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DOI: 10.1590/1413-812320202511.

30662018 4521

A territorialização da Atenção Básica à Saúde do Sistema Único

artigo article
de Saúde do Brasil

The territorialization of Primary Health Care of the Brazilian


Unified Health System

Rivaldo Mauro de Faria (https://orcid.org/0000-0002-4005-8309) 1

Abstract The territorialization of Primary Resumo A territorialização da Atenção Básica à


Health Care is an important social and political Saúde é um processo social e político importante
process for the implementation of the constitu- para a realização dos princípios constitucionais
tional principles of the Unified Health System do Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil. O
(SUS) in Brazil. The SUS is essentially a nation- SUS é fundamentalmente um projeto de atenção
wide care project, organized into regionalized care territorializado, organizado em redes de atenção
networks, with its command center in Primary regionalizadas, com centro de comando na Aten-
Health Care (PHC). For this reason, the territo- ção Básica à Saúde (ABS). Por isso, a territoriali-
rialization reflects the desired model of care that is zação reflete o próprio modelo de atenção que se
proposed in Brazil. However, even though almost propõe no Brasil. Todavia, mesmo passados trinta
thirty years have elapsed since the constitutional anos do texto constitucional, esse projeto assisten-
edict, this nationwide care project has not yet been cial territorializado não se completou. O objetivo
fully implemented. The scope of this text is to re- desse texto é refletir sobre os processos políticos e
flect on the political and ideological processes of ideológicos da territorialização da ABS do SUS no
the territorialization of PHC of the SUS in Brazil Brasil e indicar algumas razões que explicam as
and put forward some reasons that explain the dificuldades de se concretizar esse modelo de aten-
difficulties of implementing this model of nation- ção territorializado. Observou-se enorme dificul-
wide care. Enormous difficulties were observed in dade do Brasil em unificar seu modelo de atenção,
the unification of the Brazilian care model, while constrangimentos financeiros que jogam contra o
financial constraints worked against the strategic discurso estratégico em torno do Saúde da Família
discourse surrounding Family Health, and re- e dispositivos recentes que desconstroem as formas
cent regulations disrupted territorialized forms of de trabalho territorializadas e podem ampliar a
work and can broaden the fragmentation of PHC fragmentação da ABS no país.
in the country. Palavras-chave Sistema Único de Saúde, Aten-
1
Programa de Pós- Key words Unified Health System, Primary ção Básica à Saúde, Política de Saúde
Graduação em Geografia, Health Care, Health Policy
Departamento de
Geociências, Universidade
Federal de Santa Maria. Av.
Roraima 1000, Santa Maria,
Prédio 17, Sala 1135. 97109-
390 Santa Maria RS Brasil.
rivaldofaria.geo@gmail.com.
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Introdução corpora em si mesma o modelo de atenção que


se quer adotar. Mas os contextos político-ideo-
O Sistema Único de Saúde (SUS) do Brasil é um lógicos e os processos econômico-institucionais
sistema público fundamentado num projeto ter- inviabilizaram, até agora, a reorientação para um
ritorial descentralizado, hierarquizado e integra- modelo assistencial territorializado. Por isso, a
do regionalmente através das redes de atenção à territorialização da ABS não se completou e, por
saúde1. Toda arquitetura desse projeto é alicerça- conseguinte, não se completou também o dese-
da nos princípios da universalidade, equidade e nho da porta de entrada do SUS no Brasil. E isso
integralidade descritos nos dispositivos constitu- traz inúmeras consequências que jogam contra
cionais do direito de todos a saúde, não importa os princípios da ABS legalmente previstos e his-
em qual ponto do território a pessoa esteja, e do toricamente construídos.
dever do Estado de oferecer as possibilidades da Poucos estudos, todavia, discutiram a terri-
sua efetivação2. torialização na sua dimensão político-ideológica,
A localização dos serviços no território deve ou seja, como ordenamento político para a cons-
obedecer aos princípios fundamentais da reso- trução de um modelo de atenção organizado em
lutividade e da economia de escala, sendo tanto redes integradas e coordenadas territorialmente
mais concentrados quanto mais especializados para ABS. Prevaleceram, pelo menos até agora,
e vice-versa3. A atenção básica (ABS) é o único estudos que exploram sua dimensão teórico-me-
nível da atenção que estará presente em todo o todológica, que são aqueles que propõem mode-
território nacional e através dela, das pactuações los teóricos e propostas técnicas e tecnológicas
intermunicipais e dos sistemas regionais, as pes- para o planejamento territorial ou territoriali-
soas poderão acessar os demais níveis do cuida- zação dos serviços. Dessa tradição se construiu
do, assim designados secundário e terciário. Por- uma definição processual do território (terri-
tanto, todo o projeto territorial do SUS depende tório-processo), muito influenciada pela teoria
da constituição de uma base que deve funcionar miltoniana do conceito, e se fez uma produtiva
como porta de entrada e centro de comando do aproximação com a proposta do planejamento
sistema. estratégico situacional de Carlos Matus7,8. Nestes
Ao município cabe a responsabilidade de de- trinta anos do SUS, muitas experiências positivas
senhar a porta de entrada do SUS, tendo em vista foram produzidas como uma proposição teórico-
os mesmos princípios constitucionalmente pre- metodológica para a territorialização da saúde7-13.
