UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

DEPARTAMENTO DE ECONOMIA
ECO 02277 TURMA A
TEORIA MICROECONÔMICA I
PROF. MARCELO S. PORTUGAL
1a. PROVA – 2021.1

1. Dada a função utilidade U(x1, x2) = 4x1 x2  x1  x2 , pede-se:

a) obtenha as funções de demanda marshallianas pelos bens x1 e x2. (1,0 ponto)

Solução:

Max.: 4x1 x2  x1  x2
s.a.: p1x1 + p2x2 = b

L = 4x1 x2  x1  x2 + ( p1x1 + p2x2 = b)

L 4x 1
 4 x2  1   p1  0    2
x1 p1
L 4x 1
 4 x1  1   p 2  0    1
x2 p2
L
 b  p1 x1  p2 x2  0


Como  = :
4 x2  1 4 x1  1

p1 p2
4 x2 p2  p2  4 x1 p1  p1
4 x1 p1  p1  p2
x2 
4 p2

Substituindo na restrição orçamentária:

p1x1 + p2x2 = b
4 x p  p1  p2
p1x1 + p2 1 1 =b
4 p2

4 x1 p1  4 x1 p1  p1  p2 = b
4
8 p1 x1  p1  p2
b
4
8 p1 x1  p1  p2  4b

4b  p1  p2
x1 
8 p1
Analogamente:

4b  p1  p2
x2 
8 p2

b) qual é a cesta ótima quando p1 = 20, p2 = 10 e a renda monetária é de R$1.200,00?

Qual é a utilidade marginal da renda? O que ela significa? (0,5 ponto)
Solução:

x1 
 4 1200   20  10  29,9375
160

x2 
 4 1200   20  10  60,125
80

A cesta ótima é, portanto: (29,9375; 60,125).

A utilidade marginal da renda é dada pelo multiplicador de Lagrange, . Dessa forma:

4x 1 4x 1
 1  2  12, 075
p2 p1

A utilidade marginal da renda é, então, 12,075. Isso significa que se a renda aumentar
em uma unidade, a utilidade no ponto de máximo irá aumentar em 12,075 unidades.

c) se p1 = 10, p2 = 10 e a renda monetária é de R$1.200,00, qual será a cesta ótima?

Discuta este resultado, utilizando as elasticidades-preço cruzadas dos bens. Classifique
os bens quanto à complementariedade e substitutibilidade. (0,5 ponto)
Solução:
Neste caso, a cesta ótima será:
x1 = 60
x2 = 60
Como pode ser observado, a diminuição do preço do bem 1, aumentou a demanda pelo
bem 1 e diminuiu (ainda que não significativamente) a demanda pelo bem 2. Espera-se,
então, que a elasticidade-preço cruzada entre os bens seja negativa, indicando que os
bens são complementares.
Calculemos as elasticidades-preço cruzadas:
 x1 p2 p2
12 =   0  ou seja, um aumento no preço do bem 2 aumenta a demanda
p2 x1 8 p1 x1
pelo bem 1 ou, uma diminuição no preço do bem 2 diminui a demanda pelo bem 1.

x2 p1 p1
 21 =   0  ou seja, uma diminuição no preço do bem 1, aumenta a
p1 x2 8 p2 x2
demanda pelo bem 2.

Como as elasticidades-preço cruzadas são positivas, concluímos que esses bens são
substitutos.

d) Calcule a elasticidade-preço e a elasticidade-renda para cada um dos bens e interprete

os resultados. (1,0 ponto)
Solução:

Bem x1:

x1 p1 8 p1  (4b  p2  p1 )  8 p1
p  
p1 x1 8 p1 
2
x1

8 p1  32b  8 p2  8 p1 32b  8 p2 4b  p2
p    0
64 p1 x1 64 p1 x1 8 p1 x1

Como a elasticidade-preço é menor que zero, um aumento no preço do bem 1, diminui

a sua quantidade demandada. Portanto, o bem é comum.

x1 b b
 R    0  bem normal: quando a renda aumenta, a quantidade
b x1 2 p1 x1
demandada aumenta também.

