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O Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, em decisão

monocrática, sustou a decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro


(TJ-RJ), que havia dado permissão à prefeitura de um de seus municípios para
que houvesse uma fiscalização e posterior apreensão de livros cujo conteúdo
viera a atentar contra à ordem pública conforme afirmou o Poder Executivo
daquela região, o que, evidentemente, se caracteriza como uma notável censura,
algo absolutamente contrário ao Estado Democrático de Direito e a própria
Constituição Federal de 1988.

Não obstante, a decisão do ministro Gilmar foi escolhida para análise justamente
por ela abarcar princípios constitucionais, métodos interpretativos, e também pela
sua repercussão social, em face de um tema tão importante (censura X liberdade
de expressão) e que ultimamente vem levantando tantas polêmicas.

Os princípios que orientam a interpretação constitucional detêm um importante


papel de compreensão dos valores intrínsecos desse supremo dispositivo jurídico-
político, bem como buscam a clara vontade do legislador originário e derivado.
Portanto, visando a proteção de direitos e garantias essenciais ao ser humano, à
sociedade e às estruturas organizacionais do Estado, tais axiomas possibilitam ao
intérprete um maior alicerce na tomada de decisão em meio aos conflitos que lhes
apresentam.

Outrossim, sob a luz da decisão de nº 36742 e objeto da nossa análise, é possível


notar a influência dos mecanismos principiológicos na fundamentação do
veredicto, como já mencionado anteriormente. Em elevada síntese, consta no
documento a alegação do Município do Rio de Janeiro sobre uma suposta lesão à
ordem pública provocada por obras de cunho homotransexual comercializadas na
Feira Bienal do Livro.

Em decisão acertada, o relator critica a censura propiciada por dogmas religiosos,


morais e ideológicos, pois esta viola os direitos fundamentais inerentes aos grupos
sociais desfavorecidos. A intervenção municipal visando o controle das obras
editoriais do referido evento, seria uma afronta à garantia constitucional de
liberdade de expressão e, segundo o ministro, atenta contra um dos princípios
basilares do Estado Democrático de Direito, justamente a liberdade de
manifestação do pensamento e informação.

Pode-se observar que o entendimento do intérprete da Suprema Corte, a priori, foi


baseado no princípio da máxima efetividade constitucional. Este, conforme a
ilustre Nathalia Masson, consiste em proporcionar uma maior eficiência possível
aos direitos fundamentais, de maneira a otimizar a norma e extrair dela todo o seu
potencial protetivo. Destarte, fica nítido que os direitos elementares à existência
humana se sobrepõem a qualquer ato de censura prévia e discriminação à
autodeterminação individual, mesmo emanados de órgãos públicos.

Outro ponto, é no tocante ao princípio da concordância prática (ou harmonização)


também presente na decisão. Tal pressuposto atua perante conflitos específicos,
que somente se pronunciam diante de um caso concreto. (Masson, 2016, p. 65).
Com o objetivo de conciliar direitos constitucionalmente protegidos que estejam
em colisão com outros, por exemplo, o direito à liberdade de informação e a
questionável lesão à ordem pública da sentença, portanto, fica claro que a
resposta normativa tenderá pela negação de um em face ao outro. Sendo assim,
segundo Canotilho, ocorre uma limitação e um condicionamento de ambos os
lados do conflito em prol da harmonização ou concordância prática dos bens
tutelados.

Por fim, ao interpretar a decisão usando como base os princípios acima citados, é
possível notar a intenção do relator em afastar qualquer forma de preconceito e
discriminação, sobretudo, coibir o arbítrio estatal uma vez que visa assegurar a
liberdade de expressão, bem como o livre desenvolvimento da personalidade
individual, orientação sexual e as questões de gênero.
Referências:

Masson, Nathalia. Manual de Direito Constitucional. 4. ed. revisada, ampliada e


atualizada. Salvador: Juspodivm, 2016.

<https://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI310517,21048-
STF+barra+censura+de+livros+com+tematica+LGBT+na+Bienal+do+Rio >

Acesso em: 08 de set. de 2019

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