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Comente sobre as reflexões Historiográficas árabe e Europeia em relação a quem


pertence Al-Andalus.

A necessidade de compreensão do fenômeno histórico Al-Andalus se deu por meio de um


resgate produzido pelo movimento orientalista, que ansiava reviver o passado andalusino como
parte de uma memória coletiva exótica, que conectava o passado europeu com o Oriente fantasioso
da Ciência da Ilustração.

A perspectiva europeia que se elaboraria para compreender Al-Andalus seria marcada


fortemente pela contribuição de duas correntes: a francesa e a espanhola. Primeiramente, com a
perspectiva francesa se iniciariam os estudos orientalistas sobre Al-Andalus, tendo como expoentes
poetas orientalistas como Voltaire e Antoine Galland, os quais, com outros romanticistas centro-
europeus, viajaram para a Espanha para elaborar o chamado Orientalismo Doméstico.

No séc. XX, os pensadores franceses atuantes na historiografia abarcariam em suas análises


a preocupação das relações tribais existentes em Al-Andalus, uma vez que estas dialogariam com o
desenvolvimento de seu protetorado no Marrocos, herdeiro cultural do legado andalusino por ter
recebido a diáspora de seus habitantes (judeus, muçulmanos e mouriscos), sobretudo após a
expulsão de 1609.

Já a perspectiva espanhola é, de longe, a mais ampla na produção de reflexões sobre o


passado andalusino. Segundo o historiador Alejandro García SanJuan, atualmente, a historiografia
espanhola é dividida em três correntes: a tradicional/espanholista/nacional- -católica, que opõe o
elemento muçulmano à história oficial espanhola, atualmente marcada pelo movimento
negacionista do legado de Al-Andalus.

A perspectiva reformista/neutra, que instrumentaliza o processo de reconquista apenas como


um fenômeno medieval, buscando compreender as contendas entre cristãos e muçulmanos como um
fenômeno contextual; e a perspectiva crítica, que rechaça a ideia do conceito de reconquista por
considerá-lo tóxico e tendencioso, buscando compreender a influência árabe islâmica como parte da
história espanhola, sem pensar em uma oposição, seja histórica (medieval) ou conceitual.
As correntes neutra e crítica da historiografia espanhola dialogam entre si, compreendendo
que o elemento árabe e/ou muçulmano fazem parte da história espanhola; outrossim a neutra
considera que a compreensão de uma distinção entre uma identidade cristã e outra muçulmana são
fenômenos medievais, que não devem ser instrumentalizados fora deste contexto.

E a crítica entende que considerar a reconquista como marco de ruptura de um antes e


depois da história espanhola é um recurso tóxico e enviesado, mesmo que empregado sem
anacronismos, uma vez que o próprio termo seria um neologismo criado no séc. XIX para deslocar
Al-Andalus do resto de uma oficial história espanhola, esta autêntica quando sob uma pretensa
identidade cristã.

De toda maneira, a historiografia espanhola se fundamenta na discussão maiormente do


início e do final de Al-Andalus, uma vez que a problemática mais aguda ocorre quanto ao
pertencimento ou não de Al-Andalus à história espanhola.

Ainda que o primeiro resgate nostálgico de Al-Andalus seja perpetrado pelo movimento
Orientalista e abarcado em seu caráter nostálgico pelos árabes na sua primeira fase, é na segunda
fase que se tem uma formação de historiadores árabes, sendo fundamental a atuação do pensador
Taha Hussein. Este havia se formado em estudos na Europa e voltado ao Egito a fim de modernizar
sua nação formando também novos pensadores seguindo o modelo europeu, primeiramente francês.
Posteriormente, Hussein decidiu investir no estudo da Espanha.

Com o sucesso da produção historiográfica arabista-hispanista, mais pesquisadores árabes


foram estudar na Espanha, sendo o estudioso mais destacado sobre Al-Andalus o egípcio Mahmud
Ali Makki (1929-2013), o qual em parceria com seu orientador espanhol, Emílio García Gómez
(1905-1995), criou a conexão, outrora inexistente, entre as produções historiográficas árabe e
espanhola sobre Al-Andalus.

O processo de reflexão e problematização de Al-Andalus seja um fenômeno recente, para a


tradição árabe, as obras medievais árabes também contam como parte dá pro historiográfica sobre
Al-Andalus, pois estas. Ainda que pudessem contar com elementos fantásticos já possuíam uma
reflexão e percepção históricas concernentes a uma abordagem historiográfica.
O historiador marroquino M’hammad Benaboud considera que os estudos árabes Al-
Andalus são divididos em dois grandes grupos: aqueles produzidos por andalusinos (medievais) e
aqueles produzidos por não andalusinos, estes magrebinos e levantinos.

Ainda assim o processo de seu resgate e reflexão histórico foi marcado por políticas
posteriores, o que muitas vezes levou a compreensões completamente díspares entre si sobre a
importância e a valorização de Al-Andalus como parte da história Ibérica e árabe.

O movimento responsável pelo resgate da história de Al-Andalus e de seu lugar na história


Europeia e árabe é o Orientalismo. A história de Al-Andalus é alvo de disputas ideológicas tanto
pela historiografia Europeia, sobretudo a espanhola, como pela historiografia árabe.

A historiografia Europeia busca validar sua visão Orientalista por meio do resgate do
passado andalusino, o oriente doméstico, em que as ilusões e os anseios da sociedade oitocentista
vinham expressos, relatos e arquiteturas andalusinos.

Al-Andalus pertence igualmente à história espanhola e à história árabe, porém sem que ela
se adapte para comportar os anseios de cada sociedade contemporânea. Al-Andalus não existe como
um ente sempiterno, não é tangível, nem idílica e nem caótica; ela é uma realidade histórica que
precisa ser reconstruída e discutida por meio de sua própria história, sem a necessidade de se
assemelhar a nenhuma realidade que está além dela.

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