Bem x2:

x2 p2 8 p2  (4b  p1  p2 )  8 p2
p  
p2 x2 8 p2 
2
x2
8 p2  32b  8 p1  8 p2
 p 
64 p2 x2
32b  8 p1 4b  p1
p   0
64 p2 x2 8 p2 x2

Como a elasticidade-preço é menor que zero, o bem é comum, já que uma diminuição
em seu preço aumentará a sua demanda e vice-versa.
 x2 b b
 R    0  bem normal: quando aumenta a renda, a quantidade
b x2 2 p 2 x2
demandada aumenta também.

2. Seja U(D, M) = D M  , a função utilidade de um indivíduo, onde M = número de

unidades de um bem importado e D = número de unidades de um bem doméstico. Sabe-
se que se a taxa de substituição econômica (= razão entre os preços) de bens domésticos
por importados for igual a ½, o consumidor irá consumir, em equilíbrio, a mesma
quantidade dos dois bens. Qual é a taxa marginal de substituição de bens importados por
bens domésticos se a cesta de consumo é (D, M) = (50, 200)? (1,0 ponto)

Solução:
Sabemos que a taxa marginal de substituição é dada pela razão entre as utilidades
marginais. Portanto
UMgD  D 1M   M
TMS =   (1)
UMgM  D M  1  D

No ponto de ótimo (ponto A da figura abaixo), sabemos que a Taxa Marginal de

Substituição deve ser igual à relação entre os preços. O exercício nos dá a informação
que, quando a relação entre os preços for igual a ½, a quantidade consumida, em
equilíbrio, ou seja, no ponto de ótimo, dos dois bens serão iguais (M = D) e, portanto:
M  1
TMS  = =    2
D  2

Substituindo esse valor em (1), obtemos:

M
TMS =
2 D
M
TMS =
2D

Queremos saber qual é a TMgS quando a cesta de consumo é (50,200), ou seja, qual é a
inclinação da curva de indiferença nesse ponto (que não é o ponto de ótimo) – ponto B
da figura abaixo. Então:

200
TMS = = 2.
2  50
3. Um indivíduo tem função utilidade U(W) = W , onde W é a sua riqueza. Pede-se:

a) Como se classifica este indivíduo com relação ao risco? Demonstre graficamente.

(0,5 ponto)
Solução:
Este indivíduo é avesso ao risco, já que sua função de utilidade esperada é côncava:

Nesse caso, a utilidade esperada da loteria (dada pelo ponto A no gráfico acima) é
menor que a utilidade do valor esperado dessa loteria (dada pelo ponto B):

U  pw1  (1  p) w2   pU  w1   (1  p)U (w2 )

Assim, o indivíduo prefere receber o valor esperado da loteria a participar dela.

b) Este indivíduo possui um carro avaliado em R$ 40.000,00. Um seguro contra roubo

para este carro custaria R$ 2.800,00. Se a probabilidade do carro ser roubado é 5%,
verifique se este indivíduo comprará ou não o seguro. (1,0 ponto)
Solução:

Aqui temos que calcular a utilidade com e sem seguro.

Com seguro, o indivíduo terá uma renda R$ 2.800,00 menor, ou seja, a riqueza dele será
w = R$37.200,00, e não terá risco algum:

Ucs = U(37200) = 37200 = 192,87

Se ele não fizer o seguro, temos uma loteria: há 95% de chance do carro não ser
roubado e o indivíduo ficar com R$40.000,00, e 5% de chance do carro ser roubado e o
indivíduo ficar sem nada. Portanto:

Uss = 0,95  40000  0,05  0

Uss = 190

Como a Ucs é maior que a Uss, o indivíduo comprará o seguro.

c) Qual a probabilidade do carro ser roubado para a qual este indivíduo é indiferente
entre comprar ou não o seguro? (1,0 ponto)
Solução:
Aqui devemos igualar as duas situações (com e sem seguro) e encontrar a probabilidade
p:

Ucs = Uss

37200 = (1  p)  40000  p  0

192,87 = 200 – 200 p

p = 7,13/200

p = 0,03565

Portanto, a probabilidade do carro ser roubado para a qual este indivíduo é indiferente
entre comprar ou não o seguro é de 3,57%.

