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PODER NAVAL

Os CVE
e sua contribuição na
Batalha do Atlântico
(1ª parte)

Maio de 2019 marcou o 76º aniversário da “virada”

D
esde o início da guerra, os aliados vinham sofrendo pesadas perdas em
decisiva na Batalha do Atlântico, durante a Segunda navios mercantes, causadas pelos submarinos alemães que operavam
Guerra Mundial. Este artigo examina a contribuição do no Atlântico. Apesar dos esforços dos navios de escolta, apoiados pela
aviação de patrulha marítima baseada em terra,as perdas aliadas somadas,
Navio-Aeródromo (NAe) de escolta (conhecido pela sigla até o início de 1943, haviam se tornado críticas. No mês de março, ocor-
CVE, em inglês) para aquela campanha marítima, de reu o pico das perdas naquele ano, tendo sido atacados 131 navios (num total de
cujo resultado dependia o prosseguimento da luta contra 741.019 toneladas), dos quais foram afundados 108 (totalizando 585.404 tonela-
o Eixo. A neutralização da ameaça submarina alemã em das) e avariados outros 23 (total de 155.615 toneladas).
1943 possibilitou o desembarque das forças aliadas na Todavia, na primavera de 1943, entrou em serviço operativo uma nova arma
Normandia, em 1944, o que acelerou a vitória final contra do arsenal aliado, cuja contribuição para o sucesso na campanha contra os U-
boats seria inestimável: o NAe de escolta. Designado como escort aircraft carrier
a Alemanha nazista, em 1945. (ou simplesmente escort carrier), este tipo de NAe tornou-se
conhecido, entre as tripulações britânicas e americanas, por
n EDUARDO ITALO PESCE apelidos como “Woolworth carrier”,“jeep carrier” e “baby flat-

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top”. Na Marinha dos Estados Unidos, esses navios receberam originalmente (6


de março de 1941) a designação AVG,sendo redesignados como ACV em 20 de agos-
to de 1942. Em ambas as siglas, a letra “A” indicava sua condição de unidades auxi-
liares. Em 15 de setembro de 1943, sua condição plena de navios de combate foi
reconhecida pela designação CVE — logo jocosamente traduzida pelos marinheiros
como “Combustible, Volatile, Expendable” (combustível, volátil e descartável).
Com efeito, um CVE era menor e bem mais lento que os grandes NAe de es-
quadra, embarcando um número limitado de aeronaves. Sua construção utiliza-
va casco de tipo mercante, e sua vulnerabilidade era lendária. Mesmo assim, fo-
ram perdidos em serviço apenas nove navios (três britânicos e seis americanos),
de um total de 130 unidades construídas, das quais 121 foram incorporadas à Royal
Navy (RN) e à U. S. Navy (USN) entre junho de 1941 e agosto de 1945. Embora te-
nham estado presentes em todos os teatros de operações, foi sua atuação na Ba-
talha do Atlântico a que — tendo originalmente motivado a sua criação — me-
rece o maior destaque, e será o foco deste artigo. O emprego dos NAe de escolta
aliados no Pacífico, assim como nos demais teatros da II Guerra Mundial, poderá
ser tema para futuros trabalhos.

Necessidade de proteção aérea


Durante a guerra, ficou constatado que não poderia ser fornecida proteção
completa aos comboios, até que fosse possível prover escolta aérea, ao longo de
toda a travessia do Atlântico. Por anos, havia uma “brecha”,com cerca de 600 mi-
lhas marítimas de extensão, no meio do Atlântico Norte, entre a Groenlândia, a Is-
lândia e o Reino Unido (denominada GIUK Gap), que as aeronaves de patrulha ba-
seadas em terra, disponíveis no início da guerra, não podiam cobrir. Aquela “bre-
cha” foi fechada, em parte, pela introdução de novas aeronaves quadrimotores de Ao fundo Aeronaves SBD-3
Dauntless e F4F-4 no convoo
longo raio de ação, como o Consolidated B-24 Liberator americano e o Shorts Sun-
do USS Santee durante a
derland britânico, mas uma solução completa só foi obtida com a provisão de NAe Operação “Torch” (Foto: USN).
de escolta em número suficiente, para a proteção dos comboios ao lon-
go de todo o percurso.
Este conceito revolucionário (para a época) foi desenvolvido, mais
ou menos simultaneamente, no Reino Unido e nos EUA. Já em 1927, o
oficial de marinha norte-americano Bruce G. Leighton tinha apresenta-
do, num trabalho acadêmico, a proposta de um NAe de pequeno por-

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vios mercantes em NAe. Tais planos normalmente envol-


viam modificações elaboradas, o que tornava questioná-
vel sua viabilidade numa emergência.A construção dos NAe
de escolta, ao contrário, caracterizou-se pela simplicidade
e austeridade na conversão ou adaptação de navios mer-
cantes. Portanto, a relação custo-benefício destas belo-
naves “improvisadas” tornou-se bastante vantajosa.
No início da Segunda Guerra Mundial, foi feita uma ten-
tativa de levar para o mar aeronaves de caça Hawker Sea
Hurricane a bordo de cargueiros, aos quais era adaptada
uma catapulta (acionada a pólvora) na proa. A ideia era lan-
çar a aeronave para interceptar aviões alemães de escla-
recimento marítimo, como os quadrimotores Focke-Wulf
Fw200 Condor (cujo raio de ação lhes permitia operar so-
bre o Atlântico), antes que estes transmitissem a localiza-
ção dos comboios aliados. Obviamente, tais navios, co-
nhecidos como Catapult Aircraft Merchantmen (ou sim-
plesmente CAM Ships), só eram capazes de utilizar sua aero-
nave uma vez, pois esta não poderia pousar a bordo. Quan-
do acabava o combustível, o piloto — se não pudesse pou-
sar em terra — tinha que saltar de paraquedas ou arriscar
um pouso no mar (obviamente, o Sea Hurricane não era
um hidroavião). Em qualquer caso, a exposição ao frio das
Acima Poucas fotos te, para uso na guerra antissubmarino e no apoio águas do Atlântico Norte ou do Ártico podia ser fatal.
representariam melhor do que a operações anfíbias, entre outras modalidades Os 30 CAM Ships convertidos a partir de maio de 1941 eram tripulados por
esta a contribuição dos CVE de emprego. Nos EUA, a paternidade da inicia- pessoal da Marinha mercante, e seus aviões e pilotos eram fornecidos pela Royal
para a vitória na Batalha do tiva que resultou no programa de produção de Air Force (RAF). Estes navios deram cobertura aérea a 20 comboios e realizaram
Atlântico:a imagem mostra o NAe de escolta é atribuída ao presidente Frank- oito lançamentos de aeronaves, abatendo seis aviões alemães, mais três prováveis.
U-505 após ser atacado e lin D. Roosevelt. No Reino Unido, ela foi atribuí- Uma primeira iniciativa havia sido tomada alguns meses antes, quando a Royal Navy
capturado pelo USS da ao primeiro-ministro Winston Churchill. Em reativou o velho porta-hidroaviões Ark Royal (rebatizado como Pegasus) e converteu
Guadalcanal,em 4 de junho de ambos os países, foi preciso vencer certa resis- quatro navios mercantes, reclassificando-os
1944. A bordo encontrava-se tência inicial da alta hierarquia naval. como Fighter Catapult Ships (FCS) e equipando-
um inestimável tesouro de A ideia de um NAe adaptado ou converti- os com até três caças bipostos Fairey Fulmar lan- Abaixo O primeiro navio-
inteligência:uma máquina do a partir de um casco de tipo mercante não çados por catapultas (tripulados por pilotos e ob- aeródromo de escolta
endocificadora/decodificadora era exatamente novidade, pois — assim como servadores do Esquadrão 804 da Fleet Air Arm- americano foi o USS Long
Enigma (Foto:USN). os primitivos“porta-hidroaviões”do início da Pri- FAA, a Arma Aérea da Esquadra), que pousavam Island (CVE-1), da mesma
classe que o Archer,
meira Guerra Mundial — os primeiros protóti- ou caiam no mar, após concluir sua única missão.
britânico. Interessante
pos de NAe britânicos, construídos no final daquele conflito, incluíam o HMS Ar- Embora em menor número, os FCS (que eram tri- observar a ausência de
gus, um navio mercante convertido (com convés de voo corrido) para operar com pulados por pessoal da própria Royal Navy) de- “ilha”. Na foto, o convoo
aeronaves no mar. O primeiro NAe da U. S. Navy, o USS Langley (CV-1), que entrou ram proteção aérea a um total de 33 comboios. está tomado por
em serviço em 1922, foi convertido a partir do casco de um navio-carvoeiro de apoio Foram perdidos 11 CAM Ships e dois FCS. No en- aeronaves, principalmente
à Esquadra. No intervalo entre as guerras, diversas Marinhas elaboraram planos de tanto, tais navios não forneciam uma solução de- Dauntless e Hellcats (Foto:
mobilização, visando à conversão de navios de passageiros e outros tipos de na- finitiva para o problema. USN).