vistos. O documento que regula as responsabiliza- E isso permitiu, além de fornecer metodologias
ções e os modos de organização e financiamento consistentes para o planejamento territorial dos
é a Política Nacional da Atenção Básica (PNAB), serviços, superar àquela velha ideia materialista e
cuja primeira edição ocorreu há mais de dez anos4 reducionista que vê o território na sua dimensão
e já uma terceira acabou de ser publicada5. político-administrativa apenas10,12. Entretanto,
Desde a década de 1990 colocava-se a questão sobretudo em momentos de crise político-insti-
de como planejar territorialmente a ABS do SUS. tucional e de redução do papel social do Estado,
Compreendeu-se que toda a estrutura e o pró- é comum que as políticas territorializadas sejam
prio modelo assistencial dependem não apenas secundarizadas, sobretudo na área da saúde. Por
de como são alocados os serviços, mas como são isso, a julgar pelo processo histórico e sobretudo
organizadas territorialmente suas ações, sobretu- pelas políticas recentes, o SUS convive ora com
do as ações de prevenção e promoção6. Por isso, sua territorialização e ora com sua desterritoriali-
era necessário mais do que apenas delimitar ter- zação, e esses processos são bem visíveis na aten-
ritórios para os serviços, devendo haver uma re- ção básica. Por isso, é fundamental desnudar essa
lação de vinculação e pertencimento entre a po- natureza política da territorialização da ABS, que
pulação e os serviços. Essa concepção, assim de- é também uma forma de tornar esse debate não
signada territorialização da saúde, ganhou força apenas instrumental, uma vez que a ação políti-
ainda na implementação dos Distritos Sanitários, ca pode produzir arranjos ideológicos próprios a
foi, depois, incorporada aos programas Agentes cada novo momento histórico.
Comunitário de Saúde (ACS) e Saúde da Família O objetivo desse texto é discutir a territoria-
(PSF) e passou a compor o escopo das políticas lização nessa sua dimensão político-ideológica,
estratégicas em torno da Saúde da Família (ESF) estabelecendo, portanto, uma reflexão sobre a
e das Redes de Atenção à Saúde (RAS). natureza territorial do modelo de ABS do SUS.
A territorialização está hoje presente nos O primeiro desafio é analisar a territorialização
documentos reguladores da ABS do SUS e in- num contexto social e político que vai da cons-
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tituição do SUS e da ABS às recentes regulamen- jeto territorial do SUS nasce, podemos dizer, com
tações. O segundo desafio é discuti-la à luz e os DS, pois eles materializavam o próprio prin-
nos termos da própria teoria e dos documentos. cípio reformador de desconstrução do modelo
Portanto, do ponto de vista operacional, o texto hegemônico (médico-privatista) para a produ-
comunica as dimensões contextuais e legais da ção de um sistema descentralizado e apropriado
territorialização e a discute em relação às pro- localmente pelos mecanismos democráticos de
postas que vem sendo apresentadas nesses trinta participação social.
anos do SUS. Portanto, a discussão de um sistema de saú-
de distritalizado, pelo menos naquele momento,
Contextos da territorialização do SUS significava mais que um modo de organização
no Brasil apenas político-territorial dos serviços. De tal
forma que seria mais adequado, de acordo com
O processo de territorialização do SUS pode Mendes7, falar em distritalização, uma vez que se
ser compreendido em relação a três movimentos trata de um processo social de mudanças nas prá-
político-institucionais assim designados “muni- ticas sanitárias.
