma dama antiga e desdentada da Vista-se com as melhores rou-
Terra do Norte, está de pé no pátio pas, enfeite teu cabelo com as joias
aberto e se dirige a Ilmarinen, en- mais raras, coloque pérolas em seu
quanto observa o herói estran- peito inchado, use um colar de
geiro. ouro em teu pescoço, amarre tua
67
Ela pergunta: "Quem és tu, cabeça com fitas de seda, faça tuas
vindo aqui no vento da tempes- bochechas parecerem frescas e co-
tade, sobre o caminho do trenó do radas, e mantenha seu semblante
éter, despercebido pelos cães de belo e cativante.
75
guarda de Pohya? Dos heróis anti- Pois o artista Ilmarinen, vindo
gos, de toda a hoste de heróis?" de Kalevala, está aqui para forjar-
68
Ilmarinen responde: "Certa- nos o Sampo, martelar-nos a tampa
mente não vim aqui para ser la- em cores."
76
drado pelos cães de guarda, nestes A filha da Terra do Norte, uma
portais desconhecidos, nos portões jovem honrada tanto pela terra
de Sariola." como pela água, prontamente
69
Em seguida, a anfitriã da Terra veste suas melhores roupas, esco-
do Norte dirigiu-se novamente ao lhendo vestidos ricos em beleza,
herói estrangeiro: " Tu já conhe- selecionando o mais fino do seu
ceste o ferreiro de Wainola, o herói guarda-roupa de seda.
77
Ilmarinen, um habil ferreiro e ar- Ela então adorna-se com um
tista? Por muito tempo, aguardo filete de seda, coloca uma faixa de
ansiosamente a sua chegada, e há cobre em sua testa, cinge sua cin-
muito tempo esperamos por este tura com um cinto de ouro e
momento nas fronteiras da Terra adorna seu pescoço com um colar
do Norte, para que ele possa forjar de pérolas.
78
o Sampo para mim." Seu peito brilha com ouro re-
70
O herói Ilmarinen disse: "De luzente, e em seus cabelos há fios
fato, conheço o ferreiro Ilmarinen, de prata.
79
pois eu mesmo sou ele. Saindo de seu aposento, ela se
71
Sou o habilidoso ferreiro e ar- apressa ao salão, atenta e ouvindo,
tista." repleta de beleza e alegria, com
orelhas atentas e olhos brilhantes,
86
bochechas coradas e um rosto en- Ele procurou fervorosamente
cantador, esperando ansiosamente por ferramentas adequadas para re-
pelo herói estrangeiro. alizar seu trabalho.
80 87
Louhi, a anfitriã de Pohyola, No entanto, ele não encontrou
conduziu o herói Ilmarinen até sua nenhum lugar propício para execu-
morada na Terra do Norte, em sua tar a forja.
88
casa em Sariola. Não havia ferraria disponível,
81
Ela o sentou em sua mesa farta nem foles para avivar o fogo, nem
e lhe ofereceu as melhores igua- uma chaminé para direcionar a fu-
rias, proporcionando-lhe todo o maça.
89
conforto necessário. Além disso, ele não encontrou
82
Em seguida, ela falou da se- uma bigorna para moldar o metal,
guinte maneira: "Ó tu, ferreiro Il- nem tenazes e martelo para dar
marinen, mestre da forja! Será que forma à obra.
90
és capaz de forjar para mim o Em seguida, o artista Ilmari-
Sampo, martelando a tampa com nen expressou em solilóquio, di-
cores, feita das pontas das penas de zendo: "Apenas as mulheres de-
cisnes brancos, utilizando o leite sencorajam, apenas os patifes dei-
de maior virtude e um único grão xam o trabalho incompleto, nem os
de cevada, e a mais fina lã de ove- demônios, nem os heróis, nem os
lhas? Se fores capaz de fazer isso, Deuses mais sábios."