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Em 1941, a Royal Navy converteu um cargueiro alemão


capturado, o Hannover, no seu primeiro NAe de escolta, o
HMS Audacity, que entrou em serviço em agosto daque-
le ano, atuando na escolta de comboios entre o Reino Uni-
do e Gibraltar a partir setembro. Este pequeno porta-aviões,
com cerca de 142m de comprimento total, 17m de boca
(na linha d’água) e pouco mais de 8m de calado máximo,
deslocava cerca de 12.000t a plena carga. Com 5.200shp
de potência, desenvolvia pouco mais de 15 nós de velo-
cidade e não dispunha de hangar nem catapulta, mas ape-
nas de um aparelho de parada simplificado (três cabos e
uma barreira) para as aeronaves, que eram estacionadas
sobre o curto convés de voo (130m de comprimento por
18m de largura), que não possuía “ilha”. Era armado com
um canhão de 4 polegadas e um de 6 libras, contra alvos
de superfície, além de 4 canhões antiaéreos do tipo
“pom-pom”,de 2 libras, e quatro de 20mm.
Embarcando seis (oito, se incluídos dois de reserva) ca-
ças Grumman Martlet (denominação britânica do F4F Wild-
cat) Mk.II, de procedência americana, operados pelo Es-
quadrão 802 da Fleet Air Arm, atuou com sucesso na pro-
teção de quatro comboios, até ser afundado em 21 de de-
zembro de 1941, pelo submarino alemão U-751. Apesar de
sua curta vida em operações, o Audacity pode ser considerado o protótipo de to- estudo.A fim de não nos alongarmos em de- Acima A versatilidade dos CVE
dos os NAe de escolta construídos durante a guerra, bem como de um segundo masia, tampouco citaremos os nomes (ori- não conhecia limites: um blimp
tipo de navio, ainda mais simples, conhecido como Merchant Aircraft Carrier (ou ginais ou posteriores à guerra) dos navios pousa no USS Sicily, CVE-118
simplesmente MAC Ship). mercantes, inicialmente convertidos (após (Fotos: USN).
Emergencialmente, até que os NAe de escolta ficassem disponíveis em nú- o lançamento ou durante a construção) e
mero suficiente, um grupo de navios mercantes (graneleiros e navios-tanque) re- posteriormente adaptados (por modificação de projeto) pelos aliados, para
cebeu a instalação de um convés de voo, de uma “ilha” e (no caso dos granelei- atuar como NAe de escolta.
ros) de um pequeno hangar, para operar com três ou quatro aviões-torpedeiros Além do protótipo Audacity, os estaleiros britânicos (cuja capacidade de pro-
Fairey Swordfish (armados com foguetes ou com bombas de profundidade) em dução era muito menor que a dos americanos) converteram apenas mais cinco
operações antissubmarino. Estes navios continuavam a transportar carga nor- navios em NAe de escolta, sendo outros 38 recebidos dos EUA, sob os auspícios
malmente, e eram tripulados pela Marinha mercante. Um total de 19 MAC Ships, do Lend-Lease Act (Lei de Empréstimo e Ar-
incluindo 13 navios-tanque (inclusive dois de bandeira holandesa) e seis grane- rendamento). Os CVE de conversão britânica
Abaixo O quadrimotor Focke-
leiros, com destacamentos aéreos fornecidos por esquadrões da Royal Navy e (no empregavam propulsão diesel, com um ou
Wulf Fw200 Condor foi
caso dos navios holandeses) da Koninklijke Marine, entrou em operações a par- dois eixos; o protótipo Audacity era dotado responsável por muitas perdas
tir de 1943, permanecendo em serviço até o final da guerra. Seus Swordfish em- de um motor diesel de 5.200shp e um só de navios aliados. Em geral,
barcados realizaram mais de 400 surtidas operacionais e 12 ataques, embora não eixo propulsor, sendo os demais navios após descobrir um comboio
tenham afundado nenhum U-boat. Estes navios navegavam com os comboios equipados com dois motores e dois eixos. aliado, acompanhava-o de
transoceânicos e tiveram papel importante na sua proteção, complementando os Tais navios eram capazes de desenvolver ve- longe e reportava sua posição
NAe de escolta e permitindo maior flexibilidade no emprego destes. locidades da ordem de 15 a 18 nós. Os MAC para que fosse atacado por U-
Ships, que mantiveram seu“status”de navios boats (Foto: Bundesarchiv).
Produção em massa
Os Quadros nº 1 e nº 2 (na edição 136)
mostram a lista nominal de todos os NAe
de escolta aliados.Após a conversão dos pri-
meiros protótipos, foi organizado um pro-
grama de produção em grande escala
destes navios, no Reino Unido e (princi-
palmente) nos EUA. Alguns serviram (pelo
menos no papel) à U. S. Navy por um cur-
to intervalo de tempo, antes de serem
transferidos para a Royal Navy. Cabe men-
cionar que, durante o conflito, a Marinha Im-
perial japonesa chegou a converter em por-
ta-aviões alguns cascos de navios mer-
cantes. Embora historiadores ocidentais cos-
tumem designar tais navios como“NAe de
escolta”,estes não farão parte do presente