cipalização-distritalização”; “municipalização-re- A distritalização foi prevista na Lei Orgânica
gionalização” e “municipalização-regionalização da Saúde1 como uma forma de organização do
-redes de atenção” (Quadro 1). Esses movimentos SUS no município. Embora sua inscrição legal
foram produzidos a partir dos instrumentos nor- seja facultativa, ou seja, cabe ao município deci-
mativos que vão da própria Constituição2, às leis dir se quer ou não estruturar seus serviços dessa
infraconstitucionais1,14, Normas Operacionais15,16, forma, é algo bastante significativo da concepção
Normas Operacionais de Assistência à Saúde17,18 e de um SUS territorializado. Por isso, a munici-
Pacto pela Saúde19. Nos interstícios desses instru- palização-distritalização só poderia ser efetivada
mentos legais mais importantes, diversas porta- por processos de descentralização e empodera-
rias e normativas vão sedimentar a racionalidade mento local, com regras claras dos papeis de cada
da época, ora privilegiando a municipalização e ente federativo na gestão do SUS. Isso foi feito
distritalização, ora a regionalização e ora ainda a ainda no início da década de 1990 com a publica-
organização das redes de atenção. ção da terceira Norma Operacional Básica, NOB-
O primeiro movimento, assim designado 9315, onde foram estabelecidos os procedimentos
“municipalização-distritalização”, tem início reguladores da descentralização do SUS no Bra-
ainda antes do SUS, na década de 1980, com as sil. Tal como expresso nessa NOB, a descentrali-
propostas feitas a partir dos chamados Sistemas zação é o ponto de partida para a reformulação
Locais de Saúde (SILOS), no que ficou conhecido do modelo assistencial, que tem como base o pla-
no Brasil como distritos Sanitários (DS). O pro- nejamento integrado em cada esfera do governo.

Quadro 1. Movimentos políticos-institucionais responsáveis pela territorialização do SUS no Brasil.


Fases/períodos Principais políticas territoriais Processos de territorialização
Municipalização- Descentralização, criação do PACS e PSF, Os sistemas municipais são planejados através
distritalização implementação dos sistemas municipais dos distritos, a territorialização é proposta
(1990-2000) de gestão e definição do Piso da Atenção normativamente após a NOB96 e a saúde
Básica. da família se torna política prioritária e
substitutiva para a ABS.
Municipalização- Criação do Plano Diretor de A regionalização é sistematizada e proposta
regionalização Regionalização e continuação da expansão como forma de revolver a municipalização
(2000-2006) do PSF (em processo de conversão para autárquica e a porta de entrada continua
estratégia). sendo territorializada no município.
Municipalização- Pacto pela Saúde e unificação do modelo A territorialização é proposta para
regionalização- da ABS na PNAB, a regionalização é a modelagem das redes de atenção
redes de atenção melhor sistematizada através do Contrato regionalizadas e a ESF é definida como
(2006-2014) Organizativo de Ação Pública de Saúde e principal porta de entrada e nó de comando
as redes são normatizadas para integrar os das redes de saúde no território.
sistemas municipal e regional.
Fonte: Elaborado pelo autor (2018).
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Os DS representavam, então, essa menor esca- ção-regionalização, passou a ser mais fortemente
la de planejamento do SUS onde os processos de debatido a partir da publicação das Normas Ope-
descentralização ganhariam concretude e as ações racionais de Assistência Social (NOAS 01 e NOAS
de saúde coletiva seriam efetivamente imple- 02)17,18. Compreendeu-se, naquele momento, que
mentadas. Todavia, a ideia esbarrava num vazio a municipalização, por si só, não é capaz, por ra-
de políticas programáticas para a atenção básica, zões políticas e organizacionais, de integrar o SUS
sobretudo os modos de financiamento e estrutu- e oferecer uma atenção universalizada e equitati-
ração do modelo assistencial a ser adotado pelo va. Ao contrário, segundo Santos e Campos21, a
país. Em outras palavras, era necessário definir municipalização acabou fortalecendo ações de
as ações para a atenção básica e torná-las opera- caráter clientelistas e privatistas e acentuou a
cionalizáveis nesse espaço político-institucional. ineficiência do Estado brasileiro em romper com
É esse o contexto político da criação do “Progra- os processos de centralização e o fracionamento
ma Agentes Comunitários da Saúde” (PACS), em municipal. Por isso, a regionalização, embora já
1991, e “Programa Saúde da Família” (PSF), em prevista constitucionalmente, passou agora a ser
1994, no sentido de se resolver o vazio programá- o caminho para aglutinar um SUS autarquizado
tico da municipalização-distritalização. e fragmentado em milhares de municípios assi-
A consolidação dessa política de municipali- métricos. Eis, pois, o desafio da territorialização e
zação da saúde no Brasil vai ocorrer com a NOB- do debate do planejamento territorial.