91
terás como recompensa a minha fi- Então, o ferreiro Ilmarinen co-
lha mais bela por este serviço pres- meçou a procurar um local ade-
tado." quado para construir uma forja e
83
Estas são as palavras de Ilma- plantar um fole, nas terras do
rinen:"Eu forjarei para ti o Sampo, Norte, nas colinas e prados de
martelarei a tampa com cores, Pohya.
92
usando penas de cisne branco, leite Ele procurou durante um dia e
da maior virtude, um único grão de depois durante um segundo dia.
93
cevada e a mais fina lã de cordei- Antes da noite do terceiro dia,
ros. uma pedra surgiu em seu campo de
84
Uma vez que forjei o arco do visão, uma pedra que brilhava com
céu e moldei ao ar em uma cober- as cores do arco-íris.
94
tura côncava antes que a terra ti- Foi nesse lugar que o ferreiro
vesse um começo." Ilmarinen começou seu trabalho
85
E assim, o ferreiro mágico par- para construir a forja.
95
tiu para forjar o maravilhoso Ele acendeu uma fogueira e er-
Sampo, em busca de uma oficina gueu uma chaminé.
de ferreiro.
96 106
No dia seguinte, colocou seu Ilmarinen, o hábil artista, não
fole e, no terceiro dia, construiu a se agradou dessa criação e decidiu
fornalha. quebrar o arco em vários pedaços.
97 107
Assim, ele começou a forjar o Ele o lançou de volta na for-
Sampo. nalha e manteve os mercenários
98
O eterno artista mágico, o an- trabalhando no fole, empenhado
tigo ferreiro Ilmarinen, que foi o em forjar o mágico Sampo.
108
primeiro de todos os ferreiros, mis- No segundo dia, o ferreiro
turava certos metais e colocava a curvou-se e examinou cuidadosa-
mistura em um caldeirão. mente o interior da fornalha.
99 109
Ele então o colocava no fundo Dali, emergiu um objeto feito
da fornalha e chamava os merce- de metais fundidos, asseme-
nários para a forja. lhando-se a um barco de cor púr-
100
Habilmente, eles trabalhavam pura.
110
o fole, cuidavam do fogo e adicio- Cada parte dele reluzia em
navam o combustível durante três tons dourados, e os remos eram ha-
belos dias de verão e três curtas bilmente forjados em cobre.
111
noites do solstício de verão. O esquife possuía uma beleza
101
Foi somente após esse perí- admirável, porém, lamentavel-
odo que as rochas começaram a mente, estava manchado por algo
florescer nas pegadas dos trabalha- maligno.
112
dores, graças ao calor mágico pro- Rapidamente se envolvia em
veniente da fornalha. problemas, instigando brigas e se
102
No primeiro dia, Ilmarinen se lançando em combates maliciosos,
curvou e observou atentamente o sem qualquer provocação.
113
interior de sua fornalha, procu- Ilmarinen, o hábil artista, tam-
rando ver o que poderia estar se bém não se agradou dessa criação
formando a partir do fogo mágico e quebrou o esquife em vários pe-
e dos metais. daços.
103 114
Das chamas, surgiu uma besta Ele o lançou de volta na for-
com um brilho semelhante ao dos nalha e manteve os mercenários
raios da lua, um arco dourado com trabalhando no fole, empenhado
pontas de prata. em forjar o mágico Sampo.
104 115
Em sua haste reluzia o cobre No terceiro dia, Ilmarinen, o
brilhante, e o arco era forte e ma- renomado ferreiro, curvou-se e
ravilhoso. examinou cuidadosamente o fundo
105
No entanto, ai! a besta era de da fornalha.
má índole, exigindo um herói to-
dos os dias e duas cabeças em dias
de festa.
116 130
Lá, ele avistou uma novilha Decidiu, então, quebrar rapi-
majestosa, cujos chifres resplande- damente o arado em pedaços e
ciam em ouro, chamada Kimmoa. jogá-lo de volta na fornalha.
117 131
Sobre sua cabeça, ostentava a Ele permitiu que os ventos
constelação da Ursa Maior, e em atendessem ao fole, deixando os
sua testa, um disco solar radiante. ventos da tempestade incendiarem
118
Era uma bela vaca com pode- os metais.