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Acima Para se contrapor ao mercantes, utilizavam sua propulsão die- Navy operou um total de 44 NAe de escolta, somando-se os seis convertidos em
perigo representado pelas sel original, com um só eixo. Devido à ca- estaleiros britânicos e os 38 de procedência americana. Dois navios, o HMS Nabob
aeronaves de patrulha da rência de pessoal qualificado, os NAe de e o HMS Puncher (ambos da classe “Ruler”), foram operados por tripulações ca-
Luftwaffe, os britânicos escolta da Royal Navy operavam com nadenses, mas embarcando esquadrões britânicos e permanecendo sob controle
desenvolveram o conceito dos pessoal de máquinas e de arrumação e tai- da Royal Navy (mantendo por isso a designação britânica HMS, em vez de empregar
Catapult Aircraft Merchantmen fa da Marinha mercante, mobilizado. a designação canadense HMCS).
(CAM), nos quais uma catapulta De 1941 até 1944, foram convertidos O quadro da U. S. Navy é bem mais complexo. Ainda em 1941, foi incorpora-
montada na proa lançava um em CVE pelos britânicos os seguintes na- do o protótipo USS Long Island (designado como AVG-1, ACV-1 e, finalmente, CVE-
caça Hurricane. Não tendo como vios: um da classe “Audacity” (desloca- 1), da mesma classe do HMS Archer britânico (cuja designação original era BAVG-
pousar a bordo, os pilotos tinham mento a plena carga de 12.000t); um da 1), mas com 13.716t de deslocamento a plena carga. De um total de 124 CVE, per-
três opções: pouso forçado no classe“Activity”(14.480t); três da classe“Nai- tencentes a seis (ou sete) classes diferentes, cuja construção foi concluída nos EUA
mar, salto de paraquedas, ou rana”, com características ligeiramente di- durante a guerra, 115 unidades entraram em serviço até agosto de 1945 e sete após
pouso em terra, quando a ferentes (sendo que o Nairana deslocava o fim do conflito; duas unidades foram diretamente para a reserva, e outros 16 na-
autonomia remanescente o 14.280t a plena carga, o Vindex 13.671t e vios tiveram sua construção interrompida ou cancelada.
permitisse (Fotos: IWM). o Campania 15.970t); e um da classe“Pre- A Marinha dos EUA manteve em serviço 86 dos CVE construídos naquele país,
toria Castle”(23.450t), empregado apenas transferindo, como já dito, outros 38 à Royal Navy. Inicialmente, além do protóti-
no treinamento de pilotos. Dos EUA, como mencionamos, foram recebidos mais po Long Island (cujo correspondente britânico foi o Archer), foram construídas qua-
38 navios: um da classe “Archer” (13.070t); três da classe “Avenger” (14.700t); 11 da tro unidades da classe “Avenger”, três das quais foram transferidas ao Reino Uni-
classe“Attacker”(14.400t); e 23 da classe“Ruler”(14.000t). Durante a guerra, a Royal do e uma mantida nos EUA. Os primeiros navios destinados à RN fizeram parte de

Ao afundo A decantada fragilidade dos CVE nem sempre foi confirmada: o


HMS Nabob (D77), da classe “Ruler”, foi atacado pelo U-354 em 22 de agosto
de 1944, recebendo um torpedo na popa, a boreste, mas retornou à base de
Scapa Flow por seus próprios meios. A vistoria concluiu que não era
interessante repará-lo e retorná-lo ao serviço, mas posteriormente o navio foi
devolvido à U. S. Navy. Eventualmente, foi reconvertido para navio mercante,
operando até ser vendido para uma empresa de Taiwan como sucata, em
1977 (Foto: IWM).

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Acima O bombardeiro de um lote original de seis unidades (designadas BAVG- Acima Inicialmente, a U. S. tas ao longo de sua vida útil (resultando em da-
mergulho Douglas 1 a BAVG-6), encomendado a estaleiros americanos Navy considerou o Corsair dos díspares, conforme a fonte consultada). Por
Dauntless era antes da entrada dos EUA na guerra (o Lend Lea- inadequado para operar tais razões, os dados numéricos citados devem
relativamente pequeno, e se Act foi assinado em 11 de março de 1941). Ori- nos CVE. Por isso, a Royal ser considerados aproximações.
por isso sua operação em ginalmente designado como BAVG-4, o USS Char- Navy o colocou em serviço O sistema de propulsão utilizado nesses na-
conveses de voo limitados ger (CVE-30) permaneceu nos EUA e foi operado a bordo de seus navios- vios também sofreu modificações, de uma
não oferecia dificuldades pela USN no treinamento de pilotos britânicos e aeródromo de escolta classe para a seguinte. Havia um só eixo pro-
insuperáveis (Foto: USN). americanos. antes dos americanos pulsor, sendo porém empregada propulsão die-
(Foto: USN).
O sexto navio da encomenda britânica origi- sel nas classes “Long Island”/“Archer” (um mo-
nal, o HMS Tracker (que recebeu a designação BAVG-6), serviu como protótipo das tor) e“Avenger”/“Charger”(quatro motores), en-
classes“Attacker”e“Ruler”britânicas, assim como da classe“Bogue”,americana. In- quanto que as classes“Attacker”/“Bogue”e“Ruler”/“Prince William”eram equipa-
cluindo o Tracker, a classe “Attacker” incluía um total de 11 navios; dez unidades das com duas caldeiras e uma turbina a vapor. Com ambos os tipos de propulsão,
semelhantes, operadas pela U. S. Navy, constituíam a classe “Bogue”. De um lote a potência instalada era da ordem de 8.500shp, sendo a velocidade máxima de
adicional de 24 unidades de projeto semelhante, 23 foram transferidas à Royal Navy 16,5 nós nos navios com propulsão diesel e de 18 nós nos navios a vapor. Aos na-
e constituíam a classe “Ruler”.Um navio, o Prince William (CVE-31), foi incorporado vios — com capacidade de armazenamento para cerca de 3.200t de óleo com-
à U. S. Navy, tornando-se a única unidade de sua classe. bustível — era creditada uma autonomia de 10.000 milhas náuticas a 14 nós, em-
Todos esses navios (num total de 51) foram convertidos ou adaptados a par- pregando propulsão diesel, e de 8.000 milhas náuticas a 15 nós, com propulsão
tir de cascos de cargueiros do tipo C3, na classificação da U.S. Maritime Commis- a vapor.
sion (MARCOM). Os protótipos, USS Long Island e HMS Archer, foram convertidos Nas unidades do primeiro grupo, a tripulação do navio (excetuando o pessoal
a partir de cascos C3 originais, enquanto que
os navios da classe“Avenger”(incluindo o USS
Charger) eram conversões do subtipo C3-P&C.
As unidades das classes“Attacker”,“Bogue”e
“Ruler” (inclusive o USS Prince William) utili-
zavam cascos C3-S-A1 ou C3-S-A2.
Seus cascos tinham praticamente as
mesmas dimensões, podendo diferir devi-
do a projeções horizontais acima da linha
d’água. Mediam aproximadamente 150m
de comprimento total, com cerca de 21m de
boca (na linha d’água) e calado (a plena car-
ga) de 7-8m. Assim como o calado, o des-
locamento variava de uma classe para a se-
guinte, sendo de 13.716t (a plena carga) no
USS Long Island (protótipo original da USN)
e de 15.640t no HMS Puncher (penúltima uni-
dade da classe “Ruler” britânica). Além dis-
so, o verdadeiro deslocamento variava tam-
bém de um navio para outro, dependendo
das condições de carga e das alterações fei-

