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ClnTin PnLOnSHV
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EDITORA
PUC•MINAS
Colaboração:
ffiárm Lúc1o U1e1ra da Sllua
uma resposta para elas.
A
bibliografia já existente
sobre histeria poderia Porém, a maneira como
nos isentar do esforço de o sujeito histérico vai
apresentar mais um texto, procurar as respostas é
uma vez que não se trata nem de bastante particular: se de um
uma análise exaustiva de toda a lado ele procura saber, de outro
bibliografia conhecida, nem de ele realmente não quer chegar a
uma obra que apresente grandes saber. E o que a histérica está
novidades teóricas. No entanto, procurando é alguma definição
a importância do quadro, a da feminilidade que vá além do
enorme dimensão de suas falo. Grande parte, senão toda a
conseqüências e a freqüência problemática histérica, vai girar
com que aparece em nossos em tomo da impossibilidade de
consultórios, justificam este uma resposta que não o falo e a
trabalho. Nosso propósito transformação dessa i111possibili
estará cumprido se a maneira dade estrutural numa
particular com que organizamos insatisfação.
o material permitir entender Deparar-se com a castração
melhor uma certa lógica da própria e a do Outro, com os
estrutura que apresentamos. limites da possibilidade
Já na apresentação da simbólica através da inclusão do
estrutura histérica como tal, real, é o caminho difícil e
organizamos o material em angustiante que o sujeito
função da questão do saber, histérico tem para percorrer
quase como um jogo de numa análise, se o analista que
perguntas e respostas, partindo está conduzindo a cura sabe do
do que consideramos os pontos que se trata. Não sendo assim,
de estrutura que permitem, resta a possibilidade de
facilitam e até talvez justifiquem continuar na insatisfação e na
o surgimento da problemática reivindicação, e que a psicanáli
histérica. Essas perguntas, ao se e o psicanalista passem a
lado da posição do sujeito engrossar a lista dos impotentes
diante da castração do Outro, que nada conseguiram fazer com
orientarão, na clínica, a o seu sofrimento.
identificação da estrutura
histérica. São perguntas que
dizem respeito a: O que desejar?
A quem desejar? O que é ser
mulher? O que os homens Cíntia Palonsky - psicanalista
desejam nas mulheres? O que as argentina que, junto ao seu
mulheres desejam nos homens? trabalho em Buenos Aires, vem
Muito mais do que uma simples desenvolvendo atividades em
curiosidade, estas perguntas Belo Horizonte, coordenando
básicas vão funcionar como seminários de estruturas
eixo e guia da vida da histérica, clínicas, oficinas de clínica
que vai se dedicar a tentar achar psicanalítica e outros cursos.
T@íbhoteta jf reullíana
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS
Grão-Chanceler
Dom Serafim Fernandes de Araújo
Reitor
Prof. Pe. Geraldo Magela Teixeira
Pr ó-reitor de Extensão
Prof. Bonifácio José Teixeira
Pró-reitor de Graduação
Prof. Djalma Francisco Carvalho
�
EDITORA
PUC•MINAS
EDITORA DA PUC•MINAS
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Pró-reitoria de Extensão
Av. Dom José Gaspar, 500 • Coração Eucarístico
Caixa Postal: 1.686 • Te!.: (03 1 ) 3 1 9. 1 220 • Fax: (031) 319.1129
30535-6 1 0 • Belo Horizonte • Minas Gerais • Brasil
CÍnTin m. PnLOnSHV
ESTRUTURnS CLinlcns /
nn CL1n1cn=
n HISTERin
T@íbhoteta jf reullíana
Belo Hor1zonte
1991
Copyright © 1 997 by Cintia M. Palonsky
Este livro, ou parte dele, não pode ser reproduzido por qualquer
meio sem autorização escrita do Editor.
Coordenação editorial
Cláudia Teles de M. Teixeira
Projeto gráfico
Assessoria de Publicidade PROEX
Revisão
Virgínia Mata Machado
FICHA CATALOGRÁFICA
Preparada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais
P l8 l e Palonsky, Cintia M.
Estruturas clínicas na clínica: a histeria!
Cintia M. Palonsky; com a colaboração de
Mário Lúcio Vieira da Silva. - Belo Hori
zonte: PUC•Minas, 1997.
86p.