132
res mágicos. Os ventos do céu competiam
119
No entanto, lamentavelmente, ferozmente: o vento leste soprava,
essa criatura era de índole maligna. o vento oeste rugia, o vento sul gri-
120
Ela corria precipitadamente tava e o vento norte uivava.
133
pela floresta, atravessando pânta- Sopraram um dia e depois um
nos e prados, desperdiçando todo o segundo, sopraram o terceiro
seu leite ao correr. desde a manhã até a noite.
121 134
Ilmarinen, o hábil artista, tam- Foi quando o fogo saltou pe-
bém não se agradou dessa criação las janelas e as faíscas voaram para
e cortou a vaca em vários pedaços. cima pela porta.
122 135
Ele a lançou de volta na for- Nuvens de fumaça subiram
nalha ardente e manteve os merce- para o céu, misturando-se com as
nários trabalhando no fole, empe- nuvens enquanto os ventos da tem-
nhado em forjar o mágico Sampo. pestade dobravam o fole.
123 136
No quarto dia, Ilmarinen des- Na terceira noite, Ilmarinen,
ceu e examinou cuidadosamente a inclinando-se para examinar seus
fornalha até o fundo. metais, encontrou-se diante das
124
Lá ele viu um belo arado profundezas da fornalha.
137
emergindo do fogo dos metais. Lá testemunhou o milagroso
125
A ponta e a relha do arado Sampo emergir, contemplou a
eram douradas, e a viga era feita de tampa multicolorida.
138
cobre forjado. Rapidamente, o talentoso ar-
126
Os cabos eram de prata fun- tesão de Wainola empunhou a te-
dida, tornando-o um arado encan- naz e a bigorna, martelando habil-
tador e maravilhoso. mente o Sampo com força.
127 139
No entanto, infelizmente, ele No processo, ele o forjava de
era indisciplinado. modo exímio.
128 140
Ele arava campos de milho e De um lado, o Sampo moía fa-
cevada e sulcava os prados mais rinha; do outro, produzia sal; em
férteis. outra face, forjava fortuna, en-
129
Ilmarinen, estava insatisfeito quanto a tampa exibia suas múlti-
com sua criação. plas cores.
a
Kim'mo. Um nome para a vaca; a filha de Kammo, o patrono das rochas.
141
Assim, o Sampo moía inces- cuco? Quem atenderá ao seu cha-
santemente, movendo-se de um mado e cantará com ele no outono?
lado para o outro com um balançar Deveria eu partir para terras dis-
suave. tantes? Deveria esta alegre donzela
142
Moía uma medida ao romper desaparecer dos campos de Sari-
do dia, uma medida própria para ola, dos pântanos e florestas de
alimentação, uma segunda medida Pohyola, onde o cuco canta e
destinada ao mercado e uma ter- ecoa? Se eu deixasse a casa de meu
ceira medida para ser armazenada. pai, se a amora de minha mãe de-
143
Com grande alegria, a nobre saparecesse, se estas montanhas
dama da Terra do Norte, chamada perdessem suas cerejas, então o
Louhi e conhecida como anfitriã cuco também desapareceria.
149
de Pohyola, parte levando consigo Todos os pássaros deixariam
o mágico Sampo. a floresta, abandonariam os picos
144
Ela o conduz em direção às das montanhas e partiriam de meus
colinas de Sariola, nas majestosas campos e florestas nativas. Jamais,
montanhas de cobre. em minha vida, direi adeus à virgi-
145
Lá, ela coloca nove fechadu- nal liberdade, nem aos cuidados e
ras sobre essa maravilha e faz com trabalhos de verão, para que a co-
que três poderosas raízes se espa- lheita não seja negligenciada, para
lhem ao seu redor. que as bagas não sejam deixadas
146
Essas raízes crescem na terra para trás, para que os pássaros me-
por nove braças, sendo uma delas lódicos não abandonem a floresta,
uma imensa raiz localizada sob a para que as sereias não deixem as
montanha, outra sob a areia do águas, para que eu não cante mais
leito do mar, e a terceira sob a mo- com elas."