Ao lado Pequeno, rústico e leve, o


Wildcat foi a primeira e lógica escolha para
equipar os navios-aeródromo de escolta
americanos com uma aeronave de caça
(Foto: USN).

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do grupo aéreo) era constituída por 555 oficiais e praças, enquanto que nas do se- media 58m comprimento por 14m de largura, Acima As fotos ilustram a
gundo, a previsão era de 656 (igualmente sem incluir o grupo aéreo). Em serviço sendo servido por um elevador de 13m x 10m, capacidade da indústria
na USN, o Long Island e o Charger eram armados com dois canhões de 3 polega- situado a ré do hangar. Nos convertidos a par- americana de produzir CVE
das a vante e um de 5 polegadas a ré, para uso contra U-boats navegando na su- tir de cascos C3-S-A1 ou C3-S-A2, o hangar tinha em série. Nas instalações
perfície, além de canhões automáticos antiaéreos de 40mm e 20mm em núme- 79m x 19m x 5,5m, dispondo de dois elevado- da Kaiser Shipyard, em
ro variáve, (ampliado ao longo do conflito), nos bordos. Já os da classe“Bogue”,as- res de 13m x10 m. A curvatura da coberta do Vancouver (Washington),
sim como o Prince William, tinham dois canhões de 5 polegadas a ré e diversos ca- hangar (originalmente o convés principal dos vários CVE são vistos na
nhões antiaéreos de 40mm e 20mm, em número variável, nos bordos. Todos os navios) dificultava a manobra de aeronaves, tor- carreira (acima) e já
CVE transferidos ao Reino Unido durante a guerra eram convertidos a partir de cas- nando necessário utilizar cabos e roldanas flutuando, recebendo
cos do tipo C3, como vimos acima. para deslocá-las a bordo. Nas classes de CVE acabamento (abaixo)
Com exceção do Long Island, do Archer e do Avenger, os NAe de escolta do tipo construídas posteriormente, inexistia este pro- (Fotos: USN).
C3 eram dotados de uma pequena“ilha”. Possuíam convés de voo (convoo) de di- blema.
mensões limitadas, revestido em madeira. Ao serem entregues pelo estaleiro, os Três outras classes de NAe de escolta serviram apenas à U. S. Navy durante o
navios com propulsão diesel dispunham de um convoo de apenas 120m de com- conflito:“Sangamon”,“Casablanca”e“Commencement Bay”.Os quatro CVE da clas-
primento, enquanto que os dotados de propulsão a vapor tinham um convoo maior, se “Sangamon” foram convertidos a partir de navios-tanque da U. S. Navy per-
medindo 137m x 37m. O aparelho de parada (para aeronaves de até 9.000 kg pou- tencentes à classe “Cimarron” (tipo T3, na classificação MARCOM). Com 169m de
sando a 55 nós) dispunha de nove cabos de arrasto e três barreiras. Na proa, a bom- comprimento total, 23m de boca na linha d’água (35m de boca máxima) e 9,8m
bordo, havia uma catapulta hidráulica H4, capaz de lançar uma aeronave de até de calado, deslocavam 24.555t a plena carga, sendo maiores que as outras clas-
7.257 kg a 74 nós. O uso de foguetes auxiliares de decolagem do tipo RATOG ses de navios deste tipo — exceto a “Commencement Bay”, que utilizava o mes-
(Rocket-Assisted Take-Off Gear) a bordo de CVE era pouco comum, sendo mais em- mo modelo de casco. Tinham capacidade para 25-32 aeronaves (as demais clas-
pregado a bordo dos MAC Ships, ses operavam com 15-24 aeronaves), tendo sido os únicos NAe de escolta ope-
que não dispunham de catapultas. racionais a embarcar regularmente bombardeiros de mergulho (os demais ope-
Abaixo O USS Santee (CVA-29), da Nos navios que tinham casco ravam com torpedeiros e caças). Empregavam propulsão de dois eixos, com duas
classe “Sangamon”, foi um dos quatro dos subtipos C3 e C3-P&C (em cuja caldeiras e duas turbinas a vapor. As máquinas desenvolviam 13.500shp de po-
CVE operados com a IV Esquadra, conversão a superestrutura foi apenas tência, o que lhes conferia velocidade máxima de 18 nós. Esta classe tinha auto-
sediada em Recife-PE (Foto: USN). parcialmente removida), o hangar nomia de 23.920 milhas náuticas a 15 nós, com 4.780t de óleo combustível. Sem

