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1 HANS STADEN

DUAS VIAGENS AO BRASIL


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infi.n 1~ v ·is, só povoadas por gcn-
! . :lbs )lut:uncntc selvagens, um
n~ 1 v . .g. ntc europeu aqui naufragou.
Rcc )lht.:n to-se à tcn-a, conseguiu
: br • i" cr na rnorudia dos silvíco-
1 . 1mmnva-sc esse homem Hans
t. dcn, arcabuzeiro da expedição
do Almirante Sanabria. O que vi-
rc.:u e o que experimentou naquela
tremenda época de sua vida é o que
relata neste livro, que não apresen-
ta apenas uma narrativa de extra-
ordinária aventura, mas se reveste,
no mesmo tempo, da capacidade
exata de reviver, com clareza e fi-
delidade, a aurora de um país que
nascia para o mundo.
O marujo H(:lns Staden,
arcabuzeiro da expedição de
Sanabria, não é um Marco Polo,
não é um viajante que se limita a
descrever as terras ignoradas que
conheceu e as gentes desconheci-
das com que conviveu: é antes de
tudo um narrador fiel, que tem a
qualidade de reevocar e tomaram-
plamente cheias de vida todas as cir-
c~nstâncias e vicissitÚdes de que se
viu rodeado e às quais conseguiu
sobreviver.
Histo.ri~cnte, foi esse navega-
dor o pnmcuo a deixar cm fonna
d: livro, para conhecimento dos
posteros, uma obra que o tornou
seculannente célebre e que se fixou
COLEÇÃO RECONQUISTADO BRASIL- 1" SÉRIE
e-
1 U \ 1 O\
\Nl'\ F .\ VEG. CERRADOS BRASILEIROS - E. Wurming e Mário G. Fcrri
t" ~ 1 I - • • 1 .
' \E l: rAÇ:\O NO RIO ~RANDE DO SUL ~A) - G_.· A. M. Ltnt man e~ Máno G. Fcrri
4· V IAG El\ I PELAS PROVINCIAS DO RIO D~ ~ANEIR? E MINAS GERAIS - Augustc de Saint-Bita
_. ' l ·\G';l\1 PELO DISTRITO DOS DIAMAN íES E Lll ORAL DO BRASIL - Augustc de Saint-. H't·
"\ \ • i.;t d s . ·1 . l .
- . \'l ·\GEi\l AO ESPÍlUTO SANTO E RI? DOCE - Augustc e amt-H1 airc
7 _· \ 1.:\GEl\1 ÀS NASÇENTES DO RIÇ) SAO FRANCIS~O J\U~uste de Saint-Hilaire
S. \ tAGEi\I .À PROVINCIA DE GO.IAS - Auguste de Satnt-H1la1re
0 \ !AGEM A CURITIBA E PROVINCIA DE SANTA CATARINA - Auguste de Saint-Hilaire
;O. VlAGE1 1 AO RIO GRANDE DO SUL - A~guste de Saint-Hilaire
11. SEGUNDA VIAGEM DO RJ A MG E A SAO PAULO (1822) - Auguste de Saint-Hilaire
L . \ IAGEM AO BRASIL (1865-1866) - Luiz Agassiz e Elizabeth Cary Agassiz
13. VIAGEM AO INTERIOR DO BRASIL - George Gardner
14. VlAGEl\1t NO INTERIOR DO BRASIL - J. Emanuel Pohl
15. HIST. DOS FEITOS REC. PRATICADOS DURANTE OITO ANOS NO BRASIL - G. Barléu
16. O SELVAGEM - General Couto de Magalhães
17. DUAS VIAGENS PELO BRASIL - Hans Staden
18. VIAGEM PELA PROVÍNCIA DE SÃO PAULO - Auguste de Saint-Hilaire
19. HISTÓRIA DA MISSÃO DOS PADRES CAPUCHINHOS NA ILHA DO MARANHÃO - C. d' A
20. MEMÓRIA P_~~ A HIST. DA CAPITANIA DE SÃO VICENTE - Frei Gaspar da Madre de Dei:
2 l. NOTAS SOBRE O RIO DE JANEIRO - John Luccock
22. OS CADUVEOS - Guido Boggiani
23. PEREGRINAÇÃO PELA PROVÍNCIA DE SÃO PAULO - Augusto Emílio Zaluar
24. CONTR. PARA A HIST. DA GUERRA BRASIL E BUENOS AIRES - Por uma Testemunha Oc1
25. MEMÓRIA SOBRE VIAGEM DO PORTO DE SANTOS À CIDADE DE CUIABÁ - Luis d' Ali
26. MEMÓRIAS DO DISTRITO DIAMANTINO - Joaquim Felício dos Santos
27. COROGRAFIA BRASÍLICA - Aires de Casal
28. A VIDA NO BRASIL - Thomas Ewbank
29. VIAGEM PITORESCA ATRAVÉS DO BRASIL - Alcides d'Orbigny
30. A SELVA AMAZÔNICA: DO INFERNO VERDE AO DESERTO VERMELHO? - R. Goodland
31. HISTÓRIA DA GUERRA DO PARAGUAI - Max von Versen
32. HISTÓRIA DA AMÉRICA PORTUGUESA - Sebastião Rocha Pita
33. VIAGENS AO INTERIOR DO BRASIL - John Mawe
34. BRASIL: AMAZONAS - XINGU - Principe Adalberto da Prússia
35. NAS SELVAS DO BRASIL - Theodore Roosevelt
36. VIAGEM DO RIO DE JANEIRO A MORRO VELHO - Richard Burton
37. VIAGEM DE CANOA DE SABARÁ AO OCEANO ATLÂNTICO - Richard Burton
39141. HISTÓRIA DE D. PEDRO II - Ascensão, Fastígio, Declínio - 3 vais. - Heitor Lyra
42. HISTÓRIA DO MOVIMENTO POLÍTICO DE 1842 - José Antônio Marinho
43 . O PAÍS DAS AMAZONAS - Barão de Santa Anna Nery
44. VIAGEM AO TAPAJÓS - Henri Coudreau
45. AS SINGULARIDADES DA FRANÇA A~J ÁRTICA - André Thevet
46. BRASIL - Ferdinand Denis · . :,' : ,.
' • 1 1
· 1 ••
>

47. EXPLORAÇÃO DA GUIANA BRASILEI°RA ~ Hamilton Rice


49. VIAGEM AO XINGU - Henri ·doudreáu 1 ! · ' , '. · •
50. VIAGENS PELOS RIOS .AMAZàNAS 'F:
NEGRO - Alfred Russell Wallace
51. A CAPITANIA DAS MINÀS GERAJS ~ Aligusto: de:.Lima Júnior
52. ECOLOGIA DO, CERRADO - Robert ·Goodland
53. UM NATUR:'LISTA· NO RIO ·AM~ZONAS - Henry Walter Bates
54. HIST. D_AS ~LTI.MAS LUTAS NO BRASIL ENTRE~ HOLANDESES E PORTUGUESES
55 .FESTAS E TRADIÇÕES POPULARES NO BRASIL - Mello Moraes Filho
5
6157. VIAGEM PITORESCA E -HISTÓRICA ·NG BRASIL - 2 vols. - Jean Baptiste Debret
58/59. PLUTO_ BRASILIENSIS - 2 vols . .- W. L. · E·~ch'wêge
60. VIAGEM A ITABOCA E AO ITACAIÚNAS - Henry Coudreau
COLEÇÃO RECONQUISTA DO BRASIL
Dirigidu por Míirio Guimarães Ferri

Vol. 17

Transcrito em alemão moderno por


CARLOS FOUQUET

Tradução de
GUIOMAR DE CARVALHO FRANCO

Prefácio de
MÁRIO GUIMARÃES FERRI

Introdução e notas de
FRANCISCO DE ASSIS CARVALHO FRANCO

Capa
CLÁUDIO MARTINS

é
EDITORA ITATIAIA
BELO HORIZONTE
Rua São Geraldo, 53 -Floresta-Cep. 30150-070
Tel.: 3212-4600-Fax: 3224-5151 .
e-mail: vilaricaeditora@uol.com.br
Home page: www.villarica.com.br
Títul.o do Originnl Alcml\o
li ahrlu{/il>!,t' l llstorla

FlCHACAfALOGRÁFICA

(Preparada pelo Centro de Catalogação-na-fonte,


Câmam Brasileira do Livro, SP)

Staden, Hans, séc. 16.


S775d Duas viagens ao Brasil; tradução de Guiomar de Carvalho Franco/
transcrito em alemão moderno por Carlos Fouquet, prefácio de Mário Guima-
rães Ferri, introdução e notas de Francisco de Assis Carvalho Franco/Belo
Horizonte, Ed. Itatiaia; Belo Horizonte, 2008.
ilust. (Reconquista do Brasil, 17)

1. Brasil - Descrição e viagens 2. índios daAmérica do Sul- Brasil 3.


Índios Tupinambá 1. Franco, Francisco de A~sis Carvalho, 1886-1953. II. Títu-
lo. III. Série.

ISBN:978-85-319-0507-0

CDD-918.1
-980.3
75-0007 -980.41 ·

Índices para catálogo sistemático:

1. Brasil : Descrição e viagens 918.1 .


2. Brasil : Índios : História 980.41
3. Índios : Brasil : História 980.41
4. Tupinambás : Índios : Am.érica do Sul 980.3

2008

Direitos de Propriedade Literária adquiridos p~la .


EDITORA ITATIAIA
Belo Horizonte

Impresso no Brasil
Printed in Brazil
PREFACIO

Hans Staden é figura quase lendária do século XVI. que escreveu


sobre suas viagens ao Brasil, onde, convivendo com índios antro-
pófago~, participou de "arrojadas aventuras".
D10go de Sanabria herdara de seu pai João de Sanabria o direito
de su.bstituir Cabeça de Vaca. preso e desterrado, como governador
do Rw da Prata.
Antecipou-se a Sanabria, João de Salazar, como capitão do navio
"São Miguel'' , com o qual vinham duas caravelas, trazendo umas
trezentas pessoas, entre elas cinqüenta mulheres casadas ou solteiras.
Motim a bordo, falta de água potável, encontro com corsários
franceses que aceitaram respeitar a honra das mulheres e as· armas
dos homens, tempestade que separou o navio das caravelas, tudo
isso ocorreu antes que João de Salazar chegasse a Santa Catarina:
com oitenta homens e quarenta "mulheres e crianças".
Mas o patacho "São Miguel" encalhou na costa de Santa Cata-
rina para não afundar e perder sua carga.
Depois de alguns meses nesses lugares desertos, Salazar chefiou
um. grupo de homens e mulheres, o qual seguiu por mar num batel
que construíram, até o porto de São Francisco. Novas . desavenças
dividiram os expedicionários e Salazar, com doze companheiros,
dirigiu-se a São Vicente.
Hans Staden, artilheiro de um navio comandado por Penteado,
em sua primeira viagem, partiu para o Brasil, em segun~a viagem,
na armada de Sanabria, em 1550. Em 1557 publicou, em Marburgo,
um livro que o celebrizou como autoridade de Etnografia sul-ameri-
cana. Desse livro fizeram-se mais de 50 edições em alemão, flamengo ,
holandês, latim, francês, inglês e português.
Pouco se sabe de Hans Staden, a não ser o que ele mesmo
conta em seu lfvro, mas em 1664 Winckelmann encontrou em Cassei
um seu retrato.
A narrativa de Hans Staden contém preciosas informações verídi-
cas, dado o seu longo convívio com os tupinambás. Ela é valorizada.
pelas xilogravuras que devem, sem dúvida, ter sido feitas sob sua
orientação.
Hans Staden conseguiu evitar que os tupinambás o devorassem.
Apesar do sucesso obtido no exterior, com várias edições em
diversos idiomas, e apesar de ser de grande interesse à nossa História,
_ . / · , E•tTIO''"ªfia foi .wmcnte no f. im do século XI X que J.·urgiu
º"''ª
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' ll11g11a. na l~ e v i sla '1' ri m e.\'lral dp lnsliluto
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Históri .0 e Geogrâfico /Jrasilciro, em 1 ~~2. < •
Logo apareceu, entretanto: 11ova ed~çao (1900) pai roema da pelu
l n.s·r·rw J Histórico e G eográf1co d e Sao Paulo. Alberto 1.Joefgren
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tradu:iu a obra, para essa ed·1ç<.w, - d·1retamente d e um exemp Iar da
2 .a .,diçtlo alemã, de Marburgo. r •

Nessa edição brasileira aparecem notas de Teodoro Sampaw.


Nova edição em português "foi feita por Monteiro Lobato em
1925, com reimpressões em 1926 e 1927.
Mais wna edição em português, da tradução de Loefgren com
notas de Teodoro Sampaio apareceu no Rio de Janeiro, em 1930,
na série "Publicações da Academia".
Finalmente surgiu, em 1941, outra edição em portugu~s, patro-
cinada pela "Sociedade Hans Staden''. Trata-se de tradução do tra-
balho de Karl Fouquet, feita por Guiomar de Carvalho Franco. Nesta
versão mantém-se o estilo ingênuo de H ans Staden e há numerosas
notas de Francisco de Assis Carvalho Franco que também redigiu
o Prefácio.
Deste, principalmente, sirvo-me como referência para o Prefácio
da presente edição que resolveram fazer a Editora da Universidade
de São Paulo e a Livraria Itatiaia Editora, em sua Coleção "Recon-
quista do Brasil".
Foi sem dúvida acertada essa decisão, pois esta é indiscutivel-
mente a melhor edição brasileira desta obra. E na presente ·edição
fac-similar, de melhor qualidade gráfica que as anteriores, colocam-se
as xilogravuras e o retrato de Hans· Staden, bem como se apresentam
as últimas descobertas de Fouquet.
Estamos certos de que o público interessado encontrará na
leitura deste livro muita informação de utilidade, apresentada no
es~ilo ingênuo . qu~ advém .dessa personalidade tão intéressante que
fm um dos pnmezros cronistas · a escrever. sobre nossa Pátria." Hans
Staden. ··

São Paulo" dezembro de 197 4

MÁRIO GUIMARÃES FERRI

!'
SUMARIO

Prefácio ........................... . ................. · · · · · · · · · IX


Introdução ..... . ...... .. ... . ........ . ........... · · · · · · · · · · · · · · 5

LIVRO PRIMEIRO - AS VIAGENS ..... · . · · · · · · · · · · · · · 25

Prefácio do Professor Dr. Johann Eichman, chamado Dryander, em


Marburgo ................. ·. · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · 29
Capítulo 1 ............................... · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · 39
Capítulo 2 - Início da minha primeira viagem de Lisboa, em
P·o-rtugal . ................................ · · · · · · · 41
Capítulo 3 - . Como os selvagens de Pernambuco se rebelaram e
· quiseram destruir uma povoação dos portugueses .. 46
Capítulo 4 - Gomo eram as fortific1ações dos indígenas e o seu
·m odo de combater-nos ............ . ......... · · · · · 47
Capítulo 5 Como partimos de Pernambuco e alcançamos, em
Paraíba, a terra dos Potiguaras, encontriando um
navio francês com o qual nos batemos ........... . 50
Capítulo 6 - Partida de minha segunda viagem de Sevilha, na
Espanha, para a Améri~a ....................... . 53
Capítulo 7 Como alcançamos a terl'la da América, a 28 graus
de latitude, não tendo podido entretanto encontrar
o porto que nos havia ' sido· indicado, e como rebentou
na costa uma grande tempe.s tade ................ . 55
Capítulo 8 - Como· deixamos o norto em busca da Ilha de Santia
Catarina ........ : . ........... . ................. . 58
Capítulo· 9 - Como alguns de nós saimos eom o bote, afim de
conhecer o porto, e como achamos uma cruz, que
estava sobre um recife ......................... . 59
Capítulo 10 - Como fui mandado an nosso navio com uma carioa
cheia de selvagens .... ; ........................ . 63
Capítulo 11 - Como o segundo navio, do qual durante a viagem
fomos separados, chegou com O· primeiro piloto da
nossa ·e squ·a dria ... ·............................. . 64
Capítulo 12 - Como qucriamos velejar para ·São Vicente, que os
portugueses ocupavam, e conseguir deles um navio
a-fim-de levarmos a . termo nossa viagem, naufra·-
giando porém em uma· grande tempestade, não sabendo
a que distância ficava ainda São Vicente . ........ . 66
Capítulo 13 Como reconhecemos em que lugar da terra estranha
havíamos naufragado .............. . ........... . 70
Capítulo 14 Como está situado Sã-o Vicente .......... . ...... . 71
Capítulo 15 _ Como se chnnrn o lug·n.r, d~ onde os po1·tup;ue8~H (•
os tupiniquins siio 11u\1~ v10lcntamentc combatidos,
e t~ omo cstú situado ....... ·.. · · ..... '. ......... . .
Cs.pitulo 16 Como os portug·uesl!~ rcconst1·u11·am Bert1oga e levan-
taram um forte nu tlha <lc Santo Amaro ......... .
C:tpítulo 17 Como e por que nós tinhamos que contar com os
inimigos duas VC'ZC'S mais no ano do que em outrog
ten1pos .... . ................................... . 77
Capitulo 18 - Como fui aprisionarlo p<'los ~clvag·ens ........... . 78
Capítulo 19 Como O$ selvagens q'ueriam retroceder levando-me
consig-o e como chegaram os nossos para reclama1·-m<:•
Capítulo 20 O que ·a conteceu duranü a viag·em p·ara a tena
1

dos tupinamfo1s ..................... · · · · · · · · · · · . 84


Capítulo 21 - Como os selvagens SP portaram comig·o no primeiro
dia em sua aldeia . . ................. · . · · · · · 87 1
• • • •

Capítulo 22 - Como meus dois senhores vieram vêr-me e dissm·am


que me haviam dado de presente a um amigo, que
a princípio me guardaria 1: depois, quando quisesse
devorar-me, matar-me-ia ................. · . · · · · · · · 89
Capítulo 23 - Como as mulheres dansaram comigo diante da choça
na qual estavam os ídnlos ....................... . 91
Capítulo 24 - Gomo, depois da dansa, levaram-me ao lpirú-g·uaçú,
que devia matar-me ............ . ... , .......... . 93
Capítulo. 25 - Como os irmãos, que me haviam aprisionado, queixa-
ram-se a mim, cheios de -c ólera, que os portugueses
tinham atirado o seu pai. Isto queriam eles vingar
em mim .............................. ~ ........ . 94
Capítulo 26 - Como chegou para. ver-me um desses franceses ai
dEixados, e como aconselhou aos selvagens que me
devorassem, pois que ·eu era português ......... . 95
Capítulo 27 Como tive uma gTande doT de dente 96
Capítulo 28 Como me cond~ziram ao Cunham bebe·•. ~~l~ ·~~i~ ·~lt~
chefe, e como la me trataram 97
Capítulo 29 Como os tupi~iquins. vieram e~ ~·i~t~ ·· ~ ~i~~~ ·e·;~~~~, ·
o que eu havia predito ao chefe, e atacaram a aldeia
na qual eu estava ..... . 101

Capítulo 30 - Como os chefes se reunira~ ·~o.Ú:~. ~~b ·~ '1~: 1·:· · · · · 102
Capítulo 31 Gomo os t?piniquins incendia1~am Mambucadª · · · ° 1
outra aldeia ............... a, uma
104
Capítulo 32 - C~mo veiu um n~vio de BertÍ~g:~: i~f~~~~~·do·-~~ ·d~
mim·, obtendo porem a o e nas respostas 1 . . .
cap1'tu 1o 33 - corno <> 1rmao
. - . do chefe - Nhaêpepô-o acomcas ,. d M · · · ·
105
cab · · açu e ambu-
a vem e queixou-se a mim que seu . -
mãe e todos os o t irmao, sua
E . . u ros parentes estavam doentes
_x1g1dam-me conseguir do meu Deus que ficasse~
saos e novo
O.apítulo 34 Como o chefe ·d~e~.t~·
Como volto f.
Nl · ·:. · · · · · · ·: · · · · · · · · · · ·· · · ·
~
. . laepepo-oaçu voltou para casa 107
106
Capítulo 35
que me comu o I ances, que recomendara aos índios
como º'"' me essem, e ped!-lhe que me levasse consigo.
Capítulo 36 Com 0 " us amos ' por em, nao - me quiseram . libertar' 110
os selvagens devo .. . . .
levaram-me consigo à fest~ar am um pr1s1one1ro e
Capítulo 37 .... : · .... " · ··........ 112
º que :aconteceu
comeram o
.
1
na vo ta, depü1s que os selvagens
. .
escravo . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . 113
2
Cn p ft ulo 88 - Com o º"' po1·t'. Ull'LW tHJH mundu1·am d e novo um navio
b\nJ ·n1·-1nc• . . . . . . . . . . . . . . . . . . • • . . . . . . . . . . . . . . . . . . 115
C np( t ulo ao - Como OH 111\ t ivou t inhum con u l~o um cHcravo que
d o con t lnuo m o culunlavu, <i qu e te ria rapre ciado Be
m e houvesse m mntudo logo. E le pr6pl''ÍO f oi mor to
<? dcvot·ndo crn mi nhu pt•csençn . . . . . . . . . . . . . . . . . . 119
Cnpit ulo 40 C omo ch e gou um na vio f rancês, comerciando oi:s índios
nlgod üo e nau brusil. De bom grado tcriia ido ao
navio, o qu ê porém nüo estava determinado por D e m; 122
Ca pitulo 41 Como {JS selvag< ns partiram para a g uerra, levanclo-
1

mc consigo, e o que •acont eceu nesta expedição . . . . . . 124


Ca pítulo 42 Como trataram os prisioneiros durante a sua viagem
de volta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129
Capitulo 43 Como dansaram os selv·a gens com os seus inimigos,
quando acampamos no dia seguinte . . . . . . . . . . . . . . 132
Capítulo 44 Como ainda estava o navio francês a cujo bordo
me queriam levar quando voltassem da guerra. T•al
me haviam mesmo prometido . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 134
Capítulo 45 - · Como comeram o primeiro dos dois cristãos assados,
a saber, Jorge Ferreira, o filho do capitã1l· português 134
Capítulo 46' - Como Deus Todo Poderoso operou um prodígio . . . . 135
Capítulo· 47 - Como eu estava na pesca uma. tarde, com dois nativos,
e Deus realizou um- milagre comigo durante violenta .
chuva e furacão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 136
Capítulo 48 Como comeram Jerônimo, o ségundo dos dois. cr~stãos
assados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . 138
Capítulo 49 Como me levaram nara dar-me de presente . . . . . . . . 139
Capítulo 50 Como os selv1agens -·da mesma povoação narraram-me
a partida do · navio francfü:; acima mencionado . . . . . . 140 ·
Cap.í tulo 51. Como eu logo depo-is fui dado de presente, e como
. vefü · da ·Franç'a um outro mi.vi.o, o "Catherine de·
Vetteville" que, pela. graça de Deus, me resgatou 141
Capitulo 52. - Como se chamava o , capitão e {} · piloto; de onde
provinha o navio; o que .aconteceu antes da nossa
partid'a · e quanto tempo levamos na nossa viagem
para ·a França .. .· . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 143
Capítulo 53 - Como em· Dieppe fui . conduzido à· casa do capitão
do Bel 'Eté, : o navio que partira do BrasH antes de .
nós, e que .a inda não tinha regressado à' pátria . . .. . 146
Capítulo 54 . -. Minha . Oração a Deus Se.i;ihor, . quando estava em
poder dos.. selvagens que me queria~· devorar ~ ..... 147

LIVRO SEGUNDO - - A ,TERRA : E SEUS .. HABITANTES 149

Capítulo 1 Como· se vi1aja de Portugal ao Rio de Janeiro, que


fica . na Am.é rica a ·.c erca de . 24 . guaus de latitude sul 151
Capítulo 2 Góm~ . está situada a terra da América · ou Brasil, .
que em p·a rte eu ví ... ....... ~ ......... ., ......... . 152
Capítulo 3 - . De uma grande cadeia de montanhas que existe
• • ' 1 J 1

na t·erra ......................................... .. 153


Capítulo 4 Dos índios Tuninambás, do,s quais fui prisioneiro .. 154
Capítulo 5 - Co~o co~str~e~ s~as habitações os Tupinambás, dos
quais fu1 pr1s1one1ro ... . ......... . .......... . ... . 155
Capítulo 6 - Como acendem o fogo ................. : ....... . 157

3
nd . do r 1nc.m .. .. . , · · · · · · · · · ·: · ·; · · · · · · · · · · · · · · ·: 158
Cu.p ulrJ 7· - .omo atira.nt com d<'xll'cza, umma1s selvagens e pe1-
í'ífl ul o x,<. g com fJ cc hn i; . .... . .......... . .............. . 159
Qual é a ei; tatura da . gente .. ....... .:. .. · · ·: .... . 161
·n pí ul o 9 Gomo 0 que cavam e cortam, quando nao obtem dos
n p f ulo 1 cri s tãos ma chados, facas, tesouras e outras mercado-
ria.'3 s imílares ..... · · · · · · · · · · · · ·.:. · · · · · · · · · · · · · · · · 161
apí ulo 11 _ O que os s elvage n.s comem com.o pao e como plantam
e pr.eparam as ra1zes de .mandioca ............... . 162
:,t pÍ ufo 12 Como temperam seus ahmentos ................. . 163
C ;ttJÍ uJo 13 - Governo, autoridade, ordem e direito que têm ..... . 164
e pí t ul o 14 Como queimam as panelas e vasilhas que usam 165
. -apítul o 15 - Co mo preparam a bebida, com que se embriagam,
e camo agem relativamente a ela ............... . 165
Capitulo 18 - O que usam os homens como ornato, como se pintam
e que nomes têm ........ . ................ · · · · · · · 167
Ca pí ulo 17 O que usam as mulheres como enfeite ........... . 169
Ca p ítul o 18 Como dão o orimeiro nome às criancinhas ....... . 170
CLipit uJo 19 Quantas mulheres tem um varão e como as trata .. 171
Capítulo 20 Como são os compromissos de casamento ......... . 171
Capít ulo 21 Quais são os seus bens ......................... . 172
Capítulo 22 Qual é a s ua maior honra ..................... . 172
Capítulo 23 No que acreditam ........ . .................... . 173
Capítulo 24 Como fazem, das mulheres, feiticeiras ........ . .. . 175
Capítulo 25 - N o que viajam sobre ·a água ................... . 176
Capítulo 26 Porque devoram seus inimigos ................. . 176
Capítulo 27 Como se preparam quando querem empreender uma
excursão guerreira na terra dos seus contrários ... . 177
Capítulo 28 Das armas de guerra dos selvagens ............. . 178
Capítulo 29 Solenidades dos selvagens por ocasião· da matança
e devoramento dos seus inimigos. Como executam
Estes e como os tratam ......................... . 179
RE LATÓRIO SOBRE ALGUNS ANIMAIS DAQUELA TERRA
Capítulo 30 - Veados, porcos do mato e macacos . . . . . . . . . . . . . . . . 189
Capítulo 31 - O tatú . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 190
Capítulo 32 Saruês, tigres, leões, capivaras e l.agartos . . . . . . . . 191
Capítulo 33 - Duma espécie de insetos, semelhantes a pequenas
pulgas, que são chamados tunga pelos selvagens . . . . 192
Capítulo 34 - De uma e~pécie de morcegos daquela terra que
mordem as pessoas de noite, durante o sond nos
artelhos e na testa .. .......... . ............ : . . . . 193
Capítulo 35 - Sobre as abelhas da terra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 193
Capítulo 36 - Dos pássaros da terra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 194
RELATÓRIO SOBRE ALGUMAS ÁRVORES DAQUELA TERRA
Capítulo 37 A árvore do genipapo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 194
Capítulo 38 - Como crescem o algodão e a pim.e nta brasileira e
algumas raízes, que os selvagens plantam para comer 195

Conclusão - Hans Staden deseja ao leitor a graça de Deus e paz 196

NotaH , . , , , , . , , , , , , .... , , . . .................. ........... . .... .


' 201
Í'ndíc~ anaHtico , .. , , . , , .. , ..... , ............................. .
, 203

4
INTRODUÇAO

Com a prisão e desterro de Alvaro Nunes Cabeça de Vaca,


a côrte espanhola buscou um governador para o Rio da Prata,
que ali fosse a suas expensas. Ofereceu-se então João de Sa-·
nabria, cavaleiro rico, natural de Medelim, que firmou com o
governo uma capitulação em Monzóm, aos 22 de julho de 1547.
Comprometia-se êle a levar cem casais, com os filhos, du-
zentos e cincoenta solteiros ·e a fundar dois povoados, um na
costa de Santa Cátarina e outro na embocadura do Rio da Pra-
ta. O soberano porém preferiu que a expedição levasse oitenta
casais e vinte donzelas.
João de Sanabria faleceu quando nêsses preparativos e seu
filho, Diogo de Sanabria, herdou-lhe as estipulações, confirma-
das em Valhadolid, a 12 de março de 1549. E enquanto êste úl-
timo concluia tais providências, outras duas expedições se de-
senhavam, forçando-o a enviar .na sua frente, com poderes es-
peciais, a João de Salazar, natural de Espinosa de los Mante-
ras (1) , nomeado tesoureiro geral das províncias· do Rio da
Prata, o qual partiu de São Lucar de Barrameda a 10 de abril
de 1550, como capitão do patacho "São Miguel" e duas carave-
las mais, uma . das quais pertencente ao capitão Francisco Be-
cerra e a outra tendo como mestre a João de Ovando. Essa pe-
quena armada levava trezentas pessoas de equipagem, das quais

1) - Sobre a identidade dêste personagem, que fa leceu em As-·


snnção .a · 11 de fevereiro ·de 15·60, consul tem-se os estudos de Enrique de
Gandía, "La patria dei fundador de la Assun ci6n del P arn guay' ' e "Tes-
tamento de .Juan de Sala11ar", no volume ''Los primeros italianos en el
Rio de la Plata y otroA estudios historlcos", Buenos- Aires, 1932. Tam-
bem poder-se-á lêr do mesmo autor, "Historia del Grun Obnco" , Ma-
drid; 1929, pAgs. 114-115.

5
cinco ntu mulheres, cnb·c cuf:.ladus e tmlteiras, inclusive
d. M ncía Calderón d Sanubdu, viuva ~e João de Sanabria e
n qu rn El-Hc.i fizera mercC!, durante a v1da, de metade do go-
v rno do RJo da Prata ( 2 ).
Como piloto do patacho ''São Miguel" era para seguir 0
português Gonçalo da_ Costa, ':elho conhecedor do .atlân.tico sul,
mas por se achar entao desavindo com. os .sanabria, foi substi-
tuido por João Sanches, natural de Biscaia e que tambem jã
andara no Novo Mundo com Alvaro Nunes Cabeça de Vaca e
com êle retornara à Espanha em 1545.
Logo nos primeiros dias de navegação, houve a bordo da
capitânea um levante para depor João de Salazar e substituí-lo
por Fernando de Trejo, fato que não teve maiores consequên-
cias devido à atitude de Fernando de Salazar (8 ).
Chegados à ilha de Palma, sem outro 'incidente, dali saí-
ram a 15 de junho de 1550 e dirigiram-se para as .c ostas da
Guiné, em busca de ventos favoráveis. Uma tempestade sepa-
rou o navio das cç.ravelas. O ·"São Miguel" foi baldo de man-
timentos a bordo, escasseando sobretudo água potável. · A 25
de julho avistou uma nau, logo · reconhecida como de corsários
franceses, capitaneada por certo Escorcio, normando que ·nave-
gava à ordem de Francisco Martim, residente em Rochela.
Sem dar tempo a que fugissem, a embarcação francesa abor~
dou-os intimando a se renderem.
Após vários entendimentos, o· capitão João de Salazar, o
piloto João Sanches e o genovês Bernardo Vivaldo, foram numa
chalupa ao navio francês e ali acordaram a rendição, combi-
nando que os franceses se· apoderassem de todos os" bens ·que
houvesse a bordo, · não tocando poréin na honra das mulheres
e nas armas dos soldados. ·
Assim se praticou e .todos salvaram apenas a roupa do
corpo. O "São Miguel" tomou rumo de pleno oceano, onde per-
vagou "sem saber o piloto onde estava, ,por não ter sua carta
de marear pintada a terra d~ São Tomé". Bom mar'ítimo no
entanto, João Sanches atingia a ilha do Ano B.o m, a trinta lé-
guas daquele ponto. A viagem ia penosa de privações e sobres-
2
) - Enrique de Gandía, "Histõria de la conquista del Rio de la
Plata y del Paraguay", Buenos-Aires, 1932, pâg. 25·6.
8
) ·- Nenhum parentesco ligava este Fernando de Salazar ao te-
Boureiro capitão Joilo de Sa~azar. Era êle filho de certo doutor João de
Salnzar, natura~, de G1:unauu, que parece ter se metido depois · a frade.
E. de Gundfa, Historrn llel Gran Chaeo'', cit., pâg. 115 . .

6
s a ltos. A pós ci nco dins d " demoru n êsfm último porto, dali saí-
rrun com inten to de a lcunçtu· n ilha de Santa Catarina, no
B 1·asilt onde filmlmen te chegaram a 16 de dezembr o de 1.550.
Ai encon traram a car avela do capitão Becer ra, que estava então
no m:lndo de Cristov::u n de Saavedra filho de Hernandarias de
Saav·edra, correio-mór de Sevilha. '
~ta caravela, depois da sua separação em São Tomé, havia
veleJado rumo sudoeste e depois de ter lutado com um violento
temporal na costa brasileira, pouco acima de Santa Catarina,
chegou casualmente a êsse porto a 25 de novembro .le 1550. Da
segunda caravela, comandada por um cavaleiro de Cáceres~
chamado João de Ovando, não se teve mais noticia.
Por uma carta de João de Salazar escrita da "Laguna do
Viaçá", a 1 de janeiro de 1552, sabe-s~ que com êle chegaram
a Santa Catarina exatamente oitenta homens e "quarenta
mulheres e crianças". Ainda esclarece essa carta que no Viaçá,
antigo porto dos Patos, Fernando de Trejo, cavaleiro de Trujilo,
casou-se com d. Maria de Sanabria, filha de d. Meneia Calderón
de Sanabria e irmã de d. Diogo de Sanabria. Nasceu dêsse ca-
sal, em São Francisco do Sul, que pouco depois fundaram nessa
costa, aquele que mais tarde seria frei Fernando de Trejo y
Sanabria, primeiro provincial franciscano e terceiro bispo do
Tucumam ( 4 ). Nêsse mesmo · povoado ainda se casaram Rui
Dias Melgarejo, foragido do Paraguai, com Elvira de Contreras,
filha do capitão Francisco Becerra, que fôra criado do gover~
nador Vaca de Castro; João de · Salazar com d. Isabel de Con-
treras, viuva do dito capitão Becerra e Cristovam de Saave-
dra com d. Meneia de Sanabria, · tambem irmã de · d. Diogo.
João de Salazar apressou-se em mandar de Santa Catarina
por terra á Assunção, a Cristovam 4e Saavedra e cinco, soida-
dos, a-fim-de que notificasse a Domingos Martinez de Irala 'd a
nomeação de d. Diogo de Sanabria. para adearitado do Rio da
Prata e mandasse a São Gabriel. víveres e recursos para_ que
todos pudessem subir o rio Paraná e Paraguai até aquela po-
voação. Os emissários c~egaram aq 'seu d~stino ·ª 15 de agosto
de 1551 (5 ), mas Nuflo de Chaves, que foi o mensageiro de
' J ' •

4) - Frei José Maria Liqueno, "Fray Fernando de Trejo y Sa-


na bria - Fundador de la Universidad Nacional de Côrdoba'', Córdoba,
HH·6 - I, pâgs. 13 e segs. Aí se encontra a genealogia do velho Fer-
nando de Trejo.
G) -- - Luís Roque Gondra - "El descubrimiento del Nuevo Mun-
do y la conquista de America espafiola - Introduci6n a la historia de
la Republica Argentina", Buenos-Aires, 1936, pág. 443.

7
. 1.egr ess ~ oti de São G a bri el, sen1 ter nenhuma noticia de
lrHl }l . .
João, d e S nlazar e da sua gente .
E ' q u e ta'°· 11 to 0 pa tacho "São OMiguel", como a carav.ela, ha-
viam-se perdido na arribada. ... prf1mdeiro f.01· encalh a d o na
· ·
e S anta Catarina para nao a ·un ar e se perder a sua
cos t a d . d v· ,
car ga e a segunda naufragou nas cercanias o iaça.
Ficaram os náufragos durante mêses nêss.e s sítios ermos so-
frendo grande escass~z ~e. víveres e vicissitudes de: ~o~o o gê-
nero. Por isso, em pnnc1p10s de 1552, resolveram d1v1d1r-se em
dous grupos, um dos quais marchou por terra para Assunção,
sob a conduta de Afonso Velido e Fernando de Salazar. Os
restantes, com d. Meneia Calderón de Sanabria, suas filhas e
demais mulheres, á frente dos quais estava .o capitão João de
Salazar, foram por mar, num batel que construiram, até o
porto de São Francisco. Aí nova dissenção dividiu os. mala-
ven turados expedicionários, de modo que Salazar e doze com-
panheiros dirigiram-se num bergantim para São Vicente e os
demais ficaram povoando São Francisco do Sul, tendo como
dirigente a Fernando de Trejo (6 ).
1

Chegado a São Vicente, após novo naufrágio, Salazar fez


vãos esforças para encontrar meios .de se transportar para As-
sunção até que em janeiro de 1553 chegou a essa capitania o
governador-geral Tomé de Sousa. As providências que tomou
a respeito constam da sua carta datada do Salvador, 1 de
junho de 1553. Diz na mesma: - "De Castela · partiu uma ar-
mada com trezentas pessoas pouco mais ou menos ( 7 ) para o
Rio da Prata, a qual parte dela na ilha do Príncipe, na costa
da Guiné e parte na costa entre o Rio da Prata e São Vicente
sesse.nta léguas dêle, onde se, cham.a o rio dos Eatos, se perde~
quas1 toda e se salvaram somente ~essenta . pessoas, quasi a
metade mulheres, onde entrava a mulher do governador que
tambem faleceu que se .chamava Fernando de Saraiva (sic) e
suas filhas e parentes em que eram nove ou dez mulheres fi-
dalgas afóra outras. Os índios como viram que ·e ra gente que
s~ parecia .conosco e dizerem-lhe êles que eram irmãos nossos,
nao lhes fizeram mal algum, antes muito. agasalho e·
· · dºd . . omo se
viam assim pe: 1 os, veiu um capitão daquela campanha que
se chamava Joao de Salazar, que foi . criado do duque de Avei-

6) - Gondra, obra cit., . págs. 44 7 449


7
) Carlos Morla Vic -
- " ' .·
cubrimiento y con . . una - Estud10 historico sobre el des-
Leipzig 1903 1 ~ qm~ta ~e la Patagonia Y de la Tierra del Fuego",
Jantes. ' ' · par e, P g, 2 98. Ai se diz que eram duzentos tripu-

8
r o. a qu m fez d e ita i· o hábito ele Süo Tiago e chegando êste
.h om m .1 São Vice nte, cheg ue i eu e me p ediu que mandasse
b usca r a que les h om ens e mulher es que es tavam ali p e rdidos.
P arece u-me se n iço de De us e de Vossa Alteza mandá-los bus-
cai· e m um navio e trazê-los a São Vicente, parecendo-me que
as 1nulheres virão tão enfadadas dos trabalhos que passaram
q ue casar ão ai c01n quem lhes der de comer e os homens que
farão cada um a sua roça. E parti com êles dessa pobreza mi-
nha que levava e não foi tão pouco que não fosse mais do que
eu tinha de meu de trinta e cinco anos" (8 ).
Na carta de João de Salazar, escrita do porto de Santos a
25 de junho de 1553, êle conta o seu naufrágio e sua salvação
e.in Itanhaem, com doze companheiros, "con solo las armas".
Dali escreveu ao capitão-mór Antonio de Oliveira ( 9 ) que lhe
enviou um barco . onde todos vieram até São Vicente. Acres-
centa que obteve então aí de Pedro Roesel, administrador de
" un Juan Menista, flamengo que bive en Lisbona" (10 ) e por
en1prestimo, um caravelão, com o qual trouxe o resto da sua
gente que havia ficado no Viaçá, em duas viagens ( 11 ).
Nada diz Salazar das desavenças havidas e dos que ficaram
em São Francisco do -Sul. Em compensação, pedia ao Rei cas-
t elhano que "não os esquecesse nessa terra onde a maior parte
dos que nela vivem são malfeitores desterrados de Portugal".
O gov erno espanhol providenciou em tal sentido, fazendo re-
tornar com várias credenciais ao genovês Bartolomeu J usti-
niano, que_ ali fôra enviado como emissário (12 ) . Não obstante
as apresentações, Bartolomeu Justiniano nada conseguiu em
São Vicente (1 3 ). Resolveu então João de Salazar valer-se de
uma medida extrema, a qual relata na sua carta datada de
Assunção, aos 20 de março de 1556. Combinou com Rui Dias -

B) - !Historia da Coloniza~ão Portuguesa do Brasil - Porto, 19'24


- ill, pá.gs. 3'65 e 866. Nos Documentos Historicos, v . XXXV, pág. 344,
vem uma ordem régia a respeito .
. 9) - .Antonio de Oliveira foi capitão-môr de São Vicente de 1539
a 1543 e depois de 1549 a 15'54. Dele demos larga noticia no nosso tra-
balho, " Os capitães-mores vi~entinos". São Paulo, Departamento de
Cultura, 194{), pâgs. 31 e 36.
10) - Vide em "Capitães-mores vicentinos", pâg. 29 o estudo que
fuemos sobre João Veniste ou Menista, cujo nome certo seria João van
Hle1Bt. Tinha êle· parte no engenho de São Jorge, a qual depois vendeu
aos filhos de Erasmo Schetz.
ll) - E. de Gandfa, Historia da conquista, cit., pâg. 26·5.
12) - Sobre este personagem vide E. de Gandía, "Los prlmeros
italianos", clt., p!g. 52 e sega.
13 ) - E. de Gandia, "Historia de la con9uista", cit., pâg. 275,
nota 181.

9
,. seu irmão Vicente de Góis, a
M Jgarejo Cipriano de Go1s ~eis portugueses e .uma duzia de
e fuga de São V~cente cobm tomaram parte o genovês Bar-
sua
espanhóis.
N
? ~ ortidaa trun em
inulher de Cipriano e ois, .
d G, . d M .
ar1a
tolomeu JustinianoS, . d Isabel de Contreras, .que se fez
a de a 1clzar, . " Ih d
de Bastos e f'lhas e mais tres mu eres casa as.
har de duas 1
acompan ,. ra a 'ornada que assim encetaram para o
Tiveram el<:s, dpa ertJões a orientacão e o amparo moral
· atraves os s ' ~ d ·
Paraguai, 1 d Nóbrega e após cinco meses e viagem,
d 0 P adre Manue
G . , a(14) e afinal Assunçao, ' - on ' d e c h egaram em
atingiram o 15;;rra do que Bartolomeu Justiniano aí, arribara
o~tubro de t ·' s;~rnando de Trejo com outros náufr.a gos da
tres mescles ªsn es.b ·a havia tambem 'partidq de São Francisco
armada e ana ri ' 1556 N .
do Sul e fôra atingir . Assunção em ?1.eados de · · a ~ap1-
tania vicentina, ainda ficaram res1dmdo uns . poucos desses
náufragantes e algumas das "quarenta mulheres", qqe se ca~
saram na terra ( 15 ). ; ·
E de todos êles, que somavam trezentos no d~zer · de T~~é
de Sousa, conseguimos os nomes apenas dos segumtes: cap1tao
João de Salazar, tesoureiro da província; capitão Fern~ndo de
Trejo, capitão Francisco Becerra, ,João de Qvando, Fernando
de Salazar, d. Diogo ~e Lerna~ d,. Antonio de Carv~jal, .J o~o
Sanches, de Bisçaia, piloto-mó~, Bernardo .V ivaldo, geJ?.OVes;
Afonso Velidp, Fernando de .. Campos, . capitão Rafael Burrón,
padre J o.ão Fernan~-~ Carilo~ . 4-fonso ·Rodrigues, Claudip Mi-
rande, francês; Cristovam de Saavedra, Hans Staden, alemão,
arcabuzeiro; . ce~to Roldão, Afonso Q.e Escobar, Migue~ .Ort~, .
Gonçalo Dias, Piog9 Casilas, ferreirq ;· Gomes Malavér, Antonio
de Guiles, Afonso do Prado, Francisco de Cépeda, Afonso de la
Carrera, Martim Gonçalez, .G asp·a r Fernandes, natural de Faro
ma_:inheiro;,. João C?ºm.es, . pedrei70; Diogo de Aiala, Diogo d~
Leao, frances, 'carp1nte1ro; Francisco Garcia, Melchior de· Rao-
lim, João Durão; ·João ' eôrtes, Pedro · Martim · Francisco de
Cue~as, S~ncho d.e Alm~nz?m, c~rpint~iro de b~nco; Francisco
Di:rao, Joao Be_:nal, c:_arpinteiro;· Baltasar 'de Carvajal, alfaiate;
Joao de Ga?1boa, Joao Donoso,' Pedro Garcia, Bartolomeu de
Salazar e D10go Bravo de . Ia Vega .(16) ~ · Das· mu·lhere ·,
... ,.. . . ,, . , . .
. '
s, Ja men-
' 1 1 \

t" ·' ·
!

14
) - Guairá significa . ·"·o luga ··.
"'Primeiras noções de tupi" s-· ·p r m ransponivel". Plinlo Ayrosa,
llS) - Para· maiore ' ao . aulo, 19133, pág. 14;6.
Sanabria, leia-se o estud s ,detalhes sobre as mulheres da armada de
volume "Indios Y conqui~t d~ ·Gandía, "Una expediciõn de mujeres" no
pâgs. 117-160. · · ª ores en el Paraguay", ·Buenos-Aires 193·2
16 , '
) - Alguns dêstes ·
nomes colhemos em Luis Rublo Y Moreno,
10
cíonamos os nomes que conseguimos, a saber: d. Meneia C~l­
dcrón de Sanabria e urna !ilha homônima; Maria de Sanabria,
Elvka de Contreras, Isabel de Contreras e uma filha homô-
nima.

TI

Dêsses personagens todos, ficaram interessru:do à nossa


história, em. graduação diversa, d. Meneia Calderon de Sana-
bria, João de Salazar, João Sanches, de Biscaia e Hans Staden,
d,e Homberg, por terem deixado preciosas indicações s~bre. a
·t erra e a gente brasileira. Hans Staden foi mesmo o pnmerro
autor de obra impressa sobre a região vicentina e Rober~o
Southey disse do seu livro que no século ninguem conseguiu
superá-lo nas notícias dadas sobre as tribus brasileiras (1 7 ) •
E sem falar da pequena informação de viagem escrita por
d. Meneia de Calderón (18 ) , acentuemos que João de Salazar
deixou-nos várias cartas nas quais narra mlJ+udentemente a
expedição e todas as suas vicissitudes (19 ) • João Sanches, de
Biscaia, piloto-mór da armada, escreveu dois pequenos memo-
riais, um com uma sintética notícia da viagem e outro com
uma rápida descrição da costa brasileira e do Rio da Prata.
Acreditamos que o primeiro que publicou essas relações foi
Morla Vicufia e dêsse historiador vamos aqui traduzí-las, dando
publicidade das mesmas pela primeira vez em português ( 2 º) .
A data destas relações, dada pelo arquivista de Simancas, é de
1550. Será êste apenas o ano inicial das mesmas. Luis Roque
Gondra entende, acertadamente, que seria 1553 para a carta
descrição e 1556 para a _crônica ( 21 ). Vejamos porém em pri-
meiro lugar esta última: ·
'"'- Partidos que fomos de La Palma, em prosseguimento
de nossa viagem, tomamos a costa da Malagueta e daí atraves-

"Pasaajeros a Indias", Madrid, sld, vol. II, pãg. 361.


17) - Roberto Souúhey, "Historia ~o Brasil", tradução de Oli-
veira e Castro, Rio de Janeiro, 1862, vol. I, pág. 299.
18) - Morla Vicufia, obra cit., 2.ª J>arte, págs. 49-51.
19) - Ver tambem "Informaciõn de servicios de Hernando de Sa·
lazarº, datada de Santa Cruz da Serra, 29 de dezembro de 1562. As
cartas de João de Salamr, que se referem á viagem, são principalmente
as datadas do Via~, de 1 de janeiro de 1:552, as do Porto de Santos e
São Vicente, de 25 e de 30 _de junho de 1553 e a de Assunção, de 20
de março de 1-556. Esta ultima se ·encop_tra na integra nas "Cartas de
Indias", Madrid, 1877, pâgs. 579-5·8 2. ·
~~) - Morla Vicufia, obra cit., 1.ª parte, pltgs. 2'95-297.
) - Gondr~, ._obra cit., págs. 463 e 400.

11
d São Tomé, a-fim-de dobrar a costa do
san1os em budscal.. foemos ao Brasil, à ilha de Santa Catarina
Bras1·1 (?)· e ador· l
nos havia dado por ins . t ruçao
- que f"ossemos,
on d e 0 governai·nverno não pudemos passar a1' e assentamos'
d
mase
por ser 4que a nau' que levavamos,
, - po d end o mais
nao . nave. .
ovoar,
P.ar P 01
deitamo-la ·
de través; e visto que a I'Ih a d e S ant a Cata...
g_ ' tava despovoada por causa dos portugueses e seus arni...
rma es
gos (selvagens) terem feito muitos. saltos aos, in · d'1os na~urais
da dita ilha e terem aniquilado todos os selv1colas do litoral
que eram amigos dos vassalos ?e Sua Ma~est~de, passando-nos
a um porto adeante quinze I;guas da _dita ilha, p_erde~am 0
outro navio e como não possu1amos mais .embarcaçao, fizemos
uma com que passamos a outro porto para povoar e estando
povoando nêsse dito porto, os espanhóis que iam na equipagem
depuseraip. João de Salazar que traziamos como capitão e f~­
zeram capitão .a Fernando de Trejo, que casou com uma filha
de João .de Sanabria, o governador, e depois disto o dito João de
Salazar se foi a São Vicente, .povoação dos portugueses e tratou
e ordenou de se ir com muitos outros a êsse lugar e estando
como estávamos povoando com o dito Fernando de Trejo e
dona Meneia, mulher que foi do governador João de Sanabria
e as mulheres que vieram na equipagem, mandou de São Vi-
cente Tomé de Sousa, governador que era pelo rei de Portu-
gal, uma caravela ter conosco e na caravela enviou um padre
da Ordem dos Apostolos (2 2 ) para que nos fizesse muitas pro-
messas e que nos daria apetrechos de guerra e nos favoreceria
de modo ª. irmos por terra para o Paraguai, o que visto deli-
bero~ o dit.o Fer~ando de Trejo ir-se a São Vicente com os
demais. ~ isto feito, resolvi ficar na dita povoação com sete
companheiros que tambem quiseram permanecer d ·
disto estabelecido,
. porque essa era a mi'nha 1·ntençao, . e:pot~
- e, ins1s 1-
ram os portugueses que nos. queriam levar a t o d os para nos
~us.t en t ar naque 1e porto e vila e para isso se . .
-1nd1os da terra, e como eu teimava ficar ar ':1n1ram com oals
modo com Fernando de Tre·o " ' ranJaram-se de t
São Vicente, e ficaram 08 se~e ;~e este :r:ie fez saír e levou a
gados que fomos a São Vicent mpan~~rros no povoado; che-
Sousa, governador do rei de p e, ver1flca~os q1:1e Tomé de
para que não fôsse permitida a ortugal, havia deixado ordem
algum. Visto isto e 0 . passagem por terra de espanhol
rios, determinaram F maisd que nos contaram alguns contrá-
·t- ernan o de TreJ· d
cap1 ao Salazar, volver para Sã F 0 ~ os emais, menos o
o ranc1sco que é um porto
22) p
- oasivelmente 0 padre
Manuel da Nóbrega.
12
b m ,, l\ H :1p ' '· t,A n tfit'n pt voo ndo. 09 1ndlou omil{oH dos
f r UJ""U . ~t h \\ inm h,,lt> d ·~1um· ntn r mJ tm t, h onrnnn q ue P --r-
m n . , m n ~ 4' l uniu; lfoHb nrn l m· n m-no~ o troux 'rum um
1 . · , t · nd , t u l Ih )~ 1·oul>ado, 1 \lo qu • uc r ucHlo q u e foi por
nl " iat d s l r t u ~ u •s ,s ., dê:;s ' modo, s 'g undo pe nao, irüo
d ~ , · :n- a I• rmu1do d • Trcjo, por q u ,, ussim o prn ticnm os
' rtu · i s s; ' visto is to e d vicio n nfio m e deixarem ir p ara
n 'nhnm lu a r , r solvi da r a entender no capitão de S ão V i-
n t"' (·) q u queria ir in for m ar o rei de P or tugal das cousas
, B rasil, c-orn o q u e lhe fa r ia gr a nde serviço, porque estando
e mo e tavan1 os portugueses por El-Rei na m aior par te da
cost do Brasil, h a via de querer entender e conhecer a nave-
g ção e portos da dita costa. Para que fosse até ao rei de Por-
tugal, o dito capitão deu-me uma carta para o conde da Cas-
t nhe ira (2 4 ) pela qual se via a intenção que os portugueses
têm de nos expelir da costa e nos desbaratar, para que não
m ais povoemos. Francisco Gambarrota ( 2 ~) vinha para passar
a Espanha e com êle outros oito ou dez espanhóis e no cami-
nho toparam umas minas muito ricas com o que volveram to-
dos, menos o dito Francisco Gambarrota, que vem num outro
navio e traz amostras das minas; e vistas essas minas e a sua
r iqueza, Domingos de !rala enviou a Pedro Dorantes (26 ) ,
administrador, a que povoasse onde acharam as minas e ficou
povoando. Da navegação e portos que na dita costa descobri
e vi, darei conta ao piloto-maior de Sua Magestade. Na capi-
tania de São Vicente, em toda sua comarca e na parte onde
nós outros povoamos, acharam os · portugueses muitas minas
ricas de prata ( 27 ) e digo isto porque na minha presença fi-

23) - Esta resolu~ão devia ter sido tomada em meados de 1,5 5,'1
e o capltllo-mõr seria Brás Cubas, pelo que se lê no capitulo 38 da pri-
meira parte do livro de Hans Staden. .
2•) - Era o primeiro conde dêsse nome, d. Antonio de Ataide,
multo aceito de d. João III, que por carta de 11 de abril de 1530 0 ha-
l'fa nomeado vedor da fazenda. Foi êle tambem sesmelro em Itaparica e
Tatuapára, como se lê nas "Memorias" de I. Acioll, anotadas por Brâs
do Amaral, Bafa, 119 19, vol. I, pág. 3·56. Casou-se com d. Ana de Ta-
vora, filha de Alvaro Pires de Tavora, senhor do Mogadouro. Faleceu
em 7 de outubro de 1563. Braamcamp Freire, "Brasões da Sala de Sin-
tra'', Coimbra, '1930, vol. III, pág. 3'9•5 .
2õ) - Sobre êste personagem leia-se E. de Gandia, "Los prlme..
ros italianos", cit., págs. 42-43.
26) - Vide biografia àêste personagem nas "Cartas de Indlasº,
clt., pág. 7 53.
1

27
f - A noticia aqui ~ fantasiosa. Nos tempos colQniais· não se
encontrou prata no Brasil, multo embora ,p ara isso se tivessem feito bas-
,t ae dlligênclas. Ouro sim, jâ pelo tempo em que João San<!hes andou
por São Vicente, em 1~· 53-1554, é sabido que se minerava.