150
rada das montanhas. Ilmarinen, o mágico e eterno
147
Humildemente, Ilmarinen im- forjador de metal, estava com o
plora pela resposta voluntária da quepe torto e a cabeça abaixada.
151
donzela. Eis suas palavras: "Que- Seu coração estava pesado e
res vir comigo, bela donzela, tor- desapontado, e suas mãos estavam
nar-te minha esposa e rainha para vazias, enquanto ele pensava em
sempre? Eu forjei para ti o Sampo, como alcançar sua pátria distante,
e forjei a tampa em diversas co- seu lar amado e querido, os prados
res." de Wainola.
148 152
A bela e adorável filha das Ele desejava retornar da
Terras do Norte respondeu ao fer- nunca agradável Terra do Norte e
reiro: "Quem se aventurará na pró- da sombria Sariola.
153
xima primavera e no segundo ve- Então, Louhi, a senhora do
rão para liderar o canto e o eco do Norte, falou com o pretendente Il-
marinen:"Ó tu, ferreiro Ilmarinen,
por que tens o coração tão pesado? dia, até que, na terceira noite, che-
Por que está teu semblante tão aba- gou aos pacíficos prados de Wai-
tido? Tens em mente viajar dos va- nola, à sua casa em Kalevala.
161
les e colinas de Pohya para os pra- Num instante, o venerável
dos de Wainola, para tua casa em Väinämöinën voltou-se para Ilma-
Kalevala?" rinen e disse-lhe:"Ó meu irmão,
154
Essa é a resposta de Ilmari- exímio artesão do metal, tu, que és
nen:"Minha mente anseia para lá, o eterno criador de maravilhas,
para minha terra natal. forjaste o mágico Sampo? Forjaste
155
Deixe-me partir rumo aos a sua tampa em várias cores?"
162
meus parentes e ali permanecer, O irmão Ilmarinen disse estas
descansando em meu próprio palavras conforme o mestre falou:
país." "Sim, eu criei o Sampo mágico.
156 163
Imediatamente, Louhi, uma Forjei a tampa com várias co-
anfitriã das Terras do Norte, con- res, que balança para lá e para cá.
164
cedeu ao herói todo conforto ne- Ela moe uma medida ao ama-
cessário. nhecer, uma medida para ser con-
157
Ela o alimentou com comidas sumida, uma segunda medida para
requintadas e deliciosas, e o aco- o mercado e uma terceira medida
modou em um barco feito de co- para o armazém.
165
bre, revestido com o mesmo mate- Louhi possui o maravilhoso
rial. Sampo, eu, porém, não tenho a
158
Louhi convocou os ventos Noiva da Beleza."
para ajudá-lo e o vento norte o
guiou de volta para sua terra natal. RUNA XI.
159
Assim, o hábil Ilmarinen par- LAMENTO DE LEMMINKAINEN.
tiu em viagem em direção à sua pá-
tria.
160
Ele navegou pelas profunde-
zas azuis das águas, viajando por
um dia e depois por um segundo
E is a história de Ahti, tam-
bém conhecido como
Lemminkainena, filho de
Lempo, Kaukomielib.
2
Ahtic era o governante das
ilhas, tendo crescido entre as casas

a
O que significa é desconhecido, possivelmente relacionado ao finlandês Lempi
"amor".
b
Um nome próprio masculino que significa “observado, distraído ; mentalmente
distante ; viajante indiferente , sem objetivo e aventureiro , impelido a viajar pelo
desejo de viajar ; sonhador cuja mente está frequentemente sonhando acordado em
outro tempo e lugar”
c
Ahti – Nome masculino de significado desconhecido. Este é o nome do deus fin-
landês do oceano, dos rios e da pesca.
12
das ilhas, no local onde sua amada Para seu filho, a estrela do dia
mãe residia, nas margens do oce- a corteja, porém ela não irá à terra
ano e nas pontas dos promontórios. do sol, não resplandecerá ao lado
3
Ele se alimentava de salmão e da estrela do dia, apressada em tra-
badejo dos oceanos, o que o tornou zer o verão.