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Acima Caças FM-2 Wildcat o grupo aéreo, a tripulação dos navios era de 830 para até 28 aeronaves. Por razões ligadas à capacidade de produção industrial, eram
são vistos envolvidos em oficiais e praças. O armamento defensivo incluía equipados com máquinas a vapor Skinner Unaflow, com quatro caldeiras, dois mo-
acidentes a bordo de dois canhões de 5 polegadas a ré, além de gran- tores alternativos de combustão externa com cinco cilindros (do tipo usado em
navios-aeródromo de de número de canhões de 40 e 20 mm, em po- locomotivas) e dois eixos propulsores, desenvolvendo uma potência de 9.000shp
escolta americanos (Foto: sições nos bordos. e velocidades de até 20 nós. A autonomia era de 10.240 milhas náuticas a 15 nós,
USN). A classe“Commencement Bay”,que também e a tripulação (sem o pessoal das aeronaves) era de 860 oficiais e praças. Eram me-
utilizava casco do tipo T3 (porém adaptado ain- nos armadas que as anteriores, com apenas um canhão de 5 polegadas na popa
da no projeto), tinha as mesmas dimensões da anterior, com deslocamento car- quadrada com cadaste, sendo que o número de posições de 40mm e 20mm nos
regado de 24.500t e capacidade para até 35 aeronaves.Tripulada por 860 oficiais bordos era menor.
e praças, tinha armamento semelhante ao da classe anterior.Também emprega-
va propulsão semelhante, com dois eixos, duas caldeiras e duas turbinas a vapor, Versatilidade e adaptabilidade
desenvolvendo 16.000shp de potência e atingindo uma velocidade máxima de O atraso na entrada em serviço dos NAe de escolta britânicos na proteção de
19 nós. De um total de 35 previstas, 19 unidades desta última classe foram con- comboios no Atlântico Norte foi causado pela necessidade de modificar os navios
cluídas, das quais dez incorporadas até o final da guerra no Pacífico. Sete só en- de construção americana, para adequá-los aos requisitos de segurança da Royal
traram em serviço após o fim da guerra, e duas foram diretamente para a reser- Navy. Este trabalho, realizado em diversos estaleiros, no Canadá e no Reino Uni-
va, sendo 16 outras canceladas (quatro antes do lançamento e 12 antes do início do, podia levar semanas ou meses, dependendo dos métodos industriais utiliza-
da construção). dos. O estaleiro Burrard Dry Dock, em North Vancouver (Colúmbia Britânica, no Ca-
No entanto, a classe mais numerosa de CVE, cuja construção em série suce- nadá), organizou uma“linha de pro-
deu a dos navios convertidos a partir de cascos do tipo C3 (que compunham di- dução” bastante eficiente, para mo-
ferentes classes e subclasses), foi a “Casablanca”.Integrada por 50 unidades, todas dificação dos navios em menor tem- Abaixo A foto, de 1956, mostra o USS
entregues e incorporadas entre novembro de 1942 e julho de 1945, esta classe foi po, o que lhe permitiu concluir um Thetis Bay, já então designado CVHA-
proposta pelo empresário Henry J. Kaiser e inteiramente construída pelo estalei- número recorde de 19 NAe de escolta. 1. Especialmente interessante é o fato
ro de sua empresa à margem do Rio Columbia, em Vancouver (Washington). O pro- Os navios eram movidos de um cais de que ela permite ver o arranjo da
jeto desta classe utilizava um casco padrão do tipo S4-S2-BB3, com 156m de com- para outro, à medida que as várias fa- chaminé, para minimizar o efeito da
primento total, 20m de boca na linha d’água (33m de boca máxima) e calado má- ses iam sendo completadas. fumaça e dos gases quentes sobre as
ximo de 6,9m. Os navios deslocavam 10.902t a plena carga e tinham capacidade Em todos os navios recebidos, operações aéreas (Foto: USN).

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Ao lado Na reserva: nada menos que


17 CVE são vistos em 1953,
armazenados no South Boston Naval
Annex. Em primeiro plano, o CV-32
Leyte, permitindo uma comparação dos
tamanhos (Foto: USN).

dos. Os equipamentos de aviação eram


também verificados, e o convoo es-
tendido, pelo alongamento da extre-
midade curva (round-down) a ré. Eram
também instalados radares e outros
equipamentos eletrônicos, além de ar-
mamento britânico — substituindo ou
complementando o de procedência
americana. Para serviço na RN, os navios
eram armados com canhões de 4 po-
legadas, em lugar dos norte-americanos
de 3 e 5 polegadas. O HMS Archer e as
unidades da classe “Avenger” tinham
três desses canhões (dois a vante e um
a ré), enquanto que os navios das clas-
ses “Attacker” e “Ruler” dispunham de
dois a ré. O armamento antiaéreo era
constituído por número variável (que foi
aumentando ao longo da guerra) de ca-
eram verificados os diversos compartimentos, e reparados ou substituídos inú- nhões automáticos de 40mm e de 20mm, em ambos os bordos.
meros componentes — o que incluía Especial atenção era dada aos sistemas de armazenamento e distribuição de
Abaixo Tanto durante a Segunda válvulas de fundo, tubulações e ou- combustível de aviação —– atenção particularmente reforçada depois que o HMS
Guerra como posteriormente (como tras válvulas em geral, máquinas e Dasher (da classe “Avenger”) foi perdido, no início de 1943, devido a um incêndio
visto nas imagens), o uso de CVE instalações de vapor, sistemas de a bordo, causado por um vazamento de gasolina, durante o reabastecimento de
para transportar aeronaves para propulsão, geração e distribuição uma aeronave. Após o torpedeamento do HMS Avenger, no final de 1942, incên-
diferentes teatros de operações foi de energia, proteção dos paióis de dios provocados por vapores de combustível também contribuíram para a per-
algo comum: no pós-guerra, são munição, equipamentos de contro- da do navio. Os tanques de combustível de aviação de tipo americano, retangu-
vistos o USS Cape Esperance (com le de avarias, anteparas estanques, lares, foram substituídos por tanques cilíndricos, rodeados de água, segundo a prá-
F-84, F-86, L-20, F-80, T-6 e Hellcat etc. Eram instalados tanques cilín- tica adotada a bordo dos NAe de esquadra britânicos. Para aumentar a estabili-
no convoo) e o USS Core dricos de gasolina de aviação (AvGas, dade, foi acrescentado lastro permanente. A proteção passiva contra torpedos e
(transportando Skyraider para a gasolina de alta octanagem), ro- minas também foi reforçada, inclusive pelo armazenamento de tambores de óleo
então Saigon) (Fotos: USN). deados por compartimentos alaga- vazios em compartimentos estanques abaixo da linha d’agua, a fim de aumentar

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Ao lado Mesmo com aeronaves


pequenas como o Seafire, a operação
nos convoos dos CVE (no caso, o HMS
Stalker) não deixava margens a erros
(Foto: Royal Navy).

