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O FENÔMENO DO GASLIGHTING NOS BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE E O

DIREITO FUNDAMENTAL À PREVIDÊNCIA SOCIAL

Análise das perícias médicas do INSS a luz do texto “O que é a gaslighting


jurídico?” escrito por Lênio Streck sob a perspectiva constitucional e
previdenciária.

Matheus Oliveira Soares1

RESUMO

O presente artigo trata a respeito do fenômeno do Gaslighting no âmbito das


perícias médicas do INSS. O objetivo é verificar se a gaslighting está presente
no âmbito previdenciário (mais especificamente na avaliação dos benefícios
por incapacidade). Procura-se responder a seguinte pergunta: existe a
gaslighting no âmbito das avaliações periciais do INSS? Utiliza-se o método
analítico de pesquisa por meio da revisão bibliográfica. Ao discutir o estado da
arte em relação às perícias medicinais previdenciárias enxergamos as falhas
que não permitem a melhoria dos serviços do regime securitário.

Palavras chave: Gaslighting. Previdenciário. Perícia médica. INSS. Avaliação.

ABSTRACT

This article deals with the phenomenon of Gaslighting within the scope of INSS
medical expertise. The objective is to verify if gaslighting is present in the social
security scope (more specifically in the evaluation of disability benefits). The
aim is to answer the following question: is there gaslighting within the scope of
INSS expert assessments? The analytical method of research is used through a
bibliographical review. When discussing the state of the art in relation to social
security medical expertise, we see the flaws that do not allow the improvement
of the services of the security system.

1Mestrando em Constitucionalismo e Democracia pela Faculdade de Direito do Sul de Minas


(FDSM). Especialista em Direito Processual Civil e Direito Previdenciário.
Keywords: Gaslighting. Social security. Medical expertise. INSS. Assessment.

1) Introdução

O presente artigo trata a respeito do fenômeno do gaslighting nos


benefícios por incapacidade e os direitos fundamentais elencados em nossa
Constituição da República Federativa do Brasil.
Conforme será esclarecido o gaslighting, de forma simples, pode ser
definido como a negligência diante de uma determinada queixa. Tal tema
também é utilizado na medicina quando o médico ignora as queixas e sintomas
do paciente.
Tal tema possui grande relevância em nossa comunidade jurídica uma
vez que por vezes (como foi colocado por Lênio Streck) o advogado é ignorado
pelo juiz, principalmente na apreciação dos embargos de declaração.
Contudo, no presente artigo, trataremos a respeito da possível existência
fenômeno dos gaslighting no âmbito previdenciário. Será analisado se o
periciando é ignorado nas perícias médicas e como isso afeta as diretrizes
constitucionais.
Ou seja, a pergunta que este artigo visa responder é a seguinte: Existe a
gaslighting no âmbito previdenciário? Se existe, tal fenômeno interfere nas
diretrizes estabelecidas na Constituição da República Federativa do Brasil de
1988?
Para tanto, será analisada as principais queixas dos usuários dos
serviços do INSS e as diretrizes constitucionais elencadas como direitos
fundamentais.
A abordagem do tema realizar-se-á pelo método dedutivo uma vez que o
presente artigo verifica as condições gerais das perícias médicas que pode
chegar ao resultado individual (se o indivíduo sofre ou não a gaslighting no
âmbito previdenciário).
Marconi e Lakatos (2003, p.99 e 100) entende que o método dedutivo
expõe o problema; constrói um modelo teórico; faz deduções a partir de
consequências particulares; faz teste das hipóteses e faz uma adição ou
introdução das conclusões na teoria.
No item 2, será exposto o fenômeno do gaslighting, o modo como o
gaslighting foi tratado por Lênio Streck e os Direitos Fundamentais
estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil que são
atingidos pelo gaslighting.
No item 3, será analisada a situação atual dos benefícios por
incapacidade e as principais queixas dos usuários do serviço do INSS.
No item 4, serão apontadas as diretrizes constitucionais violadas pelo
gaslighting nos benefícios por incapacidade.
E, por último, será realizada a conclusão do presente artigo.