ISBN 85-86480-01-0
CDU 159.964.2
ngradectmentos
Aos participantes dos seminários, que me estimulam a
entender o suficiente para poder transmiti-lo.
Aos meus pacientes, que me confiam o
mais prezado que eles têm.
A Mário Lúcio Vieira da Silva, pela vontade e paciência.
A Oscar Vieira da Silva, pela revisão inicial.
A todas e cada uma das pessoas da PUC•Minas que
colaboraram com entusiasmo na realização deste livro.
,
sumnnm
Apresentação ................................................................... 11
A noção de estrutura . .
...................... . ............. . ....... ....... . . . 15
Estruturas clínicas . .
... ........ ..... . ................... ..... ...... . .......... 20
Constituição do sujeito ............................................. ...... . 22
A estrutura neurótica . .......... ............ .. ........... . ........ ...... .... 25
A estrutura histérica . . .
........... . ......... .. ... ........ ........... ......... 28
Condições de estrutura .
.... .. ......................... . ................... 33
o Ausência de um objeto sexual fixo,
previamente determinado .... ....... .............. .................. 34
o Estrutura do desejo como desejo
que está sempre mediatizado pelo
desejo do Outro . .
.. ........... ........................................... 36
o Ausência de complementaridade
entre os sexos ... ............. ............. ... ........... ............ ...... 39
o Particularidades do Édipo na mulher .
.................. ...... 42
Saber e não saber ... ... .................... ....... .......... ... ... ...... ...... 46
Causa e objeto de desejo . . .
..... ......... ............. ............ ...... . 50
A procura de respostas ........ ............ .............. ................. . 53
nPRESEnTncno
O
texto que estamos apresentando não começou
como tal. Os seminários de estruturas clínicas
vêm .sendo desenvolvidos em Belo Horizonte
desde 1991, e aqui estamos tentando uma transcrição, tal
vez não muito feliz. A passagem da palavra falada para a
escrita não é fácil, e o clima do seminário, com a interven
ção dos participantes, os exemplos e vinhetas clínicas, é
n nocno DE ESTRUTURn
Q
uando falamos em estrutura, estamos fazendo re
ferência a um conj unto de elementos que man
têm uma certa relação entre si, sendo que essa
r ç , sua articulação e sua posição relativa são mais
i mportantes do que os elementos em si. Esse conceito de
estrutura vale para qualquer tipo de estrutura, não sendo
exclusivo da psicanálise. Uma maneira simples de repre
sentar uma estrutura seria:
a c 15
b d
2 3
4 d
2x
+
J9 �x2 +6x+9
�
---=== -- = ------
x -3 x2 -4x+3
19
;
ESTRUTunns cumcns
O
que o conceito de estrutura clínica como tal está
definindo é uma posição do sujeito, basicamen
te em relação à castração do Outro e à própria
castração. Portanto, quando falamos em uma estrutura clí
nica, não estamos nos referindo a um certo tipo de sinto
mas, mas a uma posição do sujeito. É bem verdade que
podemos falar de sintomas hi stéricos ou obsessivos, mas é
importante assinalar que não é possível caracterizar uma
estrutura a partir dos sintomas, os quais podem aparecer
em qualquer estrutura. Fazer um d iagnóstico estrutural é
20
um processo que consiste em determinar a posição do su
jeito frente à castração, não partindo, portanto, dos sinto
mas. Ao lado dessa posição do sujeito diante da castração,
cada estrutura se organiza em torno de uma pergunta fun
damental. A pergunta fundamental da hi steria vai se dar
em relação ao sexo, enquanto na neurose obsessiva vai ser
em relação à vida e à morte. Isso não significa que tais
questões não alcancem todos os seres humanos, mas cada
uma das estruturas neuróticas vai se organizar em função
de uma dessas questões básicas.
Teoricamente, cada sujeito teria uma estrutura clíni
ca definida, possível de ser identificada. Temos, como es
truturas reconhecidas, a neurose, a perversão e a psicose
estruturas Clímcas na Clímca, n Htsterta
COnSTITUICnO DO SUJEITO
F
alamos em constituição do suj eito ou estruturação
do sujeito porque partimos do princípio de que o
sujeito é algo que vai se constituir, não é algo que
já está aí. Antes de ser sujeito, o ser humano é objeto, ob
jeto do des.ejo de u m Outro. O sujeito tem uma série de
determinações que são anteriores ao seu próprio nascimen
to, já que ele chega numa estrutura que o antecede. Ele é
sujeito ainda antes de nascer, no sentido de que j á é falado
por outros, de fazer parte de uma estrutura simbólica, mas
22 é em relação a uma estrutura simbólica que ele vai se cons
tituir realmente como sujeito. Se não fosse em relação a
uma estrutura, não existiria o sujeito como tal.