a flutuabilidade do casco, em caso de tor-


pedeamento ou colisão com minas.
A confiança da U. S. Navy nos equi-
pamentos de segurança instalados a bor-
do de seus NAe de escolta era aparente-
mente maior do que a depositada pela
Royal Navy. Os navios da USN normal-
mente entravam em serviço sem grandes
modificações.Ainda assim, todos os navios
(britânicos e americanos) do tipo C3, que
eram dotados de propulsão a vapor (clas-
ses“Bogue”/“Attacker”e“Ruler”/“Prince Wil-
liam”), tiveram de sofrer modificações
em suas turbinas, devido a defeitos crô-
nicos na fabricação, verificados após o iní-
cio das entregas pelos fabricantes.Isso,sem
dúvida, aumentou o tempo necessário aos
trabalhos de acabamento dos navios, re-
tardando sua entrada em operação. Em-
bora alguns tenham sido empregados em
serviço, pelos britânicos e pelos americanos, entre 1941 e 1942 (inclusive em apoio rar no compêndio de Arte Naval adotado na formação dos oficiais) nunca foi usa-
à invasão da África do Norte, em novembro de 1942), a ofensiva dos CVE aliados da na prática, já que a MB não tinha esse tipo de navio.
na Batalha do Atlântico só teve início na primavera de 1943. O foco da Batalha do Atlântico (que, na realidade, era uma campanha) foi a
A insuficiente capacidade de produção britânica impediu que fosse conver- guerra antissubmarino, uma vez que a ameaça de superfície alemã havia sido neu-
tido maior número de NAe de escolta, tornando necessário contar com a ajuda tralizada em 1941 (depois disso, os poucos navios de superfície da Kriegsmarine
dos EUA.Todavia, a mobilização da indústria americana, para a produção em mas- a permanecer no Atlântico concentraram-se nas águas e nos fjords da Noruega).
sa de material de emprego das Forças Armadas aliadas, certamente não foi isen- Assim que o número de U-boats em serviço permitiu, os alemães introduziram a
ta de erros e problemas, que precisaram ser corrigidos durante o conflito, no me- Rudeltaktik (tática de alcateia), na qual os submarinos formavam linhas de patru-
nor tempo possível.Tais problemas foram sendo minorados, à medida que o con- lha, nas áreas onde os comboios transoceânicos teriam que passar. Quando um
flito prosseguia e a experiência técnica aumentava. A construção em série dos CVE comboio era detectado, o submarino responsável transmitia (via rádio HF) a in-
das classes“Casablanca”e“Commencement Bay”foi bem mais previsível, resultando formação sobre sua localização para os demais integrantes da alcateia, assim como
em produtos de melhor qualidade.Talvez por isso, tais navios — ao contrário dos para o QG dos U-boats, localizado na França. O método de ataque preferido era
anteriores — tenham sido mantidos em serviço ou na reserva, após a guerra. na superfície, à noite, infiltrando-se na formação dos navios mercantes, até que o

Da defensiva à ofensiva
Durante o conflito, as várias classes de NAe de escolta serviram às Marinhas
britânica e dos EUA no Atlântico (inclusive no Ártico) e no Pacífico, assim como no
Mediterrâneo e no Índico. No Atlântico, os CVE da Royal Navy operavam mais ao
norte, em especial nos “Acessos Ocidentais” às Ilhas Britânicas (região conhecida
como Western Approaches), enquanto que os da U. S. Navy atuavam mais ao sul,
inclusive na área em torno dos Açores. O emprego destes últimos foi de impor-
tância significativa para o Brasil, uma vez que, no
decorrer da guerra, vários operaram em águas
próximas ao Nordeste e alguns visitaram portos Ao lado Apesar de seu
brasileiros. A Força do Atlântico Sul da U. S. tamanho e peso, o avião
Navy (redesignada como IV Esquadra no início torpedeiro TBF/TBM
Avenger operou
de 1943), com sede em Recife-PE, teve sob seu
satisfatoriamente a bordo
comando quatro NAe de escolta.Eram o USS San- dos navios-aeródromo de
tee (CVE-29), da classe“Sangamon”,e três navios escolta; os da foto
da classe“Casablanca”: Mission Bay (CVE-59); Tri- pertencem à Fleet Air Arm
poli (CVE-64); e Solomons (CVE-67). Curiosa- (Foto: Royal Navy, Crown
mente, chegou até a ser cunhada, na Marinha do copyright).
Brasil, a designação NAeE, que (apesar de figu-

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Acima Concluída sua contínuo aperfeiçoamento do radar e do sonar à proteção direta de nenhum comboio espe- Acima Após a guerra, o
construção nos EUA, o HMS (denominado “asdic” pelos britânicos), bem cífico, mas patrulhavam ofensivamente as ro- HMS Biter, da classe
Nabob foi transferido ao como a intensificação da cobertura aérea, tor- tas marítimas e oceânicas, nas áreas que os “Avenger”, foi transferido
Reino Unido em setembro nou esse procedimento potencialmente fatal. comboios aliados teriam que atravessar, na bus- para a Marinha francesa,
de 1943. O Canadá tentou A grande maioria dos U-boats empregados ca por submarinos alemães que pudessem recebendo o nome de
que o navio fosse na Batalha do Atlântico pertencia ao Tipo VII, ameaçar sua passagem. Estas duas modalida- Dixmude; o navio é visto
incorporado a sua com pouco mais de 700 toneladas de deslo- des de emprego deram origem, após a guer- atracando em Bayonne
Marinha, para ganhar camento submerso (capaz de operar no Atlân- ra, às doutrinas de “proteção direta” e “rota pro- (New Jersey), em 1956
experiência antes que tico Norte), e ao Tipo IX, com cerca de 1.000 to- tegida”, empregadas para a guerra antissub- (Foto: USN).
adquirisse seus próprios neladas submersos (com autonomia suficien- marino pelas Marinhas da Organização do Tra-
NAe. No entanto, por te para chegar ao Atlântico Sul). Os alemães che- tado do Atlântico Norte (OTAN) durante o período da Guerra Fria. Embora o Bra-
exigência do Lend-Lease garam inclusive a construir dez submarinos de sil não fizesse parte da OTAN, o primeiro NAe brasileiro (o Minas Gerais), que en-
Act, o navio só poderia ser reabastecimento do Tipo XIV, apelidados de trou em serviço no início de 1961, atuava como núcleo de um “grupo de caça e
incorporado à Royal Navy, “Milchkuh” (vaca leiteira), para apoiar seus U- destruição”.
o que foi feito, mas com boats em patrulha. Todos os submarinos des- Até próximo do final de 1943, o foco da ação dos NAe de escolta britânicos,
tripulação canadense te tipo foram afundados pelos aliados. Próximo no Atlântico Norte, foi a proteção à travessia dos comboios transoceânicos alia-
(Foto: Canadian War ao fim da guerra, os alemães instalaram o dos, na ida e na volta. Somente no início de 1944, quando a situação já não era
Museum). “Schnörkel” (tubo retrátil que permitia operar crítica, e a vitória contra os U-boats tornou-se uma questão de tempo, os britâ-
os motores diesel quando submerso, para re- nicos começaram a enviar seus NAe de escolta em patrulhas ofensivas, inclusi-
carregar as baterias) a bordo de seus U-boats, e ainda desenvolveram vários ti- ve na área dos Açores e nas proximidades de Gibraltar. Desse momento até o
pos de submarino de alta tecnologia — inclusive empregando a controvertida final da guerra, os CVE britânicos continuaram a atuar na proteção dos comboios
turbina Walther, que utilizava peróxido de hidrogênio como combustível. Sem aliados destinados aos portos russos de Murmansk e Archangel (ou regressan-
dúvida, o melhor projeto foi o do U-boat Tipo XXI, introduzido (em pequena quan- do destes portos), assim como em operações contra alvos na Noruega, desta-
tidade) tarde demais para influenciar o conflito, mas que viria a ser o protótipo cando-se os ataques aéreos ao encouraçado alemão Tirpitz, em 1944. Também
dos submarinos de alto desempenho do pós-guerra, até o advento da propul- deram proteção antissubmarino à distância aos desembarques aliados na Nor-
são nuclear. mandia, a fim de reduzir a interferência de U-boats. Foram ainda realizadas ações
Atuando na proteção de comboios aliados, um NAe de escolta podia ocu- diversionárias na Noruega, destinadas a reter na área o maior número possível
par uma de três posições: (1) dentro da formação; (2) fora da formação (a pequena de submarinos e navios de superfície da Kriegsmarine, assim como de unida-
distância); ou (3) à distância segura do comboio. A Posição 1 restringia a mano- des aéreas da Luftwaffe, fazendo-os crer que os desembarques aliados pudes-
bra do navio, bem como sua capacidade de lançar e recuperar aeronaves. A Po- sem ocorrer aí.
sição 2 (a pior de todas) o tornava vulnerável a ataques dos U-boats (no final de Entre 1943 e 1945, os CVE britânicos participaram de operações no Me-
1941, o HMS Audacity foi afundado nesta posição). A melhor opção era a Posi- diterrâneo e no Mar Egeu, assim como no Oceano Índico e no Sudeste Asiá-
ção 3, normalmente empregada pelos “grupos de apoio” nucleados num CVE. tico, além de integrarem a British Pacific Fleet (Esquadra Britânica do Pacífi-
Na U. S. Navy, estes grupos-tarefa antissubmarino eram denominados “grupos co) no final da guerra. A Royal Navy classificava seus NAe de escolta em dois
de caça e destruição” (Hunter-Killer Groups, ou HUK Groups). subtipos principais: Trade Protection CVE (para proteção do comércio marí-
A tática americana dos “grupos de caça e destruição”, operando no Atlânti- timo) e Assault CVE (para apoio a operações anfíbias). Para proteção aos com-
co Central, era mais ofensiva que a tática britânica, que empregava seus NAe de boios, os do primeiro subtipo embarcavam normalmente um esquadrão mis-
escolta (que contavam com sua própria cobertura de navios de escolta de su- to, constituído por aviões-torpedeiros (empregados na guerra antissubma-
perfície) no apoio a diversos comboios, deslocando-se conforme a necessida- rino) e por alguns caças (para proteção contra aviões inimigos de esclareci-
de, caso algum estivesse sob ataque ou fosse detectada uma concentração de mento marítimo ou de ataque). Para apoio aéreo a operações anfíbias, os do
U-boats à sua frente. Os HUK Groups americanos, por sua vez, não estavam ligados segundo subtipo geralmente operavam com dois esquadrões de caças, sen-

