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Mauna: O Yoga do Silêncio

 Dr. David Frawley

Mauna, o membro secreto do yoga


Mauna refere-se à prática de não falar, e aquele que faz isso
regularmente é chamado de Muni, um sinal de grande respeito no
pensamento hindu e yogue. Embora, não falar seja uma parte
importante do Mauna, é muito mais do que isso.

A voz é o principal dos nossos órgãos motores. Relaciona-se


com o elemento éter que rege todos os outros elementos e seus
respectivos órgãos motores. No entanto, um discurso interior é
também o principal fator expressivo da mente e governa toda a
atividade mental.

Nossas vidas consistem em duas ações principais: comer e falar,


o que entra e o que sai da boca. Se pudermos dominar esses dois,
poderemos dominar tudo sobre o corpo e o mundo físico e suas
complicações kármicas. A fala é onde perdemos mais energia ou
prana, e o que nos leva a ações erradas e vários emaranhados. No
entanto, a fala também é a primeira e principal forma de ajuda e afeto
que oferecemos na vida, que geralmente começa com palavras de
bondade ou amor. Não devemos esquecer o karma daquilo que
dizemos, que é a ação a que nossas palavras nos compelem, e as
energias que elas colocam em movimento dentro e ao nosso redor.

Silêncio da mente
O silêncio verbal exterior significa pouco sem o silêncio interior
da mente. A maioria de nós está falando por meio de nossos
pensamentos o tempo todo, seja para nós mesmos ou para outras
pessoas imaginárias com as quais estamos envolvidos ou que
gostaríamos de influenciar, planejando e ensaiando o que gostaríamos
de dizer a elas.

Nossos pensamentos são mais erráticos, perturbados,


excessivamente emocionais ou fora de controle, do que aquilo que
dizemos, porque eles se movem mais rapidamente e não precisam
enfrentar a resistência externa direta que envolve falar com os outros.

No entanto, não podemos ter silêncio mental, sem um controle


correspondente do órgão vocal. O silêncio da fala, falar pouco, falar
gentilmente, falar a verdade ou cantar mantras estão entre as
melhores práticas espirituais e formam a base para um sadhana
genuíno.
Mauna é mais importante para práticas de Yoga mais profundas
do que Asana. Sem Mauna ou silêncio da fala externa e interna,
qualquer asana ficará cheio de pensamentos e palavreado
desnecessário, como bloqueios nos músculos. Mauna cria estabilidade
para a mente, um assento interno ou asana para a meditação.

Mauna é necessário para Pranayama, porque a fala e o


pensamento são as principais áreas onde desperdiçamos ou perdemos
prana. A fala surge da expiração. Se não podemos controlar a fala, não
podemos controlar a expiração ou a respiração em geral.

Mauna é a base de Pratyahara, que é o controle dos sentidos e


dos órgãos motores do ponto de vista de uma consciência
superior. Sem o domínio da fala, não pode haver controle dos sentidos
ou dos órgãos motores em nenhum nível.

Práticas de Mauna e Yoga Superior


O mantra funciona melhor se for cantado em um estado de
silêncio mental ou Mauna interior. Por outro lado, o mantra ajuda a
desenvolver o silêncio da mente. O sadhaka deve levar o mantra do
estado falado, para um estado de ressonância suave e repetição junto
com a respiração, para uma repetição silenciosa pela mente e,
finalmente, para uma vibração de consciência silenciosa.

A Palavra Divina e os mantras cósmicos começando com OM e


HREEM são os sons do silêncio, nos quais, só podemos entrar com
uma mente silenciosa e um coração receptivo. As vibrações mântricas
cósmicas são os sons do espaço universal, no qual não há fricção ou
ruído. Este é o espaço da consciência, Chidakasha. Entrando nisso,
todas as limitações de tempo, lugar e pessoa desaparecem.

Como tal, Mauna é a base para Dharana ou concentração. Se


não tivermos silêncio de fala e mente, como podemos concentrar
nossa atenção ou fixar nosso olhar interiormente?