Quando o ser humano nasce, ele vai ocupar, por es
trutura, o lugar de falo da m ãe; ou seja, em um primeiro
momento, ele vai ser o falo da mãe. Isso quer dizer que,
nesse momento, a mãe vai estar completa com ele, que ele
é tudo o que a mãe deseja. Existe assim a i lusão de uma
completude possível. Dado que essa situação está caracte
rizada pela completude, pela ausência de uma falta qual
quer, a dimensão do desejo está aí abolida, de tal modo
que não existe para o filho a possibilidade de desejar qual
quer coisa. É a aparição d a dimensão do desejo da mãe
�struturas Clímcas na Clímca: n Histeria
n ESTRUTURn nEUROTICn
V
i mos anteriormente que um ponto fundamental
na constituição do sujeito refere-se à castração
do Outro, entendida no sentido de que não exis
te estrutura sem falha. O recalque dessa condição é o que
define a neurose. Como elemento de estrutura, o recalque
relaciona-se, portanto, com a castração do Outro e com a
própria castração e aparece sempre como falta de u m
s ignificante. Porém, dissemos que podemos falar d e cas
tração em dois sentidos: a castração do Outro e a do pró-
prio sujeito. Quando falamos em castração do Outro- con- 25
ceito muito i mportante para a compreensão das demais
estruturas - foi dito que toda estrutura apresenta uma fa-
lha, ou seja, toda estrutura é "castrada", não existe nenhu-
ma estrutura que sej a perfeita. Vale a pena insistir nesse
ponto, porque tal fato não constitui apenas um problema
teórico, mas um problema para o sujeito. Isto significa que
não existe na vida de um ser humano absolutamente nada
garantido; a única coisa certa é a morte, certa no sentido
de que inevitavelmente vai ·acontecer, mas não sabemos
quando, como nem onde.
Quando falamos em falta de garantia e em morte, esta
mos nos referindo não apenas às do sujeito, mas também
Cmba m. Palonsky
21
�
n ESTRUTURn HISTERICn
A
histeria é um quadro de existência muito antiga,
um nome que já vinha sendo usado muito antes
de Freud. Constituindo sempre u m objeto de in
teresse, a h isteria ganhou um grande número de explica
ções acerca da sua etiologia e, dependendo da natureza da
explicação, tornava-se alvo de práticas religiosas, judiciá
rias e médicas, entre outras.
Na história da histeria, Charcot introduziu contribui-
28 ções muito significativas, demonstrando que os sintomas
h istéricos, predominantemente localizados no corpo, po
dem ser induzidos ou suprimidos através da hipnose e que,
portanto, a histeria estaria muito m ais relacionada ao de
sejo do médico do que a uma questão neurológica,
Freud, que estagiou com Charcot, absorveu essa li
ção e também o fato de que a h isteria tem as suas próprias
leis, não necessariamente as leis da medicina. Abordando
a questão da lesão nas paralisias histéricas, Freud (1893)
diz que ela deve ser completamente independente da ana
tomia do sistema nervoso, pois, nas suas paralisias e em
outras manifestações, a histeria comporta-se como se a
anatomia não existisse, ou como se não tomasse conheci-
Estruturas Clímcas na Clímca, n H1ster1a
nição de uma estrutura clínica não pode ser feita com re
ferência a u m certo tipo de sintoma. Muito embora possa
mos falar de "sintomas histéricos", é i mportante reafirmar
que os sintomas, em si, não caracterizam uma estrutura,
mesmo porque um dado sintoma pode aparecer em qual
quer estrutura. O reconhecimento de uma estrutura clínica
requer um outro referencial. O conceito central em torno
do qual vai girar a possibil idade de u m diagnóstico dife
rencial em termos de estrutura clínica é o conceito de cas
tração. A partir da noção de constituição do sujeito, te
mos que nesse processo vai estar envolvido o reconheci
mento por parte da criança da castração: a de si própria e a
do Outro, i nicial mente encarnado na figura da mãe. Sabe-
mos que a neurose vai se estruturar em função da posição 31
que o sujeito vai tomar em relação à castração, posição es-
ta caracterizada pelo recalque da castração do Outro, bus-
cando m anter um Outro não-castrado. O movimento rea-
l izado pelo sujeito de modo a conseguir manter a ilusão
acerca da existência de um Outro completo consiste em
trazer para si a castração, e é nesse sentido q u e Lacan diz
que o neurótico oferece a própria castração para sustentar
u m Outro não-castrado. Como conseqüência, aquilo que é
impossível por estrutura, o neurótico "transforma" em im
potência de si próprio. Assim, a falha existente e inerente
a qualquer estrutura passa a ser devida a uma falha do su-
jeito.