13
. - , uais todas enviam ao rei de Por...
Z eram mw ;as
. t fund1çoes, .
as q
povoar toda a cost a. p or isso · tne
Ioao envie a d
tuº1ll para que 0 • Sua Magestade porque preten em os
º ;' . ...l.:~~ 0 dar aviso a , · , d Rº d p
Propus vrr ~ dêles , t od a a costa . . ate a
. . boca So io M a rata
portugueses ser. ande será 0 preJUlZO de ua ~gestade,
e se isto se realizar! gr itos bons portos que achei e para
porque na costa .ex:ist~ 1:1u há caminho muito curto e ótimos
0 trato com . o ~o da . ª ªavoado que agora estão formando e
rios e em especial P~~a ºe~cusam de ir ao Rio (da Prata) com
estando povoada ª e~ as aguas borrascosas. Sua Mages-
as naus, por e:~ª b ~~i:de dar rémédio a isto, de modo que
tade deve com 0 _ ª r poderem da terra que é muito bôa e
os porturueses nao se a , .d ·
, •
5

cheia de mmas e IS o a· t não se tenha duvi a pois
f com meus·
, · lh
propnos o os vi, com · 0 disse , os portugueses azerem
, ,, ricas
fundicões., e além disso têm muitos engenhos de açucar .
A carta-descricão de João Sanches, escrita anteriormente
, ,. · a que acini'a finalizamos é a seguinte: - "Os vassalos
a crome ' il ·t ·1
do rei de Portugal povoaram na costa do, Bras ~u1 as VI as
e a última nos limites de Vossa Alteza, e uma vila que cha-
mada São Vicente está na outra extremidade, em vinte e três
graus e meio, é c~pitania de Martim Afonso de Sousa; disse-
ram-me uns portugueses que pela terra dentro, na direção da
dita vila, tinham povoado outras duas vilas, e que êste ano
iam povoar outras (28 ). Parece-me que Vossa Alteza deve
mandar pôr termo a isto de modo que os ditos portugueses não
povoem .nem vedem as terras de Vossa Alteza, porque é muito·
necessário que sejam povoadas pelos vassalos de Vossa Alteza,
tanto por ser terra muito aparelhada para a produção do açú-
car como para a criação do gado, bem como outras granjearias
e proveitos que andado o tempo dela se poderá obter. Na al-
tura de vinte e cinco graus, trinta leguas da vila de São Vi-
cen~e, ~stá um bom porto que se chama Cananéa; está povoado
de inclios que .se chamam tupís, amigos dos portugueses. Si
V~ssa Alte~a vier a estabelecer limites com os portugueses, que
seJa ~elo dito po~to de Cananéa com um rio que chamam Ivaí
q~e dista de S. Vicente doze ou quinze léguas (?) .
menos e ma d V · pouco mais ou
.jurisdição e ndi~· ossda AVlteza que por aí seja estabelecida a
isas e ossa Alteza. O dito rio I vaí é bom
28) .
- Gondra, obra cit áª
cho Para concluir que e8 ta ., P hs. ~ 6_2- 4 63, argumenta com êste tre-
Dlar?o, citando as datas d~a~~:-descr1çao foi escrita em 1553, depois de
c~ntina até aquele ano En ação de ~odas as vilas da capitania vi-
V1cente, Pois dâ para ~ me gana-se porem na data da creação de São
sma o ano de 1531.
14
rio e desce do campo e é muito necessar10 pa ra quan~o p . que-
rendo Nosso Senhor se povoar a terra, f azer-se o con1ercio do
campo. Chamo campo a terra dent ro porque é plana e com
grandes can1pos e será muito produtiva; porque a t erra que
ca i S'O bre o mar é muito montanhosa e com grandes serras, e
por causa destas, existe no litoral tnuito pouca terra apro-
veitável, apenas a que está entre os vales das ditas serras.
Por isso é necessário que a vila ou vilas que se erguerem na
costa do n1ar, possuam parte da terra plana do dito campo
para que possam ter suas lavouras e criações porque junto ao
mar há muita falta de pastos, pelas causas sobreclitas. M8!5
adeante está outro porto muito bom que chamam de Sa,o
Francisco e _é o mais pró:x'imo do campo e dos índios guarams
amigos dos vassalos de Vossa Alteza que vivem no dito campo
no caminho por onde semimos
b
com Alvaro Nunes Cabeça• de
Vaca (29 ) . Conta-se de Cananéa a êste porto de São Francisco
vinte léguas pouco mais ou menos e está deserto de índios. Se
o dito porto de São Francisco fosse povoado de selvícolas, seria
a melhor entrada para se ir terra dentro, na conquista do Rio
da Prata, porque dêste porto até aos índios amigos dos vassa-
los de Vossa Alteza há muito pouco caminho e por entre os
ditos índios se póde ir á dita conquista. Parece-me que se de-
via povoar em primeiro êste porto tendo em vista a dita en-
trada. Adeante, oito léguas pouco mais ou menos, está o rio
Itapucú que quer dizer Pedra Alta, por onde entramos com o
dito Cabeça de Vaca; não é rio que tenha porto. Mais adeante.
dezoito léguas pouco mais ou menos, está a ilha de Santa Ca-
tarina; a dita ilha está a vinte e sete graus e meio; está povoada
de índios guaranís, muito amigos dos vassalos de Vossa Alteza.
Deram ao dito Cabeça de Vaca muitos mantimentos e acompa-
nharam-no ao campo . ~té a povoação dos índios seus amigos.
Adeante, aos vinte e oito graus e dois terços, está uma laguna
que se chama Viaçá; é porto apenas · para navios pequenos.
Toda esta costa desde São Francisco até esta laguna, está des-
povoada de índios devido ás muitas guerras que os tupís ami-
gos dos portugueses sempre fazem aos amigos dos vassalos de
Vossa Alteza e por tal motivo vão os ditos índios abandonando
a terra e fugindo. Adeante desta laguna, em direção ao Rio da

29) - João Sanches, ' nàtural de Biscaia, piÍOto-mõr da armada de


d. Diogo de Sanabria; já. tinha "vindo ao atlântico sul com a expedição
de Alvaro Nunes Cabeça de Vaca, em 154.1, tendo regressado a Espa-
nha em 1545. Volveu como sabemos em 155-0, chegando a Santa Cata-
rina antes de finalizar êsse ano. Em 1553 estava_em São Vicente e por
Staden temos c,iência que dali se retirou sô depois de meados de 1554.

15
80
> - Sobre êate retlgio o e 9tl agitada vida consulte- , _nd _ ,
"Historia da e<>aquista", clt., capftnlo IV.
'1) - Ha.ns Staden, capitulo 42 da primeira _rte.

16
landês, la tim, fnm cês 1 inglês e por tug uês. O pouco que dêle
se s a be é produto d o seu p róp rio livro. Lê-se ai que o dr. Dry-
a nde r , a liús J oão Eichm ann, profe8sor d e m edicina em Mar-
burgo, conheceu desde a infU ncia o p ai d e Hans Staden, como
êle natura l de Wetter, cidade ali nas imediações. M a is tarde
se mudou para Homberg, em Hesse, onde vivia em 1556 e onde
nasce u seu filho Hans. Talvez por iniciativa do dito dr. Dry-
ander, Staden ao regressar da America em 1555, conhecesse
Felipe I, landgrave de Hesse e a êle narrasse as suas viagens
e aventuras. Desde então deve ter começado a escrever o seu
livro que terminou no ano seguinte, pai~ o seu prefácio traz
a data de 20 de junho e a introdução do dr. Dryander a de 21
de dezembro de 1556 (3 2 ) •
No carnaval de 1557, saiu a primeira edição dessa, obra,
impressa em Marburgo, na "Folha de Trevo'', por Andre Kol-
be. Constatamos então que Hans Staden estava como cidad~o
de W olfhagen. Daí em deante, nenhuma notícia mai~ se tem
do estóico náufrago da armada espanhola de 1550.
Em 1664 Hans Just Winckelmann encontrou em Cassel um
retrato de Hans Staden, que publicou no mesmo ano em sua
obra sobre a America, editada em Oldemburgo ( 33 ). Richard
N. Wegner diz que nã.o se poude . col~er provas da autenticidade
dêsse retrato, que apresenta no entanto a técnica da xilogra-
vura quinhentista. ~sse mesmo autor, apreciando a obra de
Hans Staden, diz que ela foi a quinta das publicações em lín-
gua alemã que se imprimiram sobre as duas Americas. A pri-
meira foi em 1497 por Bartolomeu Küstler com uma narração
sobre o conteúdo das cartas de Colombo. A segunda consti-
tuiu uma série de edições começadas em 1504 sobre as cartas
de Americo Vespucio. A terceira foi a "Copia do novo .jornal
da terra do Brasil", impressa em Augsburgo, em 1514. A quar-
ta consistiu numa tradução f.e ita em 1550 da narrativa de Fer-
nando Cortez sobre a conquista do Mexico. A quinta final-
mente foi a obra de Hans Staden, o primeiro alemão que deu
à publicidade uma descrição etnológica clara e verdadeira de
um povo selvagem,, usanqo de suas próprias expressões.
Êsse livro de Stade:r;i .despertou rapidamente um interesse
especial. As suas verídicas informações provinham da sua
' 1

32) .- O dr. Dryander datou de Marburgo, dia de Silo Tomâs de


1556, mas é sabido que o dia dêsse santo corresponde a 21 de dezembro.
aa) - "Der Americanischen N euen Welt Beschreibung". Com o
retrato foram encontradas cerca de trinta xilogravuras que Winckelmann
classificou de originais.

17
,, • e ntre os tupinambás ou tamoios e foram de
l nga p •rmnnctc~t1 1. valor como fonte para . o estudo de Utna
gt'llnd ~ p a rl cu U. "ida Completam a sua narrativa as xilo-
tribu h oJC bdc~ut pnri~cdub.itavelmente sob sua orientação e que
gr avuras
· ' a ei
d· as ã prínceps de. Mar b urgo. E m b'ora ru d'imenta-
~i;) rur;~~e~1:: ~;ofunda fidelidade. .º .s~u mapa tam~ei:i é .dos
ies~ . t tes como ensaio primitivo de cartografia.
m ais m eressan
Há uma notável semelhança entr~ ,o retrato de Hans
Staden encontrado em C~ssel ~ a ~~~ imagem nos desenhos
traçados sob sua orientaçao. ~a esta ele com a me~ma barba
ponteaguda, que por seu próprio dizer sabemos ter s1<!.o de côr
ruiva. Muito lutou êle com os indígenas para que nao a ras-
passem, o que afinal acabaram conseguindo.
O artista que entalhou as xilogravuras, colocou as suas
iniciais D. H. na bandeira central do na~io que 1>e vê na es-
·tampa do capítulo primeiro, mas não foi possível até o pre-
sente a identificação dessa assinatura. E não acreditamos, após
ter estudado atentamente o livro, o mapa e principalmente os
desenhos, que nos ajudam de modo admirável a vêr o país, seus
habitantes, seus usos e costumes e muitas das vicissitudes
porque passou o seu autor, não ' acreditamos, repet~os, que
Hans Staden deixasse de ter apreciável ··ilustração para a· época.
Que êle conhecia algo de marinharia e o português,· o caste-
lhano e o tupí, consta da sua própria narrativa. Não entendia
o francês, mas tambem não se percebe nele o menor ódio ra-
cial, antes. a todos estimava e de todos era estimado como se
constata no decorrer da sua exposição.
Demais, o ,f ato dêle t~r relações antigas e estreitas com 0
dr:. Dryander, professor da Universidade de MarbÚrgo d
Joao Sanches, pilot~-mór da esquadra de Sanabria t" ~l e e
tanta . conta que f?1 como principal emissário nu~a ~ ,.;;_t. em
tentativa de r~sgata-Io dentre os contrário (ª 4 ) , una
teza de que tinha realmente uma cultur ~ ' ~a:nos a cer-
a que até aqui lhe é atribuída 1 .. · ª. ~em maior do que
ramos que em tal ponto todos !: s ªT
palavras escritas na intro.d ução doc
ºffrseus comen~adores. Repa-
a ~epetir as modestas
Tambem, a psicologia de Hans eu ivro : pelo ~· Dryander.
~a sua obra, é bem mais interess Staden, atraves do estudo
tiva de que era um hessiano sim ante ~o que a simples afirma-
Uma das provas está no fato d ples, . s~cero, devoto e valente.
o devorassem, aprisionado co ~ t~r. evitaliio que os tupinambás
mo o1 entre portugueses e com-
"> - Bane 8taden, capttulo 38 . .
· da Primeira parte.
18
batendo-os. Um fruncôs ohei'oU mesmo n recomunclnr uo11 ti~~
moios que o comessem logo, inaíd1n quo ·St.ucl<m on.contr~oo " 1 "'
tes para entreter e em final noutrulizm: pot' complotC>.
Alguns outros traços revelam em I·I1.nta Studon umn put~
sonalidade original. Aqui npenus recorda r c!moa .. o cmio dôlc
arrancar o penso duma sua ferida e jogá-lo f6ru, com o pon:
sarnento de que não devia estar tratando a sm1 carne, umn vo:t.
que ela iria servir de pasto a outrem ( 11 rs).

III
A obra de Staden teve tambem desusada aceitação. No
mesmo ano em que apareceu teve mais uma edição em Mar-
burgo e duas em Francfort sobre o Meno. Não tardaram .~s
versões em vários idiomas, no decorrer dos séculos XVI, XVII,
XVIII e XIX. Interessando tão de perto os nossos estudos geo ...
gráficos, etnográficos e históricos, teve no entanto a sua prime~­
ra versão na nossa língua somente no fim do último século ci-
tado. E das pesquisas que andamos fazendo, organizamos a se-
guinte indicação bibliográfica das edições, tratluções e adapta..,
ções do trabalho de Staden, resenha essa que bem sabemos não
é completa mas que nos parece a mais ampla até hoje publicada.
*** Edição em alemão feita em Marburgo, em Hesse, no
carnaval do ano de 1557. Esta é a edição prínceps, que foi im-
pressa na "Folha de Trevo", por André Kolbe. A sua enun-
ciação · se encontra em Sabin, sob o n.º 90036. J. C. Rodrigues,
na Biblioteca Brasiliense, n.º 2304, citando Brunet e Carter
Brown, diz que a primeira edição é de Francfort sobre o Meno,
em 1556, "durch Weigand Han". Acrescenta que no livro não
há data, · mas que o prefácio é que traz aquele ano. Edmundo 1

Wernicke, no seu trabalho "Ulrico Schmidl", Santa Fé, 1938


pág. 244, tambem cita "Stade Hans von Homberg-Reisbuch:
1556". Afirma que existe um exemplar com o dr. Walter J a-
cob, em Buenos-Aires. tsses autores estão porém fazendo con-
fusão com as edições de Weigand Han, ambas de 1557, em
Francfort, sobre o... Meno, as ~uais. não menci~nando data, pres-
taram-se a deduçao do ano mscrito no prefacio pelo dr. Dry-
~der.

. *** ~diç~o _em alemão, feita em Marburgo, em 1557, "no


~a do amversa:1? de Maria'', tambem por André Kolbe. Esta
e a segunda · ed1çao da qual o dr. Eduardo Prado adquiriu um
35
) - Hans .Staden, capítulo 26 da primeira parte.

19
1 d . ,, t l"\\l. · P l 1u n H \O Pnu lo, ,iendu lrn<luzidt>
·m1 la\' '_1t''. , , 't . Jle lo Ir. J\ llwl'lO J ,Hft(rtm. (, o I' 'HpoUv)
' •
t •' p '' "H' (. ., "l 1
,', . t ·ll , l''. puhll ·:'rhl l' I\\ S o 1 nu.º' : m i .v' l>"H· 07 , l\.
' . l ')lH ' l 1
,.., . , \ '< m daí 0 fo t.() d, • ·tar imp1 t.': o n o f1 onl1up{olo d uun
·( ·• '1\'I \ ~.· ·-- " , •., \' "•>l"l ... tiíl ú ltr~ o 'ln unprcrnm ' Pl' ln u H•unc1n
' t'
_ ·~ ' ii l" ,•nt ·m 'nt' mnnut\tndn ' m 'lhorudu". A por lndo
l"" ' • h
un
( i 1• ~ \ n1·1'
C-'
t\ 't' ' · . '· • }•·'-'') 1'• i 'O ' l\.HJ ll t.mcionn 1850, COJl\O .f ocilm ntc•
S
v •r u~• ·'d i 'Hú fn ·-simHnr de W t:!ncr d,' 1925, r chtudn
l t. ·{
n · i" m 1·•ta t:m rn:.!7. Tmnb •m na diçao pnnceps, n vinhetn
21 r nrnt' ao uprimciro livrinho", trnz impresso no interior:
·· · 'r um d mini nrnnet in aet rnun1''. A da scgundn edição de
.. r ur n~\
é idêntica, como se pôde verificar na edição de
n. A edição de 1930, da Acaden1ia Brasileira, que é a
, . . i : da de Lofgren n1elhorada, substituiu-a pela da edição
prín . . . ps tirando-a da edição fac-similar de Wegner. Igual-
111 n t por descuido, deu o fac-símile da portada da <:_dição
prínceps de Marburgo e conservou no entanto a traduçao de
L ·· fgren dizendo "pela segunda vez diligente1nente aumenta-
da e melhorada", palavras inexistentes no frontispício repro-
duzido. Esta segunda edição tem o título bibliográfico em Sa-
bin sob n.º 90039 e de ambas existe detalhada descrição
em Dommer - "Die aeltesten Drucke aus Marburg in
Hessen", 1892.
* * * Edição em alemão, feita em Francfort sobre o Meno,
em 1557, " durch Weigand Han", não tendo porém data nos
exemplares. Esta edição e a seguinte é que J. C. Rodrigues e
outros deduziram erradamente que devia ser de 1556. Sua des-
crição vem em Sabin, sob n.º 90037.
*** Edição em alemão, feita em 1557, em Francfort sobre
o Me;io, tambem p~r Weigand Han. A sua enunciação consta
do n. 90038 de Sabm. O exemplar que figura sob o n.º 864 do
Catálogo _d~ Exposição de Historia do Brasil, dito ali ser a se-
gu~~a ed1çao d? obra de Hans Staden, é no entanto uma destas
e~1ç~s ~e We1gand Han, como se constata da respetiva dis-
crun1n.a~ao. Os .exemplares de quaisquer destas quatro primei-
~as. ediçoes .dº. hv~o. de Hans Staden constituem hoje absolutas
1 ar1dades b1bhograf1cas.

• • * Edição em flamengo feita A t , . 8


por Christoffel Pla t. . V ' . em n uerp1a, em 155 ,
n IJn. em descrita em Sabin, sob n. 0 90040
••• Ed' - f ·
vida quant;ç:o e1t~ em Cherburgo, em 1559 e citada em dú-
19271 pág 23 d versaf~, por Wegner. Cf. edição fac-similar de
' · o pos ac10.

20
Aíç ;\o ''l'n f lnm PUJ:O, ele rnm1, fo i ln e m Antu{ t' p ln, por
lant ·. finu randn e m sn bln, Hob 11 .11 00041.
, d iç:\o ' tn nlcm iãn, d e .Frm1cforl Hob ro . o M ino,, p or:
hl ' t\ tn 1567, n u co l 'ÇHO d' lí'rnnck -F,eyrube:Hl , e~;
J . . Rodrigues, n .º 1027 da " B ibliol cu B ru Hil1onHe . ·
• Ediç,fo cnt lntim , nH col çiio d Teodoro de Br~, publ , ..
c~.da cn1 Francfort sobre o Meno, em 1502. A t r uc.lu çao ó de
dan1 Lonice r .
• Edição em a le1nã o de T e odor o de Bry, feita e.m Franc-
fort sobr e o Meno, em 1593. As edições da coleção de viagens
desse p u b licist a que se seguiran1, ta nto em alemão como e~ ~a­
tim semp re trouxeram a obra de Hans Staden. Par~ as ed1çoes
em l atim, indicamos Sabin, vol. III, págs. 33-36 e 51-52.
•• • Edição em flamengo, feita em Amsterdam, em 1595,
por Cornelis Claesz, figurando em Sabin, sob n.º 90042.
*** Edição em holandês, de Broer Jansz, feita em Ams ·
t erd am, em 1625, com xilogravw·as no texto, descrita em S~­
bin, sob n .0 90043. ~ste mesmo editor, na mesma cidade, reedi-
tou a obra de Staden em 1627, 1634 e 1638, como se verá de Sa-
bin, n .º 90044, 90046 e 90047.
** * Edição em holandês, feita em Amsterdan, em 1630,
com o titulo "Hans Sta deli van Homborgs Beschrijvinghe van
America". Consta de Sabin, n. 90045. 0

*** Edição em latim, de Ludovicus Gottofridus, feita em


Francfort sobre o Meno, em 1630, citada por Victor Hantzsch,
em "Zeitschrift des Deutschen Wissenschaftlichen Vereins",
Buenos-Aires, VI, 192Q, págs. 188-196.
*** Edição em holandês, feita em Amsterdam, em 1640,
figurando em Sabin, sob n .º 90048.
*** Edição em holandês, feita em Amsterdam, .por Jan Ja-
cobsz Bouman, em 1655, enunciada em Sabin, sob n.º 90049. O
mesmo editor. na mesma cidade: renovou as edições em 1656 e
1660, como se vê de Sabin, n.º 90050 e Martinus Nijhoff, cat.
n. 0 623, parte II.
*** Edição em alemão, de Hans Just Winckelmann, no
seu "Americanisc~en N euen Welt Beschreibung", Oldemburgo,
1664. E' uma parafrase da obra de Staden contendo o seu re-
trato e mais de uma trintena de xilogravuras encontradas em
Cassei e que Winckelmann considera originais. Citado em Sa-
bin, sob n. 0 90039.
*** Edição em holandês, de Michel de Groot, feita em
Amsterdam, em 1679, título bibliográfico em Sabin, n.º 90051.

21
•u .li;dJ~·flo •m holnndôtJ, ! oHu om Utrocht, cm 1683, f.igu.
1

i •m SnbJu sob n.º OOOG:l.


rH ttc....... ~ J'r\i '."•' c> 'c 111 holnndôs, lc .Jurlnon van PoohJurn, foitn orn
.. ...
Ut.rcch t, c m .t • ,
·oar., enunciudu
_,(l Çi
··
·m s trt 'tJJll,
. 1-1o b n. o 900h
. .
,),3 ·
• •... Ediçiio em holnndõs, .fel ta cm Amsterdnm, por Gija..
·t d . . Groot cm 1()86 cituclu em Subin, n." 90054. O mesrno
b e1
editor, ena mesma ' .
cidade,' renovou a cc]'•"' 1çuo e-1 m 1701 . 'rít u 1o b'i-
bliogrtifico em Sabin, sob n.º 90055. .
'* * • Edição em holandês, feita em Leyden, em 1706, na co-
leção de viagens de Pieter van der Aa, ei:n 8.º pequeno e .no vo-
lume 15 da coleção, mencionada em Sabm, sob n.º 90056.
* * * Edição em holandês, de Picter van der Aa, na cole-
ção denominada "Naaukeurig7 Versamelin~", no seu volume 1.0 ,
in-folio, Leyden, 1706 (?). Citada em Sabm, n.,0 90057.
* * :ic Edição em holandês, na coleção de Pieter van der
Aa, impressa em Amsterdam, em 1706-1707, segundo o ,catãlogo
n.º 25 da Livraria Kosmos, de Erich Eichner, Rio ~e Janeiro,
1939 (?). Menciona o catálogo 127 volumes da coleçao e coloc~
as duas viagens de Hans Staden no volume 20. Wegner cita
uma edição de Pieter van der Aa de Leyden e outra de Ams-
terdam, ambas de 1706.
*** Edição em holandês, de Amsterdam, em 1714, citada
por Lõfgren, que menciona como fonte bibliográfica a "Biblio-
théque Universelle de Voyages", Paris, 1806, tomo V, pág. 503.
Em Sabin verifica-se que essa edição tem no colofão a data de
1736. Cf. n.º 90058.
* ** Edição em holandês, de Pieter van der Aa, que reno-
vou quatro partes da sua coleção, em 1727, citada em Sabin n.º
90057 e tambem por Lõfgren. '
**~ Edi~~o em francês,. na coleçã~ d~ Ternaux-Compans,
den~m1,na,d~ y
oyages, r;Iabons et memo1res originaux pour
s~rvir a 1 h1st01re de la d~couv;rte de l'Amérique'~, Paris, 1837.
E o volume III da coleçao. Titulo bibliográfico em Sabin no
9~059. Interess~nte. que os bibliógrafos , depois da edição h~la~­
desa de 1736 na~ c1~am outra, a não ser esta francêsa de 1837.
Hans Staden teria ficado um século esquecido?
*** Edicão .. em alem-ao, d e acor d o com a primeira edição
de Francfort sobre o Meno feita por Karl Kl" f 1 "Bº
bl8h5'o9the~ des Litterarische~ Vereins", volu~~ e47naS~~~tga~-
' pags. 87-197. ' '
*** Ediçã 1· I ..
F. Burton, pub~c:1:la ~! 1es,;~tlbert 0 otal, notas de Richard 1:
tulo bibliográfico ,em S ªb. ª ubyt Society, Londres, 1874. Tí-
. ª in, so n.º 90060.
22
• .. , t:tu ~ r ht~u s, ô 'l'1·isl, ' dü A hm otu: Arndpo,
' •t in ~ n~ l ·i( I'n stitut" Histl)r ico n oo~rMi o DraaL..
1 " " R i ' cte ,J nt?il \ JSH~ , pngs. ~m7-~60. brn qnc dl
· l ai- · eito, ~omente e ntfio foi lrarlmddn pnrn n
. ..-sim 1nesn\ . dn , ,e,rsfio frnn' sn de Tornnux ..
tu'· nt d notas. O dr. Al nonr Arnripc'
r~ginnHssi.t1ul e n R vista Tdmensnl só é
nal a ob1~a de Hnus Stnden cont'lnunr
grande público.
Rd' ~ã . em português~ de Alberto Lõfgren, notns de
~:im"O Sampaio,,. São Paulo, 1900. Esta edição veiu fina lm.e n-
te vut.~ "'"" ~zar. ent,re nós) o livro de Staden. A iniciativa foi
~ fdo.
· S'.ti Histórico e Geográfico de São Paulo. A traduçao _ 01
feita a.iretament e dum e..~eu1plar da segunda edição de Mar-
~ ~ ·c omo j á referimos. Reproduziu todas as xilogravuras
.....essa eaiçã - que eram as mesn1as da primeira, exceção duma
vin!ie•a.. O dr. Teodoro San1paio, que anotou a versão, perma-
n ece a ...e hoj e como único intérprete dos termos e frases tupis,
escritas por Hans Staden.
• Edição em alemão, por Roberto Lehn1ann-Nitsche, em
B u enos-Aires. 1920 inserta na "Zeitschrift des Deutschen
isseP..schafilichen Vereins", volume VI, págs. 167-295. Em
1921 foi irada uma separata em Buenos-Aires, in-4. 0 pequeno.
edicão
.... de acordo com a de Francfort sobre o Meno de 1567 .
*** Edição em português, texto livre, apenas da primeira
pari.e. por M onteiro Lobato, São Paulo, 1925. Reproduz algu-
mas xilogravuras. Esta edição foi renôvada em 1926 e 1927.
Pelo mesmo escritor foi tambem organizada para a infância uma
adaptação da obra de Staden, com desenhos apropriados, da
qual até o presente foram tiradas cinco edições.
*** Edição em alemão, fac-similar da prínceps de Mar-
burgo, com um posfácio e notas do dr. Richard N. Wegner, feita
em Francfort sobre o I\[eno, em 1925 . .Na mesma cidade houve
uma segunda edição melhorada, em 1927.
*** Edição em inglês, de Malcolm Letts, na série "Broad-
way Travellers'', Londres, 1928.
*** Edição ,e m alemão, por R. Lehmann-Nitsche sob tí-
tulo ''Hans Staden, Ein deutscher Landsknecht in d~r neuen
Welt", Leipzig, 1929. •
*** EcUção ·e m inglês, da tradução de Malcolm Letts feita
, . ''Ar
na sene ·... gonaut", em New York, 1929. '

23
. - em portu auês, da tradução de Alberto Lõf
*** E d içao doro Sampaio,
b ,
na serie . "P u bl'icaçoes
- da Aca..
d Teo
· n , notas . e . ·a" Rio de Janeiro,· 1930 . E st a e d'içao- corrigi·u..
gie
Bras11en '
d;n: 1·a falhas · l' d
da edição de 1900 e publicou a em a reprodução
varias.
das xi1ogravur"as, 0 retrato de Hans Staden e o· , fac-simile b da
. _ , ceps Conservou no entanto, como Ja o servamos
ed1çao prin - ·
de Lofgren que diz " e agora a d a' a' 1uz pe1a segunda'
a tra d uçao
.1. ntemente aumentada e melh ora d a " , t rech o que so..
d
vez, I igeencontra na segunda e d.1çao - d e M arb urgo, f er'ta no
men e t Se
"aniversário de Maria", de 1557. Cf · "C , aªt'logo d ª B'bl'
I
'
10teca
de Eduardo Prado'', · Sã.o Paulo,. 1916, pag. 107, n.º 2278.
· * * * Edição em alemão, de .Gertrud Tudsen, feita em Bue..
nos-Aires> 1934.
** * Edicão em alemão, por Kar1 Fouquet, São Paulo, 1941,
n. I da série .. das "Publicações da Sociedade Hans Staden", ·de
0

São Paulo. E' transposição da edição prínceps para o alemão


moderno.
Finalmente vem á luz agora· esta edição que tambem per-
tence a série da "Sociedade Hans Staden". Fazia-se mistér tra-
duzir para o vernáculo o excelente trabalho do dr. Kar1 Fou-
quet para que tivesse entre nós a .merecida divulgação. A repro-
dução das xilogravuras e outras estampas, obedeceu. ao crité-
rio da Sociedade e apenas nessa materia, como contribuição
propria, oferecemos a reprodução do mapa de Hans Staden em
desenho feito pelo sr. Mario Paladino e para onde trasladamos
em português as legendas legiveis que se encontram na carta
do notável hessiano que foi o primeiro condestável do forte de
São Felipe na ilha de Santo Amaro.
A tradução feita por Guiomar de Carvalho Franco cingiu-
se literalmente ao texto da transposição do dr. Karl Fouquet e
obedeceu á grafia do mesmo para os termos e as frases em lÍn-
gua tupí; tambem procurou conservar a linguagem ingênua de
Staden. Todas as notas de pé de página são da nossa autoria.
E .d~sse modo ~creditamos apresentar ao público um traoalho
o:iginal en: mais de um sentido, vindo tambem êle com oportu-
rudade, pois os e~emplares da última edição completa em lin·
A

gua portu~1;1esa da obra de Hans Staden, aparecidos há mais de


dez anos, Ja se tornaram raridade no nosso mercado de livros.

São Paulo, Outubro de 1941.

Francisco de Assis Carvalho Franco.

24
Livro Primeiro

AS VIAGENS
Dedicatória:

Ao sereníssimo e ilustríssimo Príncipe e Senhor Felipe,


Landgrave de Héssia, Conde de Katzenelnbogen, Diez, Ziegen-
hain e Nidda, (ilO) etc., meu clemente Príncipe e Senhor! Gra-
ça e paz em Jesus Cristo, nosso Salvador!
Príncipe clemente e Senhor!
O santo e real profeta David diz no salmo cento e sete:
"Aqueles que singraram os mares, levando mercadoria aos
grandes oceanos; aqueles que a obra do Senhor conheceram e,
no mar, o seu poder testemunharam, quando falou e levantou
uma tempestade, elevando-os aos céus nas vagas e descendo-os
aos abismos, de almas angustiadas, e esmorecidos, cambalean-
tes, incertos como ébrios, desesperançados de qualquer alento;
aqueles que clamaram de sua miséria ao Senhor e êle os tirou
de sua angústia, acalmando o furacão, e fazendo espraiar-se as
ondas suavemente, e voltar-lhes a alegria porque as ondas
assim se acalmaram, trazendo-os à terra procurada - devem
agradecer ao Senhor pela bondade e poder com que agraciou
aos seus filhos, e louvá-lo com os seus irmãos e exaltá-lo com
os seus patriarcas".
Agradeço, pois, ao Creador onipotente dos céus, da terra
e dos mares, a seu Filho Jesus Cristo e ao Espirito-Santo, pela
grande graça e misericórdia que, pela Santíssima Trindade, me

86) - E1elipe I, .o Magnnnlmo, landgrave de Hesse, nasceu em 1 504


1

e faleceu em l5fl7. Foi o fundador cln Universi<la<le de Marburgo.

25
{ . cone ~didns . maritvilhosn ~ inesperadamente, quand
0 ~~ ~~~ Brasi 1, cz;i{ em poder dos .selvagens, os tupinambás, (87 )
ficimdo JlO\ , m~scs ~eu prisioneiro, e tendo, escapado a lllUit
ufros infortuuios. JCstou grnto porqu~ apos longa m~séria,
"'uprcinos p rigos, voltei, de.pois de ~u1tos a_nos, ao principado
º!
ie Vos ·a s t\rena Alteza, .n11nha inu!to queri~a te~-ra natal. A.
vos a Serena Al~eza que1 o eu, .humilde, relatar minha viagern-
que descrevi ligeiramente. Queira Vossa ~erena Alteza, ~or be:
uevolência> quando se apresente oportunidade, ouvir a leitur
de como eu, com a ajuda de Deus, transpús a terra e os rnare:
1.:: como o Todo-Poderoso me conduziu através de estranhos aci:

ientes e provações. A-fim, porém, de que não duvide Vossa


~rena Alteza da verdade de minhas palavras, junto a esta
n arração o meu passaporte. A Deus sàmente toda a honra! Re..
'"'omendo-me com a humildade máxima a Vossa Serena Alteza.

Wolfhagen, ( 38 ) 20 de junho de 1556


De Vossa Serena Alteza súdito de nascimento
Hans Staden de Ho:rrberg. ( 39 ) , em Héssia,
presentemente cidadão ·de Wolfhagen.
t \'

-----

37
) - Para Teodoro Sampaio "tu · bâ"
do progenitor''. Cf. a edição de Hans ~:a~m quer di~r a "geração
.t?ara Batista ·Caetano quer dizer "a gent ~n, do Rio, 1930, plig. 16.
' t.'ratados da Terra e 'da Gente do Brasil eda Fnente aos · pais principais". ·
~lâg. 27-3. ' e ernão Oardim, Rio, 19·25.
38
. ) - Cidade da província d H
·:le Cassei. e esse-Nassau, na Prússia, a oeste
- 39) - Cidade da provfncia de H . .
gem direita do Efze. Segundo R esse-Nassau, na Prússia, na niar-
nasceu cerca de 1520 Lei . · · Lehmann-Nitsche, Hans Staden .af
cabucero alemân de l~ .exi!a~~i~ e~celente trabalho "Hans Staden, ar-
15º53),,. - Boletim del Instituto ~ tnabria al Rio de la Plata 0.550·
n. 81 - Buenos-Aireº e e nvestlgaciones Historlcas - Ano V
P, nero-mal'zo de 1'927. ,

16
Hans Staden
Prefácio do Professor Dr. Johann Eichmann,
chamado Dryander, em Marburgo.

Ao ilustríssimo Senhor Felipe, Conde de Nassau e Saar-


bruecken, etc., seu clemente Senhor, deseja o dr. Dryander (4 <>)
todo o bem, oferecendo-lhe seus serviços.
Hans Staden, autor do presente livro que agora aparece
impresso, pediu-me que revisse seu trabalho e que fizesse as
necessárias· correções. Por muitas razões acolhí seu pedido.
Primeiro porque conhecí seu pai, que nasceu e foi educado na
mesma cidade que eu, em Wetter, (41 ) há cerca de cinquenta
anos, tendo dado sempre provas em sua cidade natal e em Hom-
berg, em Héssia, onde ainda mora, de ser um cidadão reto, pio
e valoroso, e que dispõe de boa cultura. Se a maçã, como se
diz no conhecido provérbio, sabe ao tronco, pode-se esperar que
o filho dêste honrado homem se assemelhe ao pai em seu valor
e piedade.
Em segundo lugar empreendo o trabalho de rever ~ste li-
vrinho, com tanto mais alegria e carinho, porque gosto
de ocupar-me com assuntos que se avizinham da matemá-
tica, tal como a cosmografia, isto é, a descrição .e medição
das terras, cidades e roteiros de viagens, dos quais êste livro
trata de muitas maneiras. Por isso o faço com gosto, pois obser-
vo que os acontecimentos são expostos com franqueza e verdade,
e está fora de· dúvida que Hans Staden não descreveu nem ilus-
trou sua viagem. e fatos afravés das narrações d~ outrem. De
muito deve ter valido para tanto não haver sido êle levado pela

40) - O dr. João Eichmann ou Dryander, foi um famoso anato-


mista germanico. Estudou medicina em Bruges e em ·Paris e cerca de
1533, praticava-a em . . Maiença. :E m 1 5315 fixou-se em Marburgo, onde
1

foi reitor da respetiva Universidade e at lecionou como professor jl.té o


seu falecimento a 20 de dezembro de 1660. 'l'ambem se dedicava ao es-
tudo da astronomia, como êle mesmo aqui menciona.
41) - Cidade da provtncia de Hesse-Nassau, na Pr\1ssia, a noro-
este de M.arburgo, sendo que esta \11tima era a capital da Landgrafsohaft
Hessen e a sua Universidade foi uma das primeiras da Alemanha, fun-
dada em 1527.

29
ambição de fama, mas sim apenas para servir, com esta publi-
cação, à gloria e honra de Deus e teste~unhar-pie seu re~onhe­
cimento pelo benefício recebido da sua ~bertaçao. Seu prmcipaJ.
desejo é dar a conhecer esta historia, a-fim-de que todos possaxn
saber, quão generosamente, e éomo contra toda ª. esperança, 0
Senhor Deus permitiu que Hans Staden voltass~ a sua querida
pátria, em Héssia, e como o livrou de tantos pengos quando lhe
invocava o nome com confiança. Durante nove meses passou
êle, entre os selvagens inimigos, esperando dia por dia, hora
por hora, a decisão para que fosse impiedosamente morto e
devorado.
Por esta indizível misericórdia divina e pelos benefícios re-
cebidos, quis êle assim, na medida de suas fracas forças, ao Se-.
nhor mostrar-se agradecido e louvá-lo perante todo o mundo.
No desempenho de sua dificil tarefa sentiu êle, à-vista do desen-
rolar dos fatos, a necessidade de relatar sua viagem, que o fez
passar nove anos (42 ) fora do seu país, e todos os acontecimen-
tos ci,ue a ela se prenderam. E quando assim expõe, em palavras
des~1das de ornato e pompa, e sem tirar conclusões, convence
o leit?; de sua sinceridade e veracidade. De que lhe teria servi-
do abas, em lugar da verdade, ter feito um.a narrativa de im-
posturas! ·
Além d~ mais .é êle, como seu pai, domiciliado nêste país
~m n~nca te-lo deixado como aventureiro, charlatão ou cigano'
v:i~=~ia, podrtanto, recear que outros viajantes que 'porve·ntur~
sem o novo mundo o desmentissem.
. l!ma prova bem convincente porém d .. . . . -
f1ded1gna, acho-a no fato de que e·1 e .c1·t a. o elugar
que sua
e a narraçao
·- é
que se encontrou, na terra dos selva . . . .. . ocas1ao em
do sábio e famoso Eobanus Hessus 1.~n~,, com Heli~?ro, o filho
tempo se retirou para o estrangeiro. e iodoro . _que lª há muito
mo~to, dever~a t_er presenciado c~::ioque era t1do por nós como
lastrmavel, fo1 feito prisioneiro e lev . d Hans Staden, de modo

tempo, como é de esperar-se e s:


pode, entretanto, voltar à patr· . da o embora. Este Heliodoro
e.nt:o. de maior ou menor
b .~ historia de Hans Stade f
. ~lOora
falsa e mentirosa, (4s) poaer'·
um homem sem honra • - a co ri-lo de vergonha ;e rºd
ç UZl-

42) - A edição d 19
e o fac-srmne d edl~ao
. - e prince ~' .
30, da .Acad elUJa
4B)
- Joãoª de Le ps de Ma.rburgBrasllelra
tr '
diz·
"' do1.8
. an.oe"
por intermédio d dr ry sõment.e eonhe o az claramente "lX"
°
um exemplar da edi .:. FelU: p1.....
u:lteros nace11gn>t,..
a obra d · e st.aden
. ·
em 1.r.86
a eondiçã ·. ~ emprestou
que Lery sõ mente fez
çaodepois
de Marb. urgo,,
. ' eo.m uú!sa, o qual Ih . " ,
que o senhor de "'' '°
de devolvê-lo, 0
.aiayenne, Te-d· . .,. · .oro TuY·
30
Com estas sólidas provas e conclusões, quero dar poren7-
rada a questão sobre a veracidade da narrativa de Hans Sta en
· ·
e dar as razões por que esta, e outras bist onas semelhantes
· ' en-
centram tão pouco aplauso e consideração.
Em primeiro lugar, os aventureiros com suas men~. dis-
paratadas, suas falsidades e narrações fantasiosas contriburram
para que se dê pouca consideração às pessoas honestas e aman-
tes da verdade, que vêm de terras estranhas, e tambem vulg~­
mente se diga: Quem quiser mentir, discurse _sob:e cousas di~
tantes, pois ninguem lá vai verificá-las. É mais comodo acredi
tar do que certificar-se.
Nada se ganha em não aceitar a verdade por causa ?as
mentiras, e deve-se considerar que há cousas que parecem 1:111-
possíveis a um homem simples, ao passo que para o, ei:idito,
quando lhe são expostas, são fatos seguros e incontestaveis, co-
mo realmente o são.
Alguns exemplos tirados da astronomia podem elucidar
o fato. Nós, habitantes da Alemanha e das regiões vizinhas, sa-
bemos, por uma longa tradição e experiência, quanto tempo
dura o inverno, o verão e as outras duas estações, o outono e
a primavera. Do mesmo modo, a duração dos dias e noites mais
longas, ou mais curtas, no verão e no inverno.
Quando, pois, alguem afirmar que no mundo existem lu-
gares onde o sol não desaparece durante meio ano e que o dia
mais longo dura seis meses ou meio ano, e a noite mais comprida
igualmente; ou que se encontram regiões nas quáis as quatro
estações aparecem duas vezes ao ano, havendo dêsse modo dois
e
verões dois invernos; ou que o sól e outras estrelas, por dimi-
nutas que sejam, e mesmo a menor delas no céu, são todavia
maiores que a terra toda; e muitas coisas incontáveis desta sor-
te - tambem não dará o homem simples, a táis afirmativas,

quet, que conhecia bem o nlemilo, lh'o traduziu em. grande parte. Uít..
então o missionário frances: - "O que li com o maior prazer, pelo fato
de João Staden, que esteve cerca de oito nnos nêsse pata, em duas ,ia·
gens que fez, tendo ficndo detido mais de seis méses pelos tupinambés
que o quiseram devorar muitas vezes, exatamente aqueles qne eu co-
nheci depois, nome por nome, nos arredores tlo Rio t.le Janeiro, que eram
nossos aliados e inimigos dos portugnêses, com os quais estava João
Staden quando foi aprisionado; como dfaia, obsen-ei que êle fala"'ª in-
teiramente a verdade; muito satisfeUo tambem fiquei porque tendo dado
4 luz n minha histõria mais de oito anos antes que tivesse ouvido falar
de João Staden e menos aind.a que tivesse najado pela: .A.merica, notei
que concordAvamos tanto na descrição dos. selvagens brasileiros como
noutras cousas vistas, quer na terra queT no mar, que se diria que ba-

31
n ' nhum cr J•d ito ' te rá tud o por hn posHívcl. Ent:etanto estas
'J..:-"' s s·to tão clnrnmcut ' provud os pelos ~str?no~os que,
O ' "~"' '" ' · · í .. . .., duvidara 0 d l
~\q u ' l ' :5 que te nhum cultura cwnt f 1cn, n a o e as.
Não s deve ·pois concluir, p elu circunstância de que a
. . . - . d sta sorte
,,.r ~ n dc massa ten1 por fa lsas as nan açoes e . , que e1as
11'1' " . rdade não possan1 ser exatas. Como nã~ estaria mal a ciên..
ci ·1 ~stro nomica se ela não pudesse fazer calculos certos sobre
todos êstes corpos celestes e nã~ pudesse prever com seguranç~
o dia e a hora dos eclipses, isto e, das trevas do sol e da lua. Ha
séculos que as trevas são calculadas antecipadamente, e os cal...
culos têm sido comprovados. Ora, diz o povo, quem esteve no
céu, para tudo ver e medir? A resposta só pode ser: a .experi...
ência quotidiana confirma as conclusões, e d_eve:r:ios ter 1st? .Por
tão exato, como certo é que três mais dois sao p~co. As solidas
bases e conclusões da ciência nos permitem medir e calcular a
distancia até à lua e mais além, até aos planetas todos, e ·final-
mente até às estrelas fixas, e qual é o volume do sol, da lua e
de outros corpos celestes. Com ajuda da ciência celeste, a as-
tronomia, e da geometria, calcula-se mesmo a circunferência,
redondeza, grandeza e extensão da terra. Todas estas cousas o
homem simples não conhece, assim cómo bem · pouco nelas
acredita. Deve-se perdoar-lhe a ignorância, pois que êle não
aprendeu mesmo muito das ciências naturáis. Que, porém, gen-
te prezada e muito instruida duvide ainda de táis fatos, cuja
veracidade está provada, é tão . vergonhoso quão lamentável
pois que o homem simples, guiando-se por êles, acha confirma~
ção. ao se1! erro. e diz: Se isso fosse. verdade, êste ou aquele es-
tudioso nao teria contestado. E assrm por diante. .,
. <? mesm~ se pode dizer de Santo Agostinho e Lactâncio
Frrm1ano, dois. santos, muit~,.. in.struidos, e aliás homens com
grande c?~hecimento das ~1e~c1as. , Éles duvidam e não que-
rem admitir que possam existir antipodas, homens que, em um
ponto ?posto da terra, de certo modo, sob nós, caminhem. com
seus pes contra os noss?s e estejam tambem dependurados de
cabeça e corpo para baixo no espaço, sem ·c ontudo se precipi-

vfamos conversado antes de escrever n .


livro de João Staden que hâ pouco fo' . ossas nnrrativas. Assim, êsse
bem que o seja em francês, oferecend~ ~mpresso em la.tim, e requer tam-
Jâ tenho traduzido e ornar com cous u d~r, se o quiserem fazer, o que
lido por todos que deseja~ saber as nota veis, merece igualmente ser
~º?ºª de ser puramente selva~ens ~~mob sã~ 1!ª ;,erdade os costumes e
H1stolre d'un voyage faict en 1 t s ras1le1ros . - Jean de Léry -
tion et des notes par I'aul Ga'f~ar:~,~e du Bré.sil - Avec une introduc-
191-192. - · Paris, 1880 _ Vol. I, págs.

32
tarem. Embora isso pareça estranha, 0s sábios estão cmlvenci•
dos de que não pode ser de outro modo e que está provado ~
mo exato, por majs zelosamente que os citados santos, erudi~
tos autores, o combatam. Os homens que habitam os pontos
extremos de um diâmetro terrestre têm que ser antípodas, isso
é uma tese irrefutável. Tudo quanto se eleva no espaço fica
ereto, em qualquer ponto que esteja da terra. Para achar
antípodas, entretanto, não é preciso viajar para baixo, no ~o­
vo mundo; antípodas os há tambem no hemisfério supenor.
Quando da região mais longínqua do oeste, a saber, o cabo
Finisterra, na Espanha, se considera oposto o leste, ou a ín-
dia, são os habitantes -de ambas estas regiões distantes, de ~
certo modo, antípodas. Daqui·· querem alguns pios teólogos m-
ferir que a graça pedida pela mãe dos filhos de Zebedeu ao
Cristo Senhor, para que pudesse um de seus filhos sen~-se
à sua direita e o outro à sua esquerda, teria sido concedi~
Isto teria acontecido estando o Santo Jacó, como se acredita
firmemente, sepultado em Compostella, não longe do Cabo Fi-
nisterra, habitualmente chamado Cabo da Estrela Escura, e o
outro apóstolo, João, descansando na índia, a terra do sol nas-
cente. Portanto existiam antípodas já há muito tempo, :inde-
pendentemente de que no tempo de Agostinho, o Novo Mun-
do, América, no · hemisfério inferior, não estivesse ainda des-
- coberto.
Alguns teólogos, especialmente Nicolau Lyra, {44') que tem
Iama aliás de .ser um homem excelente, são de opinião que-
º globo terráqueo, o mundo, flutua mergulhado nágua pela me-
tade. A parte habitada por nós emerge -da -água, a outra fica
por baixo e tão completamente· embebida nos mares, que nin-
guem nela pode habitar. Tudo isto está em contradição com
a ciência, com a cosmografia, e ultimamente ~ espanhóis. e
portugueses descobriram, nas suas numerosas viagens maríti-
mas que, bem ao contrário, toda a · terra é habitada, mesmo
nas zonas quentes, no que os nossos antepassadas e as aut0res
primevos não queriam convir. Nossas especiarias de todos os
dias, açúcar, pérolas e · outras mercadorias semelhantes, vêm-
nos dessas regiões. ·

, .
antipodas e as med1çoes -
Estas asserções; aparentemente contraditórias sobre os
.
dos ' intencio-
corpos .celestes, expús eu
nadamente, a-fim-de justificar minhas já referidas conclusões.
44 ) -
Franciscano faiecido em Paris a 23 de outubro de 1340.
Expurgou a . bíblia de t~dos os termos imprõprios (Letts).

33.
. 't das muitas outras cousas semelhantes·
Poderiam ainda, ser c1t a der-me demais· para não molest~
não quero poren1 es en
o leitor. ,. . e odem encontrar no livro do di-
Argumentos idenbcos sar PGoldtworm, (4~) o diligente Su..
gno e erudito mestre ªªZteza e Pregador em Weilburgo. o
perintendente de Vos~a esso e relatará, na sua sexta Parte,
livro será em breve imJf~ e aparentes absur,dos dos tempos
muitos milagres, maravi ª~ 'tor que quiser esmiuçar esta
antigos e novos. Ao ~ 0!11 ~:vro' e outros, que tratam do mes:
questão, indico eu aqui este 1 o de Galeoto, (46) sob~e cousas
mo assunto, como P?r ~xemp 0
aparentemente incrive1s. _
Assim estará provado, com suficiência, que nao se deye dar
reci itadamente por mentira · aquilo que ao hom:m simples
p p t h · ·c ompreensível como na narraçao presente,
parece es ran o e in ' 'Ih (47) -
as indicações sobre os habitantes nús das I as, . que _nao co. .
·
n h ec1am nen h u m ani'mal doméstico para sua abmentaçao,
, ·d nem
porcos, vacas ou cavalos, ne~hum objeto ~or nos usa o, como
vestimenta ou cama, ,nem vinho ou cerveJa, ou cousas seme-
lhantes, e com que, a seu modo, deveriam manter-se e acomo-
dar-se.
Para finalizar este p~efácio quero ainda expor, brevemente,
o que levou Hans Staden a mandar imprimir a narrativa de
ambas as suas travessias marítimas e a estadia numa terra es-
tranha. Pode muita , gente interpretá-to mal, como se quisesse
com isto co~seguir f~ma, ou fazer-se um grande nome. ~le
mesmo m'o expô~ muito . düerentemente, e acredito piamente
que êle, de fato, pensa de outro mo~o, o que se pode depreen-
der de algul'Il:as .passagens da sua narração.
Atr.a vessou vicis~itudes de toda a sorte, süportou muitas
dificu~dades,. esteve .1 ta.nt~s ·vezes em tão ~ande perigo de vida,
q?e nao pod1~ esperar h~rar.-se e voltar. a sua terra. Deus, po-
rem, a quem ele , se~~r~ implor?.u c~eio .de confiança, libertou-o
d? poder dos s.eus .1~um1gos. Alem disso, pela sua fé e suas ora-
çoes tocou muitas vezes ao Senhor, ·de modo. que êste se deu a
1 1

ealen~irl-;e~:~T:!~~ l~t;rano. E' conhecido como com,p llador de um


parece niio eh o. . eu prometido livro de milagres e maravilhas
46 egou a .s er impresso (Letts). ·
1440 )F-1 Marlo Oaleoto, ~strônomo, . professor em Bolonha cerca de
·47) a eceu em' 1~·9 ·4 • (.L etts)
' •

Ilha de San~ · ~~~si~ ~10 descoberto como uma ilha, tendo o nome de
crença. z. tempo de Hans Staden ainda perdurava essa

34
· · nht.: .r a infi ~i~. n fun ... i ' qlll' vl~~u m """' u llt tn jlrnti0 '
,-emadeiro 1 "'·n~w.\ ~li \Õ~\ \' lin ~\U\ c.1l''=l\'bt•\ m\ln .• 1nl! t1t
t.' H
1

benl qu O , lt l1f\O d~Y \ t"'\\1 ~\U\ .1" (', lmpm• t\ \lum ti\ \l
pedido. co1u tem. nwdirla: mns ~t l '\lS \wrmlUu. l""' lO• lc
de Hans stad i. qn e..:~ pngi\os: R't nHos cm\ h o ., ~.ltH\\ HOUN m lln
gres, nada po...~ a iss " :m t Rhn\
É porêin b n\ sabid qnt.' ntli':.'0 ~, \'\'\l~ r'l't.n, \n t't \'t.\m lo '
doença levrun em gernl os hmnons n Dt ns, e tl\Orlo q u ~ o h\ '°'"
cam ·en1 sua ru1gústJ.a. l\!Iuitos mrUgntn nt :rnsh'n nRh·nm, <:~ Ol\­
forme ao rito católico~ dirigindo-s n nlt~urn Smüo, pt.·01n ·,·t:t'\\...
do-lhe uma ron1aria ou uma of ·-r ndn, $ ôl" os nu .. "lli.o~~ ' ll\
sua dificuldade. Tais pr01nessas silo 1nnntidos ft ln nt: ' t'.!'C to
por aqueles que queren1 impingir a s Hntos tunu t. ·n1m-
ça. Assim relata Erasn10 de Hot rdmn, nos nn "l'!\ÇÕ ~ d tl Ull\
naufrágio, como um hon1e1n no nrnr pron1 -t ~u a f\o ristovnm
- do qual em uma igreja de Paris exist un1 quncko d' e rco
de dez côvados de altoi que parece u111 nonn polif 1110 -
um círio tão grande con10 o quadro do San.to se ~l o njuduss
nêsse perigo. O vizinho dêste homen1, que estavu pr s nte e
lhe conhecia a pobreza exprobou-lhe tal pron1 ssn, dizendo-Ih
que nunca poderia êle conseguir a cera necessária pnra essa
vela, mesmo que vendesse tudo o que possuia sobre ll terra. Ao
que respondeu o homem , segredando-lhe baixinho a-fim-de
que o Santo não ouvisse: Se êle acudir-1ne nesta aflição, dar-
-lhe-ei no máximo uma vela de sebo, que custará um vinte1n.
Outra história de um cavaleiro, em um naufrágio, é be1n
parecida. Como visse o cavaleiro que o navio ia afundar, in-
vocou São Nicolau; êle lhe ofereceria seu cavalo ou seu pagem,
se o Santo o socorresse em sua desgraça. Isto ouviu o servo e
disse-lhe que tal não deveria fazer; pois como depois cavalga-
ria? O fidalgo porém respondeu-lhe furtivamente, para que o
Santo não o pudesse ouvir: Fica calado! quando me houver
ajudado, eu nem lhe darei o rabicho do cavalo!
Assim quiseram ambos iludir aos seus Santos, esquecendo-se
depressa dos ~enefícios _rec~bidos. Hans Staden se propôs porém,
com a narrativa e pubhcaçao de sua aventura, louvar e agrade-
cer a Deus e, com espírito cristão, dar a conhecer ao mundo
todo sua comprovada misericórdia e graça, não querendo pas-
sar por um homen que houvesse esquecido os benefícios divi-
nos. Se esta não fosse a sua intenção, que se deve reconhecer
como justa e honrada, poderia êle ter-se poupado fadigas e tra-
b~lho, tempo... e d:spesas exigidas pelas xilogravuras e impres-
sao, o que nao foi pouco.

35
E porque o autor oíerece e dedica humild~te a Pre
história.ªº sereníssimo e ilustríssimo S~nhor .Felipe, .L&l')d;llt~
de Héssia, Conde de Katzenelnbogen, D1ez, Z1*:genham e :N'i:\>~
seu pi·üicipe e gracioso Senhor, e a fez publica~ em notne da,
Sua Alteza; porque ele, Hans Staden, de há muito, pelo :rn d~
cionado Principe, nosso gracioso Senhor, tem sido posto á e11..
va, em ininha própria presença e na de ?1uitos outros, se~o..
amplamente interrogado sobre . cada referencia de sua via do
e cativeiro, conforn1e tenho reiteradas vezes lembrado, co~ent
máxin1a submissão, a Vossa Alteza e a outros senhores· e p a
' or..
que reconheço em Vossa A l teza, de l onga data, um grande ain·
go da a~tronomia e. . da cos~o?rafia, - dediquei a Vossa Alt~:
za, humildemente, este prefacio. Peço a Vossa Alteza aceitá-!
relevando que não possa todavia dar cousa melhor a imprirn~'
se, em nome de V assa Alteza. ..

Recomendo-me com humildade à Vossa Alteza.


Marburgo, dia de São Tomás, ( 48 ) de 1556.

48) .
- 0 orresponde a 21
de dezembro.
CONTEÜD'O

1) Sobre duas viae-ens marítimas de Hans Staden, que


levaram oito anos e melo (~) . A primeira de Portugal, a se-
gunda de &panha, para o Novo Mundo, a América.
2) Como aí Hans Staden na terra do gentio tupini-
qlrlm ( 60) , sujeita ao Rei de Portugal, serviu combatend_o
como artilheiro, na luta contra os inimigos do Rei. Tende afi-
151
nal caído prisioneiro dos inimigos pairou nove meses e meio ( )
em perigo de ser por êles morto e devorado.
3) Como Deus milagrosa e maravilhosamente salvou o
prisioneiro, e como Hans Staden retornou à sua querida terra
natal.

Tudo isto foi dado a imprimir


para honrar e agradecer a Deus
pela sua misericórdia e liberalidade.

4.9) - .Compreenda-se, oito anos e meio somam as duas viagens.


Hans devia ter dito que foi desde que saiu do seu lar, pois de viagem
mesmo, foram apenas seis anos e quatro mêses, mais ou menos. Assim,
na primeira vi.agem embarcou em Kampen cerca de 29 de março de
1547 e regressou a Lisbôa a 8 de outubro de 1-548. A segunda fol desde
sua partida de São Locar de Barrameda a 10 de abril de 1550,, até sua
arribada de retorno, em Honfleur, a 20 de fevereiro de 1555.
r>O) - Tupiniquim, segundo Teodoro Sampaio, significa "o tio
afim". Cf. edição de 1900, pág. VI, d.a s notas. Para Batista Caetano, a
expressão deve de fato exprimir par,e ntesco colateral. Cf. Tratados da
terra, cit., pâg. 27 4.
51) - Desde meados de janeiro de 1554 atê 31 de outubro dêsse
mesmo ano, como veremos mais de espaço.

37
o guarda da cidade,
Que seria d
navio em sua rota,
Do poderoso ,
r ambos não velasse.
Se Deus Po

1. - A nau do. capitão 'Penteado, ·na qual se engajou Hans Staden como
artilheiro. ·Na flamula do mastr~ central 'vêem-se as iniciais do dese-
nhista ou gravador - D. H. - q~e até 'o presente não se poude identificar.

38
CAPt'rULO l .

.Eu, Hans Staden de Homberg, em Héssia, me propús, se


Deus o permitisse, conhecer a índia e nêsse intúito ~iajei ~e
Bremen para a Holanda. Em Kampen ( 52 ) encontrei navios
que, em Portugal, tencionavam fazer carregamento de sal.
Com êles embarquei e cheguei, após uma viage~ de qu,atro
semanas, a 29 de abril de 1547, na cidade de Setubal. Dai ~e­
guí !?ara Lisbôa, que fica a cinco milhas de distância. Em L:s-
bôa encontrei um albergue cujo dono era um jovem alemao,
que se chamava Leuhr. Fiquei algum tempo com êle, e como
lhe contasse que havia deixado o meu país a-fim-de velejar
para as índias, disse-me que eu tinha chegado muito tarde,
pois os navios do Rei, que se destinavam às índias, já haviam
largado. Pedi-lhe então que me procurasse uma outra oportu-
nidade de viagem, visto que êle já conhecia a língua do país.
Eu lhe ofereceria em troca outro serviço.
Colocou-me como artilheiro em um navio, cujo capitão se
chamava Penteado, e pretendia viajar para o Brasil como mer-
cador, mas possuia tambem permissão p,ara aprisionar os na-
vios que comerciavam com os mouros na Barbaria ( 53 ) • Tam-
bem navios franceses, que negociassem no Brasil, com os sel-
vagens, deveria êle capturar. · Finalmente devia conduzir ao
Brasil, a mandado do Rei, alguns prisioneiros, cuja condenação
havia sido indultada, pois se pretendia domiciliá-los na nova
terra.
O nosso navio estava bem aprestado com tudo que era pre-
ciso para a guerra no mar. Éramos três alemães a bordo: João,
de Bruchhausen (M), Henrique Brant, de Bremen, e eu.