2) O gaslighting jurídico e o direito constitucional à Previdência


Social

O termo gaslighting tem origem no filme “À Meia Luz” (gaslighting em


inglês). O referido filme conta a história de um casal em que o marido tenta
convencer a esposa que ela está louca. A cônjuge diz ao marido que objetos
estão desaparecendo e as luzes a gás da casa estão diminuindo (o que
originou o nome do título). Entretanto, o esposo diz que tudo não passa de
imaginação da esposa e que ela estaria ficando louca.
Assim, o termo gaslighting surge como um ato de ignorar as alegações
de outra pessoa, podendo, inclusive, sugerir a loucura do reclamante.
Tal vocábulo, inclusive é utilizado na medicina, quando o médico ignora
os sintomas do paciente.
De posse desse termo, Lênio Streck vai escrever o texto “O que é o
Gaslighting Jurídico”. No referido texto, Lênio trata como uma angústia em que
o poder judiciário (e poderíamos citar outros atores da justiça) ignoram
“sintomas” e desprezam as situações apresentadas para resolução.
Lênio, inclusive, dá como exemplo os julgamentos de embargos de
declaração em que o juiz sequer analisa os motivos do embargante e coloca na
decisão “nada há a esclarecer” ou “a parte deseja rediscutir o mérito” ou ainda
“o juiz tem o livre convencimento e por isso não necessita responder aos
argumentos da parte, se já convencido do resultado” – trecho do tema 339 do
STF.
Na escrita de Lênio, é dito que o gaslighting ceifa os direitos. Entretanto,
no presente artigo, será realizada uma análise do gaslighting no âmbito
previdenciário. Para tanto, é preciso fazer uma análise profunda no texto
constitucional para saber os deveres estatais quanto à tal direito.
De início, um importante fundamento da República Federativa do Brasil
é a cidadania. José Afonso da Silva traz que o fundamento da cidadania
constitui os participantes da vida do Estado além de reconhecer o indivíduo
como parte da sociedade (SILVA, 2013).
Ou seja, pelo fundamento da cidadania, o indivíduo não pode ser
invisível. O brasileiro pode e deve participar da vida do Estado brasileiro.
Na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 também
encontramos um importante elemento que norteia o presente artigo, que é a
Dignidade da Pessoa Humana (CONSTITUIÇÃO, 1988).
A Dignidade da Pessoa Humana vem colocar os direitos e garantias
fundamentais como algo inerente às personalidades humanas (MORAES,
2020).
Note que a Dignidade da Pessoa Humana está na Constituição como um
dos fundamentos da República. Tal fato significa que o ser humano deve ser
visto como um fim e fundamento da sociedade (TAVARES, 2020).
Como se verá o Direito Previdenciário está inserido dentro dos direitos
fundamentais. Podemos, desde já começar a pensar que negar o Direito
Previdenciário a qualquer cidadão significa negar um direito fundamental
inerente ao ser humano.
Ingo Wolfgang Sarlet, no livro Dignidade da Pessoa Humana sustenta
que a dignidade da pessoa humana pressupõe o reconhecimento e proteção
dos direitos fundamentais de todas as dimensões (SARLET, 2006).
Assim, não se pode falar em dignidade da pessoa humana, se não há o
reconhecimento e proteção (por parte do Estado) dos direitos fundamentais,
incluindo o direito fundamental à Previdência Social.
Para encerrar a ponderação a respeito dos fundamentos da República
Federativa do Brasil é preciso dizer que o poder é oriundo do povo
(CONSTITUIÇÃO, 1988).
Antes de adentrar aos Direitos e Garantias Individuais, é indispensável
mencionar o objetivo fundamental da República de construir uma sociedade
justa e solidária.
Ou seja, a meta a ser seguida é estabelecer uma sociedade com justiça.
E além da justiça, a solidariedade deve ser marca importante de nossa
comunidade brasileira. A justiça e a solidariedade são metas que devem ser
alcançadas pela república.
Vale ressaltar que a busca por justiça, no contexto dos benefícios por
incapacidade, busca que os peritos médicos atuem com equidade e que seja
entregue aos beneficiários seus direitos estabelecidos na Constituição e
demais leis previdenciárias.
No âmbito da solidariedade, pode-se dizer que a seguridade social visa
cobrir os indivíduos em momentos de necessidade. Ou seja, quando não
podem trabalhar seja em razão da idade avançada ou em razão de doença que
incapacita o indivíduo ao labor (AMADO, 2018).
Dentro do Título II da Constituição da República de 1988, no capítulo II,
estão elencados os direitos sociais.
Os direitos sociais são prestações realizadas pelo Estado de forma
direta ou indireta em que possibilita melhores condições de vida aos mais
fracos (SILVA, 2013).
Dentre os direitos sociais estabelecidos em nossa Constituição da
República, há o direito à previdência social.
A Previdência Social é definida no livro “Manual de Direito
Previdenciário” escrito por Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista
Lazzari da seguinte maneira:

