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Aula 6

Microeconomia 1 – UnB (graduação)

Problema do Consumidor e Demanda

2023/2
Solução do problema do consumidor
Problema diferenciável com dois bens
É dada uma função u : R2+ → R derivável e queremos resolver

max u(x1 , x2 )
x1 ,x2

s.a. p1 x1 + p2 x2 ≤ w , x1 , x2 ≥ 0.

Proposição 1
Se uma solução interior (quantidades positivas) existe e estivermos
no ótimo sobre a linha orçamentária, para encontrá-la:

∂u(x)
− λp1 = 0
∂x1
∂u(x)
− λp2 = 0
∂x2
p1 x1 + p2 x2 = w
Solução do problema do consumidor (cont.)
Ideia da demonstração.
Se x1∗ , x2∗ > 0 são escolhas dos bens que resolve o problema, não
existe h ∈ R2 com as seguintes propriedades:

∂u(x ∗ ) ∂u(x ∗ )
h1 + h2 > 0
∂x1 ∂x2
p1 h1 + p2 h2 = 0

pois do contrário para alguma α ̸= 0 pequeno e teríamos que


x ∗ + αh ∈ B(p, w ) e u(x ∗ + αh) > u(x ∗ ). Logo (?), existe λ tal
que
   
∂u(x ∗ )
p
 ∂x1  = λ  1  .
∂u(x ∗ )
∂x2 p2

.
Solução do problema do consumidor (cont.)

TMS na solução do problema


Na solução interior proposta acima uma outra forma de encontra a
solução é achar o ponto na reta orçamentária onde a TMS iguala
−p1
p2 . Ou seja, buscamos a igualdade entre TMS e custo de
oportunidade:
∂u
(x) p1
− ∂x
∂u
1
= − .
∂x2 (x)
p2
| {z } |{z}
substituição do bem 2 pelo bem 1 sacrifício do bem 2 pelo bem 1

Ou seja, temos uma condição de tangência entre a reta


orçamentária e a curva de indiferença do bem mais preferido em
B(p, w ). Note que isso depende de a solução ser interior (gráficos
abaixo).
do bem 2. A curva de indiferença não tangencia a reta orçamen
Solução do problema do consumidor (cont.)

Figura: Varian (livro)


uma condição necessária para alcançar o ótimo, mas não u
Solução do problema do consumidor (cont.)

.3 Ótimo de fronteira.Figura:
O consumo ótimo acarreta o consum
Varian (livro)

o bem 2. A curva de indiferença não tangencia a reta orçame


Solução do problema do consumidor (cont.)

Exemplo (Cobb-Douglas)
Considere a utilidade Cobb-Douglas:

u(x1 , x2 ) = x1a x2b .

Suponha que p1 , p2 , w > 0. Note que não pode ser ótima a escolha
de x1 = 0 ou x2 = 0 pois sempre haveria uma cesta com utilidade
positiva. Considere a CPO:
a a b
ax1a−1 x2b = λp1 ⇒ x x =λ
p1 x1 1 2
b a b
x1a bx2b−1 = λp2 ⇒ x x = λ.
p2 x2 1 2
Solução do problema do consumidor (cont.)

Exemplo (Cobb-Douglas (cont.))


Logo:
a
p1 x1 =p2 x2
b
b a
⇒ p2 x2 = w, p1 x1 = w.
a+b a+b
De outra forma,
a w
x1 =
a + b p1
b w
x2 = .
a + b p2
amos que a função de utilidade seja da forma Cobb-Douglas, u(x1, x2) =
Solução de canto
ndice deste capítulo, utilizamos o cálculo para derivar as escolhas ótim
ção deNem
utilidade,
sempreque são é interior
a solução
Com preferências côncavas (utilidade convexa), e também com
utilidade linear ou quase-linear, pode ocorrer de a solução ter
consumo 0 de algum bem.
O caso com N bens

X = RN+
O problema do consumidor pode também ser resolvido no caso de
mais de dois bens. Em analogia ao que foi feito no caso com dois
bens, primeiro temos o problema:

max u(x1 , . . . , xN )
x1 ,...,xN

s.a. p1 x1 + · · · + pN xN ≤ w
x1 , . . . , xN ≥ 0

1 No caso de u não ser diferenciável, cada situação deve ser


analisada individualmente.
2 Sob a hipótese de que u é diferenciável, podemos também
aplicar o método do lagrangiano para resolver.
O caso com N bens (cont.)