62
) - Porto na província de Over Issel, na Hola'n da, ficando na
margem esquerda do Issel. .
líS) - Nome dado antigamente ais regiões da África septentrional:
Marr~ cos, ArgéUa, Tunísia e 'I'rl polit1\nia.
4 ) - 11late nome é multo comum ~m povoações
1
.
das provtncias de
WestfAUa e HA.nover, na Prt1ssia.

39
2. - "0 pois com os portos citados, como os vi em parte na América,
o quantos gráus ficam situados, também como se denominam os habi-
tantes e como confinam suas terras. Tudo isto fiz constar deste mapa,
conforme melhor me ensinou minha memória, de sorte que saia compre-
endido facilmente por qualquer homem inteligente".

40
CA 1TUL 2.

lní io da ntinha prinleira viagem de Lisboll:-


ent Portugal.

-- -
,_

3. - A caravela que acompanhava a nau ~ do capitão Penteado

De Lisboa singramos juntan1ente com u1n pequeno navio,


que pertencia tambem ao nosso capitão, ·e alcança111os a Ma-

41
. . . Rei de Portugal, , é habitada
de1ra. Esta ilha, pertencente ao ~ duz vinho e açucar. Numa
por portugueses. E' ten·a feraz, p~o tecemos de víveres e se-
cidade, chamada Funchal, nos ª .as Marrocos que é gover-
guimos para a cidade Ighir Ufrani, em xeri'fe 'Ela pertenceu
, · d os m ouros ' umfoi-lhe ·tomada pelo xe-
nada por um prmc1J?e
anteriormente ao Rei ~e Portu~a' 1 ma~vamos encontrar navios
rife. No porto de Ighir Ufrani espe~ com os gentios.
que como já foi mencionado, comerciassem
' , . . d costa encontramos
Quando chegamos as vizinhanças a ~les que havia
muitos pescadores castelhanos e soubemos p~r , vamos surgiu
navios ancorados no porto; quando nos aproxima .'
. · d Nós 0 seguimos e o
dêste um navio inteiramente
.
carrega o.
, scapou em um arco.
b
aprisionamos· a equipagem porem e . d
Avistamos e~tão um bote que jazia abandonado na pr~ia, 0
q ual poderíamos nos utilizar
,
conjl,liltamente com o navw cap-
d os dêle Os mouros
turado· navegamos para la e nos apo eram . · d f d"'
' ,
que apressadamente para a1 cava garam1 e quiseram
. . e en e-
lo, tiveram que retroceder à frente , da nossa artilharia.
Com a nossa presa, que consistia ,de açúcar, amêndoas, tâ-
maras, peles de cabra e goma arábica, um carregamento bom
e intato voltamos à ilha da Madeira. Despachamos os peque-
nos navÍos para Lisboa, no intento de ~elatar ao ~ei o fato _e
consultá-lo sobre o destino a ser dado a presa, pois pertencia
em parte a mercadores de Valência ·e Ca.stela. O Rei respondeu-·
nos que deví~mos deixar a ~res! n~ ilha e_ prosseguir nossa
viagem; nêsse . interim colhe na ele inf ~rmaçoes exatas.
Agimos como ordenara e velejamos de . novo para Ighir
Ufrani, para ver se poder~amos conseguir miais alguma presa.
Não teve sucesso porém ô nosso empreendimento. O vento era
muito desfavoravel na- costa e frustrou nosso plano. Na vés-.
pera de Todos os Sant~s, .à noite, partimos, sob violenta tem-
pestade, da costa marroquina e rumamos para o Brasil.
Quando nos achavamos .em alto mar, a quatrocentas mi-
lhas da costa ·de Marrocos, aproximou-se do navio enorme
quantidade de peixes e apanhamos muitos à linha. Entre ês-
tes se encontravam .grandes atuns, chamados "albacorás" pelos
marujos; peixes "bonitos" menores e às vezes "dourados".
Havia tambem muitos peixes, do .t amanho de arenques, que
tinham asas de ambos os lados, qual morcegos. Quando per-
cebiam atrás de si peixes grandes, dos quais eram muito per-
seguidos, levantavam-se em elevado número e voavam por
sobre a superfície d'água, cerca· de duas braças; alguns, tão
longe que se perdiam de vista. E mergulhavam nagua de novo.

42
~ - nlt:w \ 1P 1WH nn t'\Wn1d.rnmn11 11u 111tvlo P•'l11 1n11nh 1, qut ndo urn
:-o '\l vt'\o d\H'l\l\t.n H nultc (•ní1·nrn . lllin poa•l.11guú11 churri:.nn.. 8c
P<'l .'t\'l \ ondore:i,
Ap\·o · h\HH\\\H H\N, dt IH>lr1, do ll~qu11d014. ·11:t•n 1d muito qucn-
1

•t'. }hlts < ~~ol du nu ~ ln dia t.otuhovn n plllO 11uh1·p nÓ1i <J pt'bJon ...
f"':l\ n '<' H <~ nlnuu·ln lHH' dlnn nfo't•n. A noil. , ú11 vozt n, .reb ·rrtn-

·--
-__.
4. - Mostra lghir Ufrani (Cape de Gell) e a captura do navio mouro.

vam fartes trovoadas, com chuva e vento. Elas se armavam


depressa e depressa desencadeavam;. tínhamos que estar muito
atentos, para que não nos surpreendessem sob as velas. ·
Quando sobreveiu certa vez um vento que, desdobrando-se
em tempestade, durante muitos dias soprou em contrário, re-

43
que nos ffilf.nH~wrn vívcrm-1t M< õlo 1ündi\ ·v rdu,
cea:notse'YY'lpo Ho['u1-r1os on l:fio H DeuH por Vt t t:o~ ínv· o\~~~~s.. ' ~()"
roam ,.lU • - , • - J.l\V~i~. '
Uma noit, sob :foa:t:c v ·~ndnvnl, t.tvc1noH qu' lutnt
rnente. Aparcccrmn -n os ent:fio f~obrc nnvlu lnttil· P l\()~n ..
azucs, como u nuncn havlu vh.;t:<~. l!n.a:-; d<.f:iU[ nr 'clntnd~ /\l1.~s
as V agas batiarn ú JJ.cnt"' do navio. Ü1' 1 ortu ues '$ di~ ~t\\tdo · ~~l!t·ntl\

5. - O navio do capitão Penteado, no qual violava Hans Stadan como


artilhoiro, cercado da albacorós, bonitos e dourados. A osquordo, tunto
á popa do navio, vê-se um cardume de peixes voadores.

que estaH luzes eram prenúncio de bom tempot e expressa..


mente ·m andad'rn por Deus, para con:f ortar-nos na aflição.
Agyndüc.:cran1 pmr iHso ao S 'nhor nun1a oração em comum,
apos ~1ué s umLt·l.un-8c~ UH luzes. Chumam-nas fogo de Sant'Elmo

44
u ,Ct ... .rpus
, Sanctum
• · Ao · 1•omper d o d'ia o tempo me Ih orara, 1e-
\"3ll anao-se •
\ ento fa\~or·a
e: · ve 1. v·imos pois
. que as 1uzes d ev1am
.
.ser t m m1lagrG de Deus.
Velejamos então d.
84 dias d ... · . d . para . iante com bons ventos e divisamos,
. . .- epois e termos visto terra por último a 28 de J. aneiro
ae 1;)'48 wn t · '
.
aI en1 a 1·cancan ou eiro no cabo de Santo Agostinho. Oito milhas
1os 0 rt d
h av1am-- fun->"dado uma po o e Pernambuco, onde os portugueses
-
. . . povoaçao por nome Olinda (5 5) . Entre-
gamos ~s pns10neiros a Duarte Coelho ( 56 ) , o comandante do
l~gar. ?e:embarcamos tambem alguma mercadoria, que lá
ficou; li9:wda.z:ios nossos negocios no porto e tencionávamos
prosseguir a viagem para fazer carregamentos.

55
) - No _original de Staden estâ Marin. Teodoro Sampaio quer
Qne es~a denommação seja porque os indígenas começaram a chamar a
P<n·oaç~o funda_da ~:os brancos pela designa~ão de "mairi'', que quer
dizer _cidade. Cf .. ed1ç.uo de 1930, pág. 32. Southey, Hist. Brasil, cit., I,
SO,_ diz ~ne Mann era o nome da aldeia indígena no local onde se conB-
truiu Olinda, que ainda por algum tempo ficou se chamando dessa
f6rma. .
,
56)
-:
os .. .
pns1oneuos eram degredados de Portugal, que se man-
.
davazi: Entao p~ra o _povoamento do Brasil. Duarte Coelho, pelo que te-
mos lido, constitue amda um problema histórico. Para não citarmos de-
masiada bibliografia, indicaremos aqui apenas Varnhagen, ed. Weisz-
flog, "VOL I, pág. 171, onde vem um resumo da sua vida e a conclusão
de qne era filho de Gon~alo Coelho, capitão..mõr da armada de 1503 ao
Brasil. Desenvolvidamente tratam dêste donatârio de Pernambuco, Car-
los Malheiros Dias, em "A expedição de 1503", na História da Coloni-
zação Portuguesa do Brasil, Porto, 1923, vol. II, págs. 300 e segs.,
Pedro de Azrevedo em "Os primeiros donatários", na mesma obra vol.
ill, págs. 194 e segs. e Braamcamp Freire, Brasões de Sintra, cit., vol.
II, págs. 213 e segs. Possuimos nm "NobiliArio" manuscrito, em dois vo-
lumes, cõpia feita em 1736 por Anes .Amado, do trabalho de d. Antonio
de Lima ·Pereira, escrito no século XVI. Por êsse "Nobiliário", vol. I,
págs. 169 e segs. se vê que os Coelhos provêm de Egas Muniz e que o
primeiro de que se tem noticia em Portugal, chamou-se Estevam Coelho
e foi casado com Maria Mendes, filha de Soeiro Mendes Petlte, tendo
tido o casal os filhos João, Soeiro, Estevam, Maria e Pedro Coelho. Dêste
último, que foi fidalgo honrado em tempo de d. Afonso IV e um dos en-
volvidos, segundo o "No biliário", na morte da rainha d. Inês de Castro,
por "cuja causa. El-Rei lhe alcançou o coração estando vivo" e de sua
mulher d. Aldonza Vasques Pereira, nasceram Gonçalo Pires Coelho e
Egas Coelho. Teve êste ultimo um filho por nome Pedro Coelho, que foi
grande soldado no tempo de d. Afonso V, com quem se passou á África e
morreu pelejando no terceiro assalto que se deu a Tanger. Foi casado com
d. Inês de Ataide e teve por filhos a: Egas Coelho, Gonçalo Ooelho e Ni-
colau Coelho. Egas Coelho, casando-se, teve entre outros filhos a Duarte
Coelho que foi o discutido donatário de Pernambuco. Gonçalo Coelho, que
vinha a ser d~sse modo tio de Duarte Coelho, foi o capitão-mõr da arma-

45
CAPfTULO 3.

Como os selvagens de Pernan:ibuc~ se


rebelaram e quiseram. destruir uma
povoação dos portugueses.

Rebentou então, por culpa dos portugueses, ui;i~ revolta


dos índios, que anteriormente se mostravam pacific~s, e o
chefe da terra pediu-nos, pelo amor de _Deus, q~e foss:mos
à pressa auxiliar o luga~ Igaraçú · (~ 7 ) , distante . cinco m1lh~s
de Olinda, do qual os ind1genas queriam se apoderar. ~s hab1..
tantes da povoação de Olinda, defron~e ~a. qual _nos acha~amos,
não podiam dar aos outros nenhum aJuto;io, pois desconfiavam
que os selvagens queriam tambem ataca-los.
Tomamos 40 homens dentre a guarnição do nosso navio,
para prestar socorro aos colonos de Igaraçú e seguimos .em: um
pequeno barco através dum braço· de mar, que se estendia duas
milhas terra a dentro, e no qual jazia a povoação. O número
dos defensores montava, incluindo-nos, a cerca de noventa
cristãos. Acrescente-se a êste número trinta negros e escravos
brasileiros, a saber, selvagens que pertenciam aos ·colonos. Os
selvícolas que nos sitiavam (58 ) estimavam-se em .oito mil
Nossa única proteção consistia numa estacada de cepos. ·

da de 1503 ao Brasil. Nicolau Coelho ~com nh . ..


Pf
do _do descobrimento da 1ndia e foi 0 , . ou a Vasco ·da Gama quan-
ao rei <l. Manuel I. Isso, 0 ue lem prime,~º a ~~aze~ ª. n_.ova dêsse feito
XVI, a propósito do primei~o dona~:r~u~ :obihário ' inédito, do seculo
o1) - Igarasstí ou Igara ú
léguas da vila de Duarte Coe~h' co~o :qw e. ~rnam buco.
vem ·gra-fado, ficava a cinco
da .luta na qual tomou parte H~ne . n a então 200 habitantes. Depois
mais prolongado e mortlfero F .s iStaden, houve outro assédio, multo
Brasil - Ed. Capistrano de. Abrei Vicent~ do Salvador - Historia do
p4gsiss~0·8l. . reu - Rio de Janeiro, 1887 - Vol. 1,
goeses. - Eram os caetés, inimigos
dos potiguáras, aliados dos portu-'

46
CAP1'1'U LO 4 ..

Como eram as f ortific.a çõe'ff d(}g indfg.e nmi


e o seu modo de co mbater-noH~

O lugar onde estávamos sitiados era rodeado de rei.ata.


~esta haviam disposto os selvagens dua..s f:ortifica.çõe1; corn
aJuda de grossos troncos de árvores. Af. se r ecolhíarn durante
a noite e esperavam pelas nossas sortidas. D e día pe rrn.anecia.1!-1
em valas, que haviam cavado ao redor da povoação, daã quaw
saiam para escaramuças. Quando lhes atir.ávar110-s, estendia.m --se
no chão, para escapar às balas. Assim, sitiararn.-nos de t.al
modo que, donde estávam.os, n ínguem. p odia entrar ou sair.
Aproximaram-se da povoação, lançararn ao ar gran?2 quant~­
dade de flechas, que deviam atingir-nos quando calSser.n, uti-
lizando tambem muitas delas às quais haviam arnarrado m e-
chas de algodão embebido em cêra. Com estas flechas acesas
pretendiam atear fogo ao teto das choças. Ameaçavam tarn-
bem devorar-nos, se nos pudessem capturar.
Restava-nos apenas pouca provisão de boca, e êsse pouco
já se tinha consumido. Lá na terra é muito usado buscar-se
diàriamente, ou cada dois dias, raízes frescas de mandioca para
fazer farinha e bolos. Mas então, não podíamos ir as pl anta-
ções.
Como víssemos que iriam faltar-nos víveres, fomos com
duas barcas à colonia de Itamaracá (59 ), a-fim-de abastecer-
nos. Haviam os índios posto grandes árvores sobre o canai
·estando grande número dêles em ambas as margens, na espe-
rança de tolher-nos a viagem. Em violento esforço, removemos
os entulhos, mas a maré baixou, de sorte que ficamos em seco.

ts9) - Na gravura sob o nu.mero seis, vê- ae q,ue Studen escrevem


.Ipaussd-Itamaracll, que ~reodoro · Sampaio traduz por llha Oraude de
Itamaracá. Era parte da <!apltnnfa de ·Pero J...ope1:1 de Somfü e tlnha .como
sede a vtla da •OônceJoão, meJa Iégm1 acima d.a ·t CY~ do rio Igarass11. Iil'
evidente do texto de 8tud~n que êle ~m refere A vil a men c'Lonada.

47
b rcas. Trouxeram então
. "uzcr~nos naB ªt1·rararn no espaço exis..
m111un .L
, ín lim~ n11 t 1n 11 · trJuchc1ras
• • e os a
- . am mcen di'a-1os e Jogar
·
.t1lllo:1 tJt ·o.~ de rH 1iu11c . os botes. QueA · ri ·f umaça nos obrigaria a
I1 dr
f(\r1lt' C'11t. r e a
11 r nt n ·
que uí rne e: a ·
porém levar a cab o seu
· · . inwn .u gu1ram , Ass·
i\11 chnmn:j p . . ·cus. Não conse . . de novo a mare. un
nbnndon111~ w1 ~~...1 entremeio voltou
plnno, po1N n :-l:JC

6. - Vista de confunto em que se nota 6 esquerda o Cabo da Santo Agostinho


o a vila da Marim (Olinda). No interior, ao centro, lgarassú, dentro de cuja
paliçada so encontram quatro canhões proprios da navios mercantes. Abaixo,
obsorva-na a diligência para procura de vitualhas em Itamaracá, enquanto os
atacantes derrubam arvores para impedir a sua passagem.

pudemos prosseguir até Itamaracá e obter víveres dos seus ha-


bitantes. A nossa volta haviam entulhado o caminho no mes-
mo lug~r. Tinham poste;>, como antes, árvores na corrente dá-
gua e ficaram emboscados às margens. Duas árvores estavam

48
s mi.., or . .·· 1 · uo bn ', no ti 011co 1 e no sutUJ copan amarradas
plant t .·,pudeirn ou clp6. Esta plnntn cresce como
P r rn e: mnis gt o sn. Mantinham oa índios ao pontas
'ln s u 'ntrh1chcirnm nto, e pretendlom, à nossa pas--
m u. · -las de rnodo que as árvores quebrando-se se aba-
ll\ sobr · nossas bnrcas. Avançamos e a( atravessamos, por-
prún ira árvore tombou para o lado do seu esconderijo
. outra nágua, um pouco atrás do nosso naviozinho. Antes
de ron1per caminho através dos entulhos, que restavam desde
nossa ida, gritamos pelos nossos companheiros que se acha-
vam no local sitiado para que viessem em nossa ajuda. Quando
porém principiamos a chamar, gritaram os índios de permeio,
de sorte que os nossos não nos puderam ouvir. Não podiam
êles ver-nos tambem, visto haver uma capoeira que nos sepa-
rav~. Estávamos entretanto tão perto uns dos outros que ~o­
der1am bem ter-nos ouvido, se os índios não houvessem feito
aquele alarido.
Por fim trouxemos víveres à povoação, e como os índios
viram que nada conseguiriam, fizeram a paz e foram-se de
novo. O cerco tinha durado quase um mês. Dos índios, alguns
pereceram; de nós cristãos, porém, nenhum.
Certüicamo-nos assim de que os selvagens haviam aban-
donado a sua causa. Retiramo-nos portanto para o nosso na-
vio grande, que jazia deante de Olinda, tomamos água e fize-
mos carregamento de farinha de mandioca, o quanto nos era
necessário. O comandante da povoação de Olinda nos agra- ·
deceu.

49
eonto_> ºº
p·a r.t•1m. _.., de Pernambuco
. e
lcançamoe,
t .ª

íb te
cn1 l ara a, a - rr8· dos Pobguaras,
· -, encon
b te rando
um navio . france"s
· com o qual
·_ nos a . mos.

Navegamos quarenta m1·111as a. té


um porto de nome
. . .Pa..
raíba, onde pretendiamos fazer ca_rregament~ de_ pau brasil e
obter dos índios (º'>) maior quantidade de viveres.
A nossa chegada encontramos um na vi~ francês~ , q';le ,;ar.
regava pa u brasil. Nós o atacamos e esperavamos captura-lo;
êles porém destruiram-nos .o grande mastro com um tiro e fu-
giram. Tivemos alguns mortos e feridos dentre a n?ss~ guar..
nição (º 1).
Por isso resolvemos regressar a Portugal, pois em conse..
quência dos ventos adversos não p~díamos v91tar .ªº porto,
onde queríamos suprir-nos de 'víveres. Velejamos assim, sob
ventos contrários e com parcas provisões, para Portugal, e so-
1

fremos grande fome. Alguns comeram as peles de cabras que


trazíamos a bordo. Cada homem recebia diariamente um copo
de água e um pouco de farinha de mandioca brasileira.
Apó~ uma viagem de 108 dias, chegamos a 12 de agosto de
1~48 as Ilhas dos Açores, que pertencem ao Rei de Portugal;
a1 ancoramos para descansar e pescar. Como divisássemos um
navio, dirigimo-nos para êle. Evidenciou-se ser um corsário,
que. ~e assestou em. defes~. Tiramos porém 0 melhor partido,
apns10namo~ o navio, e dele tomamos muito vinho e pão com
que nos refizemos. A equipagem escapou-se num bote ~lcan-
çando uma das ilhas. '
60
> - Oa potlguáras era l .
segundo rrcodoro Sampnt 0 · mlt ~am ~os dos portugueses. O vocAbulo
61) quer < zcr ·P ttpa-camurões"
- A carh1 de Af G • ·
a 3 de rnato de ·1 ~ 4· 8 . .onso on~nlves. eserita n 'EU-Rei. de Igarassá,
. , narra o S(\gulnte ·
me novas ele aeteo nauA fr . , • - " quun d o nqui vim ter, dera m..
lhe eu Senhor disse ue . u.ncesns que passarnm 1>ara os potlguáras, onde
saram outras rnuttaaq e csc pocllu fazer ofensa nos ·f ranceses e depois pas·
.om uma delas encontrou um meu bergantim que
. 50
Em seguida ·encontrainos cinco navios do Rei. de Portugal,
que deviam esperar, na ilha, navios vindos da índia, e escoltá-
~os a Port~gal. Reunimo-nos a êles e juntos acompanhamos, à
llha Terceira, onde devíamos de novo :fazer alta, um navio da
rota d.as índias, que justamente acabava de chegar. Defronte
desta ilha se reuniam muitos navios que chegavam todos das
novas terras e dentre os quais alguns desejavam seguir para

7. - O porto e a aldeia da Paraíba e o combate ·com o navio francês.

ia ao resgate ~ ·salu-lJhe uma zavra que ia com ela e foi-o seguindo tanto
que o alcan...;ou e andaram âe bom bardadas e espingardadas e frechadas
de maneira que quiseram abalroar com êle, ·mas os frecheiros com a mais
gente não no consentiram e mataram-lhe o mestre e feriram alguma gen-
te da que ia nêle e dos franceses morreram cinco ou seis e outros muitos
foram feridos por causa dos frechelros que os trataram mal 'e assim se

51
.. ·tugal. Quando partimos con.
. . e outros para por os navios aproximadarnenl\lt\..
a :r~spnnha, . ·a montavam . u . menos a 8 d te a
" t;) de 'ferceu ' L'sboa mais o e out
ta.men e Chegamos a I d d zesseis meses. \l..
uma centena. , viagem e e
bro de 1548, apos uma (ª2) e tomei a deliberação d
Aí descansei algu1?. temps~as viagens para as novas terr e
acompanhar os esp~: e~eixei assim Lisboa num navio h:,
de q· ue estavam · deuma P c1:da de chamada Porto . de Santa '.LVJ.
h a..
glês e cheguei a d 0 s .ingleses queriam carregar Vinho
ria (63), em C~stela,, on 7d de de Sevilha e encontrei três na~
Viajei mais alem ate ª ci :ra uma viagem ao Rio da Prata
vios que .~e apr1st~v~: l?ranto esta região, como a terra ric~
certa regia o da ,mer1 . foi descoberta há poucos anos, e o
de ouro do Peru, que , .
Brasil constituem um so continente..
'
A-fim-de tomar posse das terras do ~io da ·Prata, foram
enviados navios há alguns anos, dos quais um · voltara· (64 ),
Pediu auxílio e relatou que a terra devia ser muito rica em
ouro. Ao comandante dos três navios, d. Diogo de Sanabria,
cabia tornar-se o lugar-tenente do Rei naquelas paragens.·
Embarquei a bordo de um dos navios, que estavam muito
bem equipados, e logo partimos de Sevilha para São Lucar na
e~bocadura do G~adalquivir, rio onde se encontra Sevilha. .
Aí permanecemos a espera de vento favorável.

alargaram dêle8" . .
- Madrid, 1854 ·::- Varnhagen - Historia .
frequência dos navl V~I. I, pâgs. 453-454 d~ Brasil - Primeira edição
62) _ ~ "os ranooses, Por essa ·ê - omprova-se d~sse modo a
um ano. ase algum tempo'' d ci poca, nessa região.
63
) - Port e otaden co mpreende pouco mais de
64) - .. o Pouco acima da
1545, Alvur/>eN,,e ser o navio emfoz do Guadalete
lnõ J • unes O b que v lt •
r oilo Sanches. ª eça de Vaca, 0 capi~ã:ram para a Espanha, ell'.l ·.
João de Salazar e o piloto- ·
52 .
1
CAPiTULO 6.

Partida de minha segunda viagem de Sevilha,


na Espanha, para a América.

No ano do Senhor de 1549, no quarto dia depois da Pás-


coa ( ~ ), partimos de São Lucar. Como porém o vento fosse
contrário, velejamos para Lisboa e de lá, somente, com bom
vento para as ilhas Canárias. Em frente à ilha da Palma
ancoramos e fizemos provisão de algum vinho para a viagem.
,Os pilotos combinaram encontrar-se na costa, a 28 graus de
latitude sul, caso viéssemos a separar-nos durante a viagem.
De Palma ( 66 ) seguimos para Cabo Verde, que está situado
na terra dos negros. Lá, por um trís, íamos naufragando. Toma-
mos então nossa rota para o Novo Mundo, mas o vento era-nos
adverso, apartando-nos do rumo muitas vezes para o lado da
terra da Guiné, onde igualmente habitam ·pretos. Por fim
chegamos à ilha de São Tomé, pertencente ao Rei de Portu-
gal, rica em açúcar, porém insalubre. Em São Tomé moram
portugueses. · ~les têm muitos escravos negros. Tomamos.
água fresca e velejamos para diante. Durante uma tempestade
perdemos de vista, à noite, os outros dous navios e estávamos
agora sós ( 67 ) • Os ventos se mantinham muito desfavoráveis.
Êles sopram, naqueles mares, quase sempre do Sul, quando o
sol está ao norte da linha equatorial e, ao contrário, vêm do
Norte, quando o sol está ao sul do Equador. Como êles durante

65) - Staden errou aqui o ano que foi 155-0 e não 1549, pois é
bastante sabida a data d~ particlu de São Lucar de Bnrrameda da pe-
1

·q uena armada de ~anabrrn. O "quarto dia depois da Pilscon", corres-


ponde a 10 de abril, como largamente demonstram Luis Roque Gondra
e Roberto Lehmann-Nltscbe, m~s obras .nqui jâ citndns.
66
) - Segundo já mencionamos deviam duf ter safdo a 15 de junho
de 1550.
67
) - As emharcaçõcs_que se afastaram da caravela onde in Hans
Staden, que era. u elo capitno Becerra, fornm o patacho "'Slio l\1lguel'',
comandado por Salaz.ar e u outra cara vela sob as ordens de J ouo d l
Ovando. e

53
nie ntl v
~ a direção, afastararn \o\
· t ..",()s
{orl · J11C ~~a Somente em Se embro ~
inc 11., c~cs so ~
f' \ l11
, dP no~sa ro. -
t··1 ceI ,. .
- demos tornar o r umo sul-s-.J(),
uatr n1-s ·s n 1'.T ·te Entao pu '\l..
q ;1 do .l "' 11 •
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•• • • • 1
·--
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.......•

8. - A caravela da esquadra de Sanabria na qual se engaiou


Hans Staden, como arcabuzeiro

1 1

54
CAPt'l'ULO 7.

Como alcançamos a terra da An1érica, a 28 gra1:1s


de latitude, não tendo podido entretanto
encontrar o porto que nos havia sido
indicado, e como rebentou na costa
uma grande tempestade.

Certo dia, em 18 de novembro, tomou o piloto a latitude.


Encontrávamo-nos a 28 graus. Então procuramos a terra, na
direção do Oeste e avistamos tambem a costa, a 24 do mesmo
mês. Havia seis meses que estávamos sobre o mar e tínhamos
passado inuitas vezes grandes perigos.
Quando nos aproximávamos da terra, não pudemos en-
contrar o porto e os indícios que nos havia designado o pri-
meiro piloto da esquadra (º 8 ). Não devíamos tambem arriscar
a entrada em um porto desconhecido e por isso velejamos ao
longo da costa. Levantou-se então um forte vento, e como re-
ceiássemos perecer nos recifes, amarramos juntos tonéis vazios,
pusemos pólvora dentro, tampamos os batoques e atamos nos-
sas armas em cima. Se tivéssemos tido um naufrágio e alguns
escapassem com vida, encontrariam então suas armas en1 terra,
pois às ondas lançariam os tonéis à praia. Cruzamos contra o
vento e esperávamos assim apartar-nos da terra. Mas · de nada
isto serviu. O vento impeliu-nos sobre os recifes, que estavam
ocultos a quatro braças de profundidade e grandes vagas nos
empurraram contra a costa. Pensávamos que íamos todos pe-
recer.
Então permitiu Deus, quando já estávamos perto dos re-
cifes, que um dos nossos companheiros descobrisse um porto.
Entramos nêle e aí vimos um pequeno navio. Fugiu-nos à
frente e es7ondeu-:e atrás de uma ilha, de inodo que o per-
demos de VlSta e nao pudemos determinar que navio era. Não
o seguimos porém e ancoramos. Agradecemos então a Deus

68) - Era João Su raclrns, un tm·ul tle Bl8cn ia, como Já se referiu.

55
mos e fizemos secar
aescan Sa
dcsgrnçu;
. l do ntl
. 11 !~ nJtl n
.
ou menos d uas h oras
.•
"'n~ H'1 - .
t' ~ • • ,.l'$l 'S. . .
.
ser1a1n de canoa e h eia
rna1s · d e sel..
1 w~~n~ s [c1 ro, gran nh d .
. d hln\·t.uno . .. veiu tUUª os mas ne um e nos
~~'ª:' p do cscur~cci:QueriaJll falar-n ~-lhes algumas facas
dn l:H l . os o nuv10. . língua. Dern
'n[rt.'ns no nd be111 a sua
l.
·, l\tcn e1
po \,\

9. _ Chegada ao abrigo de Superaguí, que fica do lado do norte da


· baía de Paranaguá
1

e anzóis, e éles se retiraram. Durante a noite aproximou-se


de novo uma canoa repleta de · homens, dentre os quais esta~
vam dois portugueses, que nos perguntaram de onde vínham 0 ~·
Como lhes dissemos que vínhamos da Espanha, foram de opi-
nião que devíamos ter um piloto hápil para assim termos che-

.56
g·ndo ~\ . po~·to, pois que, senrlo-1hes llst c bem conhecido não
l Ol!l'Hrmn1, 'lltr "bu1to . I · b ,
tcui ·~~t~\d :\ E . · ' . n e lnçar u urra dur nnte semelhante
. P d ~ · · l\tfio lhes i1urrmnos exahnnente como n6s em
: ,ra gus,
rn ' 10 . o ' e n. t o e· d -.•'\S
}
.. qtrnse naufragamos· como nao
. . ' ti-
'
n u~nios nuns esper~\l1ças, certos de que perec~ríamos · como
nt·~o d. '"' r epente d 1v1snn1os
' · · · e como Deus, de' impre-
1
· • ... -. . • · ' a entrada
' isto, n os RJudou. e nos salvou do naufrágio. Não sabíamos
t an1be1n onde estav m11os.
Ouvindo isto, ad1niraran1-se inuito êles, e agradeceram a
De~18 •00 O port.o l~o qual nos achávamos, chamava-se Supera-
gm (_ ) e. d evia flc :.u · ·a cerca de 18 milhas (7º) distante da ilha
d e S u,.? Vicente, que pertencia ao Rei de Portugal. Lá mora-
va1n eles, .e a gente que nós tínhamos visto com o pequeno
navio, fugira porque nos haviam tomado por franceses.
Perguntaino-lhes então a que distância ficava a ilha de
Santa Catarina para a qual queríainos velejar. Responderam
que poderia ficar a umas 30 milhas ao sul. Lá morava uma
tribu de índios, que se chamavam carijós (71). Devíamos nos
acautelar bem dêles. Porém os selvagens da região de Supe-
raguí, onde nos achávamos, os tupiniquins, eram amigos, e
dêles nada tínhamos que recear.
Por fim perguntamos a que latitude ficava Santa Cata-
rina, e sua informação - a 28 graus - estava certa. Deram-
nos ainda indicações de como poderíamos reconhecer a terra.

- -----

60) _ Superaguí é um porto numa Ungua de terra ao norte da barra


de ParanaguA. A.1 ficava um caminho por terra para Cananéa, conhecido
secularmente pelos índios. Moi.s és Marcondes - Documentos para a his-
toria do Paraná. - Rio de Janeiro, 1923, pág. 34.
70) _ Hans Staden contava por . ~nilhas g~ogrâficas alemils de 15
ao gráu. H. 'rernaux-Compuns -. H1stolre d un puys dans le Nou-
veau Monde, nommé Amérique, pnr Hans Staden de Homberg, en Hesse.
Paris, 1837, pAg. 15. Essu medida de extensão .alemã era de 7,420 Km.
71) _ Os cnrljõs eram de ruçn guuranf, grandes guerreiros e a "gen-
te mais caminhadora de quanta lrn no Rio da Prata". E. de Gand'ta -
Los primeros italianos, cit., púg. 167 ·

57
CAPíTULO 8.

Como deixamos o porto em busca da


ilha de Santa Catarina.

Como houvesse cessado o vento lés-sueste ,e o nor~este so-


prasse, tornou-se o tempo bom. Fizemo-nos a vela port~to~
retrocedendo e procurando o citado por!o de Santa Catarma.
Depois de navegar durante dois dias nao o pudemos · encon-
trar; observamos entretanto pela forma da cos!a que já de-
víamos tê-lo passado. O céu estava encoberto, nao alcançamos
assim tomar a latitude. Precisávamos pois voltar, mas isto não
era possível, visto o vento nô-lo impedir. Deus porém é um
arrimo na desgraça. Quando ao entardecer estávamos em
prece e lhe pedíamos graça, levantaram-se, mesmo antes de
terminada a oração, e antes de escurecer, pesadas nuvens ao
sul, para onde o vento nos conduzia. O nordeste cessou;· du-
rante algum tempo houve tal calma que nenhuma aragem se
per~ebia, começando então a soprar o vento sul, que nesta es-
taçao do ano apenas raramente ocorre. Trovejava e relam-
pejava tão fortemente, que nos causou sobressalto.
O mar estava muito agitado, pois o vento sul vinha ao en-·
contro das ondas levantadas pelo vento do norte H · t
bem t a l escun·a-ao que nada se podia ver A . · avia am-
intimidava diante dos .fortes raios e trovõ~s N~qmpagem b~
onde por mãos a obra afim de colher a . m~em sa ia
dos que sucumbiríamos afogados nestas ;;:i~':· ~nsaDvamos to-
cedeu que 0 tempo mudasse e melh · . as eus con-
r~torno o mesmo lanço que de di o~ass~. VeleJ~mos então de
m?s de novo divisar 0 ort p ~ av:amos feito e procura-
tra-Io, pois havia muitat ilh~ d o~em t nao conseguimos encon-
Como estávamos . d e ron e do continente.
't- . · e novo a 28
p1 ao ao piloto que entrasse g;raus, determinou o ca-
ancorar e inspecionar por detras duma das ilhas para
estreito e encontramosquumetebrra era. Entramos então por um
f erros f1"c . om porto · D epoIS
· de lançarmos
· ' . ou resolvido 0 d
reconhecimento dêsse anco~~~~cuho dum bote para mais exato
ro.
58
CAPtTULO 9.

Como alguns de nós saimos com o bote, afim de


conhecer o porto, e como achamos uma cruz,
que estava sobre um recife.

Era o dia de Santa Catarina do ano de 1549 ( 72 ), quando


ancoramos. No mesmo dia alguns dos nossos companheiros
sairam com o bote bem equipados, pois queriam explorar me-
lhor a enseada. Supusemos que devia ser .a embocadura de
um rio, ao qual chamam São Francisco (78 ), e que pertence
à mesma província. Quanto mais penetrávamos, mais as ágt:las
se alargavam. De quando em quando procuráva~os divisar
alguma fumaça, mas nada descobríamos. Pareceu-nos então
ver em frente · da floresta, num vale, algumas choças. Segui-
mos para lá. Eram velhas choças, sem ninguem dentro. Navega-
mos então além, até ao escurecer, e dirigimo-nos a uma pe-
quena ilha, para aí pernoitar, pois pareceu-nos isto maµ; . se-
guro. Quando chegamos, já era noite. Não achamos pr:udente
porisso desembarcar e aí acampar. Só depois dalgunS dos
nossos terem rodeado a ilha, não avistando ningµem, · desce-
mos, fizemos fogo, abatemos uma pal~eira1 .e comemos o pal-
mito. 1 1

De manhã cedo entramos mais além na enseada, pois que-


ríamos saber, com certeza, se lá habitavam homens. Desde que
havíamos descoberto as velhas choças, contáv~mos com isso.
Como nos adiantássemos mais, vimos ao longe um p'a'u fincado
sobre um recife. Parecia ser uma cruz, e alguns dos ·c amara-
das conjecturavam sobre quem poderia tê-la aí trazido. Che-
gamos para mais perto. Era uma grande . cruz de madeira, fi.-
xada ·no recife por meio de pedras. Num pedaço de fundo de
barril aí preso, havia letras entalhadas, que no entanto não

72) - Leia-se 25 de novembro de 1550.


73) - Necessitamos recordar que uma das finalidades da armada
de Sanabria era povoar o porto de Silo Francisco do Sul.

59
· -·:::::-
10. - A ilha e o porto de Santa Catarina, com a aldeia de Cutia á dtrelto
e no continente, em face á ilha, a cruz encontrada pelos navegantes. O
momento é aquele em que as canoas com selvagens acorriam ao tiro de peço
disparado do bóte espanhol que explorava a baia

isto, procurou um dos companheiros decifrar o escrito, tendo-~


c~nseguido. Aí estava entalhado em língua espanhola: ''Si
';ene por ':entura aquí la armada de Su Majestad, tiren ~
tiro Y habran recado". Isto significa: "Se por acaso aqui v1e-

60
.rem t er n avios de Sua Majestade, devem dar um tiro e terão
respoot a ".
• o. de ar-
Retrocedemos depressa para a cruz, demos un1 t ir
tilharia leve e voltamo-nos para a terra. Logo avistam~,
como navegás.5emos nessa direção, cinco canoas repletas e
fndioo, que remavam direito ao nosso encontro. Aprontamos
nosso canhão. Como porém êles se aproximassem, reconhece-
mos um homem que usava vestes e trazia barba. Estava em
pé, à frente da canoa. Devia ser um cristão. Gritamos , que
precisava aproximar-se com sua canoa para que lhe f ala~e­
mos· os outros deviam permanecer distantes. Quando assim
sucedeu, lhe perguntamos em que região estávamos, e êle dife~
"Estais no porto de J urumirim (7 .. ) , como chamam os se ~a
gens ou para compreenderdes melhor, no porto de Santa a-
' ' .
tarina, como o denominaram os descobridores ·
,,
Alegramo-nos portanto, pois era o porto que procuráva-
mos. Estávamos nêle e não o sabíamos; tínhamos chegado
mesmo no dia da Santa Catarina. Por isso podeis ver como
Deus trás auxílio e salvação àqueles que o inv ocam cnm fé,
em sua desventura.
O cristão perguntou então de onde vínhamos, e respon-
demos que pertencíamos aos navios do Rei da Espanha e que-
ríamos seguir para o Rio da Prata. Havia ainda mais navios a
caminho; esperávamos que êles, se Deus assim o permitisse,
logo chegassem tambem, pois queríamos encon trar-nos nêste
porto. Disse êle que tinha prazer ouvindo t al e agradeceu ao
Senhor por isso, pois êle, havia três anos, tinha sido mandado
da povoação de Assunção ( 7 ~), n a provi nda do Rio da Prat a,

14) - E' a boca do norte qn tievnrn u ilha de Sa nta Ca tn rlnn do


continente. Jurt1mlrlm, segnndo Teodoro Sampa.lo é .. Bo<-a Pequena' '.
75) - Assunção !ol !undadn pelo ca plti\ o João de Salaza r , q ue aU
construlu um forte a 15 de agosto de 1537. E. de Gand1a - Ui cludad
de la Assnnclõn durante el gohierno de Iraln - na obra : ·- In cllos y
conquistadores en el Paraguay - Buenos-Afres, 1.932.
18) - O capitão João de Salazar, natural de Esplnos a de 10 8 :\ion-
teroa, onde nasceu em 1508, havia Ido ao -Rio da Prata na expedic;lio de
d. Pedro de Mendonç.a, em 1534, com o cargo de contador. As sú; Uu a
fundação de Buenos-Aires, tomou parte nth·a na conqui9ta do t en1t6rlo e
qwmdo o adeantado regressou â Espa nba, trasladou-se para Ass unção,
o.nde se reuniram todos os ofielais rea!B e a maior parte dos povoadores.
Elevado ao mando Domingo,s Martinez. de· Ir.ala, êste o nomeou alcaide
ordinário da cldade. Quando da ~inda d .e Alvar,o Nunes Cabeça de Vaca,
em lõ42, tornou-se ho.mem da confiança do mesmo e, por ocasião doe
partidários de Irala prende~m aquele adeantado, embarcando-o num na-
vio de retorno para a Espanha, Cab~ de Va:ea proclamou pubUcament.e
.Joio de Salazar como seu sucessor, razão porque os partldárloe, d,e Ira-

61
litoral, a. uma
, .s para o , , adir a tr1bu d?s cai-1los,
. s espanhol : , ue persu. l ntar tnand10.c a, Para
\ dist~}a
que pertence ;~~has. Tinha a~hóiS, ~ :eivagens, ~e·. º· preci..
de tre zentas igos aos esP víveres . o 'itão Salazar ,<7º), qu~
d
que er am ~un recebessetnd. nado o caP a voltava .em um dos
ue os nav ~s havia or e ha e agor . , ,
q Assun , . Espan ,
sass~Jlll. ado notícias a as suas ' ch9ças, onde
havia ev para · · · ·d
s navios. selvagens . hospedaram a .S~'1 mo o.
out r O "l s nos ·
otn os
Navegamosm e0 cr1s . tão e e e , . . .·
b ' . .. 1.. ,

mo rava taro e . , , .1 1 , , ~,
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1
1 ' 11
1

1 ' ' 1 1 1

1a o prenderam e em~~rcaram· n~ me~m~ "· navio do adeantado. Votvi4~.


assim A Espanha, em 11545, foi .ali lionrado com o hábito da Ordem ·de Slo
Tiago e finalmente 15 49 nomead,o tesoureiro das provtncias do ~1~.
exn 1

da 1Prata, devendo seguir na armada de J oã.o de ~anabrla. Coµio êste · a l


leceu e seu filho Diogo que o substitu·~~ não pudes:s e seguir de ·pronto, f~
Salazar encarregado da expedfoão, conforme, jâ em ~omeço . narraDl-08:
Ficamos sabendo pela exposição de Staden que havia provi4enciado . pa.
rn que de Assunção parti!o;se um povoador, a-fim-de permanecer em $8.D·
ta . ~atarlna! ro espera da aJ;mada em. que retornaria .da EspaJlha. ~ase
estõico partidário do capitão Salazar chamava~se, como adeante -esclare-
ce Staden, João ·F ernandes e era um. ·b asco da cidade d~ B.ilbê.o.•
CAP1TULO 10.

Como fui mandado ao nosso navio com uma


canoa cheia de selvagens.
Pediu então o chefe do nosso bote ao homem, que tínha-
mos encon~rado entre os selvagens, que arranjasse uma c.a-
noa com tripulação, a qual um de nós levaria a remo ao navio,
a-fim-de que êste tambem viesse. Deu-me êle a incumbência
de ir com os selvagens. Já estávamos há três noites fora, e a
bordo não podiam saber o que nos tinha ocorrido.
Quando nos achávamos apenas à distância de um tiro de
besta do navio, houve grande alarido a bordo. A equipagem
se pôs em posição de defesa e não queria deixar-nos aproximar
com a canoa, mas gritaram-me perguntando o que havia, onde
tinham ficado os meus camaradas e por que vinha eu sozinho
numa canoa cheia de selvagens. Fiquei calado e não dei res-
posta, pois o chefe do bote havia me ordenado fingir-me aflito,
para ver o que faria a equipagem de bordo. Como não rece-
beram resposta, discutiam entre si: Há qualquer coisa de
anormal, provavelmente os outros morreram, e os selvagens
vêm com êste único homem e, de certo, há mais gente de em-
boscada para atacar o navio. ~les queriam atirar, porém in-
terpelaram-me ainda uma vez. Então comecei a rir e disse:
"Acalmai-vos. Boas notícias! Deixai que me aproxime, e vos
contarei tudo". Então lhes narrei em que pé estavam as coisas
e êles muito se alegraram. Os selvagens voltaram para casa
com sua canoa. Aproximamo-nos com o navio às vizinhanças
de suas habitações e ancoramos.
Aí ficamos à espera dos outros navios que havíamos per-
dido durante a tempestade e que ainda deviam chegar. A al-
deia chamava-se Cutia ( 77 ) ; o homem, que tínhamos encon-
trado, era João Fernandes, um basco da cidade de Bilbáo, e
os selvagens denominavam-se carijós. tles nos trouxeram
muita caça e peixe. Em troca lhes demos anzóis.
77) - · Segundo Teodoro Sampaio êsse vocnbttlo iudtgeua signi-
fica "aquele que come de pó", com rer·e rêncln no lla\bito do animar
dêste nome tomar o alimento com as pata.a dillnteiras.

63
CAP!TULO 11.
~ d u~l durante a viagem
Conto o segundo navio, 0 q 0 primeiro
f on1os separados, chegou comd
piloto da nossa esqua ra.
. ., ,. emanas estávamos anco-
Quando havia Jª cerca
. ~ .
de tres viaJava · ·
o prrme1ro p ilo-
r ados, chegou o nav10 no qua . 1 ubemos· tinha-se 'per-
to (7 8 ) • Do terceiro navio nada mais so '
9
elido (í' ) • _ • ia em e armazena-
Preparamo-nos entao para prosseguir. v ~ R' d p· t
· - ·
mos prov1sao de boca para seis mes , es pois ate o io . a ra a
tinh a a1n· da cerca d e trezentas milhas · Tudo estava
(8 º) pronto
· .·
quando, um dia, o navio grande afundou no ~orto ' e assim
não poude ser levada a termo a viagem proJetada.
Durante dous anos ficamos em paragens ermas e passa-
mos muitos perigos. Padecemos grande fome, tivemos que co'."
mer lagartos e ratos silvestres e outros animais . assim estn~,­
nhos, que podíamos apanhar, e tambem crustáceos, que se
prendiam às pedras na água, e outros alimentos igualmente
desconhecidos. No começo os selvagens nos trouxera'm víveres
suficientes, enquanto receberam de nós bastante mercadoria
em troca. Depois seguiu a maioria para outras ,regiões . ....Não
devíamos tambem confiar muito nêles.
Assim não tínhamos nenhuma vontade de aí · permanecer
e perecer; resolvemos portanto que a maioria dentre nós · .devia
partir ·por terra para a província de Assunção, que ficava dis-
tante cerca de trezentas milhas ( 81 ) ; os demais deviam, do
78
) - Chegou a 16 de dezembro de -
1 o5-0.
pág. 442. Gondra, obra .cit..,
79
) - Era a cara vela comandada por J oã
80) - Era o patacho "Sã 0 M' l" o de Ovando.
<'hes, foi "deitado de través" igue e que, segundo João San-
81) . •
- O cammho por terra pa A
de rS anta Catarina, foi seguido or ra ssunção, partindo da região
Itapucii, segundo menciona João PS Cabeça de Vaca, que entrou pelo
lhor local para se iniciar tal via eanches! es.clarecendo que era o me-
século XVI para as relaçõ g m. Fo.1 trilha ;muito frequentada no
es entre o Brasil e o Paraguai.
64
m \smo n10 io, pn t•a lli
u' Jt imos
· · Il
"::l 'O t \u pui·k•
' ltuv
·t ''-'Ur
0 corn o nttvlo rci;tunte A êstes
O CH!llt"'
Aqu 'lcs que .
'"
. uo, e cu cstuvu entre. €!les.
· · · s~gmram p 01. l .1. .
res para a CHJninh• d et n (li~) se n1uniram de víve-
. "l n atr '~ d . .. . ·
cc ns1go nlguns índios. Mui~ves o se!·tao. Levaram tambem
os rcnrnnescentes porém h os dentre eles morreram de fome;
tarde soubemos (H3). e egaram ao seu destino, como mais
Tamben1 para nós u f'
para uma viagem po; ~;. icamos, era o navio _muito pequeno

82) - Foram conduzidos por Afonso Velido e Fernando de Sa-


lazar, compondo-se a leva de trinta pessoas, tirante os guias indl-
genas. Entraram tambem pelo Itapuct1 até o Ivat e por êste abaixo
até chegar ao rio 'Paraná\ e ·depois por terra até Assunção, informa
Domingos de Irahl na sua carta de 24· de julho de 1555, inserta em
"Ulrlco Schmidl", edlÇão de Samuel A. La fone Que vedo - Buenos
Aires, 1908, págs. 406-41 5. Por êste documento e mais pela carta de
1

Salazar, datada de São Vicente a 25 de .junho 'de 1553, bem como pe-
la crônica de João Sanches, ficamos sabendo que de Santa Catarina
passaraJ..O os restantes da armada de Sanabria para o Viaçá, em cuja
barra perderam o derradeiro navio, que era a caravela do jã faleci-
do capitão Becerra. Salazar então, com todos que se salvaram, for-
mou um ndcleo em terra, de onde partiram os supraditos emissârios
para Irala. E como não ·possuissem mais embarcação, construiram
uma, .diz João ISanches, com a qual passaram alguns para São Fran-
cisco e os outros, com 'Salazar, foram até São ·Vicente. Staden, con-
densando multo nêste ponto, não combina com êstes três testemu-
nhos. No capítulo seguinte. porém, diz subitamente: - "Deixamos o
porto .de Viac4 ••• "
88) Chegaram a Assuncão a 24 de julho de 1552.

65
CAPiTULÜ 12.

. para São Vicent~, que


Como queriamos veleJaram e conseguir dêles
os portuguese~ ocupr:v~os a termo nossa
um navio a-fim-de do porém em uma
viagem, naufragan não sabendo ·a que
grande tempestade, . da São Vicente.
distância ficava a1n
. ocupavam os portugueses uina
Não longe do co_ntm:nte te ' ou Upau-nema (S•), na língua
ilha, que se chama Sao V~ce~ 'dista setenta milhas do lugar
dos selvagens. Esta provincitaado Para lá queríamos navegar
, lt · tínhamos es ·
onde por u !111º uir dos portugueses um navio para a
e. ver se pod1~dos cponstg pois 0 navio que nos havia restado
viagem ao R10 a ra a,
era muito pequeno.
" t · t to veleJ·aram alguns dos nossos sob o comando
N es e in en . _ _ . t (ª5) Nº
do capitão Salazar na d:ireçaq de Sao V1cen e .. mguem
tinha estado na região, exceto . um homem chamado Romano
que pensava conseguir ençontrar de . novo .a terra.
' . ,11

B•) _ No original de Staden . está ~scrlto" Orbio~eme. And~


Tbevet ·grafa Morpion e . dela fa·z uma descnção.
Les s1ngularltez de
Ia France Antartique", . edição de Paul Gaffarel - Paris, ~8'l8;
pag. 275.
B:>) - Staden evita . sempre falar das dissenções havidas durante
as vicissitudes porque passaram os tripulantes da armada de San·a:brla.
Assim, tambem aqui omitiu ter ·h avido, discórdia entre João de Salazar
e Fernando de Trejo,' que contava . entre' os seus partidários a João ·San·
ches e dona 'Meneia Calderõn de ·Sanabria. ~stes ficaram· em São Fran·
c18co, onde deram começo a povoação dês se nome. João de Salazar e
uns ·poucos mais, entre os quais Hans Staden que sempre dleclpltnado,
acompanhava o Iegrtimo chefe da esquadra fo;am :para São Vicente, "no
navio restante'', escreve · Staden mas é · n'ecessârio lembrar o que .aftr..
mam ·Salazar e João Sanches, d~ que· não restavam mais navios da ex..
pedição. Navegaram pois num bergantim que Salazar na ·c itada carta
~ed.2·5 de junho de 1553, esclarece ter sido construido 'com a ajuda··dos
in 1os. • 1

66
,l )~ L -- nrno~i o 't>nt·I< <1'' ·1·m 1)fm~wpo
, • •
1
.)
Vi.
(ll 11 ), que fica

a 28 graus
t H1(
1,
lo) dt . lnt.lt.
• i
t lrh tntl ' r nl _,'l"• no1•mo
.,. .. ·
· f1 , e].. opo·i r-i d e e] orn
· d'ias pouco
H\lh,l < U n ( no.a < do umn vl1\an1·n
,..,.. r-.l""~ e orca e] e 40 m1
.. 'Ih as, uma

1'1. - O nduft«~gfo no lltordl de ltdnhõem. vendo-se Hans Staden dando á


costd num destroço. da embdrcdçdo. Esta xilogravura fornece,nos uma exce-
lente ldéid dd rngftfo dtscrita no livro. A esquerdd, na terra firme, está Bertioga
logo a seguir, as flhds de S~o Vicente e de Santo Amaro. Na primeira
notdm -se dS vilas de Sdo Vicente e de Santos e M segunda, no extremo di-
n:ito d cut1 forte de 5do Felipe e no extremo esquerdo a vila ·de Santo Amaro.
Do lddo direito dd gravura estd ltanhacm, onde se avistam, inquiétos, os ma.-
rlnheiros salvos do ncrnfrdgio.

~U) - No od~innl ele Stn<len está "hauingen ln biassape", que


t.radu !1nos '' 1wrto do Vin{:ú". A localiza~ão dêsse porto, que a edição
d lORO dn A 'ndomia llrnslleiru, traduziu como "forte", tem sido bas-
t:u1t dis 'Utlda. St.nd n o coloca no seu mapa, perto do que parece

67
, · imuno~ ancorar, porq,llt: r,
.
\1C U( r uz ~8
C (H 7). Í\J. .PhfCChuyj
....r ll a . ,,.,
a m u itaH gaiVOtWJ 11t;---
.:1 . ~t
l·l11n , ·1 dos 1 .1 to co. nt r·Lt' rio. J."I a
. corno er 'a t empo' hú..C dsua. proerc.~, -.;,.._..
cebfrnnos vct d . s a lca trazcH. ... , terra e na i l a ,cmoa busx.:a
dnhns, ch?11:1ª d·itá-Ias. Fornos .ª os ocas aban d~nadau, cac~
,:-
ç~w,
era factl Jn c;
d água . oce, d . · encontram . . a habitado
outror , esta "lhi (.\.,
à procura e ; dios que havw.m fonte numa rocha . Mat;,~-
de pote.s clost· in bem uma pequena os tambem ovos a b ordo f!
descobrindo ~~ ai votas, trou.xem . .
mos então muitas g
. mos aves e ovos. ao sul pesada t empest ade
cozm 11a ... 1 van tou-se d . , '
D ·s da refeiçao, e , s podido ancorar e · eviarnoa
edo1que dificilmente teri~1n? lançar-nos de encontro ao-.
dcea~~l~r-nos pois o vento poT~nrh1~mos esperança de alcançar,
ª
rochedos. · Era ao ª~ 01'tecer 1 do Cananea
. · , (BB) ' m·as
· ·ca'
· lU a
talv , ez um porto v1z1nho ch~ma os Não pudemos portanto
"l chegassem · · N
noite antes que a e e terra. Era grande o perigo. ada
aportar, afastando-nos da
fi .a vinte e oito graus e mefo.
denominar La~una, dizendo que rtac~lescrição, diz .q ue adeante da ilha
Tambem João .Sanches, n~ sua cait aus e dois terços, estA uma lagu.
de Santa Catarina, :' ªº~, vm~e de ~o~rf;~ de Acufia, na sua _carta u datada
na que se chama Vmçú · EJ • d ·unho de 1527, menciona a bafa
da Feitoria de Pernambuc o, t
15 lt: ~raus e meio''. De fato, Gandfa,
ª
dos Patos que ~stâ em v1n e e ~firma .ser 0 porto do Viaçá o mesmo
baseado em vários ~ocument~=~ta Catarina. Essa a opinião aceita por
que o porto dos Patos, em t . Uf Ga.ndfa "Los primeros ita-
uasi todos que discutiram n ma eria. . ' " . -
q ,, 't pág 97 _ Padre Luis Gonzaga Jaeger - As mvasoes
~an~!i;fil~~e·~ no Rio ·Grande do Sul (1635-1641)", Porto.Alegre, 1?40,
P á gs. 27
a~ e segs e varnbagen - "Historia do Brasil", c1t., 1.ª edição,
pâgs 43 7 Viaçá ·
tam bem compreendia. a reg 1-ao no con t•ment e a que
pert~ncia êsse porto e a propósito escreve Mo~sés Santiago Bertoni, na
sua obra "La civilización Guarani", Puerto Bertoni ( Paraguay), 1922,
págs. 427-428, que muitos autores têm na conta duma só nação os
carijós e os mbiâs, porque os primeiros tinham, "sobre la Laguna de los
Patos, el puerto de Mbiaçá". Trata-se no entanto, a seu ver, de duas
nações bem distintas, sendo ' que os mbiâs, provindos do Paraguay, pen.e-
traram fundo no Brasil e formaram o país de Mbiaçá (Viaçá), que v.i-
nba desde o Paraguay .até as cercanias de .Cananéa, passando ao norte
do rio Iguassú. Os mapas antigos · assinalam de fato essa região e UI·
rico Schmidl vindo do Paraguay para São Vicente, contemporaneamente
à estadia de Staden, refere-se ao pais dos viaçâs, que atravessou cami·
nhando cem léguas e vindo ter a um lugar chamado Yerubatiba (Juru-
batuba?), daí alcanç-ando em pouca distância a Santo André onde co-
nheceu ~ :esidência de João Ramalho. Cf. Ulrico Schmidl -'- "Derro-
tero Y viaJe ª Espafia Y las Indias',' - Traducido del aleman segun el
o r g1°ª
1 93 8 -
1
dpel\ Stuttgart
ngs. 166-177.
Y comentado por Edmundo Wernicke - Santa Fé,

tltula ~m"do~~~~~ro ~am paio acredita


87
q ne esta ilha dos Alcatrazes cons-
sllelra, clt., nota ~~
8ij •
ª barra de Paranaguâ. Cf. Ed. da Academia Bra-
) - Cananêa, diz Teodoro Sampaio, é provavelmente uma cor·

68
mnis . sp r{~vmnos s 'HÜo qu o embate das vagas despedaç~5?e
nnvw. pois ll ~ 'ncontrúvnmos próximo de um promontono,
ond' m> ondns sao mais ultas do que longe da terra, em alto
Jl):\1'.
Durnntc a noite ficamos tão afastados do continente que,
pe~n manhu, estava ele fora de vista. Depois de passado tempo
av1s~tamo-lo d~ novo, porém a tempestade era tão forte que não
podmmos mais nrnnter-nos. Pareceu então ao homem que me-
lhor conh · eia a região que tínhrunos a costa de São Vicente à
nos~a frente. ?eguin1os para mais perto, mas nuvens e ne-
voeiro nada deixavam reconhecer e tiven1os de lançar ao mar
todos os objetos pesados que trazírunos a bordo alijando o na-
vio dos vagalhões enormes. En1 grande angústia navegá'\ amos
ao acaso, esperando encontrar 0 porto onde os portugueses
n1oravan1. Falhamos porén1.
Quando as nuvens se entreabriram de novo um pouco, de
modo que se podia avistar a terra, declarou Romano acreditar
que o porto estava defronte de nós; devíamos dirigir-nos di-
reito a um rochedo; o porto ficava atrás. Para aí seguimos.
Mas quando estávamos perto, nada mais que a morte se nos
deparou. Não era o porto. O vento ia nos atirar de frente
ao continente e afundaríamos. Os vagalhões batiam de en-
contro à costa, num lance medonho. Invocan1os a Deus pelas
nossas almas e portan10-nos c01no soem portar-se homens do
mar atingidos pelo naufrágio.
Perto do lugar onde as ondas rebentavam de encontro à
terra, levantaram-nos elas tão alto que podíamos olhar para
baixo como de cima de un1a íngren1e muralha. Ao primeiro
embate, partiu-se o navio. Saltaram então alguns de bordo
e nadaram para a terra; agarraram-se outros a pedaços de ma-
deira, conseguindo tarnbe1n alcançar a praia. Permitiu assim
Deus a todos saír com vida do naufrágio; ventava e chovia tão
violentamente que estávamos totahnente hirtos de frio.

rupteln de Canindó, nome de uma es1>ecie de arara. Achamos esta in-


terpretnçuo muito forçada. Não seria antes vocâbulo de origem latina
e correspondente no, segundo domingo d.n quaresma, que se designa por
"Domlnicn Chnnnncaen '/ Nêsse dia é proYfi. vel que a arma.da explora-
dora, clrntnudn de 1501, tivesse ali aportado no uno seguinte, porque a
22 d~ jnneiro devern ter estacionado em Silo Vicente. O nome seria en-
tllo proveniente dn prAtkn hngiolõglca em uso entre os navegantes por-
tugueses.