13
um herói poderoso. Para seu filho, a lua brilhante a
4
Em suas veias corria o sangue corteja, porém ela não alcançará a
de gerações passadas, sua postura terra da lua, pela lua brilhante não
era altiva e sua presença domi- brilhará, não percorrerá o éter sem
nante. limites.
5 14
Sua mente e corpo se desenvol- Para seu filho, a Estrela da
veram de forma perfeita. Noite a corteja, mas ela não partirá
6
Mas, ai! ele possuía falhas. para a Terra das Estrelas, não emi-
7
Seu coração e sua moral eram tirá seu brilho na presença das es-
maus, e ele vagava por lugares im- trelas, durante as noites sombrias
próprios, passando dias e noites do inverno.
15
nas casas de donzelas alegres e Na distante Ehstland, chegam
participando das danças das vir- amantes, e outros vêm da distante
gens, envolvendo-se com donzelas Ingernb.
16
de longas tranças. Porém, eles não conseguem
8
Em Sahri habitou uma jovem conquistar a donzela, que lhes res-
donzela, a bela e encantadora Ku- ponde assim: "Seus elogios são em
lli, cuja beleza era comparável a vão, e sua prata é oferecida em
uma flor de verão. vão.
9 17
Descendente de uma linhagem Riquezas e elogios não me se-
real, ela cresceu com uma forma duzem.
18
perfeita e uma beleza radiante, re- Nunca irei a Ehstland, nunca
sidindo na humilde cabana de seu navegarei nas águas de Ingern.
19
pai, um lar que outrora acolheu he- Não cruzarei as águas do
róis lendários. Sahri, nunca provarei o peixe de
10
Sua beleza era tão impressio- Ehstland, nem degustarei suas
nante e majestosa que era louvada iguarias.
por todo o reino da Ehstlanda. 20
Ingerlandc nunca me verá, não
11
Homens de longe viajavam navegarei em seus rios, não pisarei
para cortejá-la, chegando ao local em suas fronteiras.
21
sagrado onde a virgem nasceu, a A fome lá é intensa, a escassez
casa de sua mãe. de madeira e alimentos é evidente.

a
Estônia
b
Inglaterra.
c
O mesmo que Ingern.
22
Não há água, trigo, cevada, das as donzelas lá te ridiculariza-
nem mesmo centeio em abundân- rão, todas as mulheres escarnece-
cia." rão de ti."
23 32
Lemminkainen, um herói Lemminkainen, cujos ouvidos
guerreiro das ilhas, chamado Kau- eram pouco atentos, respondeu às
komieli, decidiu empreender a ta- palavras de sua mãe: "Eu acalma-
refa de conquistar a donzela Sahri, rei o desprezo das mulheres e si-
cortejando-a e ganhando seu cora- lenciarei todas as provocações das
ção. donzelas.
24 33
Ele tinha o objetivo de obter Eu esmagarei os seios altivos
uma noiva tão honrada, uma don- delas e ferirei as mãos e as boche-
zela com tranças douradas, conhe- chas das crianças.
34
cida pela sua beleza. Com certeza, isso será sufici-
25
Porém, sua mãe o adverte com ente para conter seus insultos e
sabedoria:"Não", responde sua acabar com o desprezo!"
35
mãe, cujos cabelos já estão grisa- Esta é a resposta da mãe: "Ai
lhos. de mim, meu filho amado! Ai de
26
"Não corteje, meu amado fi- mim, minha vida malfadada! Se
lho, essa donzela de posição supe- insultares as filhas de Sahri, ou in-
rior. sultares as donzelas virtuosas, se
27
Ela nunca te trará felicidade, rires delas com escárnio, surgirá
pois pertence à linhagem de uma grande contenda, feroz a ba-
Sahri." talha que se seguirá.
28 36
O herói Lemminkainen res- Todas as hostes de pretenden-
pondeu: "Mesmo que eu venha de tes de Sahri, armadas aos milhares
uma posição inferior, e embora mi- te atacarão, e te matarão por tua
nha tribo não seja a mais elevada, loucura."