Cmba m. Palonsky
COnDICOES DE ESTRUTURn
P
odemos ainda avançar em relação àquilo que vai
conferir especificidade à histeria, considerando
que sua montagem vai se realizar em torno de al
gumas condições de estrutura, principalmente as quatro
seguintes:
determinado
mãe deseja, portanto aquilo que lhe falta; o falo como ob
jeto concreto, como alguma coisa que alguém concreta
mente possui e que, portanto, alguém pode vir a possuir.
Num segundo momento, porém, a criança vai perceber que
aquilo que a mãe deseja não é o falo, objeto concreto que
o pai possui; aquilo que ela deseja é o desejo do pai, o que
vai ser correlativo à percepção de que o que o pai deseja é
o desejo da mãe. Ou seja, neste ponto, teríamos o estabe
lecimento do desejo como desejo de desejo, como desejo
que nunca pode ser realizado, uma vez que está estruturado
em função de uma falta.
Constituir-se enquanto sujeito implica, pois, abrir pa
ra a criança a dimensão do desejo, ao mesmo tempo em
que a resposta sobre o que desejar encontra-se mediatizada
JB
pelo desejo de um terceiro, de um Outro. Portanto, para
que um objeto possa ser tomado como objeto de desejo, é
essencial a referência de um Outro. Essa situação pode ser
articulada ao tópico visto anteriormente, sobre a ausência
de um objeto sexual fixo, previamente determinado; dada
a ausência de indicações prévias sobre o objeto, é o desejo
do Outro que vai apontar para o objeto e marcá-lo como
objeto de desejo. Temos, assim, que um objeto qualquer se
rá desejado se for um objeto desejado por um terceiro. Como
diz Masotta, o acesso ao objeto do desejo é outorgado por
um terceiro. O objeto é o objeto do desejo do terceiro.3
11
FREUD, 1977. p. 3 18.
N
T
emos, pois, levantadas as condições de estrutura
que são fundamentais no estabelecimento da his
teria, bem como as perguntas ou questões que de
las derivam. Essas perguntas, ao lado da posição do sujei
to diante da castração do Outro, orientarão, na clínica, a
identificação da estrutura histérica. A importância dessas
perguntas justifica que as retomemos brevemente. São per
guntas que dizem respeito a: O que desejar? A quem dese
jar? O que é ser mulher? O que os homens desejam nas
q5 mulheres ? O que as mulheres desejam nos homens? Tais
perguntas, como dissemos, são características da estrutu
ra histérica, tendo um impacto decisivo sobre a vida da
histérica; muito mais do que uma simples curiosidade, es
sas perguntas básicas vão funcionar como eixo e guia da
vida da histérica, que vai se dedicar a tentar achar uma
resposta para elas, mas com a particularidade de que ela
não sabe que o que ela procura é um saber.
Por sinal , a cultura oferece permanentemente mode
los do que supostamente é uma mulher, o que é o amor, o
que é o desejo, o que um homem deseja e o que uma mu
lher deve desejar. Desde as novelas até as letras das músi
cas, passando pela publicidade e a moda, indicam-nos:
Estruturas Clímcas na Clímca, n H1ster1a
"Uma mulher deve ser. . ." (Da letra do bolero "La mujer",
de Mario Clavell)
Porém, a maneira como o sujeito histérico vai procu
rar as respostas é bastante particular: se de um lado ele
procura saber, de outro ele realmente não quer chegar a
saber. Temos dito que a histeria se define pela posição do
sujeito em relação à castração do Outro; dissemos tam
bém da angústia como afeto inevitável diante da cons
tatação dessa castração, e dos movimentos tendentes a evi
tar esse encontro. Se a procura de saber na histeria che
gasse às últimas conseqüências, o que apareceria seria pre
cisamente a castração do Outro, o encontro com o objeto
como causa de desejo e a angústia inevitável. A resposta
do lugar da mulher como objeto de desejo de um homem é q1
inaceitável ; esse querer saber vai esbarrar no limite de che-
gar no ponto a partir do qual tudo volta atrás, dando lugar
a um novo ciclo, tão inútil como o anterior.