9616. Ali as responsabilidades federativas foram Com as NOAS 01 e 02 produziu-se, então,
mais bem delineadas. No caso do município, por um debate mais vigoroso para a conformação
exemplo, foi um avanço a plena responsabilização de uma nova realidade territorial de gestão do
pela atenção básica, não importando o modelo SUS, necessária para a integralidade das ações e
de gestão, se plena da atenção básica ou plena do serviços hierarquicamente. Essa nova realidade
sistema municipal. Essa responsabilização é ainda passou a ser consorciada através do Plano Dire-
acompanhada pela sistematização do financia- tor de Regionalização (PDR) e colocou o estado
mento, através da criação do Piso da Atenção Bá- como ente coordenador e regular de um processo
sica (PAB fixo e variável) e o incentivo à expansão de negociação compartilhada de ações e serviços
do PSF. entre municípios. Todavia, embora as NOAS te-
Com a NOB-96 o PSF vai ganhar vida longa, nham encaminhado soluções importantes, ainda
mais que a inicialmente prevista na sua forma não estava bem delineado, política e administra-
programática. Por isso, um ano depois, através tivamente, como processar tudo isso. Na verdade,
da Portaria nº 1.88620, passou a ser compreen- as NOAS definem bem as diretrizes da regionali-
dido como uma possibilidade estratégica para o zação, mas não os instrumentos técnicos e opera-
reordenamento do modelo assistencial e para a cionais. E isso acabou dificultando para superar
própria consolidação do SUS no Brasil. Não por a fragmentação produzida na autarquização mu-
acaso, essa mesma Portaria refere como primeira nicipal do SUS.
diretriz organizativa do PSF o seu caráter substi- Compreendeu-se, então, que os sistemas re-
tutivo em relação às práticas tradicionais das uni- gionais de saúde, tal como proposto nas NOAS,
dades básicas de saúde. A segunda diretriz é a ter- só poderiam ser implementados mediante pro-
ritorialização. Mencione-se que esse é o primeiro cessos de pactuação federativa. Era necessário
documento normativo do SUS a fazer menção à um sistema de gestão compartilhada dessas regi-
territorialização dos serviços. ões, sob o risco do fracasso do próprio projeto
Com a expansão do PSF, a distritalização dos de descentralização e regionalização do SUS. Era
serviços foi perdendo importância no debate ter- também necessário definir melhor o próprio sis-
ritorial do SUS no município. Isso aconteceu de tema municipal, de maneira especial no que refe-
maneira bastante evidenciada nos municípios de re aos princípios da atenção básica e sua orienta-
pequeno e médio porte, pois a gestão territorial ção assistencial. Portanto, apresentavam-se, entre
dos serviços, dada a dimensão do município, pas- outros, três grandes desafios do planejamento
sou a ser viabilizada apenas com a definição das territorial do SUS ainda no início de século, quais
áreas de abrangência das unidades de saúde da sejam: a sistematização da atenção básica no mu-
família, de tal forma que a territorialização, antes nicípio, a regionalização e a integração e unifica-
debatida em relação aos DS, passou a ser agora ção dos sistemas municipal e regional. Esse é o
feita em relação ao PSF. contexto da apresentação de uma série de regu-
O segundo movimento do planejamento ter- lamentações produzidas a partir do “Pacto pela
ritorial do SUS, assim designado municipaliza- Vida, em Defesa do SUS e da Gestão”19.
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Com o Pacto pela Saúde é desencadeado, gurança jurídica que até então não existia para a
então, um terceiro movimento do planejamen- constituição das regiões de saúde, além de inte-
to territorial do SUS, a que estamos chamando grar mais coerentemente os sistemas municipal
“municipalização-regionalização-redes de aten- e regional21.
ção”. Esse momento será também uma fase de A territorialização do SUS encontra, portan-
amadurecimento e consenso em torno da políti- to, novos desafios na segunda década do século
ca baseada na territorialização dos serviços, agora XXI. Pela primeira vez, de maneira mais efetiva,
não apenas da atenção básica, mas de todo o SUS inclusive com instrumentos jurídicos, coloca-se a
regionalizado. Nos termos da Portaria nº 39919, questão de integrar o SUS municipal e regional,
o Pacto pela Saúde “reforça a territorialização da articulando-se uma única estrutura hierárquica
saúde como base para organização dos sistemas, compartilhada. Todavia, convergem também po-
estruturando as regiões sanitárias e instituindo líticas contrárias ao projeto territorializador, que
colegiados de gestão regional”. Por isso, o terceiro trazem enorme dificuldade para a unificação do
volume da série “Pactos pela Saúde”22, refere que modelo assistencial e sua articulação reticular.