37
devo cortejar para satisfazer minha Nada listando, Lemminkainen,
fantasia. não dando ouvidos ao aviso de sua
29
Pretendo cortejar a donzela mãe, conduziu seu cavalo de
bela e encantadora e escolher uma guerra dos estábulos e rapidamente
esposa com base em seu valor e engatou o cavalo de batalha.
38
beleza." De forma apressada, partiu em
30
Assim respondeu a mãe ansi- sua jornada para a distante aldeia
osa: "Ó Lemminkainen, meu filho Sahri, com o propósito de cortejar
amado, escuta o conselho da tua a flor Sahri e conquistar a Noiva da
mãe. Beleza.
31 39
Não vás à distante Sahri, à sua Todas as mulheres idosas
tribo de múltiplos ramos, pois to- Sahri, assim como as jovens don-
zelas de beleza cativante, uniram-
48
se em risos de escárnio ao verem o As crianças de Sahri são indo-
estranho que se aproximava. lentes, mas os potros são robustos
40
Ele conduzia seu cavalo de e cheios de brincadeiras."
49
forma descuidada pelas estreitas Lemminkainen, despreocu-
vielas, acelerando imprudente- pado em seus afazeres, desempe-
mente pelo pátio e agora fazendo nhava a função de pastor.
50
uma curva no portão. Durante o dia, cuidava dos re-
41
Agora, ele virava no portão, banhos nos pastos, mas, à noite,
provocando a quebra do eixo, do buscava diversão nos jogos das
freio e do corredor. animadas donzelas.
42 51
Então, o destemido Lemmin- Participava das danças com as
kainen, com boca torta e o rosto virgens, encantando-se com as
franzido, sacudiu os cabelos de cor donzelas de cabelos trançados.
52
de zibelina e respondeu com pala- Assim, Lemminkainen, tam-
vras assim: "Nunca em minha me- bém conhecido como Kaukomieli,
mória ouvi ou vi tal tratamento, rapidamente conquistou a atenção
nunca fui alvo de ridicularização das mulheres, silenciando seus es-
ou zombaria por parte das mulhe- cárnios e extinguindo suas provo-
res, nunca sofri desprezo das vir- cações.
53
gens. Todas as damas e filhas de
43
Tais coisas nunca me aconte- Sahri logo se juntaram para feste-
ceram em minha vida imortal. jar Lemminkainen, dançando e de-
44
Existe, porventura, algum lu- morando-se ao seu lado.
54
gar adequado nas planícies e pas- Entre elas, havia apenas uma
tagens do Sahri onde possamos donzela de Sahri que não nutria
nos reunir para cantar e dançar? Há amor por pretendentes nem favore-
algum salão de prazeres neste lu- cia deuses ou heróis.
55
gar onde as donzelas Sahri resi- Essa era a encantadora donzela
dem, donzelas alegres de tranças?" Kyllikki, a mais bela flor de Sahri.
45 56
Então, as donzelas de Sahri, Lemminkainen, jeitoso herói,
em resposta a partir de seu pro- cheio de prazer, remou cem barcos
montório, disseram: "Há um am- em pedaços e puxou mil remos em
plo espaço em Sahri, espaço abun- fragmentos, enquanto cortejava a
dante nos pastos de Sahri, onde há Donzela da Beleza, buscando con-
lugar para salões de deleite e cele- quistar a bela Kyllikki.
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brações com danças. E eis que, por fim, dirigiu-se a
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Cante e dance em nossos cam- ele a adorável donzela, a mais bela
pos verdejantes. filha das Terras do Norte: "Por
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Sejam pastores nas montanhas, que, ó fraco, te demoras nestas
pois os pastores encontram espaço fronteiras, murmurando em vão?
para dançar.
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Por que te aproximas da minha la- Com rapidez, desembrulhou a
reira, cortejando-me com um cinto capa de couro e ajustou a trave,
de cobre? Não tenho tempo a des- chicoteou seu corcel para uma ga-
perdiçar contigo. lopada.