“Previdência Social é o sistema pelo qual, mediante contribuição, as


pessoas vinculadas a algum tipo de atividade laborativa e seus
dependentes ficam resguardadas quanto a eventos de infortunística
(morte, invalidez, idade avançada, doença, acidente de trabalho,
desemprego involuntário), ou outros que a lei considera que exijam
um amparo financeiro ao indivíduo (maternidade, prole, reclusão),
mediante prestações pecuniárias (benefícios previdenciários) ou
serviços.”
O Regime Geral da Previdência Social, conforme determina a
Constituição da República de 1988, deve atender a cobertura dos eventos de
incapacidade temporária ou permanente para o trabalho (CONSTITUIÇÃO,
1988).
Pela definição acima é possível ver o direito à previdência social como
uma obrigação de proteção do Estado em face dos cidadãos nos momentos de
vulnerabilidade, como doença, idade avançada, morte e outros motivos.
E, ao falar de gaslighting, é preciso falar sobre o Devido Processo Legal
e o Contraditório.
A nossa Constituição da República Federativa do Brasil em seu artigo
5°, LIV, vem estabelecer que o princípio do Devido Processo Legal. Dentro do
princípio do Devido Processo Legal há a exigência da realização de um
processo justo que visa obter uma decisão justa (SARLET, 2018).
O princípio do Contraditório, firmado em nossa Constituição da
República, determina que a parte integrante do processo (seja judicial ou
administrativo) possa ser ouvida e tenha a possibilidade de influenciar a
decisão (DIDIER, 2019).
Entretanto, alguns agentes do INSS promovem o oposto da obrigação
estatal. Principalmente alguns peritos médicos do INSS que promovem a
gaslighting no âmbito previdenciário.
Ora, retomando o conceito de gaslighting desenvolvido por Lênio Streck,
muitos peritos médicos ignoram as enfermidades de vários segurados. Tal fato
vai gerar inúmeras ações previdenciárias ou desistências.
Os beneficiários que ajuízam ações na justiça, por vezes, morrem
aguardando ver a realização de seu direito. Outros, até passam pela perícia
médica judicial e o expert verifica a incapacidade. Mas, a parte requerente por
vezes não consegue sobreviver até o momento da sentença.
Tudo isso será esclarecido no próximo tópico.

3) Atualidade dos benefícios por incapacidade

Inicialmente, é preciso dizer que, na legislação previdenciária, o


beneficiário terá direito, em hipótese de incapacidade laborativa (neste contexto
contribuindo para a previdência social), aos seguintes benefícios: benefício por
incapacidade temporária (antigo auxílio-doença) e definitiva (antiga
aposentadoria por invalidez).
Vejamos o que diz os artigos 42 e 59 da lei 8.213 de 1991 (BRASIL,
1991):

“Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for
o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou
não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e
insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe
garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta
condição.

Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo


cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei,
ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual
por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.”