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do um deles equipado com interceptadores e o outro com caças-bombardeiros. vios tinham duas), além do aparelho de para- Acima Desse ângulo,
Os navios do primeiro subtipo tinham instalações de radar e de comunicações da. Em contraste, os cinco CVE convertidos em destacam-se os inúmeros
mais simples, além de uma “sala de operações” (equivalente britânico ao Cen- estaleiros britânicos, após o protótipo Audacity, “sponsons” adicionados
tro de Informações de Combate – CIC americano) otimizada para a guerra an- possuíam convoo de aço e hangares fechados nos bordos do USS
tissubmarino e para ações limitadas de superfície. Podiam ser facilmente iden- (ao estilo britânico), com apenas um elevador Windham Bay (CVE-92)
tificados visualmente pelo mastro do HF-DF (High-Frequency Direction Finder), a ré, e vários não dispunham de catapulta no para permitir a instalação
para detecção de emissões de rádio dos U-boats, instalado próximo à proa, a van- convés de voo. Por suas características (han- de armamento antiaéreo
te da pequena“ilha”a boreste. Este equipamento era de importância fundamental, gares fechados, assim como instalações e alo- automático (Foto: USN).
pois a Rudeltaktik, empregada pelos alemães, determinava que o primeiro sub- jamentos adequados à operação em climas
marino a localizar um comboio aliado informasse sua posição e rumo. Já os CVE frios), estes navios foram bastante úteis no Ár-
do segundo subtipo tinham instalações de radar, de comunicações e de guer- tico, onde operaram a maior parte do tempo, na proteção aos comboios para
ra eletrônica mais modernas e completas, além de uma sala de operações mais a Rússia.
semelhante ao CIC americano. Também tinham alojamentos de maior capaci- Estas conversões britânicas eram navios mais longos que seus congêneres
dade, para técnicos e pessoal de estado-maior. Duas variantes destes subtipos americanos (160-180m de comprimento total) e deslocavam entre 14.480t e
básicos (convertidas em pequenas quantidades) eram o Fighter Protection CVE 15.970t a plena carga (com exceção do Pretoria Castle, de treinamento, que des-
(para emprego na rota de Gibraltar, onde a ameaça aérea era significativa) e o locava 23.450t). O Activity tinha capacidade para dez aeronaves e era armado com
General Purpose CVE (para emprego geral, no Oceano Índico e no Golfo de Ben- dois canhões de 4 polegadas (para emprego contra U-boats na superfície) e 10
gala). x 2 canhões automáticos antiaéreos de 20mm. Os da classe Nairana tinham ca-
Os primeiros CVE da U. S. Navy a operar no Atlântico em 1943, pertencen- pacidade para 15 a 20 aeronaves, e eram armados com dois canhões de 4 po-
tes à classe “Bogue”,eram equipados de forma análoga aos britânicos. Nas clas- legadas e 8 x 2 canhões antiaéreos de 20mm, além de 4 x 4 canhões de 2 libras
ses seguintes, o equipamento instalado a bordo foi se sofisticando. No final da do tipo “pom-pom”.
guerra, apenas a baixa velocidade distinguia o desempenho dos navios da clas-
se “Commencement Bay” dos NAe ligeiros (CVL) americanos, das classes “Inde- Aeronaves contra submarinos
pendence” e “Saipan” (convertidos ou adaptados a partir de cascos de cruzadores Com exceção dos da classse “Sangamon” (que, além de caças e torpedeiros,
das classes “Cleveland” e “Baltimore”), os quais eram capazes de desenvolver cer- embarcava também bombardeiros de mergulho), os CVE da U. S. Navy opera-
ca de 30 nós e acompanhar os NAe de esquadra (CV) da classe “Essex”. Ao lon- vam (independente da capacidade máxima de aeronaves do navio) com um Com-
go do conflito, a produção de NAe de pequeno porte (CVE e CVL) para a Mari- posite Squadron (designado pela sigla VC), equipado com cerca de 21 aerona-
nha dos EUA passou por um rápido e notável processo de evolução. Sem dúvi- ves. Uma composição típica era a de 12 caças Grumman F4F Wildcat (frequen-
da, um exemplo para a indústria naval do pós-guerra. temente das versões FM-1 ou FM-2, fabricadas pela General Motors) com nove
Como visto acima, as primeiras conversões americanas do tipo C3 (classes torpedeiros Grumman TBF Avenger (cujas versões fabricadas pela GM eram de-
“Long Island”/“Archer” e “Avenger”/“Charger”), por utilizarem cascos de navios signadas como TBM). Durante a guerra, a Marinha dos EUA teve perto de uma
já lançados, possuíam hangar menor e um só elevador. As classes convertidas centena de esquadrões desse tipo (numerados de VC-1 a VC-99), sendo vários
a seguir, em geral a partir de cascos em construção (classes “Bogue”/“Attacker” desativados e reativados ao longo do conflito.
e “Prince William”/“Ruler”), ou posteriormente adaptadas no projeto (classes “Ca- No Atlântico Norte, um NAe de escolta da Royal Navy atuando na proteção
sablanca” e “Commencement Bay”), tinham hangar maior e dois elevadores. A de comboios operava com um esquadrão misto, integrado por cerca de 20 aero-
classe “Sangamon” (cujo projeto deu origem à “Commencement Bay”) era uma naves. Em 1943, estas costumavam incluir até 12 torpedeiros Fairey Swordfish Mk.II/III
exceção, por se tratar de navios de maior porte. Os hangares eram do tipo aber- e quatro a seis caças, geralmente Supermarine Seafire Mk.IIC ou Hawker Sea Hur-
to, ao estilo americano. Apenas nos navios dos tipo C3, a coberta do hangar ti- ricane Mk.IIC (ambos os tipos não dobravam as asas). Posteriormente, aeronaves
nha a curvatura original do convés principal. de origem americana passaram a predominar, nos vários teatros onde foram em-
Todos os NAe de escolta de construção americana possuíam convoo revestido pregados os CVE britânicos. O HMS Tracker, por exemplo, operou com o Esquadrão
em madeira, sendo equipados com uma catapulta hidráulica na proa (alguns na- 816 (Swordfish e Seafire) de agosto a dezembro de 1943, com o Esquadrão 846