4. Comente as seguintes afirmativas, discordando ou concordando:

a) se um consumidor está em seu ponto de equilíbrio e, a partir daí, sua renda e todos os
preços caem 5%, o consumo dos bens inferiores irá aumentar, enquanto o consumo dos
bens normais irá diminuir. (1,5 ponto)
Solução:

A afirmativa é falsa.

Seja a restrição orçamentária do consumidor:

p1 x1  p2 x2  b

Se os preços e a renda caem todos 5%, temos que:

 0,95 p1 x1   0,95 p2 x2   0,95 b = p1 x1  p2 x2  b

ou seja, a restrição orçamentária do consumidor não vai ser alterada e, portanto, as

quantidades consumidas também não serão alteradas.

Isso pode ser visto graficamente também:

Note que se multiplicarmos os preços e a renda pela mesma quantidade, a reta

orçamentária não “sairá do lugar”, já que:

b b b b
 e 
 p1 p1  p2 p2

E, assim, a escolha ótima do consumidor não será alterada.

Obs.: Isso acontece porque as funções de demanda têm a propriedade de serem

homogêneas de grau zero, ou seja, se multiplicarmos preços e renda por uma mesma
quantidade , o valor da função não será alterado:
x1 ( p, b)   0 x1 ( p, b)  x1 ( p, b)

b) um aumento no preço de um bem sempre aumenta o gasto do consumidor na compra

desse bem. (1,0 ponto)
Solução:
A afirmativa é falsa.
O gasto com o bem x é dado por:
gx = px

Sabemos que um aumento no preço do bem diminui a sua quantidade demandada:

gx = (  )p (  )x
O efeito sobre o gasto com esse bem irá depender, então, de se a diminuição da
quantidade demandada de x é proporcionalmente maior ou menor que o aumento do seu
preço, ou seja, dependerá da elasticidade-preço da demanda:

- se a demanda for elástica: um aumento no preço provoca uma grande diminuição na

quantidade demandada, ou seja, a demanda diminui mais que proporcionalmente que o
aumento no preço. Dessa forma, o gasto com esse bem irá diminuir.

- Se a demanda for inelástica: um aumento no preço provoca uma pequena diminuição

na quantidade demandada, ou seja, a demanda diminui menos que proporcionalmente
que o aumento no preço. Dessa forma, o gasto com esse bem irá aumentar.

- Se a demanda possuir elasticidade unitária: um aumento no preço provoca uma

diminuição na quantidade demandada na mesma proporção. O gasto com o bem, nesse
caso, ficará inalterado.

c) em um modelo de escolha intertemporal, a alocação do consumo no tempo vai

depender dos valores relativos das taxas de juros e da preferência no tempo. (1,0 ponto)
Solução:
A afirmativa é verdadeira.
O problema do consumidor nesse caso é alocar o seu consumo entre presente e futuro,
levando em consideração a taxa de juros e a taxa de preferência no tempo, a qual indica
o quão impaciente é o indivíduo em relação ao consumo. Se p é grande, o indivíduo é
muito impaciente e prefere consumir no presente.
A variável p pode ser vista como o custo de esperar para consumir no futuro e r o custo
de oportunidade de consumir no presente. Como sabemos, na escolha ótima do
consumidor, as utilidades marginais devem ser iguais ao preço relativo dos bens.
Portanto, a alocação intertemporal de consumo será dependente das taxas de juros e da
preferência do consumidor no tempo.

Mais formalmente:
O problema intertemporal do consumidor é (considerando uma função de utilidade
aditivamente separável):
1
Max: U(c1) + U(c2)
1 p
s.a.: c1 + Dc2 = b

1
onde D =
1 r

1
L = U(c1) + U(c2) +  (b - c1 - Dc2)
1 p

Assim, temos que:

UMgc1 1  p

UMgc2 1  r
Ou seja, o consumo depende tanto da taxa de juros quanto da taxa de preferência do
consumidor. Quanto maior p, mais o consumidor vai consumir no presente e quanto
menor p, menos o consumidor consumirá no presente. Quanto maior r, mais o
consumidor consumirá no futuro e quanto menor r, menos ele consumirá no futuro.