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1 GABRIEL MERLI

2 Na obra “A Invenção de Hugo Cabret”, é narrada a relação entre um dos pais do


3 cinema, Georges Mélies, e um menino órfão, Hugo Cabret. A ficção, inspirada na
4 realidade do começo do século XX, tem como um de seus pontos centrais o lazer
5 proporcionado pelo cinema, que encanta o garoto. No contexto brasileiro atual, o
6 acesso a essa forma de arte não é democratizado, o que prejudica a disponibilidade de
7 formas de lazer à população. Esse problema advém da centralização das salas
8 exibidoras em zonas metropolitanas e do alto custo das sessões para as classes de
9 menor renda.
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11 Primeiramente, o direito ao lazer está assegurado na Constituição de 1988, mas o
12 cinema, como meio de garantir isso, não tem penetração em todo território brasileiro.
13 O crescimento urbano no século XX atraiu as salas de cinema para as grandes cidades,
14 centralizando progressivamente a exibição de filmes. Como indicativo desse processo,
15 há menos salas hoje do que em 1975, de acordo com a Agência Nacional de Cinema
16 (Ancine). Tal fato se deve à falta de incentivo governamental – seja no âmbito fiscal
17 ou de investimento – à disseminação do cinema, o que ocasionou a redução do parque
18 exibidor interiorano. Sendo assim, a democratização do acesso ao cinema é
19 prejudicada em zonas periféricas ou rurais.
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21 Ademais, o problema existe também em locais onde há salas de cinema, uma vez
22 que o custo das sessões é inacessível às classes de renda baixa. Isso se deve ao fato
23 de o mercado ser dominado por poucas empresas exibidoras. Conforme teorizou
24 inicialmente o pensador inglês Adam Smith, o preço decorre da concorrência: a
25 competitividade força a redução dos preços, enquanto os oligopólios favorecem seu
26 aumento. Nesse sentido, a baixa concorrência dificulta o amplo acesso ao cinema no
27 Brasil.
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29 Portanto, a democratização do cinema depende da disseminação e do jogo de
30 mercado. A fim de levar os filmes a zonas periféricas, as prefeituras dessas regiões
31 devem promover a interiorização dos cinemas, por meio de investimentos no lazer e
32 incentivos fiscais. Além disso, visando reduzir o custo das sessões, cabe ao Ministério
33 da Fazenda ampliar a concorrência entre as empresas exibidoras, o que pode ser feito
34 pela regulamentação e fiscalização das relações entre elas, atraindo novas empresas
35 para o Brasil. Isso impediria a formação de oligopólios, consequentemente
36 aumentando a concorrência. Com essas medidas, o cinema será democratizado,
37 possibilitando a toda a população brasileira o mesmo encanto que tinha Hugo Cabret
38 com os filmes.
39 Comentário:
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41 O participante demonstra excelente domínio da modalidade escrita formal da
42 língua portuguesa, uma vez que a estrutura sintática é excelente e não há presença de
43 desvios em seu texto.
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45 Em relação aos princípios da estruturação do texto dissertativo-argumentativo,
46 percebe-se que o participante apresenta introdução em que expõe seu ponto de
47 vista, desenvolvimento de justificativas que comprovam esse ponto de vista e
48 conclusão que encerra a discussão, demonstrando excelente domínio do texto
49 dissertativo-argumentativo. O tema é abordado de forma completa, revelando uma
50 leitura cuidadosa da proposta de redação: ainda no primeiro parágrafo, o participante
51 anuncia a problemática ao abordar a centralização das salas de cinema e o preço
52 elevado dos ingressos que impedem a democratização efetiva do cinema. Observa-se
53 também o uso produtivo de repertório sociocultural pertinente à discussão proposta
54 pelo participante em mais de um momento do texto: no primeiro parágrafo, o filme “A
55 Invenção de Hugo Cabret” foi utilizado com o objetivo de contextualizar o tema,
56 apresentando o cinema como um lugar de lazer; no segundo parágrafo, o
57 participante compara o que é assegurado pela Constituição Federal com a situação
58 atual do país; e, no terceiro parágrafo, ele se vale de um argumento de autoridade,
59 encontrado no pensamento de Adam Smith, para fundamentar a justificativa de que o
60 preço dos ingressos é alto porque há poucas empresas atuando no Brasil.
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62 Percebe-se, também, ao longo da redação, a presença de um projeto de texto
63 estratégico, com informações, fatos e opiniões relacionados ao tema proposto,
64 desenvolvidos de forma consistente e bem organizados em defesa do ponto de vista.
65 No primeiro parágrafo, o participante destaca a importância do cinema como fonte de
66 lazer e apresenta a situação dessa arte no Brasil: de acordo com ele, o acesso ao
67 cinema é prejudicado porque as salas estão centralizadas em grandes cidades e o
68 preço dos ingressos é alto. Esses dois aspectos serão aprofundados de forma
69 organizada, cada um em um parágrafo próprio. No segundo parágrafo, discutem-se as
70 causas da centralização das salas do cinema nas grandes cidades, o que fez com que
71 as áreas rurais ou periféricas ficassem sem acesso a ele. Já no terceiro parágrafo, as
72 causas do alto custo das sessões de cinema são apresentadas e detalhadas. No último
73 parágrafo, são apresentadas propostas de solução para os dois problemas discutidos no
74 texto, reforçando a importância de se proporcionar esse tipo lazer à população
75 brasileira.
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77 Em relação à coesão, encontra-se, nessa redação, um repertório diversificado de
78 recursos coesivos, sem inadequações. Há articulação tanto entre os parágrafos
79 (“Ademais”, “Portanto”) quanto entre as ideias dentro de um mesmo parágrafo (1º
80 parágrafo: “seus pontos centrais”, “essa forma de arte”, “o que”; 2º parágrafo: “mas”,
81 “desse processo”, “Sendo assim”; 3º parágrafo: “também””, “uma vez que”,
82 “enquanto”; 4º parágrafo: “dessas regiões”, “Além disso”, “Com essas medidas”, entre
83 outros).
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85 Por fim, o participante elabora proposta de intervenção muito boa: concreta,
86 articulada à discussão desenvolvida no texto, detalhada e que respeita os direitos
87 humanos ao propor investimentos em salas de cinemas em lugares afastados e
88 aumento da competitividade entre as empresas exibidoras.

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