Mauna é a base para Dhyana ou meditação, porque o silêncio


da fala e da mente é a base para manter o estado reflexivo de
meditação no qual, a mente se torna imóvel como um espelho. A
meditação no silêncio e a meditação silenciosa andam juntas e nos
dão paz interior.

Mauna é a base do Samadhi, o estado unitário de consciência


pura, que literalmente tira nossa fala, mente e respiração que estão
interligadas. Se não ficarmos em silêncio na fala e na mente, não
estamos em samadhi.

Fala como a Deusa 


Devemos honrar a fala, como algo sagrado. Então, não nos
entregaremos tão rapidamente ao desperdício verbal e ao abuso. Uma
maneira simples de fazer isso é honrar a fala, tanto nosso próprio
órgão vocal, quanto a fala como um poder universal do qual ela se
manifesta, na forma de Devi Saraswati, junto com seu bija mantra AIM.

Ma Saraswati rege a língua e o órgão vocal e o chakra da


garganta, incluindo música, poesia e mantra, elevando-nos ao silêncio
da fala e da mente. Se não honrarmos Saraswati em nosso discurso,
nosso discurso se tornará violento, vulgar, destrutivo e desintegrador
de nosso próprio bem-estar psicológico.

A maneira vulgar e rude de falar e se expressar que marca nossa


atual cultura supostamente high tech é motivo de grande
preocupação, do ponto de vista espiritual. Isso mostra que há muita
violência e agitação fermentando dentro de nós que devem
eventualmente se manifestar em níveis individuais e coletivos. Quando
nossa fala começar a ficar áspera ou perturbada, devemos nos lembrar
de Saraswati. Sem sua graça não há espiritualidade, arte, sabedoria ou
mesmo conhecimento significativo.

No entanto, todas as Deusas ou Devis se relacionam com


diferentes aspectos da fala ou da Palavra Divina e seu poder, como
Vak-shakti.  Tripura Sundari também se relaciona com ver tudo como
sagrado ou divino, tudo na natureza como manifestação da Palavra
Divina ou força criativa cósmica, tudo como Brahman.

A própria Kundalini Shakti é o poder da Palavra Divina interior, e


é por isso que ela é composta pelas letras do alfabeto sânscrito que
reflete as vibrações sonoras cósmicas. Sem Mauna Kundalini Shakti não
pode surgir em sua verdadeira forma e poder de transformação.

Mauna implica honrar a Deusa, seguir a musa e a Yoga Shakti,


através da qual, toda a vida procede e evolui.

Mauna como a Essência do Yoga


Mauna é uma das principais práticas de Yoga e, às vezes, torna-
se um membro do próprio Yoga. Mesmo os Yamas e Niyamas como
Ahimsa, Satya e Brahmacharya requerem Mauna para se
desenvolver. Da mesma forma, Tapas, Svadhyaya e Ishvara Pranidhana
implicam controle da fala.

No que diz respeito à Ayurveda e à Yogaterapia, a prática de


Mauna ajuda a curar o corpo, o prana e a mente, pois o silêncio
interior é o poder supremo de cura, rejuvenescimento e restauração
do equilíbrio e da harmonia em geral.

Vairagya ou desapego está enraizado no controle da fala e dá o


controle da fala. Sem controle da fala não há Vairagya.

Viveka ou discernimento interior só é possível quando


observamos, em vez de reagir a nível vocal. Sem discernimento,
quanto ao que dizemos, não há Viveka.

Somente através de Mauna podemos entrar no guha ou caverna


secreta do coração em que todo o universo habita em sua verdadeira
luminosidade.  No final, todas as palavras significam nada ou tudo,
sendo o verdadeiro significado e som a nossa unidade com tudo.

O caminho para a autorrealização é através do silêncio que é o


maior professor e o maior poder de conhecimento como ensinou
Bhagavan Ramana Maharshi.

Vamadeva Shastri

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