Tais benefícios foram idealizados, em decorrência dos princípios e


normas que regem a seguridade social no Brasil, com a incumbência de
garantir o sustento de pessoas que não tenham condições de trabalhar.
Entretanto, ao fazer requerimento administrativo junto ao INSS, muitos
não conseguem de imediato a cobertura previdenciária em razão da doença
incapacitante.
Importante ressaltar que os processos judiciais em face do INSS
geraram o déficit de R$ 92 bilhões, em 2019. Ou seja, um terço do déficit
(LEONEL, 2021).
Com esse dado, verifica-se que é caro a judicialização dos benefícios
por incapacidade. Assim, para evitar o gasto excessivo com a previdência
social é preciso realizar uma perícia administrativa muito bem feita. Mas, será
que a perícia administrativa é realizada de modo escorreito?
Para responder tal indagação, precisamos verificar um importante
estudo feito por Maria da Penha Pereira de Melo, em seu artigo “Governo da
população: relação médico-paciente na perícia médica da previdência social”.
Neste artigo, a autora fez uma pesquisa sobre as principais reclamações na
Ouvidoria Geral da Previdência Social.
Maria da Penha Pereira de Melo aponta cinco principais queixas, quais
são: o perito não olha ou segue o laudo ou exame de comprovação
apresentado pelo segurado; perito que age com excesso de poder; perito não
age como médico; médico perito não tem conhecimento ou qualificação e
outras queixas.
Somente pelas principais queixas apontadas, verifica-se que os
candidatos à percepção dos benefícios por incapacidade são negligenciados.
Não somente isso. Até mesmo o médico assistente do periciando não é ouvido
pelo perito médico.
No artigo “Governo da população: relação médico-paciente na perícia
médica da previdência social”, vemos que os brasileiros se queixam alegando
mau atendimento por parte dos peritos. No mencionado artigo, consta que
85,4% dos entrevistados se queixam de agressão verbal e 34,1% dos
avaliados disseram que sofreram agressões físicas por parte dos peritos
(MELO, 2014).
No ensaio “A judicialização dos benefícios previdenciários por
incapacidade: da negativa administrativa à retratação judicial”, escrito por Paulo
Afonso Brum Vaz traz a informação de que oito (8) entre dez (10) segurados
obtiveram o benefício judicialmente. Também é disponibilizada a informação de
que, entre os anos de 2014 e 2017, 46% das ações relacionadas a pedido de
auxílio-doença e 45% dos pedidos de aposentadoria por invalidez foram
julgadas procedente.
Vemos que os peritos médicos do INSS estão falhando muito na
avaliação pericial. Ora, pelos dados acima exposto verifica-se que muitos
indeferimentos administrativos são revertidos. Ou seja, o modelo de avaliação
administrativa não está sendo eficaz. E o pior, conforme já exposto, os erros
graves desses peritos médicos custam muito caro aos cofres públicos. Já que a
judicialização dos benefícios por incapacidade não é algo acessivo.
Diante de todos esses dados, podemos ver que a perícia médica do
INSS precisa melhorar muito em relação ao atendimento. Perícias
administrativas defeituosas geram demandas judiciais que consequentemente
trazem custos maiores.
Inclusive uma das queixas dos brasileiros é o perito médico que não
escuta o periciando ou que o perito médico não presta atenção nos
documentos médicos apresentados pelo segurado.
Ora, se o médico assistente do periciando é ignorado, imagine o
periciando que relata suas incapacidade e dificuldades laborais.
Assim, podemos verificar a existência dos gaslighting no âmbito da
previdência social. Principalmente no tocante às perícias médicas.