a territorialização é o primeiro princípio da re-
gionalização do SUS no Brasil. A territorialização da Atenção Básica à
No âmbito municipal e especificamente Saúde do SUS: projeto social inacabado
da atenção básica, ainda no contexto do Pacto
pela Saúde, será também apresentada a Política A atenção básica à saúde do SUS é um projeto
Nacional da Atenção Básica (PNAB)4. Uma se- territorial inacabado. Esse projeto foi concebido
gunda versão da PNAB foi apresentada em 2011 num contexto de reforma, em fins da década de
para incluir o papel da atenção básica das redes 1980, e posto em xeque pela contrarreforma ne-
de saúde do SUS (RAS)23 e uma terceira edição, oliberal ainda no início da década de 199028. O
de antemão criticada pelo momento político da neoliberalismo é contrário às políticas territo-
sua apresentação, foi recém-publicada5. Nas duas riais, pois seu objetivo é exatamente a fragmen-
primeiras edições da PNAB a territorialização foi tação do território29. Na acepção miltoniana29, o
apresentada como atribuição comum a todos os neoliberalismo não reconhece o território que
profissionais da atenção básica e na terceira edi- ele mesmo explora, mas o mercado globalizado
ção passou a figurar também como uma diretriz, como uma rede produtora de irracionalidades,
não apenas como uma atribuição. sendo ao mesmo tempo e dialeticamente seu
Algumas críticas, todavia, foram estabeleci- objetivo e sua consequência. Por isso, no campo
das à regionalização da saúde no Brasil, mesmo da saúde, o modelo privatista e hospitalocêntri-
a que foi proposta no Pacto pela Saúde24. Da co será seu corolário, ao contrário do modelo de
mesma forma, reconheceu-se a dificuldade de in- atenção territorializado e organizado para gru-
tegração dos serviços através das RAS25. É como pos populacionais geograficamente localizados.
se houvesse uma lacuna entre um sistema muni- Portanto, a primeira limitação para se com-
cipal autarquizado e fragmentado e um sistema pletar a territorialização da ABS do SUS é de na-
regional incompleto e de certa forma ainda con- tureza político-ideológica e está relacionada com
fuso, sobretudo sem um direcionamento jurídi- o modelo de atenção que se quer adotar. É alta-
co adequado. Por isso, duas importantes regula- mente simbólico, por exemplo, que uma Política
mentações foram desenhadas para tentar resolver Nacional de Atenção Básica (PNAB) só venha a
parte dessas questões. Uma delas é a Portaria nº ser produzida quase vinte anos após a constituin-
4.279, de 2010, que foi a primeira a estabelecer te. Então, para além da demora de se pensar a re-
diretrizes claras para as RAS do SUS no Brasil26. gionalização do SUS e de sistemas de governança
Uma segunda normativa importante é o De- regional, a municipalização experimenta uma
creto 7.508, de 2011, que regulamenta o plane- limitação que lhe é própria e cuja solução ainda
jamento e articulação interfederativa do SUS27. não foi dada, qual seja: a unificação do modelo
Através desse decreto, a regionalização passou a de atenção.
ser celebrada através do Contrato Organizativo A questão que se coloca, então, é por que o
de Ação Pública de Saúde, que é, em síntese, um modelo de atenção territorializado, proposto na
instrumento de planejamento regional. Mas ele primeira edição da PNAB como um reordena-
avança em relação ao que se propunha no PDR, mento assistencial baseado na estratégia saúde
pois nele são celebradas as responsabilidades da família, não se completou? Ou seja, por que o
sanitárias e financeiras pactuadas entre os três sistema não foi unificado e a porta de entrada do
entes federativos. Em suma, o contrato traz a se- SUS não foi completamente desenhada? Cremos
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que as repostas estejam relacionadas tanto com delo indutivo é o artifício utilizado, por exemplo,
a dimensão da política de Estado para o sistema na expansão da ESF, que é uma forma de criar
público de saúde no Brasil, quanto com o orde- demandas através de incentivos dados pelo Mi-
namento ou planejamento interno ao SUS. nistério da Saúde. Não há planejamento sistêmi-
O financiamento, por exemplo, que é uma co nesse modelo, pois cabe unicamente ao mu-
dimensão da política de Estado, representa um nicípio a decisão de aderir ou não ao programa.
dos principais entraves ao projeto universalista Todavia, para além da desresponsabilizarão fe-
do SUS. O fato é que ainda não foi encontrada deral com o planejamento da ABS, esse processo
uma solução financeira a esse projeto. De acor- foi ainda acompanhado pela progressiva erosão
do com Barros e Piola30, o Brasil é o único país da capacidade indutiva de reorientação assisten-
do mundo que dispõe de um sistema de saúde cial. Por conseguinte, foi ficando cada vez mais
universal em que o gasto público é menor que o oneroso para os cofres municipais a manutenção
privado. Em 2014, por exemplo, o SUS consumiu dos serviços de ABS, processo que foi ainda in-
3,9% do PIB brasileiro. Nos países da OCDE com tensificado pela falta de reajuste dos repasses fe-
sistemas de saúde semelhantes, como Espanha, derais às ESF. Isso levou, como era de esperar, ao
Alemanha, França, por exemplo, esse valor foi de estrangulamento financeiro dos municípios e de
cerca de 8%31. sua capacidade de reorientar a ABS sob um único
O subfinanciamento é um problema crônico modelo assistencial.