69
CAPíTULO 13.

Como reconhecemos em que lugar da terra


estranha havíamos naufragado.

Agradecemos então a Deus por ter-nos permitid~ chegar


com vida à terra mas estávamos ao mesmo tempo muito desa..
nimados · como Romano não conhecia o local, não sabíatnos
onde no~ encontrávamos, se distante da ilha de São Vicente
ou se perto dela, ou ainda se havia na região selvagens, qu~
podiam fazer-nos algum mal. Como um dos nossos camaradas,
um francês por nome Cláudio, corresse casualmente ao longo
da praia para aquecer-se, viu atrás da mata uma aldeia com
casas construidas à maneira dos cristãos. Dirigiu-se para lá.
Era uma povoação dos portugueses, chamada I tanhaem (ªD)
e distante duas milhas de São Vicente. Êle narrou aos habi:
tantes como tínhamos naufragado, que não sabíamos para onde
ir, que a equipagem padecia muito com o frio. Quando ouv~
ram isto vieram correndo encontrar-nos, tomaram-nos em suas
CB:Sas e deram-nos vestes. Ficamos alguns dias com êles até
que nos refizéssemos.
Daí partimos por terra para São Vicente (Dº) onde os
portugueses nos ?ispensaram todas as honras e dura~te algum
tempo nos mantiveram. Procurou então cada um para si um
89
) - Ióanb~em segundo Teodoro Sam ai .. ". .
pedra". O governador-geral Tom~ de Sousa P o quer dizer baeta de
pouco tempo depois de Hans Stad . que chegou a São Vicente
1553: - '~ ... e ordenei outra v· en, escrev1a ao rei, a 1 de junho de
m_ar, que se chama .a Concei - 1la na borda dêste campo, ao longo do
ramados por 0 dito campo e ~ ªº'
0 ?e o~tros. moradores que estavam der-
 vila de Nossa Senhora da Cs aJn.n~ei e fiz cercar e viver em ordem".
oficializada em 1 561 D ;:c~içao <le Itanbaem, no ·e ntanto, sõ foi
Salazar e doze eomp~nh~r~:u gio do be:g.antim onde vinham João de
salvas as armas. ' entre os quais Hans Staden, apenas foram
90)
- s al azàr
..
na cita:d
depois do naufrágio' escr . a carta de 25 de . junho de 15'53, dizi que
Antonio de Oliveira ' que eve1?- de Itanhaem uma missiva ao capitão-mõr
mar para 1São Vice~te endviou logo_ um barco onde todos seguiram 1por
' sen ° af mruto bem recebidos.

70
trabalho qualquer a fi
todos os nossos n~vio-s m-~~ ganhar seu sustento. Mas como
um navio português (º~) ivessem perdido, mandou o capitão
do resto da equipag~rn ao ,Porto. d~ Imbeaçã-pe, em busca
' que la havia ficado. E assim foi feito.

----
CAPíTULO 14.

Como está situado São Vicente.

São Vicente é uma ilha, que fica próxima ao continente e


na q?al s_e en~ontram duas povoações. Uma se chama em por-
tugues ~ao V1cen~e e na língua dos selvagens Upaú-nema; a
outr~, d~tante ~ai ce;ca de ?uas milhas, é denominada Engua-
guaçu_ ( ) . Alem dISso existem na ilha ainda alguns sítios,
que sao chamados engenhos e onde se fabrica açúcar (9ª).
91
) - Na mesma carta acima citada lê-se que João de Salazar
conseguiu por emprestlmo, com Pedro Roesel, um caravelão pequeno,
com o qual trouxe em duas viagens o resto da gente que havia ficado
DO Via~.
92) - "Estâ a vila de São Vicente situada em uma ilha de três
.léguas de comprido e uma de largo, na qual ilha se fez outra vila que
se chama Santos a qual se fez porque a de São Vicente não tinha tão
bom porto e a de Santos que esta. a uma lêgua da de São Vicente tem 0
melhor porto que se pode ver e todas as naus do mundo poderão estar
,nêle com .os profzes dentro em terra. Esta ilha me parece pequena para
duas vilas: -- parecia-me bem ser uma s6 e toda ilha ser termo dela.
Verdade é que a vila de ·são Vicente diz que foi a primeira que se fez
nest&. costa e dfz verdade e tem uma igreja muito honrada e honradas
casas de pedr.,_ e cal, com um colégio dos Irmãos de Jesus. Santos pre-
cedeu-a em porto e em sitio que são duas grandes qualidades e nela
está já a alta.ndega de Vossa Alteza. Ordenara. Vossa Alteza nisto o
que lhe parecer bem, que eu houve medo de desfazer uma vila a
Martim Afonso". - Carta de Tomé de Sousa a El-Rei, datada da
Bafa, a 1 de junho de 1553. - "Historia da Colonização Portuguesa
do Brasil". - Porto, 19214, volume III, pâg. 365. - Hans Staden,
que deve ter chegado a São Vicente nos primeiros mêses de lõ52, não
fala aqui no entanto de Santos, dizendo apenas que a outra povoação se
chamava .E nguaguaçd. ou como escreveu originariamente "Ywawasupe".
A propõsito dessa denominação revelada por Staden e do seu significado,
que frei Gaspar da M.adre de Deus disse ser "Pilão-Grande", poder-se-á
ler uma erudita dissertação de Candido Mendes de Almeida na Rev. Inst.
l-Ifst. Brasileiro, vol. 14.0, 2. • parte, pâgs. 324-341. Para êsse escritor o

71
·~ -... ~~~"-Llll.'~
~~-~-~'- ~\'.
' .
-~

-
12. - Assalto dos tupinambás contra os tupiniquins e portugueses. lem~s
dqui outra ótima vista de conjunto da região. No lagamar de Enguaguaçu,
este§ uma ilhd com a denominação de Brás Cubas. No litoral, em frente a
essa ilha, um engenho de açucar. Segue~se o ccrnal da Bertioga, até o forte.
Na ilha de Santo Amaro, vê-se a pequena vila dêsse nome e no ponta da
Armação, em frente á Bertioga, está uma casa com a legf!nda: - "O baluarte
onde eu, Hans Staden, estava".

vocábulo tupi quer dizer "para a enseada", interpretação essa multo apro·
ximada da de Teodoro Sampaio que traduz "no lagamar grande". Staden
sõ escreveu a denominação "Santos" no capitulo 38, da 1.ª parte. Nas
xilogravuras e no mapa assinalou com um "S".

72
tribu. Os inimigos ao 1 - ...
tupinarnbás :Ê t _ su sao os car1Jos, os do norte chamam-se
trários taba.. , s es sao t~~e~ denominados pelos seus con-
Jaras, 0 que s1gmf1ca simplesmente "inimigo" ('M)
ed.ausaram aos p or t ugueses mm.tos danos e por isso, ainda nos·
ias presentes, devem acautelar-se dêles.

CAPíTULO 15.

Como se chama o lugar, de onde os portuguêses


e os tupiniquins são mais violentamente
combatidos, e ·como está situado.
~ cinco milhas distante de São Vicente se ·encontra a po-
V?açao. d~ ~ertioga (95 ) • Vindos do norte, alí chegam, de iní-
cio, os _mrmigos dos portugueses e dos tupiniquins em suas rotas
guerreiras, e de Bertioga continuam entre a ilha de Santo

93 ) - Segundo frei Gaspar da Madre de Deus e Pedro Taques, os


engenhos de assucar existentes na ilha, em meados do seculo XVI, eram:
o fundado por Martim Afonso de Sousa ·ou do Governador, mnis tarde
chamado dos Armadores, que vendido para João van Hielst ou João Ve-
niste e Erasmo Schetz e mais tarde tornado propriedade única dos filhos
dêste último, ficou com a denomina~ão de engenho de Sãõ Jorge dos
Erasmos. ~stes industriais tiveram como administrador ao alemão Pe-
dro Roesel, citado por Staden e outros nl\ufragos de S.annbl'ia e possui-
ram navios para o comércio de açt1car, como se verifica em Pedro Ta-ques
e no prõprio 1Staden. O segundo engenho tido como mais importante da
ilha era o da Madre de Deus, fundado por Luis de Góis. Seguiam-se os
de Estevam Pedroso, Jerônimo Leitão, Salvador do Vale, "dos Guerras, de
São João, fundado por Jos·ê Adorno, de Santo Antônio, fundado por Ma-
nuel Fernandes, casado com uma filha de Raf·a el Adorno, irmão de José
Adorno e o de Nossa Senhora da Apresentação, fundado por Manuel de
Oliveira Gago, filho do capitão-mõr Antônio de Oliveira.
04) - Varnhagen escreve que "tabajára" era o nome que se dava
a todo ·g entio aldeado. Studart Filho diz significar "senhor do litoral".
- "O Ceará" - Fortalezia, 1941, págs. 124-1.3 0. !Para significar inimigo,
diz Teodoro Sampaio, o nome grafado por Staden deve ser lido como
"tobafguára".
95) - o vocabulo tupf, segundo Teodoro Sampaio, significa "parn-
deiro das tafnhas". O paraU ou pirati não é propriamente a "tatnha"
como quer Teodoro Sampaio e sim um ~eixe do genero da tafnha, como
veremos em nota adeante. Tomé de Sousa, na sua citada carta de 1 de
junho de 1553, dizendo que teve medo de desfazer a vila de S. Vicente,
criada por Martim Afonso de Sousa, acrescentou que mandara erguer
mais três e entre essas - "a Bertiogn que Vossa Altem mandou fazer,

73
Amaro ('"') e o continente e m d ircçfw n Süo ,Vicent~. .Esta
passagem quedmn alg uns 111arnclucm;, dtlsc~ndente~ de l?d1~s e
cristãos ilnpossil.>ilitar aos tupi1!umbús., E~·um ... c1.n~? 1r~aos.
Seu pai era un1 português, sua m ae m:na .india b1 as~leir~. Er~m
çristãos~ igualmente hábeis e experi~ntes na urte. ~u~rrc1ra
ta nto d.êstes, con10 dos selvagens, do1n1nando a~nba. .s as hngu~s.
O ruais velho chamava-se João de Braga, seus ll'maos a seguir:
Diogo Domingos Francisco e André de Braga, e seu pai era
Diogo' de Braga (u1). Cerca de dois anos antes da min.h~ c~e­
gada, haviam resolvido êstes cinco irmãos, com tup1n1qums
amigos, construir em Bertioga, à maneira dos selvagens, um
forte para defesa contra os adversários e realizaram a sua idéia.
Tambem alguns portt~gueses com êles se estabeleceram, pois ~
terra era boa.
Seus inimigos, os tupinambás, cuja fronteira fica mais ou
menos a vinte e cinco milhas distante de Bertioga, observaram
isto e é'rmaram-se. Uma noite vieram em setenta canoas e
atacaram, segundo seu costume, às primeiras horas da madru-
gada. Os mamelucos e portugueses retiraram-se em uma casa
?e barro e defenderam-se. Os índios porém permaneceram
Juntos em suas choças e aí resistiram como melhor lhes foi
possível, de sorte que muitos atacantes tombaram. Afinal os
t~pinambá~ .ven~eram. Incendiaram a povoação de Bertioga e
fizeram prIS10neiros todos os selvagens. Mas aos cristãos - de-
vi'!-111 ser oito - e aos mamelucos,' nada puderam fazer-lhes na
casa, pois Deus quís protegê-los. ·
Os agressores retiraram-se para sua terra logo após terem
matado e esquartejado os prisioneiros.

que está cinco l~guas de São Vicente, na boca do rio po d .


~e faziam muito mal". Para a respetiva fortaleza nom:o onêle os indios
Janeiro de 115·50, a Antonio Adorno que já. ti h . ~ e, n 1·8 de
mõr da vila. O bispo da Bafa aind~ a . 22 d n ªprovis~ o .de alcaide-
mava na "vigarnaria da igreja' de São Tia . eddez~mbro de 1•?55, confir-
pitania de São Vicente" ao padre FernãC:º' . a vila da. Bertioga, da ca-
ms~~cos", vol. xxxv,' p!igs. 1·65 e 311 Lu1s Car.apeto. '!Documentos
) - IDra a ilha de Guaim bê 0 d · G . ·
voação, sede da :parte meridional d~ n ~ ouçalo Afonso . fundou a po-
largamente expomos nos "Capitã cap tani.a de Santo A'ma1·0, segundo
Ao tempo de Hans Staden era ,?:inn:iores v_icentinos"., cit., pâgs 80 e 38.
não quis prover nela oficiais e m : a .muito ~ouca cousa" e o governo
cente. Foi essa vila log andou que ah servissem os de São Vi-
recolhidas ao almoxarifa~o ª.~az;da pelos tupinambás e em Í57·6 eram
97) - A 20 de agosto de a~tos as afaias da sua extinta capela .
moxarife e feitor da capitania d!5o0 s~ mandava que Pedro Seabra, al-
:orador na dita c.a pitania quar ~· Vicente, pagasse a Diogo de Bra·g a.
raga um niavio de remo do
ta en a cruzRdos "fazendo o dito Diogo de
em seu regimento". _ "D manbo e grandura que Sua Alteza manda
ocumentos Historicos''' vol. XIII, 3li6 ,
74
CAPfTULO 16.

,C omo os portugueses reconstruiram Bertioga e


levantaram um forte na ilh~ de Santo Amar o.

Depois dêstes sucessos pareceu conveniente aos coman-


d an t ~s. e a, C"a113ara, não abandonar
' ' fortificá-lo
o · lugarejo, mas
o max1mo poss1vel, porque de lá se podia defender toda a re-
gião. E assim aconteceu.
Como os inimigos agora percebessem que a povoação esta-
va fo,rtificada demais para que pudessem atacá-la, passaram-lhe
ao pe uma noite, furtivamente, e chegaram através do canal
entre a ilha e o continente até as proximidades de São Vicent e.
Aí fizeram prisioneiros a quantos puderam, pois os moradores
de São Vicente não haviam cogitado de perigo algum, pensan-
do estar abrigados por Bertioga fortüicada. Tiveram que so-
frer as consequências de tal suposição.
Determinaram por isso construir bem em frente de Ber-
tioga, na ilha de Santo Amaro (98 ), próximo ao mar, uma
casa, destinando-lhe uma guarniçã·o e _p eças de artilharia com
tenção de impedir a passagem dos índios. Assim já haviam en-
cetado a construção de uma fortaleza na ilha, mas não a ti-
nham terminado porque, como me contaram, nenhum artilhei-
ro português queria aí arriscar-se.

98) - Martim Afonso de Sousa construiu uma trin th~lra junto l


barra da. Bertioga, dando assim inicio' ao forte de São '-r lngo, fü~1lols hn-
mado São João da •B ertioga e finalmente Santo Antonio. l~m 1550 &di,
ficou·se · o forte de São' Felipe, chamado · depois de Silo l,1\\h~~ nn illln ide
Santo Amaro, do lado da Armação, de que f oi primeirn ·~ou'('\t}Shb'~l o
alemão Hans Staden. Alberto Sousa - · "O~ .Anélrtu.tus" - Sllo J:>•\\tlot
1922, vol. I, .p ág. 1177. ·P ara essa fortàlezn f oi nuu Hlntln <h lii\tn.~ PQ}o
governador-geral T-0tné de Sousa, por portaria de 13 d · ,fln~ . ·. .t1 t\ .
1552, alguma ·artillharia e munições cuja descriç.ão , <mnstn. tlos Da..
cumentos Histõricos", vol. XIV, pâg. 3 9'7. Tum bem nn m~uu tlrttt\ se.
1

mand~ va para a fortalem da Bertiogn nm l'll nlo1· ll\'mero <l l\t'll"UHntmt


e municão. - Idem, pág. 899.

75
,., d lugar. Quando os habitall
. 1, examinei a situaça...o eº que entendia um pouco d~
Fui a e ue eu era alemao e que me estabelecesse na
tes so.u~:a~~hões, propuseraz;:~~spreita do inimigo. Pori111J\
maneJo ºlha e que os ajudasse . m bem. Disseram tambein
c~~;aalguma
a1
aI gente e n1e pag~na Rei de Portugal agradecer..
, · saberia o ·ahn
que se euaceitasse isso, um soberano generoso
. espec1 t ente
me, po is costumava ser .
ue 0 ajudavam e assistiam nas novas erras.
para com aqueles q . atro meses na casa. Então
Al servir qu .
Combinei com e es d Rei com navios e construir
devia chegar um encarregado ~e· tinha de ser mais forte. E
um edifício de pedra seguro, q
assim se fez. . na casa com dois. outros
. t d tempo passei eu , .
nh- 8 estávamos porem em gran-
A maior par e o
homens. Tínhamos · alguns c~. ºt
' dos índios, pois . a casa não
de perigo e ~unca ~eguros · ~an ~em que estar- em guarda di-
era muito solida. Tinhamos ~ .t n-ão passassem às ocultas.
· s selvagens a noi e .
ligente, para q1!~ o 'l . . .... vezes Deus porém nos ªJUdou, de
Isto tentaramd
sorte e es adgumabsr1'-los
que pu emos esco durante nossa vigilância.
· d e a l,g uns meses chegou o lagar-tenente · do Rei,
Dep01s " · poiS
a Câmara havia ,escrito a Sua M~jesta~e com que mso1enc~a se
portavam os ·inimigos. que :'inham do N or;e, como era ~onita. a
terra, e que n~o seria avisado abandona-la. _O Ioga~ tene~te
Tomé de Souza (99 ) tinha que .d ar uma soluçao. ~l~ inspec1c:
nou a região de Bertioga e tambem o lugar que a Cai:nara qui-
sera fortificar.
Disseram tambem ao lagar-tenente dos serviços que eu
tinha prestado à comunidade por ter ido para a casa, na qual
nenhum português queria ficar, porque ela era bem pouco for-
tüicada. Isto muito o agradou, dizendo que desejava narrar
tais fatos ao Rei ,quando Deus o fizesse retornar a Portugal e
eu seria então recompensado.

Expirava. agora · O;,prazo, a saber quatro meses durante o


qual eu. havia .prometido à Câmara servir, e pedi ~inha baixa.
Mas o logar-tenente · e a Câmara quiseram conservar-me mais
algum tempo em serviço. Prometí que ficaria ainda dois anos.
99
d ) - . Tomé de Sousa, primeiro governador-geral do Brasil. março
e
l . l549 a Julho de 1553, chegou a São Yicente
.a 1 se achando precisan t 8 .em princípios de l55il •
"Hist d B . . . ,, "'e ie~ e a de fevereiro dêsse ano. Varnhagen,
Ba'fa de ~ l ras1I ' E~. Weiszflog, voI. I, pág. 323, nota 14. Chegou à
Brasil'' , Cl?t .,ta vo
delssa
. III,viagem ,a 1 ,de m:aio de 15·53. "Hist. da Col. Port. do
pág, 364.

76
Terminado êste tempo devi . .
'OS, voltar a Portu al ª.rn ~eixar-me, sem criar embara-
fugar. Lá devia rec!be no pruneiro navio em que encontrasse
isso passou-me 0 lo r tª recompensa dos meus serviços. Sobre
con10 o recebem . te um. . e on t ra t o em nome d o R ei,·
gar-. enen
. os artilheiros reais, quando o solicitam ( 100 ) .
Construiu-se a fort 1 d
nhões. o forte t ª eza e pedra, pondo-se nela alguns ca-
g iá-los e manter eh oa
es as peças me foram confiados; devia vi-
guarda.

---- ---·--
CAPíTULO 17

Corno e por que nós tínhamos que contar com os


inimigos duas vezes mais no· ano do que em
outros tempo8.

T~nhamos que nos acautelar especialmente contra os tupi-


nambas duas vezes -por ano, épocas em que, com violência, pe-
netram na região dos tupiniquins. Uma destas épocas é em
novembro, quando amadurece o milho, que chamam abatí, e
com o qual preparam uma bebida chamada cauim. Empregam
tambem aí a raiz de . i:nandioca, de que misturam · um pouco.
Logo que voltam de sua excursão gue,r reira com abatí maduro,
preparam a bebida e devoram nesta ocasião os seus inimigos~
se conseguiram aprisionar alguns. Já um ano inteiro antes es-
peram . com alegria o tempo do abati.
Além disso, devíamos contar com êles em agosto. Nêste
tempo prociirani uma espécie de peixes que emigram do mar
para as correntes de agua doce, para aí desovar. Êstes peixes
se chamam em sua língua piratís e em espanhol "lisas" (1 º1 ).

100) - Essa nomeação para condestâvel devia ter sido em mea·


dos de abril de 1558.
101) - Teodoro Sampaio na nota 43 da edição de 1930, da Aca-
demia Brasileira diz ·q ue "para ti" equivale em português a "tafnha".
Não é bem isso' o ·naturalista Agenor ·Couto de . Mabnlhães, o. quem
fizemos uma ..cor~sulta, explicou-nos que a tainha é o "mugU platanus"
dos cientistas, peixe com 0 peso de um a dois e meio e ús vezes trê~
quilos ao passo que 0 piratr ou parair é o "mugU curema", peixe com o
peso ~o mú~imo ele seiscentas gramas. A "carimã", outro gênero dos
mugilídeos, ·sõ aparece da Bata para cima.

77
. :\ud )m ~.r.i cs. ein . gerul u n ia excursão
d ., guert'D...li..
N \ssa 'pocn empt . . •ipr ovisionur-se e viveres. pn 11
. ~ . ,11 1or podei ern .. "' d -. T· . '\;"'
r•t ' 1-f1m d me. . ro de pc 1xes com
. '... . . re e.s. ambny...
p equen as ~~ , .,
c 3 m 1 rande nume · t . ., m inuitos assados para casa. Fa
·
s attrnm com
fle chas. eh 1 aze
a que cham am p1racu1 · '. ..
.~n1 t:nn bem uma fa rin ª
- ---- -
CAPíTULO 18

Como fui aprisionado pelos selvagens.


Eu tinha um selvagem, da tribu dos carijós, que m~ . per..
tencia. Apanhava-me caça, e eu ia de quando em quandO··com
êle à floresta. .
Um dia veiu visitar-me um espan~ol da ilha ~e São Vi..
cente - que dista cinco milhas do forte em q~e eu morava, na
ilha de Santo Amaro. Com êle veiu um alemao por nome He-
liodorus Hessus, um .filho ·do falecido Eobanus ·H essus .(1º2).

102) _ Todos os autores que .· temos ··' consultad·o sobre ·o ·alemão 1

Eliodoro Hessus, insistem em · considerâ;..lo,;, nã~ .sabe·m os , qual aí razão,


como sendo o português Eliodoro Ebano, que , ei;itr~ ·outros d~~umentos,
:tlgura como juiz ordinârio do Rio de J'an~iro e'm 1572 e como vere;a~or e·m
1585. Cf. "Revista do Arquivo Federal". alio de 1·8'9 5, Dág. 2i63 e ano 1 1

de 1:897, pâgs. 1'03_-105 .. ~sses mesmos autores confundem êste ultim~


Eliodoro Ebano, com Eliodoro Ebano Pereira,." que com .· seu filho Gibaldo
Eba.no e Sebastião de .Atzeredo, fora.m os fundadores de Paran:a.guâ, pelos
anos de 1648, no dizer de Pedro Taques. Cf. "Rev. Inst. Hist . .Hràsilei-
ro", vol. IX, pâgs. 326-327. Vejamos um pouco essa" questão. ·O pai de
lDnoaoro .1:1.essus, rol Hellus JOOt>~nus Hessus, . um humanista alemao, na::!· 1
ctdo a '6 de Janeiro de 114188, na vila de Bochendorf~ em Hesse. 'Faleceu
1 • 1 ' ' ' 1

a 6 de outubro de 1540 em :M-arburgo ~ EUo.d oro· Hessus ·foi seu · terceiro


filho e tinha apenas onze anos quando seu ·p ai m:o rreu foi' por isso en-
j e
tregue, com seu irmão mais moço . Calfmaco, a Hans Rummel, ,homem
d.armas dum landgrave, a-ffm ,. d~ ser educado. "Em 154.1 já cursava 8
escola superior de Marburgo. Em 115-4 8 ·foi para a Holanda e dali em,
barcou J)6ra o 'Brasil, como :guarda.-liv.ros dd engen·ho de São· João, per·
tencente ao genovês Josê Adorno, na capitania ·d e São Vicente. ·segundo
.Rio B-ranco, tendo seguido pa·r a o Rio de Janeiro como comandante de
uma leva de voluntários vicentinos, em socor.ro contra os franco-tamotos;
pereceu no assalto dado a um· na.vlo francês ·no· Oa bo..1Frio no dia 8 de
junho de l56B. Cf. Sant' Ana Ner1 - "tLe Brésil en t .8-89"', Paris, 1S89t
.p tg. 11ts. - Eliodoro Elbano, português de nascimento,-' juiz· ordinArio · no
Rio de Janeiro em 1572 e vereador em 1585 vem confundido por Roque
Luls ~me, na sua "Nobiliarqula", extratad~ de Pedro Taques, e agora
impressa por Afonso de Tauna y, com Eliodoro Ebano . Pereira, tond'ador
Heliodorus trabalhava em São Vicente em um engenho -
assim se denominam as casas em que s~ fabrica açúcar. ~ste

13• .- Aprisionamento de Hans Staden, n-a ilha · de Santo Amaro, pelos tupi-
1

nambás e a ·sua .passagem pelo canal, ·em frente á Bertiogá, de pé na canoa


e orando. Da fortaleza são -disparados dous grandes tiros.

de Paranaguá, ·em ·1.648, segundo Taques. '"Rev. -.Inst. Hist. São ·P aulo",
1

vol. XXXIII, pág. 190. ·Não sabemos quem· .v ulgarizou que êsses três
personagens, inteiramente diversos, constituiam um s6. Para desfazer
êsse absurdo, basta considerar que para F.Jliodoro Hessus ser o mesmo
que Eliodoro ·Ebano e êste vir ia ser finalmente· Eliodoro Ebano Pereira,
necessitaria êste ·ultimo, que fundou Paranaguá em 164-8, ter pelo me-_
nos cento e vinte anos de idade! Ao leitor curioso desta questão, indi-
caremos ·mais as seguintes fontes: - Melo Morais, "Crônica Geral do
Brasil", vol. · I~ •pág. l5. - Azevedo ·Marques, "Apontamentos Histori-
cos", vol. I, pâg. 179. ·- ·Rio Branco, "Efemérides", ed. 1918, pâg. 297.

79
-

.. hamado José Adorno (toa)


· a um genoves .ereadores d o engenh o. Eu · ·'
1 0 per te11cu1
engen \ - · dor dos .ine d aufra · 1a
~ lc er a scrivao e paga eliodorus; quan ? n ~ue1 corri
con lkr..cer~l" antes, de perto, H 'lh de São Vicente, aJudou-rnn
t · na 1 a · t · .;
~ espanhóis e o encon ·rei mo passava, pois eria talve"i<.
os ê:
de maneira amiga. • V .
eiu ver-me co
ouvido que eu estava doente. dia anterior à floresta, onde
Eu mandara o meu escravod~o eu mesmo seguir no dia se..
d evia apanhar caç~, prete~d~~e que tivéssemos ~lguma Coisa
guinte, para busca-la, a-fim , h via 0 qüe se ia buscar no
para comer, pois lá na terra so ª
mato. , da selva, levantou-se de arn-
Como eu caminhasse atraves
ia" ' Rev Trim ., XXXIV, 2. ª, pâg. 21. -
Pedro Taques, "No b 1·1 iarqu
·
d · Bandeiras", vol. V, pâ.g. 199. -
Afonso de E. Taunay, "Hist. Gera. 1E ~s nos" Rev. Inst. Hist. São Pauio,
Errnelino A. de Leão, "~~leodoro do ª"Um~ elucidação histórica", Rev.
X III, pâg. 417. - J. Vieira Fazen a,
Trim., vol. 93, pâgs . 259 e segs. . à nobre familia dos duques de Gê-
103) - José Adorno pertei;ic1a ara São Vicente com alguns irmãost
nova, de onde era natural, e vem P de depois foi creada a vila de
em 1535, estabelecendo-se hem d;er;-a~c:i~ sob a invocação de São João.
San tos, com granded endgensaºnta c1sa d~ssa vila e depôs no processo de
Em 1560 era prove or a · d ~:..... A
- B
Joao de o s. lé E m 1567 admitiu Adorno como . sóc10s o engeJ.JIU.o
n· . a edn-
tão Nunes, Jacome Lopes, Francisco Anes e Cr1stov~m iniz., mas r .u-
ziu depois essa sociedade apenas á do seu ge~ro, o m~lês John Whithalt
produzindo então a fábrica mil arrobas anuais e tendo nela e~pregados
setenta escravos. Em Santos casou-se José Adorno com Catarma M?n-
.teiro, filha de Cristovam Monteiro e de ~ua mulher Marquesa Ferre1~a,
esta última herdeira das terras de Guaratiba, trocadas em 1·5 90 pelos Je-
suitas por terras na Bertioga e nos arredores da vila de Santos, caminho
de São Vicente. Muito religioso e devotado amigo do padre José .de An-
chieta, foi o comandante da pequena frota que levou êsse missionârio a
Iperoig, em abril de 1563, na esperança de paz com os tupinambâs.
Tambem fe?l companhia ao mesmo jesuita na luta para a fundação do
Rio de Janeiro e ajudou a mandar um reforço a Estâcio de Sâ, coman-
dado pelo alemão Eliodoro · Ressus, guarda-livros do seu engenho. Os
tupinambás foram desbaratados no Rio de Janeiro a 20 de janeiro de
1567. Acompanhou tambem José Adorno .ao c.apitão-môr Jerônimo Lei-
tão, quando da guerra do Cabo-.F rio em 1575, contra os mesmos inc!f-
gen.as. Pelos serviços prestados no Rio de Janeiro teve três sesmarias:
uma na Cariõca, outra em Niteroi e outra no sertão. Fundou em Santos
a capela de Nossa Senhora da Graça, da qual fez doação ao convento do
Ca~mo. Ergueu tambem, na ilha de Santo Amaro a capela de · Santo An·
tomo d~ Guaimbé. Obteve ainda várias dadas de terra entre as quaih
~-ilha do Toque-Toque, em 1586 e outra na costa indo 'para São Sebas·
:ro, .~ª qual mandou seu genro Jerônimo Ortéga 'tomar posse em 15il8,
L.t Ja andar Dluito doente e velho, tendo falecido pouco depois dessa
·d ª' com mais de cem anos e com "signais de predestinado" escrevia
epo1s o padre Simão d v . ' .. ·
em São p 1 e asconcelos. Deuou numerosa descendcne10.
alianças de ~~:;ilfu~e perdeu 0 apelido, informa Azevedo Marques, pelas

80
s h dt~i do e t11.h1ho um grand' ulnrido como é háblto cn-
h't
s e.
.
' V~\ <'US
·S d.
1
.. · ~ · SS·'\ cn t u correu
- '
·
1 parn mim, e reconheci que
'r'.lll\ Jn io:;. ~ es cercaram-me 1 visurum-m • com arcos e fle ...
ch.ns, e nss 'lí\ar:un-tn . Entilo •xclumei· "QuP Deu' salve
mmhn
. , _~ ~'·tlm·1"
~ "-. ·
M.ª.l t'tnha pronunciudo tais
· ·
pulnvras, abate-
r lm me ao solo, utirand sobre mim e ferindo-me a chuçadas.
Por: m machucaram-me apenas - Deus seja louvado! - numa
P.; 'rna
· ~
1 r·1sgando
" .. . -m . entretanto as roupas do corpo, um o man-

tt.:u, outro 0 som_bre1ro, um terceiro a camisa, e assim por diante.


C_om~çaram e~tao a brigar em torno de mim. Um dizia que ha-
via stdo o primeiro a alcançar-me outro que me havia apri-
.
s~ona d o ('Oi) · E ntrementes batiam-me
. ' '
alguns com o arco, e p~r
fun dous ergueram-me do chão, onde jazia inteiramente nu;
um agarrou-me um braço; um segundo, o outro; alguns à mi-
nha frente, outros atrás, e assim correram êles depressa car-
regando-me através da mata para o mar, onde estavam as suas
canoas.
" ~uando me trouxeram para a praia, vi estacionadas, à dis-
tancia de um ou dois lanços de pedra, as suas canoas, que êles
haviam puxado para terra, sob um arvoredo. Próximo daí es-
tava ainda um grande número de selvagens, que correram todos
ao meu encontro, logo que viram como eu para aí tinha sido
trazido. Estavam, como era seu costume, ornados de penas, e
mordiam seus braços, a-fim-de significar a ameaça de que iriam
devorar-me. A minha frente ia um chefe com o tacape que em-
pregam para abater os prisioneiros. Discursava e narrava que
em mim havia aprisionado e feito escravo a um "peró" ( 1 º~) -
assim chamavam êles aos portugueses - e que agora queria
vingar em mim a morte de seus amigos. Junto das canoas al-
guns me deram socos. Depois se apressaram em empurrar a
embarcação nágua, pois receavam que em Bertioga fosse dado
alarme, o que aconteceu de fato.
Antes porém de lançarem as canoas nágua, amarraram-me
as mãos juntas. tles eram de várias aldeias e alguns estavam
desgostosos por ter de voltar à casa sem uma presa. Por isso dis-

101) - Na narrativa de Hans Staden não consta com preclsi'io o


roê~ cm que foi aprislonndo. Pelos dizeres, porém, dos cnpttulos 38, 41,
42 e 52 da primeira p.nrte, e at.en<lenc.lo n que diz que ficou prisioneiro
dos tupfnam bfts <luran t<1 nov'~ mêses e melo, segue-se que fol em meados
de janeiro de l õõ4.
lOü) - Cnndido Mendos de Almeida faz unrn longn aprecla~ão
dOstc vocabnlo nn monogrnfiu "Porque rnsi'io os ludfgênas do nosso lito-
ral chumavnm uor; truncescs ''Mnlr" e nos portu~ueses "Pero", nn Rev.
Trlm., vol. xr..,,1, 2.ª, 71-145.

81
etinham. Uns diziam que ha-
putavam con1 aqueles que me r . mo outros queriam pois
viam se acercado tão perto de mun co . , prio Íugar.
ter de mim uma parte, e matar-me no pro
do em torno porque esperava
Lá estava eu, rezando e olhaI?- · me' tomou a palavra
. 1 h f ue queria possuir- '
o golpe. Af ma ~ c e e, q . vivo ara casa, a-fim-de que
e disse que deviam conduzu:-me ~ida e tivessem o diver-
suas mulheres tambeJ? x:ie ~issem com Nessa ocasião haveriam
timento que lhes cabia a minha.
. ,, 18
custa. . b b"d
. t 0 , preparariam e i as, or-
de matar-me a "cauim pepica ' ~' · · tamente. Assim
g anizariam uma festa e devorar-me-iamd
conJUil Tº
pescoço , ive· que su-
convieram e ataram-me quatro cor as ,ªºa· . da ficavam na
bir a uma das canoas enquanto os in 1os ain , ·
_ . t s das cordas ;.a canoa e
praia. Prenderam entao firme as pon ~ ·
empurraram-na nágua a-fim-de seguir para casa.

C.Á.PfTULO 19. . '

Como os selvagens queriam retroceder levando~me


consigo e como chegaram 'os nossos .para recl~mar-tne.

Perto da ilha de Santo Amaro . fica uina pequena ilha na


qual fazem seus nfuh~s pássaros aquáti,cos. de . p~umagem ver-
melha, chamados guaras ou .garças. Os 1nd1os me perguntaram
se os seus inimigos, os tupiniquins, já aí ·haviam estado nêsse
ano, e se tinham apanhado pássaros, quando com seus ·filhotes.
Disse que sim, ·m as apesar disso quiseram ·v erificar, ·pois esti-
mavam muito as . penas destas . aves. · Todo .seu ·'Orinato, ic.omo
se -sabe, era em geral .confeccionado de ·penas. Os guarás novos
têm a princípio penas· branco..;acinzentadas; ·depois quando já
. podem vôar, cinzento-escuras. Com esta plumagem permane-
cem mais ou menos um ano, ·até que afinal .se tornam tão \Ter-
me1hos como o púrpura.
Os ín~ios dirigiram-se então ·para ·a ilha, "esperando aí ·en-
contrar passaras. Quando. ·p orém se tinham afastado do loc~l.
onde arribaram uma distância apenas de ·c erca de· dois tiros ·de

82
ar~abuz, ( ) olharam em tôrno: Lá estava cheio de tupini-
100

qwns, e entre êles viam-se alguns portugueses .


.um escravo me havia seguido, quando fui aprisionado. Êle
ha~1a escapado e ·dado alarme. Quiseram assim libertar-me e
gritaram para os tupinambás que deviam voltar e combater com
êles, se fossem corajosos. Êles, -os tupinambás, então retrocede-
r~. J?a terra atiravam com espingarda e flechas sobre nós, e
os_ mdio~ nas · canoas respondiam com tiros. Soltaram-me as
maos, deixando porém .as cordas atadas ao pescoço. O principal
d~ canoa em que eu estaya possuia um arcabuz, e um pouco de
polvora, que obtivéra de um francês em troca de páu-brasil. Eu
tive então que descarregar a espingarda sobre a gente na praia.
· . Depo~ de assim escaramuçar por algum tempo, temeram os
tupmambas que os outros pudessem tambem munir-se de ca-
noas para perseguí-los. Porisso escaparam-se de novo, depois
que três dêles haviam sido feridos. Passaram -remando a uma
distância de cerca dum tiro de artilharia leve da fortaleza de
B·e rtioga, ( 107 ) na qual eu tinha estado, e durante êsse tempo
tive que manter-me em pé na canoa para que meus camaradas
me pudessem ver. ~stes lançaram do forte dois tiros pesados
sobre nós; atiraram porém para distância muito curta.
Nesse entremeio vieram alguns botes de Bertioga à nossa
caça. Meus amigos acreditavam poder alcançar-nos ainda, mas
retrocederam quando se convenceram que não era possível. Os
índios afastaram-se remando com excessiva rapidez.

106) - Na edição de Lõfgren e na da Academia Brasileira, está


"dez tiros de espingarda". No original de Staden vem "zwen", que é
uma forma gráfica de "zwei".
~07.) - Observa Teodoro Sampaio que êste fato prova que Staden
toi aprisionado em um ponto da ilha de Santo Amaro, para o lado de
dentro dos canais e lagamares, sendo conduzido depois através da barra
da Bertloga. ·

83
!·O

via · tt
.. os ·· ini :tbais.

De1"' "\js de tuna 'ürn~n


l:'"~' .. ~
dt) s t ~ 1nilhns - f oi 1.0 n1 d'sino
.... dia,
pelas quab~ hm·as da t \\r d a julg'al' · . ~lt1 sol - t~ u·1Etu~an1
para uma ilha pn..,~u·a1n a ·nu {i pm·n ~l. praia. Aí 9u ~ na~
pa_~~ a. noite. A n1in1 arrasb1ra1n-1n pol· t ~1-ra. Eu. n~o podia
ver nada porque tinha o l'" " t ina 'hu ndo. ·~ .1uio pod1.a ~11dn:
direito por causa das feridas na rua. Por isso prec1se1 de1-
tar-n1e na pr·a ia. Eles n1e rod arrun e dava111-1n a entender,
con1 gestos an1eaçantes1 con10 iria1n dev .r nr-n1 .
Na n1inha grande aflição e n1isél·ü1 ~ p usei e1n cousas que,
antes nunca n1e havia.in 'indo à n1ente, 110 trist vale de lá-
1

grimas em que a qui vive1nos ~ e cant ei c01n os olhos ú111idos de


pranto, do fundo do coração~ o saln10: i:' Do abis1no da iniséria
clamo eu a Ti". Ao que disserrun os selvagens: "~Vejam con10
êle grita; agora está desesperadon.
Então ponderaran1 que uao seria conveniente passar a noite
na ilha e aí acan1par e dirigirrun-se ao continente en1 frente. J ã
era noite, quando chegan1os. Lá havia cab ~u1as, que tinham
construido antes. Arrastaran1 as canoas par:\ terra, fizeram
fogo e deitaram-n1e perto. Devia dorrnir nun1a rede, que cha-
mam ini. Estas são seus leitos. Amarran1-11as en1 dois 1110\u·ões
acima do solo, ou em duas árvores, quando estão no mato. As
cordas, que eu tinha no pescoço~ prenderan1-nas no alto de uma
árvore. Deitaran1-n1e en1 torno de 1~1un, à noite, zo111bando e
chamando-me en1 sua língua: " Xé renü1nbaba in dê", que quer
dizer: "Tu és n1eu anin1al prisioneiro".
Antes que a manhã tivesse ron1pido, fora1n-se e remara1n
todo o dia. Quando o sol indicava quasi ave-n1aria e estavam
êles ainda duas milhas distante do lugar onde pretendian1
acampar durante a noite, levantou-se un~a g·rande e n1edonha
nuvem negra, que se aproximava atrás de nós. Tiverrun inedo
da nuvem e remaram depressa para alcançar a terra.. Viram

84
porém que não poderi' ._ .
ge t a, n d.e t upa- t 'ok bun1 , cacHp~ff-lhc
.- . e d1••tu· · ra·m -mn·
no~ , _ ~.
"E mon- '
Isto significa· "Fal ua e umu_nusu Jandó mom aran cima resé».
"" faça nenhum
nos · .. mal".
a ao teu Deus· que- · a g1.an d e t em.pcs t a d e nao
-

Recolhi-me e orei a Deu ,.


D d s, como e1cs me pediram: "O tu,
eus to o-poderoso, Senhor do céu e das terras, tu, que desde

14. - Hans Staden prisioneiro numa ilha, durante a vi119em de ret~rno dos
tuplnambás. Está deitado devido a ter uma perna ferida.

o começo ouviste os homens e os ajudaste, quando o teu nome


imploraram. Prova-me, entre os ímpios, a tua misericórdia. Fa-
ze-me saber que tu ainda estás comigo. Mostra aos pagãos sel-
vagens, que nada sabem de ti, que tu, meu Deus, ouviste mi-
nha prece". ·

85
. da nuvem borras-
• non e nadu 'via , "Okuá
Eu jazia amarra, o nu ~~ .
d ~ra trás e dissera~:
i á
. 0 índios porem olh&Cu atn P tempestade este se
cos~. m:nasu" Isto significa: :"A grane1e olhei . em torno. A
runo . a d ,, Er.gui-me então um pouc.o e D . s
desvrnn . o · A radeci pois a , , eu. ·
nuvein ia desaparecendo. g, ,

15. - Ocar•çú, segunda ·~tapa da 1 viagem 'dt r'etorno dos tuplMmbõS, vindos
dd Bertiogc1. Vê-se Hilns Staden deitado ho fundo da .prlrnelrtt cõnoa e\ es·
querda e rezcindo, a pedido dos sclvtcolas, por a que ' a tc:mp stade se af astc.

Em terra trataram-me os índios como no dia anterior, ata-


ram-me a uma árVore, alojaram-se durante a' noite " minha
volta, e contaram que estávamos agora perto da· sua morada;
queriam no dia seguinte, pela tarde, lá chegar. Com isso podia
eu pouco· alegrar-me. · 1

----·---~

86
CAPíTULO 21

Como os selvagens se portaram comigo


no primeiro dia em sua al~eia.

No dia seguinte - às ave-maria a julgar pelo sol - avis-


tamos suas habitações. Tínhamos· levado três dias de caminho
e percorrido de Bertioga, onde eu tinha sido aprisionado, trinta
milhas. ·
Quando· nos· aproximamos, vimos uma· pequena aldeia· de
sete choças. Chamavam-na Bbatuba (1 º8 ) .• Dirigimo-nos~ para
uma praia, aberta ·ao· mar~ Bem perto trabalhavam as mulhe-
res. nutna cultura. de plantas de· raízes, que êles chamam man~
dioca. Estavam. aí muitas delas, . que arrancavam raízes, e tive
que lhes gritar em sua lingua: "Aju ne xé peê remiurama",
isto é: "Estou chegando eu, vossa comida". .
Fomos à terra. Acudiram então todos, moços e · velhos; das
cabanas, que ficavam num outeiro, e queriam ver-me. Os ho-
mens se retiraram com os arcos e flechas para suas moradias
e deixaram-me com as mulheres, que me rodearam . .·A lgumas
foratn à minha frente, outras atrás, dansando e cantando uma
canção que, ·segundo seu ·· cost~me, entoavam .aos ·prisioneiros
que tencionavam devorar. Assim trouxeram-me elas até a cai~
çara, fortificação de estacas longas e grossas que rodeia suas
choupanas como a cerca dum jardim. Utilizam-na como ante-
paro contra o inimigo. No interior da caiçara . arrojar.am-s~ as
mulheres todas sobre mim, dando-me S()COS, arrepelando-me a
barba, e diziam em sua linguagem: "X:é. ~nama poepika aé !~,
"Com esta pancada vingo-me pelo homem ··que os · teus amigos
nos mataram". ·
- ----· - - -
108) - O nome era "Ub.atiba", como lemos em vários documentos
do seculo XVII, entre outros no "Livro primeiro de notas do tabelião de
Ubatuba", que começa em 1645 e que se aoha no respetivo cartõrlo da-
quela cidade. Staden escreve "Uwattibi". O dr. Wilhelm Kloster, na
edição alemã do ~r. Karl Fouqriet, faz vários comentârios geogrâficos,
no sentido . de démonstrar que us distâncias e mesmo as indicações· de
I .

87
.~1oc•n on d e tive
· q, ue
-
dei-
,lo~ nu e -:w • ui;carupcla-
po is in trodui irnn1-mc . rum but !rnxn- m e , . . , · l· -
D . ", t' e lc novo v 1c ., u ·adorus, como ir an1
t~u1-mt! num a 1cd ., . it·i ·ur nn1-rno, umu ç
,. b '1 , e s1gn e
ram-m ' o . e.\ - uma
d '' orar-nll~. _ ê t tempo reunidos em
. ~, homens estavan1 dur.ante .s e _,_vam em honra dos seus
utr~~choça.Lá bebiam cauun e"' camnt:tracas feitas de cabaças,
" -
ídolos chamados
M·ai..a e:\e ' que
.
sao fetizado que 1'riam fazer-me
os qu ~is talvez lhes houvessern pro
prisioneiro. . hora não houve ne-
0 canto eu ouvia, mas durante mem1~lheres e crianças.
d im apenas
nhum homem perto e m '

it ral paulista que atê aqui se


Staden, não correspondem nos locais do l o Im ressiona de f.ato a iden-
tém como identificados perante a sua obr.a. 'i risionado e levado, em
tidade do trajeto descrito por Staden,U~t s~r 'i trinta milhas de Ber-
t rês dias, para uma aldeiD: chtmada t ) e ~ :Íagem de ida e volta dessa
tioga ( Caps. 20 e 21 da prime ra par e uma arada num outro
Uba tuba para Bertioga, em acção de guerra, com P 41 42 e 43 da
local tambem denominado Ubatuba, descrita nos ~:tY:· de Bertloga parà
primeira parte. As etap~s foram . as mes~a:l~oª
a primeira Ubatuba e vice-versa. - pr m
fia ,
até São Sebastiilo;
. cl a·a· 'ºt,,,. Ocaraçú e terceiro dia, atê a primeira Ubatuba. Da lel-
segun o i ' a d ldeias
tura de staden, escreve o dr. Kloster, se conclue que .ªª uas a.
t;

·dêsse nome ficavam junto ao mar. Uma, em frente à Ilha denommada


''Ipaum-guassú", que segundo o dr. Plinio Ayrosa é o nome tupt da Ilha
Grande e a outra, no local onde hoje se encontra a cidade paulista .d e
Ubatuba. Num mapa antigo de toda região, ainda verificou mais o dr.
Kloster a assinalação dos seguintes lugares, a partir da Ubatuba paulista
para 0 norte: - ·Ponta do Ocaraç11, Taquart (Tlckquarippe), Mambu·_
caba, Ariró (Arirabe), Rio de Janeiro e Niteroi. Todas essas localidades
estão mencionadas por Staden e o dr. Kloster coloca a aldeia onde êste
permaneceu prisioneiro, cerca da enseada de Mangaratiba. Admitida
n êsse local, termina o dr. Kloster, ficariam resolvidas todas as ques·
tões levantadas pelas indicações do artilheiro alemão. · Estamos de acõrdo
com êste pensamento do dr. Kloster, mesmo porque Lery disse que co-
nheceu todos os indfgenas citados por Hans Staden, "nome por nome'',
~ 1os arredores do Rio de Janeiro. Of. "Histoire d'un voyage", cit., vol. I,
pág. 191. E em abono ainda podemos citar que com o nome de Uba-
t uba exis tiu um lugar em Angra dos Reis, onde floresceu uma fazenda
dêsse nome e a uma légua de Maricá, não multo longe de Niterol, se-
gundo Milliet de Snin t' Aclolphe, ha vin. um lugarejo chamado Ubatlba.
AliáH o em prego dêsse vocnbulo é multo comum na geografia brasileira.
Teodoro Sa mpa io diz que pode slgnlflcur tanto "sitio das frutas" como
"eltlo ~as canôtls" e "sltlo elas flechas", conforme se originar de "ibá",
fruta, ubll", canoa e "uibó.'', flecha;

88
CAPtTULO 22

Co~to meus dois senhores vieram vêr-me e


dISseram que me haviam dado de pre-
sente a um amigo, que a princípio me
guardaria e depois, quando quisesse
devorar-me, matar-me-ia.
Os seus costumes, nessa ocasião não me eram ainda tão co-
nhecidos como mais tarde, e poris~o pensei que êles agora se
preparavam para matar-me. Mas logo vieram os irmãos Nhaê-
pepô-oaçú, o "Grande' Caldeirão" e Alkindar-miri, o "Pequeno
Alguidar", (109 ) que me tinham aprisionado, e disseram que
me haviam dado de presente ao irmão de seu pai, o Ipirú-gua-
çú, o "Grande Tubarão", por amizade. Este me guardaria e ma-
taria, quando me quisesse devorar, para assim conseguir uma
alcunha.
O mesmo Ipirú-guaçú, havia um ano, aprisionara tambem
um escravo, mandando-o de presente ao Alkindar-miri, em
sinal de amizade. ltste o executara, alcançando uma alcunha
por tal feito, -e por isso prometera ao Ipirú-guaçú mandar-lhe
o primeiro inimigo que capturasse. tst~ fui eu.
Mais tarde disseram-me os irmãos: "As mulheres agora te
conduzirão ao poracé". Eu ainda não entendia essa palavra
então. Significava dansa e divertimento. Puxaram-me pelas
cordas que eu tinha ao pescoço, fora da choça para o pátio.
Acorreram todas as mulheres que estavam nas sete choças, to-
caram-me, enquanto os homens se foram. Tiravam-me umas
pelos braços, outras pelas cordas atadas ao pescoço, tão forte-
men te que eu quase não podia respirar. O que tinham em men-
te quando assim me arrastavam, não sei. Pensei então nos sofri-
m~ntos do nosso salvador Jesus Cristo, como foi inocentemente
torturado pelos vis judeus. Consolei-me nêste pensamento e,

109) _ Estas duns Interpretações são da edição de Lõfgren, de


1900, dadas por Teodoro Sampaio, que as modificou na edi~ão de 1930.

89
diante da cho-
era1n-rne
·t udo aceitei. JD]as trou:tuguês: A grandde gtarça
mais resigna d o, ' , , _ ern po · monte e erra
.
Ça do eh '.fc
a~ rutingu . . nçu pequeno .
uu . . · h ·ç a J' azia u1n . . ; . m-rne sobre e e.
"l
. t· , desta e. o · · colocara ·
branca. D . um .e . . a' uzinun e . não que queriam
p aí me con
•!". . .· pensei se
fresca. a1.1 5;;\g't11·aram. Nada mais _ pe.l o . ibira-pema, a maça
Alguxnas me ~ · . . . . torno
rocurava em
sacrificar~ne :e~p~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~,

• 1

16. - A aldeia de Ubatuba, etapa final da viagem de retorno dos tupinambh,


vindos da Bertioga e local onde permaneceu prisioneiro Hans Staden, que:
este§ agora sendo objeto do conhecimento das mulheres. Um pouco acima,
outro aspeto mostra uma delas rasp<Sndo-lhe: as sobrancelhas.

com que executam os prisioneiros. Perguntei tambem se me


matariam logo, mas elas responderam: "Ainda não''. Caminhou
então para mim uma das mulheres do grupo. Tinha uma lasca
de cristal presa a um instrumento, que parecia um ramo encur-

90
vado, e com isso raspou-me as sobrancelhas. Quis cortat~-m~
tambem a barba, mas nisto não consenti e disse-lhe que deviam
a~ater-m~ com ela. Responderam as mulheres que ainda
nao qu~riam matar-me e deixar-me-iam a barba. Depois de al-
guns dias, porém, cortaram-m'a com uma tesoura que os fran-
ceses lhes haviam dado.

CAPíTULO 23.

Como as mulheres dansaram comigo diante da


choça na qual estavam os ídolos.

Do lugar onde me haviam raspado as sobrancelhas, condu-


ziram-me as mulheres em frente da choça em que estavam os
seus ídolos, os maracás, e fizeram uma roda em volta de mim.
Fiquei no meio. Duas mulheres amarraram-me com um cordel
alguns chocalhos a uma perna e _por detrás, no pescoço, de
modo que me ficasse acima da cabeça, um leque quadrangular
de penas da cauda de papagaios, que êles chamam araçoiá.
Depois começaram elas todas a cantar. De acordo com seu
compasso, devia eu bater o pé com a perna à qual estavam ata-
dos os chocalhos, de modo que chocalhasse acompanhando o seu
canto. E a perna ferida doia-me tanto que mal me podia ter
em pé, pois ainda não estava pensada.

91
17. - Dança das mulheres, em Ubatuba, ten d o no me io Hõns Stade n, qu e
este§ com um ornato de penas na cabeça. Ao ce ntr o, aci ma, v,ê -se dud s ilh ~s
bem ·em frente ao litoral da aldeid.

92
CAP1TULO 24

Como~ depois da dansa, levaram 1ne ao


lpirú-g·uaçú, que de, ia matar-me .
1

. Concluid~ a dansa fui entregue ao Ipirú-guaçú e lá conser-


vado sob se:rera guarda. Disseran1-me que ainda tinha algum
tempo de v1da. Trouxeran1 todos os ídolos que havia na cho-
ça, colo~ando-os em torno de n1im e contarrun que êstes ído-
1~ haviam .p rofetizado que aprisionariam um português. En-
tao respondi: "Esses objetos não tên1 poder nenhu1n. Tam-
bem não podem falar, e mentem que sou um português. Sou
um. amigo dos franceses, e a terra, que é minha patria, se cha-
ma Alemanha". Retrucaram que isso devia ser mentira, pois
que fazia entre os portugueses, se era mn amigo dos france-
ses? Sabiam muito bem que os franceses eram tão 'inimigos
dos portugueses como êles proprios, pois os franceses vinham
anualmente em navios e traziam-lhes facas, machados, espe-
lhos, pentes e tesouras. E êles lhes davam em troca páu-bra-
sil, algodão e outras mercadorias, coµio penas e pimenta. Eram
portanto bons amigos. ·
Com os portugueses era diferente. Pois anos antes ha-
viam chegado à terra - assim continuaram contando - e lá,
onde ainda moram, estreitado amizade com os tupiniquins,
seus inimigos. Logo depois os procuraram para comerciarem.
~les os tupinambás, tambem tinham ido com muita confiança
aos ~avios e subiào a bordo, como fazem ainda nos dias pre-
sentes com os navios franceses; quando os portugueses conse-
guiram um numero suficiente dêles a bordo, os assaltaram,
amarraram conduzµ.am e entregaram aos tupiniquins, pelos
quáis for~ então mortos e. dev~rados. _Atiraram ~itos portu-
gueses alguns com sua arblh871~ ~ cometeram au;da outras
violências e vieram com os tupm1qwns para guerrea-los e fa-
zer prisioneiros.