Assim como organi zamos o texto até aqui em fun
ção daquilo que o sujeito histérico procura saber, vamos
continuar acrescentando aquilo que ele não quer chegar a
saber. É bom lembrar que, de fato, o sujeito histérico sabe
da castração do Outro, já que, se não fosse assim, tratar
se-ia de uma psicose. Se falamos de neurose é porque esse
saber existe, só que é um saber recalcado.
Temos pois, na histeria, uma situação em que convi
vem, ao mesmo tempo, a busca de um saber e um não que-
Cmba fi. Palonsky
D
espertar um desejo no homem é uma das ativi-
. dades favoritas da histérica. Que u ma mulher es-
teja fazendo um jogo de sedução permanente não
quer dizer que ela esteja disposta a ter uma relação sexual
com um homem. A histérica faz todo um jogo para excitar
o homem, desde que ele concretize esse desejo com outra
mulher. Uma situação comum pode ser vista, por exem
plo, entre um homem e uma mulher histérica; a relação
entre os dois pode se tornar um completo jogo de sedução,
50 e o homem vai supor que aquela mulher está querendo se
duzi-lo, está disposta a algo. Caso ele proponha alguma
coisa, é provável que a mulher reaja, por exemplo, dizen
do algo do tipo: "Está pensando que eu sou o quê? . . .". Na
situação, ela está causando o desej o, mas sem a mínima
disposição de ser ela o objeto de desejo.
É importante frisar que isso não é feito de má-fé, ela
nem sequer é consciente do jogo de sedução. Precisamen
te pelo recalque, ela "não sabe", e vê o desejo como vindo
de fora, dos homens, que "só pensam nisso"; não há ne
nhuma intenção de lesar o outro, é apenas para saber. Dado
que se sentir à mercê do desejo do Outro produz angústia,
para a histérica é então mais tranqüilizador controlar o de-
Estruturas Clímcas na Clímca, A H1stena
F
alamos, até aqui , da castração do Outro, da falha
da estrutura, sej a quando nos referimos à ine
xistência do elemento definidor da feminilidade,
seja quando abordamos a questão do desejo do Outro. Fi
cou também caracterizado um ciclo, onde o sujeito histé
rico sai em busca de uma resposta para suas questões, mas
não se satisfaz com a única resposta possível existente,
fonte inevitável de angústia, uma vez que aponta para a
castração do Outro; parte então em busca de uma nova
possibilidade de resposta. É desse movimento que estare- 53
mos falando, deste particular modo através do qual se arti-
culam o saber e o não-saber na histeria.
A histérica vai procurar as respostas de maneiras va
riadas, baseando-se sempre na suposição de que existem e
ela não está disposta a aceitar que não existam. Através de
sua busca, ela vai sustentar a existência da resposta que
espera encontrar, sej a por meio de um Outro que detenha
tal resposta, seja por meio da identificação da feminilida
de com algum significante, especialmente nas equações
falo = filho e falo = corpo.
Na vertente da suposição de um Outro que dê a res
posta esperada, vemos freqüentemente a histérica eleger
Cmba m. Palonsky
saber, porque, de fato, ela não quer saber. Não quer saber
que não existe a resposta que ela espera. O trabalho analíti
co vai consistir em transformar a pseudo pergunta numa
pergunta real , num verdadeiro questionamento.
A i nsatisfação é, assim, uma forma de saída da an
gústia, e a histérica vai se apresentar sempre como i nsatis
feita. Essa insatisfação vai estar freqüentemente referida a
"algo que falta", uma representação que indica o que está
faltando.