do SUS que já era grave até o Pacto pela Saúde, Em relação ao ordenamento interno ao SUS,
ampliou-se, a partir de 2007, com o fim da Con- no que respeita às decisões estruturais relaciona-
tribuição Provisória sobre Movimentação Finan- das ao financiamento, o problema se agrava por
ceira (CPMF), pois os fundos não foram repos- decisões políticas e assistenciais equivocadas que
tos; e parece caminhar para o desvanecimento jogam contra o modelo estratégico que se quer
com o regime fiscal que define o congelamento adotar. É o que ocorre na distribuição dos recur-
dos gastos por vinte anos32. O problema se inten- sos entre os níveis de atenção à saúde do SUS. O
sifica porque o regime de congelamento é feito estudo de Mendes e Marques36 mostra, por exem-
sob uma realidade já extremamente precarizada plo, que entre 2001 e 2011, houve redução da
de contenção de gastos e de regulamentações que participação relativa do bloco de financiamento
levam à desconstrução do SUS. federal para a ABS (de 32% para 23%) em com-
Outro problema que incide diretamente na paração à atenção de média e alta complexidade
capacidade de ofertar serviços territorialmen- (de 57% para 67%). E isso é um problema, pois
te acessíveis é o estrangulamento financeiro dos não há convergência do modelo assistencial sem
municípios. A descentralização não foi acompa- uma convergência financeira condizente. Por-
nhada, na mesma velocidade, da transferência de tanto, a proposta da territorialização da ABS e
recursos pelo governo federal. Esse problema se de mudança no modelo assistencial disposto na
intensificou após a Ementa Constitucional (EC) PNAB não foi capaz de alterar essa priorização
nº 2933, que aglutinou as normativas anteriores dos recursos aos níveis hierárquicos superiores
e regulou o montante mínimo a ser aplicado no do sistema de atenção. Ou seja, estamos a finan-
SUS pelos três entes federativos31. Para se ter uma ciar uma estrutura estranha à proposta política
ideia, entre 2000 e 2011, a participação relativa contida no instrumento normativo do próprio
da União nos custos com o SUS caiu 26,6%, en- SUS.
quanto os municípios aumentaram sua partici- Como os instrumentos normativos estavam a
pação em 36,4%30. A EC-29 só foi regulamentada pressionar a efetivação política, era necessário ou
em 2012, através da Lei Complementar (LC) nº dar consequência aos instrumentos ou reformulá
14134, que foi uma normativa bastante aguarda- -los. Depois da publicação da PNAB em 2006, vá-
da na esperança de que resolvesse o subfinan- rias ações foram tomadas ora no sentido da con-
ciamento do SUS. Mas ela não alterou a partici- vergência ao modelo, ora de desconstrução. De
pação federal no financiamento público para a maneira geral, os instrumentos normativos e a
saúde e as regulamentações posteriores fizeram prática política corroboraram para efetivar a ESF.
ainda agravar o problema. É o caso do Programa Nacional de Melhoria do
Todos esses instrumentos normativos, que Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMA-
são políticos e refletem uma visão política da Q-AB)37, que se colocou como um instrumento
saúde, levaram ao que Campos e Pereira-Junior35 indutor da ampliação do acesso e melhoria da
chamam de esgotamento do modelo indutivo de qualidade da atenção básica, além de alterar os
constituição das redes de ABS no Brasil. O mo- modos de financiamento38.
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A alterações feitas com o PMAQ-AB, asso- forma fiscal que culminou com a chamada PEC
ciada às novas orientações para a normalização dos Gastos43. A principal mudança foi a perda da
das redes de atenção à saúde e a regionalização vinculação de receitas, que era o que mantinha
do SUS26,27, obrigaram o Ministério da Saúde a um aumento tímido dos investimentos. Se mes-
reestruturar a PNAB. Por isso, uma segunda edi- mo com vinculação de receitas o SUS era sub-
ção foi produzida para incluí-las23. Aproveitou-se financiado, como será, então, numa situação de
a ocasião para introduzir propostas organizacio- um teto primário corrigido pela inflação e onde
nais importantes como a flexibilização das equi- não há nenhuma vinculação setorial obrigatória?
pes para atender populações específicas localiza- O desmonte do SUS é o termo mais recorrente na
das em situações territoriais especiais (popula- literatura que estuda o impacto dessa contrarre-
ções ribeirinhas, indígenas, de rua) e a inclusão forma neoliberal44,45, salvo mudanças decorrentes
do Núcleo de Apoio à Saúde da Família, que pas- do legítimo processo eleitoral.
