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Resumo: A indisciplina está presente nas aulas de educação física, sendo importante
encontrar meios que contribuam para resolver/amenizar este problema. Dentro desta
perspectiva, o objetivo desta investigação foi analisar uma proposta didático-
pedagógica junto a uma turma do 5° ano do ensino fundamental de uma rede pública
municipal. Durante as aulas foram realizadas atividades envolvendo a construção de
valores que, associados aos jogos sociomotrizes de cooperação, permitiram analisar
as percepções e reflexões dos alunos sobre as situações de indisciplina em aula. A
investigação utilizou-se da pesquisa-ação e os dados foram coletados através de
diários de aula e rodas de conversa. Foram observadas diversas situações de
indisciplina e de resistência em relação às propostas construídas conjuntamente entre
professor e estudantes, contudo, os jogos sociomotrizes de cooperação foram
importantes aliados neste processo. Concluímos que os jogos sociomotrizes de
cooperação e as reflexões realizadas contribuíram para minimizar os enfrentamentos
relacionados à indisciplina.
games of cooperation were important allies in this process. We conclude that the socio-
motive games of cooperation and the reflections carried out contributed to minimizing
the confrontations related to indiscipline.
INTRODUÇÃO
DISCUSSÃO TEÓRICA
A indisciplina escolar expressa um certo desalinhamento dos estudantes com
as regras de convivência coletiva. Segundo Estrela (1998, p. 17) “[...] o termo
indisciplina surge geralmente associado com a disciplina e tende a ser pela sua
negação ou privação ou desordem proveniente da quebra de regras estabelecidas”
La Taille (apud PAULA, PAIXÃO, OLIVEIRA, 2005, p. 01) define a indisciplina “[...]
como toda ação moral executada pelo sujeito e que está em desacordo com as leis
impostas ou construídas coletivamente, tendo consciência ou não deste processo de
elaboração”.
Neste trabalho, quando nos referirmos à indisciplina estaremos destacando
as discussões entre os alunos durante as aulas de Educação Física, o não
cumprimento do contrato pedagógico, interrupções e brincadeiras inapropriadas,
brigas entre alunos e desrespeito ao professor e aos colegas (PEREIRA, 2020).
proposta estão em: não valorizar o fato de ganhar ou perder; evitar a eliminação dos
participantes, procurando manter todos inclusos até o fim do jogo; procurar facilitar o
processo criativo, com a flexibilização das regras; evitar o incentivo à agressividade e
o confronto individual ou coletivo.
Para Correia (2006, p. 158) “[...] com os jogos cooperativos, a Educação Física
escolar pode enxergar com muito mais facilidade a integralidade do ser humano e a
necessidade de trabalhar valores tais como a solidariedade, a liberdade responsável
e a cooperação”. Também, podem ser uma alternativa para uma proposta integrativa
nas aulas de Educação Física, pois tem a inclusão (participação de todos nas
atividades realizadas) e a cooperação como seus princípios fundamentais (NETO;
WALDOW, 2010, p. 86-87).
Os jogos de cooperação ganharam destaque no Brasil com a divulgação dos
trabalhos do Professor Fabio Otuzi Brotto (BROTTO, 1999), os quais alimentaram
propostas e pesquisas que forneceram uma base teórica para a valorização destes
jogos.
Esta proposta valorizou-se porque em muitas situações ela se colocava como
um contraponto aos jogos competitivos e a exacerbação da competição era vista para
muitos defensores desta ideia, como algo prejudicial, sendo um reflexo da sociedade
capitalista que prioriza o ganho a qualquer “custo”. Todavia, em muitas situações criou-
se uma visão romantizada desta proposta, ao defender que o ensino dos jogos de
cooperação levaria a sociedade a uma transformação social nos aspectos da
cooperação, do respeito, da solidariedade etc.
Lovisolo, Borges e Nunes (2013) buscam rebater algumas das ideias
preconizadas pelos autores que trabalham com jogos cooperativos, principalmente a
de que os esportes competitivos produzem situações negativas, como: o confronto,
eliminação da diversão, da alegria de jogar e da exclusão dos perdedores. Para os
autores, muitos destes pressupostos precisam de maior aprofundamento, por não
fazerem uma análise mais detalhada da relação entre esporte e competição. Como
exemplo, apontam Norbert Elias que considera que os “Esportes e Jogos se
caracterizariam pelas restrições à violência impostas pelo respeito obrigatório às
regras que os estruturam” (LOVISOLO; BORGES; NUNES, 2013, p. 134).
TRAJETÓRIA METODOLÓGICA
sua importância para a vida dos educandos e discuta com eles a razão de ser de cada
conteúdo estudado”.
Esclarecida a temática proposta, foi iniciada a reflexão sobre os principais
problemas de indisciplina da turma, através de um checklist, na qual os estudantes
identificaram as seguintes situações: falta de respeito, falta de educação, bullying,
conversas e brincadeiras paralelas, e falta de atenção.