Retornando ao esquema da constituição do sujeito
para melhor entendermos esse ponto, vimos que tornar-se
sujeito envolve uma operação na qual ocorre o recalcamen
to do que seria o desejo da mãe, ao mesmo tempo em que
um significante ocupa o l ugar do que foi recalcado. Entre- 51
tanto, essa operação não é absolutamente precisa, nunca é
perfeita, no sentido de que fica sempre um resto não-alcan-
çado pelo simbólico. Dado que algo ficou fora da possibi-
l idade de simbolização, no i maginário alguma coisa vai
aparecer como faltante. O resto não-simbolizado da ope-
ração vai constituir o objeto como tal - objeto a - enquan-
to chamamos de - cp a representação da falta imaginária.
Enquanto representante da falta, o surgimento de - <j) im-
plica, pois, que o objeto estej a afastado: ou se está em
termos de - <j) ou se está em termos de objeto a. Por defini-
ção, a angústia está diretamente relacionada ao apareci-
mento do objeto como tal, portanto, a uma falha no - <j). A
Cmba m. Palonsky
58
n OUTRn mULHER
E
ssa outra maneira fundamenta-se na questão da
identificação masculina, tema que abordamos
quando falamos das particularidades do Édipo fe
minino. Vimos que em relação à estruturação do desejo,
em algum momento a criança vai se dar conta de que o de
sejo é sempre desejo de desejo, ou seja, de que aquilo que
a mãe deseja é ser desejada pelo pai, que as mulheres não
desejam exatamente os homens, mas serem desej adas pe
los homens. O que ela não sabe é porque os homens dese-
jam as mulheres e o quê os homens desejam nas mulheres. 59
A identificação com o homem vai se constituir numa ma-
neira através da qual a mulher vai "entrar" na cabeça de
um homem para, através dele, olhar as mulheres e procu-
rar esse saber.
Na frase freqüentemente ouvida "o que ele viu nela?"
tem-se claramente a estrutura da identificação masculina.
B através de uma outra mulher, olhada "através" de um
homem, que a mulher pretende chegar à feminilidade. o
que constitui um paradoxo. Paradoxo em dois sentidos:
primeiro pelo fato da identificação masculina, ou seja, é
identificando-se com um homem que a mulher pretende
descobrir o traço identificatório da feminilidade; segun-
Cmba m. Palonsky
n Pos1cno rnucn
E
m relação à competiçãofálica, podemos dizer que,
a partir da identificação masculina, a histérica pode
se colocar frente ao homem como se fosse um ho
mem, especialmente mostrando que até como homem ela
é melhor do que os homens. Para melhor alcançarmos a
extensão de tal posicionamento, precisamos entender que
a mulher tem de aceitar as duas castrações: a do Outro e a
de si própria. Na competição fálica existe o movimento de
colocar a castração no outro, como semelhante, mas não
62
no Grande Outro. Colocar a castração no outro, no caso,
em um homem, significa colocar esse homem na posição
do i mpotente, o que não é apenas uma metáfora, uma vez
que ela pode conseguir, de fato, que ele fique concreta
mente impotente, com o que vai desqualificá-lo i nteira
mente como homem.
Existe, nessa situação, uma certa sutileza, dado que
pode surgir uma suposição tal como "eu sou tão mulher
que comigo ele não pode", ou "ele não é suficientemente
homem para uma mulher como eu"; mas, esta posição de
ser "tão mulher" é, paradoxalmente, uma posição fálica: o
que aparece como o cúmulo da feminilidade é uma posi
ção masculina.
Estruturas Clímm na Clímca, A H1ster1a
66
ULGUffiUS RCSPOSTUS
A
problemática histérica gira em tomo da falta do
falo, dessa posição de não ser o falo e de tam
bém não tê-lo. Desenganada de tê-lo como coi
sa concreta, uma vez que deixa de pensar que ainda vai
crescer, aparece habitualmente a tentativa de substituir a
falta de falo em si por um filho, estabelecendo uma equa
ção pela qual falo = filho. Na equação falo = filho, o filho
vai aparecer no desejo da histérica como aquilo que vai
compensá-Ia da falta do falo, como aquilo que vai com-
pletá-la. 61
A definição impossível da feminilidade passa a ser a
maternidade, uma resposta dada muitas vezes pela cultu
ra, não apenas pela mulher. Não existindo a definição do
que é ser mulher, nesse lugar podem entrar muitas coisas.
Uma das mais habituais é "ser mãe", criando-se uma con
fusão entre feminilidade e maternidade. O filho, então, apa
rece como aquilo que se tem ou não se tem, da mesma for
ma que o falo apareci a como aquilo que se tem ou não.