sou a exercer um papel fundamental de comando A resposta, na ABS, a esse projeto neoliberal,
do planejamento territorial e assistencial. foi a publicação da terceira edição da PNAB5, que
Todos esses instrumentos e incentivos não trouxe, de imediato, manifestações contrárias de
foram capazes, todavia, de alterar o problema órgãos e instituições como a Associação Brasilei-
crônico da falta de médicos para a ABS no Brasil. ra de Saúde Coletiva46. A PNAB-2017 é um para-
Havia graves vazios assistenciais em territórios doxo, porque ao mesmo tempo que insiste na or-
mais carenciados das grandes cidades e do inte- ganização de uma ABS territorializada, permite
rior do país. Além disso, no que respeita à for- arranjos estranhos ao modelo estratégico que ela
mação médica, a regulamentação jogava contra mesmo propõe. Na ânsia de flexibilizar, a nova
o modelo de atenção que se queria adotar. Então, PNAB corre o risco de fragmentar ainda mais a
como resposta ao problema, foi criado o Pro- ABS no Brasil.
grama Mais Médicos (PMM)39. O PMM passou, A primeira tentativa de flexibilização se deu
então, a regular três dimensões importantes da com as modalidades dos serviços. A nova PNAB
ABS no Brasil: o investimento em infraestrutu- reconhece um “padrão essencial” e um “padrão
ra da rede de saúde, a ampliação e as reformas ampliado” para as ações na ABS. Indica que o
educacionais dos cursos de medicina e a provi- “padrão ampliado” será resultado de ações es-
são emergencial de médicos nos territórios vul- tratégicas direcionadas para especificidades lo-
neráveis40. Portanto, através desse programa o carregionais e o “padrão essencial” é o conjunto
Ministério da Saúde passa a intervir na regulação de serviços ordinários que serão ofertados uni-
da demanda e da formação para a ABS, que são formemente para todo o país. Há dois problemas
processos fundamentais para orientar o modelo fundamentais e relativamente preocupantes nes-
assistencial35. Embora tenha encontrado críticas sa tipificação assistencial. O primeiro é que não
pelo momento conturbado de sua produção41, o há parâmetros claros que diferenciam os padrões,
PMM representa, segundo Campos42, uma das nem mesmo em relação aos custos e formas de
primeiras políticas unificadas com capacidade de financiamento. Recomenda o texto que os servi-
responder as disfuncionalidades do SUS criadas ços do “padrão essencial” devem também realizar
pela descentralização autárquica e desresponsa- ações e serviços do “padrão ampliado”, mas não
bilização do Ministério da Saúde com a forma- há obrigatoriedade e nem critérios definidos. O
ção, financiamento e as relações de trabalho na segundo problema é a possibilidade de se pensar
ABS. esse “essencial” como “seletivo” e começarmos a
construir, no Brasil, uma atenção básica contrária
A desterritorialização da Atenção Básica à aos princípios de Alma-Ata.
Saúde do SUS Essa flexibilização levou, por conseguinte, ao
rompimento da ESF como modelo prioritário
Até o PMM, com todos os percalços políti- para a ABS no Brasil. Há dois encaminhamentos
cos e limitações estruturais, sobretudo de finan- sintomáticos desse rompimento na nova PNAB.
ciamento, tudo parecia convergir no sentido da O primeiro foi a quase retirada do Agente Co-
consolidação e unificação do modelo assisten- munitário de Saúde (ACS) da Equipe Saúde da
cial orientado pela ESF. Nos últimos dois anos, Família (eSF). O texto da portaria não define um
todavia, a crise política e o discurso reformista, número mínimo de ACS na eSF, senão apenas
de cunho neoliberal, levaram a produção de vá- recomenda que sejam inseridos de acordo com
rios instrumentos que mudaram esse sentido critérios epidemiológicos, demográficos e socio-
unificador. Um deles é a própria política de re- econômicos e com cobertura de 100% das áreas
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vulneráveis. Portanto, uma eSF pode manter um que é quarenta horas, pode inviabilizar ações de
único ACS e ela estará atendendo a legislação. prevenção e promoção da saúde no território.
Além disso, raramente o município vai desenvol- Portanto, sem a busca ativa que é feita pelo ACS
ver uma classificação das vulnerabilidades do seu e sem condições de desenvolver ações territoria-
território que exija dele uma cobertura total de lizadas, a eAB não muda o modelo de atenção.
ACS em algumas áreas, e isso não apenas por falta Em suma, tal como expresso no texto da Por-
de vontade política, mas pelo fato de que se trata taria nº 2.3465, serão reconhecidas outras estraté-
de algo relativo e difícil de ser disposto em lei. gias de atenção básica. Então, não se trata de rea-
Essa desobrigação é um golpe para a reorien- linhar ou de reorientar o modelo de atenção, mas
tação do modelo assistencial que vinha sendo de acomodar uma situação que definitivamente
pretendido e acentua ainda mais a proposta de não rompe com uma visão médico-assistencial
uma ABS seletiva. De fato, fica claro que os ser- na ABS e, ao mesmo tempo, fortalece os dispositi-
viços dos ACS serão destinados, principalmente, vos privados de oferta de saúde para a população.