93
CAPt'rULO 25

. ~
Conlo os 1r1nt1os, que nte h aviam· aprisionadort' queixa-
ra.n1-se .n .
mnn, .
cheios d
e
'I era, que
co -
os . po "Iugueses
--- tinluun· atirado
·. o seu pai.· 1st o queriam e es
vingar em mim.

Disseram ainda êles que os portugueses havia~ arranc~­


do a tiro un1 braço ao pai dos dois irmãos que me t1:-°ham f ei-
to prisioneiro, pelo que viera êle a morrer, e qu.eriam agora
vingar em mim essa morte. Respondi que em. mrm n~da ha-
via a vingar, pois ,eu não era português; eu tinha, havia pou-
co1 chegado a São Vicente com os castelhanos. Naufragamos
e , por isso eu tinha ficado entre os portugueses.
· Havia lá, nessa ocasião, um moço da sua tribu que tinha
vivido como escravo junto aos portugueses. Numa expedição
contra os tupinambás, subjugaram os tupiniquins uma aldeia
inteira. , Aos velhos devoraram, comerciando com os portugue-
ses alguns dos jovens, entre os quáis se contava o menciona-
q~ moço, que fora adquirido por um senhor da região de Ber-
ti,oga, um galego por nome Antonio Agudin. tste escravo ti-
nha1 sido de novo. capturado pelos tupinambás, cerca de três
m7ses antes · de· mim, mas como membro da própria tribu ..
tinha sido executado. tle conhecia-me bem Inqwr· . ' nao
, · 1 · iram-no
a meu respeito e re atou que era verdade que um · ~
h f d · h · h navio t1-
n . a na~ raga fo ~ aviam Ec ama?o castelhanos aos náufragos
dos quais eu azia parte. ram estes amigos d '
Nada mais sabia de mim. os portugueses.
Já antes. eu tinha sabido, e repetiram-me
em tempos chegavam navios franceses e ' que de tempos
fran~eses viviam e~tre os selvagens. Tinhque t~bem alguns
lher. pimenta. Por isso insisti na minha ~m fica~o para co-
um amigo dos franceses, não deviam m t eclaraçao: eu era
· ª ar-me portanto, an-
tes que êstes chegassem e me reconhe cessem
conservaram-me em severa vigilância. ·
CAP1TULO 26

Como chegou para vêr-me um dêsses franceses aí


deix~dos, e como aconselhou aos selvagens
que me devorassem, pois que eu era português.

A quatro milhas distante de nossa aldeia havia um fran-


cês. Sab~ndo da minha presença, veiu êle e dirigiu-se à cho-
ça que ficava em frente à minha. Vieram então a mim os ín-
dios e disseram: "Acha-se aqui presentemente um francês.
Queremos ver agora se tu tambem és francês ou não. Ale-
grei-me, pois pensei: êle é certamente um cristão e terá sem
duvida uma boa palavra em meu favor.
Conduziram-me então nú ao francês. Era um jovem a quem
os índios chamavam Caruatá-uára. ~le falou-me em francês e
não pude entendê-lo. Os selvagens nos rodeavam e ouviam-nos.
Como l)áo pude responder-lhe, disse lhes o francês na língua
dos nativos: "Matai-o e comei-o, êsse biltre; êle é bem portu-
guês, vosso inimigo e meu". Isto entendi eu bem e pedi-lhe por-
tanto, pelo amor de Deus, que lhes dissesse que não me comes-
sem. Mas êle retrucou: "~les querem . comer-te". Pensei no
versículo de Jeremias, no capítulo dezessete, onde se .diz: " Des-
graçado é o homem que conta com os homens." E .com tal reti-
rei-me de novo, muito acabrunhado. Antes porém arranquei do
ombro um pedaço de pano de linho, que me tinham dado -
sabe Deus como havia chegado até êles! - Eu o tinha pensado
porque o sol aí me queimara muito. Atire~-o aos p~s do ~rancês.
Se eu devia morrer mesmo, por que havia de cuidar ainda da
minha carne para os outros! Assim pensei comigo. Reconduzi-
ram-me à minha choça, e deitei-me de novo em minha rêde.
Só Deus sabia como estava aniquilado! Cantei, em altas vozes,
o verso:
Agora pedimos ao Espírito Santo
Pela fé verdadeira, com todas as veras,
Que nos preserve em nossa morte
Quando deixarmos esta mísera vida
Kirie eleison ! ·
95
. ,, E' um português legítirno.
é disseram. "
Os selvagens por . m diante da morte. . .
Agora grita, apavora-se . dias na aldeia, retrrando-s~ no
.. rmaneceu dois parar-se .e matar-me Justo
O frances pe 1 ram pre ·
. d1'a Os índios reso ve .d todas as coisas para a festa.
t ercerro · · eun1 o elho f ·
·a em que tivessem r t doS moços e V s, az1arn '
no d I erto e o '
Vigiavam-me de bem. P
grande escárneo de mim.

'1:

CAPíTULO 27

Como tive uma grande dôr de dente. ". ·...

Na minha-desdita - como se diz que uma infelicidade n:un-


ca vem só - ocorreu que um dente me maltratasse. A ·grande
dôr tinha-me abatido muito. Perguntou-me então meu amo o qu~
acontecera para que eu comesse tão pouco. Disse que um dente
me doía. A vista disso, foi buscar· um instrumento de ·madeí:ua
e queria arrancar-m'o. Falei-lhe porém que o dente não mais
doía e opús-me de tal modo, quando quis extrair-m'o (à forÇa,
que desistiu do intento. Mas lembrou que se eu não comesse e
não engordasse de novo, matar~~e-iam antes do tempo rriarcad0.
Deus sabe quant~s _vezes deseJe1 de todo o coração _ se assim
fosse a vonta~e d1v1na - ~orrer sem que os selvagens se aper;.
cebessem, a-~1m-de que nao pudessem levar a cabo seus inten~
tos para comigo!

------

96
';01uo nte e d ·
.. ou uz1ran1 ao Cttnh b -b
It h am e e, seu mais
a o e efe, e como lá me trataram.

Alguns dias dep ·s cond


01 .
·hmnnvam Ai·irabe (11º)' uz1ram-m e a uma· out ra aIdeia,
· que
u n ais nobre dentre t d' ao chefe Cunhambebe (111). ~ste era
u:u ? ª
r -·
·d · d
111
ª
°·
os os chefes. Em sua morada
a 1guns outros e à sua maneira tinham
haviam-se
preparado
unl . l gI ande festa. Queriam tambem vêr-me, por isso ordenou o
unhambebe que .fosse eu trazido para lá naquêle dia .
.Quando vinha me aproximando das choças, ouvi um grande
·:ilax1do; cantavam e tocavam em seus instrumentos de sopro.
Diante das choças estavam espetadas cerca de quinze cabeças,
sobre postes. Eram cabeças de maracajás (112 ), seus inimigos, e
que êles haviam devorado. Enquanto me faziam passar ao pé
delas, contaram-me que as cabeças eram de contrários seus, os

110) - Ariró~ que ainda boje existe como nome da serra que se-
l ~trn, n oeste, o Estado do Rio -de Janeiro do de São Paulo. Nela na'8ce
0 rio tnm bem dêsse nome, que vem desaguar na bafa de Angra doe
Reis. A aldeia de Arirõ está assinalada nos mapas antigos, nessa baia.
1 u) _ Cunham bebe, segundo Varnbagen, significa . "O voar. da
Ih ,, Teodoro ·sampaio impugna essa interpretação e diz exprimir
rn • ~~b • 10 " 0 . indivíduo que fala arrastado". Outros melhora~ o por-
11

o ' ' oc(_ u • nifica "o gago". Houve pelo menos dois chefes
t uguês para dizer que slg rimeiro dêles é 0 de que fala '.Db.evet, po-
indfgenas com êsse nome. 0 P m sua marinha de canoas toda costa
d )roso selvngem que domi~~va S~~astião fazendo arremetidas vitoriosas
desde Angra dos Reis até ~ te 1.ilste é tambem o Cunhambebe de
na Bertioga, Santos e .São ~enlo · 0 depois da chegada de Villegaigno:°
Hans Stnden e morreu de pesii'eul~rd "Villegaign.on", Paris, 1897, pa-
no Rio de Janeiro. Cf. Arthur n or' Weiszflog traz dêle um retrato,
g ina 114. A edição de Varnbage _ P 354 _3 55. o segundo Cunham bebe,
8
reproduzido de 'l'bevet, vol. I, page 'estava em Iperoig e sobre o qual se
foi o amigo do padre Anebieta, qu reve na sua carta de janeiro de 156ü,
poder!\ ler o que o tauma~urgr~a~s~esuitlcas"' publicadas pela Academia
insertn no vol. III, das oa 33 pâgs. 196 e sega.
Brasileira, Rio de Janeiro, 19 • ~e Teodoro Sampaio, significa "gato do
112) - MaracajA, no dtzer
inato".
97
. e êles iriam fazer assim
pensel qu
110rrorizou.
mar11cajás. Isto me foi um dos meu~ guar-
.comigo. ma das choças, que todos ouvissetn ·
·~1d·1 em u
" nossa en t 1' "
"tou e
m voz a lta
"
't"para
~ie achava que era elo
b .
1 .c.i
das à frente e gi 0
portugues · · inimigo em seu poder
HAqui trago o escravo, aJguem tinha um Isto é muito usad~
5
espetáculo vêr-~edco%:itas outras ~~us~o ·chefe, que aí se acha-
e discursava am ª. então ao sitio . , e· embriagado com
"1 Conduzm-me Bav1arn-s ·
entre e esd. outros a beber. . "Vieste. como inimigo
va senta o com disseram· · · · .,
Caul·m ' olharam-me irados, e...
· . ''V'
re'rn. corno vosso in1m1go .
naod pobeber.
nosso?" Respondi: im,
Com isto, deram-me tambem .e vi'do falar muito. Devia
. , tinha ou " ,
Do chefe Cunhambebe Ja· d tirano que com prazer
ser um grande homem, e um gran gens e '
pareceu-1ne · · d '·
q:u~ · ev1a
1
comia carne humana. Um dos :eva disse~lhe assi.ID em su'a lin-
ser êsse chefe. Dirigi-me ,..P.a ra ele, e . . "ÉS tu Cunhambebe·?
guagem, como gostam eles de ,.~uv!!'. ·nda 'vivo". "Pciis bem''
a~nda vives?: "~fr°"'. respo~deu e e,t·1 a1 que és .um hQmem d~
disse eu entao muito ouvi sobre e d .
'
grande fama". Levantou-se e e en ao, "'l t"' passan , o por ·
, . ·. em.... .
·mim
pavonado e muito lisonjeado. S~gundp º·.costume, ,ti;~z1a 1 ·~a
grande pedra redonqa, de côr verde, en~1ada .ªº lab19 . . Al~m
disso tinha um colar branco de çonchas de mariscos - como as
usam os índios à guisa de.. ornato, p~ndurada.s ao pescoço .-
que teria ce~tamente seis braças de comprimento. Por ·tais or-
natos vi que pev~a ~er u~ dos mais nobres. Sentou-se após de
novo e perguntou-:-me qual o plano de ataque de seus inim~gos,
os tupiniquins e ós portugueses. E a seguir perguntou por que
e_u tinha ~uerido atir~ sobre .êles ~a região de. BerÜog~, pois
!inha sabido que eu e~tava empregado como artilheiro · contra
e.les . Respondi que os port_ugueses . ,m e . haviam lá posto ,,e eu
tinha que fa. zer ,. o meu · serviço , . ' ao que repli"co u que eu propr10 , ·
era um portugues. Ao frances que me procur· ·h . , t-"
d e filh o. ~s-P.t t Ih h '' · .
e e avia dito que eu n - ara c
· ' . amou
í· ·,.
en ao
era legítimo português' Eu r 1. . ao pudera entende-lo ·e
, . •' ep 1que1 então· "s· , d d .
ha muito que saí da terra fran . . · . Im; e ver a e,
e"'le, a proposito,, . .
que já tinha ·cesa .. d~ e esqueci '. .a'. lingua . " . n·~sse
cinco portugueseS; êstes todoSªJha ª~º a aprisionai e a comer
franceses, e tinham assim m t"d viam pretextado que eram
d ~ 1. a. min
. h .
a vida por perdid
en I o Ist 0
··
-
·era tao claro que eu
vma. Pude apenas concluir' da e me re~oniendei à vontade di..
. · as suas pala . .·
1
Recomeçou êle porém . , . v~as que devia · mort~r~
Portugueses, pois · a ·1nterro
deviam tem" gar o que diziam d'êle os
·
e-1o gr d . .
an emente. Respondit
98
'' Siln, falam muito d e ti
conduzes contra ~los. 1
e dnH tot•t·( .
. " s.
tioga . un, respondeu ' POl'ét .
n. ngorn fV 'JH
'!\ ·t . l , Ut t'rnu qu o flonipr(
um, como n1e haviam caele; Il'ht cuilt· ~;~l y1cnrom melhor 11< r~
"pturado. DiH~'"" 1: O!<J ~n .Cloreuln urn n
. n1n el n: º'ret.rn V U.t'..
11e
.:'J'-.:-

.~

-~ ...

18. -: A .ê!ldeia de Ariró, do chefe Cunhambebe, onde Staden com as per-


~as blrgddds, se ayistou com o .mesmo, que é o indigena que traz acangatara,
em eta e. en~uape. Essa a/dera, segundo se deduz de Staden e de antigos
· ." J11dpas, ficava na baía de Angra dos Reis . .

<ladeiras inimigos, os tupiniquins, preparam vinte e cinco ca-


noas, e virão logo atacar tua terra". E assim aconteceu.
Enquarito dêste modo interrogava, permaneciam os outros
Pert.o e ouviam. Numa palavra: perguntou muito e contou muito.

99
. tuguês e muitos outros
. , matado rnu1to p~ante isso, toda a bebida
Gabou-se de ter Jª <-nirnigos. D Finalizou, portanto a
ram seus J...I.' rvida. . ' .
selvagens que e t 1'nha sido so choça para continuar- a
que havia na choç~ ara urna outra
entrevista, porque iam P
beber. o filho do chefe . cwm.ambebe
, , lhes de mofa. . e eu · devia assim, corn
L a servi- três lugare5.' · exclamav ·
amarrou-me as pernas em a Com isto riam. e _ a.m.
os pés ligados saltar pela choç . . '" Perguntei entao ao meu
"Aí vem pul~ndo o nosso· manJa:d· se rne havia trazido ;para
. , t. h conduzi o, . . t
amo que para ai me m a ,., que apenas era cos urne
matar-me. Respondeu que ~ao, J:?ªSs. E desataram-me 'as c.or-
. aos escrav.os estrangeiro
tratar assim . _ e de ·mim entao - e ·a:palpar.
· ax,n ' ..
das das pernas. Aproximaram 5 ro da cabeca lhe pertencia
me a carne. Um d'izia · e o couue cantar-lhes
~u .
~
alguma cousa,'
outro~ que a coxa lhe cabia. Tive q · ei ex licar-lhes em sua
e_ entoei cantos religiosos, que p~ec1~ "p Responderam que
língua. Disse: ."Cant~i sobre,º. meu eus Íín a· teõuira A3
o meu Deus era uma imundic1e, em sua gu · ·
palavras me doeram, e pensei co~go: "Ó tu, bom Deus, tens
às vezes que tolerar muito!"
, No outro dia, quando toda a gent~ na aldeia me havia yist'o;
e expandido sua alegria à minha custa, disse o chefe Cunham~ .
bebe . aos meus guardas ' que deviam atentar bem sobre mim~
Conduziram-n:ie depois para fora da choça, a-fim-de recambiar- .
me par.a Ubatuba, onde devia ·ser sacrificado. Zombavam de
mim, dizendo que q?eriam vir logo à cab~na do meu amó ·pará
com~r-~e. e J;>eb~~ Junto. . ~eu amo porem consolava.:.me c.om)
pers1ste~cia, e d1z1a que nao me matariam tão cedo. ·

• 1 ,·

' • / t'

·'·

100
CAPt'rULO 29.

Como os tupiniquins vieram em vinte e cinco canoas,


o que eu havia predito ao chefe, e atacaram a
aldeia na qual eu estava.

19. _ Ataqu~ dos tupiniquins c3 aldeia de Ubatuba.

101
/
tugueses, os tuph:ti-
. lanejavam uma os amigos dos por_º
Eu já havia dito que cu aprisionam~nt Apora vieram êles
quins, .i:iesmo .~11 ~~: !:ü1:1a os tupi.11am~:~ m;nhã a aldeia.
exp. ediçno gu~1.1cco11 ~nnoas e assaltaram rn a atirar todos
vinte e c1n · meçasse
con1 . s choças e co de âníco, e as mu-
Co1no ~ta~c·rns: ~ : assaltados d~ gr~n"V[s me tendes por
11
0
juntos, enchexan1~se ·r Então lhes d1?se. ora um arco e fle-
lheres quisenun fugi . . 'nimigo. Da1-rne ag 'udarei a defen-
u111 português, por vosso ~rras Então eu vos aJ flechas. gritei
e} desatai me as am . . um arco e '
. l8S e }.. ,,- Deram tambem a mim ' era possível, e dizia-
der as e 1oças . ... hem quanto me . nenhum
e atirei à sua moda, tao ~ . . . ~ não haveria perigo .
lhes que precisavam ser c?raJosos~ ar através da es~acAada que
Era minha intenção com isso, esc ~ os. atacaµtes, pois ~st~s I?e
deava as cabanas, e desertar par ' ' eu estava ' na aldeia.
ro . . b' - tambem que .
conheciam bem e sa iam .· . 1 . • •
' guardado demais. · 1 • •

Continuava porem · · ,· d podiam conseguir,


· · · viram
Quando os tup1n1qu1ns. · que . · Assim que se a f as-
·. · na ª - ·
retiraram-se para suas cano'à.~ , e ~o~~m-:se-, . .
taram, fiquei de no~~ sob amru;ras~ , ' ·,, , ,
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· CAPíTULO .·30.
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1 ... • . ' ' ' 1

Como os .chefes se ~en. ~ira~ · ~ . noite, sob o luar~· ".:


1
1 '•
• 1 ''1 ~·

Na noite dêsse .mesmo dia, a,.d ·c~arão. ·da lua; . se, ~e~irain.
os mais nobres no. pátio, . em m~io 'das ,choÇas. .Cop.ferenciaram
e deliberaram quando , d~v~'riam. ·mat.ar"7me. . Condu~ira~-me
1

tambem para áí, escar~ecendb ' qé ·: ll:?;i~ 1 ·: e ~m.eaçanÇlo-me. '.E~


estava triste, .olhava a lua·, e"p~~s·ava .cotn~go: · ~'ó meu Senhor
e meu Deus, tira-me dêste sofr~mento . 'p ara a bemaventurança~' . .
Perguntaram-me ·então por "que· ·fit,~va .sempre·, assim · a ,. lua, .~ 1 , •

respondi: "Vejo nela que · .~s~·a zangada~·'. Pois a cara da lu~


1 '·' ' 1

parecia-me estar tão ter:rív~l" q~~ -. ,I?eus ,µi'9 perd,ôe! - eu 1

••

mesmo supunha que Deus e 'todas as creaturas deviam .estar en..:.


' 1 1 \' \ 1 ' ,·'

!furecidas comigo.,· Nisto . p~rguntou~me . Nhaêpepô-oaçú, um dos


chefes, e tambeJI?. aqueie que me.· queria fazer matar: "Com
~uem está a lua enfurecida?"" Respon.di: "Ela olha para a tua
cabana,-. Con1 isso e"' "it l
. _ . 4'c ou-so e rntou-mc com pulavnw ímpe-
ras. P n1 a concet tar 0 •"rr·o d· .. , , .. · t
E ~ ·1 _ . ~ ' rn~e: 1 n1vez nua SCJO n uu ca..
~na. _ ~t: e~furec1da coin os carij6s escravos". Tambem uma
tnbu d?S ind1os chama-se curiJ'ó. "Sim" a· . ~ êl . t ~ .. sobre
êles c:ha toda d. . . . . ' rnse e .cn ao, ,.,
. .ª
nuus pensar nisto. esgraça. Assim seJa". Esforcei-me por nao

20. - Conselho dos chefes, numa noite de luar, em Ubatuba, deliberando


sobre a morte de Hans Staden, que se vê ao centro, orando. A sua prece,
escrita acima de sua cabeça, diz o seguinte: - "Ó meu Senhor e Deus, aju-
da-me nesta desdita para um fim bemaventurado". - Esta xilogravura é intere-
sscrnte porque mostra os selvagens fumando e no texto de Staden não existe
referência a esse habito.

--- - - - -

103
CAPíTULO 31.

.ndiaram Mambucaba,
Como os tupiniquins ince .
uma outra aldeia. .
. , ·a de que os tupiniquins, após
No dia seguinte ve1u ª notici me achava aprisionado ti-
sua retirada de Ubatu?ª• on~:bucaba (11ª) . Os habita~tes
nham assaltado a aldeia de . no que foi feito prisio-
haviam fugido, salvo um meni~o peque. '
neiro. As cabanas foram reduzidas a cinzas.
Por isto Nhaêpepô-oaçú transportou-se para l~, pois eram
seus parentes e amigos; e queria ajudar aos hab1tant.es a re-
erguer suas choças. Levou consigo todos os. seus amigos que
moravam em sua cabana. A sua volta queria trazer barro e
farinha de raizes para a festa, na qual eu devia ser devo·r ado.
Nhaêpepô-oaçú podia dispor de mim livremente e :f ez-me
sofrer ~uito. Quando se foi, recomendou ao Ipirú-guaçú, a quem
me hav1a mandado de presente, que devia vigiar-me bem.
' Demoraram-se mais de quatorze dias e reconstruiram · tu<io
de novo. · ·

- L ugar que os .
113)
A~gra dos Reis. Existem mapas atuais ai .
ne~ro. Varnhagen traduz outros dêsse nomenda 1S.ss1nalam na bala de
pa10 quer que signifique " o vocâbulo Por "f no Estado do Rio de Ja-
a Passagem''. ortaleza'' e Teodoro Satn
'104
CAPfTULO 32.

Como veiu um · d
. b navio e Bertioga, informando-se de
mim, o tendo porém apenas respostas lacon1cas.
,., .

· Nesse ínterim vei · . ,. .


- 1 u um nav10 portugues de Bert10ga e an-
corou .n_ao onge do lugar onde eu me achava aprisionado. A
gua:niçao de"! um tiro de canhão no intúito de que os índios o
ouvissem e ai viessem para . falar.
Quando os .selvagens viram o navio, disseram-me: "Aí es-
t~o os t~us amigos, os portugueses. Querem de certo saber se
~m~a ,,vives,_ e talvez resgatar-te". Respondi: "Deve ser meu
rrmao . Pois eu .sempre presumira que os portugueses, que
passassem por esta região, perguntassem por mim. A-fim-de
que, porém, os selvagens não pudessem pensar que eu era um
português, já lhes havia contado de antemão que entre os por-
tugueses vivia um meu irmão, que era tambem um francês. E
como o navio realmente vinha nêsse momento, disse que po-
deria bem ser o meu irmão. tles estavam persuadidos, no en-
tanto, de que eu era português, e aproximaram-se tanto do na-
vio que podiam entender-se. Os portugueses perguntaram o que
havia a meu respeito, e recebei;am tal resposta que não pros-
seguiram as perguntas. Pensaram certamente que eu estive~se
morto, e retiraram-se de novo.
o que pensei, qua.ndo vi o ,~avio afastar-se,, só Deus sab~!
Os selvagens porém d1sse~am:, Acertamos ~everas com o pri-
sioneiro. Já mandam navios a sua procura .

105
CAPt~ruLO 33.
,. pô-oa.çú de Mambu.
Nhaepe
f . ,.,
Como o irn1ão d~ che e iro que seu 1rmao, sua
·u e queixou-se a 111 t estavam doentes.
ca ba ve1 aren es D
mãe e todos os outros P ir do meu eus
Exigiam-me conseg~ os de novo.
que ficassem sa
dos selvagens que., em
~perava diàriamente a volta tar-me. Um dia ouvi uma
Mambucaba se preparavam para mTa. medo ·J·uigando que já
'
vozeria na choça do chefe ausen,te · iveostume:
. ' qu~ndo
. 1
aguem
p ·
tivessem regressa d o. ois êsse e seu
d. c , ·
preparam seus am1gós, · '
se ausenta, basta ser por quatr~ iasÍga Não demorou rriu#o,
por ocasião da volta, uma vozea" ~ ~m - ~ de um dos teus dois
veiu-me um dêles e disse-me: irma h m muito 'doentes"
amos chegou e conta que os outros se ac ª d f · · ·1 ·1 ·
.
A1egre1-me - e pensei:. Deus a gora preten e azer
entao . . ,: .,,a. o~
m -
ma cousa. · · d ·. 1,
Logo depois veiu em pessoa o, irmão de ~eu seg~n . ~, ~~~a
minha choça, sentou-se, pôs-se a clamar e disse que . seu ~rma.o,
sua mãe, os filhos do .seu irmão, todos ti~pam fi'cado d?entes;
seu irmão Nhaêpepô-oaçú m'o havia enviado e me ~a;ndava ' di-
zer que eu tinha que conseguir do meu Deus que se tornassem rt • .·
de novo sãos. Acrescentou êle: "Meu irmão · acha que teu Deus
está irado". Respondi: "Sim, meu Deus está 1rado ' porque{ teu
irmão q.ueria comer-m~~ e foi pa:a ·Mambuca~a para lá · prepa-
rar a_ minha morte. Vos ·asseverais que eu sou· um português, e·
eu na~ o sou absoluta1!1ei:te. Torna ao teu 'irmão . .· · ~le ' , deve
voltar a sua choça. Entao implorarei ao meu Deu · "l
" A ·t d . A s para que e e
sarde .. ~s oHres~on eu que ele estava demasiado doente e não
Pº..: ena vir. avia reparado porém e bem b. ..
mao, mesmo em Mambucaba f · . ' _ sa ia, que o seu ir-
Por fim lhe disse eu: "Teu' i~~~a f~ao, ~e :u apenas o quisesse.
voltar à sua choça e curar-se-á aí icara tao forte que poderá
resposta regressou a Mambucaba comJ?leta1!1ent.e ". Com esta
lhas de Ubatuba, onde eu estava: que fica d1stB;nte quatro mi~

106
CAPíTULO 34.

Como o chefe doente Nhaêpepô-oaçú voltou para casa.

,Depois de al~ ,dias, voltaram todos doentes. Nhaêpepô-


o~çu f~z-me conduzir a sua cabana e contou-me como todos ha-
v1~ fic:ado enfermos. Dizia êle que eu já o soubera de ante-
mao, p01s se lembrava ainda que eu lhe havia dito que a lua fi-
tava. irada sobre sua cabana. Quando assim o ouvia falar, refleti
comigo: Que eu tenha desta sorte aludido à lua naquela noite,
deve te~ a7ontecido _pela providência divina. Alegrei-me muito
e pensei amda: HoJe Deus está comigo!
Nessa ocasião lhe disse: "É verdade. Ficastes todos doen-
tes porque tu me querias comer, embora . eu n~o seja teu ini-
migo. Disto vem tua infelicidade". E êle ordenou que nada
deviam fazer-me, se êle ficasse de novo são. Eu porém não sa-
bia o que ·de melhor devia pedir a Deus e ponderei: Se ficarem
de novo sãos, matar-me-ão do mesmo modo; se, ao contrário,
morrerem, dirão os· outros: deixái-nos matá-lo, antes que atra-
vés dêle ainda mais infelicidade cáia sobre nós. E assim prin-
cipiaram a discutir. Abandonei-me pois à vontade divina. ,
Entretanto como o chefe me pedia encarecidamente que os
tornasse todos sãos, fui de um a um pondo-lhes a mão sobre a
cabeça, como de mim exigiam.
Deus porém quís diversamente. Morreram. Primeiro uma
criança, depois a mãe do chefe, uma velha mulher, que preten-
dia aprontar as vasilhas nas quais se iria preparar a b~bida para
o banquete da minha morte. Depois de alguns dias morreu um
irmão, a seguir uma outra criança e por fim o irmão que me
havia trazido a notícia da moléstia.
Como o chefe visse então que seus filhos, sua mãe e seus ir-
mãos tinham morrido, teve muito medo de que êle e suas mu-
lheres tambem morressem. Pediu-me que dissesse ao meu Deus,
quisesse êle agora abrandar sua·· ~ra e conservar-lhe a v~da.
Consolei-o e animei-o para que nao temesse nenhum perigo;
mas quando de . novo se restabelecesse, não ousasse pensar

107
,., e or denou
. tambem
. n a
.. e ue nao, ssern de mrm, em
e enW~ . 1 scarnece ainda doente, sa-
pisse êl ao e t xnPº · 1
00 ~a:~·-~7; caba~~e:u;i:Ou alg~:su:s rnun;;:~~:· J~e ;ilfu~;
cm
t os .
ameaçassem
. devorar o urna rerarn ito
assirn corn igos rnor ·t sofrer mu .
entretanto, seus arn '<ltn fe1 o
ran do era Dos e haV1':..
mente adoec . tambeill rn
ainda outros, que

21 _ Staden preparando-se para ampar~r os doentes que chegam. ~tes mor·


;eram , no entanto, e estão sendo enterrados em e.ovas junto às cabanas.

Havia aí ainda mais dois chefes em duas outras choças.


Um se chamava Guaratinga-açú, o outro Carimã-cui (11.' ) . So-
nhou o Guaratinga-açú, que eu tinha ido a êle e dito q~e êle
ia morrer. Em vista disso, v~iu-me uma manhã cedo e expôs·
me sua aflição. Consolei-o, não haveria perigo nenhum, xnas

lH) - "I<'arlnha de carimtl"' se~un<lo Teodoro Sampaio.

108
não devia tambem querer mat
tsem. Respondeu que não e ar-me, nem aconselhar tal a ou-
8
prisionado não me n1 ata'sse que ~e as pessoas que me haviam
al e mesmo que êles m m, nao me queria tambem fazer
rn ' e matassem, não comeria nada de
rnun·
Havia tambem o outro chefe C . _ .
irn 0 que muito 0 ate . ' arima-cu1, sonhado algo de
rn cle comer, e narrou- rronzou. Chamou:me à suà choça, deu-
me t me sua preocupaçao· contou igualmente
corno ou rora, numa expediça- 0 . .' . .
.. H . · guerreira, tmha apris10nado um
portugu. .es. avia~o matado com suas próprias mãos e comido
tanto de}e 9-ue aye agora por isso lhe estava doente ~peito. Em
c.onsequencia, nao 9ueria c~mer mais nenhum. E agora tinha
tido um sonho horriv;I comigo, dizendo que necessáriamente ia
morrer. !ambem a ele falei que não existia nenhum perigo,
apenas nao comesse mais carne humana .
.. As mulher~s velhas, de diversas choças, que com seus arra-
nhoe~, pancadas e ameaças de devorar-me, muito me fizeram
sofrer, chamavam-me agora "chê-raíra" isto é seu filho, e pe-
diam: "Não nos deixes morrer. Tratan'ios des~e modo a ti por
que pensamos que eras português, contra os quais temos rancor.
Já aprisionamos e comemos tambem alguns portugueses, porém
o seu Deus não se irou tanto como o teu. Reconhecemos que tu
não és p~rtuguês".
Assim deixaram-me por algum tempo em paz. Não sabiam
ao certo pelo quê me deviam ter, se português, ou francês; e
diziam ' que tinha uma barba vermelha como os franceses; já
haviam tambem visto portugueses, mas êstes tinham todos
barba preta.
Depois do terror que a morte de tantas pessoas causara, e
depois que um dos meus amos se rest~beleceu, não falaram
mais em me devorar. Vigiavam-me porem do mesmo modo e
nunca me deixavam andar só.

-~---

109
cAPí1~uLO 35.

oroendara aos índios


" que rec 1 .
Como voltou o frances, edí-Ihe que'. i:ne· ~vasse
q ue me comessem, e P os ,porém, .nao .m e
. .
coms1go; como os .
meus aro ·'·
1·bertar. ·, ,..., ·. '. .
queriam 1 . . .~
. 1 ·\ '"1 .

', , ·que me · deixé;lra, ,,.para,


Já contei do francês Caruata-uara · 'eram amigos· do's .:fr~n-
, . panhavam e · . . . . ~.. ,. .
com os ind10s 9-ue me acom ,· u~lidade de pe~~~' ffi.~~C~u:~~l~S
ceses, colher prmenta, e uma .q . ,. " · . · . . ., . , · . . _,.. ,
de comércio dos selvagens. . ·· ·· , ' . ·· • •

. . , 0 0· ões onde fund~avarp. ,. se~~ . 1 n~- 1

A-fim-de regressar a~ P ~ ~\ 5 ) tinha .êle que vir por Uba-


vios, para Manguape e Niteroi , 1
hancionara aquela ..ocasião,
(. • ' ·

tuba, onde eu estav~. Qua~d<;> me a h . essem os .índios de-


não pensou outra c01sa senao que me ouv . . '. .
· · lhes havia mesmo recomendado, e . du,r. ante
vora dO, pOlS ISSO ·: • · ·h , ºd · morto ·
todo o tempo da 'sua ausênci~ ~e tin a 1 o por .
t'
1

1 1 ' • ' 1

Veiu procurar:.m~ e~ '·mil'.iha' choça e dirigi':1-me . ~ ~~layri~


na língua dos nativos. .A sua. pergunt~, se eu ainda VlV~B;, . r.~s­
pondi: ''Sim, e agradeço a J?eus1 por i:ie have~ d~a~t.e .ta~~o
tempo preservado". tle devia ter ouvido dos ind1os o ··que se
havia passado nêsse ínterim, e como e'u' naquêle tempo · ti~ha
permissão para andar de .cá ·e de :1a ·seµi aniarr~, conduzi~o a
Um lugar onde estivéssemos ' sós, pois ' os 'nativos 'não ' deviam
o~vir nossa conversação, . e lhe ...disse·: "·Vês· ··a ssim:, que Deus
a~nda me ...conserv~ com vida.. ~ao sou .tambem .português, mas
sun alemao, que na~fragu~1 com os ·e spanhóis, vindo dêste
mo?o entre os portugueses. Co~.ta · ·· pois isto aos selvagens, e
mais, que faço P.arte dos te1;1~, am1~?s. Leva-me contigo lá ond~
ancoram os navios franceses ... Pois receava ·" l -
cusasse, d e f a t o· t ornariam
. . os. indios
, tud . que,
. se e
. e se re
matariam, se fossem assaltados de ódio. o por mentira, e me

lllS) - Staden grafa "Iterroenne" T


"enseada''. · eodoro Sampaio diz significar

110
Exortei-o trunbem
se não tinha no corp
11
ª
língua dos ti
ssdo que depois de to u~11 coração cl'ist~1n vos e porgut tcl-lhc
. . ue n1e matasse s a vida Viria Utna o o,. ou se nno hnvin pon-
q ra de fato p ~- A_:rependeu-se ent_uba, qunndo nconselhou
se or ugues, que e. . ao e disse que me supu-
os fr~nc~se~ enforcavam todo ~run celerados tão nefandos que
na provincia do Brasil. Asshn quele que co~segulam npnnhnr
~eviam os franceses adatar-se ao procedem. E acrescentou. que
tir o modo pelo qual tratavam s selvagens, tinhatn que adm'i-
franceses tambem os inimi .0 °.8 seus contrários, pois eram os
A a· .
meu pe ido disse êle a 0 . .
g s Jurados dos portugueses.
nhecido bem a primeira vez ~ indios que não 1ne havia reco-
fazia parte dos amigos dos f;a n1as q~e eu era . da Alemanha e
.sigo ao porto no qual e t nceses, que queria levar-1ne con ..
ram os meus amos· nã s a~am os _seus navios. A isto replica-
ª menos que viess~m em o, nao queriam entregar-me a ninguem,
lhes trouxessem um . pessoa
.. meu
. pa1,· ou meus u· .rnaos,
-:- e
navio cheio de n1ercadorias principalmente
n1a.ehha d os. ' espe lh os ' faca s, pent es e tesouras, 'e lh'as -desse1n.
p
ois aviam. me encontrado em terra dos seus inimigos e eu
lhes pertencia. '
Quand? o francê~ ou':iu tal, disse-me que eu entendera
bem que nao m~ queriam libertar. Roguei-lhe então, pelo amor
de Deus, que viesse, buscar-me co1n o próximo navio que che-
gasse e me levasse a França. Prometeu-m'o e recomendou aos
selvagens que me tratassem ben1 e não ine matasse1n. Meus
amigos viriam logo buscar-me. E com isto se retirou.
Depois de sua partida perguntou-n1e un1 dos xneus amos,
Alkindar-miri (não era o doente), o que Caruatá-uára - co1no
os índios chamavam o francês en1 sua língua - n1e havia dado
e se êle era meu patrício. Respondi afirmativamente à última
pergunta. Zangou-se êle com isto e perguntou: "Porque não te
presenteou então com uma faca, para que in'a pudesses dar?"
Quando todos se curaram, reco1neçara1n a murn1urar de
mim e disseram que os franceses vali~m quase tão pouco co~no
os portugueses. Isto era de novo muito embaraçoso para mun.

- - ----

111
CAPíTULO 36.

m prisioneiro e
devoraram u
Corno os selvagens ·go à festa.
levaram-me const

· · comer Um Prisioneiro
d
numa
· ·
. depois. queriam
Alguns dias ) que .
ficava a cerca e seis bm1-
.
116
aldeia de nome Ticoanpe ( . ' . ha cabana foram tam em
lhas distante de Ubatuba_. Da ::;::mos
para lá em uma canoa.
muitos e levaram-me consigo. V J t nci·a à tribu dos mara-
.
O escravo, que queriam co mer ' per e
cajás. uma bebida de raízes de
Conforme seu costume, prepara:roem. sómente depois do
abatí quando querem comer um o '
festi~ em que bebem é que o matam. d f t'
. h
Como se aproximasse a ora, u1 a f · ' tarde ' antes o es im,
,,
. . lh
ao escravo e e isse. a· . "Estás assim aparelhado para
'd d t d morrer .
"
R 1u-se e"1e e r espondeu·· "Sim' estou bem muni o ' e t u o, ape-
nas a mussurana não é bastante longa. Entre nos er:ios m:
Ihores ". Chamam mussurana a uma corda de algodao . . malS
.
grossa que um dedo, com a qual são amarrados os pr1s1onerros.
E sua corda era curta, de mais ou menos seis braças. Conver-
sava, como se fosse para uma feira. ·
Trazia comigo um livro em língua portuguesa, que os ín-
dios tinham achado em um navio que haviam conquistado com
o auxílio dos franceses, e que me haviam dado. Li êste livro,
quando abandonei o prisioneiro; êle fez-me muita pena. Por
isso voltei de novo · a êle e dirigi-lhe mais uma vez a palavra,
pois os maracaj ás eram amigos dos portugueses: "Sou tambem
~ prisioneiro, exa~amente como tu, e não vim aqui porque
qmsesse comer de. tr, mas m~us amos trouxerani-me consigo".
Ao que retrucou ele que sabia bem no's na- , arne
· 1he disse
h umana. Dep01s · '
que devia ter a"n· o cormamos
· e ·am
imo, pois comer1
~
116
) - Pode ser má. grafia de Ta
gra dos Reis. Teodoro Sampaio escr gua~ 0 .u Taquarí, ambas em An-
" Na água do p~ço''. eve Tiquaripe'', que traduz pc>r

112
,1 'nas a sua carne · seu ~ , .

nd ' v~ll· tH muem
a. . '
o espfritesp1r1t
d ·
o iriu a Utnu t. . ...
1 crgun to u êle se isto era o a nossa gente e 1:ºu1 ; a .r~[{lllo, . p~·u
. verdade R a 1 tt mmta ale gria
!1le que nunca h. avia visto D . eferi que sim e res ondeu~
Deus n a outra vida e deiv . eus. Concluí dizend P .
. 4e1-o quand 0 o que veria
Na noite seguinte hou terminou a conversa
t ve um f t .
Jentamen
- e que arrancou pe d aç ord e vento e ·sopro u t-ao vio- .
En tao se zangaram os ínct1·08
, · , · .
? 8 0 teto da nossa cabana
comigo e d'1sseram em sua língua:·
· Aipo ma1r anga1paba ibit,
mau,' o san t o, f o1· quem mau dguasu om ou " . Isto é: O homem
olbou êle nas "peles do trov1: 0 ~u 0 ~ento, pois durante 0 dia
E que eu o havia provocado ª • Assun aludiam ao meu livro.
amigo dos portugueses e e~ porque 0 escravo era amigo nosso,
máu tempo, impedir a' festa e~~erava talvez conseguir, com o
nhor, dizendo: "Senhor tu m. etste transe pedi a Deus, e Se-
serva-me tambem daqui' por diant e ens,, at'e .aqui· preservado, pre-
dernente contra mun· • e · Pois murmuravam bcrran-
Quando raiou o dia 0 tem 0
muito satisfeitos. DirigÍ-m Pt_ era belo; beberam e ficaram
e en ao ao escravo e lhe disse. "O
v~nto forte era Deus. Êle quer Ievar-t .,, ·
d · f · AI . e para
cli a epo1s 01 e e comido. Como isto se passa s1 . Ao segundo
b . ,
tuio nono do segundo livro. ª
' 8 ere1s no cap1-

CAP.fTULO 37.

O que aconteceu na volta, depois que os selvagens


comeram o escravo.
Quando se acabou a ,festa, retrocedemos às nossas habita-
ções em Ubatuba. Os meus amos trouxeram um pouco de carne
~ada consigo. Ventava e chovia forte. Por isso levamos três
dias em caminho, ao passo que se póde percorrer a distância
em um dia. Quando, na noite do primeiro dia, erigimos caba-
nas para acampar no mato, disseram-me que eu devi~ cuidar
d~ que não chovesse. Lá estava entre nos um menino, que
ainda tinha um osso da perna do escravo com alguma carne, e
0 comia. Disse-lhe que devia jogá-lo fora. Zang?1:1-se, e todos

os outros, comigo; disseram que tal l~es era legitimo pasto, e


que devia dar-me por satisfeito com isso.

113
,. dias nos aproximamos até
viagem de tres itações, não podendo pros...
Depois de lll!1ª das nossas hab muito altas. Puxaznos
um quarto de n11Iha as ondas estava.Illos poder trazê-la à casa
seguir porém, porque terra e esperáva.J? te Permaneceu poré~
por isso a canoa P~:mpo no dia segu~ntão os selvagens 'Vol-
se houvesse bom Resolveram canoa mais tarde
igualmente tempestuoso. vir buscar ª ,
tar às habitações por terra, e
quando 0 tempo melhorasse. e 0 menino continuou a
,
Antes que parbssemos, . d comeram, · Prosseo~uos,
fora depolS. ani'l'Y\

roer a carne do seu osso, atiran" êde"o-o falei entao,


- " na<?
- queneis · .
e logo o tempo aclar~u. V ' eu Deus estava irado por-
acreditar-me quando disse que 0 m ,, ,, Sim" disseram os ín-
. . . carne do osso . ' .
que o menmo,.. comi~ a .d sem que tu o houvesses visto,
dios, "mas se ele a tivesse comi 0 t ,, E assim ficou.
teríamos tido bom tempo, por cer 0 · . • d
Alkin d
· , h rguntou-me · ar, um ·.os
Quando regressei ª c ?ça,. pe como tratavam os seus
meus dois amos se eu havia visto agora . .·
·inrm1gos.
· · ' lhe di·sse.· "Sim · Que os comais,
A o que "~
parece-me
,
medonho· não tanto a matança". Respondeu: sse e o cos-
tume ent~e nós. Com os portugueses fazemos o mesmo".
~ste Alkindar me tinha em grande antipatia e teria visto
com bons olhos que o Ipirú-guaçú, a quem me havia mandado
de presente, me tivesse matado. Como já se narrou, lpirú-
guaçú lhe havia presenteado com um escravo para que o ma-
tasse e ·obtivesse com isso mais um apelido. Portanto prome-
tera Alkindar mandar-lhe de presente o primeiro inimigo que
apanhasse. Ainda que não lhe competisse matar-me tê-lo-ia
feito de bom grado. Mas o seu irmão sempre tal evitava re-
ceando que mais calamidades o pudessem alcançar. .
Assim, tinha o mesmo Alkindar
· ameaçado
. ·· novament e de
matar-me, antes que os outros me tivessem tr . .d . 1 .1
onde devoraram 0 escravo E d az1 o ao oca
tuba, ficara êle, durante a· mini~an °.
eu. agora voltava a Uba-
tes: Precisava de repouso· por a1 ausencia, c~m os olhos doen-
e dizia-me sempre que ~u de . gum t~mpo nao podia ver nada,
ficassem os olhos outra ve ~1 ª pedir ao meu Deus que lhe
, d . . z saos. Eu est· ava pronto para ISSO,
mas epo1s precisava que não . .
.
teu-o. Alguns dias mais tard rna1s me desejass.e mal. Prome-
e estava curado.

114
--
CAPíTULO 38.

Como os portugueses mandaram de novo


um navio buscar-me.
Ao quinto mês em qu , .
, e eu estava entre os 1nd1os (117),
chegou a1 novamente um navio da ilha d - v· t É
. . . e 8 ao icen e. uso
d?s. portugues:s VIaJar J!ela terra de seus inimigos, bem mu-
wc;rados todavia, e co~ eles comerciar. Dão-lhes facas e sega-
derras em tro.ca de farinha de mandioca, que os índios têm em
grande quantidade nalgum.as regiões. Empregam a farinha para
alimentar os numerosos escravos que mantêm em suas planta-
ções de cana de açúcar. Quando chegam os navios dos portu-
gueses, dirigem-se para êle um ou dois índios numa canoa, e
alçam-lhes as mercadorias tão depressa quanto possível. Pedem
então o · quê querem em troca e os portugueses lh'o entregam.
Enquanto ·ambos estão no navio, conservam-se algumas canoas
cheias .d e selvagens à distância e . observam. Quando a troca
comercial termina, remam muitas vezes os selvagens em dire-
ção do navio, escaramuçam com os portugueses e atiram-lhes
flechas. Depois disto voltam.
A guarnição do navio que vinha ~e São V~ce~te deu um
tiro de canhão, no intúito de que ouvissem os md1os que ~
navio aí estava. ~stes foram para lá, e .pergunt~ram por mun,
se eu ainda ·vivia. Responderam q~e _srmh. ~eddiram os cfºi:t~-
. tinham um ca1xao e e10 e merca or1a '
gueses para ver-i;ie' _ ,. t bem 0 qual se achava a
que trazia meu irmao, frances am '
bordo com êles. . rtuguês por no-
" . ntrava no navio po ,
Um frances que se enco ºnh mesmo sido meu camarada
. Mº de (118) ti a . -
me. Claud io iran . '_ selvagens como meu irmao,
antigamente. Apontei-o entao ~·05 e no navio e perguntasse
dizendo-lhes que . êle . talvez, es/~~sem uma viagem.
por mim, pois já havia aqui es ª
____· _ , · do que jA expusemos.
0
117) ,·M. d
. de 3·unho de 1554, segudn de Sanabrla e acompa-
- eaos t daarmaa
118) - Havia sido tripulan e t como j4 referimos.
nhar.a João de Salazar a .São Vicen e,
115
am-me que meu
ter r a e. narrahr
,., e e1. o de ,mercado-
do navio em um ca1~a~ "Conduzi-me para
D sembarcaram
~ovo
trazia-i:ie eu entao. -
i~mao ueria mmto ve falar com dar-lhe, qu
. - eviera de
Os portugueses
er-me. Disse meu irmao. ando estiver de
nas e q . que possa ecornen
lá perto, paiª d. m Quero r
não nos enten e .

22 ~ -- . ·-- - -
_ St•den de pé no c•no•, P•rlamenta com a tripulação de um
· ' ' ·,, : ' navio português, chegado a Ubatuba.
1' '

volta, que dê parte aó nosso pai, para que venha com illn navio
biiscar-me, e traga :ip.uitas coisas". Concordaram com isto, mas
receavam que os portugueses pudessem entender-nos, pois :pr;·
tendiam, por vol~.'.1 de agosto, efetuar unia grande exped1çao
guer'reira na reg1ao de Bertioga, onde me haviam capturado.
Como eu lhes conhecia todos os planos, temiam que pudesse
t16
ntl'ni~o:'i.-. lu~ r 'lnta11do alnut"'1 , _.
nH<l n ' i
n1 'l>t1t·n- ª b . " cot8a p .
' ,, ·, e ...08 ··
portttgueses. n· ti- orem retruquei'·. "N-ao,
nlw e { u ln "U lt1nuo". E11tã (j.. o entendem a língua mi-
disU\n 'Ül d, urnn pedrada d o _1e1?-"1aram conduzindo-me até à
- ,1 ' . D ... ·f. - o llav10 n.
l'td.rc s. llig -n1e à gent d ' u, como sempre andava
l ku: esteja co11vosco, queri'doe . e ~ordo, dizendo: "O Senhor
· · D· · · s irmaos A
tOllH!~º· · 17. l que sou u 1n fra 1 " · penas um de vós fale
t'n(.fü) un1 dêles, João Sanches (~;9s), e nad~ m.ais". Principiou
1
\l\ "'iu bein e falou·
..... ' •
"Meu que ·d' um · b1sca1nho
- que eu co-
·11 .•1\- ·io por tua causa · Na-o sa b~ri
0
iam o irmao, ·viemos
· com êste
morto, pois o primeiro navio nenh s se ":1y1as ou estava_s
A,'< r·l nos ordenou 0 com d ~ma noticia trouxe de ti.
·- . _, an ante Bras Cubas (12º) em Santos
q u ' 1ndagassemos se ainda estavas com .d C nh d '
ninda vives, precisamos saber prun·e1·rov1 a. ~ d~cen o que
d .t . -- se os m 10s querem
v~~;l er- e, se nao querem, precisamos capturar alguns dêles,
n~fun-de resgatar-te".

~esp01~di: . "Poss~ Deus recompensar-vos, por essa ação, na


-tenudade, pois aqui estou em grande angústia e sofrimento,
e ainda não sei o quê de mim vão decidir. Já me teriam devo-
rado, certamente, se Deus não o tivesse impedido de maneira
especial". Disse-lhes ainda: "Não me venderão tambem. Não
v s ocorra entretanto a idéia de dizer óutra coisa senão que sou
um francês, e dai-me, pelo an1or de Deus, algumas mercado-
rias facas e anzóis". Isto fizeram. Um dos selvagens dirigiu-se
nmn' bote até o navio> indo buscar as coisas.
Quando vi que os índio.s nã~, me perr:iitiam falar mais
teinpo con1 os portugueses, disse: Acautelai-vos bem. Os sel-

- - 110) _ _ Piloto-mõr dn esquadra de Sanahria, do qual_ jâ fizemos


lJH:! u ~ão . Luis Roque Gondra, nu su~a obra ' citada.' parece. nao ter repa-.
., · , . - -d . Hans Stnden, que aproxima mais ou men_os a A

1,uJo estn inc.Iica.ç.uo e . Europa levando para Lisboa


dut.u dn pnrtidu de J oilo Sanches piam ªiém de t;ma carta de recomen-
'tão mór vlcent no, .it
eo mun 1cn cÕes e1o cap1 ! - • R ferido escritor dá como tempo da
dn~lio puru o r.011de dn Cnstnnheira. t ~ de março de 1555. Cf. obra cit.,
1>nrtldn de Snnches, alguns mêses an e.ue devia ter em muito boa conta
PÍlg-. •1G4. Cerromente Joüo Sanches, q a Europa sem uma última ten-
n i-Iuu-s Stnden, não qui~ regressar l~arnFeita esta e nada tendo conse-
latlvu. para salvá-lo dos tupinnmb O'~ depois, isto é, cercR de julho de
guluo, partiu pura 0 seu destino loº
ll354. la noticia no nosso tra-
al damos amp - l
120) - Ilrús ·Ou bus, do qu vicentinos", estn va entao pe a se-
hnlllo j(t citado ''Os capitíles-mores Substituira Pedro Ferrazi Barreto e
.~:unrlu vez governando n cnpltnniu. 0 • que êste seu segundo gov.erz:o
Por esta htdlciir·ilo de Staden, corrioim 09 até 1556, quando o substituiu
~· .
~e lulciou cm meados de 1 554
. · Governou
t 0 a 20 de ju1ho dê ss e ano ·
.Jorge Ferreira,' t}Ue vemos nêsse pos
117
·; dição guerreira contra Ber-
. ma e:xpe . ,
vagens planejam de novo u , . dios tarnbem se preparavam
. , que
tioga". Retorquiram . os seus Id
in ·a na qua1 me conservavam .
·
muito e atacariam · t mente .a ª ter
JUS a
ei bórn animo.
,.. · · D eus dºispo-
prisioneiro. Devia eu apenas rn~ue eu visse be~ que em nada
ria todas as coisas pel~ mel?or · omo mereço ÍSsO pelos meus
me podiam ajudar. "Sim, disse ~u! ~e castigue do que na yida
pecados, é melhor que Deus aqui. tire ·desta aflição". .
eterna. Rogai a Deus para que . ~e . . · .
. . .. · Senhor Deus. Queriam amda con-
Recomende1-os entao ao . . . ,., , me . permitiram . ·por
versar mais comigo·
· ' mas os nativos ·
"l · voltaram:µao . · comigo
. . para· ·as
mais tempo entreter-me com e es, e .
cabanas. ,
Aí tomei as faCas e os anzói~· e dei-Ih'os, dizendi>:' ' "To\fas .
estas coisas deu-me meu irmão : o .francês". Perguntarain tudo
o que havia êle conve~sa.do co~.igo. Respondi ·~ue havia · orde-
nado a meu irmão que devia tratar de escapulir-se dos pqrtu-
gueses, viajar para ·noss.a . patda ·e voitar em um nav:i:o '. com
muitas 1!1ercadorias, para ~ vir . . buscar-me. Pois êles, os 'Índiqs,
eram ge:ite ' ord~~ra . e tratavam-m~· bem; por isso desejava '
1
re-
c~mpensa-los, . quando o navfo vi~sse. , Precisava eú. enganá~los
1

d~ste modo, s~mp,re. b ~elhor possível e i~to muito os agrad.OU.


i:epois dêste fato se ,entr.~diZi~m: "~le deve ser mes~o" um
"-:a.I?-ces. Q~eremos .trata-lq µielhor daq~i por diante" Assim
VIVI eu mais .algum tempo :entre êles persuadind0 .
ine tratassem , bem, pois log.0 ~m nav'i· . . -o.s para qµe
· ·,··. o viria por mmh ·
D e q.ua~do .em ·quando me · ~evavam tam ,, . . a caus~.
de aJuda-los se tinhan} algum quefazer.be~ ª flo~esta, e havia
1 '

1 1 ' ;·!
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• :1 J 1
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1 • • 1 !
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1 .
' '
'
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1'1.

•'

118
CAPl'rULo 39.

Como os nativos tinharn . .


continuo me caluniava c:nsigo º8!- escravo que de
me houvessem matad 0 que teria apreciado se
morto e devorad 0 1og~. ~le próprio foi
em minha presença.
Entre os índios vivia um . .
tambe~ eram hostís aos am. cativdo, . da tr1bu dos carijós, que
servo dêstes mas fugira igos os portugueses. Tinha sido
' e os selvagens n- t ·
que se refugia entre êles ao ma am nmguem
f ·i·1 , ' ªmenos que cometa algo de invulgar
0 ug1 ivo e conservado como escravo e dev , 1os. .
~ t · ·, e servi-
, J!JS et car110, que havia
. J. á três anos v1v1a
. . ent re os tupmam-
.
bas,
.· .con
·· ou•t que me tinha visto com os por t ugueses e que eu
at·irara tmui
. d as vezes sobre aqueles
. _ ' quando os mesmos l'a h a-
viam es a o em suas exped1çoes guerreiras.
Os portugueses tinham alguns anos antes morto a tiro
um .~os chefes .d~s tupi~ambás, e o carijó afirmava que eu fora
o atirador. In~1stia continuadamente com os índios para que me
matassem, pois eu era o verdadeiro inimigo, êle o havia visto.
E mentia J?.isto tudo, pois que já estava, havia três anos entre os
tupinambás e apenas um ano se tinha escoado desde' a minha
chegada'· a São Vicente, de onde êle havia fugido. Pedia eu
seippre. ·a Deus que me protegesse contra esta calúnia.
, No ano de 1554, por volta do sexto mês do meu cativeiro,
ficou o carijó doente, e seu amo pediu-me para ajudá-lo a-fim-
de que sarasse e pudesse apanhar caça para obtermos alguma
coisa que comer. Pois eu sabia bem, disse o seu amo, que êle
me dariia uma parte, se o carijó lhe trouxe.sse caça: Se porém
eu achasse que 0 escravo não sararia, queria ma~da-lo de pre-
sente a um bom amigo, para que o matasse e obtivesse uma al-
cunha com· isto.
. Os índios têm dentes de um animal, que chamam paca.
Afiam bem um dêstes dentes e com êle cortam o lugar da pele
onde 0 sangue Se acumula. Brota então o sangue, como quando
se sangra alguem.
119
23. _ Acima, Sta~en tentando sangrar o escravo . carijó doente. Ao \~do
esquerdo, o escravo carijó ao se~ executado com go\pe de ibirapema e abaixo,
o esquarteiarnento do seu corpo.

conseguido, como bem haviam visto, e disseram: "Vai ·morr;r·


Queremos matá-lo, antes que morra". Ao que retruquei: "Nao,
não façais isto, talvez venha a sarar".
De nada valeu porém. Arrastaram-no diante da choça do
chefe Guaratinga, e dois o mantiveram, pois estava tão doente

120
. e beu o que q 11 •
q ue . não ·.perc
, b"d . er1am fazer d ·1
haviam mcum l o da matan .
4

e e. O homem, a quem
ça,
cabeça, que f ez s a1, tar os miolos D
ve1u e deu
. - lh e uma pancada na
da choça e queriam comê-lo. A.d e~o 15 o h~rgaram em frente
tratava-se de um homem q ;erti que nao deviam fazê-lo;
igualmente adquirir a doencâueN_icara. doente,_ e êles poc:liam
que che~ou um homem da minhaªº sabiam en~ao qt;e fazer, até
que dev~am ace~der 0 fogo , erto cabana e gntou, as mulheres,
beca pois o canJó tinha , p do m~rto. Decepou-lhe a ca-
~ ' , . so um olho e tinha , .. ·
causa da molestia que tinh . • ma aparenc1a, por
. uscando a pele do a tido. Atrrou fora a cabeça, cha-
1

~ d . · corpo sobre o fogo. Picou-o depois repar-


tm o-o com os outros, em parte'"' iguais , d, t
, Cons ~ d ~ , como e usa o en re
e_1es. · u:ruram-no to o, menos a cabeça e tripas, das quais
tw eram noJo, porque estava doente.
~dei por to~as as choças. Numa assavam os pés, noutra
as m~?~' na tercerr~ pedaços do corpo. Então lhes narrei como
o c~nJo - que a:as~avam e iam comer - sempre me ca-
luniara, e lhes havia dito que eu matara a tiro alguns dos seus
amigos, enquanto eu estivera junto dos portugueses. Isto era
mentira, e êle nunca lá me tinha visto. "Sabeis bem pois, pros-
seguí, que êle havia estado alguns anos entre vós, e nunca es-
tivera doente. Agora porém o meu Deus ficara irado por causa
da calúnia que êle tinha espalhado contra mim. Fê-lo adoecer,
e nascer em vosso espírito a idéia de matá-lo e comê-lo. Assim
agirá o meu Deus com todos os máus que me fizeram ou me
íaçam sofrer!" A estas palavras se atemorizaram muitos dos
índios. E agradeci ao Deus todo poderoso por mostrar-se para
comigo, e~ tudo, tão grande e tão benigno.
Portanto, peço ao leitor queira considerar o que escrevo.
Dou-me a êste trabalho, não pelo prazer de escrever alguma
coisa nova ma5 exclusivamente para trazer à luz os benefícios
que Deus 'me prestou !
Entrementes chegou o tempo :m que que~~ levar a
efeito a guerra para a qual desde tres meses. :e vinharr: prepa-
rando E a eu sempre que nessa ocas1ao me deixassem
. sperav . p t di fu ·
em casa com as mulheres, quando partissem. re en a · grr
então durante sua ausência.