[...] perguntei se eles concordavam, pedi para que levantassem as mãos para
que pudéssemos verificar se eles concordavam com o que estava sendo
escrito no cartaz. Acabamos ficando em cinco regras:
1- Levantar a mão quando for falar;
2- Ser educado com todos;
3- Ser amigável;
4- Obedecer ao professor;
5- E não gritar. (Diário de Aula 02, p. 10)
Segundo Caetano e Pereira (2012), o professor, ao convidar seus alunos para
estabelecer as regras da classe, estará guiando os mesmos no caminho da
autonomia. Este fator é importante, uma vez, que evita que as decisões sejam
tomadas de maneira autoritária pelo professor.
No momento da apresentação dos Jogos Sociomotrizes de Cooperação, o
professor-pesquisador buscou, primeiro, verificar os conhecimentos prévios dos
alunos sobre as atividades e compreender se eles tinham conhecimento ou a noção
de tais atividades.
cooperação, principalmente, com a ideia de que estas atividades tinham como objetivo
“ajudar o outro”, sempre tendo o verbo “ajudar” como elemento central nas respostas
dos alunos.
Para auxiliar os alunos a refletirem sobre seus comportamentos e atitudes
durante as aulas, o professor-pesquisador buscou, durante as rodas de conversas,
levar os alunos a pensarem sobre a importância de colaborarem e de participarem
coletivamente durante os jogos, dando destaque a dois objetivos que eram
importantes na realização dessas atividades: a cooperação e o trabalho em equipe.
Tentei fazer que falassem mais um pouco, perguntei a uma aluna se ela sabia
o que era cooperação, então me respondeu: “que era ajudar o outro”.
Perguntei também se era preciso cooperação nas atividades que fizemos, ela
falou: “sim, porque tem que todo mundo ajudar” (Diário de aula n. 07, p. 41).
A discussão sobre estes temas tinha como premissa levar os alunos a refletirem
sobre a importância da colaboração durante o desenvolvimento das atividades e,
também, o intuito de verificar se os alunos compreendiam que a indisciplina
comprometia o grupo como um todo.
Você R., pode falar? “É que tem muita bagunça e não dá para trabalhar em
equipe, os meninos não ajudam, eles mexem com as meninas”. Na sala
vocês também têm dificuldades para trabalhar em equipe, tem muita
bagunça? “Sim!", ela respondeu.
Voltei a fazer a pergunta e a aluna respondeu que precisava trabalhar em
equipe, perguntei se para ela, se eles haviam trabalhado em equipe, ela então
disse: “não”. Perguntei o porquê e, ela me falou que: “havia umas pessoas
que não sabiam brincar”. Perguntei para o grupo se eles concordavam e a
maioria disse que sim (Diário de aula n. 07, p. 40).
A dimensão atitudinal proporcionou o debate de temas essenciais como:
respeito mútuo, companheirismo e orientação sexual (BRASIL, 1997). Tais temas
estiveram presentes e foram discutidos e abordados pelos alunos durante as práticas
ou na construção das regras pela turma.
[...] Mas vocês não acham que o respeito tem que ter com qualquer pessoa?
E, não somente por causa da punição? Outra aluna respondeu: “Sim, tem que
ter mas, quando não tem... tem que chamar os pais”. Mas não é importante o
respeito sem ter que punir? Por que todo mundo merece respeito? “Sim”,
disse um menino e completou que tinha que ter com “todo mundo” (Diário de
aula n. 10, p. 57).
Destaca-se que, apesar da lógica interna destes jogos favorecer a cooperação
e a participação de todos nas atividades, não podemos excluir o fato de que quando
o aluno participa de tais atividades ele carrega consigo uma maneira pessoal e
subjetiva de participar, isto se deve à lógica externa, ou seja, o aluno traz para as suas
Quando um aluno foi tentar subir e não conseguiu, um menino do grupo falou
um palavrão para ele; pedi para ele não falar palavrão, mas sim, ajudar o seu
amigo. Ele ficou olhando e disse que o outro era tonto, disse que não tinha
ninguém tonto, mas se ele tentasse ajudar o seu amigo, ele conseguiria
(Diário de aula n. 08, p. 45).
Muitos dos conflitos ocorridos durante as atividades aconteciam por motivos de
discussões e, em alguns casos, havia ofensas pessoais a outro(s) colega(s). É
relevante destacar que os conflitos são importantes nas relações humanas,
principalmente, para o desenvolvimento do diálogo e da empatia, porém, torna-se
necessário ao professor intervir quando os conflitos fogem dos limites que poderiam
ser aceitáveis, como no caso das ofensas pessoais ou em algumas situações de
exclusão e agressões físicas. Nestes casos, o professor precisa intervir, levando os
alunos a refletirem sobre suas atitudes e comportamentos.
constantemente reforçar junto a eles o diálogo, dando oportunidade para que todos
possam discutir e participar. O professor deve estimular, através da prática dos jogos
com cooperação nas aulas de Educação Física, os valores importantes nas relações
humanas, como, o respeito mútuo, a solidariedade e a cooperação entre as pessoas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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problemas de indisciplina na escola In: Revista de Psicologia, Educação e Cultura.
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jogo de regras e sua relação com a indisciplina nas aulas de Educação Física. In:
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Anais [...]. Curitiba: UTP, 2012. p. 300-312.
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SILVEIRA, T.A.; BRITO, R.G. A dinâmica das rodas de conversa em aulas de ciência
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www.diaadiaeducacao.pr.gov.br . Acesso em: 17 out. 2021.