aos pobres. E isso é reduzir o potencial desse ser- Não há alteração, por exemplo, nos dispositivos
viço para a ABS como um todo, sobretudo em re- de financiamento, mantém-se uma sobrecarga de
lação a coordenação dos fluxos e a continuidade responsabilidades do município (na verdade, elas
da atenção. A territorialização, por exemplo, só aumentaram), e como solução, será permito toda
pode ser viabilizada pela busca ativa, que é algo sorte de arranjos a partir de uma equipe mínima.
quase sempre feito pelo ACS e sem a qual se torna Portanto, atribui-se aos municípios toda sorte de
bem mais difícil a identificação e a consequente obrigações num cenário inviável e que os incen-
intervenção nos determinantes sociais de saúde. tiva a redesenhar o próprio modelo assistencial
Então, é curioso que a nova PNAB coloque a ter- sob novas bases.
ritorialização como uma de suas diretrizes (que é
algo novo, não presente nas edições anteriores) e,
ao mesmo tempo, a inviabiliza. A territorializa- Considerações finais
ção é uma atribuição comum a todos os profis-
sionais da ABS, assim está posto na PNAB. Mas a A territorialização é uma política fundamental
verdade é que o profissional que mais entra nesse para dar consequência aos princípios do SUS no
território e o reconhece é o ACS. E isso é absolu- Brasil. Todavia, convivemos ainda hoje com mo-
tamente contraditório na nova PNAB. delos de atenção desterritorializados e fragmen-
A política de desconstrução do ACS ficou tados em ações descontínuas, casuísticas e pouco
definitivamente clara na recente publicação da resolutivas. A convergência assistencial, no sen-
Portaria nº 8347, que pretende ofertar formação tido de criar redes de atenção territorializadas a
técnica em enfermagem a todos os ACS. Então, partir da ABS, é uma proposta constitucional que
a defesa da formação profissional, que era uma foi sistematizada em diversos documentos ainda
bandeira para o fortalecimento das ações de vigi- na década de 1990. Mas o Brasil demorou muito
lância à saúde territorializada, foi simplesmente para unificar seu modelo de atenção. Demorou
transformada numa política de conversão profis- também para pensar os sistemas locais em relação
sional. Consequentemente, nesse contexto, o ACS aos sistemas regionais e de constituir mecanismos
deixa de existir para se tornar outro. coerentes de modelagem das redes e da própria re-
O segundo encaminhamento que rompe com gionalização do SUS. Isso levou à sobreposição de
a unificação do modelo de ABS é reconhecimen- modelos, o estrangulamento financeiro dos muni-
to de uma nova forma de trabalho em equipe, a cípios e a precarização da ABS e do próprio SUS.
chamada equipe da Atenção Básica (eAB). Ou- Diversos instrumentos criados nesse início de
tras modalidades de equipes já estavam previs- século foram importantes para se produzir um
tas na legislação anterior, mas a eAB representa discurso unificador da ABS. A PNAB foi, certa-
claramente uma mudança do modelo assisten- mente, um dos maiores avanços. Depois dela, foi
cial. Na verdade, a eAB é um rearranjo criado importante a implementação do sistema de ava-
para manter o desarranjo das UBS tradicionais, liação através do PMAQ e a regulação da forma-
apenas que com uma nova roupa. A composição ção médica pelo PMM. Ficou mais claro também
mínima, que é a quase sempre adotada, é repre- o papel da ABS nas redes e na própria pactuação
sentada basicamente por médicos, enfermeiros e regional. Mas não se resolveu o problema finan-
técnicos. Não é obrigatório, por exemplo, a pre- ceiro para viabilizar um sistema de atenção ter-
sença do ACS. A carga horária mínima de dez ritorializado. Então, as normativas passaram a
horas por categoria profissional, diferente da eSF, orientar o modelo, mas a ideologia financeira era
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estranha ao próprio modelo que se queria ado- lamento do ACS, são alguns dos processos que
tar. E esse problema se intensificou com a crise levarão a um novo arranjo organizacional. Por
política e com a produção de instrumentos de conseguinte, será muito difícil desenhar a porta
desconstrução do SUS e da ABS. de entrada do SUS num sistema médico-assis-
A publicação da terceira edição da PNAB em tencial curativo, fragmentado e seletivo. Salvo
2017 sintetiza bem a ideologia política do novo mudanças produzidas pelo próprio debate e pelo
momento. Basicamente o que se propõe é a des- saudável processo político, a territorialização da
territorialização da ABS pela desconstrução do saúde, como processo social de mudanças nas
modelo de atenção baseado no Saúde da Família. práticas sanitárias, corre o risco de ser inviabili-
O reconhecimento de outras formas de organi- zada. Portanto, como projeto idealizado e ainda
zação (essencial e ampliada), a manutenção das inacabado, a territorialização da ABS do SUS, nos
tradicionais UBS através das eAB, e a desmante- termos atuais, pode nem mesmo se completar.

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