4) gaslighting nos benefícios por incapacidade

O fenômeno do gaslighting está presente na ciência jurídica e também


consta no direito previdenciário. Os candidatos a percepção aos benefícios por
incapacidade são negligenciados pelos peritos médicos do INSS.
Ao analisar a gaslighting em cotejo com a Constituição da República,
verifica-se gravíssimo contexto de violação.
A desobediência ao texto constitucional já inicia com o fundamento da
cidadania. Como foi abordado neste artigo, traz a inclusão do indivíduo como
parte da sociedade brasileira.
Entretanto, quando o beneficiário não é ouvido pelos peritos médicos, há
evidente transgressão ao fundamento constitucional da cidadania. Ora, o
periciando tratado como se não fosse integrante da sociedade brasileira.
Tal fato também vem a violar gravemente o princípio da Dignidade
Humana que pressupõe o respeito e cumprimento integral dos Direitos e
Garantias do Indivíduo.
Que dentro do rol de Direitos e Garantias fundamentais se encontra o
Direito Social à Previdência Social.
Há clara violação ao objetivo de construção de uma sociedade justa e
solidária.
Não há justiça quando cidadãos não são devidamente ouvidos na
autarquia previdenciária; as opiniões dos médicos assistentes são ignoradas
dentre outras ilicitudes abordadas ao longo deste artigo.
O objetivo de se construir uma sociedade solidária não prospera. Isso
porque como foi abordado, pessoas que necessitam de ser agasalhadas no
INSS tem seu benefício indeferido. E tal fato foi devidamente comprovado pelo
número de ações procedentes que buscavam a reversão de decisão que
indeferiu o pedido de benefício por incapacidade.
A imposição do silêncio aos periciandos viola o devido processo legal,
isso porque não há razoabilidade em não ouvir o periciando. Também deve ser
considerado que as decisões administrativas não estão sendo justas. Ora, boa
parte dos indeferimentos são revertidos judicialmente.
Não há que se falar em existência de contraditório porque o periciando
(quando não é ouvido ou seus documentos médicos são ignorados) não tem a
menor possibilidade de influenciar a decisão do perito médico do INSS.
Uma das razões que podem ser apontadas é o silenciamento dos
periciandos durante a realização da perícia. O médico perito, por vezes, ignora
relatos de dor do paciente ou sintoma que o expert julga não ter relação com o
processo administrativo (por falta de conhecimento específico). Ou ainda, o
perito age com a arrogância de não ponderar a respeito da opinião de um
colega que atua como médico assistente do candidato ao recebimento do
benefício por incapacidade.
Pode-se dizer também que há violação ao contraditório. Ora, o
contraditório dá ao cidadão a possibilidade de influência na decisão. Mas, é
impossível a existência do contraditório se o cidadão é ignorado ou os laudos
médicos não são sequer observados ou se o periciando é maltratado (DIDIER,
2019).
O gaslighting está presente.
A manutenção do gaslighting além de ser contrária ao que diz e
determina a nossa Constituição, pode-se dizer que traz prejuízos aos cofres
públicos. Ora, conforme visto acima, podemos claramente estabelecer a
relação entre perícias mal conduzidas com o aumento na judicialização dos
benefícios por incapacidade.
E, mais do que isso, a longa espera por quem faz jus ao recebimento de
benefício por incapacidade é algo que fere o princípio da Dignidade da Pessoa
Humana. Ora, o fundamento da nossa sociedade é o ser humano.
Assim, além do gaslighting jurídico há também o gaslighting
previdenciário. Lênio Streck diz que o gaslighting mata direitos. No direito
previdenciário, além da tentativa de assassinato dos preceitos constitucionais,
há também a morte física do autor da ação pleiteando benefícios por
incapacidade.
Pois não é incomum ouvir que pessoas falecem aguardando nova
perícia na justiça ou falecem após a realização de perícias e antes da
sentença.
O gaslighting previdenciário mata o direito e pode matar o cidadão
brasileiro.

3) Conclusão

Ao término do presente artigo é evidente a existência do gaslighting no


âmbito dos benefícios por incapacidade. Entretanto, é preciso dizer que mais
do que constatar a existência do gaslighting nos benefícios por incapacidade, o
presente artigo entregou à comunidade jurídica uma visão de parte do
tratamento que o cidadão possui no INSS.
Este artigo trouxe o modo como os princípios estabelecidos na
Constituição de República de 1988, como os fundamentos e objetivos da
República Federativa do Brasil e os princípios do Devido Processo Legal e
Contraditório, são diuturnamente afrontados por médicos peritos do INSS em
razão da existência do gaslighting no âmbito do INSS.
E além de negarem uma decisão justa aos cidadãos, peritos que
procedem com o gaslighting também violam um importante fundamento da
nossa república, que é a dignidade da pessoa humana.
O gaslighting fere o fundamento da cidadania além de prejudicar
gravemente a construção de uma sociedade justa e solidária. Ora como se
poderá falar de uma sociedade justa onde os cidadãos não podem ser ouvidos
durante uma perícia administrativa do INSS? E não existe solidariedade se o
Estado fecha os olhos aos brasileiros que possuem incapacidade para
trabalhar.
Aliás, a própria violação às garantias fundamentais são seria uma
violação à dignidade da pessoa humana. Entretanto, mais do que matar
garantias fundamentais podemos dizer que enquanto o gaslighting perdurar, a
sociedade brasileira não estará tendo o bem estar do ser humano como
prioridade.
Com isso um dos fundamentos da nossa República está sendo
colapsada.
E qual uma possível saída para tal fenômeno negativo? A própria
Constituição de 1988 seria uma resposta. Ora, o cumprimento e o respeito à
Constituição não só por pessoas formadas em ciência jurídica por trazer a
dignidade da pessoa humana e outras garantias fundamentais ao seu ponto
máximo.
Principalmente com uma mudança de mentalidade. Lênio Streck afirma
que o gaslighting jurídico está tão arraigado que teria até torcida a favor da
existência do gaslighting jurídico.
E, no direito previdenciário, não seria diferente. Não é incomum
encontrar peritos que culpam o beneficiário por não trazer a documentação
correta. Entretanto, tais peritos não fornecem a informação precisa a respeito
da documentação necessária para a realização de perícia.
Ademais, tal fato restabeleceria a confiança que os brasileiros tem no
Instituto Nacional do Seguro Social.
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