Resolvendo no caso difenciável


Escreva o lagrangiano

L = u(x1 , . . . , xN ) + λ(w − p1 x1 − · · · − pN xN ),

e encontre os pontos críticos de L com respeito às N + 1 variáveis.


Isso fornece o sistema de N + 1 equações em N + 1 variáveis:

∂u(x)
− λ1 p1 = 0
∂x1
..
.
∂u(x)
− λN pN = 0
∂xN
w − p1 x1 − · · · − pN xN = 0.
O caso com N bens (cont.)

Observação
Implicação para utilidade marginal e preços Aplicando as condições
acima para os bens i e j, vemos que

∂u(x)
= λpi
∂xi
∂u(x)
= λpj .
∂xj

Com isso, os preços relativos igualam a razão as utilidades


marginais:
∂u(x)
∂xi pi
∂u(x)
= .
pj
∂xj
O caso com N bens (cont.)

Exemplo (Cobb-Douglas com N bens)


Resolva o problema do consumidor de

max x1 x2 . . . xN
x1 ,...,xN

s.a. x1 + · · · + xN ≤ 10
x1 , . . . , xN ≥ 0

Aqui pi = 1 para todo bem i, e a renda é w = 10. Note que a CPO


fornece para cada bem i:

u(x)
= λ,
xi
10
de onde conclui-se que x1 = · · · = xN . Logo, xi = N.
O caso com N bens (cont.)

Interpretação

∂u(x)
∂xi
∂u(x)
= “valor” marginal do bem i em termos de j
∂xj
pi
= custo marginal no mercado do bem i em termos de j.
pj

Logo, na escolha ótima o benefício marginal do bem iguala o seu


custo na margem.
Função de demanda
Ideia: cada par (p, w ) de vetor de preços p ∈ RN e renda w
induz um problema para o consumidor, em que ele quer achar
a melhor cesta para consumir de B(p, w ). Por isso, podemos
construir uma “função” que associa a cada problema, e
portanto a cada (p, w ), a cesta ótima escolhida x(p, w ).

Definição (Função de demanda)


É uma função x M : RN N
+ × R+ → R+ que associa a cada
(p, w ) ∈ R+ × R+ a cesta x (p, w ) = x ∗ , onde x ∗ = (x1∗ , . . . , xN∗ )
N M

resolve o problema do consumidor Pu nesse contexto. Ou seja:

x M (p, w ) = arg max u(x) s.a. x ∈ B(p, w )


x∈RN
x M (p, w ) = (x1M (p, w ), . . . , xNM (p, w )).

Notação: x M (p, w ) ou x(p, w ), não havendo ambiguidade.


Função de demanda (cont.)

Demanda Marshalliana
A função de demanda acima também é conhecida como demanda
Marshalliana, que expressa a cesta demandada como função de
preços e renda. Cada xiM (p, w ) representa demanda Marshalliana
do bem i. Às vezes a função demanda acima também é chamada
de função de demanda Walrasiana.

E se a demanda Marshalliana não for uma “função”?