121
CAPíTULO 40.
1

. "'s comerciando os índios


Como chegou um nav!o f~nh'o~ grado teria ido ao
algodão e pau bras 1!· ~ estava determinado
navio, o que porem nao 1

por . D~us. ·
\ • 1 '

· , · da expedição guerreira,
Cerca de oito dias ~ntes do inicioto que .dista oito . milhas
chegou um navio frances em um por ' .chamam .Rio .·de , J a-
de Ubatuba (121 ) ao qual os portuguese~ . . ·
. , d" ' N"t . Aí . costumam os , france~es faze.r
nerro, e os in ws, i ero~. .. . . . . bote tambem até a
carregamento de pau-brasil. ,V1eraiµ . ~um ..
nossa aldeia e compraram dos índios p1menta, maca~os e pap~- 1

gáios. Um dêles desceu em terra. · Chamavq-se Jaca, con~ec1a


a língua dos selvagens, e hegoci6u com êles .. _P.e dí-lhe que ·i;i.e
tomasse consigo no navio, ·m as ·meus amos d1sser~m qu~ .nao;
não queriam· ·entregar-me ·assi,:n'; \mas · obter por mim mercado-
rias. Nisto lhes pedí que .me levassem ao navio; meus arriigos
lhes dariam bastantes· mercado:çias,. ao que responderam: ''Não,
não são os teus verdadeiros amigos·, pois já teriam os franceses,
os que aqui estão no bo~~' · dado a . ti uma camisa, porque foste
nú; mas êles . não
. se ocup~~ contigo". Assim era; ~epliquei no
e!1tanto que eles ~e v~s:n~1am :P.? . grande navio, .ql:J.arido ,.para
la fosse. T~mb~m i~to 1?-ªº
açreditaram. .q p.avio ~~o ·p~rtiria
. "
121
) - se tem .a • evidência . d
...Aqui .
distância entr~ .a aldeia 'onde se
'a'ch~'vae s:.r. rel~tivamente peque.n a a
porto do Rio de Janeiro ou Niterbi no :·v ·.~ ~ 1 º~~ 1 !º H:ff.J?.S 'S.taden . e o
1

Casal diz significar "água ocÚlta': . Cf ~'cC b~lo in. ~ígena, . qu.e Ayres do
J:aneiro, 1817, vol. II, pâg. 12.· Allâs · · orografia Brazfiica", Rio df'
pftulos trinta e oito e quarenta da ' .ª 8 ~1logr.avuras referentes aos ca-
que a ilha de "Ipaun-guassú"· . que pnm.~; ra.. parte, mostram claramente
Grande, estâ bem em frent~ a esseg~do o dr. Plinio Ayrosa é a Ilha
terra firme. E<Sta assinalação .é ums.a.dos batuba, colocada no litoral da
a Ubatuba onde Staden permane.c eu . ~ elementos que fazem crer que
dosãReis ou na enseada de Mangaraptr1·b1s1onLeeiro ficava na bata de Angra
ens o o estudo do dr KI a. ia ·
sillen - ln der Spra.ch oster em "Hans iStade~se Para melhor compre-
São Paulo, 19.41 ' pâ.gs ~~2er Ge~en~art übertr -Zwei Reisen nach Bra-
. ' · -225~ , agen Von Karl Fouquet~' •
122
. · 24 . . ~ Staden procura escapar num navio francez, mas é repelido
pela equipagem.

bem voltar à patria e não me levar, perecerei sem dúvida entre


os ín~ios, pois não se conta em absoluto com esta gente.
Com tal pensamento abandonei a choça e dirigi-me para o
rnar. Perceberam-no e correram-me ao encalço para apanhar-
rne. Corria-lhes à frente repeli o primeiro que me alcançou
e. fugi, embora toda a aldeiá estivesse atrás de mim.

123
· rém quís entrar nêle,
bote. Quando Pº ue, se me levassem
Nadei para perto do me pensavam 2-voltar-se e tornar-se
os franceses rechassar~;age~s, podiam r
contra a vontade dos s .
seus inimigos. . ovo para a terra, e reflet~:
- alentado nadei de ~ ue permaneça por mais
. Entao, des e' da ~ontade divina tq to não tivesse tentado
VeJO agora que ,., S entre an ' inh ,
tempo ainda em desolaçao. . e, ue tinha sido por m a pro-
fugir, ficaria pensan~o ·depois q .
pria culpa. . . m-se os índios e gritaram:
Quando voltei à ter~a, rego~IJ~~ e disse: "Pensais que. vos
"Ei-lo que volta!" Fingi-me zanga dizer à gente da minha
quís assim fugir? Fui ao bote par: para vós muitas merca-
terra que deviam ' preparar-se e JUll arme levásseis a êles". Isto
dorias, até que voltásseis da guerrs~t~sfeitos. .
os agradou e ficaram novamente

CAPfTULO 41.

Como os selvagens partiram para a guerra, levando-me


consigo, e o que aconteceu nesta expedição.

Quatro dias depois reuniram, perto da aldeia de Ubatuba,


algumas canoas, nas quais queriam partir para a guerra. Tam-
bem o' chefe Cunhambebe aí veiu com suas embarcações. Disse
e~tão .º meu amo que ~ueria levar-~e consigo; pedi porém que
me deixasse em casa, e certamente ele o teria feito se Cunham-
bebe não lhe houve.sse ordenado levar-me. Agi as~im, de modo
a , p~recer ~ue partia contra vontade, pois que teriam pensado,
se .tivesse ido ~~ ~oa ment:, que fugiria dêles à chegada na
terra dos seus mimigos;
, e· deste modo hav1·am d e v1g1ar-me
· · um
tanto menos. Era tambem meu intento es ·
,.. .
f rances, se me deixassem em casa Mas 1 capar para o navio
· ·
. · evaram-me consigo.
Eram trmta e oito canoas guarnecid .
ou menos dezoito homens AI " as cada uma com maJ.S
zar sobre a guerra, atra~és .d~~~e del:s tinham feito profeti-
bobagens em que se atinham d us idolos, sonhos e outras
fiantes . para a · empresa. Tinh~ e. modo_ que marchavam con-
região da Bertioga, onde me :v~ntençao. ~e dirigir-se para a
. am aprisionado, esconder-se
em. redor do mato nas vi· . h
. . . zin ança d
·
neiros os inmugos que aí 11 ~ a Povoação e le . .
1es caissern , ~- , var pns10-
Por volta de 14 de as rnaos.
. V ~ agosto de 1554 .
guerreira. e~ neste mês, com . , iniciamos esta expedicão
correntes de agua doce para ? Jª
se narrou, do mar paraJ as
ses. Em português cha~arn 1 esovar, uma espécie de pei-
ª
na língua dos nativos, pirat~no~ taí,nh~s; em espanhol, lisas e
êste tempo de desova (122) N · s, md1os chamam piracema a
a guerra, tanto os tupinamb, esta epoca partem êles todos para
a marcha apanham e comeas como ?s seus inimigos, e durante
na volta, porém, viajam 0 m .os peixes. Retardam-se na ida;
mais depressa que podem.
Esperava sempre que os a 1.
estivessem pelo caminh . 1:1 gos dos portugueses tambem
a terra dos tupinambásº' pms eles ~e certo queriam assaltar
. ' como me tinham contado no navio
havia pouco tempo, os portugueses de lá. '
Durante a viagem me perguntaram muitas vezes os índios
se eu. ~chava que ê.les aprisionariam alguem. Para não irritá-
los, d1z1a-lhes que srm e acrescentava que os inimigos topariam
conosco.
Uma .noite acampamos num lugar que tambem se chama
Ubatuba (1 23 ) • Aí apanhamos muito peixe, piratís ou taínhas,
que são tão grandes como um lúcio bem desenvolvido. Sopra-
va um vento forte. Tagarelavam comigo e tinham muito que
perguntar. Disse eu então : "~ste vento sopra sobre muitos
mortos". Como, porém, um outro grupo da sua gente, que
tambem se achava a caminho em canoas, pelo rio Paraíba (124 ),
tinha entrado na terra, pensavam êles que já tivessem êsses

122) - Anchieta faz descrição idêntica na sua carta de São Vi-


cent_e, fi.ni de maio de 156-0, publicada pelo dr. Miranda de Azevedo,
São Paulo, HWO, pág. 10. . . _
123) _ Esta segunda Ubatuba é que parece ser, pelas md1caçoes
de Staden a hoje cidade dêsse nome no litoral paulista. . .
' . . ara alcançar o vale do no Para1ba
124) - O cammho indígena p e ·unho de 1633 lê-se que Mi-
era por Paratí. Num docu_mento de 18 d do~atária da capitania de Ita-
gueI Aires Maldonado pedia à co~~ess~ leguas de terra com todos os
nhaem, lhe desse de sesmaria -- quat:~to de largo como de cumprido
Portos e aguas que nelas se acharem d Angra dos Reis para o sertão
e os campos que estão detraz da serra e t~ um pico alto que chamam
dela, para a banda do noroes te. ' aonde es a
re a dita serra, que est~ na mesma
o Frade e é um caminho antigo sob í or onde foi o capitão Martim
c.ordilheira dela sobre o rio de Par~te, :or onde ordinariamente se. ser-
de Sá para o sertão com seu arraia i de suas terras para o dito rio de
· n·á paratonal,
' · guaia
vi am e servem o gentio v r vol. 57, }J'"g.
.-..6 27 4··
Paratf'' - Anais da Biblioteca Nac
125
25. _ Acampamento de ' ~upi~arpba~ na~ . pro~imidades da ilha de São Sebastião.
1 1
Vê-se Hans Sta~en de pe, assma\ado com uma cruz.
1 I
1
, ' '1 '

chefe C~hambebe pelo acampmi_~nto, no bosque, exortando-·


os, e disse que não deviam estar agora muito longe da terr~
do inimigo. Cada qual devia lembrar-se bem do sonho que ti-
vesse à ·,~oi~e e , cuidasse de sonhar algo feliz~ Depois que êle
125) - ' Segundo Teodoro Sampaio significa "No , estreito".

126
2
~· :- ~ luta eritre tupiniquins e portugueses, com os tupinambds, nas
P ox1m1dades de Boiçucangd. Ao fundo e d esquerda, os fortes de
5do Tiago (Bertioga) e de São Felipe (Santo Amaro).

i Ao romper do dia reuniram-se os chefes em torno de uma


gaçaba com peixes cozidos, que comiam, narrando uns aos
0~t;os
0
os sonhos, até onde lhes ap7azia. Alguns dansavam com
Idolos. Desejavam no mesmo dia chegar bem perto da terra

127
mado Boiçucanga (12º)., onde
t , m lugar eh a
do ·seu inünigo, a e u. . até à tarde. .
q ueriam ficar de esp1e1ta ampamen to onde pernoitamos , d.
em
A nossa partida o .ªe d untaram-me os in ios mais
frente à ilha de Maemb1pe, perg teceria. Disse a esmo: "Ern
uma vez o que eu pensava. que .. acon sso encontro. S"d e e apenas
. .
Boiçucanga os in1m1gos _ . vrrao ao no d h
f ·r-Ihes quan o e egassemos ,
. h .
corajosos". M1n ~ 1n e, . t nçao era ue me haviam aprisionad o, d.lS-
ug1 ' . .
a Boiçucanga, pois o srt10, em q
tava dela apenas seis milhas. · d f t
1 da costa, vrmos . e a o
Enquant~ seguíamo~ ao onITha ao nosso encontro. Excl~-
0

canoas que vinham de tras du~a ssos inimigos os tupini-


- , d'
maram en t ao os in 10s. · "Lá vem os no oas atrás duma' rocha
quins!" Quiseram esconder-se com ª.s canem descuidosamente.
para deixar que os outros se aprox1mass
Êles nos perceberam porém e viraram em fuga par~ a sua ~?­
rada. Remamos a toda força, durante bem quatro . oras, ras ª
dêles, até que por fim os alcançamos. Eram cmco canoas
cheias, todas de Bertiqga.
Conhecia-os todos. · Numa das cinco canoas se encontravam
seis mamelucos, que tinham sido batizados, entre êles dois ir-
mã.os, Diogo e Domingos de Braga (127 ). Êstes dois se defende-
ram muito corajosamente, um dêles com u1n arcabuz, o outro
com arco, e se mantiveram em suas canoas duas horas inteiras
contra umas trinta embarcações dos nossos. Quando suas fle-
chas se esgotaram porém, subjugaram-nos os tupinambás e os
aprisionaram. Alguns, logo depois, foram mortos a golpes e a
tiros. Ambos os irmãos não fora~ feridos, mas dois dos mame-
lucos tiveram ferimentos muito graves, assim como alguns dos
tupiniquins, e entre êles uma mulher.

_______ ,

1 '>6)
- - B o1çucanga,
· como se vê na :,
ao capitulo quarenta e um da prim . segunda xilogravura referente
depois de Bertioga, partindo do sul eira parte, era uma praia assinalada
e fi ea en t re a pon. t a do Camburí, e para
p
o norte · Aºmda tem êsse nome
T~q1:1e. O vocâbulo i!1digena quer ~ize~~t~~ha, antes da ilha de Toque-
Plm1~9f-yrosa, obra cit., pâg. 138 . · esqueleto da cobra grande''.
~ ) - Os mesmos já referid
parte, filhos de Diogo de Braga os . no capitulo quinze da pr1·meira
, marcmeiro.
128
CAPfTULo 42.

Como trataram 0s • . •
prisioneiros durante
a sua viagem de volta.

O lugar, onde os tupin' ·


duas boas milhas di t t iqu1ns foram aprisionados, estava
a , s an e da costa. Remávamos então tão
depressa quanto podiamas ' de volta para a t erra a- f'im- d e acam-
parmos novamente no i:iesmo sítio que a noit~ passada. Pela
tarde, pouco ar:tes do por do sol, chegamos à terra em Maem-
bipe. Levou a1 cada um seu prisioneiro para ·a 'sua cabana.
Aqueles que estavam muito feridos foram arrastados à praia,
mortos imediatamente e cortados em pedaços, segundo o seu
costume, assando-se então a carne. Entre os que foram assados
nessa noite, encontravam-se dois mamelucos que eram cristãos.
Um dêles era um português por nome Jorge Ferreira, filho de
um capitão ( 128 ) , que o havia tido de uma índia.· O outro cha-
mava-se Jerônimo. Havia capturado êste, um selvagem chamado
Paraguá (129) , que morava comigo numa e.abana. Paraguá a~sou
Jerônimo durante a noite, a um passo mais ou menos ~a.minha
cama. Jerônimo (que Deus o tenha) era parente proxuno de
Diogo de Braga.
· 6 J rge Ferreira que governou a caplta-
128) - 6
Era o capitão-m r ~e is de 15 7 a 1572. A tndia aqui
nia vicentina de 1556 a 1558 e ie
itima mulher, pote foi Joana Ra-
referida era aliás mameluca e sua eug filho homônimo, referido por Sta-
rnalho, filha de João Ramalho. Od~ tido 0 capitão-mór dêsse casamento
den, devia ser o primogênito, ten Ferreira, casada com Oristovam
rnaiB três que sabemos: Marquesa Tristão de Oliveira e Baltasar
Monteiro Joana Ferreira, casada cof:de São Vicente um monstro . m;-
Ferrelra,' que em l564 matou na pra narrado por Pero de Magalh~~i :
rinho, denominado "Ipupi~ra"'
Gandavo. Foi Jorge Ferreira. q
::!ºreedificou a fortale:i~ ::c~:V~mos ~~
Além do que sobre,, âgs 37 e 42,
na Bertioga, em janeiro de 155 itães-mores vicenti~os ~o~ern~ mudou-se
7
noaso citado trabalho "Os capinado 0 seu segunb~talbara e ali veiu a
Podemos acrescentar que term j fundação multo
Para o Rio de J anelro, para cu ª ro sampaio.
falecer pouco tempo depois. i ,, segundo Teodo
"Papaga o '
129) _ Traduz-se por 129
27 - Desembarque dos prision.ei.ros feitos pelos tupinambás, nas proximidades
da· ilha de São Sebastião, :após a vitória. Os prisioneiros muito feridos
estéio sendo mortos e esquartejados. Esse local era a primeira etapa da
viagem de retorno para a aldeia de Ubatuba.
1

dos nossos pecados, e em cujo ~orne tínhamos sido batizados.


"Creio nêle; tem-me salvaguardado há muito tempo entre os
selvagens, e devemos contentar-nos com 0 que Deus nos des-
tina". .Assim discursei· eu.

130
.1\tlais tarde me perg t
. un arain . irm-
va con1 o seu primo Jer" . os dois
fogo, assando, e que eu j ,º~~º· Disse-lhes aos 0 que se passa-
daço do filho do capitão ~ in~a visto como s~uâ estava sobre o
porén1, dizendo-lhes que s=~~eira. Choraram en~:or~a uiy pe-
menos oito meses (I3o) entr iam, bem que eu já estavaonso .e1-os
"o e os indi D mais ou
vado . ~~~mo fará êle convos os, e eus me havia preser-
acrescen tei. De veras tua . t co. Tende confiança nêle" E
a vós, pois sou de uma terr o is o deve .abalar-me mais do que
aos medonhos costumes desªt estrangeira e não estou habituado
·
tes e f os t es criados" Sim d.a gente · v,os, porem,
, aqui, nascen-
tanto nes t a provaçao - . que nã
' isseram
. êles , eu h avia
. endurecido
.
0 mais me comovia
Quando assim nos entret' h ·
que deixasse os irmãos e fos~~ amos, ~rdenaram-me os índios
ran:-me o que tinha para dizer-f:ª minha choça, e pergunta-
nalizou~me que tivesse de b d s durante tanto tempo. Pe-
que se entregassem int · a an onar , os doi·s · Recomend e1-
· Ihes
. . , . eiramente a vontade de Deus· já conhe-
ciam a t- miseria
· · que existia nêste vale de l'agrimas
· 'Respond e-
ram .e n ao que nunca a tinham sentido como ag~ra, dizendo
que.! â.e~d~ q:ue cada .homem. devia morrer um dia pela delibe-
raçao divina, morreriam assim um pouco mais aliviados pois
eu tambem estava junto com êles. '
Saí então_ ?ª ~abana e ,and~i por todo o acampamento,
olhando' os prisioneiros. Ia· so. N1nguem me prestava atenção.
Poderia bem fugir, pois estávamos em frente à ilha Maembipe,
distante apenas cerca de dez milhas de Bertioga. Não o fiz
porém em: consideração aos cristãos prisioneiros, dos quais qua-
tro ainda ' estavam com vida, pois pensava que, se fugisse, se
zangariam· os índios e matariam logo os cativos; e talvez Deus
nos conservasse a todos. Deliberei então ficar j:unto dêles e en-
corajá-los; 'e assim fiz. Estavam portanto o~ selvag~ns bem
intencionados para . comigo, pois . eu l~e~ havia .p rofetizado -
por acaso' -· ··. dizendo que os inimigos viriam ao nosso encontro.
QUando, isto aconteceu, disseram que eu era melhor profeta
~o que os seus maracás.

1'

---
130) . - .Meados de setembro de 1554.
131
cAPtTULO 43

l agens com os seus inimigos,


Como dansaram os se v , o dia seguinte.
quando acampamos ,n
omontório, chamado
· s a um alto pr d tupinambás
No dia seguinte ch_eg:;-~ distante da ter~-: ~ui à choça d~
Ocaraçú, (1ª1) e que, nao para aí passar a n~1lhe. o que preten-
Os selvagens acamparam , perguntei- e "d
Cunhambebe o chefe supre~o, Ae e deviam ser comi os e
dia com os ~amelucos. Di~se ~le aq~uito encolerizad? contra
proibiu-me de lhes falar, p~is es avcasa, e não ter ido a guer~a
eAIes. Deviam ter permanecido . · igosem eorno lhe pedisse que devia
t
combatê-lo com os seus i;iim . us amigos contra resga e,
deixá-los viver e entrega-los. a_os se
d ·am ser comidos.
respondeu que ev1 b tinh à sua frente um grande
Durante
h . d istoarne
Cunhambe
humana e Com1a ~ de uma perna ' segurou-
cesto c e10 dae boca
· ' diante c e pergunt. °u-me se tambem queria comer. ·
~a · d·· "bm ànimal irracional não come um outro parce1r_o,
spo~ I. deve devorar um outro homem?" Mordeu-a enta_o
1sse:o~eJmaua'ra ichê" · "Sou um jaguar. Está gostoso". Reti-
e um.d.
rei"."me dêle, à vista disto.
Na mesma tarde ordenou que cada qual devia trazer o seu
prisioneiro a um lugar, que ficava fronteiriço ao bosque, junto
do mar. Assim fizeram. Os índios se reuniram, formaram uma
grande roda e colocaram dentro os prisioneiros. Estes deviam
todos juntos cantar e. matraquear com os ídolos os maracás.
Depois, um após outro, discursava com audácia; dÍzendo: "Sim,
partimos, como fazem os homens corajosos a-fim-de a vós nosso
inimigo, aprisionar e co~er. Ma~ então tivestes
' ' '
a supremacia e
nos capturastes. Isso nao nos. unporta. Guerreiros valorosos
morrem na terra dos seus inimigos. E a nossa terra ainda é
grande. Os nossos logo nos vingarão em vós". Ao que respon-
31
i Ainda hoje tem êsse nom
) -
este da bafa de Parau. p e e forma o Promontório a sudo-
"Praça Grande". ara Teodoro Sampaio o vocábulo significa

132
d iam os outros·. 'V'os . ,
1

queremos vingar e'th J~ e:x:terrnina t


· d 4
~.... Vos" s es rn ·
assim, ca a um cond . . Quand t u1tos dos n .
abrigo. uz1u de Voltaº errninararn d ossos. Tal
· o seu . . e discursar
A o t erceiro dia ""v olt a:rn prisioneiro ao seu
em suas al deias pátrias os Para sua t
' os pris · · erra. Toma
, ...,~--~--~~-,,~----..- Ioneiros · 0 s de Ubatuba
ram consigo'
, entre

28. - O acampamento de Ocaraçú, segu~da etapa da viagem de retorno


Para a afdeia de Ubatuba. A dança a roda dos restantes prisioneiros.

os quáis eu vivia, tinham capturado vivos oito indígenas, além


de_ três mamelucos, que eram cristãos, a saber: Diogo, seu ir-
mao e um terceiro, por nome Antônio. tste ha_via sido. a:prisiona-
do pelo filho do meu amo. Dois mamelucos ainda, crIStaos tam-
bem, levaram assados para comê-los em casa. Gastamos ao todo
0 nze dias entre ida e volta.

133
' - .

cAPíTULO 44

, tava o nav
io ' francês a dcujo
Como ainda aqui es D.do voltassem a
bordo me queriam le~~q:esnw prometido.
guerra. Tal me :Jtav1a . .·. , , . . ·. .
. lamei-lhes que deviam
· .
Quando chegamos · a sua patr1a rec · h"a est ª.do com
6is 'ago.r a ' tin ·A ·

levar-me ao navio dos france~es, p d . inimigos~ pelo que ~em


" na guerra e aJU
êles . dad0 na,., captura os . " .· . , ,::· ..·..',· . . , ~ ...
· . ortugues.
tinham conhecido que eu nao era ~ as '' prime1ro .queriam
, · levariam · m . -
Prometeram que a1 l'I!e , carne, assada ,dos .cr1staos. , ,
descansar e comer o moquem'. ' a ." . " " , " ·. .
11 '1

li '
. ' .. .

' 1 '' 1 ' ' 11 ' • ' ~1 '

. , . .cAPlT.bw · 45 . · .:
" ' ' ' • .' ' 1 ....... " • ~ • ,'' '" ' '1 . ' ' :·· • ·,

Como ~omeram o primeü.:~. dos dois .cristãos àssad~s,


a saber, Jorge Ferreira, · ~ · filho do ~apitão po~~Jlles·
' 1 1 : • ' • ' . ,

Em frente da· mi~ha çhoç~ ficava a do · chefe · "Tatãm~í.'(~ 8~)


1

Este guardav~ um dos cris~ãos assados . e, '. se~do a · pr~JÇe. ,dos


índios, fazia preparar · a bé,bida...Juntava7"s~ m\lita , .gente,. be-
biam, cantavam e apro~tavam uma 'grand~ : festança.·· ~o dia se-
guinte, depois da bebede~a/ aqueciam de novo a catne assada 1
1

e. comiam-na. A carne do out:ç9 . })orérri~ do . Jerôriunb, , ,fo~ pen?u-


rada na cabana e~ que eu estava, numa cesta · sobre .0 · fumeiro,
durante trê~. se~~nas t~lvez,," até . ~tle fico:U "s~ca .c ómo ' um p~u.
Que ela assim f1cass.e pendurada, esquecida sobre 0 fogo, du-
rante t~nto .. tempo, ·tinha a su~ · r.azão: .o .selvagem, a quem ela
pe~enc1a1 chamava-s.e Paragua. · 1!:le tinha, partido à procura de
raizes para o preparo da bebida· ,que se · · fest~"" -
. · b . . '· precisa para o .. uA•
anterior ao anquete. Assim se passav t - que-
. 1
, . . a o ~mpo; nao me
' • j 1 1 l

ia2) - Traduz-se por "Fogulnho" ..

134
riam levar a o navio antes que n festa tivesse sido realizada e o
Jerônimo, devorado. Entrcmen ks havia largado de novo o
11·1v1·0 ·frances, que ancorara a cerca de oito milhos distante.
' Quando
11
soub~ disto, fiquei muito triste. Mas disseram-me
os 1.· dios que. , os
. franceses
d . t' costumavam
f voltar todos os anos, e
trt est·l nobc1a ev1a sa ·1s· azer-1ne.

-- ---·--
CAPíTULO 46

Como Deus Todo Poderoso operou um prodígio.

· - ~\--;-.
~ ~~ • · agra d ecimento da b a. A esquerda,
d Ubatu
2~. .
- A direita, Stada~ru:z, arguid~:Sª111hos
arando em
milagre, lunto a umbalhando com 5
aldeia e dos ós costas.
enfol•a 135
mulheres tra 0
S g ros S as e a plantara
.t elll.
· ,varava ao Senhor mui as· vezes.
una c1.uz, de d.
Eu tinha feito l orava. Aí o:a arrancassem, pois isso
f t a ª
ren e , choça en1 que m 5 que nao ,., ac reditaram entretanto
Ivag·en 0
"'l
Recomendara aos seuma desgraça;. n':ne ausentei com e es P.ara
~a
odia resultar-lhes , uanto um dia . e deu-a ao seu marido,
minha palavra. Enq rrancou a cruz edonda - esfregar-lhe
a p· esca, uma n1ulher a o a madeira e~ahr s de que fazem uma
• e"' le
- com ,· ar1n ° ' ~ · come-
Para ela devia d caracors m t u Logo aep01s
em cilna as conchas t osmuito me desgo.s o .dias Vieram então
, . , . 'rio Is o muitos ·
espec1e de rosa · ente, durante . tender-me com o meu
çou a chover forte~. alh que eu devia en tempo de plantação
à minha choça e e~1g1: cessasse. Pois o seuhuva, não poderiam
Deus para que a e uv não parasse a e
'á havia chegado, e se .
J . • encolerizado o meu
plantar.
Respon dºi q ue a culpa .erat sua. Havl1am
do qua eu costumava falar-lhe.
h
do o lenho JUil o . h provocado aI t uva,
e
Com~ acreditassem que eles mesm
Deus arrancan "' os tin am f .
i ir uma nova cruz. . s o OI,
ajudou-me o filho do.meu amo~ :r!na hora da tar~e. Quando
a julgar pelo sol, mais ou menoem o belo, embora tivesse esta-
se levantou a cruz, torno!1-~~~ar~-se todos e pensaram que
do muito ruim de manha. · . ·
6 meu Deus fazia o que eu queria. .

CAPfTULO 47

Como eu estava na pesca uma tarde, com dois


nativos, e Deus realizou um milagre comigo
durante violenta chuva e furacão.
Eu estava na pesca com Paraguá, um dos mais nobres
selvagens - o que havia :issado 'Jerônimo - e mais um outro
índio. Ao começo do crepusculo, levantou-se uma forte tempes-
tade. Chovia não longe de nós, e o vento trazia-nos a borrasca.
Pediram-me então os dois nativos que falasse com meu Deus
para qu_e a eh.uva ~ão nos atrapalhasse. Talvez apanhássemos
0
mais
para peixe.
comer.P01s sabia eu bem que na cabana
. não tínhamos nada

E:tas palavras m: comoveram e pedi ao Senhor, de todo o


coraçao, provar em mnn o seu Poder, desde que os selvagens de
136
0

im exigiam, e Para que Vissern corno o rneu Deus sernpre es-


f! comigo. Quando te;minei a oração, Veiu rugindo o vento, com

~e
ªchuva, e choveu ate cerca de seis passos de nós. Porém lá, on-
veJ 0estávamos,
algum
· que
.
peixe.
ficou seco, ao que Paraguá exclamou:
falaste com o teu Deus." Apanhamos tambem depol.'l
"Ago~a

~
30 . •
_ -
A expedição po ra pesca. nõ ° Stade.n
toda queVê-se
do A esquerda
atingru oorcl~cal. da pesca.
e aa

fundo, o tampes havia falado com


t aram ambos Com
DeDeus,
o .meu oça econ
volta ea, ochque ntão a se admiraram os
se passara. que etul
outros selvagens.

13?
CAPiTULO 48

Como comeram Jerônimo, o segundo dos


dois ·cristãos assados.

Quando o índio Paraguá reuniu ·tod.~s º~ pertences -· . à cuja


..
procura tinha saído, como se menciono~ acuna . - fez preparar
as bebidas. Estas se destinavam ao festim depois do qual devia
ser comida a carne de Jerônimo. Depois do . festim · trouxerfiln-
me os dois irmãos e mais um outro indivíduo de nome Antô-
nio, que havia sido çapturado p~lo. 'filho do meu amo, de
sorte
que eramos qu~tro cristãos juntos~ Tivemos que beber com êles,
mas antes de começarmos, rogamos .a; Deus que fosse misericor-
dioso para com .a alma de J erôn!mo e tambem para conosco
quando chegasse a no~s~ hora. · Os selvagens taramelavam co~
?osc~, em alegre azáfp.lJ1:a; .. nÇ>s, .. porém, nos sentíamos muito
1nfehzes. · ·
Na ~.anha · seguinte cedo, cozeram de novo a carne e come-
ram-na. Em pouco tudo foi consumido.
Ainda no mesmo dia me levaram .
Diogo e seu irmão pediram-me . , d P~~a dar-me de pre~ente.
por êles e dei-lhes instrUções ~= espe ida, que orasse a Deus
fugir. Expl~quei-lhes por onde ~a ~ caso .de ser-lh~s. possível
pois a conhecia bem para que ~ e:ri~~ andar na serra, (133)
seguir o rasto. Com~ soube mai8 st ind1m1gos. não lhes pudessem
ram-se, e fugiram. Se foram d ar e, assun o fizeram· livra-
. ·e novo
. presos, nao
- sei (134).
'
i-.. _ _

133) ' ' '


- Um trabalho intere ' . .
culo XVI, na capitania de Sã s~nte sobre as t .
Moura e publicado na Rev · T · ~ Vicente,. foi esc . rllhas indígenas do ee-
recem af os vá.rios caminh~s rim., voI. LXXxv~~to ·P or Gentil de Assis
versos pontos desde Angra d cham~dos do ma ' Pâgs. 419-430. Apa-
134) - Não o foram e os , ~is até Oana~·é!. que irradiavam de di-
moios na luta final do Ri Donungos de B
São Paulo o .denunciava ~o~ Janeiro em 15r6a7ga ainda combateu os ta"'
A . de Taunay ' "H'ist. ·Geral ~o
da Perni ·
B cioso trafiº e em 15·72 a camara de
s and eiras'',
· · 1 cante d e fndios mansos.
138 ' Pâg. 151.
CAPíTULO 49.

Como me levaram pa d
ra ar-me de presente.
Partiram os nativos c ·
· d d omigo para Taquaraçú-tiba (1 35) onde
me queriam ar e presente Q d , '
· uan o bnhamos nos afastado
um ped~ço da terra, voltei-me para as choças que abandonára-
mos e VI uma nuvem preta pairando sobre elas. Mostrei-a aos
índios, dizendo-lhes que o meu Deus se enfurecera contra a
aldeia por que haviam comido carne cristã, e assim por diante.
Como me trouxeram então para Taquaraçú-tiba, entrega-
ram-me a um chefe chamado Abatí-poçanga, (13 6) recomendan-
do-lhe que não devia causar-me, nem deixar que me causassem
dano, pois o meu Deus se vingaria daqueles que me fizessem
algum mal. Isto tinham visto quando eu ainda me achava com
êles e tambem eu mesmo o advertira: logo viriam meus ir-
mã~s e amigos com um navio cheio de mercadorias, e se me tra-
tassem bem eu lh'as daria; eu sabia certamente que o meu
Deus logo f~ria vir 0 navio de meus irmãos .. Isto ?i~s agradou.
o chefe chamou-me de filho, e com os seus filhos ia a caça.

---·--

~ ,, gundo Teodoro Sam-


taquaruçl s , se -
135) - Significa "Si tio dos
Da .
io. "Onldo de m flhO"·
136) - Quer dizer 139
cAPfTULO 50.

ovoação narraram-me
Conto os selvagens da mesma P .
.d d . francês acima mencionado.
a· parti a o navio .
, · · "Marie Bel'Et '"
Contavam-me êles como o ultimo navio, o . . . e !
vindo de Dieppe, no qual eu gostaria de ~er ~1aJado, tmha _a1
sido carregado inteiramente com pau brasil, pimenta, algod~o,
penas, macacos, papagáios e mercadoria~ semelhantes, que n~o
há em Dieppe. No porto do Rio de Janeiro tomaram os france-
ses (137 ) um navio Jusitano e deram um português a · Itavú,
um chefe dos índios, . que o havia comido. Tambeni estava no
mesmo navio o francês que havia aconselhado aos selvagens -
logo depois que eu fui aprisionado - que me comessem, e
queria retornar ao seu país. Era o mesmo navio de que
acima falei, quando fugi dos nativos, e cheguei ao bote mas não
n:e ~uiseram levar: Perdeu-se em sua viagem de r~gress'o à
p~tna: Quando ~ais tarde voltei para a França num outro na-
vio, n1nguem sabia do seu paradeiro. Sobre isto ainda tornarei.

-----

1a1) - Sobre o comércio


e a frequência das suas v· dos franceses co
trabalhos de A. G. de Arau~~g;ns, n?i seculo x.v1f 0
~ indígenas do Brasil
na Rev. Trim., vol. .L xxvl:r o~ge, O Brasil e ' vide de preferência os
toire du Brésil franç.ais ' 2 ·.' Pâgs. 193-2 17 a França no seculo XVI",
Carvalho, "Dom Joã.o nt~ ~e;ziéme si~cle'' Pa-:- Paul Gaff.arel, "Bis·
franceses" Li
'
b ris, 1878, e Gomes de
s ôa, 1·9-09.
140
CAPfTULO 51.

Como. eu logo depois fui dado de present e, e como


ve1u da França
. um outro nav1·0, o "C ath er1ne
.
de V etteville" que, pela graça de Deus,
me resgatou.

Estav~ :u, havia catorze dias mais ou menos, no vilarejo


T~quaraçu-tiba, em casa do chefe Abatí-poçanga, quando um
dia me procuraram alguns selvagens e disseram que tinham
ouvido atirar. Devia ser no porto de Niteroi, que tambem é
chamado Rio de Janeiro. Como eu então estava seguro de que
um navio aí se achava, pedi-lhes que para lá me conduzissem,
pois seriam talvez os meus irmãos. Prometeram-me, mas reti-
veram~me, contudo, ainda alguns dias.

Entrementes haviam ouvido dizer os franceses, que tinham


chegado a . Niteroi, que eu vivia entre os índios. Então enviou
o capitão duas-pessoas do seu navio com alguns chefes dos sel-
vagens que lhes eram amigos, ao luga: em que me e?contrav~.
Foram êles a uma choça, que pertencia ao chefe Coo-uara-açu,
(138) e que ficava bem próxima daquela em que ~u est~va.
Os selva ens anunciaram-me que dois home~s do nav1,o hav~am
· d D~ · , Ales e dei-lhes as boas vindas na hngua dos
vin o rr1g1-me a e - · , 1 t·
. · Q · d iram aproximar tao m1serave , iveram
na t ivos. uan o me v me alguma coisa de suas vestes.
· -
compaixao e mrm d · e .deram-. d Res onderam que por minha
Perguntei por que ~aviamdvm d~· tra~~r-me a bordo, e isto de-
causa. Tinha-lhes sido or ena . s
·
viam êles empreen er pord todos os me10 · . . , . .
_ d 0 0 coração pela m1sericordia ~1-
Alegrei-me entao de ~o chamava Perot e conhecia
Vina e disse a um dos dois,. qu~ s~arar que era meu irn1ã~ e
a língua indígena, que devia e: - es cheios de mercadorias,
que me havia trazido alguns ca1xo ao navio, indo buscar os
.
a- f un-de , a·ios me levassem ·
que os in
i or "O comilão".
'feodoro Snmpn o P
138) - Tr.adn~-se no dizer de
141
eu queria permanecer
isava dizer qu: mercâncias, até que 0
. -es Alé1n disso pre~rnenta e outra
caixo · ·untar p1
entre êles para J no próximo ano. e tambem ao navio, e
navio retornass~ formações Ievara~°:iordo tiveram todos pe-
C0111 estas in me acompanh?u. entilezas.
nleu amo mesmo f ·to muitas g .
d ·m tendo-me ei d inco dias no navio, per-
na e m1 ' d erca e e
távamos des e e
t' h
a quem eu in a s1 o
·a
Quando es acique Abatí-p.oçanga - os caixões; devia fazer
guntou-me o e de estavam It
enviado de presente - on . oderíamos 1ogo vo ar para
com q U e m'os dessem, ·e depois. ~ ~
cap1tao. y;,ste me ordenou
d que de-
P 0
casa. articipei tal deseJO
f t'a que· 0 nav1-0 tivesse to a ta sua
t car-
via eu entreter o che e a e criassem con ra empos,
-
ga feita: para que nao se . zangassem e .
m a bordo, ou urdissem a 1guma
quando vissem que me retmha _ podia confiar. Mas o meu
traição. Eram gente. em que na~r~~se recambiar-me para casa.
amo, o cacique, queria.ª ~od~ 0 m alavras algum tempo.
Apesar disso consegui Iludi-lo co p a pois bem sabia que
Disse-lhe que não devia ter tanta press 'não podiam separar-
as bons amigos quando se encontfravam, partissem de novo
se tão rápidamente. Quando os ranceses .
com o seu navio, haviamas de voltar à sua cabana. Assim o
detive. ,
Quando o navio por fi~ ficou pronto para a viagem, reu-
niram-se os franceses todos a bordo. Eu estava entre êles, e
meu amo, o principal, tambem aí estava com as pessoas que o
tinham acompanhado. O capitão do navio fez saber aos índios,
através do seu intérprete, que muito lhe agradava que não me
tivessem matado, embora me ,h ouvessem aprisionado entre os
seus inimigos. Depois lhes fez dizer, a-fim-de mais fácilmente
e de maneira digna libertar-me dêles, que me havia feito vir
a bordo para p~esentear-lhes _com alguma coisa, pois me ti-
nham cwdado tao. bem. Era igualmente sua intenção dar-me
al~as ~erc~dorias, para. q':1e permanecesse entre os índios,
ate que _e e re o~asse ~ pois que eu já lhes ·era conhecido
- . para Juntar punenta e outras mercador· d "1 · dia
carecer. ias e que e e po -
Tínhamos entretanto combinado · ·
homens da guarnição, os quáis t· h' antes, que cerca de dez
migo, à vista disso agissem em c~1:n arn alg~ma semelhaJ?.ça co-
meus irmãos e queriam levar-m um. e simulassem que eram
jo tinha sido exposto aos índio: c~sigo .para casa. Tal dese.-
nhum, queriam que eu voltasse ~o e~s irmãos, de modo ?e-
va ~ornar ao lar, pois nosso pai de ~ eles a terra. Eu prec1sa-
seJ ava ver-me ainda uma vez
142
antes de morrer E t-
de f at o, e"le era 0· e n ao f ez o cap 1· t-
" omand ªº 0dizer aos selvagens
~s ~ ~':J.~
tass; com eles à terra M ante do navi
ir_maos, muitos. Nada· que êle era e gostaria que eu
via apenas para libert~odJ.a fazer contra ~~nas um único e meus
bem ao meu amo -~e dos índios e es. ~ste pretexto ~
.. ' o cac1qu por bem E .
a casa, mas bem v· e, que gosta . · eu disse tam-
sentir. Principiou elªt.9-ue os meus irma:1a d:_ retornar com êle
. l n ao a v if os nao o q .
riam evar-me cons· oc erar diz d0 uenam con-
novamente com 1;.ºª. todo trans'e -~e . - posto 9ue que-
filho e ficado muit~ nne1:1"o navio, pois me ~a ;u então voltar
0

tinham querido enrru.vecido com os d u:via tratado como


junto a bordo te~~mer. E uma de suas ~W:tuba, porque me
altas vozes e' lastrm·'s~gundo o seu costume de erles, qtue estava
D . e1-me tamb ' amen ar-me em
epoIS de tudo isto, deu-lhe o e~, _como entre êles é hábito
cas'. machados, espelhos e encap1tao algumas bugigangas, fa~
m~ o~ menos, com o ue p t~s, n~ valor de cinco ducados
hab1taçoes. q partiram a terra em busca de suas

Assim
, me livrou o Senhor tod d
de Isaac e J acó do pod·e , d o po eroso, Deus de Abraão
, . ' rio os barbara ,. " '
g oria e honra em Jesus e · t
sal~
s crueis. A ele louvor
1
vador. Amen.' ris o, seu querido filho, e nosso

CAP!TULO 52

Como ~e chamava~ o capitão e o piloto; de onde


provinha o naVIo; o que aconteceu antes da
nossa partida e quanto tempo levamos
na nossa viagem para a França.
O capitão do navio se chamava Guilherme de Moner; o
piloto, Francisco de Schantz e o navio, Catherine de Vette-
ville (139) .
Aprestou-se o navio, a-fim-de velejar para a França.
Nisso, veiu uma manhã, quando ainda está~amos ~o por:o do
Rio de Janeiro, um pequeno navio portugues e qws partir da

. 189) _ Vettevllle ó uma povonçilo do tiepartamento do Selne-Inté-


rleure ( 1',rança) .
143
baía. Havia comerciado com os maracajás, . uma. ,., tribu . de índi· os
que tem amizade com os portugueses, e cuJa regiao se lrmita co
trib1;1svive~
a terra dos tupiniquins (H<')' os amigos dos franceses. As d tn
em intensa hostilidade. Era o navio que,
se disse, devia resgatar-me dos selvagens. Pertencia a um
comoº~
feit~:

31. - Comb 0 t6
contra um pequeno nav·iodum
do bote navio fr ancês e
portu
baia do ~.ues, Pertenc canoas com
A

1
-- 10 de J ente a p se vage

-;;-:~qui
140) aneiro edro R ns,
plnamb!í.s houve um . oesel, na
·p erfeitamenteao tupiniquins engano d
quina erame dos tu plnam ~.corrigimo
maracajll.s . o que aqu· . Na xilou e Staden .
~e esta~
.,ra vura q u pois êle u.
seus aliados amigos dos l ns como :· .Pois nl"e 18 escrever tu-
os franceses · )Ortugueses iz1nhos.
e · 01 figuram
s 1 as acima
pa ald i vê-se
144 10 imig os nnracajá
dos tu . e ose as
8 dos
tupini-
Plllambâs e de
de nom~ Pe~ro Roesel (Hl)
com artilharia, avançara:rn · Os franceses equipa
·serrun da para os p t ram seu bote
e qu1 . . . r caça ao navio L or ugueses dentro da baía
com os m1m1gos e intun· a' -1os .a se
evararn-me
d consigo · Devia
. f a1ar
to, atacain~s o navio, repeliram- ren erem. Quando, entretan-
franceses a1 foram mortos , b nos os portugueses. Alguns
1
ferido graven1ente por u:rn ~ir~ª e .outros feridos. Tambem fui
qualquer um dos outros fer'd' 1 0
muito mais gravemente do que
Em n1inha angústia recorri ~ que pern:aneceram com vida.
morrer, e pedi ao Pai bondªº en~or, pois pensei que deveria
depois que me havia salvo d~s.~ quisess~ conservar-me a vida,
se voltar à terra crist- J go dos tiranos, para que pudes-
,.
benefic1os que me havi ªe apregoar
d' . tambe m a ouras t
gentes os
pletamente bom SeJ·a iª prodigalizado. E fiquei de novo com-
' · ouva o o Deus magnânimo para todo o
sempre.
°
N ano da graça de 1554, no último dia de outubro (142 )
desferramos as ~elas no porto do Rio de Janeiro e ru~amos
para ~ França. '!11vemos ~º?1 vento no mar, de sorte que a tri-
pulaçao se admirava e d1z1a que um tal vento devia ser uma
dádiva especial de Deus, o que era verdade. Manifestamente
o Senhor nos concedia um milagre no mar.
Na véspera de Natal vieram à proximidade do navio muitos
peixes, a que chamam golfinhos. Pescamos tantos dêles que du-
rante alguns dias pudemos fartar-nos. Tambem para a noite
dos Santos Reis brindou-nos o Senhor com pescaria abundante.
Fora do que Deus do mar nos dava, não tínhamos muito para
comer.
Por volta de vinte de fevereiro de 1555 chegamos à França,
na cidadezinha de Honfleur, que fica na Normandia. Durante
toda a viagem de volta, cerca de quatr~ meses, não vimo~ terra.
Ajudei-os então a descarregar o nay1?, e . quando ~stava~os
prontos, agradecí a todos pelo benef1c10 .feito. De~01s pe?1 ao
capitão um J>assaporte. Teria êle preferido que ainda fizesse

. . d dos Schetz em São Vicente, como jA


141) - Alemão, adm1mstra or ve ter vindo para o Brasil por ini-
r~ferimos. Foi homem muito rico. De morador em Lisbôa, continuando
c1atlva de João van Hielst, flameng~, São Jorge quando êste passou a
no entanto na gerência do engen~o eudou aos náufragos da armada de
Pertencer apenas aos Scbetz. Muito aj testamento dever-lhe a quan-
Sanabria e João de Salazar confessava e~Uca e d. Meneia Calderón d~
tia de sessenta ducados por escritura d~vedora de mais de duzentos du-.
Sanabria dizia em carta que lhe era
cados. meses e meio que Hans Staden
142 ) - Findavam aqui os no;e
Permaneceu em meio dos tupinarnb s.
145
. Como visse porém que ~u não
_ . m em sua companhta. rte com o senhor almirante,
urna .viage - assapo f 1 '
queria fi'car • obteve-me um P Norma ndi· a · ~ste
. ez evar-me
d a
o mais alto co1nandante erniu falar de mim, . e . eu-me o
sua presença, quando ouv ·nda algum d1nhe1ro para a
assaporte. Meu capitão de~-meHa1 nfleur para Le Havre Neuf
P . arpei de o .
viagem. Despedi-me e z
e daí para Dieppe.

CAPíTULO 53.

. fui· . conduzido à casa do ·1capitão


eorno em D1eppe
do Bel'Eté, o navio que partira do Bra~I ~n~es
de nós, e que ainda não tinha regressado a patr1a.

Era de Dieppe o último· ri.avio, o "Marie Bel'Et~", ~o qual


queria voltar para a França o intérprete que havia dito aos
índios que me devorassem. ,Tambem de lá eram, assim como o
capitão dêsse navio, os homens que não quiseram tomar-me no
seu bote quando fugi dos selvagens. Conforme me contaram os
índios, havia-lhes dado o capitão um português para comerem,
quando, como acima se disse, tomou um navio dos mesmos.
O "Bel'Et~,,, e . sua tripulação, não tinha ainda voltado
quando che~ue1 a D1epp~, embora devesse já estar, três meses
an~;s de ~os, na patri~, ~?nsiderando que 0 nosso navio,
o Catherine
· d "'l de Vettev1lle
. ' ·estivera- no Brasi·1 t res meses
A

d ep01s e es, e me havia resgatado.


As mulheres, parentes e amigos dess . .
e perguntaram se dela nada h . ª ~ente vieram ver-me
certamente soube alguma cousa avia , · Re spondº1: "s·rm,
d . . 1 sabido
ímpia no navio. É-me indiferente ~ esf. Ha, em parte, gente
lhes como um da guarnição q on e icaram." Então contei-
· ' ue estava n t .
ent re os nativos, ordenara a êstes ue a erra estrangeira
todo pode:oso me havia proteg·d 1 0
q m~ comessem. Mas Deus
gente havia se dirigido em se b · Contei-lhes ainda como essa
. .
est ava preso, no intuito de tu f'ote para. as cab anas em que eu
~acacos; c~mo fugi dos selvag~~s1car com os índios pimenta e
nao me quiseram receber d ' -nadando para o seu bote mas
com os nativos ' e sorte ·que t· '
lento. Tambem' ~a q~e me causara então ive de v~Itar à terra
que tinha sido c:~~;:sa gente dado aosg~~~~e magua e de~a­
·comiseração. De tudo '. t De mirn não t 'nh lOS um portugues,
is o conclúo , como º1 arn tido nenhuma
146 bom Deus foi liberal
Para comigo, de modo que p
- or graça h
par~, traze~ aos. s~us estas novas "Qc eguei antes desta gente,
rem ' contmue1; posso adiant . ue venham quando quise-
punição tamanha impiedade ar-vos que Deus não deixa sem
- o quê cometeram contra mie malvadez - Deus os perdôe!
chega o castigo, pois Deus 0 Sm ~a terra alheia. Cedo ou tarde
mente se apiedou da rninh~ súp~~ ~~ dos ~éus, bem manüesta-
resgataram dos selvagens corr Ic~h E mais: "Aqueles que me
verdade. Deus nos deu t~m 0 ~~ ~s. bem a volta. Esta é a
das profundezas do mar". p gnifico, bons ventos, e peixe
Isto impressionou grandemente
va que os seus parentes . d . . ' e perguntaram se eu acha-
d. am a v1v1am. Para não tirar-lhes toda
a esperança, Isse-lhes que talvez pudessem ainda voltar em-
bor~ todos, e ~u tambem, acreditássemos que êles, com o ~avio,
haviam perecido.
. Depoi~ .destas conversas, despedi-me e disse-lhes que po-
diam participar aos seus parentes, quando chegassem, que Deus
me favorecera e que eu aí tinha estado.
De Dieppe seguí de navio para Londres, na Inglaterra. Lá
permanecí alguns dias, continuando depois para a Zelândia e
daí para Antuérpia. Assim Deus, todo poderoso, a quem tudo
é possível, ajudou-me a voltar à pátria. A êle perene louvor!
Amen.

Minha ·oração a Deus Senhor, quando estava em


poder dos selvagens que me queriam devorar.
ó tú, todo poderoso, que creaste o Céu, e a, Terra; ~ú, Deus
dos nossos patriarcas Abraão, Isaac e Jaca; ,tu, que tao pode-
rosament e guias · t e 0 teu povo d'Israel atraves do Mar· Verme-1 t
lh r d _ d seu inimigo; tú, que protegest~ Dan1e en re
o, :vran o .º o , , sem re soberano, queiras salvar-me
os leoes: a ti peço, o tu,
d
,~ ue não te conhecem nela
- d t
A homens crue1s, q . . , '\
as maos . es es . . . rido filho, que os pris1one1ros
amor de: Jesus Cristo, teu que , Senhor é de tua vontade
, e Se porem, ' ..
salvou de ·.e terno carcez:.. · aturada desta gente, que nao t;
que padeça eu morte tao de~nlh falo me respondem que tu
conhece, e que, quand? de ti e ~!s su~s mãos - su~tenta;ne
não tens poder para hvrar-m em mim suas 1ntençoes,
na última hora, quando exe~ut~:ricórdia. Se devo Pª?~c~r
de modo ·que não duvide da u~ e preserva-me da m1seria
tão grande aflição dá-me depois Pªtezmorizaram todos os nossos
na vida futura, diante' dª q uai ,se
desa livrar-me por eerto do seu
antepa~sados. Pois, Senhor' po
147
des ajudar! E quando me hou-
poder Ajuda-me, sei que me P? sorte mas somente à tua mão
veres ·aJU
· d a d o, nao d a Pois ' agora, nenh um po d er10
- 0 atribuirei
, ,
poderosa, que me tera salv~ º·uando me tiveres arrancado do
humano logrará ajudar-me. bq efício e trazê-lo à luz dentre
seu poder hei de louvar teu en '
'
todos os povos ·
onde estiver. .A.Inen· ·
.. . possa orar contrito _
Nao creio que a 1gue~ . persecuçao e a dôr
Desde que não o atinJam o perigo, ª d ·
O morto não pode viver pela sua v~nta e,
A criatura não pode ir contra o Criador.
Justamente para com o homem, a quem manda a dôr,
Mostra-se Deus em verdade generosamente bom.
E ninguem ousa· duvidar
Que a dôr é favor divino.
Nenhuma esperança nem defesa encontra, nunca,
Senão aquele que se arma da fé e da palavra do Senhor.
Por isso todo homem temente a Deu~
Nada de melhor pode ensinar a seus filhos
Do que fazer-lhes compreender a palavra divina
E a ela entregar~se na desgraça.
Por fim, caro leitor, não penses
Que eu à procura de fama e honrarias
Escreví êste livrinho;
ou.tro _motivo moy~u-me o esforço:
For feito nh para gloria - e louvor ao Todo Poderoso,
Que co ece o coraçao e pensamento human 0
A êle, caro leitor, te recomendo. •
Queira êle tambem para sempre ~roteger-me !

FIM DO PRIMEIRO LIVRO

148
Livro Segundo

A TERRA E SEUS
HABITANTES
Pequeno relatório verídico
sobre a vida e costumes
dos tupinambás dos quáis
fui prisioneiro.

. é . . sua terra fi ca. a 24º de latitude .sul,


Habitam a Am rica' ,,.., . ue é· e 1am ada Rio de Janeiro.
limitando com uma regiao q 1
3
0 3.• Dois chefes tuplnombós, com os corpos emplumados e ostentando,
da esquerda, tembetó e um ibirapema e o da direita, tembetá, acCn·
gatóra, enduape e um arco e flexas.

150
CAP1TULO 1.

Como se viaja
, . de Portugal ao Rio de J ane1ro,
· que
A
fica na merica a cerca de 24 graus de latitude sul.

Lisboa é uma cidade de Portugal e fica a 39 graus ao norte


do Equador: Quando se quer viajar de Lisboa à província do
Rio de Janeiro, na terra do Brasil, que tambem se chama Amé-
rica, vai-se primeiro às ilhas Canárias. Pertencem ao t·ei da
Espanha, e seis delas devem ser aqui mencionadas: Grã-Caná-
ria, Lanzarote, Fuerteventura, Ferro, Palma e Tenerife (143 ).
Daí segue-se para um grupo de ilhas, que se chamam do
Cabo Verd~, isto é, ilhas do promontório glauco. ~ste pro-
montório · fica na terra dos pretos, que tambem se chama
Guiné. Êsse grupo de ilhas, sob o trópico de Cancer, pertence
ao rei . de Portugal.
Das ilhas do Cabo Verde veleja-se rumo sudoeste-sul para
a terra do Brasil. O mar é grande e amplo. Singra-se muitas
ve~es tr ês meses para alcançar-se terra, primeiro passando o
1

trópico · de ,. Cancer, que fica para trás, depois o Equador. Quan-


do se debca êste ao norte, não se póde mais ver a estrela do
Norte, que tambem se chama est:e~a ~olar .N?rte. Então se
chega à .altura do trópico de Capncorn10 e. i.:1aJ~-se com. sol_ a
pino. Quando se deixa o trópico do Capncorn10, em drreçao
ao sul, olhando-se para o norte, vê-se o sol.
Entre '. os dois trópicos impera de contínuo ~-ran.de calor, e
a terra citada do Brasil fica em parte na reg1ao inserta nos
trópicos.