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Prefiro ocupar-me polindo esta Com grande ímpeto, um ru-
pedra, movendo o pilão no pesado gido poderoso e um chocalhar es-
almofariz de arenito, ou ainda, trondoso, ele se dirige rapidamente
sentar-me ao lado de minha mãe para casa, como o vento de uma
nas moradas de meu pai. tempestade furiosa. E assim, ele
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Jamais darei atenção ao teu pronuncia estas palavras para
cortejo, nem me importarei com aqueles que estão atentos aos seus
criaturas ou bajuladores. dizeres: "Ó donzelas ansiosas, ja-
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Anseio por um marido esbelto, mais ousareis espalhar estas notí-
pois possuo um corpo esguio. cias, pois eu conduzi Kyllikki para
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Desejo tê-lo de boa figura, pois minha morada distante, junto aos
talvez eu seja bem-formada. meus parentes.
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Almejo um homem alto e ma- Se desobedecerdes a esta or-
jestoso, para que sua estatura es- dem, sereis afligidas e sofrereis
teja em consonância com a minha como donzelas aflitas.
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majestade. Eu entoarei canções guerreiras
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Não percas teu tempo corte- contra os pretendentes, confron-
jando a donzela, a flor favorita de tando-os com lanças e espadas afi-
Sahri." adas, fazendo com que, por meses,
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Havia passado o tempo, quase anos e eras, jamais contemplem
um mês se esvaiu, quando numa seus rostos novamente.
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noite de alegria, onde as donzelas Não ouvirão mais suas vozes
se reuniam para dançar no vale alegres, não pisarão nestas terras
além do prado, em uma área plana elevadas, nem se unirão a estas
e verdejante, chegou cedo a don- danças, e não mais percorrerão es-
zela Kyllikki, o orgulho de Sahri, a tas estradas."
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Donzela da Beleza. Triste é o lamento de Kyllikki,
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Logo em seguida, Lemminkai- triste é a flor chorosa de Sahri.
nen a seguiu, montado em seu ga- Ouça agora a súplica chorosa dela:
ranhão altivo, o corredor mais ve- "Ó, devolve-me a minha liberdade,
loz do Norte, dirigindo-se rapida- liberte-me das agonias da escravi-
mente além do prado onde as don- dão.
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zelas se encontravam para dançar. Permita que esta donzela va-
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De prontidão, ele arrebatou a gueie de volta para casa.
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donzela Kyllikki, que prontamente Deixe-me seguir algum cami-
se sentou nos assentos bancários. nho e vagar até meu pai que está
sofrendo e minha mãe que está
chorando.
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Deixe-me ir, do contrário, lan-
çarei uma maldição sobre ti! Se
não me concederes a liberdade, se
não me permitires retornar ao lar
onde meus entes queridos esperam
minha chegada, então saiba que te-
nho sete irmãos robustos, sete fi-
lhos do irmão de meu pai e sete fi-
lhos da irmã de minha mãe.
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Eles perseguem as pegadas do
veado vermelho e caçam a lebre na
urze.
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Eles te seguirão e te matarão,
assim alcançarei a minha desejada
liberdade."
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Lemminkainen, com pouco
cuidado, recusou-se a satisfazer os
desejos da donzela e não atendeu
ao seu pedido de misericórdia.
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A virgem que esperava tornou
a falar, o orgulho e a beleza das
Terras do Norte: "Eu costumava
ser alegre ao lado dos meus paren-
tes, nasci com alegria e fui criada
com doçura.
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Passei minha infância com fe-
licidade, desfrutando da liberdade
de ser uma virgem, morando na
casa do meu pai, ao lado da cama
da minha mãe, pertencendo à li-
nhagem de Sahri.
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Mas, ai! toda a minha alegria
se dissipou, toda a minha felici-
dade se foi e toda a minha beleza
de donzela desapareceu desde que
encontrei o teu espírito maligno, ó
herói sem vergonha da desonra,
combatente cruel das ilhas, impla-
cável na batalha civil."

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