Dependendo das preferências do consumidor, o problema Pu pode
admitir mais de uma solução dado um par de vetor de preços e
renda (p, w ). Essa possibilidade fica excluída se as preferências fore
estritamente convexas (por quê?), mas ocorre, por exemplo, com
substitutos perfeitos em alguns casos. Neste caso a função
demanda seria uma “correspondência” x M : RN + × R+ ⇒ R+ .
N
Função de demanda (cont.)
Exemplo (O caso com 2 bens e a curva de demanda)
Resolvendo o problema do consumidor para cada (p1 , p2 , w )
encontramos x M (p, w ) = (x1M (p, w ), x2M (p, w )), sendo

(p1 , p2 , w ) 7→ x1 (p1 , p2 , w ) (função demanda do bem 1)


(p1 , p2 , w ) 7→ x2 (p1 , p2 , w ) (função demanda do bem 2).

p1

x1M (p1 , p2 , w )

0 x1
Função de demanda (cont.)
Exemplo (Utilidade Cobb-Douglas com 2 bens)
Suponha que u(x) = x1a x2b . Então para preços e renda positivos a
demanda Marshalliana x(p, w ) tem o formato:
a w
x1 (p, w ) =
a + b p1
b w
x2 (p, w ) = .
a + b p2

Exemplo (Bens complementares perfeitos)


Quando u(x) = min{ax1 , bx2 }, sabemos que as proporções ótimas
de consumo são sempre com xx12 = ba . Supondo a região com preços
e renda positivos temos
bw aw
x1 (p, w ) = , x2 (p, w ) = .
bp1 + ap2 bp1 + ap2
Função de demanda (cont.)
Exemplo (Utilidade quase-linear)
Suponha que u(x1 , x2 ) = Ax1 − B2 x12 + x2 . E seja p2 = 1. Como a
utilidade cresce com x2 , na solução do problema do consumidor
teremos p1 x1 + x2 = w . Por isso podemos substituir x2 = w − p1 x1
na utilidade e obter
B 2
u = Ax1 − x + w − p1 x1 .
2 1
du
Se x1 > 0 no ótimo, teremos dx 1
= A − Bx1 − p1 = 0, ou seja
p1 = A − Bx1 . Quando x1 = 0 note que u = w . Para a escolha
positiva de x1 ser melhor precisamos de

(A − p1 )2 B (A − p1 )2
− > 0,
B 2 B2
o que vale para p1 < A.
Função de demanda (cont.)
Exemplo (Utilidade quase-linear (cont.))
Note que
A − p1
x2 = w − p1 ≥0
B
para renda w suficientemente alta.
p1

x1 (p1 , p2 , w )

0 A x1
B
Mais curvas importantes

Ideia: além da curva de demanda de um bem como função de


seu preço, normalmente consideramos outras variações e a
forma como elas afetam a escolha do consumidor. A forma de
mostrar os diversos efeitos leva a outras curvas importantes,
tais como:
1 Curva de demanda inversa: mostra o preço do bem ao qual o
consumidor pagaria para escolher de forma ótima consumir
exatamente uma dada quantidade.
2 Curva de preço-consumo: mostra a evolução das cestas
demandas frente à variação de preços (normalmente o preço de
um único bem).
3 Curva de renda-consumo: relaciona as cestas demandadas de
forma ótima com variações na renda do consumidor.
4 Curva de Engel: relaciona a quantidade demandada de uma
dado bem com mudanças na renda.
Mais curvas importantes (cont.)

Definição (Curva de demanda e demanda inversa)


1 A curva de demanda de um bem i expressa, dados os preços
dos demais bens e renda constantes, quando a quantidade
demandada do bem i varia quando variamos pi . Ou seja, é o
gráfico da função pi 7→ xi (pi ), onde xi (pi ) é a demanda
Marshalliana xiM (p, w ) do bem i vista como função de pi
apenas.
2 A curva de demanda inversa do bem i na quantidade xi é o
preço do bem i ao qual, tudo o mais constante (preços pi ,
j ̸= i, e renda w ) o consumidor escolhe consumir exatamente
xi . Ou seja, é a função xi 7→ pi (xi ) onde pi (xi ) respeita

xi = xiM (p1 , . . . , pi−1 , pi (xi ), pi+1 , . . . , pN , w ).


ponto
Maisde vista.importantes
curvas A Figura 6.15 descreve a função de demanda in
(cont.)
manda direta, dependendo do ponto de vista.