Por sua vez, a gravidez continua sendo, pelo menos
por enquanto, a única coisa que a mulher pode e o homem
não pode. A mulher se aproveita disso e se arma em torno
desse fato, criando situações em que procura um homem
Cmba ffi. Palonshy
O SlnTOmn HISTERICO
T
odas essas maneiras através das quais o sujeito
histérico procura evitar a angústia decorrente da
constatação da castração do Outro, com todas as
suas vicissitudes, não são sem conseqüências. Vamos, en
tão, encontrar toda uma gama de sintomas com os quais a
histérica vai se fazer representar. Entender esse ponto i m
plica considerarmos que o mecanismo por excelência da
histeria é o recalque. É o mecanismo das neuroses, só que,
na histeria, é o mecanismo patognomônico, sinal que defi-
10 ne um dado quadro. Na histeria vamos ver o recalque cons
tantemente em funcionamento, às vezes falhando, se bem
que podemos dizer que na histeria ele é bastante bem-su
cedido.
O que estruturalmente está recalcado na histérica é a
castração do Outro. No fundo, ela sabe da castração do
Outro (caso contrário, seria psicótica), mas "esquece", re
calca. Falamos em castração do Outro no sentido de que
não existe estrutura sem falha. O recalque dessa condição
é o que define a neurose. Como elemento de estrutura, o
recalque tem a ver com a castração do Outro e com a pró
pria castração e aparece sempre como falta de um signi
ficante. O recalque consiste em que determinado signifi-
estruturas Clímcas na Clímca, H Histeria
n cumcn on HISTERin
A
posição histérica é, pelo menos aparentemente,
propícia para começar uma análise, uma vez que
a histérica sempre aparece como querendo s a
ber, u ma posição que convida a consultar um analista, as
trólogo, ginecologista, etc. A histérica está permanente
mente na posição de sujeito barrado, que não sabe, que
quer saber, etc.
Se os psicanalistas temos dificuldades na clínica da
hi steria não é por falta de prática ou, pelo menos, de opor-
tun idades. Trata-se, sem dúvida, do quadro que com mais 19
freqüência se apresenta em nosso consultório, e isso não
acontece por acaso. Se o que guia o sujeito histérico é o
desejo de saber, como não dirigir essa procura também ao
psicanalista, aquele que precisamente supõe-se que sabe
e, em especial, da circulação do desejo e do sexo? O psica-
nalista pode, faci lmente, ser m ai s u m na série dos mestres
nos quais procurar respostas para as suas questões, série
na qual entram desde o médico até a cartomante.
Por outro lado, o convite à associação livre não re
presenta uma dificuldade para o sujeito histérico. Ele sabe
melhor do que ninguém que uma palavra pode querer di
zer.mais de uma coisa, que u m sim pode querer dizer não
Cmba m. Palonsky
e v1ce-versa.
Com essa apresentação, poderíamos pensar que a en
trada em análi se da histérica é quase automática, mas i sso
seria um engano. Passar desse desejo de saber um saber
inexistente a uma disposição a saber o que há para saber
não é fácil. Evidentemente, não temos receitas para ofere
cer, mas pelo menos podemos tentar descrever os proble
mas que com freqüência se apresentam e as situações que
é preferível evitar.
Analisar a questão da transferência no tratamento da
hi stérica significa aplicar cada um dos fenômenos que te
mos analisado no desenvolvimento da estrutura na rela
ção com o ou a analista. Estamos marcando a distinção
BO porque o sexo do analista não é indiferente. Curiosidade,
tentativas de sedução, competição fálica, desafio, identifi
cações várias são algumas das vicissitudes com que o ana
li sta deverá lidar. Tentar saber sobre o desejo do analista e
"realizá-lo" é u m mecanismo que, se não for rapidamente
percebido e desarticulado, leva a confusões de supostas
"curas", baseadas na identificação com i deai s que o pró
prio analista sustenta. Os exemplos desse tipo de situação
vão desde o casamento da paciente a mudanças na apa
rência física.
Em outros termos, falamos de fenômenos imaginári
os que não têm nada a ver com as modificações na posi
ção subjetiva, mas que produzem, às vezes, grande satis-
Estruturas Clímcas na Clímca, n H1stena
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RCPCRÊnCinS BIBLIOGRnPICns