-----
113 ) ·- O arquipélago das Ca
ilhas e ilhó'tas.
nârias compõe-se ao todo de treze

151
CAP1TUL0 2.

Como está situada a ·terra da ~érica ou


Brasil, que em parte eu VI.

A América é uma terra vasta. Lá existem muitas tribus


de homens selvagens com muitas línguas div~rsas, e n~ero­
sos animais esquisitos. Tem um aspecto agradavel. A~ arvores
estão sempre verdes; aí não medram as semelhantes as nossas
hessianas. Os habitantes andam nús. Na parte da terra que
fica entre os trópicos, em nenhum tempo do ano faz frio, como
aqui, no dia de São Miguel, mas a terra ao sul do trópico do
Capricórnio é um pouco mais fria. Aí vive uma tribu de índios
que se chamam carijós. Servem-se de peles de animais selva-
gens, preparam-nas bem e cobrem-se com elas. Suas mulheres
fazem te~idos de fio de algodão como sacos, abertos em cima
e em ~a1xo. Vestem-nos e chamam-nos em sua língua tipoi.
Existem .tambeT? naquela região frutos terrestres e arbó-
reos dos quais se alimentam homens e an.1 .
têm o ·corpo de côr pardo-avermelhad fais. Os ,habitantes
que os queima muito E' gente ª· sto provem do sol,
pre pronta para pers~guir 08 inü~~paz, astuta e maldosa, sem-
. igos e devorá-los
A terra da América estend - . .
c~nt,.en~s de milhas para o nort: se, em comprimento, muitas
·ili
d1stanc1a de umas quinhentas m1 para o sul. Velejei bem a
numa parte da terra, e em muit as ªº longo da costa estive
. as povoações, em pess~a.

152
CAPíTULo 3.

De uma grande cadêia de n1ontanhas


que existe na terra.

,. Existe
. aí uma cadêia d e mont anhas que se aproxima
· ate,
tres milh~s do mar, na!guns lugares mais, noutros menos. Co-
meça r:iais ou menos a altura da baía de Todos-os-Santos, -
povoaçao que os portugueses erigiram e habitam - estendendo-
se n~ total ~e duzentas e quatro milhas ao longo da costa, até
terminar a 29 ao sul do Equador. Por vezes tem oito milhas
de largura. Do outro lado desta cadêia há terra tambem. Por
entre as, · IDO~tanhas nascem muitos lindos cursos de água, e
existe a1 muita caça.
Na serra vive uma raça de índios, que se chamam guaia-
nás (144). Não têm domicílio fixo, como os outros selvícolas
que habitam defronte ou atrás dos montes, e fazem guerra
contra todas as outras tribus. Quando indivíduos de tribus es-
tranhas entram em seus domínios, comem-nos. o mesmo fazem
1

os outros com êles. Vão atrás de caça nas montanhas, atiram-


1

na, .ágeiS, com o arco e empregam com dextreza outros petre-


chos, como laços e armadilhas, com que a apanham. Existe
tambem na serra muito mel silvestre, que comem. Os índios
conhe~em ge.r~lmente o grito dos animais e º. ~anto dos .p?ssa-
ros e valem-se disto para assim melhor espreita-los e atira-los.
Acendem 0 , ~ogo com dois pedaços de pau, como tam:bem os
outros ' s.e lyagens. A carne que comem, assam-na em geral.
Perambulam · com as mulheres e prole.
' 1 1 ./ • • •

Quando · acampam nas proximidades de terreno m~1go,


levantam em .
.torno de seus ranchos un:i trançado co~pacto de
galhos que ·, lhes serve tambem deA abrigo contr~ o Jaguar, de
sorte que .não se pode surpreende-los sem maIS nem menos.

114
) -
'
IHâ divergências entre
costumes . dos guaianãs. ·· A bibliogra
f: 8
tores na descrição dos usos e
~~re esta tribu é apreciável, :fir-
znando · ql,1~ 1 ~ão pertencia A raça tupf.
153
. ontudos, chamados maracá-
espinhos ar . d'
Fincam tambem no solo _ como aqui. ~e poem.
p - ma i-
ibá, em volta de suas palhoça~ d 0 5 seus inimigos. Alimentam
lhas de pé. Isto fazem por me 0 't Quando rompe o dia, ex-
uma fogueira durante toda,.,ª noi e.iste a fumaça e não se lhes
tinguem-na, a-fim-de que nao se av
siga o rasto. ,
. · · .e as unhas. Como outros gen-
De1xam crescer os cabelos racás que consideram
tios, têm as matracas chamada~ ma , dan'sas Cortam com
deuses. Organizam .tambem festins e · h d dr
dentes de animais selvagens e racham co.rp ~un as e P~ ~'
·
como as tinham as ·outras
· tri·b us· ant e s que tivessem comerc10
de permuta com os navios. .
Marcham frequentemente . contra os seus advérs~ios.
Quando querem capturá-los, p(;>stam-se, atrás .de galhos seco~ p~
vizinhança das choças inimigas. , No · momento em que vem
para buscar lenha, procuram ·a panhá-los. Tratam com mais fe.!
rocidade os seus inimigos do que êstes os tratam e cortam-lhes
muit~s vezes, com · ·s anha 'íurioiú~t, as pernas e braços do corpo
em vida. o~, outros, p~rém, m.a t.a m primeiro o inimigo, antes
de esquarteJa-lo e' come-lo. .' '.
1

t,
'·"· ---
1 •

' 1 ' '

'' CAPfTULO 4. .
1 '

· .··n os índios ·tupinambás ·dos ·,. ·.. ·· ·


· ' · · ·· ' , 18
q~~ f u~ prisioneiro: ·
. ~s tupinambá~ ··habita'm defro , . . ·. . . : .,
bem Junto. 8:º .mar; ·. mas 'tanibem ·at~e . da citada gra'ride serra.
o seu territorio por . cerca 'de sessenta' ' em qa ' montanha
· 'Ih se ' t ' d
que nasce nes t a serra " . . · . m1 as· ·N · .. . pes en,. e
então no mar, têm êle:'tçorre P.~ra!e.fo à costa
uma região de . t . ambem terra q
â rio. ara1b?,
h . ,.. esembocando
. s- v111: e e :oito milhas d ' ue abitam beirando
, ~º. acossados de . contr, '. . . '. e comprimento. '
seu VIzmho uma . t 'b ar1os de tod .
s- Ih . ri u de g t,
ao- es adversos. Se · . .. e~ ias .cham d
os os lad
os.
A . ,.
o norte e.
quins; os que habÍta~s in_un1gos 'ªº
, , .
suf 0
~ gua.i tacás (1~·cs}.·
. mais ao interior ~ amam-se fupini.:'
. 1115) P "
nio A · · -:--- ara , Teodoro S · : · ,.
sao cham a d os cara-
yrosa traduz como ,, h b~lllPaio . 0 te~ . ,.
a itante . d , rno s1gnifi "
154 os Vales''' obra ca. o andejo'' ~ J>li-
.. eit., Pág. 14·6.
j:lS i.1 1;); pr?xin10 ~ êles, na serra, vivem
;l mbos há ainda t~n1a outra tribu os os ~~aianás e entre
5 ~- L) 1n1it o perseguidos. Todas esta's maracaJas, pelos quais
.s1 ,
q uan do alguexn apanha um in1m1go,
. . tr.ibus se guerreiam entre
come-o.

CAPtTULO 5.

Con10 constróem suas ·habitações os tupinambás,


dos quais fui prisioneiro.

. Edific_~ suas ~hab!tações de preferência em lugares em


~uJ a proxmu.~ade tem .agua e lenha: assim como caça e peixe.
~~ uma reg1ao se exaure, transferen1 seu lugar de moradia
_ara outro. Quando querem construir suas choças, reune um
cheie um grupo de cerca de quarenta homens e mulheres,
quantos pode conseguir, sendo usualmente seus amigos e pa-
rentes, que edificam uma cabana, de mais ou menos quatorze
pés de largura, a qual, conforme o número de pessoas que
abriga, chega a ter cento e cincoenta pés de comprimento.
Tais cabanas têm mais ou menos duas braças de alto, arredon-
dadas em cima como a abóbada duma adega e cobertas espes-
samente com folhas de palmeiras, a-fim-de que não chova
aentro. Não têm divisões no interior. Ninguem tem um quarto
separado; a cada ocupante, porém, marid? e mulher, cabe, de
um lado um espaço de doze pés ao comprido. O espaço corres-
pondent~ do outro lado é tomado por outro ocupante. Assim
ficam repletas as cabanas. Cada ocupante tem seu fogo pró-
prio. O chefe da cabana recebe seu lugar no centro. Cada ca-
bana é provida em geral de três peq~en~s po~tas, uma en: ca_da
extremidade, e uma no meio. Elas sa? tao baixas que os ind1os
precisam curvar-se para entrar e sair.
Poucas aldeias contam mais do que sete cabanas. E?~re
estas d · _ ~ 1 't'o li'vre em que matam os seus pris10-
. ·.e1xam e es um pa i ' f t"f" -
neiros. Gostam de rodear suas chóças com uma or I icaçao,

~ ertllo da capitania vicentina, como


rnost ) - Os carajâs viviam n~ts den Eram de ra!:a não tupt e eml-
gr ra mais ou menos o m.npa de n _ ·_
·aram depois para o vale do rio AragUB 1a.
155
da de troncos
s uma e~taca menos braça
m volta dela de mais º~nhuma flecha
a saber: _levarachados. Est a tão
ntam e cerca,
cerra d a, sque n
buracos pe1os q uais
de palmerra
. de altm .à, fazem-na,
, m ai tem
pequeno
rigem "nda uma outra
a1
e meia , la . Pore
de atravessa- desta' es tacada e
p~
atiram. Em torno .

34•• Umo aldeia fortificada· com' crâneas de prisioneiros nos moirões da entrada.

cerca, uma paliçada. de paus grossos e compridos, não os .col?-


cando, entretanto, Junto um do outro, mas a uma distancia
pela qual não pode passar um homem. Entre alguns selva-
gens é uso
estacas espetardasa cabanas.
à entrada cabeça dos inimigos devorados sobre as

156
CAP.tTULO 6.

Como acendem 0 fogo.

35.. Produzindo fogo.

Têm eles uma espécie de madeira chamada ubaçú-iba.


Secam-na, tomam-lhe dois pedaços da grossura de um dedo,
esfregando um sobre o outro. Isto produz pó e o calor da es-
frega acende êste pó. Assim fazem fogo, como mostra- a fi-
gura.

157
CAPíTULO 7.

Onde ~ormem..

36'. - Uma rêde.

Dormem em rêdes que chamam ini .em s.u a língua e s~o


feitas de fio de algodã<~. Amarr~m-n~s acima do sólo em dois
moirões.
De noite entretêm ·.per1!1anerttemente. uma fogueira e tam-
1

bem não gostam de sair fora das cabanas, na escuridão, sem


fogo, para as suas necessidades, de tanto medo que têm do
diabo, ao qual chamam ~hanga e acreditam muitas vezes ver.

158
CAPiTULO 8.

Como atiram, com dextreza, an1·ma1·8 se1vagens


e peixes com flechas.

Para .oi:de quer que vão, seja no mato ou nágua, sempre


levam consigo arco e flechas. Quando andam pela floresta
voltam o rosto fixamente de tempos em tempos para 0 alto d~
árvores. Percebendo algum indício de pássaros grandes, ma-
cacos ou outros animais, que nelas vivem, dão-lhes caça, esfor-
çando-se por atirá-los e perseguem-nos até consegui-los. Raras
vezes vem de mãos vazias aquele que vai à caça.
Assim · tambem seguem os peixes, perto da praia. Têm a
vista aguçada. Quando algures vem um peixe à tona, atiram-
no, , e pouc~s setas falham. Logo que um peixe é alcançado,
saltam 'nágu'a e nadam-lhe atrás. Muitos peixes grandes afun-
dam, quando sentem em si a flecha. Mergulham ao seu en-
calço; até cerca de seis braças de profundidade, e trazem-nos
para , fóra . .
Além disso têm pequenas rêdes. O fio com que as ema-
lham obtêln.-rio de folhas longas e pontudas, que chamam tu-
cúm.' Quando querem pescar com es:as rêdes, juntam-se alguns
dêles e· êolocam-se em círculo na agua r~a, de :nodo _que a
cada um cabe um determinado pedaço d~ rede. Vao entao ~
poucos' no centro da roda e batem na agua. Se algum pence
quer f · · · fundo fica preso à rêde. Aquele que apanha
. ugir para o ' escam pouco.
muito peixe reparte com os outros que P .
. eom: ' fr equenc1a vem tambem
A •

..
gente que mora dIStante do
. es torram-nos sobre o
~ar, r~colhem grande porçao" de fe ~~ que secam bem a-
1

?go, esmagam-nos, fazendo de~es t::n 0 'Levam-na para casa


fnn-de que se conserve por muito d ~~dioca. Se levassem
e comem-na juntamente com ª _ e - se conservariam por
assad
. os os peixes para casa ' entao Tambem
nao leva uma vasilh
.. a
inu~to tempo, pois não os salgan;· caberiam peixes assados m-
' in?1s farinha de peixe do que ª
tetros.
159
' --
-~-

-
--
....:::.. .

-
37. - Uma partida de pesca.

160
CAPíTULo 9.

Qual é a estatura da gente.


São gente bonita de corpo e estatura, homens e mulheres
igualrnente, como as pes~oas daqui; apenas, são queimados do
s 1, pois andam todos nus, moços e velhos, e nada absoluta-
mente trazem sobre as partes pudendas. Mas se desfiguram
com pinturas. Não têm barba, pois arrancam os pelos, com
as raízes, tão pronto lhes nascem. Através do lábio inferior,
das bochechas e orelhas fazem furos e aí penduram pedras. E'
0 seu ornato. Além disso, ataviam-se com penas.

CAP1TULO 10.

uando não obtêm dos


Com o que cavam e cortam, q tras
cristãos machados, facas: t~souras e ou
mercadorias sundares.
. m os navios à terra, em-
Antigamente antes de lhes . vire edra preta-azulada na
Pregavam os índios uma espécie de ~m muitas regiões, que
fabricação de cunhas, e ainda o faAzf~mm a borda mais larga d.a
- •
nao são procuradas pelos navio 5 .
ia os um pabno de compr1-
Pedra. Estas cunhas têm mais ou ~~n de espessura; algumas
tnento, quatro dedos de largo e ~~tão urna pequ~a vara,
ln.aiores outras menores. Tomam arraxn-na com em ira.
dobram~na por sobre a cunha e a!ll 161
cun h a S d e ferro que· lhes
. !' tambem as... Aí orém arran1am o
A mesma forma tlen1mas povoaçoes. e penfiando a cunha
. t- s en1 a gu d o pau h
dão os cris ao ' . perf uran ° qual rac am.
t a maneira d com o . .
cabo de ou ~sto é o seu macha o, d mato afian1-nos no
no buraco. d orco o ' d
b m dentes e P dois pedaços e ma-
. Peg~m taII?_l~s e amarram-nos entr~cos tão roliços como
me10, ate aguça suas flechas e .
.
d eira. Com isto aparam ·
se fossem torneados. ·n imal que é chamado
Por fim empregam o den te de um a
t e quando .' tem a 1guma
A

·am bem êste dente na pon a, . ham .com êle o lugar


paca. Afl d gue arran ·
moléstia, que lhes vem o san ' sendo esta a sua maneira
que lhes dói. Isto faz brotar o sangue, . , . . .
~s~~. .
1 •

CAPíTULO 11

o que os selvagens comem êomo pão e ~.orno plantam


e preparam as raizes de mandioca.

Quando querem plantar, derrubam as arvores do lugar que.


para isso e~colheram! e deixam-~as . secar por cerc~ d~ três
meses. Entao lhes deitam fogo e queimam-nas. Depois fmcam
as mudas da plal)ta de raizes que usam como pão, entre as
cepas das árvores. Êste__ y~getal se chama mandioca.· É um" ar-
busto de uma braça de altura- ~ ._ que cria tr.ê s.· raízes. Quando
querem prepará-las, arrancam ·os arbustos~ · dest'acam-lhes as
raízes e enterram de novo os p~daços· d~ hastes. Estas pegam
e se desenvolvem tanto em seis meses, que podem ser . utili-
zadas.
Preparam a mandi~ca de três modos. Primeir
' ' '

: trituram
0
sobre, uma pedra as ra1zes totalmente, em pequenos grumos,
extraindo o suco COil} uma cana feita de case d lm ha-
. t· ·t' D" t ' "'
mada 1p1 1. es. e modo se torna seca a ma a e pa as e ·C
d , · as•·
· D f · · ssa,
sam numa peneira. a ar1nha fazem bolos f' · h que epois
A . p·lha
na qual secam e torram sua farinha é fei mm os.. . vas1 ,
tem a forma
· · de uma grande t ravessa. ta de barro queunado
. e

162
Segundo: tomam as raízes frese . .
xando-as aí apodrecer; retiram-nas e~~~ deitam-nas nágua, dei-
ª sobre o fogo. Chamam a estas raíz:~ e" secam-i;as_ na fuma-
ç -se por muito tempo. Quand secas canma. Conser-
van1 ° os se1vagens querem utilizá-
las, esmagam-nas em um almofariz de madeira. Isto dá uma
·farinha branca. Com ela fazem bolos que se h b .. ,
.. e amam eIJUS.
Terceiro: tomam mandioca bem apodr ·d -
. " ec1 a, nao a secam,
mas a misturam com seca e verde. Obtêm assim~ torrando, uma
farinha que se conserva perfeitamente um ano~ É boa tambem
para comer. Ch~mam-na uitá~. .
Preparam tambem uma sorte de farinha de peixe e carne,
do seguinte modo: assam a carne, ou o peixe, na fumaça sobre o
fogo, deixam-na secar de todo; desfiam-na, torram-na de novo
depois, ao fogo, em vasilhas queimadas para tal fim e que cha-
mam inhêpoã; esmagam-na após em um pilão de madeira e
passando isto numa peneira, reduzem-na a farinha. Esta se con-
serva por muito tempo. O uso de salgar peixe e car:ne, ne~ o
conhecem. Comem a tal farinha junto com a de mandioca, e isto
tem muito bom gosto.

CAPfTULO 12

. Como temperam seus alimentos.


, d· os que não comem sal. Nas
Há muitas tribus, ~n~re ~s in i1 . '
·as 0 usam; imitaram-no
tribus das quais fui prisioneiro, ª ~am Contaram-me porém
dos fr anceses, que com êles comerei ·
, ·o nfinante e que mora no m-

. , t 'b que lhes e e
co~o os cara1as, r1 u ,. al de palmeiras e co~em~n?.
tenor, longe do mar, o~tem s a comer muito dêle, nao v1v1a
Quem, entretanto, se habituasse
longamente. · mesmo 0 vi e nisso
. t modo - eu s
Fabricam-no do seguin ~ ssa e a picam em pequena
ajudei· abatem uma palmeira _gro lenha sêca, colocam em
1ascas. · Fazem depois uma e aie1rae com ·nza Desta
reduzindo-as ª ci : que
e. .mando-as tão uma c01sa,
una estas lascas, quei Separa-se en i-o no fogo.
fazem uma barrela, que cozem. fosse salitre e pro.ve ta
tem. aparência de sal. Pensei que 1 e era de côr c1nzen .
N- , . to de sa
ao era porem. Tinha gos . . usa sal.
Mas · a maioria das tríbUS nao
163
. u carne, põem dentro
.
, dios cozinham peixe o esta, um tant o cozi"d a,
Quando os i::Oenta verde. Logo que a a fina que se chama
habitualmente Pld e fazem dela uma P P utilizam como va-
retiram-na do ca o baças de que se
.
m1n . ga
' u . Bebem-no em ca
siThas. "da de peixe ou de carne,
Quando querem preparar uma. comi peixe ou a carne sob re
que deve durar muito tempo, deitam ~os acima do fogo, que
pequenos paus à altura de quat~o pado deixando o alimento
fazem em baixo, de taman~o ª :~ª letamente seco~ Quando
assar e defumar até q~e fique. h~-no de novo. Chamam a
mais tarde querem come-lo, cozm
esta comida moquém.

CAPfTULO 13.

Governo, autoridade, ordem e direito que têm.

Os selvagens não têm governo, nem direito estabelecidos.


Cada cabana tem um superior. ~ste é o principal. Todos os
seus principais são de linhagem idêntica e têm. direito igual de
ordenar e reger. Conclua-se daí como quiser. Se um sobresaiu
dentre os outros por feitos em combate, ouve-se-lhe mais do
que aos outros, quando .empr~endem uma arremetida guerreira,,
como Cunhambebe, acima citado. Fora disso nenhum privi-
légio_ ;>bs_ervei entr_e êles, a não se~ q_ue os mais moços devem
obedienc1a aos mais velhos, como exige o seu ·costume.
Se ac~so alguem mata . ou atira um outro, · os amigos do
morto estao prontos para matar tambem 0 agressor mas 'isso
raramente acont~ce: Cada um obedece ao principal da sua ca-
ban~. O que o prmc1pal ordena, é feito, não à força ou por medo,
porem de boa vontade. ·

164
CAPfTULo 14.
Como queimam as Panelas .
e vasilhas que usam.
As mulheres fabricam a 8 .
guinte modo: tomam barro vasilhas de que carecem do se-
vasilhas que querem ter. D~p=assam~no e fazem então as
gum tempo. Sabem tambem . as, deixam secar durante al-
querem queimar as vasilhas d :mta-las com gosto. Quando
aí bastante cortiça sêca qi{e et r.uçam-nas ~obre pedras, põem
vasilhas, de modo que hicand~ eiam. Assun se queimam as
em como ferro em brasa.

CAPfTULO 15.

Como preparam a bebida, com que se embriagam,


e como agem relativamente a ela.

As mulheres fazem as bebidas. Tomam raizes de mandioca


e cozinham grandes paneladas cheias. Uma vez cozida, retiram
a i:nandioca da panela, passam-na em outras, ou em vasilhas, e
deixam-na esfriar um pouco. Então se assentam as meninas
perto, mascam-na colocando-a numa vasilha especial.
- '
Quando todas as raízes cozidas estão mastigadas, põem de
novo a massa na panela deitam-lhe água, misturam ambas, e
aquecem de novo. '
Têm para tal vasilhas adequadas, que enterram. a meio no
Chã. o, e que se empregam como aqui· os toneis para vinho
·lh
e cer-
I t
VeJa D . f ham bem as vas1 as. s o
ferin· espeJam dentro a massaDe · ecam na assrm. repousar . doIS·
ct· enta por si e fica forte. eIX b.
bias. Bebem-na então e com ela se em ria
gam É grossa e tem
·
oin gosto.
165
~icoeiro
rópria bebida e quan..
banas prepara sua._ ~ ntece habitualmente
Cada uma. das ca festar, o que em uma cabana
do uma aldêia, qu:r mem-se todos prun
uma vez por ines, I e_t l á e assim. a seg
uir '.
até que tenham
e
bebem tu. do que at1 d1 s' as choças.
ª
sorvido a be b1'd de o a e: •

i~
;1
r...

.(
,,,,_

38 - Mulheres trabalhando na fabricação de bebidas.

Sentam-se à volta das vasilhas de que bebem, alguns sobre


achas de lenha, outros ao sólo. As mulheres lhes servem a
bebida tal qual como o seu costume o exige. Alguns se levan-
tam, cantam e 'dansam em torno das vasilhas. No próprio lugar
em que estão bebendo, vertetn suas águas.
166
]3ebem durante a noit
,ntre as fogueiras ardente: t~da. Dansam t
,o -ntos e fazem uma gritaria c~mam,
sopram ª:1~em
às. vezes
lldos. É raro ver-se porém edonha, quand f" seus mstru-
"u ,névolos entre si; que um que tem se desavenhoamicam
s- embria-
.
0
1er do que outro, cede-Ih' o. em maior q uanbdade para
· . ao muito
00

CAPíTULO 16

que .usam os homens como ornato, como se pintam


.e que nomes têm.

39 - Tembetás de labios e de faces.

to Fazem uma tonsura no alto da cabeça e deixam ficar em


rn~o uma corôa de cabelos, como um monge. Perguntei-lhes
r uitas vezes de onde haviam tirado esse penteado, e responde-
sam que sellll antepassados o haviam visto em um homem que
v\~hamava Meire Humane (147), e havia feito muitas mara-
1 as entre êles. Têm-no por um profeta ou apóstolo.

---
dl~e:a amerlcan~s.
tnlto 147) - Malre-monan Mafr-zumane, sumó ou Pai Zomé é um do•
históricos para maior conbcctment.o desta crenca .. ~n­
reu ,1 • consultem-se entre outras 118 ·ecgnlnteH obrue . .A. Jl{etraux... La

de. c~nqnlHtll
torig on des tuplnambâe'' paris 11l28, pAg. irs. - JD. de Gand!a, Jlts-
Dâ.gae ~ga. - Oewaldo Orl~o.
227a critica de los ·mitos Ja amerlc:nnu"' Madrid, 11>29, pl!.ge.
"MltOH umerfndlos''o )tio il • Janeiro, 1930,

. 100 e aegs. 167


A seguir perguntei com o que podiam cortar .os cabelos an-
tes que os navios lhes tivessem trazido tesouras. Responderam
que ~ tomava uma cunha de pedra, sustentando-lhe por baixo
um outro objéto sobre quê se macetavam os cabe1_os. A tonsura
no meio faziam com uma lasca de pedra apropriada, que em-
pregavam muito para tal fim.
Além disso fabricam para si um enfeite de penas verme-
lhai, que se chama acangatara e que amarram à cabeça.
' -

A. ~olábio inferior têm um grande orif~o, e isso desde a in-


fanc1a. Fazem, nos meninos, com um ·ped~ço aguçado de chi-
fre de veado, um pequeno furo através dos lábios. Aí metem
uma pedrinha ou pedacinho de madeira e untam-no com
_seus unguentos. O pequeno buraco permanece então aberto.

40. - Enduape.

Quando os meninos cre~ .1 , 1 •

mas, fazem-lhes m . ...cem e se tornam cap


uma grande dr a1or esse buraco 'Enf' azes de trazer ar-
loca-se para 1:ent~overd\ A extre~idade1~:e e?tão no mesmo
mente. Com o peso 'd~a oca, e ~ espessa per1or, delgada, co-
Em ambos os lados da P~dra fica"lhes semp~endy;a~se externa-
cada uma delas uma oca, nas bochechas e to ab10 pendente.
xos ,ováis e red~ndos. ~quena pedra~ La Íd razem ainda, em
comuns. Estes são del d guns tem cristái P am todos os sei-
ga os, mas do me s em vez de pedras
smo com .
168 prunento.
Confecionam um outro ornato da co . ·
cól n1 arinho, que chamam rnatapú T ncha de um grande ca-
n·1~ branco como neve. Penduram-n.0 , e:rn a forma de meia-lua
· , D a casa do cara:rnujo a volta
e, e-se boJeci. _ . do pescoço. Cha-
ni uenos discos brancos, que enrola:a;-mho fazem tambem
~ ~s têm a grossura de um talo de trig0 :rn dt~rno ?o pescoço.
p S • a' los e a muito trabalho
fabflC - · ·
Amarram tambem tufos de penas nos b .
·
e uma resina e arvore grudam b
d . raços e pintam-se de
Preto. omlh b , so re o corpo pe-
nas verm\ :~ e. ran~as, entremeando-lhes o colorido. Passam
aquela su s ancia so. re os lugares que querem emplumar e
imprensam-lhes em crma as penas, que se colam. Pintam tam-
bem um braço de preto e o outro de vermelho. O mesmo fa-
zem às pernas, e o corpo é igualmente pintado.
Além disso usam um ornato, feito com plumas de ema, que
é uma cousa grande e redonda, que amarram às cadeiras, quan-
do marcham para a guerra contra o seu inimigo, ou quando têm
wna festa. Chama-se enduape.
Tiram os seus nomes dos animais selvagens e tomam para
si muitos com uma diferença porém: após o nascimento é da-
do um n~me; que o menino usa somen_te até · que se torne ca-
paz de guerrear e mate inimigos. Entao recebe tantos nomes
quantos inim~gos tenha matado.
',1•

CAPíTULO 17

heres como enfei.te.


·o·que usam as mul .
t0 e
corpo todo
0
1· feriar do ros de· xam
d As mulheres pintam a part~ ~am 05 bome~s. Mas ~rna-
oe !nodo idêntico ao que se pm mulheres. Nao tr,az~duram
~ cabelos crescer' como ?utr;sros nas orelhas, e a1 iJ:priment.o
enen!o especial. Apenas .tem r::enos um palmo d~cºsua língua
feites redondos de mais ou Chamam-nos e designa-
e Utna polegada' de grossura. d caramujos do mar,
~ªlnbipai e fazem-nos tambern e
os Por rnatapús. 169
ne1:x:es
. e frutos das árvo-
~ dos pássaros, rr. uando mulheres, po-
Ton1 tn s us n?1nes .. as um nome, q matam seus ma-
Na iníancia ten1 apen antos escravos
r s. . . tos nomes qu
retn toman1 tan . lh
. , dome os pio os.
ridos. ulher espiolha algu:m, faziam e responde-
Quan.do uma ~ . s vezes por que assim miam alguma coi-
Pergunte1-lhes muita . imigos que lhes Nc~ há . parteiras es-
ra1n-1ne que eram se~s invingar~se dêles. ao do parto . acode-
sa da cabeça, e quenam ulher está nas dôreslh é ex~tamen-
eciáis. Quando uma ~ . em ou mu er, .. .
~ quem se acha mais proxuno, ho~e quatro dias depois . de um
te O mesmo. Vi mulheres, cereal,
· d'aco a
., . . . . .
nascimento, andar daqui e .. . anos de fio : de algo-
Carregam seus filhos envolv1dolhs, em,·PAs crianças dormem,
dão, sobre as co:t as, e. assim
. traba am.
- obstante as mulhere~ se do-
entretanto, e estao satisfeitas nao. elas , . .. ,
brarem e locomoverem .bastante c, p~ . , , ~· .i
,, i 1 ••

' . 1

.. 1
1 '

'. ~ .'
CAPíTULO' 18
1 •.

,• ' ' \ . \

Como dão o primeiro nome às cria·n cinhas.


A mulher de um dos selvagens, que me ha~ia '', aprisionado,
deu à luz, alguns dias depois, um .filho. O i:iarigo reuniu. os
vizinhos mais chegados da sua choça e com eles conferenciou
sobre que nome convinha dar á criança, o qual significasse de-
nôdo e impusesse mêdo. Propusera~ .muitos , nomes, ,que não
0 agradaram. Dizia querer dar ao .filho o nome de um dos seus
quatro antepassado~ . e acrescentou 9-ue :~s ;rianças trazendo a-
queles nomes cresciam robustas e tinham exito · na captura dos
escravos. Mencionou os quatros avoengos: . o· primeiro se cha-
mava Quirimã, o segundo Eíramitã, o terceiro Coema e o
nome do quarto não guarde.i. .Q\la~do falou em Coema,' pen- 1

sei que devia ser Cham, ou Ham, - · en~retanto Coema em sua


língua .signif~ca: . manhã. A:c~ns~lhei-o dar ·à ~rianç~ êste . \n o-
me, pois havia sido, .sem duvida, o de · um dos seus antecesso-
res. Recebeu o tnen1no um daqueles nomes 1 •
· 1 1 • •

Assim dão apelidos aos seus filhos, sem batismo nem cir-
cuncisão. 1 1

170
CAPíTULQ 19.

Quantas mulheres tem um v.a -


rao e como as trata.
A maioria dos homens tem só u ulh
têm mais, e muitos dos seus princip~a ~ ter, alguns porém
f Ab t' s em reze e quatorze
O eh e e ª l-poçanga, ao qual fui dado de presente última~
mente, e do qual os franceses me resgataram tinha muitas mu-
lheres, e uma, que. lhe havia sido a primeira, 'era suprema entre
elas. Cada " uma tinha o seu espaço exclusivo na cabana seu
fogo próprio e sua plantação de mandioca particular. Mantfnha-
se o varão no espaço pertencente áquela com quem lidava e
que lhe dava de comer. E assim alternativamente.
1 "

Criam elas os filhos que têm; se são meninos, quando cres-


cidos ; ~ducam-nos para a caça. Cada filho entrega tudo o que
traz da caÇa à sua mãe que coze a dádiva e a reparte com os
outros ~
. As .m~lheres vivem em boa harmonia umas com as outras.
Entre os ·s elvagens é costume um dar de presente a outro uma
mulh~r~ ·quando dela se e~fa~a. Sucede tambem que se presen-
teiam co:tn uma filha ou irma.

\ 1 • I'

CAPfTULO 20.
missos de casamento.
·Como são os compro
. . uando estas são ainda
. . omo noivas, q . rtam-lhes os
Prometem suas filhas e f cam casadeiras, co . ada for-
criancas. , Quando crescem e lranbaduras de deter~mai'·s selva-
cabel~os, fazem-lhes as
.. costas ar alguns dentes dde anun
as esfoladu-
ma e prendem-lhes ao pesco_ço de novo cr;sci os i: põem qual-
gens. Quando os cabelos es:ao as escoriaçoes, Pºpreta depois de
ras sas,
- . podem-se a1·nda verdo que Perrnanece
quer :cousa na ferida, de mo 171
Concluidas táis ceremô-
ideram isto uma honra. deve ter sem solenidade
curad a. e ons . , le que a ' t"'
. entregan1 a inoça aque com decoro e em suas
inasl . Ih r portam-se
especial. Marido e mu e
relações a encoberto.~ nh"" cedo percorrer todas
· · al pela ma a '
Vi tambem um pnncip ' dente aguçado de peixe as .per-
as choças, arranhando com um , 5 a-fim-de que os pais as
1
nas das crianças, para amedronta- ~tas· "Ele voltará!" Assim
pudessem ameaçar, se fossem pera .
procuram fazer calar as crianças.

CAPfTULO 21.

Quais são os seus bens.


Não existe entre êles propriedade particular, nem conhe-
cem dinheiro. Seu tesouro são penas de pássaros. Quem as tem
muitas, é rico e quem tem cristáis para os lábios e faces, é dos
mais ricos. Cada familia te~, para comer, a mandioca que lhe
é própria.

CAPfT.V LO 22

Qual é a sua maior honra.


. Co~i~e~a um homem sua maior h
muitos 1nun1gos, o que en.t re êle , h ;.nra capturar e matar
mes quantos inimigos matou e s e · ~ itual. Traz tantos no-
aqueles que têm muitos nomes. os mais nobres entre êles são

172
CAPíTULo 23.

No que acreditam.
Os selvagens crêem numa cousa que cresce como uma
abábora. É grande com~ um pote de meia pinta e ôca por den-
tr O. Fincam-lhe atraves
b
um pequeno cabo ' cortam-lhe uma
tertura como uma oca e metem-lhe no interior pequenas pe-
~as de modo que chocalha. Sacolejam isto quando cantam e
da~am. Chamam-no maracá. Cada um dos homens possu_e o
seU, Particularmente. Tem o aspeto que mostra a segumte
figura.

. nel,a de barro.
· . óte e uma po
41. - Um maracá, um P , .-
. . eh am page. São
, A .. ssoas a qu~
·

Ha entre eles algumas pe ui se consideram _


am
os adivinh 05 •
todas as
considerados por êles coroo .aqatravés da terra, va~ ªestranho,
Perambulam uma vez por an? ·to vindo de longe,. fal 0
·. ar e dar
h
e oças e relatam que um esprr1 '
f culdade · ed fazer ·
. qmsesseID; 0
os visitara,
. . . d
investm 0-0s da . a , -
inaracas . se Cada um então
o .
.
05
Poder a todas as mat~acas ~lhes-ia conce~d~ wna grande
que pedissem os pages, s:r sse pader. Pr p
queria que sua matraca tive 173
g ouros levando ainda estra-
festa bebem cantam e fazem a '
. '
nhos usos a efeito.
' d. . hos um dia. Desocupa~se
. d.
Dep01s 1s o, es1 t d ·gnam os · a iv1n
lher ou criança d eve perma-
uma choça, na qual nenhuma mu ada um pinte de verme-
necer. Os feiticeiros ordenam que e e lá entre. Querem então
lho seu maracá, adorne-o com penas .
dar às matracas o poder de · falar. . , os adivinhos em pri-
Quando entram na ch?ça, se~~am-se ão . erto de si. Os
meiro lugar e cravam seus maracas ndo eh i' cÍá àos feiticeiros
demais fincam-lhes ao pé os seus, e ca a qua d
um presente - flechas, penas oµ , ornatos q~e tr~~em pen ~~a­
dos às orelhas a-fim-de q. ue seU. ídolo nao seJa esque~i o.
Logo que estão' todos ·.reunidos,,'' toma · o a d.I v1n
· h o o maraca. . de ,
cada um dêles e incensa-o coin uma herv~ que ~hamam ~pit~.
Segura então a matraca .bem jut?-to ,à boca, chócalha-a e tj.1~-.l.he:
"Né cora", fala agora' ~ faze~~e ouvi!, se ai estás. ~rofe~e ~pqs em
voz alta e depressa· um~ p'a lavra, <;le modo que na<? se pode bem
distinguir se a emitiu êle ou a matraca. Os presentes acr~dit.am
que a matraca a disse, · mas o próprio feiticeiro a emitiu. Assim
o faz com todas ·as .matracas, ·uma após ,outra, e cada um fica
pensando que o seu maracá tem grande poder. Ordenam-lhes
então os adivinhos que pa~tam para a· guerra na captura de ini-
migos, pois ·apetece aos espjritos,,que ·, estão nos maracás comer
carne es.c rava. E parten;i após .Para a guerra.
Quando ' o pagé, o feiticeiro~ ~ornou divinas todas as 'matra-
C?S, t°.~ª ,~ada qu~l ~ qu,e lhe perten.c e de volta, chama-a "que-
r1d,o filho
. -· , faz-Ih. e., · uma
. ,.pequena
. choupana
. , na qu a 1 sera' coo-1
cada,.
,. poe-~he
, '· ... em f,r ente comida. ,e, nnplora-lhe
. .tud o quan· t ,o a s1·
e ·necessar10, do mesmo modo como ·rogamos ri., ·d d ·
Deus. São então os , seus deu ses. · os
, ao .ver. a erro
· Com 9 ver~adei~o ·Deus; que creou 0 céu _
preocupam~·- Creem,. de longa tradiç- ~ a terra, nao se
pre exist.ira~. Al.iás, nada sabem ~~é que ~ ceu e a t~r~a. sem-
mundo ' 'ape'nas narra·m· q' u''e h ouve, · .uma . ·particular ·do 1n1c10
·. _ do
1

, , ,
aguas na qual ,. todos ·os seus antepass d vez uma vastidao de
Somente alguns daí escaparam nur: os morreram afogados.
sobre altas arvores. ·Penso que d a ~mbarcação e outros
A ,Princípio, quandci chegueie:~t;er ~ido o dilúvio.
maracas, calculei que fosse tal e eles e falaram-me dos
narravam-me muitas, vezes 'co v.ez, uma arte do diabo pois
f u1· a' ch oça em que estavam osmofe·os. o.bJ. et os f alavam. Quando '
cousas falar, tinham todos que ,a~!1ce1ros que deviam ·fazer as
c~ban~, quando reconheci: a farç entar-~e. , Eu porém saí , da
cega e esta ! . a, e pensei comigo.. p o b re gene t

174
CAPfTULo 24.

·Como fazem, das mulh


. eres, feiticeiras .
. Primeiramente vão os selvagens a .
após .outra todas as mulheres da hab~~a_choça? tomam uma
·Depois deve cada uma g ·t · açao e incensam-nas.
• · ;w ri ar' sa1tar e correr em roda, até
, , •

ficar tao ..exausta que cai ao solo como mort E t- d' f ·


· · "V"d A , a. n ao iz o e1-
ticeiro: ·.' e e. ~or~ ~sta morta. Logo a farei viva de novo".
~.ua11do ;i yolta a s1, ~1z ele, está apta a predizer cousas futuras,
e q~a~d~ . J?~rtem apos para a guerra, sobre esta têm as mulheres
q~e . _ pro~~t.izar. Costumes de tal sorte têm êles muitos.
. .·.'.~: ·}µ1.Hher do meu amo, a quem fui mandado de presente
parR ser ,morto, começou uma noite a fazer profecias, contando
a seu:'niarido que lhe tinha vindo visitar um espírito, de terras
estranhas. Êste queria saber dela, quando deveria eu ser morto
e perguntou onde estava o tacape com o qual eu devia ser sacri-
ficado~ . ' Respondeu meu amo à mulher que não demo:aria muito
e·tudq 1:~staria pronto. Porém parecia-lhe que eu . nao era por-
tug4ê~, '· mas sim franc~;. .
' ·Quahdo a mulher terminou su~ predição, pergun~ei-lhe
1

por· qq~· m,e atentava assim co~tra a vida, desde que eu nao era
cer t amen. · t 'e· um in1m1
1·1 ·· · ·go ,· se nao receava que o meu Deus lhe

-
· . . . :. . calamidade. Respondeu que eu nao
pude~s~ mandar a 1guma . . eram. os espíritos estranhos
. ,. .
dey1a . pre.o cupar-me e om isso pois
' f tos ue me diziam respeito.
que aueriam
... . estar ao par dos q ª

~--
'1 \ .

' '1

!·.

' ! 1, 175
CAP1TUL0 25

No que viajam sobre a água. ·


' · d árvore que cha
Existe lá, naquela terra, uma espec1e e . ' ~
mam igá-ibira. Tiram-lhe a casca, de ~lto abaixo, . numa ~
peça e para isso Ievantam em volta da ~vare uma estrutu~a
especial, a-firil-de sacá-la inteira . . Depois trazem essa casca
das montanhas ao mar. Aquecem-na ao fogo e rec~am-na
para cima, ·diante e atrás, amarrando-lhe antes, ao me~o, tran~­
versalmente, madeira, para que não · se distenda. Assrm faJ::>r1-
cam botes nbs quáis 'poâem fr trihta dos seus para a guer~a.
As cascas têm a grossura dum polegar, mais ou menos quatro
pés de largura e qu~rent~ de comprimento, algumas mais
longas, outras menos. Remam rápido com êstes barcos e nêles
viajam tão <;listante quanto lhes ,apraz. Quando o mar está tor-
1 1

mentoso, puxam as e~barcações para ·a práia, até que se torn~


m~o de novo . .Não remam m,ais que duas milhas mar .afóra,
mas . ao lo:q.go da costa viajam l.onge. . ·
1 '
.. '

'I·

1 '

"' CAPfTULO 26
1 '

Porque devoram seus ·inimigos.


'1 '

Fazem isto, não para matar a f ·


por grande ódio, e quando ·na guerraome, mas por hostilidade,
outros, gritam entre si che1·os de f, _escaramuçam uns com os
· ram b egue, d ·· "n e b e marãpá xe re-
, sobr~ ' ti cáia toda ur1a
m1u
N de acanga jucá aipotá curi ne
cabe~a. Xe anama poepica que ~eqa.
u::f
a~a, tu és meu pasto.
a~da hoje moer-te a
e~ tI ~ !llorte dos meus amigos ·NJ~' aqw estou para vingar
erma rire, etc., tu~ carne hoje aÍna roo, xe mocaen será ar
deve ser meu manJar". Isto tud o f azem a, antes
p que. 0 sol s
e d e1·te,
· or imensa hostilidade.
------~
176
.,.

CAPíTULO 27.

Como se preparam quando querem empreender


uma excursão guerreira na terra dos
seus contrários.

Quando pretendem empreender uma excursão guerreira


em terra dos seus inimigos, reunem-se os seus principáis e deli-
beram como se deve agir, dando-o a conhecer aos homens, em
todas as choças, para que se aprestem, e citam então uma q~ali­
dade de .frutos arbóreos; quando êstes estiverem maduros, pre-
tendem partir, pois não sabem determinar ano e dia. Fixam
tambem ás vezes o tempo de partida, no qual desova uma espé-
cie de peixe, que chamam piratí em sua língua. A época da
desova chamam piracema.
Para êste prazo arranjam canôa, flechas e farinha grossa
de raízes à qual denominam uiatã e utilizam como alimento.
Depois dfsto consultam os pagés, os a~ivinhos, se de fato ven~e- .
rão. Éstes dizem naturalmente. que sim, orde~~?d?-lhes porem
que atentem aos sonhos que tiverem com os in1m1gos. Quando
maioria sonha que vê assar a carhe ~o seu inimigo, significaria
~t vitória. Quando) entretanto, virem · ·assar a sua própria
,carne, 1·sto nada de bom prognostºica, e nes t e caso d everiam
is o a A . .
per-
manecer em casa. . ·
. Quando então os sonhos lhes agradam,. armam-se, preparam
em todas as choças ~randes festins, bebem . e dansam com os
seus 1'dolos ' os maracas,. .
e .cada . um . pede a sua matraca que 0
a ºude a capturar um 1nrm1go. . ·
J partem apos. , Quan d o ch egai:i as . ºnh anças da terra dos
' viz1
seus inimigos, ordenam-lhes entao ~s. principáis, na noite da
véspera do ataqu~ ao campo adv:rsar10, que prestem atenção
aos sonhos que tiverem nessa n01te.
,Tomei parte c~m êles. ~u~a excursão guerreira~ Quando
b~viarno~ chegado a terra 1~1m1ga, f~i 0 principal, na noite de
vespera aquela em que queriam ataca-la, a todo acampamento,

177
. atentar bem aos .sonhos que
.. ·. s ue deviam , disso aos Jovens que,
dizend? aos gue:r.en~oi~. Ordenou alem ssim se fez, e o prin-
lhes viessem ne..sa assem e pescassem. ~h mou após os outros
Pela lnadrugada, caç o que caçaram. a se todos em cír-
d preparar s
cipal .m.~n ou . e da sua cabana. en . ue comeram, rela-
taram-
princ1pa1s ~m fie~~ dar de comer. Depois q agradaram bas-
culo no chao. Fez- 1es . muitos dêstes que os ,
taram seus sonhos, e havia e alegria com os maracas. . . .
tante. A seguir dansaran: d . ai as choças dos seus mun~-
Na noite seguinte vao espre:t de madrugada, quando o .dia
gos. O ataque sempre tem luga ue está gravemente ferido,
desponta. Se capturam alguem. ; sua carne assada para casa.
matam-no logo e carregam cons1g t- levemente, trazem-nos
Os que não estao - f en'dos, ou o . es ao .
suas aldeias.
vivos e matam-nos em . . ndo os pés ao solo e so-
Assaltam, sob grande gritaria, ba~e cabaças. Todos envol-
prando em instrumentos, que fazem_ . igos Enfeitam-se com
vem em si cordas para _ama:rar ~ic= fre~te aos contráriOs.
penas vermelhas como sinal ident b flechas ardentes con-
Atiram com rapidez e em~regam tam emlh fogo Quarido um
tra as choças dos adversários para atear~, . es ~ cura
dos seus é ferido, utilizam ervas espec1a1s para .

CAPíTULO 28.

Das armas de guerra 'dos ·sei.v agens.


1 ' '
1
e ,

' '
Usam arcos. A ponta das flechas é de 0sso, que . aguçam :e
amarram-lhes ao cabo, ou ainda de, dentes de peixes. ::€stes são
chamados tubarões, e se pescam no ~ar. Apanham tambem
algodão, misturam-no com cêra, prendem-no, .sr_bre as flechas
e inflamam-nas. São as flechas . incendiárias. Fabrica~, além
disso escudos de cortiça de árvores' e peles -de animáis selva-
gens.' Entérram ta~bem espi~hos 'p ontudos, como aqui entre·
nós se fazem armadilhas de pe. ,
Ouvi-lhes dizer t~mbem, ' mas não Vi própriamente, que uti-
lizam pimenta, que ha em sua terra, e com que conseguem afu-
gentar das fortificações os seus inimigos. Isto se dá da maneira
seguinte: quando o vento sopra, fazem uma grande fogueira e
lançam-lhe dentro um montão ·de pés ,de pimenta. Se a fumaça
dá de encontro às cabanas, o inimigo tem que saír então · para
fóra. Assim narram e eu creio, pois já estive uma vez, como já
178
foi dito con1 os portu ºo·ueses, en1 uma ,
que se e l1an1a . Pernainbuco L, .
· a perma . prov1ncia daquel a. t erra
e1n urr1 b· raço
d de. niar en1 sec o, porque
, anecemos
, com um na v10, · '
ten do v1n o muitos ~e1vao·ens n1are nos surpreendera
- . . ~ • ~b que nos que · . ,
nao consegu1ran1. Atiraram . ·. t . nam capturar 0 que
. n1u1 os arbust '
e a praia e esperavan1 afuge11ta . . os secos entre o navio
- r-nos com a f
1nas nao puderam, entretant t umaça da pimenta,
o, a ear-lhes fogo.

CAPíTULO 29.

Solenidades dos selvagens por ocasião da matança e


deYoramento dos seus inimigos. Como executam
êstes e como os tratam.

Quando trazem para casa um inimigo, batem-lhe as mu.::


~eres e as crianças primeiro. A seguir colam-lhe ao corpo penas
cmzentas, raspam-lhe as sobrancelhas, dansam-lhe em .torno e
amarram-no bem, a-fim-de que não lhes possa escapar. Dão-lhe
então uma mulher, que dêle cuida, servindo-o tambem. Se tem
dêle um filho, criam-no até grande, matam-no e o comem',
quando lhes vem à cabeça.
Dão de comer bem ao prisioneiro. Conservam-no por algilm
tempo e então se preparam. Para tanto fabricam muitas vasi-
lhas, nas quáis põem suas bebidas e queimam. tambem vasilha-
me especial para os ingredientes com que o pintam e enfeitam.
Além disso fazem borlas de penas, que amarram ao tacape com
que 0 matam. Fabricam tambem uma longa (!Orda, chamada.
mussurana. Com esta o amarram, antes de executá"'.'lo.
Assim que tudo está p:eparado, ~eterininam o tempo em·
que deve morrer 0 prisioneiro e _co~v1dam os sel~agens de ou-
tras aldêias para que venh~ as~1stir. Enchem entao de bebi~as
todas as vasilhas. Um ou dois ~u~s a~tes das mulheres fabrica-
rem as bebidas, conduzem o prisioneiro um~ ou duas vezes ao
pátio dentre as cabanas e dansam-lhe. em v;olta.
Logo que estão reu~id~s todos os que v_ier~~ .de fora, dá-
lhes as boas vindas o p~1~C 1 J?ªl,,da ·Cho.ça e, diz: Vinde agora e
ajudai a comer o vosso inimigo · No dia, vespera de começarem
a beber, amarram a mussurana em torno ao pescoço do prisio-
neiro e pintam o ibirapema ~om que o pretendem matar. O de-
senho ao lado mostra o aspeto desta maça. · Tem mais .de uma

179
braça de longo. Os selvagens a untam com uma substância gru-
denta. Tomam então cascas de ovo dum pássaro, o macaguá,
que são cinzentas, reduzem-nas a pó, e espalham isto sobre o ta-
cape. Depois se assenta uma mulher e garatuja nesta poeira de
cascas de , ovo, que está grudada. Enquanto ela desenha, ro-
deiam-na, cantando, muitas mulheres.
Estando o ibirapema como o deve, ornado com borlas de
penas e outros enfeites, será pendurado acima do chão, numa
vara, numa choça vazia. Os selvagens cantam então, através
da noite toda, em volta desta choça. Do mesmo modo pintam
o rosto do prisioneiro, e enquanto uma
mulher o pinta, cantam as outras. Quan-
do principiam a beber, levam comsigo o
prisioneiro, que bebe com êles, e com o
qual se divertem. Acabada a bebida, des-
cansam no outro dia e constroem para o
prisioneiro uma pequena cabana no local
em que deve morrer. Aí passa êle a noite
sendo bem vigiado. '
,. . P:la manhã, bem antes do alvorecer,
vem eles, dansam e cantam em redor do
tacape c~m que o querem executar, até
qu~ o dia rompa. Tiram então o prisio-
neiro para fora da pequena choça e der-
ruba~-na, fazendo um espaço limpo. Em
segmda desatam-lhe a mussurana do es-
coço, passam-lh'a em volta do corpo !'ete-
sando-~ de ambos os lados. Fica êle então
no
gurameio, a bem
cordaamarrado · MUI•ta gente se-
deix~asfi duas extremidades.
1 1

Assim
- 0 car algum · tempo e
poem-lhe perto pequenas pedr
possa lançá-las nas mulh as para que
correm em red eres, que lhe
ameaç or, mostrando-lhe com
as como o pretend
mulheres estão . e:r;i comer. As
quando fôr êle p~taddas e tem o encargo,
das caban cor a o, de correr em volta
daços N. as com os primeiros quatro pe-
42. - Mussurana e ibirapema • ISSO encontram prazer os demais.
, passos mais então
Fazem ou uma f oguerra,
.
a dois
que • t ' menos do escravo de sorte
mulher se aproxima
ao alto as b orlas de pena correndo
es e necessáriamente a vê
d' com . a maça, o ibrrapema
. . ' e ergue
uma
' a gritos de alegria e passa c~rrendo

180
em frente do pr1s1oneiro a-fim-de que êle o veja. Depois um
homem toma o tacape, coloca-se com êle em frente do prisio-
neiro, empunhando-o, para que o aviste. Entrementes, afasta-
se aquele que o vai matar, com outros treze ou quatorze, e
pintam os corpos de côr plúmbea, com cinza.

. • As mulheres pintando o ibirapema e o rosto do prisioneiro.


43

Quando retorna ao prisioneiro, com os seus companheiros~


ara 0 pátio, entrega-lhe o tacape aquele que com êle se acha
~rn pé, em frente ao capturado; vem então o principal da caba-
na, toma a arma e mete-lh'a entre as pernas. Consideram isto

181
uma honra. A seguir retoma o tacape aquele que vai matar o
prisioneiro e diz: "Sim, aqui estou eu, quero matar-te, pois tua
gente tambem matou e comeu muitos dos meus amigos". Res-
ponde-lhe o prisioneiro: "Quando estiver morto, terei ainda
muitos amigos que sa.b erão vingar•me." .Depois golpeia o pri-

44. · O ibirapema pendurado


na cabana · e a d
ansa em seu redor.

sioneiro na nuca d
mente levam
raspam-lhe t
a; e modo que lhe
mulheres o saltam os mio! .
do-lhe o anuoda a pele, fazend:1or~o, arrastam-noos, e imediata-
s com um pau . ~o inteirament b para o fogo
e ranc
182 , a-fim d
- e que nada d ·1 o, . e tapan-'
e e se escape.
Depois de e~f olado, toma-o um homem e corta-lhe as per-
nas, acima dos Joelhos, e os br_aços junto ao corpo. Vêm então
5
quatro mulheres, apanham os quatro pedaços, correm com
~les em torno das cabanas, fazendo grande alarido, em sinal de
~legria. Separam após as costas, com as nádegas, da parte dian-

45. - o

. As vísceras são dadas às mulheres.


teira. Repartem is r e Slfazem
· to entIdo · uma papa rala, que se chama
0
Fervem-nas e com ca crianças sorvem. Comem essas vísceras,
mingáu, que elas e ª~a cabeça. O miolo do crânio, a língua e
assim como a carne
183
.
tudo o que podem aproveitar, comem 1 as ndo
crianças.
cada Quando
um o seuo
todo foi partilhado, voltam para casa, eva
quinhão. , . da uma alcunha, e o
Quem matou o priizioneiro recebe am m cima com o dente
principal da choça arranha-lhe os braços, e '

46. - A execução do prisioneiro que ,está preso á r111ussurana.

de um animal selvagem. Quando esta arranhadura sara, vêm-


·se as cicatrilzes, que valem por ornato honroso. Durante êsse
dia, deve o carrasco permanecer numa rêde, em repouso. Dão-
lhe um pequeno arco, com uma flecha, com que deve passar o
184
tempo, atirando num alvo de cera. Assim procedem para que
seus braços não percam a pontaria, com a impressão da ma-
tança.
Tudo isso eu v1, e assistí.

47 •• O esquarte)amento do corpo do prisioneiro.

os selvagens não sabem contar além de cinco. Quando


uerem contar para diante mostram os dedos da mão e do pé,
~ quando falam de um número grande, mostram os de quatro
ou cinco pessoas.

185
48. - Mulheres e crianças sorvendo o mingau.

186
. . Ao 1 d
49. • Comendo a carne da cabeça do pris1one1ro
. . H
com as mãos em atitud d . a o, ans Staden
e e prece.

187
50. - Assando os pedaços do corpo do prisioneiro.

-----
188
RELAróRIO SOBRE ALGUNS ANIMAIS
DAQUELA TERRA.

CAPíTULO 30.

Veados, porcos do mato e macacos.


1'

Existem naquela terra veados, como aqui entre nós, em


Héssia, e duas espécies de porcos do mato, das quáis uma se
parece 'com o porco selvagem daqui e a outra é pequena, pare-
cendo-se com porquinhos novos. Chamam-se êstes tanhaçú-tatú,
(148) sendo muito difícil pegá-los nas armadilhas que utilizam
para a caça os nativos.
Há tambem lá três · espécies de macacos. Uma delas se
chama caí. São os macacos dos quáis alguns nos. vêm aqui ao
país. A outra espécie se chama acacaí. ~stes ·usualmente sal-
tarilham nas árvores em grandes bandos, fazendo terrível
gritaria no ~ato:. E existe a~nd~ . uma terceira espécie, cha-
mada buriqu1. Sao vermelhos, tem barba como cabras e são
grandes como um cachorro de porte médio.

148) - O original de 'Staden escreve "teygasó-dattu". A edi~ão


da Academia Brasileira escreveu "Taygasú, Dattu'' dizendo que se de-
vi.a ler "taititt1, tatt1" ou como ho.ie se diz vulgdrmente, "caetett1" e
"tatt1". Parece-nos, porém, que Staden quis nêste perfodo indicar apenas
as espécies de porcos brasileiros e não o tatú, para 0 qual reservou ca-
pftulo especial. "Talassú", é tanto o caitetú como o queixada e o ter-
mo tupi slgniflc.a "dente grande'': O <lr. A. Couto de Ma 0O'alhães grafa
"taitett1" e "tajaçll"' explicando que êste l1ltimo termo ê o nome ge
nérico do porco sllvestrc brasileiro. 11
Ensaio sobre a :ta una bra ·1 · ,~­
São Paulo, 1'939, pAgs. 317 .3 22 . s1 eira ,

189
CAPfTULO 31.

O tatú.
Chama-se tatú, uma outra espécie de animáis. O tatú
mede cerca de um palmo de alto e palmo e meio de comprido.
Tem o corpo todo encouraçado, com exceção do ventre. A cou-
raça é como chifre, fechando-se com junturas, · como numa ar-
madura. Tem um focinho longo e pontudo, uma cauda compri-
da e vive bem nas rochas. Seu alimento são formigas. É de car-
ne gorda. Comí dela muitas vezes. (149 )

......