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Acima Embora mais pesado (Avenger e Wildcat) de janeiro a junho de 1944 arma. Em julho de 1943, aeronaves desse es- Acima As dimensões
que o Wildcat, o Grumman e com o Esquadrão 853 (Avenger e Wildcat) quadrão atacaram e afundaram os submarinos mínimas do convés de
F6F Hellcat tinha de setembro a dezembro de 1944.Em sua car- U-160 (no dia 14) e U-509 (no dia 15), empre- voo dos CVE
desempenho muito superior reira operacional, este navio recebeu três gando os novos torpedos “Fido” (apelido dado frequentemente
e operou nos CVE, tanto com Battle Honors (Honras de Batalha): Atlântico pelos pilotos) em ambos os ataques. resultavam em acidentes
a U. S. Navy como com a 1943-1944; Ártico 1944; e Normandia 1944. A U. S. Navy introduziu a tática denominada como o da foto, em que
Royal Navy (Foto: Grumman As aeronaves embarcadas em NAe de es- “Avenger-Wilcat team”,para emprego de suas pelo menos três Avenger
Aircraft). colta incluíam aviões torpedeiros para em- aeronaves embarcadas nos NAe de escolta, em foram danificados a
prego antissubmarino, além de caças para patrulha antissubmarino no Atlântico. As mis- bordo do USS Bogue,
defesa aérea e para apoio aos torpedeiros durante os ataques. Os torpedeiros sões de patrulha eram realizadas por ele- CVE-9 (Foto: USN).
eram geralmente armados com bombas de profundidade de vários pesos, em mentos constituídos por duas aeronaves: um
cabides externos (no Swordfish) ou no compartimento interno de bombas (no torpedeiro TBF/TBM Avenger e um caça F4F/FM Wildcat. Quando fosse avista-
Avenger), além de foguetes não-guiados sob do um submarino navegando na superfície, o Wildcat realizaria passes de me-
as asas. Raramente eram empregados tor- tralhamento, a fim de forçar o U-boat a submergir — o que o impediria de usar
Abaixo A ideia de obter um pedos de corrida reta (contra navios de su- seu armamento antiaéreo. O Avenger então realizava o seu ataque, procuran-
NAe a partir da conversão de perfície), e os CVE de procedência america- do lançar suas bombas de profundidade (ou seu torpedo “Fido”) no local onde
um casco de tipo mercante na levavam apenas seis armas desse tipo, em o inimigo tinha acabado de mergulhar. À medida que a guerra progredia, os sen-
não era nova, tanto que um suportes suspensos das anteparas, em am- sores instalados a bordo das aeronaves foram sendo aperfeiçoados. Variantes
dos primeiros NAe britânicos bos os bordos do hangar, a vante do eleva- do Avenger foram equipadas com radares centimétricos, em casulos no bordo
(o HMS Argus, incorporado
dor de ré. Em 1943, foi introduzido um novo de ataque da asa de direita, assim como holofotes e sonobóias no compartimento
em setembro de 1918, e visto
nesta foto de 1942) foi obtido tipo de torpedo acústíco antissubmarino de bombas. A versão Mk. II do avião torpedeiro britânico Fairey Swordfish era ar-
a partir do casco do navio com propulsão elétrica, que era designado mada com oito trilhos para lançamento de foguetes sob as asas, sendo a variante
italiano de passageiros Conte pelo codinome “Mk. 24 Mine” para esconder Mk.III equipada, além dos foguetes, com radar centimétrico num bulbo ventral.
Rosso. Vale a pena ressaltar seu verdadeiro propósito. O Esquadrão VC- Apesar das limitações impostas pelas dimensões do convoo e pela baixa ve-
que esse navio não era um 29, embarcado no USS Santee (CVE-29), foi a locidade, os NAe de escolta aliados eram capazes de operar com a maioria dos ti-
CVE (Foto: Royal Navy). primeira unidade aérea equipada com a nova pos de aeronaves que embarcavam nos NAe de esquadra. O Swordfish teve am-
plo emprego a bordo de CVE britânicos, mesmo após
a chegada do Avenger. Apesar de seu peso, o Avenger
era uma excelente plataforma antissubmarino, como
comprovou seu amplo uso a bordo de CVE america-
nos e britânicos. Foram também empregados, em ca-
ráter limitado,o bombardeiro de mergulho e torpedeiro
Fairey Barracuda (nos ataques ao Tirpitz em 1944) e o
caça-bombardeiro Fairey Firefly, ambos britânicos.
A operação do Vought Corsair nos CVE enfren-
tou alguns obstáculos, mas caças como o britânico
Supermarine Seafire Mk.II/III (a versão Mk.III tinha asas
dobráveis) e os americanos F4F Wildcat e F6F Hell-
cat (ambos da Grumman) não tiveram dificuldade
em operar a bordo de CVE. Já o bombardeiro de mer-
gulho Curtiss SB2C Helldiver, que veio a substituir em
serviço o Douglas SBD Dauntless, operou princi-
palmente dos NAe de esquadra da USN, não sendo
empregado operacionalmente pelos britânicos. n

NOTA: A 2ª PARTE SERÁ PUBLICADA NA


PRÓXIMA EDIÇÃO.

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