Figura: Varian (livro): p1 = p1 (x1 )


.15 Curva de demanda inversa. Se acharmos que a curva d
ço em função da quantidade, teremos uma função de demand
Mais curvas importantes (cont.)

Definição (Curva de preço-consumo)


A curva de preço consumo é uma curva que associa uma variação
parametrizada t 7→ p(t) do vetor preços a cestas escolhidas
x M (p(t), w ). Ou seja, é a curva t 7→ x M (p(t), w ).

Exemplo (Curva de preço consumo quando apenas ∆p1 ̸= 0)


No caso de dois bens, suponha que o preço do bem 2 e renda estão
dados nos patamares p̄2 e w̄ respectivamente. A curva de preço
consumo é a curva no plano dada por

p1 7→ (x1M (p1 , p̄2 , w̄ ), x2M (p1 , p̄2 , w̄ )).

Ou seja, são as escolhas ótimas dos dois bens à medida em que o


preço do bem 1 varia.
ir os pontos ótimos para formar a curva de preço-consumo, c
A. Mais
Essa curvas
curva importantes
representa as cestas que seriam demandadas
(cont.)
m 1.

.11 Curva Figura:


de preço-consumo e preço-consumo
Varian (livro): curva de curva de demanda.
no painel A O paine
preço-consumo, que descreve as escolhas ótimas à medida q
aria. O painel B contém a curva de demanda associada, qu
Mais curvas importantes (cont.)

Definição (Curva de renda-consumo e curva de Engel)


1 A curva de renda consumo é a curva gerada no plano das
cestas de mercadorias por variações na renda, tudo o mais
constante. Ou seja, é a curva

w 7→ x M (p, w ).

A curva de renda consumo é também conhecida por caminho


de expansão da renda.
2 A curva de Engel relaciona no plano a quantidade demandada
de uma dado com a renda. Ou seja, ela representa a função
que associa, tudo o mais constante, a cada w a quantidade
demandada xi (w ) = xiM (p, w ).
mos uma curva chamada curva de Engel. A curva de Engel é u
Mais curvas importantes (cont.)
um dos bens como função da renda, com os preços constan
urva de Engel, ver a Figura 6.3B.

.3 Como a demanda varia


Figura: quando
Varian (livro)a renda varia. A curva

ou caminho de expansão da renda), mostrada no painel A,


ima em diferentes níveis de renda e preços constante
escolha ótima do bem 1 contra a renda, m, obtemos a curva
Mais curvas importantes (cont.)
Exemplo (Efeito de ∆w com preferências homotéticas)
Note que quando o consumidor tem preferências homotéticas e
apenas a renda varia, suas escolhas dos bens aumentam
proporcionalmente frente a ∆w > 0.

GURA 6.7 Preferências homotéticas. A curva


Figura: Varian (livro)de renda-consumo (A) e a cur
Engel (B), no caso de preferências homotéticas.
Utilidade indireta
Ideia: associar a cada problema de escolha o valor da utilidade
na cesta ótima naquele problema. Um uso possível: comparar
o “bem-estar” do consumidor em situações distintas.

Definição (Função de utilidade indireta)


A função de utilidade indireta v : RN
+ × R+ → R é o valor da
utilidade do consumidor na melhor cesta escolhida em B(p, w ), ou
seja,

v (p, w ) = u(x M (p, w )).

Exemplo (Cobb-Douglas u(x) = x1a x2b , a + b = 1)

 a  b
w a b
v (p, w ) = .
a+b p1 p2
Referências

H. Varian
Microeconomia – uma abordagem moderna
Atlas, 9a ed, 2015.
Capítulos 5, 6.
M. J. Osborne, A. Rubinstein
Models in Microeconomic Theory
Open Book Publishers, 2nd ed, 2023.
Capítulo 5.
H. Varian
Microeconomic Analysis
W.W. Norton, 3rd ed, 1992.
Capítulos 7, 8.

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