··~
51. - O tatú.

149
) - Do tatú, cujo n .
tam os naturalistas cinco . orne. Llldigena quer . "
Con~ulte-se A. Couto de M ;s11é_c1es, com r dizer . casco duro", ci-
lhermg, "Da vida de agalhn.es, obra "1· gt nn?e var1eclatle de nomes
S u1) , 1934 pAgs 1·4 e nossos 'lnuna1s',
... · . (. ~ ., puo-s 22n •
, . . segs , s-ao Leo e. . º . e ,R . von
u e ..s;eO"s
· Poldo (Rio Grande do
190
CAPíTULO 32.

Saruês, tigres, leões, capivwas e lagartos.


Há ainda uma espécie de caça, chamada saruê. (150 ) O
animal tem o tamanho de um gato, tem pelo cinzento escuro ou.
claro e uma cauda tambem como um gato. Quando dá cria.
ten1 seis filhotes mais ou menos. No ventre há uma fenda de
cerca de meio palmo, e no interior da fenda uma outra pele,
pois o ventre não é aberto. Dentro desta bolsa estão tambem

52. - O saruê.

. t tas. Para onde vái, leva consigo os filhotes na bolsa, entre


:: Juas peles. Ajudei muitas vezes a caçar saruês e retirei os
filhotes de dentro da bolsa.
Há t.ambem muitos tigres naquela terra, que estraçalham
hornens e causam grandes danos; além disso uma espécie de

l=iO) - ID' o gambá meridlClnal que no norte do Brasil chamam


••mucurd" e 1>ara seu estudo vide Oouto de Magalhães, obra eit., páig.
217 e segs.

191
leão, a que chamam leopardo, que significa leão pardacento, e
muitos outros diversos animais. (UH)
Uin animal, que denominam capivara, vive em terra e ná-
gua. As capivaras comem os caniços que ficam à margem das
águas doces. Quando se assustam com alguma cousa, fogem
para a água e vão-lhe ao fu~do~ São ~aiores que ~a ovelha,
e têm a cabeça semelhante a lebre,' conquanto maior, orelhas
curtas, cauda romba e pernas bastante altas. O pelo é cinzento
escuro. Têm três dedos em cada pé e correm velozes em terra,
de umas águas às outras. A carne te~ sabor da de porco.
Uma espécie de grandes lagartos lá vive nágua e na terra.
São bons para comer. ·

CAPíTULO 33

Duma espécie de insetos, semelhantes a p~quenas


pulgas, que são ~hawados. tunga pelos selvagens.
11 ' 1 i 1 '

Existem lá .pequenos insetos,., parecidos ·com pulgas, meno-


res porém e chamados tunga' na· língua dos ,selvagens. . Medràrii
nas cabanas, . pela imundície ·das ·gf8ntes, e ,s e lhes :metem nos
1

pés. Só coça ·quando e1itra, e sem que ·se .si11ta- especialmente,


penetra na carne. Quando não se percebe, nem se ·r etira, 'for-
ma-se em mass.a numa casa redonda, como uma ervilha. Sen-
tindo-o e retirando o bichinho, :fica na carne um buraquinho do
tamanho duma ervilha. Quando ~heguei ·à terra pela primeira
vez, com os espanhóis, yi ~orno ~tac~ram os ,Pé.s de alguns dos
nossos camaradas, porque não o's perceberam.
,, '

' 1

• •1

' :

ltirn) - E' sabido que no Brasil ~ão' existe tigre . nem leopardo , e
1

mu 0 menos leão. O tigre seria · a onça pintada ou 'u jaguar'' O leo-


pardodosseria a on"a
eles ~ p ar d ou " suaçu-arana".. · Sobre esta e outras
ª · espé-
:_~ ~~~ felinos , consulte-se a obra citada .de . O.o uto de Magalhães,
26
8
págs.

192
CÃPfTULO 34

De uma espécie de morcegos daquela terra, que


mordem as pessoas de noite, durante o sono,
nos ·artelhos e na testa. ,
.. ·.. Ô~ morcegos são maiores do que aqui n~ Alemanha. Voam
de nqite nas cabanas e em torno das rêdes em que dormem as
pessoas. Quando percebem. que alguem dorme e não os afugen-
ta, . voam-lhe aos pés, morde:r,n e sugam, ou mordem a testa,
voando depois em retirada. Quando estava entre os índios, ar-
rancavam-me muitas vezes um pedaço dos artelhos. Quando
acordava, ·via os dedos sangrando. fylordem os selvagens, porém,
habitualmente na testa.

CAPtTULO 35
' '

Sobre ·as abelhas da terra.


Há lá naquela terra três qualidades de abelhas. As primei-
ras são quase como as .nossa.s daqui. As ~utras são pretas e gran-
des como moscas; as terceiras, pequenas como mosquitos.
Todas estas abe~as depositam _s~~ , mel em arvores ocas.
Muitas vezes, com os selvagens, retirei mel de todas as três es-
' cies e em geral nas menores . e~contramos melhor mel do
e
pqu~ ' outras. N- . . t amb em tao - f requente como as abe-
na~ , ao ~1cam.
lhas aqui do pais.. V1 muitas vezes· como as abelhas, quando
os selvagens colhiam o mel, se lhe.s pegavam · e os mesmos
tinham que fazer para arrancá-las do corpo nú. Tambem eu
próprio fui nú colher mel mas precisei, a primeira vez correr
à água de dôr terrível e aí r.e tirar as abelhas, lavando, ~-fim-de
despegá-las do corpo.

193
CAP!TULO 36

Dos pássaros da , terra. 1

. '

Tambem lá vivem muitos pássaros es~:r~nhos. Uma espécie,


chamada guará-piranga, tem seu comedouro no mar, e nidifica
nos recifes vizinhos da terra. E' aproximadamente do tamanho
de uma galinha,. tem o bi~o longo, e pernas como a · garça,
mas não tão comprida·s. O guará-piranga tem uma parti~ulari­
dade: as primeiras penas, que crescem· nos filhotes, são cinza~
claro. Quando já podem voar, são cinzento-~s~uro~, Assim
voam, ao que se sabe, durante um ·ano. Então mudam as penas,
1

e todo o pássaro se torna tão rubro como a côr· vermelha má-


xima pode ser. E assim· fida. SU.'as penas são muito ·apreciadas
pelos selvagens. · · ·
· , 1

'. '

RELA'T óRIO SOBRE 'ALGUMAS ÁRVORES ,! \ 11

DAQUELA . TERRA~ ... :'.'\ . I'

1
·•':• 1, '1
1

CAPlTULO ·37 · ... ·. ~ 1 1 t


1 ... • l,'. -'. 1 · 1

1 1 1 \ í 1 ' 1,' \ .·1' 1.


1

A árvore do ·g.enjpapo'. '.- · 1.... '· • • • •

1 , . \ \ ·' 1 l t ' 1 ' ,: • .. • •


1 ' ' ' 1

Numa árvore, que os selvagetiS ch:am;uri ~e~pa~o-ivá cres-


c:n~ fruto q1!e se p~rece .u~ · P?~~o· ,."com a·. ·maçã. Os .'selva-
~ z:iascam _este fruto e. exprerr>:ew. o,·suco em uma vasilha.
~m ,e~e se pintam. Quando ~sfre'gam , o· suco sobre a pele . a
pnnc1p10 parece ' · M \ · . · ' ·
torna a _ agua. · as a~ çabp·.. d~ alguns momentos se
. pele tao negra como tinta. Assim dlira no.ve dias. De-
poi~ a cor desaparece, mas ·não antes . dêste 't empo 'm esmo que
se ave o quanto· se queira. I· . • .. , • , ' , "' . .

194
CAP1TULO 38

Como crescem o algodão e a pimenta brasileira


e algumas raízes, que os selvagens plantam
para comer.

··, O algodão cresce em arbustos de mais ou menos uma braça


de alto· e tem muitos galhos. Depois da florada o arbusto dá
cáP,sulas. Estas se abrem quando ficam maduras. O algodão está
então nas cápsulas em torno de um pequeno caroço preto.
tste é a semente que se planta. Os arbustos estão cheios destas
CáP,SUlas.
, Há duas qualidades de pimenta naquela terra. Uma é ama-
rela outra vermelha. Ambas as qualidades crescem porém da
mes~a maneira. Quando a pimenta está verde, tem o tamanho
'do fruto da roseira brava, que cr~sce no espinheiro. O pimentei-
'r o ~ um pequeno arbusto .de ma1~ ou m:nos uma braça de alto.
Tem pequenas folhas e fica che10 de pimenta. A pimenta tem
g"'sto ardido. Os selvagens a colhem quando está madura e
s~cam-na ao sol. A outra espécie de pimentinhas, que se parece
bastante com esta, secam do mesmo modo.
Há tambem raízes que se chama,m getica e têm bom sabor.
Quando os selvagens quer~m planta-las, cortam as raízes em
e uenos pedaços e metem os pedacinhos na terra. ~stes cres-
p q então e as plantas se espalham. sobre o ·solo como ramas de
cem •t ,
lúpulo e deitam mw as raizes.

195
CONCLUSÃO.

Hans Staden deseja ao leitor a graça de Deus e paz.

Querido leitor! ·Descrevi minha viagem maríti,ma tão la-


cônica porque queria contar apenas o início, ~orno cru. em poder
da cruel gente selvagem. Quis mostrar com _ISSO, como o Salva-
dor de todos os males nosso Senhor e Deus, de modo patente, e
sem que eu o pudess~ esperar, me livrou do poder dos gentíos.
Cada qual deve ouvir que o Deus todo-poderoso pr~serv~. e
conduz, ainda agora, tão maravilhosamente, seus cr1staos fieIS,
entre o povo ímpio dos pagãos, como sempre o fez, desde o co-
mêço. Cada qual deve, portanto, igualmente ser grato a Deus e
nêle confiar no tempo da provação. Pois Deus mesmo falou:
Chama por mim na desgraça, assim te salvarei, e tu hás de
louvar-me.
Poderá alguem dizer que eu devia talvez fazer imprimir
tudo quanto conheci e vi. Precisava então escrever um livro
grosso. De certo tinha eu tambem muito mais para escrever,
se para tanto me esforçasse, mas o meu intúito não era êsse.
EXpús aquí e ali, suficientemente, o pensamento que me levou
a escrever êste livrinho, a saber, como todos nós devemos a
Deus louvor e gratiqão, por ter-nos protegido desde o nasci-
mento, desde a primeira hora, até as presentes, em nossa vida.
Ademais posso bem imaginar que o conteúdo dêste livrinho
pareça a muitos fantástico. De quem a culpa? De resto não sou
o primeiro e nem serei o último que pode conhecer táis traves-
sías, terras e povos. Os que me precederam, não colheram sua
experiência através de sorrisos, e futuramente será o mesmo.
Porém ninguem admitirá que aqueles que arriscam a vida e
enfrentam a ,morte sintam do mesmo modo que aqueles que se
conservam a margem, observando, ou aqueles que ouvem
contar. E se todos os que viajam para a América tivessem de
con!ar com o perigo de cair em poder de cruéis inimigos, quem
entao demandaria aquela terra? Mas tenho por verdadeiro que
muitos honrados homens de Castela, Portugal, França, alguns
196
ta1nbém de Antuérpia, no Brabante, que estiveram na A , .
pode1n testemunhar que é assim como escrevo p mer1lca,
, - h ' . ara aque es
porem quhe nao co~ ~cem a terra estrangeira, me apoio nêsses
testemun os, e pr1nc1palmente ·em Deus .
.Empreend~ min~a primeira viagem à América em um
na. v10
. po~tugues, CUJO capitão se chamava Penteado. Éramos
tres alemaes a bordo. Um era de Bremen e se chamava Henri-
que Brant, o segundo se chamava João e era de Bruchhausen
.
o terceiro era eu.
'
Fiz minha segunda viagem de Sevilha, na Espanha, para
o Rio da Prata, província situada na América. O comandante
do navio era don Diogo de Sanabria. Era eu aí o único alemão.
Depois de longos esforças, cuidados e perigos, em água e em
terra, que nesta viagem, como se narrou, duraram dois anos,
naufragamos afinal em São Vicente, ilha bem próxima do con-
tinente do Brasil, que era habitada por portugueses. Aí encon-
trei um compatriota, um filho do falecido Eobanus Hessus, que
me acolheu bem. Além disso, tinham aí os comerciantes de
Antuérpia que se chamam Schetz, um representante ou feitor
por nome 'Pedro Roesel. ÊSt.es d~ll:s podem serv,ir ~e test~i:iu­
nhos de como lá estive e fui apns10nado pelos indios crueis.
Ainda há os marítimos da Normândia, na França, que me
resgataram dos selvagens. O capitão do ~avio era de Vetteville
e se chamava Guilherme de Mon~r;, o piloto, ?e Harfleur, cha-
mado Francisco de Schantz, e. ~ interprete Perot, d~ Harfleur.
E t excelente gente me aux1hou na França, depois de Deus
~ªque Ele os recompense na eterna Be~aventurança! Ajuda-
ram-me a conseg~ir um pasdsapo~te, vestiram-me e deram-me
dinheiro para a viagem. Po em estemunhar onde me encon-
traram.
A seguir abandonei Dieppe, e·n ; :i_:rança, navegando e de-
dei Londres, na Inglaterra. A1 tiveram conhecimento os
manespondentes da Bolsa holandesa, pe~o capitão do navio com ·
corrqual aí cheguei,. d o que se passara ~omi~o.
. eonvidaram-me
.
0
como hóspede e honraram-me com dmhe1ro para a viagem.
Então parti para a Alemanha.
Em Antuérpia fui à casa von Oka, ter com um negociante
por nome Gaspar Schetz, ~ qu~l, como ,s e mencionou, tinha 0
feitor pedro Roesel, en: Sao Vicente. Trouxe-lhe a notícia de
como os fra_nceses haviam atacado o navio do seu feitor, no
Rio de Janeiro, e c~mo foram rechassados. Este negociante
presenteou com d,01s ducados imperiáis para a viagem.
queira recompensa-lo.
D=
197
Se houver agora um moço, a quem minha descrição e êstes
testemunhos não bastem, que empreenda então êle próprio, com
a ajuda de Deus, a .viagem, e a dúvida se lhe dissipará. Dei-lhe,
nêste livro, informações suficientes. Siga o rasto. Para aquele,
a quem Deus ajuda, o mundo não está fechado.
Ao Deus todo poderàso, que é tudo em tudo, louvor, honra
e glória por todo o sempre do sempre. . ,

AMEN.

' i

' '

' 1 ,1

Impresso em .Marburgo, na Folh d T


por André Kolbe, no Carnaval a de
e 1557.
revo,

198
~lftOiia 6nb be~iei6ung eptter f anbt~
(d)4fft ~ett»il~ttt/r'C4cftt~tt/C81lmttligttt ~11fdJíccfJ!n
~fttt};)~t1Jín b~r n~wtnweltl merica ge"8tn/t'Ot ""b nad}
C[f>~ifij geburt im Canb Jút.>efTm unbcfant;bi~"lfbif~lf.
11~4)ftuergangen~ ;ar/Da (~~~ans 0tabenwnf)om~
. . ...·berg au~ t:)qJin bm:d} fan qgn~ trfamn.s ttfmtt/
• • :unb y~~o burel] twn truCf antas g&b~
, • • 1. ••

iD~bici~t btm ;Durd]lettd)tÍ~en nod}g~bometi l>enn/


1

f) P1'ilípf~tt Canbtg~atf;u nqfen/<lnaff JÚ (fa13en•


1

· d~6ogm!i>~íes~"'"""~~11feinem (8.J.7,
· ·Jmt qntr t.702rdu JD.1o'1: íb11~1!tgatantl!1dJ11Mn/
onlindrlJ Profa/[or.s Mulu1.~., M•rp11rg1r~ .
:Jn'1oUDu »ücfJüns ~set nad) ~as ~OJreHJI.

C'dMl'rtGJ11arpur91im fM M. D. LVJJ,
53, • Reprodução facslmllar do frontispício da ediçõo original
de Marburgo, da 1557.
199
~tlttc:11/barHacb b~s bzítttn tag~ rt~r~tt tr t'ózt att. 'On6.fi'e
IJatt~n beíd)loffet1/fl'cwólte~.;ú rll.ft~n/onbb~ser~!' _tcigt~
1uid] tóbte11/fo balb (itaUt bing b't eyna11berpettenn)nb ft(
l'tnt'~tt~tt mid) fepz Reiffigl ~nb tJ,attcn mir groffen fpott
411/bcybe jung t)nb art·.

~ie tdj fó grófl ~an wepe batte 1


<!~put ~~'OÍÍ· __
(f,.,man
6htg~b ft'dJ / wíe íd) fº· i"1 t~cnbe wi:ie I bas gMcf.? wie
fagt/bas eyn ~nglucE ntd}talkyn ~omptI m1rey11
3an tl)epe tpct / fo bas íd) gar utrficl / burd) gro~
wepe;fo
fragtc miei} n1~in per: J wie es tmit bas íd) fo wenig e(fe/id}
fagttmirt!>eteeyn,lan fl'tbe / iOo ram crmít cyntm bingt/ .
"ºn J)ol~~ g~mad)t;l'n~ woltc j11 mír au~rei(fen;Jd) fagte
er !bete inir nit mep: we~e/iErwolt~ jn mírmít gewalt au~
reíffen. iDofl} wegert íd) mid) fo fep:/bas erbaruon ~blic~/ .
íamtyt1t~~r;wo id] ttid)t efíe t>nb tt'íb~rumb !uncme/woltm
(iemíd) tottn cbebcr r~d}ten ~~.it. <Dott tt1cy~ wit maMd)rnal
id) fo J)ert31id) begerte1bas íd) môd}tt/tvcns feín gotlid) wíll
were;(iei:ben !l>e ts bie ~ilben ad)t J,tttcn /~as fie 11íd]t jmt
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54. - Reproduçõo facslmilar de uma página da ediçõo original
de Marburgo, de 1557. Cap 27 do Livr p . ·.
· o r1me1ro.
200
NOTAS
relativas aos mapas.

Foi ~om grande satisfação que me incumbi da honrosa tarefa


de desenhar, para esta edição brasileira das viagens de Ham Staden,
uns mapas e umas plantas ilustrativas. Qyanto aos ensaios de recons-
tituição .e alguns novos fátos averiguados, já fiz referência a eles
às páginas 222 a 225 da edição alemã. Teve o autor da edição
brasileira, o sr. dr. Carvalho Franco, a amabilidade de aprovar
o resultado de meus estudos, transcrevendo-os, em resumo, em suas
notas numeras 108 e 121. Assim sendo, posso limitar-me a dar,
apenas, umas ligeiras observações e trazer a lume alguns novos
resultados que obtive aprofundando-me mais no assúnto.

1) Mapa, ilustrando as duas viagens.


As rotas indicadas devem ser consideradas como prováveis,
levando-se em conta as condições atmosféricas e de correnteza
reinantes nas épocas das viagens. O ponto mais meridional é
atingido em Viaza (Jabiassapé), a 28 ~º S, conforme citado
no 2.º trecho do capítulo 12.

2) Mapa da primeira viagem. . . ,


Serve, apenas, para ilustrar os nomes indicados dos capttulos 2 a 5.

3) Planta dos arredores de Bertioga.


Esta planta foi desenhad.a, espe~iaim:nte, aproveitando-~e estu-
dos feitos in loco, relativos à s1tuaçao da casa forte de Staden,
na ilha de Santo Amaro. Chegamos à conclusão que estaria
localizada na proximidade do posterior forte São Felipe. Acha-
se indicado o rumo, provàvclmcnte, seguido pelos tupinambás,
ao aprisionarem Hans Staden (capítulos 18 e 19). A nossa argu-
mentação a respeito, pretendemos reuní-la cm publicação especial.

201
4) Mapa da ••eunda vlQ'em.
Com o fim de pór melhor i vista os detalhes, o mapa foi
descnJ1ado em escala maior que na edição alemã e s6 para a
distSncia de ltanhaen até o Rio de Janeiro, , sendo traçados
todos os trajetos feitos por Hans Staden desde o aprisionamento
até a libertação. Acompanhando d traÇado e confrontando-o
com as dist~ncias indicadas por Hans Staden, tem-s.e a prova
bastante de nossa tese, segundo a qual o atual lugar denominado
Ubatuba não póde ser o m~mo, onde o alemão viveu longo
tempo como prisioneiro. Como, porém, ainda existem algumas
dúvidas, apesar de todos os nossos esforços, dou a l~calização
de Ubatuba de Staden como .ainda ~ncerta, o que assinalo
pelo ponto .de interrogação.

J?r. Wilhelm Kloster

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(Amcrm1
Índice Analítico
St. = grafia empregada por Staden.

Aa, Pieter van der, editor da obra de Staden 22.


Abati, (St. = Abbati) = milho, 77, 112. '
Abati-poçanga, (St. = Abbati Bossange), chefe indígena, 139, 141,
142, 171.
Abelhas, 193.
Academia Brasileira de Letras, 20, 24, 30, 83, 97.
Acongatara (St. = Kannittare), ornato, 99, 150, 168; ilustr. 33.
Açores, Uhas dos (St. = Losa Sores), 50.
Açucar e engenhos, 71-73, 79, 80, 115.
Acufia, Rodrigo de, 68.
Adivinho, 173-175, 177.
Adorno, Antonio, 7 4.
Adorno, José (St. = Josepe Ornio), um genovês, 73, 77, 80.
Adorno, Rafael, 73.
Afonso, Gonçalo, 74.
Agricultura, 77, 87, 115, 162, 163, 171, 195.
Aiala, Diogo de, 10.
Albacorá, (St. = Albakore), qualidade de peixe, 42.
Alemanha e alemães, 17, 31, 3?, 76, 78? 80, 93, 110, 111, 145, l97.
Agudin, Antonio. (St . .= An~omo Agudm), um galego, 94.
Alcatraz = gaivota marinha ; Ilha dos A. (St. = Alkátrases,
Insula de A.), 68.
Algodão, 93, 12~, 140,. 152, 1~8! 170, 17_8, }95.
Alkindar-miri (St. = Alkindar Mi.ri), ~hcfe md1gcna, 89, 111; 114.
Almeida, Candido Mende~ de, h1stor1ador, 71, 81.
Alminzom, Sancho de, 1O.
América 17, 31, 37. 40~ 52-55, 151, 152, 197.
Amsterd~m, cidade dos Paiscs Baixos, 21, 22.
Anchieta, José de, 80, 97, 125.
Angra dos Reis, 88, 97, 99, 104, 112 ,122.
Animais domésticos, 34.
Ano Bom, Ilha do, 6.
Ant6nlo, um português, 133.

203
Antropófago e manta.nça .d o pri ioneiro , 97, 109, 112-114, 120,
121, 129, 131., 132, 134, 138, 153, 154, 176, 179, 180-185,
187, 188; Jlustr, 47, 50. ,
Antuérpia (St. · Antd-0rff), cidade do Paw~s Baixos, 20, 21,
147, 197. -,.
Apóstolon, rdcm do _, 12.
Araçoiá (St. .Arasoya), leque ornamenta4 91.
Aroripe, Tristão de Alencar, tradutor da obra ,de Sta.~ 23.
Ariró (St. ~ Arirab, Arírop), povoação, 88, 97, 99, 200; ilustr. 18.
Armação, ponta da, 72, 75.
Armenta, Bernardo de, frade franciscano, 16.
Arte medidnal, 96, 178.
Assunção, (St. = Sumption, la Soncion), hoje capital do Paraguai
5, 7-- 11, 61, 62, 64, 65.
Ataide, D. Antonio de, vide Conde da Castanheira.
Augsburgo, cidade da Alemanha, 17.
Aveiro, Duque de, 8. .
Ayrosa, Plínio, pesquisador do tupí-guaraní, 10, 88, 128, 154.
Azarado, Sebastião de, fundador de Paranaguá, 78.

Baía de Todos os Santos (St. = Boiga de Todolos Sanctus), 153.


Barbária, vide Marrocos.
Bastos, Maria de, 1O.
Bebidas, 77, 82, 88, 98, 100, 107, 112, 134, 138, 165, 166 179
181; ilustr. 38. ' '
Becerra, F_:ancisco~ ca~ítão do navio "São Miguel", 5-7, 10, 53, 65.
Bernal, Joao, carp1nte1ro, 10.
Bertioga (St. = Bríckioka, Brigiaco), 67, 72-76, 79, 81, 83, 86-88,
90, 9~, 98, ~9, 105, 116, 118, 124, 127-129, 131, 201,
210 (ilustr.); ilustr. 11, 12, 15, 16.
Bertoni, Moisés Santiago, etn6logo, 68.
Biscaia, Baía da, 6, 11.
Boiçucanga, (St. == B.oywassu-Kange), povoação, 127, 128; ilustr. 26.
Bofeci (St. = Bogess1), ornato, 169.
Bonito (St. = Bonítte), qualidade de peixe, 42.
Boumann,. Jan Jacobsz, editor da obra de Staden, 21.
Bragor Diogo, de, 7 4, 128, 129.
Bragol, 2.J8oãol,3píol3g8o Domingos, Francisco e André de, irmãos, 73.
' i.J, - • '
Brant, 1-Ienrique, um alemão, 39, 197.
Br6s Cub~s (St. = Brascupas), Ilha de, 72; ilustr. 12.
Bremen, cidade d:i
~lemanha, 39, 197.
Brown, C~rter, b1b]1ote~a americana, 19,
Bruges, c?da:de da Bélgica, 29.
Brunet, b1bli6grafo francês, 19.

204
Bry, Teodoro de, editor da obra de Stadcn, 21.
Buenos Aires 16, 23, 24, 61.
Burrón, Rafael, capitão, 10.
Burton, Richard F., anotador da obra de Stadcn, 22.

Cabeleira dos indígenas, 167, 168.


Cabras, 50.
Cabo Verde (St. = Cape virde), 53, 151.
Caça, 153, 159.
Cáceres, província espanhola, 7.
Caetano, Batista, etn6logo, 26 37.
Caetés, tribu indígena, 46. .
Caiçara (St. = Ywara), fortificação dos selvagens, · 87.
Campos, Fernando de, 10.
Cananéa (St. = Caninee), porto, 14, 15, 57, 68.
Canárias, Ilhas das, 53, 151.
Cancer, tr6pico de~ 151.
Canoas, 86, 124, 176; ilustr. 15. ·
Capivara, 191, 192.
Capricórnio, trópico de, 151, 152. -
Caraiós (St. = Karayas), tribu indígen~, 154, 155, 163.
Carapeto, Fernão Luis, padre, 74.
Cardim, Fernão, padre, 26.
Cariiós (St. = Carios), tribu indígena, 57, 62, 68,' 73, 78, 103,
119, 120, 121, 152.
Carilo, J(oão .FeKrn~n~es, )pad~e, ~O.
Carimã St. = einnrna , raiz seca, 163.
Carimã, variedade de peixe, 77.
c ,a rimã-cui, chefe-indígena, 108, 109.
Correra, Afonso de la, 1O.
Caruató-uóra, um franc~s, 110, 111.
Carvaial, D. Antonio de, 1O,
Carvaial, BaltaSar de, alfaiate, 10.
Carvalho, Gomes de, historiador, 140.
Casal, Ayres do, ge6grafo, 122.
Casilas, Diogo, ferreiro, 10.
Cassei, cidade da Alemanha, 17, 18, 21, 26.
Castanheira, Conde de, 13.
Costela, província da Espanha, 8, 42; 52, 196.
Castro, Vaca de, governador, 7. .
CCatheri(nSe de Vetteville,_·navio francês, 141, 143, 146.
~uim t. = ~awawy), bebida, 77, 82, 88, 98.
Cepeda, Francisco de, 10.
Cipó (St. = Sippo), 49.
Chaves, Nuflo de, 7.

205
Cherburgo, cid.adc ~a· França, 20. 1.
Claesz, Comchs, editor da obra de Staden, 2
Claudio, vide Mirande. · 46
Coelho, Duarte, donatario de Pernam~~co, 45, ·
Colombo, Christovam, 17.
Conceição, vila, 47, 70. 1 1

Contagem, sistemà de, 185.


Contreras, Elvira de, 7, 11.
Contreras, Isabel de, 10, 11.
Coó-uara-açú (St. = Sowarasu), chefe indígena, 141.
Côrtes, João, 10.
Co rtez, Fernando, 17.
Costa, Gonçalo da, um português, 6. ·
Cubas, Brás, fundador de Santos e .c~pitão-m6r, 13, 117.
Cuevas, Francisco de, 10.
Cunhambebe (St. = Konyan Bebe), chefe indígena, 97~100, 124,
126, 132, 164, 200. ' .
Cutia (St. = Acuttia, Acutia), povoação indígena, 60, 63; ilustr. 10. .

· l~O; ilustr.
Dansa e música, 91, 92, 97, 133,. 166, 167, 172, 177-
28, 44. .
D. H., xil6grafo alemão, 38~ ·
Dias, Gonçalo, 1O.
Dieppe _(St. = Depen, D~ppaw), cidade da·França, 140, 146, 147, 197.
Oiez, cidade da Alen1anha, 25, 3'6, 199. ·
Dilúvio,, 174. ., -
Dinheiro, 172. . ·,
Direito e organização da tribu, " 155, 164, 172. ·-- - -...

Dommer, bibli6grafo alemão, 20.


Donoso, João, 1O.
Dorantes, Pedro, administrador, 13. . .
Dourados (St. = Du:ado), qualidad~ · de peixe, 42.
Oryander, pr~f. dr.Joao Eichmann, chamado Dryand 17
Durão, Francisco, 10. · . ,er, , 18, 29, 199.
Durão, João, 1O.

Ebano, Eliodoro, 78, 79.


Eichmann, João, vide Dryander.
Endu~pe (St. = Enduap, Enduape), ornato
. 1lustr. 18, 33, 40. · ' 99, 150, 168, 169;
Enguaguaç.ú (St. = Ywawa supc), po~oaçã
Equador, hnha do, 43, 53 151 o, 71, 72.
Erasmo de Rotcrdam, hu~anist~ 35 ·
Escobar, Afonso de, 10. ' ·
Escorcio, capitão normando, 6.

206
Escravidão, 119.
Espanha, espanhóes e navios espanhóes, 6, 9, 10, 12, 13, 15, 33,
37, 52, 53, 56, 61, 62, 110, 151, 197.
Eslreia Polar Norte, 151. ·

Fazenda, ]. Vieira, historiador, 80.


Felipe 1., landgrave de Hess·e, 17, 25, 29, 199.
Fernandes, João, 62, 63.
Fe,r nandes, Gaspar, 10.
Fernandes, Manuel, 73.
Ferreira, Jorge (St. = Jorge Ferrero), um portugu~s, 129.
Finisterra, Cabo de (St. = a fine terrae), 33.
f i1rmiano, Lactâncio, te6logo, 32.
fÍ'sica dos indígenas, 152, 154, 161.
Fo·g o e utensilios para acender, 153-155, 157, 158, 163, 164, 171,
180; ilustr. 35. -
Fortaleza de Hans Staden em Bertioga, 75-77, 79, 83; ilustr. 13.
Fortificações dos selvagens, 47, 87, 155, 156; ilustr. 34.
Fouquet, Karl, tradutor da obra de Staden, 24, 87.
:frança, franceses e navios franceses, 6, 10, 19, 31, 39, 50-52, 57,
70, 78, 83, 91, 93-96, 98, 105, 109-112, 115, 116, 118,
122-124, 134, 135, 140-146, 163, 171, 196; ilustr. 24.
Francfort, cidade da Alemanha, 19-23.
Fronck-Feyrabend, colecionador de obras, 21.
Frei Gaspar da Madre de Deus, historiador, 71, 73'.
Frutos, 152, 177, 194, 195.
Funchal (St. = Funtschal), 42.

Gafforel, Paul, historiador, 140.


·G ago, Manuel de Oliveira, 73.
'G oleotol Mario, astrônomo em Bolonha, 34.
Gambarotta, Francisco, 13. .
Gambôa, João de, 10.
Gandía, Enrique de, historiador, 5, 6 ' 9 , 10' 13' 16,J 57 , 61 ,
68, 167 .
Garcia, Francisco, 1O.
Garcia, ·Pedro, 10.
Gell, Cape de, vide lghir Ufrani.
Getica, raíz, 195.
Góis, Cipriano de, 1O.
G<?~s, L~is de, fundador de um engenho de açucar 73
Goas, Vicente de, 10. ' ·
Goldtworm.! Gaspar,. magistrado e pregador, 34.
Gomes, Joao, pedreiro, 10.
Gonçalez, Martim, marinheiro, 1O.

207
~ondc;alv s, ~ . ns . , un \, l'HWtu ~tu~st; ! ~·
1 ')'} 64 l J7,
uon - 'ª.' .· \US Roq~ , . 1us ·o.rhu <W, , n, 11' "14, • . · , . 1 '
Gottofrtdu Ludov1cus, d1tof da obnt dt St,,clcu, 2 ·
Groot,. ijsbert de, ditor da bnt de Stndcu, 22,
Groot, lichel d , · ditor da obrn ele Stndcn, 21.
Guadalquivir, ri eh\ .&p•lnh:t, r: 2.
Guoianós (St. = Wayganna), ra~~a indígena, 153, 1.55.
Guaimbé, ilha, 74.
Guair6, r . ião, 10.
Guaitacás (St. ~ \Xf cittaka), tribu indígena, 154.
Guorá piranga (St. = Uwara pirange), ou garça, 82, 194.
Guaranis, r ça indígena, 15, 57, 58. . . _ 120
Guaratinga-açú (St. = Vratinge Wassu), chefe indígena, 90, . ' 108 ·
Guerra e armas, 47-49, 7 4, 77, 81, 83, 102, 104, 115, 124--126,
128, 144, 150, 154, 177, 178; ilustr. 6, 7, 12, 13, 19, 26, 31, 33.
Guerras, engen~o de açucar, 73.
Guiles, Antonio de, 1O.
Guiné (St. = lant Gene), região da Africa, 6, 8, 53, 151.

Habitações dos selvagens, 84, 87, 153-155.


Han, Weigand, editor do livro de Staden, 19, 20.
Hantzsch, Victor escritor, 21.
Hesse (Hessia), província da Alemanha, 17, 19, 20, 25, 26, 29,
30, 36, 39, 199.
Hessus, Eliodoro, filho do Helius Eobanus Hessus, 30, 78-80.
Hessus, Helius Eobanus, humanista e professor em Marburgo, 30,
78, 197.
Hielst, João van, um flamengo, 9, 73, 145.
Homberg, cidade da Alemanha, 11, 17, 26, 29, 39, 199.
HonAeur, (St. = Honflor), porto da França, 37, 145, 146.

lbira-pema (St. = Iwera Pemme), instrumento para os prisioneiros


90, 91, 120, }50, 179-182; ilustr. 33, 42, 44. '
lgaraçú ou Igarassu (St. = Garasu, Ugarasu), localidade no Estado
de Pernambuco, 46.
lgarassú, rio, 47, 48, 50; ilustr. 6.
. (St. = Cape de Gell), porto de Maroccos, 42 , 43 .
lghir-Ufrani
1guassú, no, 68 .
.fhering, Rudolf von, naturalista, 190.
Ilha Grande, 88, 122.
lm~eaçã-pe (St. = Inbiassape), porto, vide Viaçá.
lndaa, 33, 39, 51.
ln?lat.errat.. inglêses e navios inglêscs, 52, 147, 197.
lna, vide t<ede. ·
lnsétos, 192, 193.

208
l numaç - o, il ll St't'. 21.
l pcw ~• iô -lto nHUQcó ou llha C r:tnd c de Itamaracá, 47.
1 rc lo, povon\"rio, e. 7.
h lrú .. uoçü, chefe indípcna, 89, 9 3, 104, 114.
lra la, Domm gos Mart inez de, 7, 8, 13, 61, 65.
1to 11a nos , ..> •
ltamarac6 (St. T:lfftmaraka, Tamerka), povoação no Estado de
P rnnmbuco, 47, 48; ilustr. 6. .
lta nh oa m (St. ~~ ltcngc Ehm), povoação, 9, 67, 70, 202; 1lustr. 11.
lt-0par ico, povoação, 13.
lta pucú, r io, 15, 64, 65.
ltavú (St. r- Ita Wu), chefe indígena, 140.
lvaí, r io, 14, 65.

Jacó, u n1 franc~s, 122.


Ja c ob, Walter, 19.
Ja e ger, Padre Luiz Gonzaga, historiador, 68.
Jansz, Broer, editor da obra de Staden, 21.
Jerônimo (St. :.:: I-Iironymus), mn português, 129, 131, 134-136, 138.
João Ili, Rei de Portugal, 12-14, 37, 39, 42, 76, 77.
João de Bruchhausen, um alemão, 39, 197.
Jorge, A. G. de Araujo, historiador, 140.
Jurumirim = Santa Catarina (St. :_-:: Schirmirein), porto, 61; ilustr. 10.
Justiniano, Bartolomeu, um genovês, 9, 10.

Kampen, porto da Holanda, 37, 39.


Katzenelnbogen, ex-condado alemão, 25, 36, 199.
Kloster, Wilhelm, ge6grafo alemão, 87, 88, 122, 202.
Kluepfel, Karl, editor da obra de Staden, 22.
Kolbe, André, impressor alemão, 17, 19.
Kuestler, Bartolomeu, editor da obra de Staden, 17.

Lagartos, 191, 192.


Leão, Diogo de, carpinteiro francês, 10.
Leão, Ermelino A. de, historiador, 80.
Lechler, Martin, editor da obra de Staden, 21.
Le Havre Neuf (St. = Habelnoefl), porto francês 146
Lehmann-Nitsche, Roberto, historiador 23 26 S3 . •
Leipzig, cidade da Alemanha, 23. ' ' ' ·
Leitão, Jer8nimo, 73. ·
Leme, Roque Luiz, genealogista, 78.
Leões, 191, 192.
Lerna, D. Diogo de, 10.
Liry, João de, missionário 30 32 88
Letts, Malcolm, tradutor da ohra 'de Stadcn, 23.

209
39
Leuhr (St. = Lcuhr), alemão domiciliado cm Lisb6a, ·
Leyden, cidade da Holanda, 22. 6
Lingua tupi, 84-87, 100, 109, 113, 132, 174, 17 ·
liqueno, Frei José Maria, escritor, 7.
Lisbôa, 37, 39, 41, 42, 52, 53, 117, 145, 15 1.d ·
Lobato, Monteiro, compilador da obra de Sta en, 23 · 4 83 89
Loefgren, Alberto, tradutor da obra de Staden, 2 0' 22 - 2 ' ' ·
Londres, 22, 23, 147, 197.
Lonicer, Adam, tradutor da obra de Stadcn, 21.
Lyra, Nicolau, te6logo, 33.
Macacos, 189.
Macaguá (St. = Mackukawa), variedade de pássaro, 180.
Madeira, Ilha da (St. = Eilga de Madera), 4, .~2. .
Maembipe (St. = Meyenbipe) ou São Sebast1ao, ilha, 126, 128,
129, 131; ilustr. 25, 27.
Magalhães, A. Couto de, naturalista, 189-192.
Maiença, cidade da Alemanha, 29.
Malagueta, Ilha de, 11. ,
Malavér, Gomes, 10.
Mambucaba (St. = Mambukabe), povoação dos selvagens, 88, 104, 106.
Mandioca (St. = Mandioken)~ 47, ·49, 50, 62, 77, 87, 115, 159,
162, 163, 165, 171, 172.
Mangaratiba, enseada, 88, 122.
Manguape (St. = Mungu Wappe), porto, 110~
Maracá ou matraca (St. · = Tammerka), ídolo, 88, 91, 131, 132,
154, 173, 174, 177, 178; .ilustr. 41.
Maracaiás (S:. = Markayas), tribu indígena, 97, 98, 112, 144, 155.
Marburgo, cidade da Alemanha, 16-20, ·23-25 29 . 36 · 199
Marcondes, Moisés, historiador, 57. ' ' ' •
Maricá, povoação, 88.
Marie Bel'Eté, navio francês, 140, 146.
Morin vide Olinda.
Marrocos (St. = Barbaria), 39, 42.
Martim, Francisco~ 6.
Martim, Pedro, 1O. ·
Matapú, carac61 do mar, ~69.
1 \

Mbiaçá vide também ViaÇá, 68.


Mbiás, tribu "?-dígena, 68. , , . l
1

Medelim, localidade na Espanha, 5.


Meire Humana ~St.. , Meire Humane), um "protcta ou a-~ 1 ,, 167
Melgareto, Rui Dias, 7, 10. ~ ..o o ' •
Men~onça, D. Pedro de, chefe .de uma expedição, 6I.
Menasta, Juan, um flamengo, vide João van Hi 1st ·
Mercadorias, 45, 56, 93, 110, 111, 115-118 i2'2 ·2,. ,.,
146, 161. ' ' , , 1 .., 139-1 ..3'
Metraux, A., etn6logo, 167.
México, 17.
Milho ou , abad, 77, -112.
Mingáu .(St. = Mingau), 164, l 83, 186.
Miranda, Claudio ou Claude, un1 francês, 143, 197.
M<;>ner, Guilhern1c de, capitão francês, ] 43, 197.
Montanhas do Brazil, 152.
Monteros, úpinosa de los, cidade da Espanha, 5.
Monzóm, localidade na Espanha, 5.
Moquem (St. = Mockaein), a carne humana assada, 134 164.
Morce.g os, 193.
Moura, Gentil de Assis, 138.
Mussurana (St. = mussurana), corda de algodão, 112, l 79, 180,
184; ilustr. 42, 46.

Nassau, ex-condado da Alemanha, 29.


Nhaê-pepô-oaçú (St~ = Jcppipo Wasu), chefe indígena, 89, l 02,
l 04, l 06, l 07.
Nidda, cidade e ex-condado da Alemanha; 25, 36, J 99.
Nilhoff, Martinus, bibli6grafo, 2.1.
Niteroi (St. = lterroenne), porto, hoje capital do Estado do Rio,
88, 11 o, 122, 141.
Nóbrega, Manoel da, 1 O, 12.
Nomes e expressões indígenas, 1O, 37, 45, 47, 50, 61, 63, 66--69,
71-73, 77, 88, 89, 95, 104, 110, 112, 122, 126, 128, 129,
132, 134, 139, 141, 154, 163, 170, 176, 189.

Ocaraçú (St. = .Occarasu, Ocarasu), povoação, indígena, 86, 88,


132, 133; dustr. 15, 28.
O~a, estabeleci~ento comercial em Antuérpia, 197.
Oldemburgo, cidade da Alemanha, 17, 21.
Olinda (S~. = Marin, Marein), povoação, hoje cidade, 45, 46, 48,
49; 1lustr. 6.
Oliveira, Antonio de, capitão n1Ór, 9, 70, 73.
Onça, 192.
Orico, Oswaldo, 167.
Ornato, ·dos índ.ios, 81, 82, 91, 92, 98, 99, 150, 161, 167- 169,
181, 184; 1lustr. 33, 39, 40.
Ortiz, Miguel, 1O.
Ovando,. João de, 5, 7, 10, 53, 64.
Paca, animal roedor, 119, 120 162
Pag6 vide Adivinho. ' -•
PaladlnoÍ ·Mario, 24.
Palma, 1 ha de {La), 6, 11, 53.
Palmito, 59.

211
Panos para carregar crianças, 170. , 4, 136-138·. .
Paraguó (St. = Parwaa), um selvagem, 129 13
Paraguai, rio, 7.
Paraguai, país, 1O, 12, 64, 68. 5; ilustr. 7.
Paraíba (St. = Paraibe), porto e rio, 50, 51, 12
Paraná, rio, 7, 65. ·.
Paranaguá, porto do Paraná, 57, 68, 78, 79.
1

Parati, baía, 125, 132. . · ·• · , ,

Paris, cidade, 20, 22, 29. '


Parteiras, 170.
Pássaros, 194. . 1

Patos, Porto dos, vide também Viaçá, 7, 68.


Patos, rio dos, 8.
Pau brasil, 50, 83, 93, 122, 140.
Pedroso, Estevam, 73.
Peixes e pesca, 42, 73, 77, 78, 125, 127, · 145, 159, 163, 164,
177, 178; ilustr. 30, 37.
Peixes voadores <.St. = pisce Bolador ), 42, 43.
Peles de animais, 152. · . ·
Penteado (St. = Pintiado), capitão português, 38, 39, 41, 44, l97.
Pereira,· Eliodoro Ebano, 78; 79.
Pernambuco (St. = Prannenbucke), 45, 46, 50, 179.
Perot, um francês, 141, 197. · ·
Pimenta, 48, 93, 94, 110, .122, 140; 146, 16~, 178, 179, 195.
Piolhos, 170. _
Piracema, (St. = pirakaen), 125; 177.
Piracuí (St. = Pira Kui), farinha, 78.
Piratas, 39, 14~. .
Piratí ou Parad (St. = Bratti) = tainha, qualidade de peixe · 77 73
125, 177. ' , ' '
Plantijn, Christoffel, editor da opra de ,Staden 20 ·
Platerus, Felix, um s9içoi. 30. , . ' ' ·
Poolsum, Juriaen van, editor da obra de ' staden 22
Poracé (St. = Aprasse), 4ansa e divertip)ento 89. ·( '
Porto de Sta. Maria, 52. · .· ' " 1 ustr. 16
..
Porcos, 189.
Portugal, pc;>rtuguêses e :navios portugu&ses 9 10 · · ·
33, 37, 39, 41, 42, 44-4ó so-s2 5 6 , 12 614, 16, 18, 31,
83, 93-97, 100, 102, los, 106, 1'09 _: ·57 ' 6, 69-77, 81,
. 121, 122, 125, 127, 129, 1~4, 140, 143-14~ 1 2, 114~117, 119,
Potigu<Íras (St. = Buttugaris), tribu .indígena , lSl, 153, 179, 19~.
Prado, Afonso do, 1O. 46
' , , 50.
Prado, Eduardo; 19, 24.
Prata, Ric:>' da," 5-8, 11, 14-16 52 57
Pretos, 46, 53, 151. , , ' ' 6 1, 62 ' 64, 66, 197.

212
Pri nci pe, Ilha do, 8.
Prisioneiros, tratamento dos, 84, 86-91, 93, 94, 96, 100, 104,
109, 112, 119, 129, 130, 132, 133, 155, 179, 180,.183; ilustr. 45.
Prússia, 26, 29.

Ramalho, Joana, 129.


Ramalho, João, 68, 129;
Raolim, Melchior de, 10.
Rêde ( = ini), 84, 88, 158, 193; ilustr." 14, 36.
Religião dos índios, t27, 136, 154, 158, 162, 167, 173---175.
Rio de Janeiro, 23, 24, ·ao, 88, 122, 140, 141, 143-146, 151,
197, 202.
Rochela, cidade da França, 6.
Rodrigues, Afonso, 10.
Rodrigues, J. C., bibliógrafo, 19-21.
Roesel, Pedro, feitor, 9, 71, 73, 144, 145, 197.
Roldão, 10.
Romano, 66, 69, 70.
Rubio y Moreno, Luis, historiador, 10.

Sá, Estácio de, 80.


Saarbruecke.n, cidade da Alemanha, 29.
Saavedra, Christovam de, 7, 10.
Saavedra, Hernandarias de, de Sevilha, 7.
Sabin bibliógrafo, 19-22.
Saint" Adolphe, Milliet de, viajante e historiador, 88.
Sal, 163. .
Salazar Bartolomeu de, 10.
Salazar' Fernando de, 6, 8, 10, 65.
Salazar' João de, 6.
Salazar: João de (filho), capitão, 5-12, 52, 53, 61, 62, 65, 66,
70, 71, 145.
Salvador' cidade, 8. . .
Sampaio, Teodoro, historiador, 23, ·24, 26, 37, 45, 47, 50, 61, 68,
70, 72, 73~ 77, 83, 88, 89, .97, 104, 108, 110, 112, 126, 129,
132 139, 141, 154.
Sanobrio: Diogo de (St. = Diego de Senabrie), 5, 7, 10, 16, 18,
26, 52-54, 59, 62, 117, 145, 197.
Sonabria João de, 5, 6, 12, 62.
Sanabria: Maria de, 7, 11.
Sanabria, Meneia Calderdn de, 6--8, 1 l, 12, 66, 145.
Sanches, João (St. = Johann Scnches); natural da Biscaia, 6, 10,
11, 13-15, 18, 52, 55, 64-66, 117.
Sangria, 119, 120, 162.

213
Santa Catarina (St. = sanct Catharin hauingen, insel sanctae Catha-
rinae), porto e ilha, 5, 7, 8, 12, 15, 16, 57, 58, 60-62, 64,
65, 68; ilustr. 1O.
Santo Agostinho, cabo de (St. = la cape de Sanct Augustin), 32,
48; ilustr. 6.
Santo Amaro, capitania de, 7 4.
Santo Amaro (sancto Maro), ilha, 24, 67, 72, 73, 75, 78- ' 80, 82,
83, 127, 201; ilustr. 11, 12, 26.
Santo André, povoação, 68. . .
Santos, cidade, 9, 1 L 67, 71~ 72, 74, 80~. 9?, 117; ilustr. 12, 13.
São Felipe, forte na ilha de Santo Amaro, '24,' 67, 75, 127, 129, 201.
São Francisco do Sul, 7-10, 12, ] 5, 59, 65, 66. ,
São Gabriel, 7, 8.
São João, rio, 16. ,
São Jorge, engenho, 9, 73, 145. , · · ·
São Lucar de Barrameda (St. = sanct Lucas), localidade na Espanha,
5, 37, 52, 53. ' '
São Paulo, cidade, 20, 23, 24.
São Sebastião = Maembipe, ilha, 126, 128, 129, 131; ilustr·. 25~ 27.
São Sebastião, povoação, 88, 97, 130. , '
São Tiago, forte, 9, 75, 127, 210 (ilustr).
São Torná (St. = sanct Thome), ilha, 6, 7, 12, 53.
São Vicente, capitania~ 138. ,
São Vicente (St. = sancte Vincente), 1ilha . e povoação, 8-12;
13-15, 57, 65-71, 73-75, 78-80, 94, 97, 115_, 119, 145
197; ilustr. 11, 12, 13. "'
Saraiva, Fernando, .,de, 8. , . 1

Saruê (St. = Serwoy), animal selvagem, 191; ilustr. 52·.


Schantz, Francisco de, 143, 197.
Schetz, Erasmo, comerciante de .Antuérpia, 9, 73, i°45, 197,.
Schetz, Gaspar, 197.
Schmidl, Ulrico, militar e viajante alemão; ,65, , 68~
Seabra, Pedro, feitor, 7 4. · · ,
Setúbal (St. = sanct Tuval), porto de Portugal, 39. ,
Sevilha, cidade,.' ?, .52, 53, 197. , :. , ·,
Simancas, cidade, 11. · . . . \
Sonhos, interpretação dos (brigomânica), .126, 127, 177.
Sousa, Alberto, escritor, 75. , · .
Sousa, Martim Afonso de, 14, 73,,. 75.
Sousa, Pedro Lopes de, 47. ·
Sousa, Tomé de (St. .= Tome . d de Susse), 8, 10 ' 12, 70 , 71 , 73 , 75 , 76.
Southey, R oberto, h 1stona o~, 11, 45.
Staden, pai de Haris Staden, 17, 29, 30.
Studart, Filho, escritor, 73.
Stuttgart, cidade · da Alemanha, 22.
Superaguí (St. = Supraway, Supra uia), porto, 57.

214
Tainha = ?'it,ttí; r~ 77 t ·1 \ 177
Tamoios, ti-ibu indíg _'trn, 1H, · l 9.
Taquaraçú-tibo ( · t. · Tn ·kw~\n\sutibi), po von~~~ío doN.índio~, 139, 141.
Taq :u a·ri, po' a .· ~1 , \.:8.
Ta.ques 1 Pedr t~eue~llogist~\ e historiador, 73, 7 - . 80.
Totámiri (St. = 1\1t~1n1it"i) . ·hefc indígena, 134.
Totú (St. = D•lttu ),
1 O· ilustt'. 5 l.
Tounay, Afonso de E. 78, 138.
Teddos, 15.....
T e,mbetá, ornato., 99, 150, 167; ilustr. 18, 33.
Tenerife, ilha, 151.
Terceira,. ilha, 51, 52.
Ternoux-Compans, tradutor e editor da obra de Staden, 22, 23, 57.
Thevet, André, escritor, 66, 97.
Ticoaripa (Taguaí, Taquarí), (St. = Tickquarippc), povoação, 112.
Tigres, 191, 192.
Tipití (St. = tippici), n1a11gueira, 162.
Tipoí (St. = typpoy), vestitnenta, 152.
T cotai, Albert, tradutor da obra de Staden, 22.
Treto, Fernando de, 6-8, 10, 12, 13, 66.
T udsen, Gertrud, compiladora da obra de Staden, 24.
Tupí, raça indígena, 15, 153, 155.
Tupinambás (St. = Tuppin Inbas), tribu indígena, 18, 26, 31, 72,
74, 77, 79-81, 83-86, 90, 93, 94, 102, 119, 125, 127, 128,
130, 132, 144, 145, 149, 150, 154, 155, 201; ilustr. 16, 31.
· Tupiniquins (St. = Tuppin Ikins), tribu indígena, 37, 57, 72-7 4,
77, 82, 83, 93, 94, 98, 99, 101, 102, 104, 127, 128, 144, 154.
Turquet, Teodoro, 30.
Ubatuba (St. = Uwattibi), nome de duas povoações indígenas, 87,
88, 90, 92, 100, ] 01, 103, 104, 106, 110, 112, 114, 116, 122,
124, 125, 130, 133, 135, 143, 202; ilustr. 16, 17, 19-24, 29, 30.
Upaú-nema vide São Vicente (St. = Orbioneme, Urbioneme).
Utensílios dos selvagens, 90, 120, 154, 161, 162, 168, 200.
Utrecht, cidade da Holanda, 21.

Vaca, Alvaro Nunes Cabeça de, 5, 6, 15, 16, 52, 61, 64.
Vale, Salvador do, 73.
Valência, cidade, 42.
Valhadolid, cidade, 5.
Varnhagen, Visconde de Porto Seguro, historiador, 45, 52, 68,
73, 76, 97, 104.
Vasilhas, 164-166, 173, 179; ilustr. 41.
Vaga, Diogo Bravo de la, 1O.
Valido, Afonso, um português, 8, 10, 65.

215
V entste, João vide João van Htalst.
Vespuccio, Americo, 17.
Vestimenta dos indígenas, 152, 161.
Vetteville (St. = Dattauilla, Wattauilla), localidade na França,
143, 197.
Viaçá (St. = Imbeaçã-pe), outrora Porto dos Patos, 7-9, 11, 15,
65, 67, 68, 71, 201.
Viaçás, tribu indígena, 68.
Vicuna, Carlos Morla, historiador, 8, 11.
Vida familiar, 155, 170-172. ·
Villegaignon, Almirante Nicolau Durand de, 97.
Vingança de morte, 164, 182.
Vivaldo, Bernardo, um genovês, 6, 1O.
Viveres, 34, 47-50, 59, 62, 64, 65, 68, 78, 125, 152, 153, 159,
' 162-164, 177, 190-192.

Wegner, ·,}\ichard N., historiador, 17, 20, 22, 23.


Weilburgo, ;i;~idade da Alemanha, 34.
Wernicke, Edmundo, historiador, 19.
Wetter, cidade da Alemanha, 17, 29.
Winkelmann, Hans Just, editor da obra de Staden, 17, 21.
Wolfhagen, cidade da Alemanha, 17, 26.

Yerubatiba, povoação, 68.


Ywawasupe vide Enguaguaçú.

Ziegenhain, ex-condado alemão, 25, 36. 199.

'''

216
Apresente edição de DUAS VIAGENS AO BRASIL
de Hans Staden é o volu1ne número 17 da Coleção
"Reconquista do Brasil" {l ªSérie), dirigida por Antô-
nio Paim, Roque Spencer Maciel de Barros e Ruy
Afonso da Costa Nunes; diretor até o volun1e 60,
Mário Guimarães Ferri (1918-1985). Impresso na
Sografe Editora e Gráfica Ltda., à rua Alcobaça, 745 -
Belo Horizonte, para a Editora Itatiaia, à Rua São Ge-
raldo, 67 - Belo Horizonte - MG. No catálogo geral
leva o número 00476/9B. ISBN: 978-85-319-0507-0.
como uma das fontes mais autori-
zadas da etnografia sul ..americana.
Mais de cinqüenta edições de seu
relato, ein alemão, flamengo, holm1-
dês, latim, francês e português dão
testemunho de sua invulgar importân-
cia. No Brasil, até a infància foi atra-
ída para a significação de seus escri-
tos, através dos livros especialmente
dedicados aos jovens pelas transcri-
ções geniais de Monteiro Lobato.
Personalidade inegavelmente
invulgar, Hans Staden, por sua vida
e por sua obra, situa-se entre os.
mais importantes autores que já es-
creveram sobre os inícios da histó-
ria brasileira. Ele viu, viveu e des-
creveu o que era esta região, com
seus panoramas e seus habitantes,
nos selváticos começos que lhe de-
ram configuração e dimensões. Para
quem quer compreender as raízes
e as coordenadas da evolução bra-
sileira, o seu testemunho é simples-
mente indispensável.
Ao reapresentar a obra de Hans
Staden, facilitando-a à consulta e
apreciação de todos os estudiosos,
a Editora Itatiaia, sente-se feliz por
poder, mais uma vez, cooperar com
t~dos aqueles que, no estudo da
formação histórica brasileira, se
. devotam a buscar nos alicerces do
passado as indicações que nos
apontam o caminho da construção
de uma nação sempre maior.
A presente obra apresenta-se em
reprodução fac-similar da excelen-
te tradução de Guiomar de Carva-
lho Franco, altamente enriquecida
com a inserção de ilustrações e
mapas da edição original publicada
em Marburgo no ano de 1556.
é
.E DITORA ITATIAIA
UMA EDIÇÃO ITATIAIA É SEMPRE UM BOM LIVRO
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